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Na medida, porém, em que me fui
tornando íntimo do meu mundo, em que melhor
o percebia e o entendia na “leitura” que dele ia
fazendo, os meus temores iam diminuindo.
Mas, é importante dizer, a “leitura” do
meu mundo, que me foi sempre fundamental, não
fez de mim um menino antecipado em homem,
um racionalista de calças curtas. A curiosidade
do menino não iria distorcer-se pelo simples fato
de ser exercida, no que fui mais ajudado do que
desajudado por meus pais. E foi com eles, precisamente, em certo momento dessa rica experiência de
compreensão do meu mundo imediato, sem que tal
compreensão tivesse significado malquerenças ao
que ele tinha de encantadoramente misterioso, que
eu comecei a ser introduzido na leitura da palavra. A decifração da palavra fluía naturalmente
da “leitura” do mundo particular. Não era algo
que se estivesse dando superpostamente a ele. Fui
alfabetizado no chão do quintal de minha casa,
à sombra das mangueiras, com palavras do meu
mundo e não do mundo maior dos meus pais. O
chão foi o meu quadro negro; gravetos, o meu giz.
(Paulo Freire)
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n
a
na formação de um leitor?
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arece um passe de mágica o momento em que, de repente, as crianças começam a
ler. As letras passeiam em suas vidas até finalmente serem apropriadas por elas
e tomarem significado. Todo esse fascinante processo inicia-se pelo domínio
da criança da escrita do próprio nome, daí parte-se para a decodificação de frases e,
rapidamente, elas estão lendo tudo.
O processo de aquisição da leitura parece algo bem simples descrito assim. E seria
se parasse por aí. O segundo passo para a formação de um leitor de fato proficiente
centra-se na fundamental questão: “ler o quê?”. A preocupação com a leitura vai além da
alfabetização. Não é suficiente entender o sistema de escrita, é necessário também que a
criança se aproprie dos diferentes usos e formas lingüísticas do idioma materno.
Tornar a criança uma leitora proficiente é um processo que se faz gradativamente e acontece
numa parceria entre família e escola. Desde muito pequena, mesmo quando a criança ainda não
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formula hipóteses sobre a escrita, já podemos considerá-la uma leitora em formação. E isso se dá
na convivência e na rotina do dia-a-dia, quando ela compartilha com pessoas queridas diferentes
experiências, emoções e pensamentos despertados após o ato de leitura de um romance, um manual
de instruções, um anúncio publicitário etc.
Tudo pode ser contexto de leitura. A criança acorda e vê o pai lendo o jornal, chega à escola e a professora conta uma história de um livro, depois os alunos discutem uma notícia interessante que saiu numa
revista. Então, eles registram uma coisa e outra, consultam um livro de culinária e vão estabelecendo
contato com inúmeros portadores de texto. No fim do dia, a criança vê a mãe apanhar o último livro
de Fernando Bonassi e deitar-se para fazer sua derradeira leitura antes de chegar o sono.
Dessa forma, certamente, essa criança vai entender (se já não entendeu) que a leitura é um
ato humano essencial e que pode ter vários objetivos: informar, divertir, emocionar, relembrar... O
contato com o universo letrado começa quando a criança nasce e está associado a tudo o que ela
vive desde então, afinal o ato de decodificar o significado das palavras é o ato de ler o mundo.
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“Pra mim, livro é vida; desde que eu era muito pequeno
os livros me deram casa e comida.
Foi assim: eu brincava de construtor, livro era tijolo;
em pé, fazia parede; deitado, fazia degrau de escada;
inclinado, encostava num outro e fazia telhado.
E quando a casinha ficava pronta eu me espremia
lá dentro para brincar de morar em livro.
De casa em casa eu fui descobrindo o mundo (de tanto
olhar para paredes). Primeiro, olhando desenhos; depois,
decifrando palavras.
Achava-me empoleirado no balcão, abrindo caixas e
pacotes, examinando as miudezas da prateleira. Meu pai,
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de bom humor, apontava-me objetos singulares e explicava
o préstimo deles.
Demorei a atenção nuns cadernos de capa enfeitada por
três faixas verticais, borrões, nódoas cobertas de riscos
semelhantes aos dos jornais e dos livros. Tive a
idéia infeliz de abrir um desses folhetos, percorri
as páginas amarelas, de papel ordinário. Meu
pai tentou avivar-me a curiosidade valorizando com energia as linhas mal impressas,
falhadas, antipáticas. Afirmou que as pessoas familiarizadas com elas dispunham de
armas terríveis. Isto me pareceu absurdo: os
traços insignificantes não tinham feição perigosa de armas. Ouvi os louvores, incrédulo.
Aí meu pai me perguntou se eu não desejava
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inteirar-me daquelas maravilhas, tornar-me
um sujeito sabido como padre João Inácio e
o advogado Bento Américo. Respondi que
não. Padre João Inácio me fazia medo e
o advogado Bento Américo, notável na
opinião do júri, residia longe da vila e
não me interessava. Meu pai insistiu em
considerar esses dois homens como padrões e
relacionou-os com as cartilhas da prateleira.
Largou pela segunda vez a interrogação pérfida.
Não me sentia propenso a adivinhar os sinais pretos
do papel amarelo?
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Foi assim que se exprimiu o Tentador, humanizado,
naquela manhã funesta. A consulta me surpreendeu. Em
geral não perguntava se qualquer coisa era do meu agrado:
havia obrigações, e tinha de submeter-me. A liberdade que
me ofereciam de repente, o direito de optar, insinuou-me
a vaga desconfiança. Que estaria para acontecer? Mas
a pergunta risonha levou-me a adotar procedimento
oposto à minha tendência. Receei mostrar-me descortês e obtuso, recair na sujeição habitual. Deixeime persuadir, sem nenhum entusiasmo, esperando
que os garranchos do papel me dessem as qualidades
necessárias para livrar-me de pequenos deveres e
pequenos castigos. Decidi-me.
(Graciliano Ramos)
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Analu G. Del Picchia Suringar
Bruna P. de Assunção Cardoso,
Ilze Capucci e Paula G. Von Glehn Strano
são professoras do Infantil 5.
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Qual a importância da família na formação de um leitor?