Uma nova visão da importância da preparação física no futebol Determinante do alto rendimento não está relacionado ao aumento das capacidades físicas, e sim ao destaque técnico ao sistema equilibrado de jogo dentro das estratégias ofensivas e defensivas Sandro Sargentim* Ao analisarmos os desportos de uma forma geral, percebemos que na maior parte das vezes certos esportes tem uma predominância maior da preparação física quando comparado com outros esportes. No atletismo, na natação, no remo, levantamento de peso, e muitos outros esportes, a preparação física, através de suas específicas capacidades, é determinante para o alto desempenho em cada modalidade. A técnica nesses casos tem sua importância, contudo não são determinantes para o alto desempenho. Em outros esportes como o futebol, basquete, vôlei, handball, entre tantos, o determinante para o alto rendimento são os aspectos técnicos e táticos, sendo esses componentes essenciais para o alto desempenho do atleta ou da equipe. A preparação física, apesar de muito importante, não é determinante para o desempenho do atleta e tampouco da equipe. Para analisar esse panorama, podemos traçar dois exemplos em dois esportes tão distintos: um corredor de cem metros e um atleta de futebol. Para o corredor, a técnica e a estratégia de corrida são importantes. Com esses componentes é possível o atleta melhorar seu tempo e subir de patamar no decorrer de sua carreira. Contudo, o detalhe essencial para o corredor ser mais veloz é o aumento das capacidades físicas específicas de sua modalidade. Se as capacidades físicas não aumentarem significativamente, de pouco adiantará a melhora da técnica e da estratégia de corrida, e os tempos dificilmente melhorarão. No caso do futebolista, existe uma inversão de valores quando comparado ao exemplo anterior. O atleta de futebol, por mais que melhore suas capacidades físicas, que pode e certamente ajudarão na melhora do desempenho, conseguirá o sucesso na sua atuação com uma grande técnica e uma estrutura estratégica sólida de sua equipe. O determinante do alto rendimento do futebolista não está relacionado com o aumento de suas capacidades físicas, e sim com o destaque técnico e com o sistema equilibrado de jogo dentro das estratégias ofensivas e defensivas. O que está sendo discutido aqui não é se o preparador físico é menos ou mais importante que se pensava, e sim a necessidade de refletir em que ponto os preparadores físicos podem e devem agir para contribuir com a melhora de rendimento dos atletas e de sua equipe. O desempenho atlético do futebolista pode não ser o determinante para o alto rendimento do atleta ou da equipe, mas sem sombra de dúvida ele interfere na melhora das ações motoras de alta intensidade para a execução dos sistemas de jogo e dos componentes técnicos dos futebolistas. Para que o atleta de futebol possa atuar através dos seus componentes técnicos e cumprir as ações ofensivas e defensivas dentro dos sistemas de jogo definidos pela equipe técnica, ele precisa desenvolver as ações motoras de forma plena, com movimentos potentes, intensos, rápidos, precisos e sem a presença de fadiga. O futebol é um esporte, por isso deve ser tratado como um desporto seguindo diretrizes e leis que regem as modalidades esportivas. Cabe aos profissionais que compõem a preparação física atualizada dentro do futebol, atenção às mudanças e atualizações e cumprir de forma específica e pontual as reais funções de cada membro da equipe interdisciplinar que compõe as comissões técnicas. O preparador físico atualizado deve estar cada vez mais atento a melhora do padrão motor dos gestos específicos recorrentes à atuação dos mesmos dentro do campo de jogo. A tendência do preparador físico é cada vez mais dar menos atenção aos valores absolutos de Vo2 máx, limiares, alturas de salto, e tantos outros, e sim buscar um maior equilíbrio muscular e um melhor padrão de movimento possibilitando gestos específicos intensos e potentes determinantes nas principais ações dos futebolistas. Cada dia mais o preparador físico com os estudos e os dados científicos em mãos pode elaborar exercícios com transferência para a modalidade. No caso do futebolista, os exercícios devem estar relacionados com os movimentos específicos do jogo de futebol. O treinamento que gera alto rendimento para o futebolista é dividido em dois treinos: 1 - Treino com bola - determinante para o alto rendimento do atleta de futebol e para a definição do padrão de jogo bem como suas estratégias ofensivas e defensivas. Nesse treino, a resistência específica é aprimorada ou mantida por arrasto. 2 - Treino de força - essencial para a melhora dos movimentos específicos potentes do futebolista, bem como importante para o equilíbrio corporal e muscular, determinante como profilaxia de lesões musculares e articulares. Não podemos confundir treino de força com treino de musculação em aparelhos de forma tradicional. Quando citamos treino de força, nos referimos àquelas ações que estimulam os movimentos através de ações com pouca ou nenhuma sobrecarga, em cadeia cinética fechada, estimulando os exercícios com peso corporal acrescentando poucos acessórios relacionados ao Treinamento Funcional. Dia após dia os preparadores físicos devem estar interligados dentro dos treinamentos específicos e através desses procurar direcionar as capacidades físicas através dos modelos de jogo pré-estabelecidos pelos técnicos. Ao mesmo tempo dentro da sequência dos treinamentos específicos, atividades de potencialização do rendimento de força devem ser aplicadas de forma pontual proporcionando transferência do gesto do treino de força para as ações realizadas dentro do jogo de futebol, equilibrando o atleta e gerando uma maior possibilidade de ações intensas, com a qualidade de execução para que os gestos técnicos possam ser realizados com propriedade sem perda da qualidade do movimento. Pouco importa quantos metros o futebolista percorre no campo e tampouco a sua velocidade média dentro de cada partida. O importante é que cada ação de alta intensidade possa ser feita de forma plena e potente, e que o atleta de futebol consiga realizar todas essas ações sem a presença de fadiga evitando a queda de rendimento tão temida na partida ou ao longo da temporada anual. Para que essas ações de alta intensidade ocorram de forma potente e uniforme ao longo do jogo de futebol o treino de força é essencial, equilibrando os futebolistas para as ações específicas determinantes do alto rendimento. *Sandro Sargentim é preparador físico de futebol e autor do livro "Treinamento de força no futebol". Além disso, é docente no curso de pós graduação em Treinamento Desportivo UNiFmu/Gama Filho e Treinamento Funcional - Ceafi e coordenador da pós graduação em Ciências no Futebol - UniFmu.