781 EXMA. SRA. DRA. JUÍZA FEDERAL DA 31ª VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO DE JANEIRO Processo nº. 2010.51.01.807950-0 SANOFI-AVENTIS FARMACÊUTICA LTDA., sociedade brasileira com sede na Avenida Major Sylvio de Magalhães Padilha, 5.200, Edifício Dallas, Conjuntos 31 e 32/parte, inscrita no CNPJ/MF sob o nº. 02.685.377/0001-57, vem, por seus advogados (pugna pela juntada ulterior da procuração, CPC 37), nos autos da AÇÃO ORDINÁRIA que NOVARTIS AG move contra o INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL – INPI e a AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA – ANVISA, com fundamento nos artigos 50 a 54 do Código de Processo Civil, além dos demais dispositivos citados ao longo da presente, requerer seu ingresso no feito na qualidade de assistente litisconsorcial do Réu INPI, deduzindo, para tanto, os argumentos seguintes. I – SOBRE A REQUERENTE E FATOS QUE JUSTIFICAM SEU INGRESSO NA LIDE 1. A Requerente, SANOFI-AVENTIS, é uma tradicional empresa dedicada à fabricação e comercialização de medicamentos. Está presente no Brasil há mais de 50 anos, ocupando atualmente a posição de maior grupo farmacêutico, com 4500 colaboradores diretos, três fábricas e um portfolio de mais de 350 produtos (doc. 1). Av. Dr. Cardoso de Melo, 1955 - 7º andar, CEP 04548-005 - São Paulo, SP - Tel.: +55 (11) 3847-7777 - Fax: +55 (11) 3847-7778 Av. Presidente Antonio Carlos, 615, sala 1005, CEP 20020-010 - Rio de Janeiro, RJ - Tel.: +55 (21) 2533-5200 - Fax: +55 (21) 2533-2200 SAS Q. 6, Bl. K - sala 102, Edifício Belvedere, CEP 70070-915 - Brasília, DF - Tel.: +55 (61)3321-8383 - Fax: +55 (61) 3321-8383 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 782 2. A SANOFI-AVENTIS é, também, uma empresa dedicada à pesquisa e ao desenvolvimento de novos produtos, devotando parte considerável de seus esforços à criação de medicamentos destinados ao tratamento de um variado espectro de doenças. Justamente por este motivo, e por ter ciência da sua importância dos pontos de vista social e econômico, defende de forma irrestrita a proteção à propriedade intelectual, respeitando e fazendo respeitar direitos válidos. 3. Nesse contexto, e justamente em razão de inexistir qualquer direito de patente que impeça a exploração comercial do princípio ativo valsartana, requereu e obteve por parte da autoridade sanitária a autorização para comercialização do medicamento TAMCORE (doc. 2), que emprega justamente a referida substância como meio de tratamento da hipertensão arterial. 4. Ao ter outorgado registro do medicamento em questão, passou a Sanofi- Aventis a atender à exigência sanitária indispensável para a exploração comercial do fármaco, qual seja o registro do produto perante do Ministério da Saúde, tal qual preceitua o artigo 12 da Lei 6.360/76: Art. 12. Nenhum dos produtos de que trata esta Lei, inclusive os importados, poderá ser industrializado, exposto à venda ou entregue ao consumo antes de registrado no Ministério da Saúde. I.A) NOTIFICAÇÃO DA ORA REQUERENTE; BELIGERÂNCIA DA AUTORA: 5. Após a publicação da concessão do registro sanitário em tela pela ANVISA, que ocorreu no dia 20 de dezembro de 2010, surpreendentemente não tardou a NOVARTIS em se precipitar e iniciar a adoção de medidas ameaçadoras com a clara finalidade de criar embaraços ao início da comercialização de medicamentos com valsartana da SANOFIAVENTIS, com esteio nos supostos direitos ao qual faria jus sobre medicamentos contendo o princípio ativo valsartana. 2 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 783 6. Com efeito, no dia 27 de dezembro de 2010 uma notificação extrajudicial foi recebida pela SANOFI-AVENTIS (doc. 3), a qual teve por base a patente de número PP1100014-7, expirada em 19 de fevereiro de 2010, e cujo prazo de validade jamais foi corrigido por decisão administrativa ou judicial. Conquanto tal notificação não se refira especificamente ao pedido de patente PI9709956-2, objeto da presente demanda, seu conteúdo revela o ímpeto beligerante da NOVARTIS em relação à sanofi-aventis, no que tange a explorar comercialmente medicamentos contendo valsartana, bem sintetizado na passagem a seguir: “NOVARTIS BIOCIÊNCIAS S/A, distribuidora exclusiva do produto DIOVAN no Brasil, através de sua Diretora Jurídica, tendo em vista que V. S.as obtiveram registros de comercialização perante a ANVISA, para medicamento genérico e similar do DIOVAN, vem informar o que segue:” (...) “É importante relembrar que a mera concessão do registro de comercialização do medicamento contendo o composto ‘valsartan’ pela ANVISA, não significa que a empresa de V. S.as está autorizada a comercializar tal medicamento enquanto ainda pendente patente para o referido composto”. 7. De fato, ao promover uma ação em que ataca o ato do INPI que indeferiu o pedido de patente PI9709956-2, a NOVARTIS exibe seu claro intento de não abrir mão da intenção de buscar de alguma forma lograr exclusividade – ainda que infundada, como se demonstrará – na comercialização de medicamentos contendo valsartana no Brasil. A finalidade última do provimento judicial perseguido nestes autos é justamente obter uma patente que dê suporte a medidas como aquela que já tomou no dia 27 de dezembro de 2010, que visavam a obstar o ingresso no mercado da SANOFI-AVENTIS. 8. Trata-se, contudo, de medida temerária, na medida em que a Autora busca obter exclusividade a partir de um pedido de patente reiteradas vezes rejeitado pelo INPI, cujo objeto é sabida e notoriamente não patenteável. E como a Autora já deu sinais claros de que não hesitará em opô-lo contra qualquer terceiro que pretenda comercializar produtos contendo valsartana – lembre-se, Exa., que o mesmo foi feito em relação a uma patente cujo prazo de validade já expirou – não poderia a Requerente quedar-se inerte. 3 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 784 9. Não bastasse o animus da NOVARTIS em perseguir qualquer atividade da SANOFI-AVENTIS envolvendo a substância valsartana, ainda que fosse ela a mera obtenção de um registro de produto sem qualquer esboço de exploração comercial de sua parte, veio, mais tarde, o INPI, manifestar-se por duas vezes nestes autos, de modo a instalar a incerteza sobre o escopo de proteção de uma pretensa patente. II – INGRESSO NO FEITO NA QUALIDADE DE ASSISTENTE LITISCONSORCIAL 10. A possibilidade de assistência encontra-se regulada pelas disposições do artigo 50 do Código de Processo Civil, que fixa as condições necessárias ao ingresso de terceiro no feito sob essa modalidade: “Art. 50. Pendendo uma causa entre duas ou mais pessoas, o terceiro, que tiver interesse jurídico em que a sentença seja favorável a uma delas, poderá intervir no processo para assisti-la”. 11. Note-se que o dispositivo transcrito revela a necessidade de verdadeiro interesse jurídico na demanda, que difere substancialmente daquele meramente econômico ou moral, ainda que possam se acumular. Nesse sentido, merece destaque a doutrina especializada que conta com definição fixada por NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY 1 : “Interesse jurídico. Somente pode intervir como assistente o terceiro que tiver interesse jurídico em que uma das partes vença a ação. Há interesse jurídico do terceiro quando a relação jurídica da qual seja titular possa ser reflexamente atingida pela sentença que vier a ser proferida entre assistido e parte contrária. Não há necessidade de que o terceiro tenha, efetivamente, relação jurídica com o assistido, ainda que isto ocorra na maioria dos casos. Por exemplo, há interesse jurídico do sublocatário em ação de despejo movida contra o locatário. O interesse meramente econômico ou moral não enseja a assistência, se não vier qualificado como interesse também jurídico”. 1 In Código de processo civil comentado e legislação extravagante, 9ª Edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 232. 4 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 785 12. Por outro lado, o caput artigo 54 do CPC 2 estabelece que, nas hipóteses onde além da existência do mero interesse jurídico a sentença haja de “influir na relação jurídica” entre o terceiro interessado e o adversário daquele que se pretende assistir, caracteriza-se a assistência litisconsorcial. 13. Aplicando-se o tipo legal ao caso presente, resulta incontroverso o interesse jurídico da Requerente para integrar o feito na qualidade de assistente do Réu INPI. A procedência da presente ação, admitida apenas para argumentar, resultaria numa patente de escopo ainda indefinido, influindo decisivamente na sua capacidade/possibilidade de explorar os diretos que emanam de um registro sanitário de produto contendo valsartana. Como fixado alhures, a NOVARTIS não hesitará em opor à SANOFI-AVENTIS uma patente cujo objeto é reconhecidamente não patenteável, dado que já o insinuou fazer, mesmo sem estar diante de qualquer esboço de exploração comercial pela SANOFI-AVENTIS. 14. Mais: assumidas uma variedade de obrigações em relação aos fornecedores das matérias primas empregadas na fabricação do seu TAMCORE, a esfera jurídica da ora Requerente tem inequívoco potencial de ser atingida caso – indevidamente, data vênia – se dê guarida à pretensão da Autora. 15. No que concerne à qualificação da Requerente como assistente litisconsorcial, tampouco são necessárias grandes divagações. A sentença perseguida pela Autora fatalmente há de influir na relação jurídica entre ela e a SANOFI-AVENTIS, pois, concedida a patente que a NOVARTIS diz – inapropriadamente – merecer, o privilégio certamente será empregado como meio de obstar a produção e a comercialização do TAMCORE, já autorizada pelas autoridades sanitárias, sob a alegação de infração patentária. 2 “Art. 54. Considera-se litisconsorte da parte principal o assistente, toda vez que a sentença houve de influir na relação jurídica entre ele o adversário do assistido”. 5 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 786 16. Noutras palavras: visando a tutela pretendida à concessão de uma patente que protege forma farmacêutica de medicamento à base de valsartana, e sendo certo que, segundo a NOVARTIS, a empresa deve ter assegurado seu direito de exclusividade sobre medicamentos contendo a mesma substância, tão logo esta logre êxito em ver tutelada tal prerrogativa (o que, novamente, só se admite para argumentar) ela não hesitará em opô-la contra a ora Requerente, que, por seu turno, dispõe de sólidas razões aptas a comprovar que a tese Autoral é de todo descabida. 17. A posição, data maxima venia, vacilante do INPI nestes autos, que recentemente veio a se consolidar de modo correto, ou seja, pela negativa do provimento ao pedido autoral, agrava ainda mais o risco a que a Requerente encontra-se sujeita, exigindo, portanto, sua participação ativa na lide para a defesa de seus interesses. 18. Assim, atendidas as condições estabelecidas pelo regulamento processual civil, haverá de ser deferido o pleito da Requerente de admissão do feito na qualidade de assistente litisconsorcial do Réu INPI. III – INVIABILIDADE E IMPROCEDÊNCIA FLAGRANTE DA AÇÃO 19. Superada a questão atinente à entrada da Requerente no processo, é possível passar à demonstração de que, de fato, não há a mais remota possibilidade de conversão do pedido PI9709956-2 em patente. Isso porque: 9 Preliminarmente, a petição inicial é inepta por conter pedidos incompatíveis entre si, ou, no mínimo, juridicamente impossíveis (CPC 295, I, parágrafo único, III e IV), o que desafia seu indeferimento (CPC 267, I); 9 Do ponto de vista procedimental, é absurda a expectativa – por um breve momento estimulada pelo INPI – de estabelecimento de um verdadeiro novo procedimento de exame na esfera judicial, com a finalidade de corrigir equívocos nos quais a Autora incorreu ao longo do processamento do pedido junto à Autarquia; e 6 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 787 9 Do ponto de vista técnico-patentário, não há mesmo como entender caracterizado o requisito essencial de atividade inventiva inscrito no artigo 8º da Lei 9.279/96, como, aliás, havia constatado o INPI ao indeferir o pedido na esfera administrativa. 20. A Requerente abordará cada um destes temas separadamente, demonstrando, ao final, que o único desfecho possível para o presente processo é a total improcedência. III.A) INÉPCIA DA PETIÇÃO INCIAL: 21. É evidente a inépcia da petição inicial. 22. Se observados os rigores da possibilidade de revisão, pelo Poder Judiciário, dos atos administrativos, o que poderia ser perseguido aqui pela NOVARTIS seria a anulação do ato de indeferimento praticado pelo INPI e a concessão de sua patente PI9709956-2 com o quadro reivindicatório oferecido ao longo do seu processo de exame. Ou seja, porque as reivindicações do pedido de patente, como apresentadas e avaliadas pelo INPI, atenderiam aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial, a decisão da Autarquia teria sido equivocada e mereceria correção por este r. Juízo. 23. Justamente por isso, formula a Autora o pedido seguinte: “(...) seja julgada procedente a demanda para: (i) determinar a anulação da decisão administrativa praticada pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI que indeferiu o pedido de patente PI 9709956-2;” 24. Todavia, deixando de lado a indissociável vinculação entre aquilo que originalmente requereu e o que pretende ver protegido, pretende candidamente a NOVARTIS o descarte das reivindicações originais de seu pedido, esperando seja concedida a patente com base em outras, como se extrai dos seguintes passagens e pedido imediatamente posterior àquele transcrito acima (grifos originais): 7 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 788 “Com a decisão que terminou a fase administrativa de 28 de abril de 2009, o INPI confirmou o indeferimento de todas as reivindicações 1 a 42 do pedido de patente da Autora” “a presente demanda, a Autora visa à concessão da patente com apenas as reivindicações de 1 a 28 daquelas 42 reivindicações anteriormente pleiteadas (doc. 14). Ademais, se V. Exa., após examinar o mérito, entender ser necessário restringir as reivindicações ainda mais, a Autora não se oporá à fusão do teor da reivindicação 1 com a 2, na medida em que ainda protegerá a inclusão de uma quantidade do composto ativo VALSARTAN superior a 35% em peso (doc. 15)” (...) “(ii) determinar que o INPI defira esse pedido de patente com suas atuais reivindicações 1 a 28 (doc. 14 supra), ou, alternativamente, com suas reivindicações emendadas 1 a 27 (doc. 15 supra) indicadas na presente exordial, na medida em que todos os requisitos legais de patenteabilidade estão preenchidos;” 25. Como resultado, resulta evidente a incompatibilidade entre a anulação da decisão administrativa e o objetivo que se pretende alcançar por meio da presente ação: da anulação da decisão que indeferiu o pedido de patente não advém a simples concessão do quanto requerido quando o pedido foi depositado (e eventualmente emendado ao longo do processo administrativo), mas, sim, a prática de novo ato, baseado em outras premissas e que outorgará à Requerente outros limites, transferindo ao Judiciário aquilo que apenas ao INPI caberia. 26. E ainda que incompatibilidade não houvesse (como se possível fosse a anulação de um ato dito ilegal para que, ao invés de corrigir-se-lhe, criar-se um outro), não haveria dúvidas de que, exatamente pelas mesmas razões, o intento que a Autora pretende alcançar é impossível. Data vênia, não é dado ao Judiciário, ao anular o ato administrativo que corresponde ao indeferimento de um pedido de patente (e que se deu com base naquilo que foi requerido por sua própria titular junto ao órgão), arvorar-se nas prerrogativas e obrigações do próprio órgão patentário, revendo o pedido e sopesando o oferecimento de alternativas que ao próprio INPI não foram submetidas para que a respeito delas se manifestasse. 8 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 789 27. Assim, retomando a premissa fixada acima, por qualquer prisma que se observe é possível vislumbrar a inépcia da inicial e a conseqüente necessidade de seu indeferimento, culminando com a extinção do feito sem resolução do mérito. III.B) SUBMISSÃO DE NOVO QUADRO REIVINDICATÓRIO, AFRONTA AO ART. 32 DA LEI 9.279/96: 28. Como é possível constatar da leitura da exordial, pretende a Autora contornar o indeferimento de seu pedido de patente PI9709956-2 mediante o oferecimento de novos quadros reivindicatórios e alternativos, defendendo serem eles mais restritos do que aqueles oferecidos originalmente na fase administrativa. Senão vejamos novamente passagem essencial do documento: “Na presente demanda, a Autora visa à concessão da patente com apenas as reivindicações de 1 a 28 daquelas 42 reivindicações anteriormente pleiteadas (doc. 14). Ademais, se V. Exa., após examinar o mérito, entender ser necessário restringir as reivindicações ainda mais, a Autora não se oporá à fusão do teor da reivindicação 1 com a 2, na medida em que ainda protegerá a inclusão de uma quantidade do composto ativo VALSARTAN superior a 35% em peso” 29. Todavia, é inviável o procedimento da Autora neste particular, na medida em que o artigo 32 da Lei 9.279/96 é taxativo ao estabelecer que “para melhor esclarecer ou definir o pedido de patente, o depositante poderá efetuar alterações até o requerimento do exame, desde que estas se limitem à matéria inicialmente revelada no pedido”. 30. Ainda que se admita que alterações possam ser realizadas no pedido de patente ao longo do processo de exame, como, por exemplo, decorrência de exigências técnicas, tal possibilidade por óbvio tem como limitador o término da instância administrativa, que oportuniza a intervenção de qualquer terceiro interessado e a ulterior instauração de procedimento administrativo de nulidade. O que jamais poderá se admitir é que, encerrado o processo administrativo, seja facultado ao titular de um pedido a promoção de alterações no texto da patente no curso de uma ação judicial, contrariando a 9 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 790 sistemática criada pela Lei da Propriedade Industrial e criando enormes embaraços àqueles que, porventura, desejem contra o privilégio se insurgir. 31. Como comprovação da total ausência de razoabilidade e legitimidade no pleito autoral, basta considerar que, se exitosa sua empreitada, sua patente terá sido concedida sem que qualquer terceiro além daqueles que tomem conhecimento da presente ação e, mais ainda, que nela ingressem, tenham tido a oportunidade de apresentar qualquer objeção, como ocorreria, por exemplo, ao longo de todo o procedimento regular de exame do pedido de patente junto ao INPI. Em última análise, o pleito autoral busca tutela judicial para violar o devido processo legal, com o que o Judiciário, obviamente, não pode compactuar. III.C) INVIABILIDADE DE APRESENTAÇÃO DE NOVAS REIVINDICAÇÕES OU EMENDAS AO PEDIDO NO CURSO DA AÇÃO; 32. IMPOSSÍVEL EMENDA DA INICIAL: Na realidade, o que faz a Autora ao propor quadros reivindicatórios alternativos como meio de alcançar a patente almejada é estabelecer, como se possível fosse, uma interlocução com o INPI análoga àquela de que disporia – e de fato dispôs, falhando em demonstrar que seu pedido atendia aos requisitos da Lei – na esfera administrativa. 33. A exordial o faz, inicialmente, induzindo a Autarquia a crer na legitimidade do procedimento, tanto assim que, ao se manifestar nos autos (fls. 590/591), os seus representantes chegaram mesmo a sugerir a realização de novas alterações que, se concretizadas, poderiam caracterizar uma invenção a ser protegida. Senão vejamos: “Entretanto, a redação da reivindicação 1 (Doc15), não contempla as características da invenção que foram aceitas pelo INPI conforme trazida pela Autora na presente Ação. A própria Autora destaca no Parágrafo (160) da presente Ação que: ‘Características que diferenciam a formulação do presente pedido de patente daquelas disponíveis no mercado antes de depósito do pedido são: o tamanho pequeno alcançável da forma de dosagem (e, consequentemente, sua boa capacidade de ingestão), e a farmacocinética e biodisponibilidade favoráveis’. (Grifo nosso). 10 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 791 Conforme pode ser observado, essas características não estão presentes na Reivindicação 1 nem ao longo de todo o quadro reivindicatório apresentado pela Autora (doc. 15). Adicionalmente, vale destacar que, para alcançar o efeito técnico desejado e as características essenciais da invenção, isto é, estabilidade e pequeno tamanho da forma de dosagem, a descrição dos excipientes utilizados na formulação de tais tabletes e/ou drágeas seria importante. Entretanto, tais características (qualitativa e/ou quantitativa) também não estão contempladas na redação da reivindicação 1 (Doc15).” (destaque nosso) 34. Felizmente bem preparado o INPI, o equívoco foi corrigido por meio da petição de fls. 648/657, na qual a Autarquia, inclusive em consagração ao quanto deduzido no tópico anterior, ressalva que “ao alterar o quadro reivindicatório, a argumentação e, consequentemente, o foco da análise técnica apresentados na seara administrativa, a autora está claramente pretendendo utilizar a via judicial como um segundo recurso administrativo, ou seja, não obtendo êxito na linha adotada administrativamente, parte para outra estratégia em juízo, fazendo com que o INPI tenha de realizar uma nova análise técnica, com base em novos elementos, agora em sede judicial”. E, completando, afirma que “obviamente tal não é possível, pois a depositante perdeu a oportunidade de fazer tais alegações no processamento administrativo, não podendo, agora, faze-las no âmbito judicial”. 35. Todavia, em função das posições contraditórias exaradas nos autos pelo INPI no processo, é importante que se ressalve: não apenas por pretender ilicitamente conferir à ação judicial aparência de processo administrativo, mas também por caracterizar emenda impossível da petição inicial, contrariando o artigo 294 do Código de Processo Civil, não há como se admitir que a Autora promova no curso da ação alterações em seu pedido de patente a fim de contornar os limites que lhe impõem suas contrapartes. 36. Explica-se: ao propor a demanda em apreço, o Autor delimitou seu alcance e objeto ao requerer fosse deferida pelo INPI a patente PI9709926-2 “com suas atuais reivindicações 1 a 28 (doc. 14 supra), ou, alternativamente, com suas reivindicações emendadas 1 a 27 (doc. 15 supra) indicadas na presente exordial, na medida em que todos os requisitos legais de patenteabilidade estão preenchidos”. O pedido, então, é certo, e 11 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 792 engloba a concessão da patente especificamente com o quadro reivindicatório proposto na inicial. 37. Logo, admitir que o Autor atenda a “sugestão” inicial do INPI (posteriormente revogada pela manifestação subseqüente) e emende aquelas reivindicações no curso do processo, seria o mesmo que permitir o aditamento extemporâneo de seu pedido, o que se afigura impossível neste ponto, conquanto já foram citados os Réus, um dos quais, inclusive, já tendo contestado a ação. Repita-se: a afronta ao artigo 294 do CPC, que é claro ao autorizar o aditamento apenas “antes da citação”, seria inequívoca. III.D) MANIFESTA FALTA DE ATIVIDADE INVENTIVA NO OBJETO DO PEDIDO DE PATENTE PI9709956-2: 38. Na esfera puramente técnica, melhor sorte não assiste à Autora. Não há em seu pedido de patente qualquer atividade inventiva. 39. Em primeiro lugar, o pedido de patente da NOVARTIS não apresenta nenhuma solução técnica patenteável, eis que não é crível que tenha havido sequer um problema técnico a ser resolvido. A única menção efetivada no pedido de patente PI 9709956-2 é a de que, por meio do processo de granulação a seco do valsartana, seria possível obter-se um “equilíbrio incomum” entre tamanho reduzido e elevada concentração de princípio ativo. 40. Curiosamente, o tamanho do comprimido originado do processo de granulação a seco do valsartana não é, nem de longe, um elemento sólido a embasar o deferimento do pedido de patente, uma vez que o tamanho dos comprimidos é igual ou insignificantemente distinto independentemente do processo de granulação escolhido (a úmido ou a seco). Apenas o tamanho de cápsulas poderia eventualmente ser comparado ao tamanho dos comprimidos nesse quesito, como a própria NOVARTIS o faz. Mas, em relação ao estado da técnica, existem outros exemplos de comprimidos de valsartana (e até mesmo outros medicamentos da família “sartanas”, como a ibersartana) com tamanho 12 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 793 reduzido. Assim sendo, onde estaria o problema técnico a ser resolvido? Levando-se em consideração que o processo de granulação para a obtenção de comprimidos de pequeno tamanho contendo valsartana é amplamente conhecido no estado da técnica, o processo de granulação a seco não propicia qualquer solução que justifique a concessão de patente. 41. Vale frisar que o próprio INPI já consignou que a simples substituição de um processo conhecido por outro processo conhecido de granulação de substâncias farmacêuticas não merece qualquer proteção patentária. 42. No caso sub judice não há a descrição de nenhuma melhoria real ao produto ou ao processo. Ora, os componentes descritos no pedido de patente são bem conhecidos, assim como a sua utilização nas proporções mencionadas no pedido de patente. Em resumo: nenhuma solução técnica inventiva ou inovadora é indicada no pedido de patente, o que evidentemente obsta qualquer possibilidade de seu deferimento pelo INPI. 43. Outro ponto que merece destaque, Excelência, é o fato de existir pedido internacional de patente formulado pela SANOFI-AVENTIS (WO 97/34597 – doc. 4) que consiste de prova cabal de que tanto a granulação a seco quanto a granulação a úmido podem ser utilizadas na preparação de comprimidos com valsartana, conforme se lê claramente na página 12, linhas 8-10 do referido documento: “Pour la préparation d’une composition pharmaceutique orale, on peut par exemple mèlanger le principe actif avec les excipients ou véhicules pharmaceutiques sélectionnés puis proceder à une granulation à l’ètat séc ou humide” “Para a preparação de uma composição farmacêutica oral, pode ser por exemplo misturado o princípio ativo com os excipientes ou veículos farmaceuticamente aceitáveis selecionados e então proceder uma granulação e seco ou a úmido.” (tradução livre) 44. E conforme se lê claramente na página 16, linhas 27-30 do referido documento: 13 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 794 “l’inhibiteur de l´angiotensine II parmi l’irbésartan, le losartan, le candesartan, le vlsartan, le zolasartan, le telminsartan, l’éprosartan, ces composés étant administres à dses doses thèrapeutiquement actives choisis entre 1 et 200mh/jour “Inibidor da angiotensina II, como irbesartana, losartana, candersartana, valsartana, zolasartana, telminsartana, eprosartana, esses componentes sendo administrados a doses terapeuticamente ativas dentro da faixa de 1-200 mg/dia.” (tradução livre). 45. Esse ponto é de extremo relevo, Excelência, na medida em que rechaça qualquer alegação de existência de problema técnico a ser resolvido pelo pedido de patente da NOVARTIS. Explica-se. 46. Nesse pedido internacional de patente da SANOFI-AVENTIS consta claramente que composições contendo valsartana podem ser granuladas a seco ou a úmido. Mais ainda, esse pedido de patente é anterior ao pedido da NOVARTIS, comprovando cabalmente: (i) Que antes do depósito de prioridade do pedido de patente da NOVARTIS a SANOFI-AVENTIS já detinha o conhecimento de que ambos os processos de granulação poderiam ser utilizados para a fabricação de comprimidos contendo valsartana em alta concentração; e (ii) Inexistir qualquer problema técnico a ser resolvido pelo pedido de patente da NOVARTIS. 47. Mas não é tudo. 48. A pedido da ora Requerente foi conduzida análise a respeito do objeto do pedido de patente PI9709956-2 pelo Prof. Dr. CARLOS ALBERTO MANSSOUR FRAGA, farmacêutico e professor adjunto da UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO (doc. 5), que atestou, como bem defende o INPI, ser a granulação a seco e úmida intercambiáveis no caso de valsartana (e, portanto, óbvia a escolha por uma ou por outra): 14 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 795 "CONCLUSÃO Inexiste problema técnico a ser resolvido no pedido de patente brasileiro PI 9709956-2, uma vez que no caso do Valsartan tanto a granulação a seco quanto a úmido podem ser utilizadas. Não é indicada qualquer solução técnica inventiva ou inovadora, pois o processo de granulação de valsartan descrito no pedido de patente brasileiro PI 9709956-2 não traz qualquer dado que demonstre melhoria real ao produto ou ao processo em relação ao que se conhecia amplamente na técnica anterior, tampouco traz resultados surpreendentes ao técnico no assunto. Ainda que se considerasse que há solução a algum problema, os meios revelados no pedido de patente não poderiam ser considerados inventivos. A mera substituição de granulação por via úmida por granulação a seco não implica em adaptações complexas ou inesperadas pelos técnicos no assunto. Embora a maioria dos processos de granulação seja feita pela via úmida, o uso de outros processos, como o de granulação a seco, é comum e natural aos técnicos no assunto, especialmente quando tais processos são amplamente conhecidos e disponíveis. Portanto, concluímos que o pedido de patente brasileiro PI 9709956-2 não descreve na sua lista de reivindicações matérias que representem atividade inventiva no âmbito das formulações de dosagem oral de valsartan empregando método de granulação pela via seca”. 49. Além disso, tampouco podem ser tratados como inventivos os passos, aspectos ou parâmetros que norteiam a transição ou adaptação de um processo de granulação de valsartana de úmido para seco e vice-versa. 50. Assim, muito diferentemente do que diz a NOVARTIS, é inviável a alegação de que há demonstração de que seu pedido atende ao requisito de atividade inventiva. Pelo contrário, tanto as alegações desenvolvidas pela Requerente quanto as robustas evidências técnicas por ela colacionadas dão conta justamente do contrário, revelando a total impossibilidade de se agasalhar a expectativa da Autora. 15 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 796 IV – CONCLUSÃO E PEDIDOS 51. Em face do exposto pugna a Requerente: (i) Em observância ao quanto disposto no art. 51 do Código de Processo Civil, sejam intimadas as partes para, querendo, manifestarem-se sobre o presente pedido de assistência litisconsorcial fundado no art. 54 do CPC, deferindo-o ao final V. Exa.; (ii) Subsidiariamente, caso entenda V. Exa. não estarem presentes os requisitos necessários ao ingresso da Requerente do feito na qualidade de assistente litisconsorcial, o que se cogita ad argumentandum, pugna pelo deferimento da sua integração ao processo ao menos na qualidade de assistente simples, na forma do art. 50 do mesmo diploma legal, por restar mais do que caracterizado ao menos o manifesto interesse jurídico da SANOFI-AVENTIS na improcedência da ação. 52. Em qualquer das hipóteses, tanto com esteio no que dos autos já consta e daquilo que ainda os integrarão, roga seja julgada: (i) Extinta, sem resolução do mérito, a ação, com base no artigo 267, I c/c 295, I e parágrafo único, III ou IV do Código de Processo Civil; ou, subsidiariamente; (ii) Totalmente improcedente a presente ação, mantendo-se íntegra a decisão que indeferiu o pedido de patente PI9709956-2. 16 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19 797 53. Por derradeiro, reitera o pedido de juntada, em quinze dias, do instrumento procuratório, bem como da necessária tradução juramentada do documento nº. 4 colacionado à presente peça. Termos em que, P. deferimento. Rio de Janeiro, 23 de fevereiro de 2011. PEDRO SERGIO FIALDINI FILHO ALEXANDRE EINSFELD OAB/SP 137.599 OAB/RJ 114.584 17 Protocolada por ALEXANDRE EINSFELD em 23/02/2011 13:19