O
NOVO
DESENVOLVIMENTISMO
E
A
MACROECONOMIA
ESTRUTURALISTA: CONSIDERAÇÕES ACERCA DAS CONTRIBUIÇÕES
DE BRESSER-PEREIRA
Lauro Mattei1
Resumo
O debate sobre o modelo de desenvolvimento brasileiro retornou à agenda pública na primeira
década do Século XXI, após mais de duas décadas de domínio do pensamento econômico
ortodoxo, que estimulou os países subdesenvolvidos a adotar políticas econômicas liberalizantes
como estratégia para recuperar o crescimento. É neste contexto que se formou o pensamento
“Novo Desenvolvimentista”, o qual contou com a expressiva participação do professor BresserPereira. Com isso, o objetivo do artigo é fazer uma síntese da trajetória desse autor neste debate,
ressaltando-se a importância do mesmo, tanto em termos de sua contribuição para manter o
debate sobre o desenvolvimento na agenda pública como na construção de uma nova abordagem
teórica denominada de “macroeconomia estruturalista do desenvolvimento”.
Palavras-chave: Bresser-Pereira, Novo Desenvolvimentismo, Macroeconomia Estruturalista.
Código JEL: O10
Abstract
The debate regarding Brazil’s development model returned again to the public arena in the first
decade of 21st Century after two decades of orthodox economic policies which encouraged nondeveloped countries to adopt liberal economic policies as their preferred growth strategies. It is
in this context that a new development theory – New Developmentalism – emerges, which one
has had an important participation of professor Bresser-Pereira. The main objective of this article
is to make a synthesis of professor Bresser-Pereira contributions in this debate, and highlight the
importance of him in both contributions in maintaining the development debate in the public
agenda as well as proposing a new theoretical approach called “structuralist macroeconomic
development”.
Key-words: Bresser-Pereira, New Developmentalism, Structuralist Macroeconomics
JEL Code: 010
1
Professor dos cursos de Graduação e de Pós-Graduação em Economia e de Pós-Graduação em
Administração, ambos da UFSC. Email: [email protected]
INTRODUÇÃO
Passada a avalanche neoliberal dos anos de 1990, o tema do desenvolvimento
voltou a ocupar o centro dos debates no Brasil e na maioria dos países considerados
subdesenvolvidos nos primórdios do século XXI. Em grande medida, pode-se afirmar
que o predomínio daquelas políticas neoliberais foi fortemente influenciado pelo ideário
político emanado dos países centrais e consubstanciado no chamado “Consenso de
Washington”. Em linhas gerais, esse consenso definiu que a melhor estratégia de
enfrentamento da crise, por parte dos países periféricos, seria a desregulamentação
completa de suas economias como forma de atrair novos investimentos externos e
possibilitar a livre mobilidade dos capitais.
Assentados nos princípios da ortodoxia convencional, organismos internacionais
– particularmente o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional – passaram a
receitar um conjunto de políticas macroeconômicas destinadas à promoção da
liberalização comercial, de modo a possibilitar uma ampliação do comércio
internacional, bem como de estímulo ao livre funcionamento dos mercados financeiros,
por acreditarem que estes mercados são autorregulados e capazes de garantir a
estabilidade e o crescimento econômico.
Complementarmente a isso, receitou-se também a adoção de programas de
privatizações de empresas estatais, sendo esta a melhor forma de atacar os problemas
fiscais dos estados nacionais. Com isso, acreditava-se que o tripé básico “liberalização
comercial”, “desregulamentação financeira” e “privatização das empresas estatais” seria
capaz de levar automaticamente os sistemas econômicos a um patamar de crescimento
superior aos níveis verificados durante os períodos de crises.
Na prática, porém, esse tripé ortodoxo convencional promoveu uma forte
elevação das taxas de juros com impactos negativos sobre as taxas de investimentos e
sobre o crédito aos empresários e aos consumidores, bem como estimulou uma taxa de
câmbio sobreapreciada, que gerou enormes déficits em conta corrente. A consequência
imediata é que a entrada de capitais para financiar esses déficits endivida os países,
tornando-os cada vez mais dependentes desses capitais, ao mesmo tempo em que
cimenta o caminho para a formação de crises de balanço de pagamentos.
O Brasil adotou essa estratégia de forma mais articulada a partir de 1994 com o
Plano Real, cujo principal objetivo era debelar o processo inflacionário e garantir a
estabilidade macroeconômica através da estabilidade dos preços. Para tanto, adotou-se
uma política cambial rígida e uma política de juros extremamente elevada,
comparativamente a outros países em situação idêntica. Com isso, segundo BRESSERPEREIRA & NAKANO (2002), construiu-se a armadilha dos juros que levou a um
equilíbrio perverso em que a política econômica tornou-se incapaz de estimular a
retomada do desenvolvimento.
Essa estratégia, mesmo que tenha conseguido estabilizar o processo
inflacionário, se transformou em um dos principais impeditivos para que não fosse
viabilizada a retomada do crescimento do país ainda na década de 1990. Assim, “o
plano econômico brasileiro fracassou não apenas porque não logrou retomar o
desenvolvimento: na verdade, não chegou sequer a estabilizar macroeconomicamente o
país, de forma que deixa uma herança pesada para o futuro governo em termos de altas
dívidas – interna, ou do estado, e externa, ou do país – e de altos déficits – público ou
do estado, e externo, ou da nação. Dívidas e déficits que se espelham nas mais altas
taxas de desemprego que o país já teve” (BRESSER-PEREIRA, 2002: 364).
Em grande medida, foi a partir das discussões desses problemas que se formou a
corrente do “Novo Desenvolvimentismo” durante a primeira década do século XXI.
Para tanto, o principal objetivo deste estudo é recuperar as contribuições do professor
Bresser-Pereira nesse debate. Além dessa breve introdução, o artigo contém mais três
seções. A primeira delas faz uma breve síntese da trajetória da participação desse autor
nos debates recentes sobre o “novo desenvolvimentismo”, enquanto que a segunda
seção apresenta de forma sistematizada os principais elementos teóricos presentes
naquilo
que
esse
autor
denomina
de
“macroeconomia
estruturalista
do
desenvolvimento”. A terceira seção apresenta as considerações finais do trabalho,
momento em que são sistematizados os principais aspectos desse debate, ressaltando-se
a importância da nova abordagem teórica proposta pelo autor aqui estudado.
1 – BREVE SÍNTESE DA TRAJETÓRIA DE CONTRIBUIÇÕES DE BRESSERPEREIRA NOS DEBATES SOBRE O NOVO DESENVOLVIMENTISMO2
Esta seção tem por objetivo sistematizar a trajetória e as principais contribuições
do autor nos debates sobre o “Novo Desenvolvimentismo”, bem como as produções
acadêmicas que ocorreram sob sua liderança na Escola de Economia da Fundação
Getúlio Vargas de São Paulo. Ressalta-se que optamos por trabalhar apenas com textos
de autoria e em coautorias, o que significa que estamos desconsiderando os esforços que
também podem estar sendo feitos por outros membros desse grupo de pesquisadores da
FGV-SP.
Mesmo que no início dessas discussões o professor Bresser-Pereira tenha focado
suas análises nas inconsistências da política econômica, registra-se que atualmente ele
se
transformou
em
um
dos
principais
nomes
nos
debates
sobre
“novo
desenvolvimentismo” brasileiro, inclusive apresentando recentemente uma matriz
teórica para a interpretação da temática3, a qual será objeto de análise na seção seguinte.
De uma maneira geral, entendemos que a trajetória da produção acadêmica pode
ser dividida em três momentos distintos, muito embora o próprio Bresser-Pereira
sempre gosta de afirmar que há mais de trinta anos está estudando o assunto. No
primeiro momento, destacamos alguns textos4 cujo foco diz respeito à análise da
política econômica adotada após a estabilização econômica (Plano Real). Partindo do
pressuposto que os oitos anos do Governo FHC (1995-2002) foram frustrantes no plano
econômico, afirma-se que a causa desse mau desempenho se deve a “ao erro de agenda,
pois ao invés de definir o desequilíbrio externo como o principal problema a ser
enfrentado, o governo continuou a dar prioridade a um problema já basicamente
equacionado – o da inflação” (BRESSER-PEREIRA, 2002:360).
2
- Esta seção está parcialmente baseada em partes do artigo “Gênese e Agenda do Novo
Desenvolvimentismo Brasileiro”, de minha autoria e que foi apresentado no IV Encontro da AKB.
3
4
- Uma resenha da produção sobre essa temática encontra-se em Bresser-Pereira (2011).
Destacam-se os textos Macroeconomia do Brasil pós 1994 (2003); Macroeconomia Pós-Plano Real: as
relações básicas (2005); e Financiamento para o subdesenvolvimento (2002)
Em grande medida, o autor explica essa opção a partir de dois elementos: por um
lado, o país seguiu acriticamente a receita de subdesenvolvimento do Segundo
Consenso Washington5 e, por outro, a alienação das elites que, da mesma forma que
reproduzem os padrões de consumo do centro, reproduzem também suas ideias. No
primeiro caso, estimulou-se como estratégia de desenvolvimento que países altamente
endividados, como era o caso do Brasil, deveriam se endividar ainda mais. Para tal, foi
necessário realizar um forte ajuste estrutural das economias, orientando-as para o
mercado (ajuste fiscal rigoroso; abertura comercial e financeira; privatização de
empresas estatais; etc.). Assim, ao contrário dos anos de 1970, quando o Brasil seu
desenvolveu com dívida, agora deveria se desenvolver com poupança externa e, se
possível, com investimentos diretos externos6.
O segundo elemento diz respeito ao comportamento das elites que, segundo o
autor, demonstraram-se incapazes de definir e defender o interesse nacional. Isto
ocorreu porque as elites brasileiras continuam incapazes de se identificar com a nação.
Por isso, o autor concluiu que, enquanto a população mais pobre avançou em sua
compreensão do mundo atual, as elites retrocederam fortemente nos últimos 20 anos.
Essa perde de rumo das elites foi fortemente potencializada após a crise do estado
desenvolvimentista na década de1980.
A adoção dessa política econômica interessava, segundo o autor, aos países ricos
(justificavam seus superávits comerciais); aos bancos internacionais (que podiam
emprestar grandes quantidades de recursos a elevadas taxas de juros); e a alguns
segmentos locais (que se beneficiavam da própria política econômica).
A partir dessa interpretação o autor avança no sentido de mostrar que essa
estratégia de política econômica levou à “armadilha da taxa de juros e da taxa de
câmbio”. Tal armadilha consiste no fato de que toda vez que o Banco Central (BC)
baixa os juros, a taxa de câmbio aumenta, fazendo com que a inflação retome a
5
O autor considera “Consenso de Washington” a política norte-americana da década de 1980 em relação
aos países altamente endividados (crises das dívidas externas). Para ele, o Segundo Consenso de
Washington é a dimensão internacional do primeiro.
6
Bresser-Pereira mostra a existência de um mecanismo perverso no desenvolvimento com poupança
externa: quanto maiores os financiamentos externos (IDE), mais apreciada se torna a taxa de câmbio,
menos estimulantes são as exportações, com mais incentivos ao consumo doméstico, que reduz a
poupança interna. Com isso, mantém o nível do déficit em conta corrente, exigindo-se novos
financiamentos. Isso levou a duas crises no balanço de pagamentos: em 1998 e em 2002. Esse mecanismo
é perverso justamente porque há limites para um país se endividar.
trajetória ascendente7. Da mesma forma, quando reduções nas taxas de juros induzem a
novas expansões do crescimento, cresce o déficit em conta corrente. Como esses déficits
são financiados por capitais especulativos atraídos por elevadas taxas de juros, a
armadilha torna-se ainda mais perigosa. Finalmente, as taxas de juros elevadas também
atuam desfavoravelmente aumentando a dívida pública de um Estado normalmente
bastante endividado.
Esses mecanismos de política econômica (altas taxas de juros e elevado
endividamento público) promovem uma brutal transferência monetária para os setores
rentistas, além de impedir o pleno emprego e inviabilizar a retomada do
desenvolvimento.
A partir dessas interpretações da política econômica, o momento seguinte dos
trabalhos acadêmicos passou a ser a discussão e sugestão de novas estratégias de
desenvolvimento para o país8. Partindo do pressuposto de que o desenvolvimento
econômico é um fenômeno histórico relacionado com a formação dos estados-nação e
com os mercados, uma estratégia nacional desenvolvimentista deveria combinar o uso
dos recursos disponíveis com as instituições existentes no sentido de promover uma
concertação de interesse dos agentes socioeconômicos visando atingir o objetivo geral,
ou seja, a melhoria do padrão de vida de toda a população.
Para tanto, rejeita-se o reducionismo ideológico que frequentemente é utilizado
pelo saber convencional para opor o “desenvolvimentismo” (por ser inflacionário) ao
pragmatismo ortodoxo (defensor da estabilidade macroeconômica). Esta é uma falsa
contradição, uma vez que a defesa da estabilidade macroeconômica também é uma das
condições básicas para a construção de uma estratégia nacional desenvolvimentista.
Assim, para o autor uma agenda desenvolvimentista pressupõe Estado e mercado
fortes. Um Estado forte pressupõe a adoção de um conjunto de políticas (industrial,
tecnológica, reforma agrária, crédito, emprego, etc.), além de um sistema de proteção
social capaz de diminuir as distâncias entre o povo e as elites, ao mesmo tempo em que
sejam criadas as condições para que os mercados funcionem. Porém, como é alertado
7
8
Isso ocorre para acomodar mudanças nos preços relativos derivadas das desvalorizações.
Neste caso, destacam-se dois artigos de Bresser-Pereira: Proposta de Desenvolvimento para o Brasil
(2004 e 2005) e Estratégia Nacional e Desenvolvimento (2006).
em diversos estudos, essa agenda desenvolvimentista continuará bloqueada enquanto o
principal obstáculo da política econômica não for removido: a armadilha da taxa de
juros e do câmbio, ou seja, a política de desenvolvimento baseada na poupança externa
e na abertura da conta capital, que leva o país a perder o controle sobre o mais
importante preço macroeconômico da economia (taxa de câmbio). Para que ocorra a
retomada do desenvolvimento, “será preciso coragem para enfrentar os interesses dos
rentistas e do mercado financeiro e a ortodoxia convencional em que se apoiam”
(Bresser-Pereira, 2004: 630).
A partir do diagnóstico dos problemas da política econômica e da interdição da
agenda desenvolvimentista, passou-se a defender um novo projeto desenvolvimentista
para o país9. Registre-se que é neste momento que as questões teóricas e de escolha de
política econômica passaram a ficar mais claras, uma vez que grande parte dos artigos
citados na nota anterior faz uma oposição entre as proposições da chamada Ortodoxia
Convencional10 e as propostas defendidas pelos “novos desenvolvimentistas”.
Num primeiro plano, mostra-se que toda estratégia emanada da escola
convencional pressupõe que a retomada do desenvolvimento se dê apenas pelo caminho
do crescimento com poupanças externa e pela abertura da conta capital. Em termos
ideológicos, a ortodoxia convencional “quer fortalecer o mercado pelo enfraquecimento
do Estado, como se houvesse um jogo de soma zero entre as duas instituições... na
verdade é a reação prática contra o crescimento do aparelho do Estado...é a ideologia de
direita, dos mais poderosos, da alta burguesia e da alta tecnoburocracia” (BresserPereira, 2006:17).
Além disso, considera-se também que a ortodoxia convencional só recentemente
passou a considerar as instituições como relevantes. Todavia, essas instituições
adquirem valor apenas na perspectiva de que sejam garantidos os contratos e o bom
funcionamento dos mercados. Na verdade, a ortodoxia apresenta uma proposta bem
9
Neste caso, destacam-se os seguintes estudos: O novo desenvolvimentismo e a ortodoxia convencional
(Bresser-Pereira, 2006); O Brasil e o novo desenvolvimentismo (Bresser-Pereira, 2010); Do antigo ao
novo desenvolvimentismo na América Latina (Bresser-Pereira, 2010).
10
“A Ortodoxia Convencional é constituída pelo conjunto de teorias, diagnósticos e propostas de políticas
que os países ricos oferecem aos países em desenvolvimento, tendo como base a teoria econômica
neoclássica, mas não se confundindo com ela porque não é teórica, mas abertamente ideológica e voltada
para as propostas de reformas institucionais e políticas econômicas. Sua origem está em Washington onde
estão o Tesouro dos EUA e as duas agências subordinadas a este: o FMI e o Banco Mundial” (BresserPereira, 2006:16,17).
simplista: “basta que as instituições garantam a propriedade e os contratos, ou mais
amplamente,
o
bom
funcionamento
dos
mercados,
que
estes
promoverão
automaticamente o desenvolvimento” (Bresser-Pereira, 2006:18).
Somam-se aos dois aspectos anteriores outros fatores essenciais. Por exemplo,
na questão da reforma do Estado, a ortodoxia vê nela a oportunidade de reduzir seu
papel junto à sociedade. Já no âmbito do mercado de trabalho, essa escola de
pensamento econômico defende a flexibilidade das relações trabalhistas como tática
para retirar direitos dos trabalhadores e, com isso, precarizar a força de trabalho,
pagando baixos salários. Finalmente, no âmbito das políticas econômicas é que grandes
diferenças aparecem entre a sabedoria convencional e os “novos desenvolvimentistas”,
especialmente nos instrumentos promotores da estabilidade macroeconômica, que para
os últimos vão muito além da garantia de superávits primários e do papel único do
Banco Central: controlar a inflação via mecanismo da taxa de juros.
A partir dessa contraposição, passou-se a definir uma agenda desenvolvimentista
para o país, tendo dois horizontes de ação. Por um lado, altera-se a concepção de
estabilidade macroeconômica, destinando outras funções às políticas econômicas e às
próprias instituições e, por outro, propõe-se uma nova agenda de desenvolvimento,
elencando elementos do “antigo desenvolvimentismo” e adicionando-se a ele elementos
do “novo desenvolvimentismo”. Esses aspectos estão claramente explicitados no artigo
“do antigo ao novo desenvolvimentismo”, do ano de 2010.
Recentemente o professor Bresser-Pereira passou a enfrentar esse debate de
forma mais consistente também no campo teórico, chegando à proposição e formulação
de uma nova teoria macroeconômica11 por ele denominada de “macroeconomia
estruturalista do desenvolvimento”. Na essência, essa proposição teórica coloca a taxa
de câmbio no centro das preocupações sobre desenvolvimento, procurando explicar as
relações existentes entre desenvolvimento econômico e taxa de câmbio. O autor acima
citado explica essa relação através da metáfora do interruptor de luz, o qual liga ou
11
Neste caso, destacam-se os artigos: Macroeconomia estruturalista do desenvolvimento (Bresser-Pereira,
2010); Macroeconomia estruturalista e o Novo Desenvolvimentismo (Bresser-Pereira, 2010);
Structuralist macroeconomics and the new developmentalism (Bresser-Pereira, 2011)
desliga as empresas competentes da demanda internacional. Este assunto será discutido
com maior profundidade na seção seguinte.
2– A MACROECONOMIA ESTRUTURALISTA ENQUANTO INSTRUMENTO
TEÓRICO DO NOVO DESENVOLVIMENTISMO
2.1 – Concepção geral
Em linhas gerais, a macroeconomia estruturalista do desenvolvimento, segundo
Bresser-Pereira, é uma teoria estruturalista keynesiana baseada em duas tendências
estruturais que limitam as oportunidades de investimento: a tendência da taxa de
salários de crescer menos do que a produtividade e a tendência à sobrevalorização da
taxa de câmbio. Esta segunda tendência, com dois modelos por detrás – o modelo da
doença holandesa e a crítica ao modelo de crescimento ancorado na poupança externa –
mostra que a taxa de câmbio é considerada um preço macroeconômico chave no
desenvolvimento econômico. Desta maneira, essa abordagem vê a sobrevalorização
crônica da moeda como o impedimento principal do crescimento.
Além disso, a macroeconomia estruturalista do desenvolvimento está baseada na
oportunidade de investimentos voltados para a exportação e na oportunidade de
investimentos voltado para o mercado interno. Este último tema já foi amplamente
discutido pela maioria dos autores estruturalistas, especialmente Celso Furtado. Já “a
segunda tendência e a manobra intelectual correlata de “libertar” a taxa de câmbio do
nicho da teoria monetária na qual estava escondida ou presa e colocá-la no centro do
processo do desenvolvimento econômico são partes essenciais da nova macroeconomia
estruturalista do desenvolvimento” (Bresser-Pereira, 2010:8).
Esse
autor
desenvolvimento
afirma,
parte
do
ainda,
que
pressuposto
a
macroeconomia
keynesiano
de
estruturalista
que
os
do
principais
estrangulamentos ao crescimento e ao pleno emprego localizam-se no lado da demanda,
mesmo reconhecendo-se a importância do lado da oferta. Por isso, o fator chave é saber
aproveitar os recursos disponíveis no sentido de aumentar a capacidade de oferta do
país.
Mas esse novo arcabouço teórico apresenta também uma diferença crucial em
relação à sabedoria convencional, uma vez que, diferentemente da teoria neoclássica
que vê a taxa de câmbio flutuando suavemente ao redor de uma taxa de equilíbrio, a
macroeconomia estruturalista do desenvolvimento vê a taxa de câmbio se
movimentando em direção a uma crise monetária que é originada pela doença holandesa
e pela afluência excessiva de capitais, fatos estes causados pela política de crescimento
baseada na poupança externa.
Esta evolução teórica pode ser sintetizada nas palavras do próprio autor e líder
do grupo de novos desenvolvimentistas da FGV-SP: “over the past ten year, in
cooperation with a skilled group of Keynesian and structuralist economists, I have been
developing a structuralist macroeconomic of development, that is, a demand-side theory
of development based on structural tendencies that constrain investment opportunities
and limit the rate of growth of developing countries. On the other hand, based on the
Latin American experience with national developmentalism (1930-1980) and the past
20 years’ growth experience of dynamic Asian countries, we have been drafting a
national development strategy: new developmentalism” (Bresser-Pereira, 2011: 493494).
A partir dessa trajetória definiu-se o novo desenvolvimentismo como sendo “a
third discourse an alternative, on one side, to the Washington Consensus for which the
solution of all problems lies in reducing the public deficit, and, on the other side, to the
populist approach that views fiscal expansion as such magic solution and is not
responsible in Exchange rate terms as it proposes growth with foreign savings. Instead,
new developmentalism proposes a strategy based on fiscal responsibility and principally
foreign exchange responsibility” (idem, pp.494).
2.2 – Pressupostos teóricos e fundamentos da Macroeconomia Estruturalista do
Desenvolvimento
O pressuposto geral desse novo arcabouço teórico trata da tendência à
sobrevalorização cíclica da taxa de câmbio nos países em desenvolvimento. Afirma-se,
ainda, que as razões que fundamentam essa tendência derivam da “Doença Holandesa”
e da excessiva e desnecessária afluência de capitais.
A partir daí é construída uma trajetória teórica que vai procurar se diferenciar do
antigo “estruturalismo latino-americano”, bem como criticar a teoria tradicional. Neste
último caso, a crítica central recai sobre o fracasso da teoria macroeconômica dessa
matriz de pensamento que fundamentou toda sua política de crescimento para os países
em desenvolvimento via poupança externa. Tal fundamentação, que ganhou corpo no
chamado “Consenso de Washington”, começou a ruir na América Latina ainda nas
décadas de 1980 e de 1990, momento em que também experimentou a ruína em
diversos países asiáticos naquilo que ficou conhecido com a “crise asiática”. Finalmente
o fracasso total dos “remédios” da sabedoria convencional apareceu a partir de 2008
com a instauração da crise global do sistema econômico capitalista.
Sobre a teoria estruturalista original resgatam-se suas teses centrais, de forma a
mostrar quais delas já foram superadas e os pressupostos que ainda estão em voga e que
precisam ser considerados em uma nova abordagem do desenvolvimento. Para fazer
esse movimento, são resgatadas as idéias do complexo sistema teórico estruturalista,
conforme descrevemos a seguir12:
a)a tendência à deterioração dos termos de intercâmbio, da qual se deduziu a
intervenção do estado na economia. Este pressuposto foi mantido pelo novo arcabouço
teórico;
b)o papel central do Estado na promoção do desenvolvimento econômico.
Este pressuposto foi mantido, porém com uma alteração fundamental em relação à
concepção estruturalista anterior. Neste caso, nota-se que o Estado tem papel como
indutor do desenvolvimento econômico. Ou seja, pressupõe-se aqui um Estado não mais
produtor de mercadorias diretamente, mas sim um agente regulador da vida econômica,
o que é bem diferente da concepção Neoclássica, a qual destina esse papel aos
“mercados”;
c)o caráter estrutural do desenvolvimento. Este pressuposto também foi
mantido na nova concepção, uma vez que se supõe que o desenvolvimento não ocorre a
12
A recuperação das idéias do estruturalismo está baseada em Bresser-Pereira e Gala (2010) e também
em Bresser-Pereira (2011).
partir de combinações de setores como pressupõe a teoria convencional, mas sim a
partir da transferência de mão-de-obra para setores produtivos com valor adicionado per
capita mais elevado;
d)o subdesenvolvimento contrapondo-se ao desenvolvimento. Também este
pressuposto foi mantido, uma vez que o subdesenvolvimento é entendido não como um
estágio atrasado de desenvolvimento, mas como resultado da subordinação da periferia
aos interesses dos países industrializados e, conseqüentemente, desenvolvidos;
e)a tendência dos salários de crescerem menos do que a produtividade
devido à oferta ilimitada de mão-de-obra. Este pressuposto foi mantido por se
considerar que esta é uma das causas estruturais da insuficiência da demanda nos países
em desenvolvimento, ou seja, a oferta ilimitada de mão-de-obra comprime os salários
com implicações diretas sobre o comportamento da demanda ou do próprio nível de
investimentos do setor empresarial;
f)a indústria infante legitimando proteção tarifária. Esta tese foi excluída,
pois o autor entende que a mesma encontra-se superada, particularmente para países de
renda média, como é o caso do Brasil. A razão para a superação encontra-se no processo
histórico, uma vez que esta tese se justificava no início do processo de industrialização
por substituições de importações quando a indústria nacional necessitava de proteção.
Este instrumento ainda faz sentido para parte dos países pobres da América Latina que
ainda não ingressaram na industrialização. Mas para aqueles classificados de renda
média o autor sugere a adoção de uma política industrial que seja capaz de elevar a
competitividade;
g)a tese da inflação estrutural. Também esta tese foi excluída do novo
arcabouço teórico, uma vez que seu fundamento inicial se apoiava na idéia de que era
difícil (ou até mesmo impossível) obter a estabilidade de preços no mesmo patamar dos
países desenvolvidos devido às imperfeições de mercado, destacando-se dentre essas
imperfeições a resposta lenta da oferta de alimentos aos impulsos da demanda.
Atualmente não somente essas respostas são eficientes, como os países de renda média
passaram a manter as taxas de inflação em patamares baixos e até mesmo dentro dos
padrões de muitos países desenvolvidos;
h)a tese da necessidade da poupança externa.Esta tese foi abandonada pelo
novo arcabouço teórico em função da concepção da teoria convencional que acabou
sendo incorporada à teoria estruturalista através do modelo dos dois hiatos. Tal modelo
apregoava que os países latino-americanos enfrentariam permanentes restrições de
divisas externas, as quais precisavam ser sanadas com déficits em conta corrente
financiados exatamente pelos empréstimos e/ou investimentos externos.
2.2.1 – Novas teses da macroeconomia estruturalista do desenvolvimento
Além dos pressupostos anteriores mantidos a partir das formulações originais do
estruturalismo Latino-Americano, a nova formulação denominada de “macroeconomia
estruturalista do desenvolvimento”, elaborada por Bresser-Pereira e contando com a
participação de colegas de sua instituição, vai mostrar, como mencionamos
anteriormente, os problemas decorrentes da sobreapreciação crônica da taxa de câmbio.
Para enfrentar tais problemas foram elaboradas cinco novas teses, as quais se
juntam às teses originais acima citadas para conformar a nova interpretação teórica. A
seguir são apresentadas e discutidas cada uma dessas teses:
1ª) o papel da taxa de câmbio no desenvolvimento. Partindo do pressuposto de
que a taxa de câmbio competitiva é fundamental para o desenvolvimento econômico do
país porque coloca o mercado externo à disposição das empresas nacionais, o autor
assume uma proposição que caminha no sentido inverso à da teoria convencional, ou
seja, o desenvolvimento econômico deriva da função investimento a qual, com uma taxa
de câmbio competitiva, acabará elevando a própria poupança interna.
2ª)tendência à sobrevalorização cíclica da taxa de câmbio nos países em
desenvolvimento: neste caso parte-se do pressuposto de que são as crises do balanço de
pagamento, e não o mercado, que determinam os ciclo cambiais. Assim, em não
havendo uma política que administre a taxa de câmbio para neutralizar essa tendência
cíclica, instaura-se uma crise que irá depreciar de forma violenta a taxa de câmbio. O
mecanismo se dá da seguinte forma: esta taxa cambial, que no início do ciclo não
afetava o equilíbrio da conta corrente, deprecia-se violentamente para, em seguida, se
apreciar novamente. Este movimento é condicionado por dois fatores estruturais: a
doença holandesa e os fluxos de capitais. Estes últimos, atraídos pelas altas taxas de
juros, continuam a apreciar a taxa de câmbio, levando ao déficit na conta corrente. Este
movimento de apreciação da taxa de câmbio continua até que uma crise do balanço de
pagamentos se instaure e interrompa o processo. Dentre as políticas adotadas
erroneamente que agravam este movimento, o autor destaca o crescimento com
poupança externa, a âncora cambial revestida de metas da inflação, o populismo
cambial, etc.
3ª)doença holandesa: segundo o autor, a doença holandesa é um problema
antigo, mas que somente foi identificada na Holanda nos anos de 1960, quando se
verificou que a descoberta de gás natural e sua exportação estavam apreciando a taxa de
câmbio e ameaçando destruir a indústria do país.
Em termos conceituais, Bresser-Pereira afirma que a “doença holandesa” pode
ser definida como a sobreapreciação crônica da taxa de câmbio de um país causada por
rendas ricardianas que o referido país obtém ao explorar recursos abundantes e baratos,
cuja produção comercial é compatível com uma taxa de câmbio de equilíbrio corrente
claramente mais apreciada do que a taxa de câmbio de equilíbrio industrial (taxa que
viabiliza os demais setores econômicos produtores de bens comercializáveis que
utilizam tecnologias no estado da arte mundial). A conseqüência é que bens produzidos
com este nível tecnológico tornam-se inviáveis economicamente em um mercado
competitivo.
Na verdade, por tratar-se de uma falha de mercado pelo lado da demanda que
limita a existência de oportunidades de investimentos na indústria manufatureira, a
doença holandesa existe quando o país tem condições técnicas e administrativas de
investir na produção de bens de maior nível tecnológico e com salários mais elevados,
mas a taxa de câmbio em curso não permite que esses investimentos sejam realizados.
A gravidade do problema decorre do diferencial entre a taxa de câmbio de
equilíbrio industrial e a taxa de câmbio corrente. Assim, quanto maior for esse
diferencial, maior serão os efeitos da doença holandesa. Já a neutralização desses efeitos
pode se dar a partir de uma política administrada da taxa de câmbio competitiva que a
conduza do nível de equilíbrio corrente para o nível de equilíbrio industrial.
4ª)Política de crescimento com poupança externa: para o autor a política de
déficits em conta corrente e de endividamento externo não causa aumento do
investimento, mas sobreapreciação da taxa de câmbio e a substituição da poupança
interna pela externa. Como visto, esta apreciação decorre da doença holandesa e dos
fatores que estimulam a entrada de capitais, sendo que dentre esses fatores a política de
crescimento com poupança externa é a mais perigosa para o país. Rejeitando as teses da
teoria convencional, o autor afirma que normalmente essa estratégia causa alta taxa de
substituição da poupança interna pela externa, levando apenas a uma expansão do
consumo e da dívida externa.
5ª)Responsabilidade fiscal: adota-se posição contrária aos déficits públicos e
déficits correntes por entender que esses dois déficits são formas de desorganizar e
enfraquecer o sistema econômico. Isto porque déficits em conta corrente enfraquecem o
estado nacional, tornando-o dependente dos credores externos, além de causar inflação.
2.3 – Relações da macroeconomia estruturalista com o novo desenvolvimentismo
De um modo geral, pode-se dizer que as teses da macroeconomia estruturalista
do desenvolvimento, por um lado, atualizam a teoria estruturalista latino-americana
porque mantém o princípio estruturalista e, por outro, rejeitam as teses da teoria
convencional, tanto em termos das estratégias de estabilidade macroeconômica como
em relação às estratégias de desenvolvimento.
Do ponto de vista do estruturalismo latino-americano, denominado pelo autor de
velho desenvolvimentismo, atualiza-se a concepção sobre industrialização, uma vez que
o novo desenvolvimentismo entende que esta deve ser orientada para as exportações por
considerar que o modelo substituidor de importações já está superado. Além disso,
destina-se outro papel ao estado no novo desenvolvimentismo, ou seja, ele deve reduzir
seu papel em favor do mercado, uma vez que o setor privado nacional possui recursos e
capacidade empresarial para realizar os investimentos necessários.
Da mesma forma, a política industrial continua sendo estratégica, porém com um
papel subsidiário, devendo ser direcionada para setores estratégicos e para empresas
com capacidade de competição internacional. Além disso, o novo desenvolvimentismo
não admite nenhuma complacência com a inflação e rejeita tanto os déficits públicos
quanto os déficits em conta corrente.
Com relação à teoria convencional, observa-se uma profunda diferença entre as
concepções macroeconômicas que balizam o novo desenvolvimentismo e aquelas
sustentadas pela ortodoxia. Assim, não se trata apenas de mudanças no estágio de
desenvolvimento como no caso do velho desenvolvimentismo, mas sim de opções
distintas de políticas macroeconômicas. E o ponto de partida é a função do Estado no
processo de desenvolvimento, uma vez que o fundamentalismo de mercado da teoria
convencional ignora a importância dessa instituição na definição de estratégias
nacionais de desenvolvimento.
Além disso, divergências cruciais aparecem em termos da globalização
financeira e da flexibilização do mercado de trabalho com o objetivo de precarizar a
força de trabalho e reduzir os salários. Também a tese do financiamento do crescimento
via poupança externa é rejeitado pelo novo desenvolvimentismo.
Finalmente, a macroeconomia estruturalista do desenvolvimento diverge do
conceito de estabilidade macroeconômica por entender que a ortodoxia restringe este
conceito aos temas do controle da inflação e controle dos gastos públicos, enquanto para
o novo desenvolvimentismo este conceito é mais amplo abrangendo a estabilidade de
preços, o equilíbrio do balanço de pagamentos e o pleno emprego.
3 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em linhas gerais, pode-se afirmar que a macroeconomia estruturalista do
desenvolvimento nada mais é que uma reformulação da teoria estruturalista LatinoAmericana, a qual precisava ser reformulada para dar conta dos desafios do
desenvolvimento contemporâneo. Neste caso, a nova formulação manteve o arcabouço
central que dava sustentação e estatura teórica ao estruturalismo latino-americano, uma
vez que se manteve a concepção de que o desenvolvimento econômico é um processo
estrutural permeado por um conjunto de mudanças estruturais que ao longo do tempo
terão de ser redefinidas.
Com as crises econômicas que se abateram sobre América Latina a partir da
década de 1980 abriu-se espaço para as teses da teoria ortodoxa convencional, as quais
estabeleceram uma nova hegemonia na região sustentada pela concepção do Consenso
de Washington. A partir daí implantou-se diversas reformas econômicas, com ênfase
nos processos de desregulamentação dos mercados, na liberalização comercial e
financeira e na privatização das empresas estatais. Com isso, as sociedades locais
ficaram mais vulneráveis e os projetos nacionais de desenvolvimento foram sendo
abandonados.
Porém, como essa hegemonia durou pouco e suas teses macroeconômicas
resultaram em fracassos econômicos e sociais, voltou em cena no limiar do século XXI
a discussão da necessidade de estratégias nacionais desenvolvimentista. É no bojo deste
debate que vão aparecer os fundamentos de que o autor denomina de “macroeconomia
estruturalista do desenvolvimento”.
Registre-se aqui a importância dessas novas proposições teóricas, uma vez que
elas vêm cumprir um papel decisivo na disputa pela hegemonia por duas razões
centrais:
por
um
lado,
demonstram
claramente
o
fracasso
do
arcabouço
macroeconômico convencional e, por outro, atualizam um conjunto de proposições
teóricas capazes de recolocar na agenda pública a questão das novas estratégias
nacionais desenvolvimentistas no âmbito do que está sendo designado de “Novo
Desenvolvimentismo”.
É neste sentido que gostaríamos de ressaltar a importância de Bresser-Pereira
neste debate, seja confrontando a velha teoria tradicional, seja instigando o pensamento
econômico crítico no sentido de se recuperar as teses estruturalistas, atualizá-las e a
partir daí produzir uma base teórica para o desenvolvimento econômico latinoamericano.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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