Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Texto Apresentado ao Departamento de Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo – EPM, para Concurso de Livre Docência em Oftalmologia São Paulo 2003 Schor, Paulo Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa 77pp; 29,7 x 21 cm Tese (Livre Docência em Oftalmologia) Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina 1. Córnea – Cirurgia. 2.Instrumentação NLMC – WW200 Este Trabalho apresenta um conjunto de realizações, iniciadas em 1992 e ainda não finalizadas. Durante o processo de amadurecimento e produção, os Setores de Córnea e Doenças Externas Oculares, o Laboratório de Microbiologia, o Setor de Cirurgia Refrativa, o Setor de Refração e Lentes de Contato, o Setor de Ultra-som e o Setor de Bioengenharia Ocular do Departamento de Oftalmologia da UNIFESP, foram envolvidos Além do Departamento de Oftalmologia, o Núcleo de Propriedade Intelectual da UNIFESP, o Grupo de Ótica da Universidade de Sâo Paulo – São Carlos, a Opto Eletrônica e a Eyetec tiveram participação fundamental no avanço desta Linha de Pesquisa Também participaram o Schepens Eye Research Institute ligado a Harvard Medical School, Massachussets Institute of Technology e Cornea Consultant of Boston. O autor apresenta interesse comercial em alguns desenvolvimentos protegidos por Patentes apresentados nesse estudo AOS MEUS AVÓS Agradecimentos • À Ana e Marina, por darem sentido a vida • A meu pai e a minha mãe, pelo que eu sou • A todos os Pesquisadores, Estagiários, Estudantes e Pós-graduandos do setor de Bioengenharia Ocular da UNIFESP pela dedicação e entendimento de como ser criativo, objetivo e produtivo • Aos meus pós-graduandos • Ao sempre presente Rubinho • Ao setor de Cirurgia Refrativa da UNIFESP nas pessoas do querido Walton Nosé, Wallace Chamon e Mauro Campos • À Maria Regina Chalita, Mirko Jankov e Marco Cesar Helena, pela superação, adaptação e brilhantismo • Aos meus irmãos e cunhados, Patricia, Breno, Jan Michiel e Valéria pelo amor emitido e absorvido • Ao amigo de todas as horas Wallace Chamon • Ao amigo de todos os humores Edson Mori • À Norma e Helena, pela inteligência e paciência com todos nós • Ao Luis Alberto e Jarbas Castro pela transparência, lealdade e honestidade, além da inigualável inteligência produtiva • Ao tio Nestor e tio Daniel, por nos ensinarem que a estrada deve ser curtida • À Iara Martins, Regina e Solange, pela proteção e eficiência • A todos que fazem da Visus uma grande clínica Resumo Schor, P. Óptica fisiológica e cirurgia refrativa. São Paulo, 2003. 77pp. Tese (Livre Docência) – Departamento de Oftalmologia, Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina A córnea foi o primeiro e mais bem sucedido exemplo de estudo multidisciplinar na Oftalmologia. Seus aspectos ópticos, anatômicos, fisiológicos, patológicos, clínicos e cirúrgicos foram interligados por mentes brilhantes como Isaac Newton, Hermann von Helmhotz e José Inácio Barraquer. As propriedades de reflexão, refração e difração aplicados ao dioptro mais eficiente do sistema ocular humano são um dos alicerces da chamada Optica Fisiológica, que trata das consequências visuais da Óptica Geométrica. Entre nós sobressaem-se estudiosos capazes de manter a evolução tecnológica e criar ferramentas e raciocícios que dão vida a esse amplo campo da ciência. Tratamos nesse estudo de aspectos ligados à formação da imagem do ponto de vista óptico, iniciando pela descrição do sistema visual; um sistema muito copiado e pouco entendido e passando pela interface ar-lágrima, que torna-se sinônimo da própria córnea. O crescimento ocular e seus mecanismos de controle são discutidos como agentes da gênese de ametropias, bem como a forma corneana. Alterações nessa forma, fenômenos ópticos, e uma ampla discussão sobre o poder corneano são apresentados. Tanto a face anterior, como a recentemente compreendida face posterior são discutidas e os pontos de referência do sistema visual são determinados e avaliados. O ápice da córnea, pupila de entrada, linha de visão e eixo pupilar tem sua importância detalhada, bem como a pupila e o cristalino. Os princípios da avaliação de distorções ópticas, denominadas aberrações, são delineados e os tratamentos atualmente disponíveis, como óculos, lentes de contato e cirurgia fotorrefrativa apresentados. Uma discussão abrangente sobre o princípio dos aparelhos de aberrometria e seus sensores precede a explicação matemática da expressão de seus resultados, e resulta na aplicação fisiológica e nos prejuizos visuais das aberrações. O estudo termina com um debate sobre o presente e o futuro das correções fotorrefrativas personalizadas e com a opinião, sempre presente, do autor, sobre o papel da Universidade e da crítica na evolução tecnológica moderna. Summary Schor, P. Physiological optics and refractive surgery. São Paulo, 2003. 77pp. Thesys (Post Doctorate) – Departament of Ophthalmology, Federal University of São Paulo – Paulista School of Medicine The cornea was the first and most succeeded example of interdisciplinary studies in Ophthalmology. Its optics, anatomy, physiology, pathology, clinics and surgery have been linked by brilliant minds as of Isaac Newton, Hermann von Helmhotz and José Inácio Barraquer. Reflection, refraction and diffraction applied to the most efficient diopter of the human optical system are the basis for what we know as Physiological Optics, that translates Geometric Optics to the sense of vision. Among us are many researchers capable of keep pace with the technology evolution and create rational and solutions that maintains alive this broad science field. In this study we present optical aspects of image formation, starting by a visual system description, a system copied but not fully understood, following by the airtears interface, almost the synonym of the cornea itself. Ocular growth mechanism and controls are discussed as part of the ametropia genesis, besides the cornea shape itself. Abnormal shapes and its optical consequences follows a discussion regarding corneal power. Both anterior and posterior corneal surface are debated and its reference points determined. Corneal apex, entrance pupil, line of vision and pupilary axis are detailed as the pupil and the crystalline lens. Optics distortion (aberrations) evaluation principles are summarized and its treatments, as eyeglasses, contact lenses and photorrefractive surgery presented. A comprehensive discussion on the aberrometry principles and its sensors precedes a mathematics explanation on its output and ends in the physiological implication of aberrations. In its last part a debate on the present and future of customized photorrefractive correction, having the always present author opinion is given, emphasizing the role of the University and the critics analysis on the modern technology evolution. Prefácio O estudo e compreensão das bases dos fenômenos biológicos pemite a evolução e desenvolvimento de novas tecnologias. Esta é a filosofia do setor de Bioengenharia Ocular da UNIFESP, criado em agosto de 1996. Originado a partir de um instrumento capaz de concretizar idéias até então internalizadas em cada mente, a caneta, foi sob a inspiração do Dr. David Miller, e do impulso constante do Prof. Rubens Belfort Jr. que este frutificou. O presente estudo transmite a profundidade e abrangência da linha de pesquisa de seu fundador, e fundamentalmente sua incapacidade de permanecer sereno frente as transformações sociais e tecnológicas atuais. A manutenção desse espírito investigativo e aberto a novas percepções atraiu médicos, físicos, biólogos, engenheiros, tecnólogos, advogados, programadores e matemáticos ao setor de Bioengenharia. O domínio da linguagem inter-disciplinar tem sido a arma para a fertilização cruzada que amplia a capacidade de ação do oftalmologista. Esperamos expandir ainda mais as atividades, com registro de programas, patenteamento de produtos, comercialização de métodos, construção de protótipos e teste de aparelhos, sempre tendo uma sólida base teórica a suportar nossos impulsos. SUMÁRIO DESCRIÇÃO DO SISTEMA VISUAL 1 INTERFACE AR-LÁGRIMA 5 O CRESCIMENTO OCULAR 7 FORMA DA CÓRNEA 11 ASTIGMATISMO E CERATOCONE 14 DETERMINAÇÃO DO PODER CORNEANO 17 FACE ANTERIOR E ÍNDICE TEÓRICO 18 FACE POSTERIOR E ESPESSURA 20 O ÁPICE DA CÓRNEA 21 O CENTRO DA PUPILA DE ENTRADA 23 EIXO ÓPTICO E EIXO VISUAL 25 OS ÂNGULOS DA VISÃO 26 O TAMANHO DA PUPILA 27 O TERCEIRO ELEMENTO: CRISTALINO 29 AVALIAÇÃO DO SISTEMA VISUAL COMO UM TODO 31 AMETROPIAS E COMPRIMENTO AXIAL 33 TRATAMENTO DAS ABERRAÇÕES DE BAIXA ORDEM 36 ÓCULOS, LENTES DE CONTATO RÍGIDAS E GELATINOSAS 36 EXCIMER LASER 39 SENSORES E APARELHOS DE ABERROMETRIA 46 PRINCÍPIO DOS SENSORES 49 CARACTERÍSTICA DOS SENSORES TSCHERNING HARTMANN-SHACK MISTOS TRACEY, OPD SCAN CASTRO 51 51 52 54 54 54 CÁLCULO MATEMÁTICO DAS ABERRAÇÕES USANDO POLINÔMIOS DE ZERNIKE 56 CARACTERIZAÇÃO FISIOLÓGICA DAS ABERRAÇÕES 67 ABERRAÇÃO ESFÉRICA E O TAMANHO DA PUPILA 68 COMA E DESCENTRALIZAÇÕES 71 PREJUÍZO VISUAL DAS ABERRAÇÕES 73 CORREÇÃO CORNEANA GUIADA POR ABERROMETRIA 75 BIBLIOGRAFIA 79 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Descrição do Sistema Visual Em 1965, Gordon Moore observou que a eficiência dos circuitos integrados tendia a crescer a uma taxa regular com o passar do tempo. Àquela época o número de transistores em um circuito integrado duplicava a cada 18 meses 1. Tal tendência ganhou a denominação de lei de Moore, e tem sido aplicada até os dias de hoje. O debate de até quando tal “lei” será cumprida é extenso e apresenta a tendência atual de ser substituído por questionamentos mais profundos acerca do uso e integração do poder tecnológico com o ambiente humano em que vivemos. Em 1997 o supercomputador Deep Blue ultrapassou o campeão mundial de xadrez Garry Kasparov, ainda sem realizar o mesmo número de operações matemáticas que o cérebro humano. Em 2020 o poder de cálculo de um supercomputador deverá ser equivalente ao cérebro humano ao custo de 1000 dólares 2. A “façanha” porém só será alcançada se forem gastos aproximadamente quatro milhões de dólares para esfriar os processadores do futuro em cada um dos centros de processamento de dados. No final da década, um microprocessador do tamanho de um selo, deverá gerar a mesma temperatura que um foguete espacial 3. Tal discussão futurista ganha espaço em nosso meio e passa a fazer parte de nossas preocupações cotidianas porque a fronteira silício-carbono está sendo cada vez mais estudada e entendida. Essa é a nova fronteira do conhecimento e barreira real para a evolução humana 4. Estamos em um estágio onde uma fonte de luz monocromática, unidirecional, coerente e colimada pode atravessar uma área extensa de nossa córnea, sofrer correção das imperfeições geradas pela mesma e pelo cristalino, e atingir um minúsculo ponto da fovéola retiniana, sem distorções de cores ou forma. Os instrumentos espaciais conseguem utilizar todo o potencial óptico dessa imagem quase perfeita e montar representações nunca conseguidas do micro e macrocosmo. Os aparelhos médicos permitem obter os detalhes de cada dióptro ocular, montar mapas de irregularidades quase instantâneos, e transmitir tais informações a um aparelho de ablação tecidual acoplado opticamente ao olho real, de modo a corrigir todas as aberrações visuais e formar imagens extremamente nítidas na retina dos seres humanos. Descrição do Sistema Visual - Página 1 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Porém pouco entendemos da fronteira retiniana. Iniciamos a descrição do préprocessamento retiniano e do processamento cerebral, e ainda não conseguimos modulá-lo nem imitá-lo em aplicações laboratoriais. Nos valemos, isso sim, de sua imensa maleabilidade, que permite a correção de borramentos ópticos e a percepção de formas em imagens borradas. Antes de passarem de várias décadas, pouco conseguiremos fazer com imagens tão nítidas como as entendidas como 20/10. A supervisão é a constatação de nossa cegueira em relação ao processamento neuronal. Numa ciência milenar como a óptica, que remonta aos tempos de Ibn al Haitan na Mesopotâmia, os avanços em direção a essa fronteira são incríveis. A física teórica e aplicada deixou preparado o alicerce para a evolução científica. Equipamentos, teorias e experimentos pareciam estar à espera de processamentos mais evoluídos que permitissem o maior poder de manipulação de dados. A computação ocupou um local imprevisto há séculos, e possibilitou aplicações tão diversas como a manipulação do código genético ou a cirurgia corneana personalizada a laser. O sistema visual humano ainda se assemelha a uma máquina fotográfica, ou melhor, as máquinas fotográficas ainda se assemelham a nosso sistema visual. A cópia e adaptação de nosso sistema formador de imagem é secular, e os princípios de refração e diafragmas bloqueadores da difração também. Pequenos avanços com grande resultados mantiveram sua derivação a partir do invento original, como as lentes anesféricas. Tais lentes possibilitaram magnificações importantes e a ampliação da visão do cosmos, e em menor escala, a melhoria dos nossos exames propedêuticos, com lentes anesféricas de observação da retina humana. A descrição moderna da nossa visão, porém é complexa, pois mesmo antes da luz atingir a retina e iniciar o processo pouco conhecido do “enxergar”, entendemos que o trajeto luminoso não é mais retilíneo e uniforme, compreendido a partir de instrumentos que detectam pontos isolados e montam o caminho da luz desde a fonte luminosa até a retina. Adicionamos pontos de referência, áreas de mensuração, elementos complexos de refração e bloqueios dinâmicos. Temos de entender conceitos de aberrometria para definir limites ópticos. Começamos pelos instrumentos que nos possibilitaram o entendimento da forma da superfície anterior da córnea, os ceratômetros 5. Passamos para os ceratômetros Descrição do Sistema Visual - Página 2 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor de área, ou Videoceratômetros Computadorizados, também conhecidos como Topógrafos Corneanos 6 (Ilustração 1). Ilustração 1. Evolução temporal dos instrumentos capazes de medir a superfície anterior da córnea. Dos discos de Plácido aos ceratômetros clínicos e cirúrgicos, e novamente aos discos de Plácido Adicionamos instrumentos capazes de fornecer indícios da espessura e forma da superfície posterior da córnea, como os mapas de varredura em fenda, comercialmente disponibilizados no aparelho denominado Orbscan (Ilustração 2); e a forma do cristalino, como o sistema Scheimpflug (Ilustração 3). Ilustração 2. Mapa teórico da superfície posterior de uma córnea normal, representando a elevação em relação a uma esfera de referência, obtido pelo método de análise de fendas ópticas e do aparelho Orbscan Descrição do Sistema Visual - Página 3 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 3. Fotografias obtidas a partir do princípio de Scheimflug, de um cristalino normal in-vivo. A direita aparelho comercialmente disponível, à esquerda fotografia experimental Também nos aperfeiçoamos na determinação dos índices de refração dos diferentes meios oculares, e hoje conseguimos analisar in vivo a forma da retina 7, e de seu ponto mais importante, a mácula (Ilustração 4). Ilustração 4. Corte anatômico das camadas da retina humana in-vivo, na região da mácula, obtidas a partir da tomografia de coerência óptica, ou OCT Finalmente, conseguimos aplicar um conceito da óptica espacial aos olhos humanos, e estendemos a compreensão da refração ocular para centenas de pontos dentro da chamada pupila de entrada, montando mapas de aberrações de todo o sistema óptico (Ilustração 5). Descrição do Sistema Visual - Página 4 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 5. Mapa Clinico de aberrações oculares de um olho humano obtido a partir de um sensor de Hartmann-Shack comercialmente disponível Devemos utilizar todos esses conceitos para determinar e aprofundar nossos conhecimentos em relação à moderna óptica fisiológica, desde o entendimento da fisiologia, até o desenvolvimento de modernos sistemas de avaliação dinâmica do aparelho visual humano. Interface ar-lágrima O olho humano possui fundamentalmente três formas de borramento, a difração, a dispersão e a aberração. A difração ocorre quando um feixe de luz ou frente de onda encontra um obstáculo, uma abertura ou outra irregularidade no meio; sendo dependente do tamanho da abertura, e resulta em uma mudança na direção da luz ou da onda. Quando a luz atinge um obstáculo, ela desvia em direção ao mesmo, Interface ar-lágrima - Página 5 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor como se fosse desacelerada (Ilustração 6). Tal evento tem sentido no olho humano quando observamos pupilas pequenas (menores de 1mm). Na prática diária porém, a difração é pouco importante e é amplamente compensada pelo poderosíssimo processamento retiniano e cerebral. A dispersão é importante em condições patológicas, como nos edemas de córnea e de cristalino 8. Nessas situações o distanciamento entre as fibras de colágeno dessas estruturas aumenta, e a água, com índice de refração distinto, determina mais um dióptro que a luz retilínea tem de atravessar. A física teórica nos diz que a luz não sofrerá desvio se a distância entre dioptros com índices de refração distintos for menor que o comprimento de onda da luz incidente. Tal postulado permite inferir que caso o distanciamento entre as lamelas corneanas ou cristalinianas seja menor que o comprimento da luz visível (aproximadamente 600 nanômetros) a luz não sofrerá desvios, mas sim, será anulada lateralmente pela interferência destrutiva das ondulações adjacentes, e seguirá em linha reta. O postulado é diretamente observado na prática clínica, onde notamos estruturas edemaciadas como dioptros nebulosos, ou borrados. Tais dioptros dispersam as partículas de luz incidente, que perde a composição espacial e torna-se desfocalizado. Algumas partículas de luz (fótons) mantêm seu trajeto e formam a imagem originalmente composta na retina, porém com menos luminosidade. O restante da massa luminosa irá interferir com a imagem composta, diminuindo seu contraste e conseqüentemente sua nitidez 9. Ilustração 6. Ilustração de uma frente de onda percorrendo um meio homogêneo e encontrando um obstáculo com um orifício central. Note-se a deflexão da onda (difração) em direção ao centro da abertura e sua periferia, a partir das bordas do orifício Interface ar-lágrima - Página 6 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor As aberrações são, porém, o fenômeno que tem maior conseqüência clínica. Tratase de um comportamento que necessita de meios com diferentes índices de refração, e quanto maior tal diferença, maior a refração, ou desvio dos raios ou frentes de onda da normal, plano perpendicular ao dióptro em questão. No olho humano a maior fonte de aberração é a interface entre o ar e a porção lipídica do filme lacrimal. Em tal situação, a luz que vinha percorrendo um meio com índice de refração de 1,000, passa a percorrer um meio com índice de refração de 1,376. Tal passagem, considerando o perfil convexo da superfície, freia a luz e permite sua aproximação da normal, causando sua convergência em direção à mácula. Após essa primeira refração, a luz passa por centenas de micro-desvios, conseqüentes à variação de índice de refração nas microestruturas intra-corneanas, como lípideágua, água-muco, muco-epitélio, epitélio-camada basal, etc, etc, até atingir as células endoteliais e adentrar o humor aquoso, que tem um índice medido de refração de 1,336. Nessa condição a luz sofre ligeiro desvio voltando a se aproximar da normal, afastando-se da mácula. O cristalino, porém não somente determina a aproximação final da luz até a mácula, como controla com precisão o exato local de focalização da mesma, utilizando seu mecanismo de acomodação. Digamos que a aproximação inicial e grosseira da luz (promovida pela córnea) se compara ao vôo de uma aeronave a 10,000 metros de altura, dirigindo-se para o nordeste do Brasil, e a aproximação final (cristaliniana) trata da aterrisagem na pista três, Sul, do aeroporto Internacional dos Guararapes em Recife. O Crescimento Ocular É impressionante o mecanismo natural e evolutivo que permitiu um sistema com tamanha perfeição e ajustes finos, e mais eloqüente ainda são os meios pelos quais o homem, durante seu crescimento, adquire e mantém o melhor local de focalização de uma imagem. Trata-se do controle genético do crescimento ocular, determinado por uma série de genes, proteínas e estímulos que fazem com que o olho cresça continuamente até o foco da imagem. Desse modo as crianças nascem como olhos pequenos e cristalino com alto poder de acomodação, ou de abaulamento. Tal propriedade permite que o foco seja “arrastado” até a retina e que as crianças enxerguem com nitidez, mesmo sendo hipermétropes. Pelos mecanismos genéticos, há a percepção de que a luz incidente na retina quando o O Crescimento Ocular - Página 7 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor cristalino está relaxado (não abaulado) não está focalizada, e a sinalização para que haja formação de colágeno escleral e alongamento do olho 10 . Tal alongamento cessa quando o foco da luz paralela proveniente do cristalino em repouso coincide com a retina, ou seja, quando o olho se tornou emétrope (sem vício refracional). Curiosamente, se as crianças nascem com olhos muito grandes, ou miopia patológica (Ilustração 7), não há sinalização para a parada do crescimento, e geralmente esses olhos continuam crescendo e tendo cada vez mais miopia. O mesmo acontece em primatas que são privados do estímulo luminoso 11 . Obviamente tal mecanismo é teórico, e outros estímulos ambientais e genéticos contribuem para a população de amétropes no planeta. Ilustração 7. Ilustração esquemática de um olho emétrope, em relação ao olho com alta miopia, e um olho hipermétrope. Note-se que a retina mantém-se no mesmo plano nos três casos, demonstrando que o poder de convergência da córnea deve ser o mesmo, e somente o comprimento axial determina a ametropia em questão Como vemos, não somente a manutenção, mas o processo de obtenção de uma imagem nítida é complexo e determinado não somente pelos meios de refração dos dioptros, mas por sua forma relativa. O Crescimento Ocular - Página 8 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Existem importantes e conhecidas evidências de transmissão genética da miopia. As miopias baixas e moderadas seguem padrão de transmissão multifatorial com provavelmente mais de um gene envolvido, enquanto as altas miopias têm em geral um comportamento autossômico dominante, com expressividade variável quanto à intensidade (grau da miopia) e penetrância incompleta. O esforço acomodativo crônico é considerado como uma das possíveis causas da miopia. O aumento da incidência de míopes em escolares e em pessoas que trabalham muito com visão para perto, já foi documentado, e uma das explicações para este fato seria que o aumento do poder refrativo do cristalino as custas do músculo ciliar poderia influenciar no aparecimento e desenvolvimento da miopia. A acomodação aumentaria a pressão longitudinal na cavidade vítrea, por aumento do volume do cristalino, promovendo o alongamento ocular gradativo, com conseqüente miopização. No entanto, esta observação, não se firmou epidemiologicamente como uma relação causa-efeito, mas indica uma associação entre atividades que requeiram esforço acomodativo (visão para perto) e miopia. A esclera tem como função criar uma proteção para os componentes internos do olho e ao mesmo tempo opor-se às forças de expansão geradas pela pressão intraocular. A esclera humana é uma camada fibrosa, com colágeno representando 50 a 75% de seu peso seco. O colágeno tipo I é mais comum (90-95%) na estrutura da esclera, enquanto o colágeno tipo III pode ser encontrado em pequena quantidade. Estudos in vitro, sugerem um aumento na proliferação de condrócitos e síntese de matriz extracelular em olhos privados de luz. Essa síntese de fibras colágenas diferenciadas (diâmetro menor), resultaria em afinamento e diminuição da resistência escleral, principalmente no pólo posterior, explicando o aumento no comprimento axial desses olhos. Alguns autores sugerem que o uso de substâncias como a 7metilxantina (um metabólito da cafeína), promove um aumento na concentração e na espessura das fibras colágenas da região posterior da esclera de coelhos e que tais substâncias poderiam ser analisadas quanto a uma possível prevenção no aumento do comprimento axial. Também se observou a indução de miopia em casos onde o efeito da acomodação visual foi anulado por lesão do núcleo de Edinger-Westphal ou por secção da inervação ocular aferente e eferente ou ainda em animais que não possuem sistema de acomodação. Tais fatos reforçam a hipótese de o crescimento ocular e a O Crescimento Ocular - Página 9 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor progressão da miopia não estarem associados à inervação eferente (estímulo cortical) ou aferente (estímulo acomodativo), mas sim a estímulos bioquímicos locais, que se iniciariam na retina e atuariam na esclera. Há evidências de que a regulação do ciclo circadiano – claro/escuro, com interferência de receptores de dopamina, presentes nas células amácrinas da retina, poderiam atuar nesse sentido. Recentemente foi estudado o papel da melanopsina nesse processo. Tal substância controla grande parte do ciclo circadiano na presença do olho de camundongos, mesmo sem função visual. A retirada de olhos sem função visual deve então ser repensada? 12 Alguns autores propuseram que a administração de cicloplégicos (parassimpatolíticos) como a atropina, poderia diminuir a progressão da miopia. Sugeriu-se que a acomodação poderia ser um fator determinante do aparecimento da miopia tanto em olhos humanos como em animais. No entanto, a diminuição da progressão da miopia com a administração de atropina foi também observada em olhos de galináceos (que possuem musculatura intra-ocular estriada, com receptores colinérgicos predominantemente nicotínicos) e, portanto não influenciados pela atropina (um antagonista colinérgico muscarínico). Ou seja, em galináceos a administração de atropina promoveu um menor aumento do crescimento ocular e menor miopia, provavelmente por um mecanismo não relacionado à acomodação, uma vez que a mesma não provoca cicloplegia ou dilatação da pupila nestes animais. Criou-se, então a hipótese de que a atropina atuaria de uma forma nãoacomodativa, na prevenção do aumento do comprimento axial do olho. Em estudos com primatas e outros mamíferos, a atropina invariavelmente provoca bloqueio da acomodação, através de seu efeito sobre receptores muscarínicos do músculo ciliar, ficando difícil distinguir se a diminuição da progressão da miopia deveu-se a um fator acomodativo ou não 10. A atropina é um antagonista colinérgico muscarínico que se liga a todos os cinco receptores muscarínicos conhecidos (M1, M2, M3, M4 e M5). Sabe-se que os receptores M1 são normalmente encontrados em células neurais, como por exemplo, em camadas da retina, enquanto que receptores M3 são encontrados em músculos lisos (por exemplo, músculo ciliar). A pirenzepina é um antagonista muscarínico, específico M1. Estudos in vitro utilizando olhos de mamíferos envolvendo pirenzepina, demonstraram sua eficácia em diminuir o crescimento O Crescimento Ocular - Página 10 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor escleral (medido através da diminuição da síntese de glicosaminoglicanos e DNA). Sabe-se que na retina, as células amácrinas possuem receptores muscarínicos M1 sendo a acetilcolina um dos seus neurotransmissores. Os receptores muscarínicos M1 também são encontrados na coróide e epitélio pigmentar da retina. A pirenzepina poderia intervir no crescimento ocular bloqueando estes receptores localizados no globo ocular. A presença de receptores muscarínicos em camadas celulares de processamento da imagem retiniana (células amácrinas) explicaria a indução de miopia por privação de estímulo adequado mesmo em olhos com nervos ópticos secionados. Vários estudos clínicos prospectivos aleatórios sugerem que a administração de atropina 1x/dia retarda a progressão da miopia (não progressão de até 0,50 dioptria ao ano). A concentração 0,5% provou ser mais eficaz do que as concentrações 0,1% e 0,25%. Os efeitos colaterais imediatos (fotofobia) e relacionados ao uso crônico (maior exposição à radiação UV, podendo levar a alterações maculares e indução de catarata, perda prematura da acomodação, além de efeitos sistêmicos) e a falta de seguimento quanto à própria progressão da miopia em longo prazo, causam ainda bastante controvérsia no seu uso clínico. O uso de beta-bloqueadores poderia atuar na prevenção da progressão da miopia, através da diminuição da pressão ocular. No entanto nem estudos em animais, nem estudos clínicos aleatórios demonstram tal relação de forma significativa até o momento. Forma da Córnea Por ser a base para a camada lipídica do filme lacrimal, o arcabouço corneano tem a forma determinante para a maior parte da refração ocular. Apesar do conhecimento da forma convexa da Córnea existir desde 1600, bem como a noção de que a luz deveria atravessar a mesma de modo a ser focalizada dentro do olho, a aplicação desse conceito e a construção de lentes corretivas somente foi documentada mais tarde. As lentes parecem ter sido descobertas por artesãos venezianos que cortavam garrafas de vidro, e ao olhar para objetos próximos através das mesmas, notaram sua magnificação e descobriram o “tratamento” da presbiopia. A partir dessas lentes esféricas foram se desenvolvendo lentes astigmáticas, espelhos convexos, etc 13. Forma da Córnea - Página 11 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor A observação do reflexo de objetos simétricos e de tamanho conhecido, aliado a conceitos de trigonometria, permitiu cálculos relativamente precisos da curvatura anterior da córnea. Como seqüência natural desses desenvolvimentos tivemos o aparecimento de ceratômetros qualitativos manuais, ceratômetros quantitativos manuais e automatizados 13 , e ceratômetros qualitativos e quantitativos automatizados. Os últimos permanecem como instrumentos padrão para a determinação da forma da córnea, e estão em constante evolução, com incorporação de funcionalidades e módulos adicionais desde sua concepção. A córnea já havia sido dividida por ocasião da adaptação de lentes de contato corneanas em apical, limbal e transicional 14 . Tal subdivisão interessa a contactologia, pois cada região deverá sofrer a pressão correspondente a uma adaptação individual (Ilustração 8). Determinou-se que a melhor adaptação, ou seja, a condição de maior tolerância objetiva e subjetiva, seria a de um toque paracentral, livramento apical e alta mobilidade. Ilustração 8. Esquema das curvaturas centrais, paracentrais e periféricas de uma lente de contato rígida Como até esse evento os instrumentos responsáveis pela determinação do poder corneano mediam quatro pontos em aproximadamente 2,5 mm centrais da córnea, foi introduzido um conceito de Topogometria, onde o mesmo instrumento (Ceratômetro tipo Javal ou Baush and Lomb) media diferentes regiões da córnea alternadamente, na dependência da direção do olhar. Esses mapas de área se Forma da Córnea - Página 12 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor limitavam a dezenas de pontos e eram trabalhosos, pois obtidos de modo manual (Ilustração 9). Ilustração 9. Topogômetro clínico utilizado para medir a curvatura corneana em diversos pontos de sua superfície Em 1957 15 foi novamente utilizado o conceito de regularidade dos discos de Plácido, e vários anéis iluminados foram apresentados à córnea, que promovia sua reflexão. Posteriormente tais figuras regulares ou irregulares eram fotografadas e analisadas manualmente. Na década de 1970 a tecnologia digital permitiu a análise automatizada da forma destes discos refletidos 13 , e mais tarde a captura, determinação de bordas e cálculo de distâncias foram totalmente incorporados nos Topógrafos Corneanos. Hoje em dia toda a área de reflexão dos anéis pode ser analisada, com precisão de aproximadamente 0,50D e reprodutibilidade clinicamente significante. A intensiva cooperação entre o Grupo de Óptica da USP-São Carlos e o setor de Bioengenharia Ocular da UNIFESP permitiu nosso posicionamento, sempre na vanguarda dos desenvolvimentos e inovações nesse campo. Citamos o desenvolvimento praticamente em paralelo do Ceratômetro Cirúrgico Quantitativo 13 e dos princípios computacionais com construção do primeiro, e ainda único Topógrafo Corneano Nacional 16, ambos de 1998. Também é importante mencionar o Topógrafo Intraoperatório 17, 18, e o atual desenvolvimento de Redes Neurais e Programas de Diagnóstico Automatizado de Alterações Corneanas 19. Forma da Córnea - Página 13 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor O último desenvolvimento está em registro no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), concretizando a produção intelectual em nossa área de atuação. Astigmatismo e Ceratocone A forma da córnea fisiológica se divide em anesférica com asfericidade positiva e negativa, com ou sem astigmatismo; e irregular, ou sem padrão definido. A asfericidade se refere ao aplanamento ou aumento de curvatura da córnea desde seu ápice até sua periferia, e tem o valor aproximado de 0,25 D/mm. Córneas mais anesféricas que isso podem apresentar ectasias localizadas, como as submetidas a procedimentos foto-refrativos para a correção da hipermetropias, ou as pertencentes a indivíduos portadores de ceratocone central. A definição clássica de ceratocone 20 trata de uma doença genética, ectásica, que cursa com afinamento estromal, quebras na camada de Bowman e eventual progressão para hidropsia aguda. Existem descrições de tipos bizarros de ectasias, que devem fazer parte da mesma manifestação sindrômica 21, e certamente levam a uma visão distorcida. Os astigmatismos coabitam com a asfericidade, e determinam meridianos mais curvos ou mais planos de uma mesma córnea. Raros são os casos de uma ausência completa de astigmatismo, e o tipo mais freqüente de alteração é chamada de astigmatismo a favor da regra, com 70% dos indivíduos afetados 22. Nestes casos os meridianos verticais são mais curvos que os horizontais, provavelmente devido à pressão constante das pálpebras sobre a Córnea. Astigmatismos opostos aos descritos são catalogados como contra a regra, e os intermediários são chamados oblíquos. A definição de regularidade e simetria pressupõe o ápice da córnea como divisor entre os dois semi-meridianos mais curvos da córnea. Córneas com astigmatismos regulares apresentam continuidade entre os dois semi-meridianos, e córneas com astigmatismos simétricos apresentam uma imagem em espelho da porção superior em relação à inferior (Ilustração 10). Astigmatismo e Ceratocone - Página 14 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 10. Exemplos de mapas de superfície anterior da córnea com astigmatismo irregular (a) e astigmatismo assimétrico (b) Nos casos onde não há regularidade ou simetria de padrões, chamamos os astigmatismos de irregulares, ou sem padrão definido. Os mapas topográficos têm certa diversidade, e a familiaridade com padrões de cores gerados a partir de uma escala determinada permite um diagnóstico relativamente constante (reprodutível e confiável) dos examinadores. Atualmente temos uma dificuldade grande na determinação de bons candidatos à cirurgia refrativa. Não somente do ponto de vista de expectativa do paciente, mas também do ponto de vista clínico e mais especificamente topográfico. Sabemos que se tais pacientes forem submetidos a ceratotomia radial, provavelmente terão maus resultados refracionais 23 . Também sabemos que aproximadamente 5% dos pacientes que procuram os serviços de cirurgia refrativa tem suspeita de ceratocone. Tal fato talvez se explique exatamente pela visão distorcida com o uso de correção convencional (óculos ou lentes de contato gelatinosas), e conseqüente procura da cirurgia como alternativa para a distorção. Finalmente sabemos que os pacientes com astigmatismos irregulares leves, que não são classificados como ceratocone (Ilustração 11), quando submetidos a cirurgia refrativa a laser, quer seja PRK ou LASIK, perdem ao menos uma linha de melhor visão corrigida, quando comparados com pares normais 24. Astigmatismo e Ceratocone - Página 15 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 11. Mapas da superfície anterior da córnea de pacientes submetidos a cirurgia refrativa a laser (LASIK e PRK), que tiveram maior perda de linhas de visão quando comparados a pares com topografias normais Pelas graves conseqüências da cirurgia em casos de diagnóstico duvidoso, esforços estão sendo empreendidos no sentido de melhorar as ferramentas computadorizadas para a identificação precoce e correta dessa patologia. Redes neurais foram testadas e permitiram diferenciar topografias normais de ceratocones clássicos 19. Vamos ver adiante que hoje em dia a categoria dos astigmatismos irregulares está sendo caracterizada com base em outros atributos que descrevem planos tridimensionais específicos, chamados de polinômios de Zernique. A evolução natural da refratometria clínica caminha no sentido de denominar de desvio da normalidade, ou aberração, qualquer alteração de forma. Tal enfoque também é utilizado em Topografia Corneana 25 , e adiciona detalhes e características identificáveis aos clássicos astigmatismos, asfericidades, etc.. Astigmatismo e Ceratocone - Página 16 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Determinação do Poder Corneano Para se calcular o poder refrativo real da córnea é preciso considerar que este sistema é composto de duas superfícies ópticas (faces anterior e posterior) separadas por uma distância entre elas (espessura) e de três meios ópticos (ar, córnea e humor aquoso) cada um com um índice de refração diferente. A limitação técnica de medir a superfície posterior da córnea sempre dificultou a confirmação do valor conhecido como K, ou poder real da córnea. A ceratometria (manual ou computadorizada) e a topografia convencional com discos de Plácido, só conseguem medir o poder óptico da superfície anterior da córnea. Chamamos o índice derivado de todos os dioptros corneanos, que considera a córnea como uma lente fina, de índice de refração teórico padrão, ou IRC. O IRC anula a face posterior da córnea, assumindo que a mesma diminui em cerca de 10% o poder da face anterior. Portanto, para uma mudança de 0,50D no poder total, a modificação da face posterior deveria ser de aproximadamente 5,00D. A videoceratografia combinada com a varredura de fenda de luz permitiu uma avaliação mais completa e precisa de todo o sistema óptico da córnea. Dependendo do índice de refração usado ou da porção analisada da córnea, diversos mapas de poder são obtidos no analisador de fendas de luz ou Orbscan, como os mapas ceratométricos, anterior, posterior, total e de espessura. Para os mapas de poder ceratométricos, o aparelho Orbscan-II utiliza automaticamente o índice de refração teórico padrão (IRC) de 1,337. Para os mapas de poder total, anterior e posterior da Córnea, utiliza-se a variação fisiológica dos índices reais de refração do ar (1,000), da Córnea (1,376) e do humor aquoso (1,336). O mapa de poder da espessura (thickness power map) representa a contribuição, no poder refrativo total da córnea, da espessura da córnea no ponto de medida. Os mapas de poder médio (mean power maps) representam o equivalente esférico, isto é, a média aritmética da convergência, em dioptria, de cada ponto das superfícies, anterior ou posterior, da córnea, em todas as posições (meridianos). O mapa de poder total médio é a soma dos mapas de poder médio anterior, posterior e da espessura. Determinação do Poder Corneano - Página 17 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Apesar da precisão desta tecnologia ter sido verificada, sua confiabilidade tem sido questionada. Uma observação realizada por nosso grupo dá conta de que valores distintos são obtidos a partir da análise de diferentes áreas 26. O Orbscan-II tem nos permitido demonstrar que os valores indicados pelos mapas de poder ceratométrico são sempre maiores (entre +0,75 e +2,00 D com quase +1,50 D em média), que os encontrados nos mapas de poder total. Esta diferença foi estatisticamente significante. Isto é, o poder da córnea, quando assumido a partir da medição da superfície anterior usando o IRC, é superior àquele calculado com base em todos seus componentes ópticos (superfícies anterior e posterior, espessura e índices de refração fisiológicos). Os diversos mapas de poder ceratométrico, e em especial o axial ceratométrico, que é o mapa mais popular, são úteis para fins comparativos com os dados fornecidos pela ceratometria manual, computadorizada ou pela topografia com disco de Plácido 27. A capacidade do Orbscan II de analisar a região central da córnea parece ter sido pouco pesquisada de modo sistemático e pode ser um passo importante no cálculo do poder das lentes intra-oculares (LIOs), mormente após cirurgias ceratorrefrativas. Enquanto a ceratometria manual mede uma área paracentral única, a topografia convencional por discos de Plácido infere o centro da córnea, sem medí-lo, a partir de anéis paracentrais. Sem a limitação inerente aos ceratômetros citados, as fendas de luz permitem obter medidas da elevação das superfícies da córnea e, portanto, do seu poder (expresso como a média de todos os pontos), em áreas centrais. A análise de uma área interpolada de dois milímetros, pelo mapa de poder total médio ou de uma área de quatro milímetros, pelo mapa de poder total óptico, parece ser o mais próximo a valores significantes do ponto de vista clínico 26. Face Anterior e Índice Teórico Como visto, somente recentemente houve a possibilidade do cálculo do poder corneano com o auxílio das fendas de luz. Quando mencionamos que a forma da córnea já era conhecida e logo após, que sua determinação seria relacionada com seu poder de vergência, assim como o poder de lentes, omitimos que, para tais cálculos, eram utilizados modelos de olhos, ou os olhos esquemáticos. Face Anterior e Índice Teórico - Página 18 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Existem vários modelos propostos, dentre os quais o de Gullstrand 28 (Ilustração 12), e em todos eles parte-se de uma superfície de curvatura anterior pré-determinada, de um comprimento axial conhecido e limitado até o cristalino a após o mesmo, e de uma lente ocular (cristalino) também conhecida. A partir dessas referências é possível calcular os pontos próximos de cada lente envolvida e montar diagramas de raios (ray tracing) capazes de explicar fenômenos ópticos oculares. Ilustração 12. Modelo do olho esquemático de Gullstrand, mostrando as dimensões relativas de cada dioptro e sua distância relativa Um dos fenômenos passíveis de explicação é exatamente o poder corneano, que, se medido para os olhos esquemáticos, deve corresponder a aproximadamente 43,00 D das 58,00 D totais de refração ocular 28 . Portanto mais uma lente convergente deve se interpor entre o foco e a retina, de modo a trazer o mesmo para o plano da retina. Como tal lente está mergulhada em um meio de índice de refração similar ao da água, e a própria lente tem um índice de refração não muito Face Anterior e Índice Teórico - Página 19 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor diferente de 1,336, devemos dar enorme importância à forma dessa lente para tornála clinicamente significante. Por tal razão o cristalino tem um poder no interior do olho de aproximadamente 19,00 D, e se fosse medido fora do olho teria um poder de quase 100,00 D. Todas as superfícies referidas até aqui foram tratadas como sendo lentes delgadas, apesar de termos visto que sua espessura e forma são fundamentais para seu efeito. Ao tratarmos a córnea como uma lente delgada, reduzimos suas características a curvatura e índice de refração, e seu índice de refração teórico é, portanto de 1,337. Vale a pena enfatizar novamente que tal índice é fictício, e não leva em conta a espessura nem a curvatura posterior da córnea para ser obtido e aplicado, mas somente a face anterior. Face Posterior e Espessura Já citamos que a tecnologia que nos permite analisar a face posterior da córnea leva a denominação de Orbscan. Assumimos clinicamente que sua precisão e reprodutibilidade são suficientes em córneas sadias e não operadas. Também assumimos com certo consenso , que as córneas opacas são mal interpretadas por esse exame, e que as córneas submetidas a cirurgias ceratorrefrativas, devem ser analisadas com cautela 29. Tais limitações parecem estar relacionadas ao reconhecimento da interface opaca como interface final, e determinação de espessuras menores em situações patológicas 30 . Vale lembrar que o Orbscan constrói seus mapas com base em 40 fendas ópticas que se movem, e aproximadamente 4000 pontos, tendo de interpolar medidas entre os pontos, e que se houver uma variação brusca de espessura em um ponto, sendo esta artificial ou real, todo o mapa daquela região irá sofrer, pois não temos notícia de haver um limitador de variância de espessura nestes aparelhos. De qualquer modo, pelo menos em córneas normais, as fendas nos permitem inferir valores de curvatura posterior e de espessura, e o próprio aparelho realiza as operações matemáticas que devem resultar em áreas de poder refrativo. Como em inúmeros desenvolvimentos tecnológicos, temos no Orbscan um significante montante de segredos de fábrica. Um deles é a determinação do mapa Face Posterior e Espessura - Página 20 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor de elevação anterior. Na versão I do aparelho, não havia acoplamento de discos de Plácido, e a elevação da superfície anterior era baseada exclusivamente na porção anterior da fenda óptica. Aparentemente tal determinação não é tão precisa quanto a análise, já consagrada, dos anéis de Plácido, e por isso mesmo a companhia optou por adicioná-los na versão II. Exatamente quais e quantos dados são utilizados de cada princípio são segredos de fábrica do aparelho, que impossibilitam o entendimento matemático dos resultados isolados, ou seja, o mapa de elevação anterior parece “contaminado” com o mapa de curvatura axial, e o mapa de elevação posterior é reflexo somente da porção posterior da fenda óptica. Resultante desse raciocínio julgamos pouco pertinente tratar a elevação anterior e posterior da mesma forma, uma vez que cada uma delas oferece um conjunto de dados obtido de modos diversos. Há, porém um meio de fazer a comparação mais próxima, que é a utilização da paquimetria. A paquimetria derivada do Orbscan utiliza somente as fendas ópticas, assim como um paquímetro óptico. Nesse princípio o algoritmo de identificação localiza a porção anterior e posterior da fenda no mesmo local, e subtraindo seus valores absolutos chega a um resultado relativo, sem interferência de discos de Plácido ou outros artefatos, como esferas de referência teórica. Concluímos então que a paquimetria em córneas normais deve fornecer dados fidedignos de espessura, e permitir sua utilização para o entendimento de patologias que cursem com afinamentos corneanos. Também estamos sugerindo que os mapas de elevação teóricos não devam ser avaliados sem críticas, sendo ainda objeto de estudos e comparações com situações consideradas padrão em nossa prática diária. O Ápice da Córnea Por estarmos tratando de instrumentos capazes de fornecer dados sobre uma estrutura transparente e de pequenas dimensões, como a córnea, devemos diferenciar os dados fornecidos pelos aparelhos e suas limitações, dos dados anatômicos e da óptica fisiológica que desejaríamos obter. Um dos pontos de referência mais importantes para os aparelhos ópticos como os Topógrafos é o ápice da córnea. Determinamos como o ápice da córnea, a porção O Ápice da Córnea - Página 21 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor mais próxima dos discos de Plácido, quase nunca coincidente com a região do centro geométrico da córnea. Pelo arranjo cônico dos anéis, o ápice da córnea é freqüentemente determinado no primeiro anel de leitura, ou seja, o anel mais próximo fisicamente da córnea; ou no ponto de fixação. Tal arranjo cônico é fundamental para a melhor localização das irregularidades corneanas, caso contrário haveria necessidade de uma grande compensação para a distância de cada anel em relação a porções anatômicas da córnea. O ápice é, portanto uma referência anatômica, que por motivos técnicos é utilizado pelos Topógrafos Corneanos como o ponto de partida para a construção de mapas ceratométricos. Quando dizemos que se deve retirar importância do ápice como região fisiologicamente determinante, enfatizamos a inexistência de uma relação entre a otimização ou prejuízo do aproveitamento luminoso em relação ao ápice da córnea, e principalmente em relação ao seu centro geométrico. Em outra leitura poderiamos dizer que o ápice corneano é uma necessidade técnica e o centro geométrico uma referência anatômica, que utilizamos quando por exemplo, desejamos manter uma eqüidistância relativa das bordas de um enxerto de córnea, em relação à margem da córnea receptora. Isso, pois é fato que se houver pequena distância entre a interface do enxerto e os vasos do limbo, há maior chance de rejeição do mesmo. Tais considerações já foram objeto de discussão quando das cirurgias incisionais corneanas, onde havia marcação do erroneamente denominado “centro óptico”, e determinação da colocação de incisões a partir do mesmo. Em um clássico artigo de 1987 31 tal discussão pareceu encerrada, com a constatação da inutilidade óptica do então chamado centro óptico, e conseqüente substituição pelo centro da pupila de entrada (Ilustração 13). O Ápice da Córnea - Página 22 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 13. Diagrama da localização dos pontos de referência óptica na córnea. Note-se a não coincidência dos quatro pontos demarcados. O reflexo corneano, dependente somente da curvatura da córnea, geralmente se localiza nasalmente O Centro da Pupila de Entrada A Pupila de entrada é a imagem que temos da pupila, ou do orifício iriano através da córnea. Ela é maior aproximadamente 0,5 mm que a pupila real (a que podemos tocar quando de uma cirurgia a céu aberto, como o transplante de córnea) e se encontra em um plano mais anteriorizado que a pupila real. É essa estrutura que deve nortear a óptica fisiológica, e tem papel central em nossa discussão (Ilustração 14). Ilustração 14. Diagrama da pupila de entrada e da pupila natural, demonstrando que a primeira encontra-se aparentemente maior e mais anteriorizada em relação à segunda O Centro da Pupila de Entrada - Página 23 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Alguns motivos que devem ser levados em consideração para tamanha importância dessa estrutura incluem a natural barreira que a mesma impõe à passagem de luz, bloqueando fisicamente os raios corneanos paracentrais e atuando como um diafragma óptico dinâmico. Tal fato tem sido a justificativa de toda a centralização dos procedimentos refrativos corneanos estar sendo realizada com base na pupila de entrada. Outro argumento inclui o direcionamento retiniano dos cones em relação a essa estrutura, também denominado de fenômeno de Stiles-Crawford. Tal fato chama atenção para a otimização ocular do pincel luminoso que tem em seu centro o chamado raio chefe, ou o raio de luz que passa pelo centro da pupila de entrada. Tal pincel carrega consigo o maior volume luminoso, e tem a potencialidade de formar a imagem mais brilhante na região da mácula. Hoje em dia os Excimer laseres e demais instrumentos cirúrgicos tem o centro da pupila de entrada como principal referência, e as empresas produtoras desses equipamentos direcionaram esforços para o reconhecimento e acompanhamento de movimentos do olho como um todo e especificamente da área corneana referente à pupila de entrada antes e durante os tratamentos oculares. Cabe a ressalva que os aparelhos que acoplam opticamente o olho ao feixe de laser, necessitam de uma referência com alto contraste, capaz de ser continuamente reconhecida por uma câmera infravermelha ou de luz visível, e monitorado durante as cirurgias. A diferença de cor entre a íris e a pupila gera o contraste suficiente para tal mecanismo. Assim atuam os laser que se guiam pela pupila de entrada. Porém temos a possibilidade de utilizar o contraste da esclera em relação à íris, ou ainda de adicionar outro elemento, como um anel circular de alta reflexão, para ser reconhecido pela câmera filmadora. Estamos diante de duas realidades e duas necessidades. Uma delas é a realidade e necessidade técnica do aparelho, que para funcionar necessita de áreas com contraste, e de outro lado a necessidade e realidade do sistema óptico humano, que apesar de reconhecer na pupila de entrada a maior fonte luminosa, não tem necessariamente no centro da mesma, o alinhamento entre o objeto de fixação e a mácula. O Centro da Pupila de Entrada - Página 24 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Eixo Óptico e Eixo Visual Se houvesse um perfeito alinhamento dos elementos ópticos do olho poderíamos nos referir a um eixo óptico, que unisse o centro óptico de todos os elementos oculares. Mesmo se existisse tal condição, não haveria visão possível se a mácula não se localizasse exatamente no final desse eixo óptico. Um eixo unindo teoricamente a mácula ao objeto de fixação, e passando pelo ponto nodal dos elementos intra-oculares, teria a denominação de eixo visual. Tais condições não existem e, portanto são errôneas tais denominações na prática clínica. Do ponto de vista de modelos ópticos, o deslocamento da mácula em relação ao alinhamento óptico perfeito ganha o nome de ângulo alfa. Na prática clínica devemos ter em mente a referência ao eixo visual como a linha que teoricamente conecta a mácula e o objeto de fixação (linha de visão). O intercepto de tal linha com a face anterior da córnea define o centro de visão da córnea, ou centro visual (Ilustração 15). Ilustração 15. Representação esquemática das linhas de referência da visão, enfatizando a diferença da definição de eixo pupilar de Salmon e de Roorda. Note-se que ambos tem como uma das referências o centro da pupila de entrada. A linha de visão une a mácula ao objeto de fixação e não depende da posição da pupila Eixo Óptico e Eixo Visual - Página 25 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Os Ângulos da Visão O eixo pupilar, referência hoje largamente utilizada, tem o centro da pupila de entrada como um de seus elementos determinantes, porém existem discordâncias em relação à sua segunda referência, como sendo a mácula fixação 33 32 ou o objeto de . Temos, portanto uma linha que une o centro da pupila de entrada com uma referência externa (objeto) ou interna (mácula), e traz consigo o maior volume de informação luminosa possível, conforme discutimos anteriormente. Novamente chamamos a atenção para o olho não ideal, mas sim real. O olho onde os dioptros não são todos alinhados, mas sim deslocados. Nesse sistema a pupila exerce um papel bloqueador de raios sem, contudo modificar sua vergência. Os raios que atingem a córnea paracentral são todos direcionados para o cristalino e daí para a mácula, independente do local onde atinjam a face anterior da córnea. Não há, portanto, um melhor ponto corneano isolado para a formação da imagem. Mas há, sim, uma região sobre a córnea que determina menor distorção, ou aberração, dos raios luminosos incidentes na mácula 32 . Isso tem sido comprovado usando os modelos computacionais do olho esquemático com dados de córneas in vivo 34. Também pode não haver uma linha contínua que une o objeto à mácula se a pupila for demasiadamente deslocada, e mesmo assim o objeto será visto. Nessa condição (clínica), nem o eixo pupilar que tem o objeto como um dos vértices, nem o que tem a mácula como um dos vértices, descreve corretamente o melhor caminho luminoso, ou o caminho do raio chefe. Deveríamos dividir o problema em duas partes. A primeira que trata da formação da imagem, e que sofre somente com a posição relativa dos dioptros. Nessa discussão é fundamental a localização do ponto remoto de cada lente. Nessa abstração, não há um eixo, mas sim um trajeto do pincel luminoso. A segunda parte do problema é exatamente a posição da pupila nesse trajeto, que serve como anteparo à luz. Para entender a segunda parte do problema devemos nos valer da comparação do eixo pupilar com a linha de visão, onde pode haver um pequeno ângulo relacionado às duas, que originariamente denominou-se lambda, mas acabou por denominar-se Os Ângulos da Visão - Página 26 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor ângulo kappa 28 . Tal angulação aparece em pacientes que dirigem o olhar para um objeto de fixação puntiforme luminoso, porém demonstram o reflexo do mesmo objeto em localização distante do centro da pupila de entrada, simulando um estrabismo, mas efetivando uma condição de alinhamento ocular fisiológico. Para discutir a primeira parte do problema devemos medir o ângulo que separa o eixo pupilar de origem macular, do originado no objeto, de modo a compensar a posição relativa do olho e permitir o entendimento do sistema de raios luminosos independentemente da pupila de entrada. Tal condição é o desafio atual no diagnóstico e tratamento dos vícios refrativos nos serem humanos e já foi objeto de discussão e proposição por Mandel, que gerou uma metodologia que permite a detecção do eixo pupilar e conseqüente alinhamento do ângulo kappa a partir de dados do topógrafo corneano 35. O Tamanho da Pupila A natureza dotou a pupila de um movimento pulsátil denominado hippus, que é determinado pelo balanço entre o sistema nervoso simpático e o parassimpático. Várias drogas utilizadas em oftalmologia acabam por modificar o equilíbrio fisiológico, efeito colateral de uma ação sobre os receptores muscarínicos colinérgicos (no caso dos parassimpatomiméticos), ou da inibição da liberação de catecolaminas (como no caso de agonistas alfa 2), ou ainda da inibição das ações da acetilcolina (como os derivados sintético das drogas antimuscarínicas). Tais drogas provocam miose, impedem a midríase ou provocam midríase respectivamente. A pupila pode ser medida em condições escotópicas (sem luz), mesópicas (a meia luz) ou fotópicas (com luz). Tais medidas são fundamentais para a compreensão posterior de fenômenos envolvidos em cirurgias refrativas corneanas, uma vez que a pupila determina quais raios luminosos irão atingir a face anterior do cristalino, e daí a retina. A literatura aponta para medidas de pupila variáveis com a idade e com o sexo, apresentando as seguintes medidas (em mm) representadas por equações em mais de 1000 voluntários estudados em condições escotópicas: 5.83 + 0.181*idade em anos - 0053*idade em anos ^2 (r2 = 0.897) para homens e 5.40 + 0.285*idade em O Tamanho da Pupila - Página 27 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor anos - 0.0109*idade em anos ^2 para mulheres (r2 = 0.945) 36 . Uma média de tamanho pupilar pode ser considerada como sendo de 5.90 ± 0.97 mm, porém há grande variação destes números, com limites de 3.24 a 7.91 mm 37. Tal variação reforça ainda mais a necessidade de conhecimento personalizado de cada pupila para a programação de cirurgias refrativas, uma vez que as cirurgias são realizadas na córnea, e tem uma zona óptica característica, determinada pela área de aplicação central do laser e transição periférica. Aqui se unem as duas partes do nosso problema: a linha de visão (posição óptica ideal) e a pupila de entrada (menor incidência de aberrações) Todos os equipamentos hoje disponíveis para pupilometria determinam a melhor circunferência que interpola os pontos da bordas da pupila. Uma análise mais precisa da forma da pupila deveria envolver a determinação da figura geométrica ligada por pontos (polígono de múltiplos vértices), e não uma curva simples da família das elipses. Tal polígono pode ser determinado com 360 vértices permitindo a análise não somente do diâmetro da circunferência média, mas também de sua forma composta. O pupilômetro refrativo ideal deveria também permitir a descrição de uma curva de resposta individual à luz para cada nível de iluminância (Ilustração 16). A partir da velocidade e intensidade da constrição, e do ponto final e inicial da curva, teríamos um bom parâmetro, tanto na avaliação pré-operatória, quanto no diagnóstico pósoperatório de casos com queixas de halos ou diplopias monoculares 38. O Tamanho da Pupila - Página 28 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 16. Resposta da pupila de um indivíduo submetido a condições crescentes de luminância. Dados obtidos a partir do protótipo desenvolvido em conjunto com a EyeTec, 2003 O Terceiro Elemento: Cristalino Além da análise da posição relativa de todos os dioptros oculares, devemos levar em consideração que algumas estruturas tem um comportamento dinâmico, como é o caso do cristalino. Seu estudo fisiológico tem bases que datam do século XXIX, com Frederich Von Helmholtz 39 que primeiramente descreveu e quantificou o mecanismo de alteração da vergência da face anterior ou posterior da lente, com estímulos externos. Tal movimento ganhou o nome de acomodação, e hoje sabemos que ela é responsável por parte das irregularidades de nosso sistema visual, ou aberrações de alta ordem. A acomodação permite às crianças nascerem hipermétropes, e mesmo assim desenvolverem visão, bem como fornece uma margem de segurança para as cirurgias refrativas, principalmente se realizadas em indivíduos com menos de 40 anos. O Terceiro Elemento: Cristalino - Página 29 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor A perda da acomodação é dependente da posição relativa dos seres humanos no globo terrestre. Quanto mais distante do equador, mais tarde tal efeito se dará. Aparentemente há uma forte dependência da consistência do cristalino na presbiopia, havendo um endurecimento progressivo da lente e conseqüente perda de elasticidade e maleabilidade em resposta a estímulos do músculo ciliar. O maior desafio para a óptica fisiológica e a cirurgia refrativa é, sem dúvida, a restauração da acomodação 40. Propostas tem sido feitas, como as cirurgias de expansão da esclera sob o corpo ciliar, porém seus resultados não são reprodutíveis na clínica. As outras opções para que pessoas com mais de 40 anos mantenham sua visão para perto se baseiam na confusão 41. Entenda-se por confusão, a chegada de mais de uma imagem no cérebro, ou na retina do paciente. Podemos ter tal efeito baseado na anisometropia (monovisão), ou em lentes multifocais. A primeira técnica é mais fisiológica e tem sido tolerada em até 70% dos casos pacientes présbitas 42 . A segunda técnica é tolerada em alguns casos de motivados a usar hipermétropes mais idosos, acima de 50 anos lentes 43, 44 de contato, principalmente , e depende da centralização das lentes em relação à linha de visão dos pacientes. Há uma importante especulação em relação ao mecanismo de acomodação, principalmente quando se trata de avaliar as distorções do sistema visual como um todo e propor métodos cirúrgicos para sua correção, como os tratamentos corneanos personalizados a laser. Tais tratamentos se baseiam no diagnóstico de imperfeições de nosso sistema visual, e na sua correção. Até pouco tempo tais imperfeições ficavam restritas às ametropias clinicamente conhecidas como miopia, hipermetropia ou astigmatismo porém, com a incorporação de instrumentos antes utilizados para a análise do espaço cósmico, pudemos determinar e quantificar aberrações como coma, aberração esférica entre outras, em nosso sistema visual. Tais aberrações podem ser muito sutis, e mesmo assim ser quantificadas de um modo reprodutível a curto prazo. Os tratamentos personalizados se propõem a reduzir tais aberrações ou ao menos limitar seu aparecimento após as cirurgias refrativas corneanas, e aparentemente tal feito já está sendo observado na literatura 45 . O que não se apurou foi a O Terceiro Elemento: Cristalino - Página 30 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor contribuição da dinâmica cristaliniana na manutenção da estabilidade de tais tratamentos, e a propriedade de alteração dinâmica de forma de porções do cristalino, conhecida como microacomodação. O estudo da microacomodação está sendo realizado também por nosso grupo, que determinou uma diminuição significante nas aberrações de alta ordem quando o cristalino está em funcionamento, em contraposição a um aumento das aberrações quando da cicloplegia 46 , 47 . Tais estudos tratam de manter a midríase necessária para a comparação de mesmos tamanhos de pupila, porém utilizam-se de drogas que não inibem a acomodação, como a fenilefrina. Por tais resultados é de se supor que a lente cristaliniana tem o poder de corrigir dinamicamente aberrações setoriais do sistema óptico, porém tais afirmações carecem de comprovação em larga escala. Avaliação do Sistema Visual como um Todo A determinação do poder de vergência do sistema óptico pode teoricamente ser obtida com a soma da vergência de todos os dioptros, porém tal metodologia é complexa em vários sentidos. Inicialmente não possuímos ferramentas diagnósticas precisas o suficiente para determinar as curvaturas anterior e posterior da córnea e cristalino in vivo. Também não sabemos ao certo o índice de refração de cada porção da córnea, e menos ainda de cada camada do cristalino. Ao lado disso, sabemos que o deslocamento de uma lente em relação a outra produz um efeito prismático e que a posição da mácula varia entre os indivíduos, bem como o tamanho de sua pupila. Para contornar tais fatos, emprestamos os conceitos de aberrometria da óptica espacial e medimos a vergência do sistema e não de seus componentes. Para tanto precisamos ter acesso ao feixe de luz que tem em seu centro o raio chefe, que leva em conta a mácula e o objeto de fixação. Se iluminarmos com luz coerente, monocromática, unidirecional e puntiforme (laser) a coróide, temos um reflexo proveniente de um ponto de luz no centro de um espelho côncavo. Tal ponto de luz emitirá fótons em todas as direções, porém somente os que atravessarem a retina, humor vítreo, cristalino, pupila, humor aquoso e córnea serão observados externamente. Se fizermos tal feixe de luz atravessar pequenas lentes dispostas em um arranjo simétrico teremos vários focos de luz que podem ser projetados em um Avaliação do Sistema Visual como um Todo - Página 31 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor anteparo. A figura que se forma nesse anteparo é a representação da vergência do sistema visual como um todo (Ilustração 17). Ilustração 17. Posição bidimensional dos focos das lentículas do sensor do tipo Hatman-Shack, presente nos analisadores de frente de onda Se tivermos uma figura de referência formada a partir de um sistema emétrope, podemos dizer se nosso arranjo de pontos representa ou não um olho emétrope. Se soubermos a relação entre o deslocamento de cada foco da figura emétrope, e sua vergência relativa, podemos saber se o sistema é míope ou hipermétrope (Ilustração 18). Ilustração 18. Deslocamento dos focos de luz de um padrão ideal em relação a um padrão real, obtido de um olho humano a partir do mesmo sensor de HartmannShack Avaliação do Sistema Visual como um Todo - Página 32 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ao excluir sistematicamente as aberrações uniformes, chamadas de aberrações de baixa ordem, nos deparamos com as imperfeições mais sutis em relação a figura ideal e chamamos estas imperfeições de aberrações de alta ordem 48. Ametropias e Comprimento Axial Com a incorporação da aberrometria à nossa prática clínica, devemos chamar de aberrações, e não ametropias, todos os vícios refracionais. Atualmente ainda precisamos nos ater às ametropias clássicas para a compreensão universal. As ametropias clássicas envolvem a miopia, hipermetropia e astigmatismo e são as aberrações com possibilidade de correção por óculos convencionais. Às outras manifestações chamávamos até então de astigmatismos irregulares. A miopia é uma das manifestações refracionais mais estudadas e carrega consigo várias características fisiológicas e patológicas importantes. O olho pode ser míope, na dependência de ser maior que o local de seu foco remoto, ou possuir uma vergência maior que seu comprimento axial. À primeira condição denominamos miopia axial e à segunda miopia de índice. A maioria dos indivíduos alto míopes tem um olho maior que o considerado normal, e se reúnem em um grupo que denominamos de míopes patológicos. Aparentemente míopes de mais de 6,00 dioptrias esféricas possuem achados característicos da miopia patológica, que se refletem em sua retina, vítreo e coróide 49 . Algumas alterações são facilmente entendidas às custas de um olho mais alongado, com estiramento de esclera e conseqüente estiramento de coróide e retina, levando a estrias angióides, estafilomas, eventual rotura retiniana, etc..; outros achados são de etiologia mais complexa, como a maculopatia miópica, que pode cursar com hemorragia, buraco de mácula e perda de visão central. Por estas manifestações devemos ter em mente o alto risco cirúrgico nos alto míopes. Também vale a pena ressaltar que as correções das altas miopias já foram propostas na superfície da córnea esféricas devem ter sua 50 . Pacientes com miopias acima de dez dioptrias cirurgia corneana exaustivamente discutida e eventualmente contra-indicada, face ao conhecimento atual em cirurgia refrativa corneana 51. Um dos motivo para tal afirmação é a relação direta entre a quantidade de tecido que deve ser retirado do estroma corneano e a ametropia a ser corrigida. Ametropias e Comprimento Axial - Página 33 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Tal equação tem como termo adicional a área da ablação realizada, e na atualidade são utilizadas áreas de ablação de pelo menos 5,50 mm. Com tais dados, calcula-se em mais de 120 micra a quantidade de tecido a ser retirado para a correção de mais de 10,00 dioptrias de miopia, o que acarreta como conseqüência uma fragilidade corneana remanescente que pode levar a uma ectasia corneana iatrogênica. Inúmeras publicações avaliaram a eficácia e segurança de cirurgias intra-oculares em altas miopias e, em nosso meio, participamos do desenvolvimento das lentes de câmara anterior e suporte angular para olhos fácicos 52 . Tais lentes inicialmente possuíam alças relativamente rígidas, bordas espessas e pouca angulação entre as alças e o corpo da lente levando à perda endotelial eventual e irregularidade da pupila em vários casos. Mesmo assim houve importante sucesso e grande número de pacientes operados. O desenvolvimento subsequente permitiu a confecção de lentes mais delgadas, com suporte flexível e boa angulação (Ilustração 19). Informações obtidas hoje pela Biomicroscopia Ultra-sônica permitem a triagem de pacientes bons candidatos a tais auxílios ópticos. Ilustração 19. Modificação no desenho e produto final destinado a corrigir altas ametropias quando colocado na câmara anterior de olhos humanos. Note-se que o segundo produto, denominado de lente Nuvita, apresenta hastes mais delgadas e angulação diferenciada das sapatas, além de ter as bordas ópticas mais finas Ametropias e Comprimento Axial - Página 34 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor A hipermetropia, em contrapartida, caracteriza-se por um olho pequeno e/ou uma córnea plana, e carrega consigo riscos como o glaucoma de ângulo fechado ou as hemorragias de coróide durante cirurgias intra-oculares. Como já citamos, quase todos nascemos hipermétropes e utilizamos a acomodação para trazer a imagem até a retina enquanto nosso olho não cresce. Existem fatores já identificados que determinam o crescimento ocular e fundamentalmente determinam a parada deste crescimento. Quando a córnea tem uma curvatura diferente em seus dois meridianos principais denominamos tal olho como astigmata. O astigmatismo pode ocorrer se o cristalino possuir tal característica, ou mesmo se a esclera tiver uma curvatura diferente em cada um de seus meridianos principais. A maioria dos olhos possui algum grau de astigmatismo, porém somente a partir de um certo limite esta aberração compromete a visão. Já dividimos o astigmatismo em astigmatismo na regra (meridiano mais curvo vertical), contra a regra (meridiano mais curvo horizontal) ou oblíquo (meridiano mais curvo distante mais de 15 graus dos meridiano vertical e horizontal). Temos como extremos de limitação da visão os astigmatismos maiores que uma dioptria cilíndrica, porém os astigmatismos contra a regra e oblíquo podem se manifestar clinicamente com até 0,75 dioptria cilíndrica, devido provavelmente ao fato de borrarem em um olho com o meridiano oposto emétrope, somente as linhas verticais, que tem grande importância para a formação e interpretação da imagem. Com o advento da topografia corneana, podemos medir a curvatura da córnea ao longo de sua superfície e classificamos os astigmatismos também quanto à sua simetria em relação ao ápice da córnea e sua regularidade quanto aos seus semimeridianos. Chamamos de astigmatismo regular, ao astigmatismo que pode ser corrigido com óculos e avançamos denominando tal aberração de aberração de baixa ordem, bem como a miopia e a hipermetropia. Os astigmatismos assimétricos, que não mantém um padrão especular tendo como referência o ápice da córnea, e/ou irregulares, que não mantém um alinhamento contínuo dos dois semimeridianos, não podem ser corrigidos com óculos e são parte das aberrações de alta ordem que hoje em dia podemos subdividir, quantificar, comparar e eventualmente tratar cirurgicamente. Ametropias e Comprimento Axial - Página 35 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Tratamento das Aberrações de Baixa Ordem Há uma máxima entre os cirurgiões refrativos ligados à prática academica, que diz que se os óculos não tivessem sido inventados mas somente a cirurgia refrativa, ao seu inventor caberia o prêmio Nobel. Isso retrata a enorme eficiência da correção por lentes na visão final dos indivíduos. A introdução das lentes de contato rígidas, depois gelatinosas e das cirurgias refrativas corneanas e intra-oculares, se deu basicamente guiada por mudanças comportamentais na sociedade, como padrões estéticos e não pela ineficiência dos óculos. Até hoje quando orientamos pacientes pré-cirúrgicos, enfatizamos que a cirurgia refrativa deve ter como objetivo a diminuição da dependência aos óculos ou lentes de contato, e que provavelmente a visão do paciente deverá ser ligeiramente inferior à conseguida com a correção anterior. Se de um modo grosseiro e pouco aprofundado estamos elevando os óculos ao patamar de solução final dos problemas visuais, numa análise mais pormenorizada vemos avanços tecnológicos e possibilidades futuras muito interessantes com as novas técnicas de cirurgia refrativa, como os tratamentos personalizados, que cursam com menor indução de aberrações esféricas que os tratamentos não personalizados de pequenas zonas ópticas e menor deformação de imagem que os óculos. De todo modo, até agora, a oftalmologia obteve sucesso na correção da visão da maioria esmagadora dos casos, prescrevendo óculos com lentes esféricas, cilíndricas e esfero-cilíndricas para a correção das miopias e hipermetropias; astigmatismos simples; astigmatismos compostos e mistos respectivamente. Óculos, Lentes de Contato Rígidas e Gelatinosas Apesar da aparente incongruência, a qualidade da visão atingida com a correção visual parece inversamente proporcional ao avanço temporal da humanidade. Após o advento e consolidação dos óculos, surgiram as lentes de contato de apoio corneano e material rígido, como alternativa para casos de córneas deformadas, altas anisometropias ou afacias. Realmente tais indicações nunca foram baseadas em mudanças de padrão social, mas repousam em benefício mensurável para a qualidade de visão se comparadas aos óculos. Tratamento das Aberrações de Baixa Ordem - Página 36 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Após o aparecimento das lentes de contato rígidas, surgiram materiais com maior permeabilidade mas semelhante dureza e finalmente materiais maleáveis, que genericamente foram denominados de gelatinosos. As lentes de contato gelatinosas contribuíram imensamente para a popularização do uso de lentes de contato, pois não apresentam o incômodo causado pelo toque da pálpebra com a borda das lentes rígidas. Com essa característica e boa segurança, milhões de indivíduos passaram a usar lentes de contato, mesmo sem as indicações anteriormente descritas. Na maioria dos casos as aberrações poderiam ser corrigidas com óculos, porém a praticidade, comportamento social e disponibilidade determinaram a nova escolha. O fato de que milhões passaram a usar lentes gelatinosas não faz dessa opção a melhor opção do ponto de vista de qualidade óptica, porém deve ser levado em consideração como fato concreto e determinado, antes da apresentação da limitação dessas lentes. Cabe a redundância de que as lentes gelatinosas são maleáveis, ou seja, se amoldam à superfície subjacente, no caso a córnea. Sendo, portanto, paralelas à superfície da córnea, seu efeito só pode ser derivado de diferenças regulares de espessura entre o centro e a periferia, o que limita seu uso a casos de miopias ou hipermetropias. A correção de astigmatismos implica na utilização de lentes tóricas que mantenham uma relação estável com um determinado meridiano corneano, o que só foi conseguido mais tarde com as lentes de contato gelatinosas tóricas, que mantém sua posição com o auxílio gravitacional (Ilustração 20). Ilustração 20. Ilustração esquemática de uma lente de contato gelatinosa tórica comercialmente disponível, demonstrando a zona prismática peso inferior, que determinará a orientação da lente sobre a córnea Óculos, Lentes de Contato Rígidas e Gelatinosas - Página 37 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Atualmente a produção de lentes de contato gelatinosas está direcionada para as lentes gelatinosas simples, sem correção de cilindros refracionais. A opção por tal lente é obviamente mercadológica, uma vez que são pouquíssimos os casos onde não se observam astigmatismos. Por outro lado, não são poucos os casos com pequenos cilindros, e mesmo cilindros maiores, de até uma dioptria, que prefiram a conveniência social, com visão ligeiramente borrada, ao uso de óculos 53. As lentes gelatinosas simples são, do ponto de vista estritamente óptico, uma regressão de alguns séculos de história e prestam-se à correção de um tipo de aberração, de baixa ordem. As lentes gelatinosas tóricas devem ser comparadas aos óculos convencionais e permitem a correção de todas as aberrações de baixa ordem, havendo somente a limitação em relação à quantidade de aberração que pode ser corrigida dessa forma. As lentes rígidas, criadas inicialmente para corrigir córneas irregulares ou situações ópticas desfavoráveis aos óculos, nunca deixaram a prática de clínicos e cirurgiões de córnea e segmento anterior e encontram cada vez mais indicações, à medida que a prática da cirurgia corneana se amplia. Devemos também recorrer na redundância da ausência de maleabilidade das lentes de contato rígidas, que mantém sua curvatura anterior e posterior independente da superfície onde estão apoiadas e das pressões que sofrem. Com a manutenção das suas características de fabricação quando em contato com a córnea, é permitida a mudança radical do comportamento óptico do olho humano. Córneas irregulares passam a apresentar à luz incidente uma superfície regular, previsivelmente regular. As irregularidades aqui mencionadas podem ser os astigmatismos, abaulamentos periféricos, depressões paracentrais, etc.. que compõe, além das aberrações de baixa ordem, várias aberrações de alta ordem. É por esse fato que pacientes usuários de lentes rígidas usualmente apresentam visão excelente, e notam uma sensível piora na sua visão quando passam a utilizar as lentes gelatinosas. Também por esse fato os pacientes candidatos a cirurgia refrativa corneana (mormente pela técnica convencional) devem ser exaustivamente orientados em relação à piora relativa de sua visão, mesmo com o sucesso cirúrgico esperado. Óculos, Lentes de Contato Rígidas e Gelatinosas - Página 38 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Excimer Laser Do mesmo modo que as lentes de contato gelatinosas são utilizadas por milhões de pessoas mesmo resultando em uma visão pior que as lentes rígidas, a cirurgia refrativa se popularizou. A visão dos pacientes submetidos a cirurgia refrativa é freqüentemente pior que a apresentada com a correção anterior, mesmo assim a popularidade da cirurgia aumenta diariamente e as explicações passam por conveniência na prática de esportes, intolerância a lentes de contato ou óculos, estética, comodidade, etc. O Excimer laser foi a ferramenta que elevou a cirurgia refrativa corneana a um nível científico aceitável. Anteriormente à mesma, a correção era realizada com base na modificação da biomecânica da córnea, com a aplicação de cortes periféricos radiais que resultavam no desarranjo da estrutura armada da abóbada corneana. Tal desestruturação era parcialmente previsível a curto prazo comportamento não pôde ser previsto a médio e longo prazo até 1994 porém, 54 seu , quando foi publicamente aceito o fato do aplanamento contínuo da curvatura central de uma porcentagem significativa das córneas submetidas à chamada ceratotomia radial. A partir de então, tratamentos alternativos com resultados inconsistentes foram propostos e avaliados para a diminuição da hipermetropia progressiva secundária a ceratotomia radial, como as suturas circulares 55 (Ilustração 21). Excimer Laser - Página 39 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 21. Gráfico da regressão do efeito refrativo observado na córnea de quatro pacientes operados com sutura de fio de aço para a correção de hipermetropia pós ceratotomia radial Derivada de supostos experimentos militares 56 , a radiação ultravioleta mostrou-se promissora na vaporização de tecido corneano, tendo como conseqüência pequeno dano térmico subjacente. Após experimentos em animais e conhecimento prévio do mercado 57 , empresas norte-americanas concentraram esforços na correção de miopias simples. A ablação diferencial centro-periferia, indo até aproximadamente 4,5 mm do centro da ablação (Ilustração 22), parecia suficiente para o resultado esperado. Inúmeros pacientes foram tratados com a chamada zona óptica de 4,5 mm que, diga-se de passagem, era maior que a obtida nas ceratotomias radiais, de aproximadamente 3 mm. Excimer Laser - Página 40 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 22. Fotomicrografia corneana ilustrando o padrão de ablação em degrau para miopias, conseguido com laseres de área extensa e diafragma Vários desses pacientes tiveram bons resultados, porém, como não era totalmente conhecida a conseqüência da profundidade de ablação, casos de altas ametropias desenvolveram formas anormais de cicatrização (chamadas à época de pseudomembranas) com a formação de colágeno fetal e acúmulo de matriz extracelular altamente hidratada, que causaram o chamado “haze” 58 (Ilustração 23). Ilustração 23. Córnea com deposição de colágeno fetal após tratamento de alta ametropia na superfície da mesma (haze) Excimer Laser - Página 41 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor A constatação de que tratamentos profundos limitariam as ametropias a serem corrigidas coincidindo com o litígio entre optometristas e oftalmologistas americanos sobre a possibilidade de realizar procedimentos de baixa complexidade, fez ressurgir a técnica de delaminação corneana estromal seguida da aplicação do excimer laser, que ganhou a denominação de LASIK. Com tal tecnologia foi possível diminuir a interferência de fatores da cicatrização como as interleucinas e fatores de crescimento, e ampliar a gama de ametropias a serem tratadas. Além disso, foi convenientemente ampliada a complexidade do procedimento, limitando a execução do mesmo a médicos oftalmologistas. Coincidente à introdução do LASIK, observou-se modificações na arquitetura do feixe de laser, com modulação periférica e possibilidade de tratamentos de hipermetropias e astigmatismos miópicos simples e compostos, além da ampliação do diâmetro dos feixes. Novos laseres que necessitavam de menos potência e baseavam-se na movimentação do pequeno feixe ou feixe estreito sobre a córnea, foram fabricados. A cada modificação novos resultados eram esperados e novos nomogramas eram construídos 59 , o que implicava em significante imprevisibilidade dos tratamentos. Infelizmente, a evolução dos laseres não foi acompanhada pela evolução nos aparelhos que possibilitavam a aplicação profunda dos mesmos, os microcerátomos. Tais aparelhos tiveram sua origem remota nos anos 60, com José Ignácio Barraquer, que utilizou-os para obter uma lamela corneana e torneá-la 60 . Além do processo ainda ser totalmente mecânico e o aparelho apresentar as mesmas partes móveis há mais de 40 anos, suas lâminas de uso único não raramente são reutilizadas, podendo comprometer o corte (Ilustração 24). Instrumentos capazes de analisar em tempo real o fio de corte dessas lâminas foram idealizados e parcialmente desenvolvidos por nosso grupo 61 , e devem tornar-se realidade em um campo guiado pela máxima qualidade e mínimo risco. Excimer Laser - Página 42 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 24. Captura digital do fio de corte de uma lâmina de LASIK submetida a trauma, determinação do perfil de corte e interpolação matemática da irregularidade central apresentada após impacto proposital Mesmo após centenas de tratamentos seguidos e avaliados num mesmo aparelho, ainda havia certa imprecisão e os pacientes deveriam (e devem) ser informados e orientados em relação a essas cifras. Esperávamos inicialmente que 77% dos pacientes apresentassem visão melhor ou igual a 20/40 com até 97% 63 62 . Atualmente contamos dos pacientes com visão de 20/40 ou melhor, após um mês da mesma cirurgia (PRK). Mesmo com tamanha evolução em relação aos resultados quantitativos, continuamos a fundamentar as indicações de cirurgia refrativa corneana na diminuição da dependência de óculos e mantemos a posição de nunca “indicar” uma cirurgia refrativa, mas sim deixar de contra-indicá-la. Vários de nós aguardam tal mudança de filosofia, o que traria para a clínica milhões de felizes usuários de óculos ou lentes de contato. Excimer Laser - Página 43 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor As lentes rígidas ainda dão melhor visão que a maioria das foto-ablações corneanas, e nosso parâmetro de avaliação está migrando da quantidade de visão para a qualidade de visão. Questionários e a relação médico paciente dizem mais sobre a visão do que a tabela de Snellen e expressões como “20/happy” são utilizadas para definir resultados pós-operatórios. A necessidade de manipulação de dados pouco ortodoxos levounos a realizar trabalhos de qualidade de visão e, principalmente, da qualidade de vida relacionada à visão e ao uso de correção visual, o que é bem mais abrangente por envolver fatores psicossociais. Tais estudos poderiam permitir a separação de um paciente contente com visão 20/25 e um descontente com visão 20/25 64 . Vários fatores parecem influenciar nessa diferenciação, inclusive a expectativa préoperatória. Do ponto de vista da óptica fisiológica, a atenção está voltada para a imagem retiniana conseqüente à cirurgia corneana. Julgamos tal imagem como um ponto, e simulamos seu borramento, denominando o resultado como a função de espalhamento de ponto ou “PSF - point spread function” (Ilustração 25). Tal borramento é conseqüência natural da somatória de todos os raios que atingem a face anterior da córnea e não são bloqueados pela pupila, reforçando mais uma vez a importância da localização, forma e comportamento da pupila na cirurgia refrativa corneana. Ilustração 25. Simulação experimental da função de espalhamento de ponto em um olho sem aberração e em um olho com aberração do tipo coma Excimer Laser - Página 44 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Quanto mais difuso e maior for o borramento, menor deverá ser a definição visual do indivíduo. As maiores causas de borramento são derivadas de miopia ou hipermetropias, seguidas dos astigmatismos. A essas aberrações altamente deletérias, pois presentes em maior quantidade, denominamos aberrações de baixa ordem. Tanto com lentes gelatinosas como após cirurgias foto-refrativas corneanas, temos geralmente uma diminuição acentuada das aberrações de baixa ordem, o que leva inexoravelmente a uma melhora da visão dos pacientes em relação à ausência de correção, porém, nessas duas condições não chegamos a ter um ponto discreto na retina, mas mantemos um borramento, tênue, mas presente. Tal persistência pode ter conseqüências em determinados pacientes, que exprimem uma sensação visual de halos, estrelas ou borramentos indeterminados em torno de fontes luminosas, principalmente em condições escotópicas ou mesópicas (Ilustração 26). Ilustração 26. Ilustração feita por um paciente operado com laser de área extensa e zona óptica pequena, exprimindo sua visão ao olhar para uma lâmpada oval e uma tubular, quando acesas à noite Hoje em dia a prevenção dos sintomas com a identificação, seja por meio de questionários ou do estudo da pupila, de tais indivíduos é um dos desafios maiores Excimer Laser - Página 45 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor na cirurgia refrativa 65 . O tratamento desses sintomas também é desafiador, porém aparentemente temos uma arma a ser testada para estes casos, que é o tratamento personalizado. Independente da atuação na prevenção ou tratamento, necessitamos do domínio da tecnologia no diagnóstico da função de espalhamento de ponto. Já mencionamos anteriormente que a avaliação do sistema visual como um todo se dá por meio da avaliação das frentes de onda ou aberrometria e, para a realização da mesma, já dispomos de algumas tecnologias. Sensores e Aparelhos de Aberrometria Apesar da óbvia presença da tecnologia de ponta para a análise de frentes de onda, os seus princípios básicos foram postulados há quase quatro séculos. O primeiro trabalho tratando o assunto da óptica do olho humano foi publicado por Scheiner em 1619, quase 70 anos antes dos trabalhos do Newton e de Huygens, considerados os fundadores da óptica física. Neste trabalho pioneiro “Oculus, sive fundamentum opticum”, Scheiner descreveu um aparelho simples, desde então conhecido como o disco de Scheiner, para medir as imperfeições do olho humano 66. O disco de Scheiner é um disco opaco com dois buracos (Ilustração 27). Se o disco for colocado na frente de um olho “sem imperfeições”, a luz de um objeto distante e puntiforme como uma estrela ou uma luz distante mais de seis metros do olho humano atravessando os dois buracos, formaria uma só imagem retiniana. Tal efeito seria relatado pelo paciente como a visão de um objeto único. No entanto, caso o olho tenha algum grau de erro refracional, formar-se-iam duas imagens, o que poderia ser corrigido colocando-se uma lente simples correspondente ao erro refrativo. Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 46 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 27. Disco de Scheiner, utilizado para identificar imperfeições de todo o sistema óptico do olho humano Em outra linha de pesquisa independente do trabalho de Scheiner, Tscherning (1894) descreveu um método para a medida das aberrações do olho humano. O aberrômetro de Tscherning, descrito no trabalho “Die monocrhomatischen Aberrationene des menschlichen Auges”, trata de uma lente positiva de + 5,00 dioptrias com uma grade gravada 67 (Ilustração 28). Ilustração 28. Grade de Tscherning utilizada para revelar imperfeições de todo o sistema visual a partir da observação das distorções na retina humana. Atualmente a grade é iluminada e a imagem capturada é analisada digitalmente Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 47 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor O paciente, olhando para um objeto puntiforme através deste aberrômetro, enxergaria a sombra da grade deformada pelas aberrações do olho, e poderia descrevê-las ou mesmo desenhá-las. Somente sessenta anos mais tarde (1960), nos trabalhos de Howland descrevendo o aberrômetro de cilindro cruzado, e Howland & Howland em 1977, 68 aplicando-o na população humana, teríamos as primeiras aplicações clínicas destes princípios, ainda com os aberrômetros subjetivos. A aberrometria baseada nos princípios de Tscherning foi aperfeiçoada por volta de 1977 com o uso conjunto de laseres, câmeras de vídeo ultra-sensíveis e microcomputadores, tornando possível medidas objetivas mais precisas e consistentes, no lugar das subjetivas. Contemporaneamente a Tscherning, Hartmann modificou o disco de Scheiner acrescentando mais perfurações ao disco. Desta forma, a luz, chegando de um objeto distante, seria dividida em vários raios e a orientação de cada um ou o desvio da posição ideal, seriam causados pelas aberrações de todo sistema visual e as representaria 66. Mais tarde, em 1971, Shack continuou com a modificação, substituindo o disco perfurado por uma matriz de pequenas lentes (Ilustração 29), descrevendo o sensor chamado de Hartmann-Shack 69 . Desta forma, a luz é dividida em raios pelas próprias lentes, e as aberrações ópticas podem ser detectadas medindo-se desvios dos focos das lentes em comparação com as posições dos focos ideais. Ilustração 29. Matriz de microlentes proposta por Shack e presente na maioria dos aparelhos de análise de frentes de onda comercialmente disponíveis Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 48 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor A primeira aplicação clínica do aberrômetro de Hartmann-Shack ocorreu com o auxílio do uso de câmeras de vídeo ultra-sensíveis e micro-computadores por Liang, em 1994 70. Princípio dos Sensores Como as aberrações ópticas do olho humano têm como conseqüência a deformação ou nitidez da imagem na mácula, o aberrômetro ideal deveria medir as aberrações diretamente na mácula, avaliando a qualidade da imagem. Isso é impossível do ponto de vista técnico, portanto todos os aberrômetros são obrigados a lidar com a luz atravessando o sistema visual duas vezes, entrando e saindo do olho. Existem duas maneiras de analisar o sistema óptico do paciente usando a tecnologia de frente de onda, dependendo do sentido da luz (na entrada ou na saída do olho) na qual as aberrações analisadas acontecem. No primeiro grupo dos aberrômetros “de entrada”, baseados no princípio da imagem retinoscópica simultânea (Tscherning) ou seqüencial (Tracey), um feixe de luz paralelo atravessa o olho e sofre as aberrações enquanto a frente de luz está entrando no olho. Em outros aberrômetros, ainda “de entrada”, as aberrações de imagem são avaliadas estimando-se a diferença do caminho óptico entre vários pontos, baseando-se no princípio de retinoscopia (OPD scan). Os métodos que analisam a luz que parte da retina do paciente têm como base a reversibilidade da luz, avaliando assim as aberrações na “saída” do olho (Hartmann-Shack e Castro). A lista dos aberrômetros comercialmente disponíveis encontra-se na iIlustração 30. Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 49 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 30. Lista de analisadores de frente de onda disponíveis em janeiro de 2003. Seu nome comercial encontra-se na primeira linha, o princípio no qual se baseia na segunda, e a empresa produtora na terceira Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 50 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Característica dos Sensores Tscherning O aberrômetro baseado no princípio de Tscherning foi projetado por Mierdel e colaboradores, na Universidade Técnica de Dresden, Alemanha 71 . Atualmente duas empresas alemãs disponibilizaram comercialmente aberrômetros baseados neste princípio: WaveLight e Schwind. Este aberrômetro é composto por três vias ópticas: via de entrada, via de saída e via de centralização da imagem. A luz de laser vermelho (670nm) é colimada e expandida para atingir uma boa homogeneidade. Este feixe de luz de secção extensa atravessa uma máscara com uma grade de 168 pequenos furos, dividindoo em raios finos (diâmetro de 0,3 mm cada) e paralelos. Estes raios paralelos são projetados com um diâmetro de 10 mm na córnea e atravessam todo o sistema óptico de olho, formando o foco (área de menor confusão) alguns milímetros antes da retina. Essa projeção gera uma imagem retiniana de um milímetro, real e invertida, onde cada ponto representa a imagem de um raio originado da máscara (Ilustração 31). Para que o tamanho da imagem retiniana seja sempre igual a um milímetro, mesmo em olhos com diferentes poderes dióptricos, uma lente aberroscópica é acoplada no caminho óptico do aberrômetro. Desta forma, o paciente enxerga suas próprias aberrações percebendo a deformação seletiva da grade entrando no olho, podendo até descrevê-las. Ilustração 31. Imagem retiniana real e invertida, onde cada ponto representa a imagem de um raio originado dos raios puntiformes emitidos nos aparelhos que se baseiam no princípio de Tcherning Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 51 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Após uma exposição de 60 msec, uma foto da imagem retiniana de 1 x 1 mm2 é formada e capturada usando-se um esquema óptico baseado nos princípios da oftalmoscopia indireta e uma vídeo-câmera. Um diafragma é colocado no caminho óptico para assegurar que a imagem seja formada somente pelos raios paraxiais atravessando a via de saída e passando exclusivamente pela área paraxial do sistema óptico do olho. As coordenadas dos centros geométricos de todos os pontos da imagem retiniana são determinados através do programa específico no microcomputador. O padrão ideal das coordenadas no olho sem aberrações é calculado usando-se o modelo do olho simplificado de Gullstrand, onde o comprimento axial do olho é calculado a partir da refração esférica medida pela função de refrator automatizado. A posição de cada ponto da imagem é comparada com a posição ideal, e o desvio da frente de onda da sua forma ideal esférica pode ser calculada no nível da pupila usando-se a relação entre posição dos raios na córnea e a posição na imagem retiniana. Hartmann-Shack O aberrômetro baseado no princípio de Hartmann-Shack é o mais utilizado atualmente, sendo comercialmente disponível através de várias empresas: Alcon, Bausch & Lomb, Topcon, VISX, Zeiss e Wavefront Sciences. Um pulso curto de raio de laser infravermelho fino (diâmetro de 10 µm) é projetado na mácula, e a luz é refletida pelas estruturas profundas da retina ou da própria coróide, iniciando uma frente de onda perfeitamente esférica. No caminho de saída do olho, a frente será modificada pelas próprias aberrações do olho, assumindo uma forma irregular ou com aberrações. Esta frente é subdividida pela matriz de lentes em vários pontos de foco que incidem sobre um CCD (sensor de luz presente em uma câmera de vídeo) fotossensível. Como os pontos de foco também sofrem de aberrações das lentes, existe um borramento ao redor dos mesmos e o programa dos aparelhos aplica filtros para a detecção do ponto de maior luminosidade, e para definí-lo como o foco da respectiva lente (Ilustração 32). Uma vez encontrados todos os focos de cada lente, o mesmo programa irá comparar a distribuição dos focos com uma distribuição padrão de Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 52 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor uma frente de onda plana determinada pela fábrica. A distância relativa de cada foco ao ponto padrão determinará a aberração correspondente. Ilustração 32. Determinação do brilho médio dos pontos de foco e obtenção das coordenadas da frente de onda a ser comparada com o padrão. Primera versão do programa a ser utilizado no sensor de Castro, desenvolvido pela Eyetec em 2002 Há de se notar que em todos os modelos de sensor, as distâncias relativas é que determinam a perfeição ou imperfeição da frente de onda. Os polinômios de Zernike são o modo que os engenheiros e físicos conseguiram traduzir essa deformação para que elas tivessem um sentido para os observadores. Os polinômios são, portanto, obtidos a partir da imagem deformada observada, e as imagens deformadas são obtidas a partir dos sensores (Ilustração 33). Ilustração 33. Ilustração da deformação de uma grade regular (em verde) após atravessar um sistema óptico (azul). A partir das distâncias entre as arestas da grade vermelha é possível fazer o cálculo dos termos do polinômio de Zernique e determinar a contribuição de cada aberração individual ou de todas as aberrações de alta ou baixa ordem Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 53 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Mistos Tracey, OPD Scan De modo a aproveitar a tecnologia bem estabelecida dos refratores automatizados atuais, empresas como a Nidek e a Tracey Technologies utilizaram o caminho óptico da luz e tomaram várias medidas em cada ponto da pupila. Vale lembrar que sempre nos referimos à pupila como local de medida das aberrações, isso porque a íris bloqueia qualquer raio de luz que incida sobre a mesma, limitando a área de análise à pupila livre (Ilustração 34). Também por esse motivo devemos sempre conhecer o tamanho da pupila onde o exame foi feito e comparar exames realizados sempre com o mesmo tamanho de pupila. Ilustração 34. Esquema da área da pupila a ser avaliada pelos analisadores de frente de onda. Somente a luz que retornar da coróide e atravessar a pupila será analisada, enfatizando a importância do tamanho e posição da pupila na análise de frentes de onda O OPD ("optical path difference") mede aproximadamente 1440 pontos meridionais na pupila do paciente, e o sensor utilizado no aparelho comercializado pela Tracey obtém imagens não simultâneas de cada ponto de leitura, teoricamente tem a vantagem do não cruzamento de raios de luz, o que na prática não foi ainda demonstrado como superior aos sistemas concomitantes. Castro O sensor de Castro é um sensor de saída e caracteriza-se pela obtenção de um foco circular a partir de um conjunto de lentes circulares concêntricas de secção tórica. Cada lente tórica circular se comporta como um anel de focalização, que forma uma linha circular contínua de foco (Ilustração 35). Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 54 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 35. Imagem das lentes tóricas circulares do sensor de Castro. Note-se a concentricidade das linhas circulares e a continuidade das mesmas. A partir dessa forma o programa deverá determinar as aberrações isoladas e agrupadas do sistema óptico As lentes concêntricas têm um raio que possibilita a focalização em uma distância conhecida e a imagem produzida é capturada por um CCD após o tratamento dos raios para diminuir as imperfeições do sistema óptico do aparelho. Note que na Ilustração 36 a posição 18 é onde fica o sensor, entre a luz que sai do olho e o computador que irá trabalhar a imagem. Ilustração 36. Diagrama opto-mecânico da posição dos componentes no aberrômetro baseado no sensor de Castro. A posição 8 está reservada ao sensor propriamente dito Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 55 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor O sensor de Castro tem como ferramenta de uso um programa exaustivamente testado por uma empresa ligada a Opto Eletrônica, denominada EyeTec. A EyeTec desenvolve há vários anos o videoceratógrafo Corneano CT-2000 16 . Como os topógrafos corneanos atuais, o CT-2000 utiliza-se de discos de Plácido para representar a imagem da superfície anterior da córnea, e tais discos formam imagens circulares semelhantes às obtidas pelo sensor de Castro, parte da tecnologia na identificação dos anéis nas imagens digitalizadas foi aproveitada do Topógrafo Corneano previamente desenvolvido pela empresa Eyetec e comercializado pela Opto Eletrônica. A partir dos anéis circulares determinam-se linhas contínuas e compara-se sua deformação com um círculo perfeito. Porções mais afastadas de uma esfera ideal representam regiões de frentes de onda mais divergentes (hipermétropes) que porções mais próximas. Tendo registrado as diferenças de forma entre a imagem obtida e uma imagem de calibração artificial, é possível a composição dos polinômios de Zernike, que definirão as aberrações de baixa e alta ordem. Algumas vantagens do sensor de Castro incluem a relativa simplicidade na manufatura do sensor e a menor possibilidade de leitura errônea de focos, pois os mesmos algoritmos usados na topografia corneana servem para que o programa “siga” a linha contínua circular e não misture a imagem de um anel com o outro. O sensor de Castro encontra-se em processo de patenteamento 72 e deverá estar disponível em futuro breve para uso clínico . Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike Os cálculos envolvidos na descrição das aberrações da frente de onda têm início a partir das posições no plano cartesiano dos focos puntiformes provenientes da lentículas, e formados no CCD. Os algoritmos para processamento de imagens nos fornecem os centros de "massa" de tais pontos e, portanto temos as coordenadas para pontos da imagem de calibração (olho artificial emétrope) e para imagens de olhos in vivo ou artificiais com aberrações. Dadas as coordenadas destes pontos, calculamos as derivadas parciais da função frente de onda. As funções matemáticas que nos permitem com uma equação descrever uma superfície, foram propostas por Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 56 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Zernike e publicados pela primeira vez em 1934. Zernike foi inventor do microscópio que opera pelo princípio da diferença de fase 73 , especialmente útil na magnificação de imagens biológicas, sem a necessidade de uso de corantes. Isto é muitas vezes vantajoso, pois em certos casos os corantes deterioram a amostra. Ele recebeu o prêmio Nobel por esta invenção e, em um de seus trabalhos relacionados a este instrumento, apresentou uma série de polinômios com propriedades de simetria especialmente interessantes para descrição de aberrações ópticas. Por suas características, estes polinômios adquiriram grande aceitação e difusão entre os cientistas na área de óptica e são hoje amplamente usados em astronomia, óptica adaptável e retinoscopia de alta resolução 74, 75. O entendimento das aberrações pode ter duas abordagens denominadas óptica de raio e óptica de ondas. Um sistema óptico gera uma imagem puntiforme se todos os raios que formam essa imagem encontrarem-se em um mesmo ponto. No entanto, essa situação ideal não existe na vida real devido à presença das aberrações. Na abordagem pela óptica de ondas um sistema óptico perfeito gera uma onda perfeitamente esférica centralizada na imagem puntiforme. As diferenças dessa superfície ideal constituem as aberrações. A análise de frente de onda tem como objetivo estudar a forma (distorções de um plano de referência) de uma frente de onda. Uma das leis básicas da óptica geométrica é a da reversibilidade dos raios e essa lei afirma que o caminho percorrido por um raio luminoso de um objeto a uma imagem é reversível e, portanto, idêntico àquele percorrido da imagem ao objeto. Dessa maneira um olho humano teoricamente perfeito convergirá todos os raios provenientes de um ponto no infinito para um único ponto na mácula e a frente de onda gerada por um ponto na mácula será perfeitamente plana ao sair do olho (Ilustração 37). Portanto, na maioria dos sistemas de análise de frente de onda estudamos as distorções presentes na frente de onda gerada por uma fonte luminosa puntiforme localizada na retina. Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 57 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 37. Representação esquemática de uma frente de onda gerada na mácula e se propagando pelas estruturas transparentes do olho. Note que nesse olho ideal a frente de onda emergente da córnea é plana A descrição de uma superfície complexa como a de uma frente de onda com aberrações requer ferramentas específicas. Os polinômios de Zernike são uma maneira de caracterizar e quantificar superfícies, permitindo a sua comparação. Para o entendimento dos polinômios de Zernike precisamos entender o que é uma decomposição física. Para serem estudados, os fenômenos físicos devem ser decompostos em um sistema convencional antes de serem comparados. Uma decomposição perfeita é aquela que permite, a partir de um fenômeno, gerar uma decomposição que é perfeitamente retrógrada, ou seja, a partir dos dados decompostos possamos reconstruir o evento. O raio de curvatura de uma circunferência é o único dado necessário para compararmos circunferências e as medidas dos três lados de um sólido retângulo são suficientes para compararmos o tamanho e volume de dois sólidos, pois com o raio de curvatura da circunferência e as medidas dos lados do sólido podemos reconstruir a circunferência e o sólido originais. A decomposição de uma superfície pelos polinômios de Zernike implica em definirmos algumas características e quantificarmos cada uma dessas características para aquela superfície, de tal maneira que com essas informações possamos reproduzir a superfície original. Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 58 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Para facilitar o entendimento vamos utilizar algumas características que podem estar presentes em qualquer superfície e que são de fácil visualização: (a) componente esférico e (b) componente cilíndrico. Imaginemos um plano perfeitamente horizontal (plano de referência), ao acrescentarmos a ele um componente esférico côncavo poderemos imaginar uma superfície em forma de calota. Se acrescentarmos agora um componente cilíndrico poderemos imaginar uma superfície com a forma de uma calota que tenha sido distorcida cilindricamente. Ou seja, com a informação de qual a quantidade e orientação dos componentes esférico e cilíndrico, poderemos reconstruir a superfície em questão e poderemos compará-la com qualquer outra em cada um de seus componentes (Ilustração 38). Ilustração 38. Demonstração da construção de superfícies por decomposição. (A): ao acrescentarmos um componente esférico a uma superfície plana esta assumirá a forma de uma calota. (B): ao acrescentarmos um componente cilíndrico a uma superfície plana esta assumirá a forma de um cilindro. (C): ao acrescentarmos um componente esférico e um componente cilíndrico a uma superfície plana esta assumirá a forma de uma calota distorcida. A superfície final pode ser decomposta em três componentes: a superfície plana (plano de referência), a superfície esférica e a superfície cilíndrica Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 59 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Os polinômios de Zernike são os componentes das superfícies e variam de componentes simples (como os descritos acima) até componentes altamente complexos. O conhecimento de um conjunto de coeficientes de Zernike de uma superfície permite a reconstrução da superfície sem a necessidade de outras informações. Por exemplo, se imaginarmos um plano definido pelas coordenadas cartesianas X e Y e, para cada um de seus pontos, definirmos uma altura W, uma superfície será plana e localizada sobre o plano referência se W for sempre igual a zero (Ilustração 39). Ilustração 39. Superfície plana onde todas as alturas (W) são constantes no plano cartesiano (X e Y) Se W aumentar com o aumento de X e Y teremos uma superfície côncava (Ilustração 40), já, se W aumentar com o aumento de X e diminuir em função de Y teremos uma superfície cilíndrica (Ilustração 41). Cada um dos polinômios de Zernike determina um comportamento específico de W em função de X e Y. Ilustração 40. Superfície côncava onde as alturas (W) aumentam em conjunto com X e Y. Note que o plano é mais elevado quanto mais ele se afasta da origem (X=0 e Y=0). Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 60 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 41. Superfície cilíndrica onde as alturas (W) aumentam em conjunto com o aumento de X e diminuem em relação a Y Como os componentes de Zernike medem o distanciamento de um plano de referência, a sua unidade é uma unidade de medida. Em oftalmologia a unidade mais utilizada é o mícron. Existem outros polinômios utilizados para a descrição de superfícies, como os polinômios de Seidel, no entanto os polinômios de Zernike se mostraram mais apropriados que os polinômios de Seidel para descrever as aberrações ópticas, pelo fato de que cada tipo de aberração é representado de forma única e independente pelo seu respectivo polinômio, como foi demonstrado em 1934 pelo próprio Zernike. Desta forma, a aberração total de um sistema óptico pode ser representada por uma soma apropriada, em termos destes polinômios, ponderados pelos seus respectivos coeficientes. O valor do coeficiente indica a contribuição de cada aberração específica na distorção total do sistema óptico. Como vimos anteriormente, uma superfície é a soma das suas aberrações específicas (polinômios de Zernike). Cada um dos polinômios representa a distância do plano de referência causada por aquele componente de aberração, a soma das distâncias de todos os componentes nos informa a aberração total de um sistema, ou seja, o distanciamento total da frente de onda para o plano de referência. Essas distâncias são ponderadas na forma de RMS (do inglês, Root Mean Square). No cálculo do RMS as distâncias são elevadas ao quadrado para a retirada dos sinais negativos e dessa maneira evitar que distâncias positivas anulem as distâncias negativas. Os polinômios de Zernike representam formas que variam de muito simples a muito complexas. Cada um dos polinômios tem três componentes: um fator de normalização, um componente radial (θ ) e um componente azimutal (ρ ) . Em uma Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 61 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor representação por coordenadas polares ( ρ,θ ) , ρ é polinomial e varia de zero a um, enquanto θ é sinusoidal e varia de zero a 2π . Cada polinômio tem duas características: a sua ordem (n) e a sua freqüência angular (m). A ordem está associada ao componente radial e representa a maior ordem encontrada no polinômio, por exemplo: um polinômio de segunda ordem tem em sua fórmula, no máximo, o expoente 2 (elevado ao quadrado) enquanto um polinômio de sexta ordem terá no máximo o expoente 6. Um exemplo de polinômio de quarta ordem seria o polinômio Z 42 ( ρ,θ ) = 10 (4 ρ 4 − 3ρ 2 )cos 2θ . Quanto maior a ordem de um polinômio, menores serão as suas irregularidades. A freqüência angular representa quantas vezes as alterações se repetem ao redor de uma circunferência, portanto está associada ao componente azimutal do polinômio. Um polinômio com freqüência angular de 4 significa que a cada 90 graus o padrão da aberração irá se repetir (Ilustração 42). Ilustração 42. Descrição dos componentes do polinômio de Zernike. Todos os polinômios de Zernike apresentam os mesmos componentes desse exemplo. Nessa representação por coordenadas polares , p é polinomial e varia de zero a um, enquanto θ é sinusoidal e varia de zero a 2π . Cada polinômio tem duas características: a sua ordem (n) e a sua freqüência angular (m). A ordem está associada ao componente radial e a freqüência angular está associada ao componente azimutal do polinômio Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 62 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Idealmente os polinômios devem ser representados por um esquema de indexação dupla com essas duas variáveis da seguinte maneira: Z nm . Em algumas situações opta-se pela indexação simples, onde o índice j é atribuído arbitrariamente e iniciase do zero (Tabela 1). Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 63 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Tabela 1. Expressão matemática de todas as aberrações de ordem mais baixa e mais alta Índice Ordem (j) (n) Freqüência Angular (m) 0 1 2 3 4 0 1 1 2 2 0 -1 1 -2 0 Indexação Simples Zj Z0 Z1 Z2 Z3 Z4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 2 3 3 3 3 4 4 4 4 4 5 5 5 5 2 -3 -1 1 3 -4 -2 0 2 4 -5 -3 -1 1 Z5 Z6 Z7 Z8 Z9 Z10 Z11 Z12 Z13 Z14 Z15 Z16 Z17 Z18 Indexação Dupla Z nm Z 00 Z1−1 Z11 Z 2−2 Z 20 Z 22 Z 3−3 Z 3−1 Z13 Z 33 Z 4−4 Z 4−2 Z 40 Z 42 Z 44 Z 5−5 Z 5−3 Z 5−1 Z15 Z nm ( ρ,θ ) Nome Usual Pistão Inclinação (Tilt) Inclinação (Tilt) Astigmatismo Defocus (Miopia ou Hipermetropia) Astigmatismo Trifólio (Trefoil) Coma Coma Trifólio (Trefoil) Quadrifólio (Quadrifoil) Aberração Esférica Quadrifólio (Quadrifoil) Coma Secundário Coma Secundário 1 2 ρ senθ 2 ρ cos θ 6 ρ 2 sen 2θ 3 (2 ρ 2 −1) 6 ρ 2 cos 2θ 8 ρ 3 sen 3θ 8 (3ρ 3 − 2 ρ ) sen θ 8 (3ρ 3 − 2 ρ ) cos θ 8 ρ 3 cos 3θ 10 ρ 4 sen 4θ 10 (4 ρ 4 − 3ρ 2 ) sen 2θ 5 (6 ρ 4 − 6 ρ 2 + 1) 10 (4 ρ 4 − 3ρ 2 ) cos 2θ 10 ρ 4 cos 4θ 12 ρ 5 sen 5θ 12 (5 ρ 5 − 4 ρ 3 ) sen 3θ 12 (10 ρ 5 −12 ρ 3 + 3ρ) sen θ 12 (10 ρ 5 −12 ρ 3 + 3ρ) cos θ Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 64 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor 19 20 21 22 23 24 5 5 6 6 6 6 3 5 -6 -4 -2 0 Z19 Z 20 Z 21 Z 22 Z 23 Z 24 Z 53 Z 55 Z 6−6 Z 6−4 Z 6−2 Z 60 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 6 6 6 7 7 7 7 7 7 7 7 2 4 6 -7 -5 -3 -1 1 3 5 7 Z 25 Z 26 Z 27 Z 28 Z 29 Z 30 Z 31 Z 32 Z 33 Z 34 Z 35 Z 62 Z 64 Z 66 Z 7−7 Z 7−5 Z 7−3 Z 7−1 Z17 Z 73 Z 75 Z 77 Aberração Esférica Secundária 12 (5 ρ 5 − 4 ρ 3 ) cos 3θ 12 ρ 5 cos 5θ 14 ρ 6 sen 6θ 14 (6 ρ 6 − 5 ρ 4 ) sen 4θ 14 (15 ρ 6 − 20 ρ 4 + 6 ρ 2 ) sen 2θ 7 (20 ρ 6 − 30 ρ 4 + 12 ρ 2 −1) 14 (15 ρ 6 − 20 ρ 4 + 6 ρ 2 ) cos 2θ 14 (6 ρ 6 − 5 ρ 4 ) cos 4θ 14 ρ 6 cos 6θ 4 ρ 7 sen 7θ 4 (7 ρ 7 − 6ρ 5 ) sen 5θ 4 (21ρ 7 − 30ρ 5 + 10 ρ 3 ) sen 3θ 4 (35 ρ 7 − 60ρ 5 + 30 ρ 3 − 4 ρ ) sen θ 4 (35 ρ 7 − 60ρ 5 + 30 ρ 3 − 4 ρ) cos θ 4 (21ρ 7 − 30ρ 5 + 10 ρ 3 ) cos 3θ 4 (7 ρ 7 − 6ρ 5 ) cos 5θ 4 ρ 7 cos 7θ Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 65 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Na Ilustração 43 podemos ver gráficos, em três dimensões, dos 15 primeiros Polinômios de Zernike da Tabela 1, gerados no programa Matlab 76. É a combinação linear de cada um destes polinômios que permite gerar padrões que descrevem as imperfeições ópticas do olho. Utiliza-se estes primeiros 15 termos para cálculo dos coeficientes que descrevem a frente de onda do olho artificial. Ilustração 43. Forma tridimensional dos quinze primeiros termos do polinômio de Zernique. A complexidade das formas é crescente a medida que os termos são mais elevados A equação fundamental de Zernique pode ser utilizada com o número de termos que se desejar. Quanto maior o número de termos, maior a precisão na interpolação da frente de onda 77. Para o cálculo dos coeficientes de cada polinômio, como vimos anteriormente, utiliza-se o método da raiz quadrada média 78 . Tal valor conforme já observado, representa a distância entre dada aberração e um plano perfeito. Pode-se somar Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 66 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor em termos absolutos as aberrações de duas ou mais superfícies e chegar-se aos RMS totais, ou à soma dos RMS das aberrações de baixa e de alta ordem. Caracterização Fisiológica das Aberrações A manipulação de dados derivados das irregularidades de cada superfície matematicamente determinada não é um problema atual, porém seu entendimento é. Os aberrômetros fornecem dados numéricos agrupados e isolados de quantas superfícies forem necessárias para montar um quadro geral das irregularidades de qualquer sistema visual. A diferença entre a superfície perfeita e a atualmente reconhecida é denominada de raiz quadrada média, que entendemos como o desvio absoluto do ideal (RMS). O RMS de cada superfície deve ser encarado com extrema cautela, pois uma irregularidade pode anular outra. Por exemplo, um olho com aberração do tipo coma, pode ter parte da mesma anulada pela aberração denominada de tricorno, ou “trifoil”. Clinicamente julgou-se pertinente dividir as aberrações em baixa e alta ordem, pois em geral, as primeiras são maiores e mais significantes, inclusive do ponto de vista de prejuízo visual, que as segundas. Vale lembrar que as primeiras (baixa ordem) são as passíveis de correção com óculos. Temos então o RMS conjunto das aberrações de baixa ordem, e o restante, que é o RMS das aberrações de alta ordem. Somente para motivos comparativos interessa ter RMS isolados, como quando comparamos pré e pós-operatório de diferentes zonas ópticas de Excimer laseres, e queremos, por exemplo, determinar qual zona óptica produz maior aumento da aberração esférica. Para avaliações individuais é pouco importante o valor de cada aberração isolada, uma vez que, como já dissemos, as irregularidades de uma superfície, podem anular parcialmente as irregularidades da outra. Temos, portanto um RMS que chamamos de RMS baixa (baixa ordem) e um RMS alta (alta ordem) para cada tamanho de pupila (Ilustração 44). Caracterização Fisiológica das Aberrações - Página 67 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 44. RMS de baixa ordem (3 primeiros termos da esquerda para a direita) e RMS de alta ordem (próximos 9 termos), de um olho virgem de cirurgia corneana com pupila de 6 mm e de 9 mm. Note-se o aumento significativo do RMS, que na realidade represneta uma extrapolação de valores, pois o indivíduo não apresentava dilatação pupilar quando do exame Como os RMS, que revelam as irregularidades das superfícies, são expressos em unidades de tamanho, traduzidos por elevação em relação a um plano, devemos nos familiarizar com o conceito de micra, em se tratando de RMS. Os RMS baixa tem sistematicamente valores maiores que os RMS alta, e os aparelhos acabam por sugerir uma escala própria para estes valores. Os RMS alta são geralmente mais de 8 valores, e possuem escala própria. Não há uma sistemática de valores maiores ou menores no RMS alta, porém em geral os maiores termos de Zernique determinam RMS menores, a partir de um certo valor. Aberração Esférica e o Tamanho da Pupila A análise das frentes de onda materializa a importância da pupila no sistema visual. Por se tratar de um obstáculo relativamente descentralizado no caminho óptico da luz, a pupila irá determinar a forma final da superfície correspondente a cada paciente. Ela irá bloquear raios ou frentes de onda periféricas, e permitirá a Aberração Esférica e o Tamanho da Pupila - Página 68 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor observação de uma mapa da luz efetiva. Diferente da topografia corneana, onde toda, ou quase toda a córnea é mapeada, a pupila irá restringir o mapeamento óptico ocular. Anteriormente citamos que o centro da pupila não determina o caminho mais efetivo dos raios que unem o objeto à mácula, mas parece ser o ponto onde as aberrações fisiológicas oculares tem menor importância. Isso pois a pupila bloqueia, como um diafragma, os raios paracentrais, que carregam consigo a aberração esférica. A aberração esférica faz parte de qualquer sistema óptico onde a lente seja relativamente esférica, e naturalmente tenha maior vergência em sua periferia do que em sua porção central (Ilustração 45), formando uma função de espalhamento de ponto com borramento circunferencial. Ilustração 45. Lente de 20D esférica sobre retícula impressa. Note-se a deformação periférica (aberração esférica) dos quadrados em relação ao centro da imagem As aberrações esféricas são há muito conhecidas e combatidas nos sistemas ópticos artificiais, principalmente com a interposição de diafragmas que bloqueiam os raios paracentrais. Tal ato, porém diminui a eficiência luminosa do sistema, limitando a entrada de luz e conseqüentemente diminuindo o contraste de nitidez do mesmo. Outra forma de compensar a aberração esférica é o aplanamento periférico de lentes positivas, que passam a refratar menos a luz paracentral (Ilustração 46), diminuindo o borramento da função de espalhamento de ponto. Aberração Esférica e o Tamanho da Pupila - Página 69 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 46. Lente de 20D anesférica sobre retícula impressa. Note-se a menor deformação periférica (aberração esférica) dos quadrados em relação a lente esférica As soluções apresentadas são literalmente copiadas da natureza, que as utiliza há milhões de anos em animais. Nossa córnea não é esférica, mas relativamente asférica, com a periferia mais plana que o centro, e nossa pupila é um diafragma dinâmico, que bloqueia os raios paracentrais mais eficientemente em condições fotópicas, onde há luz abundante para que não haja perda de contraste, e bloqueia parcialmente os raios paracentrais em condições mesópicas e escotópicas, onde deve haver um compromisso entre a quantidade de luz e o bloqueio paracentral. Com base nisso entendemos a direta relação entre a pupila e a aberração esférica. Também percebemos a extrema importância da determinação do tamanho da pupila frente a qualquer exame de frentes de onda, sem o que estaríamos comparando um sistema óptico com outro diferente. Devemos, portanto ter o melhor domínio sobre a pupila para poder interpretar corretamente os dados das análises de frente de onda. Não basta a medida externa do tamanho pupilar, há de se registrar a curva de miose induzida por luz, a regularidade da pupila, seu estado de repouso e a máxima miose (Ilustração 47), além de determinar e sobrepor seu centro ao centro visual, e preferencialmente usar o último como referência para o tratamento fotorefrativo. Aberração Esférica e o Tamanho da Pupila - Página 70 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Ilustração 47. Imagem da pupila de um indivíduo normal, e gráfico da posição relativa do centro da pupila de entrada e da resposta a condições de luminosidade crescente Coma e Descentralizações A adaptação de um sistema de notação puramente físico, para o olho humano, repleto de peculiaridades evolucionais e funcionais é problemática. Várias aberrações de alta ordem não encontram explicação fisiológica cabível. Como iremos relacionar as dobraduras quadráticas, ou quadrifoils, com algum fenômeno perceptível na nossa visão? Eventualmente teremos abstrações que devem ser entendidas como parte de um todo, sem relevância clínica por si só. Entretanto é surpreendente a utilidade dos polinômios e aberrações decorrentes dos mesmos em alguns fenômenos visuais. A aberração esférica já foi exemplificada acima, e o coma faz parte do grupo de aberrações que podem ser encaixados em algumas situações fisiológicas. Uma superfície com coma caracteriza-se por uma elevação seguida de depressão em um mesmo meridiano, determinando uma área da maior vergência adjacente a Coma e Descentralizações - Página 71 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor uma área de menos vergência. A função de espalhamento de ponto produz nessa condição um borramento que lembra a cauda de um cometa, com uma porção mais densa (o cometa) e um borramento triangular (Ilustração 48). A percepção deste fenômeno aparentemente é o de uma duplicidade de objetos 38 , sendo um deles nítido, e o outro borrado e deslocado para uma direção definida. Ilustração 48. Mapa clínico de aberrações totais com função de espalhamento de ponto de um sistema óptico com aberração do tipo coma significante. O mapa superior esquerdo simula a acuidade visual potencial desse sistema óptico. O mapa inferior esquerdo representa a distribuição bidimensional, com escala de cores, da aberrações de alta ordem. O mapa superior a direita exprime a função de espalhamento de ponto, podendo ser observada uma imagem identificada com coma. Na tabela inferior a direita observa-se o valor numérico dos RMS de cada aberração isolada A percepção da imagem não depende somente da função de espalhamento de ponto. Esta é somente uma representação artificial da suposta imagem retiniana, que deverá ser previamente processada nas camadas retinianas, e posteriormente Coma e Descentralizações - Página 72 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor processada no cérebro. Por tal motivo nem todos os tipos de coma são percebidos como duplicidades. Comas presentes a mais tempo no sistema visual são geralmente processados e interpretados como imagens relativamente nítidas, e aberrações de aparecimento recente, como os induzidos por cirurgias, são notados imediatamente e tendem a diminuir (sua percepção) com o tempo. Duas situações interessantes que cursam com o coma são o ceratocone e as descentralizações cirúrgicas. No primeiro caso temos o coma presente em todos os ceratocones não centrais. A própria definição de ceratocone, que trata de um abaulamento corneano localizado, carrega o coma consigo, pois a área abaulada produz maior vergência, e a área adjacente produz menor vergência, coincidindo com a figura teórica de tal aberração. As descentralizações podem ser maiores que 2 mm ou menores que isso. Tal valor aparentemente divide a significância clínica das mesmas 79 . Tradicionalmente mede-se a descentralização em relação ao centro geométrico da pupila de entrada, mas como já vimos, idealmente deveríamos medir a descentralização em relação à linha de visão, pois esta determina o caminho dos raios que unem o objeto á mácula. Temos, portanto uma segunda fonte de erro, que geralmente é pequena demais para ser considerada, que é a distância entre o centro da pupila de entrada e o intercepto corneano da linha de visão (ângulo kappa). Do ponto de vista clínico sabemos que existem sintomas quando a área mais profunda do tratamento, que define o alinhamento dessa nova “lente” esculpida na córnea, se encontra distante do centro da pupila de entrada. Novamente definimos coma nessa situação, pois teremos uma região com alta vergência (no caso divergência se for tratada miopia), adjacente a uma área com menor vergência. As duas áreas devem obviamente contribuir para a formação da imagem, ou seja, não ser bloqueadas pela pupila, para determinar o borramento em forma de cauda de cometa, ou coma. Prejuízo Visual das Aberrações A correlação clínica das aberrações é tema complexo pois inclui a percepção de cada indivíduo. Não há diferenciação possível entre o borramento de uma miopia e de uma hipermetropia da mesma monta, na vigência da cicloplegia. O sistema visual Prejuízo Visual das Aberrações - Página 73 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor não entende se a luz que chega dispersa à retina provém de um ponto, ou se dirigese a um ponto. Só enxergamos um borrão. Temos dificuldade em relacionar o astigmatismo a um sinal visual distinto. Dizemos que o indivíduo com astigmatismo enxerga um borrão inclinado quando olha para um ponto luminoso. Vimos anteriormente que o coma produz a mesma impressão, e provavelmente o tricorno também permite tal interpretação. Se a aberração for de longa data, então a percepção será diferente, podendo ser ainda menor. Apesar disso, há uma certa correlação clínica entre as aberrações medidas individualmente e sintomas específicos. A diplopia monocular aparentemente se relaciona ao coma vertical (em todos os tamanhos de pupila), a diferença entre a visão dupla do astigmatismo e a do coma, é que a primeira desaparece com a correção dos óculos. O deslumbramento ou glare e o efeito de espalhamento ou starburst se correlacionam com a aberração esférica e com a aberração total em pupilas em condições escotópicas. Talvez a evolução tecnológica produza comparadores diagnósticos individuais que gerem padrões isolados, e que o paciente possa interpretar como sua queixa principal, mas em se tratando de percepção visual, sabemos que os progressos e implementações são lentos e difíceis. Ainda mantemos crença nas tabelas de optotipos escritos em alto contraste, como a presente nos projetores de optotipos de nossos consultórios. Pouco utilizamos as tabelas de baixo contraste, os testes de ofuscamento ou questionários de função visual. Tais instrumentos são restritos, pois a complexidade e o tempo de execução geralmente não são compensados por medidas objetivas que possam ser utilizadas para diagnóstico, e muito menos para terapêutica dos vícios refracionais, incluídas as aberrações de alta ordem. Um instrumento interessante a ser observado para a clínica refrativa é a tabela de acuidade visual em baixo contraste onde as letras são iluminadas e o fundo escuro. Tal arranjo maximiza o efeito deletério proveniente da luz sobre os optotipos, e teoricamente determina melhor o prejuízo visual das aberrações, sem no entanto discriminar a origem do mesmo. A atual oftalmologia trata de aberrações de baixa ordem. Oferece visão compatível com atividades diárias (em geral diurnas). Prefere soluções universais de praticidade Prejuízo Visual das Aberrações - Página 74 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor inquestionável. Trata de inovações tecnológicas como produto externo, sem uma necessária aplicação clínica. É vulnerável a campanhas de marketing e interesses laicos. A função da Universidade é a de transformar criticamente a classe formadora de opinião do amanhã, dotando-lhes de conceitos básicos fundamentais para que os jovens possam determinar o caminho de sua ciência e de sua crença. Correção Corneana Guiada por Aberrometria As correções personalizadas devem ser entendidas a partir do final do parágrafo anterior, com suas vantagens e limitações. Devemos oferecer vantagens para indivíduos bem adaptados? Os riscos inerentes ao procedimento são menores que a possibilidade de melhora de sintomas que julgamos conhecer? Podemos acreditar na estabilidade do sistema visual ao longo dos anos? Devemos consumir mais tecido para tratamentos de aberrações individuais? Temos instrumentos para medir nosso resultados? Estas e outras perguntas, ainda sem resposta absoluta, fazem-nos evoluir e nos orgulhar de pertencer a uma geração que pode vivenciar transformações e questionamentos científicos e éticos. Os tratamentos guiados por aberrometria são uma revolução tecnológica na instrumentação cirúrgica corneana. Foi possível, graças aos conceitos de livre mercado e acirrada concorrência, importados pelo modelo capitalista de gestão, desenvolver em tempo extremamente curto uma interface entre mapas diagnósticos e ações terapêuticas. A tentativa inicial de ligação foi realizada entre o mapa de curvatura corneana e o excimer laser. Para tanto foi necessário modificar o mapa de curvatura para um mapa de elevação, e deve-se entender tal mapa de elevação, como um modelo a partir do primeiro sendo portanto, um mapa teórico. Mesmo assim, tais mapas foram analisados e vários programas escritos para que ablações de feixes estreitos de excimer laser pudessem rastrear os mesmos e gerar mapas mais homogêneos. O chamado topo-link foi testado por nosso grupo há alguns anos, já com um dos primeiros sistemas de acoplamento espacial, ou “eyetracking”, entre uma referência no plano corneano, e o feixe de laser. Os resultados desses tratamentos foram Correção Corneana Guiada por Aberrometria - Página 75 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor restritos a poucos pacientes, nos quais observou-se uma diminuição da irregularidade da córnea e discreta melhora da visão e das queixas de borramento (Ilustração 49). A estratégia de tratar a córnea faz enorme sentido, uma vez que essa superfície, como vimos anteriormente, é responsável por mais de 90% da eficiência do sistema visual. Também é lembrado o fato de estarmos familiarizados com os topógrafos corneanos há décadas, havendo inúmeros meios de avaliar mapas corneanos, e determinar sua homogeneidade. Ilustração 49. Mapa da curvatura anterior de um paciente submetido a ablação guiada pela topografia. O mapa da esquerda demonstra o estado pré-operatório e o da direita o estado pós-operatório de 3 meses após ablação personalizada sob flap (Topolink em LASIK) Contudo o apelo mercadológico e mesmo a consistência de um argumento científico fizeram a maioria das empresa optar pelo uso da análise de frentes de onda como método diagnóstico a partir do qual o tratamento deveria ser realizado. O apelo de mercado se justifica à medida que o topógrafo não geraria novas receitas, pois é um instrumento já presente em inúmeras clínicas, e o argumento científico Correção Corneana Guiada por Aberrometria - Página 76 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor baseia-se em que os aberrômetros analisam todo o sistema visual, e não somente 93% dele. Na realidade há outro argumento que deve ser lembrado. O aberrômetro avalia o sistema óptico alinhado fisiologicamente. Sua leitura se dá a partir dos raios que deixam o olho e não são bloqueados pela pupila, porém nenhum ponto de referência externa, como o ápice da córnea, é utilizado e temos, portanto, um mapa pupilar com alinhamento do objeto à mácula (linha de visão). Um dos desafios atuais é exatamente dotar os novos topógrafos desse alinhamento fisiológico, e do bloqueio pupilar natural. Com as ferramentas tecnológicas disponíveis, o mercado preparado, e o entendimento dos processos fisiológicos em mente, desenvolvemos vários raciocínios manifestos em congressos e artigos 66, 67 , sobre as indicações e limitações dos tratamentos personalizados. Concordamos em haver hoje em dia indicações específicas para os tratamentos personalizados, como estados pós-operatórios complicados com descentralizações, por exemplo 79 . Os retratamentos de córneas hipo ou hipercorrigidas, que antes tinham resultados limitados com a técnica de PRK e depois tiveram melhorias na previsibilidade com o LASIK 80 , e especificamente as córneas com superfícies irregulares, sem dúvida, também passam pelo tratamento personalizado. Os resultados obtidos em córneas virgens de cirurgias são encorajadores, e devemos rever as indicações de tratamentos personalizados após a publicação desses resultados. Estamos nos familiarizando com novos mapas de aberrações, e achamos ser necessário o julgamento de condições psicofísicas previamente e posteriormente ao procedimento, sob pena de concluirmos sobre valores científicos sem correspondência clínica. Graças ao espírito inovador desta instituição, pudemos testar tais tratamentos personalizados em um número ainda restrito de indivíduos, e várias conclusões foram de encontro às teorias apresentadas. Realmente há um aumento menor das aberrações esféricas nos pacientes tratados de modo personalizado, porém não há uma resposta inequívoca de preferência por tal tratamento em comparação com o tratamento convencional. A literatura tem mostrado os mesmos resultados, sempre apontando dados matemáticos e poucas intervenções sensoriais mais completas. Correção Corneana Guiada por Aberrometria - Página 77 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Vemos na aberrometria um instrumento diagnóstico moderno que permite ampliar várias fronteiras, desde a acomodação até a correção visual. Vários desenvolvimentos estão sendo realizados e novas tecnologias serão apresentadas, porém o mote continua. Das mudanças ocorridas nos últimos anos em cirurgia refrativa e óptica fisiológica, a maior foi a análise crítica do processo. Como em qualquer campo da tecnologia, política e arte, a cada ação corresponde uma reação, e nosso espírito crítico construtivo deve estar sempre presente, justificando nossa diferença no cenário global. Correção Corneana Guiada por Aberrometria - Página 78 Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Bibliografia 1. Gilheany, S. Moore´s Law. Archive Planning 1999;3(4):http://www.archivebuilders.com/pdf/22017v005.pdf. 2. Moravec, H. When will computer hardware match the human brain? 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