Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.7, n.1, p.83-96, 2005 ISSN 1517-8595 83 TRANSIÇÕES DE FASES EM ALIMENTOS: INFLUÊNCIA NO PROCESSAMENTO E NA ARMAZENAGEM Juliana Tófano de Campos Leite1, Fernanda Elisabeth Xidieh Murr2; Kil Jin Park3 RESUMO Alimentos são compostos por uma combinação de diferentes componentes e, por essa razão, geralmente existem em um estado de não-equilíbrio amorfo. A transição vítrea é a principal transição de fases observada em componentes amorfos e, portanto, a mais comum em alimentos. A transição vítrea em materiais amorfos ocorre em uma faixa de temperaturas, mas geralmente é associada a um único valor – a temperatura de transição vítrea (Tg). Essa temperatura varia com a composição dos alimentos, principalmente com a concentração de água. O conhecimento do comportamento da temperatura de transição vítrea em função da umidade dos alimentos é essencial para a determinação das melhores condições de processamento e armazenagem dos alimentos. Palavras-chave: transição vítrea, diagramas de estado, atividade de água, plastificação pela água PHASES TRANSITIONS IN FOODS: INFLUENCE IN THE PROCESSING AND STORAGE ABSTRACT Food is composed by a combination of several components and, for this reason, generally in at a non-equilibrium amorphous state. The glass transition is the main phases transition observed at amorphous materials; therefore it is the most common in food materials. The glass transition in amorphous materials occurs at a range of temperatures, but it is often referred to the single temperature value – the glass transition temperature (Tg). This temperature varies with the food composition, mainly with the water content. The knowledge of the glass transition temperature behavior in function of the food moisture content is very important to determine the best conditions for food processing and storing. Keywords: glass transition, phase diagrams, water activity, plasticizing by water ____________________________ Protocolo 150 Protocolo 100 de 10 /01 / 2005 1 2 3 Doutoranda em Engenharia de Alimentos Departamento de Engenharia de Alimentos – Faculdade de Engenharia de Alimentos – Universidade Estadual de Campinas. Caixa Postal 6121. CEP: 13083-970. Campinas-SP, Brasil. E-mail: [email protected] Professora - Departamento de Engenharia de Alimentos – Faculdade de Engenharia de Alimentos – Universidade Estadual de Campinas. Caixa Postal 6121. CEP: 13083-970. Campinas-SP, Brasil. E-mail: [email protected] Professor Titular - Faculdade de Engenharia Agrícola – Universidade Estadual de Campinas. Caixa Postal 6011. CEP: 13084-971. Campinas-SP, Brasil. E-mail: [email protected] 84 Transições de fases em alimentos:Influência no processamento e na armazenagem INTRODUÇÃO A estabilidade é uma característica extremamente desejável em alimentos. Ao adquirir um produto, o consumidor deseja que ele mantenha a sua qualidade pelo maior tempo possível, tanto do ponto de vista sensorial, quanto do microbiológico. Termodinâmica-mente, um material estável é aquele que se encontra em equilíbrio com as condições de temperatura e pressão do ambiente, de forma que ele não apresente alterações em seu estado físico ao longo do tempo. Compostos, quimicamente puros, geralmente, são estáveis. No entanto, os alimentos são formados por uma combinação de diferentes componentes e, por essa razão, geralmente, existem em um estado de nãoequilíbrio amorfo. Materiais amorfos são compostos susceptíveis às mudanças de temperatura e pressão do ambiente, de modo que pequenas variações nas condições ambientes podem provocar mudanças de estado em alguns componentes, causando mudanças estruturais indesejáveis. A mudança de fase mais comum em alimentos é a transição vítrea, que consiste em uma transição de fase de segunda ordem de um estado sólido-vítreo para um estado semilíquido gomoso. A transição vítrea de um composto ocorre a uma certa temperatura, denominada temperatura de transição vítrea (Tg), que é variável com a composição do alimento, principalmente, com o teor de água. A textura é um dos atributos sensoriais de maior importância em alimentos e está diretamente relacionada com o seu estado físico. Durante o processamento e a armazenagem, os alimentos estão sujeitos a uma série de variações na sua composição e nas condições de temperatura e pressão do ambiente, as quais levam a alterações no seu estado físico e, consequentemente, na sua textura. O conhecimento da temperatura de transição vítrea em função da concentração de água é de extrema importância na formulação e na determinação das condições ideais de processamento e armazenagem de alimentos, de forma a manter a qualidade do produto pelo maior tempo possível. Diagramas de estado são diagramas de fase simplificados obtidos pela sobreposição da curva de transição vítrea (Tg versus concentração) ao diagrama de equilíbrio, permitindo visualizar os pontos de transição Leite et al. entre os estados sólidos amorfos de nãoequilíbrio da matéria, ou seja, os estados vítreo e gomoso. Esses diagramas são extremamente úteis no estudo das transições de fase em alimentos, pois permitem visualizar a influência das condições de umidade e temperatura do ambiente sobre o estado físico dos alimentos. Por essa razão, são ferramentas indispensáveis na determinação das condições ideais de processamento e armazenagem dos alimentos. O objetivo desse trabalho é demonstrar, através dos trabalhos científicos, a importância de se conhecer o comportamento da temperatura de transição vítrea em função da concentração de água nos alimentos. Transições de fase em alimentos Transições de fase são alterações no estado físico dos materiais que têm efeito significativo sobre as suas propriedades físicas. Existem três estados físicos básicos: sólido, líquido e gasoso. O termo transição refere-se à mudança, no estado, provocada por uma alteração de temperatura ou pressão. As transições de fase em alimentos ocorrem, geralmente, como um resultado de mudanças na composição ou na temperatura, durante as etapas de processamento ou armazenagem (Roos, 1995a). A estabilidade é uma característica extremamente desejável em alimentos. Ao adquirir um produto, o consumidor deseja que a sua qualidade seja mantida pelo maior tempo possível, tanto do ponto de vista microbiológico, quanto do sensorial. No entanto, os alimentos são formados por diversos componentes que estão sujeitos às variações de condições do ambiente e, consequentemente, a uma série de alterações que podem resultar na perda de qualidade e até na completa deterioração desses materiais. Termodinamicamente, um material estável é aquele que se encontra em equilíbrio com as condições de pressão e temperatura do ambiente, isto é, que não apresenta mudanças em seu estado físico em função do tempo. No equilíbrio, a estrutura molecular desses materiais se encontra organizada da melhor forma possível, de modo que se obtenha o menor nível de energia para o sistema. Em geral, materiais em equilíbrio são compostos puros, a uma determinada temperatura e pressão (Roos, 1995a). Alimentos são sistemas complexos, pois não são compostos puros, mas sim uma Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.7, n.1, p.83-96, 2005 Transições de fases em alimentos:Influência no processamento e na armazenagem combinação de uma grande variedade de componentes, tais como carboidratos, lipídeos, proteínas, fibras e água. De acordo com Roos (1995a), o estado físico dos alimentos, geralmente, é governado pela transição de fase dos seus principais componentes. Uma vez que a água é o principal componente e diluente, na grande maioria dos alimentos, ela deve afetar, significativamente, o estado físico e a as propriedades dos demais compostos. A maior parte dos alimentos, assim como uma grande quantidade de polímeros sintéticos, existe em um estado de não-equilíbrio amorfo, que pode ser definido como uma falta de organização das moléculas, sendo o oposto ao estado cristalino, o qual se caracteriza pelo melhor arranjo da estrutura. Esses materiais são, geralmente metaestáveis, de modo que seu estado físico e suas propriedades físicoquímicas mudam de comportamento, durante as etapas de processamento, estocagem, distribuição e consumo (Roos, 1995a; Slade & Levine, 1991). De acordo com Roos (1995a), materiais amorfos podem ser obtidos como resultado de diversos processos. Sua formação ocorre, através de uma mudança no material, a qual deve ocorrer em uma velocidade, suficientemente alta, de maneira que não haja tempo para que o produto se ajuste às mudanças que ocorreram na vizinhança e, portanto, saia do estado de não-equilíbrio para o estado de equilíbrio. Materiais amorfos podem ser formados em processos onde a temperatura é reduzida abaixo do ponto de fusão ou quando ocorre remoção de água por evaporação ou por congelamento (Slade & Levine, 1991). O resfriamento rápido de alimentos com alto teor de água, também, resulta na formação de materiais amorfos, através de uma diminuição na mobilidade molecular do material, evitando a cristalização da água. Materiais amorfos, também, são obtidos da fusão de polímeros cristalinos, podendo ser resfriados para um estado viscoelástico (gomoso) ou para um estado sólido (vítreo) (Roos, 1995). Transição vítrea Em alimentos, a mudança de fase mais importante, que é característica de materiais amorfos, é a transição vítrea, que consiste em uma transição de fase de segunda ordem de um estado sólido-vítreo para um estado semilíquido gomoso. Termodinamicamente, a transição Leite et al. 85 vítrea pode ser definida como uma pseudotransição de fase de segunda ordem, pois apresenta características típicas desse tipo de transição, como mudança na tangente de expansão do volume (a primeira derivada da energia livre), a descontinuidade do coeficiente de expansão térmica e a descontinuidade do calor específico (segunda derivada da energia livre). Ela não pode ser classificada como uma transição termodinâmica verdadeira por ser afetada pela cinética de formação da forma vítrea, como as velocidades de aquecimento ou resfriamento (Roos, 1995a). A transição vítrea ocorre através de uma faixa de temperaturas, embora seja, freqüentemente, referida a uma única temperatura. A temperatura, a uma dada umidade, à qual é atribuída essa transição é denominada temperatura de transição vítrea – Tg (Kauzmann, 1948; Sperling, 1992). Na ciência clássica de polímeros, a Tg é, freqüentemente, associada à temperatura do ponto médio (midpoint) da variação do calor específico do material (Cp), entre os estados vítreo e líquido (Wunderlich, 1990). Roos & Karel (1991e) atribuíram os valores de Tg ao ponto inicial da transição, por se tratar da temperatura em que os autores observaram rápidas mudanças na viscosidade do sistema. Os valores da temperatura de transição vítrea de compostos amorfos e alimentos são mais freqüentemente determinados pela técnica de calorimetria diferencial de varredura (CDV). Essa metodologia detecta uma mudança típica no calor específico da amostra à temperatura de transição vítrea. O valor da Tg de uma única amostra depende do seu histórico térmico, de forma que um mesmo método de análise pode fornecer diferentes valores de Tg. Geralmente, o valor considerado como a temperatura de transição vítrea é a temperatura inicial ou a temperatura média da faixa de variação de Tg (Bhandari et al., 1997; Roos, 1995b). O conhecimento da temperatura de transição vítrea é de grande importância em materiais amorfos, pois muitas propriedades físicas desses materiais podem ser relacionadas ao seu valor (Slade & Levine, 1991). Em alimentos, a Tg está diretamente ligada à alteração de textura dos materiais, que é uma das propriedades mais relevantes do ponto de vista sensorial. Quando materiais amorfos se encontram sob baixas temperaturas (estado vítreo) eles são duros e quebradiços, com características vítreas, similares às observadas em plásticos duros, lãs de vidro ou biscoitos crocantes (crisp crackers) Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.7, n.1, p.83-96, 2005 86 Transições de fases em alimentos:Influência no processamento e na armazenagem (Labuza, 2004; Sperling, 1992). Um aumento na temperatura pode causar nesses materiais uma transformação para o estado gomoso, um estado menos viscoso, à temperatura de transição vítrea (Tg). A crocância característica de alimentos no estado vítreo é altamente desejada em biscoitos, batatas fritas, cereais matinais e alimentos desidratados. Já a maciez associada ao estado gomoso é desejável em alguns produtos desidratados, como damasco e banana, e, também, em produtos industrializados, como é o caso de alguns biscoitos e recheios (Baroni, 2004; Labuza, 2004). A determinação das propriedades de estado em alimentos, em função da temperatura e da concentração de água, fornece informações valiosas no estabelecimento da formulação, processamento, embalagem e estocagem para que seja evitada a mudança de fase (vítreo-gomoso), mantendo o Leite et al. alimento na forma desejada para o consumo pelo maior tempo possível (Roos, & Karel, 1991a). A teoria da transição vítrea da ciência dos polímeros pode ajudar na compreensão das propriedades texturais de alimentos e explicar as alterações que ocorrem durante o processamento e a armazenagem, tais como a pegajosidade, o empelotamento, o amolecimento e o endurecimento (Labuza, 2004; Roos & Karel, 1991a, 1991b, 1991c, 1991d, 1991e; Slade & Levine, 1989; Sperling, 1992). Uma vez que a maior parte dos polímeros é termoplástica e sujeita a plastificação pela água, suas propriedades físicas são governadas pela temperatura e pela quantidade de água (Slade & Levine, 1991). Na Figura 1, pode-se observar um diagrama representativo da transição entre os estados vítreo e gomoso. Figura 1 – Diagrama representativo da transição entre os estados vítreo e gomosos para um material amorfo (Adaptado de Labuza et al., 2004) A partir da observação da Figura 1, percebe-se que a transição do estado vítreo para o gomoso pode ocorrer, tanto pelo aumento da temperatura, como pelo aumento na concentração do plasticizante, no caso, a concentração de água (umidade). À temperatura de transição vítrea ocorre uma mudança drástica no movimento local das cadeias de polímeros, resultando em inúmeras diferenças entre as propriedades dos estados vítreo e gomoso. Quando um alimento é submetido a um ambiente de elevada umidade relativa e temperatura constante, ele absorve água, havendo um aumento na concentração desse plasticizante. Com isso, ocorre uma redução na sua viscosidade e um consequente aumento na mobilidade molecular, dentre outras modificações. Analogamente, em um material submetido a um aumento da temperatura acima da Tg, com umidade constante, observam-se várias alterações, tais como: aumento de volume livre, decréscimo da viscosidade, aumento do calor específico e aumento da expansão térmica (Kauzmann, 1948; White & Cakebread, 1966). Dentre as transformações observadas, aquelas que mais afetam o comportamento dos alimentos estão relacionadas ao aumento exponencial da mobilidade molecular e ao decréscimo de viscosidade (Ross & Karel, 1991; Slade & Levine, 1991). Esses fatores governam uma série de transformações estruturais dependentes do tempo e, muitas Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.7, n.1, p.83-96, 2005 Transições de fases em alimentos:Influência no processamento e na armazenagem vezes, relacionadas à viscosidade, tais como: pegajosidade, colapso (perda de estrutura, escoamento sob a força da gravidade) e cristalização durante o processamento e a armazenagem. Alimentos que se encontram no estado vítreo possuem viscosidades muito elevadas, da ordem de 1012Pa, o que provoca uma imobilização das moléculas e não permite os rearranjos necessários para a formação de estruturas cristalinas. Por essa razão, supõe-se que tais materiais sejam estáveis abaixo da linha da Tg. Quando, pela absorção de água ou pelo aumento da temperatura, os materiais atingem uma viscosidade entre 106 e 108Pa, eles começam a apresentar algum tipo de escoamento (Downton et al., 1982; Roos, 1995a). Conforme um sistema passa do estado vítreo para o gomoso, sua viscosidade cai de valores da ordem de 1012 para valores da ordem de 103Pa, à temperatura de transição vítrea (Sperling, 1992). A viscosidade reduzida confere uma maior mobilidade aos reagentes e às cadeias de polímeros (Labuza et al., 2004). O aumento da mobilidade molecular melhora a difusão, resultando em uma cristalização dos componentes amorfos dependente do tempo (Bhandari et al., 1997; Labuza et al., 2004; Roos, 1995a). A cristalização, por sua vez, causa as mais drásticas variações nas propriedades físicas de polímeros alimentícios. Ela pode afetar, consideravelmente, a estabilidade dos alimentos e pode promover características de reidratação em pós, além de afetar as propriedades texturais (Kim et al., 1981; Roos & Karel, 1992; Roos et al., 1996). A porção de volume livre, definida como a parcela de espaço associada com um sistema que não é ocupada por cadeias de polímeros propriamente ditas, também oscila entre os estados vítreo e gomoso (Labuza et al. 2004). O volume livre disponível em um sistema vítreo é estimado em valores entre 2 e 11,3% do volume total e acredita-se que esse valor aumenta substancialmente à temperatura de transição vítrea, devido a um aumento dramático no coeficiente de expansão térmica (Ferry, 1980). Esse aumento no volume livre deve permitir uma difusão mais rápida dos reagentes. Baseado no volume requerido para difusão, o tamanho da molécula difusora também deve ser um fator importante na definição das taxas de difusão. A temperatura de transição vítrea da maior parte dos componentes alimentícios solúveis em água (polímeros, polissacarídeos e Leite et al. 87 proteínas) é elevada e aumenta com o aumento do peso molecular. Uma vez que esses materiais tendem a se decompor em temperaturas menores que Tg, muitas vezes o valor da Tg de polímeros alimentícios anidros não pode ser determinado. O estado físico e as propriedades fisicoquímicas dos alimentos mudam seu comportamento durante as etapas de processamento, de distribuição e de armazenagem. A remoção de água por evaporação e a desidratação por imersão/impregnação ou congelamento geralmente resultam na formação de produtos no estado amorfo (Slade & Levine, 1991). Efeito da plasticização da água sobre a transição vítrea em alimentos Não existem dúvidas de que a temperatura, a quantidade de água e o tempo são fatores que têm forte influência sobre o estado físico e a qualidade de materiais biológicos e alimentos. De acordo com Labuza et al. (2004), a partir da década de 60, as formas mais comuns de deterioração de alimentos; tais como modificações físicas e fisico-químicas, crescimento microbiológico e reações das fases lipídica e aquosa; foram tidas como resultado da disponibilidade termodinâmica de água, ou atividade de água (aw), e da quantidade total de água presente no alimento (Teor de água). De acordo com Roos et al. (1996), a estabilidade em alimentos é, significativamente, afetada pela pressão relativa de vapor d’água, que corresponde à atividade de água, aw, sob condições de equilíbrio. A diferença no potencial químico da água (µ) entre dois sistemas resulta na troca de água entre eles. Hyman & Labuza (1998) Quando uma micro-região atinge valores superiores ou inferiores ao da aw local, ocorre uma mudança de estado físico Labuza et al. (2004). As isotermas de sorção de água são curvas que mostram a relação entre a atividade de água e o teor de água do material, sob uma temperatura constante. São, portanto, ferramentas que permitem caracterizar as relações entre o teor de água de um material e a sua disponibilidade de água. Estudos de modelos para as isotermas de sorção são particularmente importantes na predição da vida de prateleira de alimentos com teor de água baixo ou intermediário (Labuza et al., 1970; Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.7, n.1, p.83-96, 2005 Transições de fases em alimentos:Influência no processamento e na armazenagem 88 Labuza, 1980; Simatos & Karel, 1988; Roos & Karel, 1996). Produtos amorfos, em geral, sofrem efeito de plasticização pela água. Nesse caso, o teor de água dos materiais tem forte influência sobre a sua temperatura de transição vítrea. A água provoca uma redução drástica na Tg de polímeros alimentícios (Slade & Levine, 1991), e mesmo a presença de traços de água pode significar reduções significativas no valor da Tg. O efeito plasticizante da água (Roos, 1995b) é típico de carboidratos com baixo peso molecular, oligossacarídeos, polissacarídeos, proteínas e polímeros plastificáveis. A plasticização pela água pode ser observada pela depressão da temperatura de transição vítrea com o aumento do conteúdo de água (umidade), melhorando a perceptibilidade da transição. A predição da depressão da Tg como resultado da plasticização pela água é útil na avaliação dos efeitos da composição dos alimentos sobre a Tg, uma vez que as alterações relacionadas à transição vítrea podem afetar o tempo de prateleira e a qualidade Roos et al. (1996). Sobral & Menegalli (2002) relatam que vários modelos explicam o fenômeno de plastificação pela água. De acordo com os autores, muitos consideram que a entrada do solvente na matriz polimérica causa um aumento na mobilidade molecular, reduzindo o valor da Tg. Roos et al. (1996) afirmam que alguns modelos de plasticização aplicados em sistemas poliméricos não são aplicáveis para a plasticização da água, pois são baseados na similaridade das propriedades dos compostos da mistura, o que é raro entre os compostos dos alimentos. O efeito da água sobre a Tg de vários alimentos tem sido predito pela equação de Gordon & Taylor (1952) citados por Zimeri & Kokini (2003) (Equação 1), a qual foi originalmente desenvolvida para descrever a dependência da Tg com a composição binária de polímeros miscíveis (Zimeri & Kokini, 2003). Tg = x1Tg1 + kx2Tg 2 x1 + kx2 (1) Leite et al. Onde xi é a fração mássica do i-ésimo componente, Tgi é a temperatura de transição vítrea do i-ésimo componente e k é uma constante de ajuste. No estudo do efeito da água sobre a Tg, x1 é a fração mássica de água e x2, a de sólido. Couchman & Karasz (1978) basearamse na teoria termodinâmica da transição vítrea de misturas de polímeros para propor um modelo de plasticização ilustrado na Equação 2. Tg = x1T g1 + (∆Cp 2 / ∆Cp1 ) x 2T g 2 x1 + (∆Cp 2 / ∆Cp1 ) x 2 (2) Na Equação (2), ∆Cpi é a mudança no calor específico do i-ésimo componente à temperatura Tgi. Comparando-se as equações (1) e (2), nota-se que a equação proposta por Couchman & Karasz (1978) é igual à de Gordon & Taylor (1952) citados por Zimeri & Kokini (2003), com k = ∆Cp2/∆Cp1. A equação de Gordon & Taylor tem se mostrado particularmente útil no ajuste de dados experimentais da Tg e da composição de açúcares amorfos (Roos, & Karel, 1991b, 1991e; Roos, 1993) e maltodextrinas (Roos, & Karel, 1991d, 1991e, além de outros ingredientes e alimentos em geral. Roos (1993) demonstrou que o uso combinado da equação de Gordon & Taylor e dos modelos das isotermas de sorção permite avaliar a estabilidade dos alimentos sob várias condições de armazenagem, baseando-se no fato de que há perda de estabilidade acima da Tg. O autor sugeriu o uso combinado dos modelos matemáticos utilizados em isotermas de sorção e da equação de Gordon-Taylor para a descrição da plasticização pela água. Os modelos podem ser ajustados aos dados experimentais e utilizados para mostrar a Tg e a isoterma de sorção em um único gráfico, como pode ser observado na Figura 2, que foi adaptada de dados experimentais de Joupilla & Roos (1994) para leite em pó desnatado. Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.7, n.1, p.83-96, 2005 Transições de fases em alimentos:Influência no processamento e na armazenagem Leite et al. 89 Figura 2 – Temperatura de transição vítrea, Tg, como uma função da atividade de água, aw, e isoterma de sorção a 24ºC leite em pó desnatado. (Adaptado de JOUPILLA & ROOS, 1994) Roos, et al. (1996) ressaltam que a relação entre Tg e aw sob uma temperatura constante fornece um método simples para predição dos efeitos da umidade relativa durante a armazenagem sobre a Tg. Tal predição é de grande utilidade na avaliação da estabilidade de vários alimentos com baixo teor de umidade, como pós, cereais, frutas desidratadas, dentre outros. Roos (1987) estabeleceu uma relação linear entre a atividade de água e a temperatura de transição vítrea. Roos & Karel (1991c) e ROOS (1993) observaram que essa linearidade se aplica a valores de aw entre 0,1 e 0,8. No entanto, para toda a faixa de aw, essa relação é sigmoidal, como pode ser observado na Figura 2. As informações contidas na Figura 2 são de grande utilidade na localização de valores críticos para a atividade de água e para a umidade, definidos como aqueles que reduzem a Tg para a temperatura ambiente (Roos, 1993; Jouppila & Roos, 1994; Roos, 1995a). Na Figura 2, por exemplo, se o leite em pó for armazenado em um ambiente com atividade de água de 0,37, ele atingirá uma umidade de 7,6g/100g de sólidos e a sua temperatura de transição vítrea será reduzida para 24ºC. Isso significa que a atividade de água crítica é de 0,37, pois o produto sofreria alterações estruturais à temperatura ambiente, reduzindo o seu tempo de prateleira. Zimeri & Kokini (2002) estudaram o efeito da umidade sobre a cristalinidade e a temperatura de transição vítrea da inulina. Foram avaliados ambientes com atividade de água variando entre 0 e 0,93. Os autores observaram que a temperatura de transição vítrea da inulina diminuiu com o aumento da umidade, confirmando o efeito plastificador da água. Roos & Karel (1991d), estudando o efeito da umidade sobre o comportamento térmico e a cristalização de alimentos amorfos, também, observaram um decréscimo na Tg com o aumento de umidade. Zimeri & Kokini (2003) estudaram o efeito da umidade sobre a transição vítrea de amido gelatinizado e também observaram o efeito plastificante. DIAGRAMAS DE ESTADO Uma fase pode ser definida como um estado fisico e quimicamente homogêneo de um material que se encontra claramente separado de outra matéria. Uma transição de fase pode ser observada de uma mudança na energia interna, no volume, no número de moles ou na massa. A mudança na fase ocorre como resultado de uma mudança na temperatura ou Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.7, n.1, p.83-96, 2005 90 Transições de fases em alimentos:Influência no processamento e na armazenagem na pressão. Um estado de equilíbrio entre fases requer que ambas estejam sob as mesmas condições de temperatura e pressão (Roos, 1995a). Quando a água interage com um soluto dissolvido ou com um material amorfo ou cristalino, a termodinâmica do sistema muda de tal forma que a energia livre da água sofre uma redução. Essa situação se manifesta, através de um decréscimo, na pressão de vapor d’água, na fase gasosa, de uma redução na linha de congelamento, em função da concentração de reagente, bem como de um aumento nos pontos de ebulição e de fusão de qualquer soluto. Essas interações representam as condições de equilíbrio termodinâmico em um ponto de concentração de água/temperatura e podem ser utilizadas para construir um diagrama de fases representativo com três linhas de equilíbrio (ponto de ebulição, ponto de congelamento ou Leite et al. formação de gelo e ponto de fusão ou cristalização do soluto) (Labuza et al., 2004). A relação entre os estados físicos, a pressão, a temperatura e o volume pode ser mostrada em diagramas de fases tridimensionais. Tais diagramas mostram superfícies que indicam valores para as variáveis de estado sob condições de equilíbrio. Nesses diagramas, é possível perceber que, na maior parte das situações de equilíbrio, duas fases coexistem, ou seja, existe um equilíbrio sólido-líquido, sólido-gás ou líquido-gás. As projeções bidimensionais dos diagramas de fase são muito úteis para aplicações práticas (Roos, 1995a). Na Figura 3, observa-se um diagrama de fase bidimensional esquemático, onde são mostradas as linhas de equilíbrio para temperatura e pressão de cada fase. Em alimentos, um dos diagramas bidimensionais de maior importância é o da água. Figura 3 – Diagrama de fase esquemático mostrando as curvas de equilíbrio entre vários estados físicos e a sua dependência da temperatura e da pressão (Adaptado de Roos, 1995a) Quando uma curva de transição vítrea de um componente sólido é inserida em um diagrama de equilíbrio apropriado, é possível visualizar os pontos de transição entre os estados sólidos amorfos de não-equilíbrio da matéria, isto é, os estados vítreo e gomoso (Labuza et al., 2004). O diagrama resultante dessa composição é chamado diagrama de estado. Roos (1995a) define os diagramas de estado como diagramas de fase simplificados que descrevem a dependência da temperatura de transição vítrea com a concentração de solutos ou alimentos sólidos e a relação entre a formação de gelo e a concentração de soluto sob baixas temperaturas. De acordo com Franks (1972), diagramas de estado são a combinação do convencional diagrama de fase com as Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.7, n.1, p.83-96, 2005 Transições de fases em alimentos:Influência no processamento e na armazenagem curvas de transição vítrea em função da composição, em uma só figura. A Figura 4 Leite et al. 91 mostra um exemplo de um diagrama de estado esquemático típico de alimentos sólidos. Figura 4 – Diagrama de estado esquemático típico de alimentos sólidos (Adaptado de Roos, 1995a) De acordo com Roos (1995a), Rasmussen & Luyet (1995) utilizaram os diagramas de fase para mostrar a dependência com a temperatura de transições térmicas em soluções congeladas e Franks et al. (1977) , citados por (Roos, 1995a)enfatizaram que o termo “estado” deveria ser utilizado no lugar de “fase” devido à natureza de não-equilíbrio do estado físico de materiais biológicos concentrados por congelamento. Em ciências dos alimentos, os diagramas de estado representam as diversas situações em que o sistema pode existir como função da temperatura, da concentração de sólidos, do tempo e da pressão. Dessa forma, ele pode ser utilizado como um mapa para a seleção das melhores condições para o processamento, o congelamento e o armazenamento refrigerado de alimentos (Slade & Levine, 1988; Slade & Levine, 1989). Os diagramas de estado são importantes ferramentas no estabelecimento das condições adequadas de processamento e armazenagem de alimentos desidratados e congelados. Eles também podem ser aplicados na definição das condições apropriadas de liofilização (Roos, 1995a). Segundo Roos & Karel (1991c), diagramas de estado são particularmente úteis na caracterização do estado físico de açúcares e na dependência das temperaturas de transição com a concentração de água. Segundo Labuza et al. (2004), os diagramas de estado podem ser utilizados para ilustrar algumas mudanças de estado físico de alimentos em função da umidade (ou concentração de plasticizante) durante quaisquer processos de remoção de água (secagem, cozimento, extrusão, evaporação) ou mesmo durante a armazenagem. O diagrama de estado define a região de umidade/temperatura na qual o domínio do alimento ou ingrediente é vítreo, gomoso, soluto cristalino, congelado, etc. Labuza et al. (2004) ressaltam que uma complicação na utilização dos diagramas de estado para alimentos reside no fato de esses não serem soluções homogêneas ou isotrópicas, apresentando-se, a nível molecular, como micro-domínios heterogêneos que nunca existirão em equilíbrio verdadeiro. Essas regiões em alimentos podem existir como líquidos com solutos dissolvidos ou como sólidos no estado sólido amorfo, que não são estados reais de equilíbrio e podem resultar em observações anômalas. Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.7, n.1, p.83-96, 2005 92 Transições de fases em alimentos:Influência no processamento e na armazenagem APLICAÇÃO DOS DIAGRAMAS DE ESTADO EM ALIMENTOS Um fato extremamente indesejável, no que diz respeito a alimentos, é modificação textural. Quem nunca teve a desagradável sensação de morder um biscoito completamente murcho? A crocância é uma característica que o consumidor espera encontrar em todos os biscoitos do tipo crisp cracker e é essencial para a sua qualidade. No entanto, quando a embalagem de biscoito é aberta e fica exposta às condições ambientes, em pouco tempo a sua textura se torna macia e ele perde a sua crocância característica. As modificações texturais sofridas por alimentos estão, diretamente, ligadas às alterações estruturais sofridas ao longo do seu tempo de prateleira. A água, devido ao seu efeito plasticizante, é um dos principais elementos responsáveis por essas alterações. Durante a armazenagem, muitos alimentos trocam umidade com o ambiente, o que resulta em alterações estruturais como a transição entre os estados vítero e gomoso. É essa a causa da perda de crocância de biscoitos tipo crisp cracker pouco tempo após a abertura da embalagem, se a mesma não for armazenada corretamente. A troca de umidade com o ambiente faz com que o alimento passe do estado vítreo para o gomoso, havendo perda de qualidade. O efeito plasticizante da água também afeta a qualidade de produtos em pó, principalmente aqueles com alta concentração de açúcares. Os processos de secagem por liofilização ou spray dryer, devido à rápida remoção de umidade, resultam em produtos no estado vítreo. Açúcares no estado amorfo são produtos altamente higroscópicos e absorvem água quando expostos a ambientes com elevada umidade relativa. Esse processo resulta em alterações estruturais, como a cristalização e o empelotamento, que resultarão em produtos com texturas indesejáveis, como a pegajosa e a granular, de acordo com as condições de temperatura e umidade do ambiente. Essas alterações estruturais são indesejáveis, pois interferem na habilidade de dissolução e no escoamento livre dos pós. Além disso, as transições de fase em pós podem ocasionar a perda de componentes voláteis ou à oxidação de Leite et al. lipídeos encapsulados (Saltmarch & Labuza, 1980; Douwnton et al., 1982; Bhandari et al., 1997; Labuza et al., 2004). De acordo com Labuza et al. (2004), atividades de água entre 0,3 e 0,4, à temperatura ambiente, são suficientes para provocar alterações estruturais como o empelotamento de pós e a perda de crocância. Labuza et al. (2004) apresentaram a importância do uso de diagramas de estado no estudo da cristalização de algodão doce, do endurecimento de biscoitos macios e no amolecimento de alimentos crocantes. A perda de textura do algodão doce está diretamente associada à cristalização do açúcar, ocasionada pela absorção de umidade. Labuza et al. (2004) concluíram que o açúcar que forma o algodão doce (sacarose) cristaliza rapidamente e perde sua estrutura quando, devido à absorção de umidade, é levado a ambientes com temperatura superior à de transição vítrea. Estudos mostraram que a adição de inibidores da cristalização, como os açúcares trehalose e rafinose, pode aumentar o tempo de prateleira desse produto. As alterações texturais sofridas por biscoitos macios (soft crackers) ou por alimentos crocantes (batatas chips, pipoca, crisp crackers), durante o processamento e a armazenagem podem ser melhor compreendidas através do estudo dos diagramas de estado. Na Figura 5 é apresentado um diagrama de estado hipotético, onde são mostradas as regiões de equilíbrio e as regiões amorfas. Na Figura 5, um material que se encontre na posição 1 estará no estado gomoso, como é o caso de uma massa para biscoitos. Labuza et al. (2004) citam o exemplo de uma massa de biscoitos sendo assada. Durante esse processo, o produto sofrerá um aumento de temperatura, seguido pela perda de umidade e posterior refriamento até a temperatura ambiente (linha pontilhada). O estado físico do material, após o resfriamento, irá depender da perda de umidade sofrida durante o processamento. Biscoitos crocantes (crisp crackers) deverão ser assados até o estado vítreo (posição 3), ao passo que biscoitos com textura mais macia, como é o caso de cookies com gotas de chocolate, deverão continuar no estado gomoso (posição 2). Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.7, n.1, p.83-96, 2005 Transições de fases em alimentos:Influência no processamento e na armazenagem Legenda: • Posição 1; Leite et al. 93 Posição 2; ∫ Posição 3 Figura 5 – Diagrama de estado hipotético mostrando as regiões de equilíbrio e as regiões amorfas (Adaptado de Labuza et al.(2004). Em alguns alimentos, é possível observar a co-existência dos estados vítreo e gomoso. Um exemplo típico Labuza et al. (2004) são os biscoitos recheados, nos quais o recheio é macio e encontra-se no estado gomoso e os biscoitos, mais crocantes, encontram-se no estado vítreo. Hyman & Labuza (1998) afirmam que, caso haja diferença entre as atividades de água dos materiais em contato, ocorrerá uma troca de umidade entre eles. O biscoito irá absorver umidade e perder crocância (deslocamento no diagrama para a esquerda), enquanto o recheio irá ficar mais duro e ressecado devido à perda de umidade (deslocamento no diagrama para a direita). De acordo com Labuza et al. (2004), biscoitos macios (soft cookies) são alimentos com uma umidade final, após assados, entre 7 e 10% e uma atividade de água entre 0,5 e 0,65. Logo que são retirados do forno, esses biscoitos são extremamente macios e apresentam alta mastigabilidade. No entanto, após cerca de 24 horas, eles se tornam secos e com textura dura e esfarelenta, sem que haja qualquer alteração na umidade. No caso desses biscoitos, o endurecimento é provocado pela cristalização da sacarose, que ocorre durante a vida de prateleira do produto. Durante a mistura e o cozimento dos biscoitos, a sacarose se dissolve e, enquanto a umidade é perdida, ela passa para o estado amorfo (posição 2, na Figura 5) e permanece nele enquanto o material se mantiver acima da temperatura de transição vítrea (1990). De acordo com o diagrama de estados, ao longo da vida de prateleira dos biscoitos, a sacarose dissolvida sofre uma cristalização, resultando em uma redução do volume de plasticizante e consequentemente, nas alterações texturais observadas. Biscoitos crocantes (crisp crackers) apresentam alterações na textura com o ganho de umidade. Katz & Labuza (1981) estudaram a textura desses biscoitos em função da atividade de água e observaram que alimentos crocantes (pipocas, biscoitos de água e sal, batatas chips) apresentaram alterações texturais quando a atividade de água excedeu a faixa de 0,35-0,50. Labuza et al. (2004) afirmam que a teoria da transição vítrea permite uma melhor compreensão das alterações texturais ocasionadas nesses produtos, devido ao aumento da umidade. Se um material amorfo existe no estado vítreo, ele é duro e quebradiço, o que, para alimentos tipo snacks à base de cereais, representa uma textura crocante ou dura. No estado amorfo gomoso, esses alimentos apresentam uma textura macia e elástica que pode ser definida como empapada e é totalmente indesejável. A transição do estado vítreo para o gomoso ocorre quando o alimento absorve umidade suficiente para que a sua temperatura de transição vítrea caia abaixo da Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.7, n.1, p.83-96, 2005 94 Transições de fases em alimentos:Influência no processamento e na armazenagem temperatura ambiente, de acordo com o diagrama de estados. Na Figura 5, a posição 3 representa o alimento no estado vítreo. O ganho de umidade, a uma temperatura constante, faria o alimento passar da posição 3 para a posição 2, se ele estivesse armazenado a uma temperatura superior à Tg, nessa umidade. Baroni (2004) ressalta a importância dos diagramas de estado para as novas formulações, uma vez que o conhecimento do comportamento dos constituintes do alimento na região de mudança de estado pode ser de grande valia na predição de estabilidade e de mudanças da textura, quando o produto é submetido a várias condições de temperatura e umidade relativa. De acordo com a autora, os diagramas de estado mostram as relações entre a composição do produto e seu estado físico, fornecendo informações fundamentais para a sua adequada formulação, de modo que se obtenha um produto final sob as melhores condições de estabilidade e qualidade. Leite et al. Chirife, J.; Iglesias, H. A. Equations for fitting water sorption isotherms of foods: Part 1. Journal of Food Technology. v. 13, n.3, p.159-174. 1978. Couchman, P. 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Dessa forma, o conhecimento da variação da temperatura de transição vítrea com a composição dos alimentos é de fundamental importância na definição da formulação dos alimentos, bem como das condições ideais de processamento e armazenagem, de modo que se obtenham produtos de qualidade. AGRADECIMENTOS Agradecemos à FAPESP, ao CNPq e à UNICAMP. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Baroni, A. F. Propriedades mecânicas, termodinâmicas e de estado de tomate submetido à desidratação osmótica e secagem. Campinas, 2004. 226f. Tese (Doutorado em Engenharia de Alimentos) – Faculdade de Engenharia de Alimentos, Universidade Estadual de Campinas. Bhandari, B. R.; Datta, N.; Howest, T. Problems associated with spray drying of sugar-rich foods. Drying Technology. New York. v.15, n.2, p.671-684. 1997. Franks, F.; Asquith, M. H.; Hammond, C. C.; Skaer, H. B.; Achlin, P. Polymeric cryoprotectants in the preservation of biological ultrastructure I. 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