Aula nº 27 Forças de coesão e de adesão. Capilaridade: tubos capilares e capilaridade entre lâminas. Formação de gotas Forças de coesão e de adesão Vimos na última aula que a tensão superficial se define como a energia por W unidade de área, γ = ou, o que é equivalente, como a força por unidade de ∆A comprimento que uma superfície exerce sobre um corpo com o qual a superfície está em f contacto γ = . l A energia de um líquido depende das propriedades do líquido mas também das propriedades do meio com o qual o líquido está em contacto. Ao introduzirmos as propriedades do líquido, em particular no caso da Fig. 26.1, considerámos que este estava em contacto com o ar. Mas poderia também estar em contacto com o seu vapor ou com outro gás a baixa pressão. Desde que o segundo meio seja um gás nestas condições, as forças de ligação das moléculas do líquido às desse outro meio são sempre muito menores do que as forças de coesão entre as moléculas do líquido. A situação muda quando o outro meio vizinho é um outro líquido ou um sólido (ou um gás a pressão elevada). Nesse caso a tensão superficial é também determinada pelas características desse outro meio. As superfícies de um líquido e de um sólido com o qual o líquido está em contacto formam entre si um ângulo designado por “ângulo de contacto”. O valor deste ângulo depende da competição entre as forças de coesão líquido-líquido e as forças de adesão líquido-sólido. Consideremos um líquido contido num recipiente de paredes verticais. A Fig. 27.1 mostra os ângulos de contacto. O ângulo de contacto pode ser superior a 90º, tal como na situação do lado esquerdo da figura, ou superior a 90º. sólido sólido θ θ líquido líquido Figura 27.1 As forças de tensão superficial que o líquido exerce nas paredes do recipiente, estão sobre a linha de contacto do líquido com o recipiente (uma circunferência para um recipiente cilíndrico). Na Fig. 27.2 indicam-se estas forças num ponto. 1 θ θ Figura 27.2 As forças que a superfície do líquido exercem na parede do recipiente são tangentes à superfície. Por seu lado, as forças que as paredes exercem no líquido são iguais em grandeza e direcção mas têm sentidos opostos (princípio da igualdade de acçãoreacção). O bem conhecido fenómeno de capilaridade tem directamente a ver com a existência de tensão superficial e de interacção líquido-sólido. Consiste na subida (ou descida) de um líquido num tubo fino colocado num recipiente com o líquido. O ângulo de contacto é um dos factores de que depende a subida (ou descida) do líquido no capilar. Como veremos de seguida, se θ < 90º o líquido sobe; se θ > 90º o líquido desce. Capilaridade: tubos capilares e capilaridade entre lâminas A Fig. 27.3 mostra um tubo capilar mergulhado num recipiente contendo um líquido de densidade ρ . O líquido sobe até uma altura h como se mostra na mesma figura. h Figura 27.3 O equilíbrio da coluna de líquido é devido ao anulamento recíproco de duas forças iguais e opostas: uma é o peso da própria coluna de líquido, mg; a outra é a força que a parede do tubo exerce na superfície do líquido (igual e oposta à força que a superfície do líquido exerce sobre a parede). Para que o líquido suba no capilar o ângulo de contacto terá de ser inferior a um ângulo recto. As forças que se exercem no líquido estão representadas no lado esquerdo da Fig. 27.4. 2 dF cos θ dF dl P P θ Figura 27.4 Designando o raio do tubo por r, a força dF que se exerce num dado ponto1 está representada no lado direito da figura. As componentes verticais destas forças, todas de igual valor, dF cos θ = γ dl cos θ , somam-se. A resultante no plano horizontal é nula. O valor da resultante das forças que o vidro exerce no líquido é o produto da força por unidade de comprimento, γ cos θ pelo comprimento total que é 2 π r , ou seja, 2 π r γ cos θ . O volume do líquido na coluna (desprezando o menisco) é V = π r 2 h e, portanto, o seu peso é π r 2 h ρ g . Igualando as duas forças, 2 π r γ cos θ = π r 2 h ρ g (27.1) donde h= 2 γ cos θ . ρgr (27.2) Se θ = 90º , h = 0 ; se θ < 90º , o líquido sobe no capilar, como já vimos; e se θ > 90º o líquido desce, tal como se mostra na Fig. 27.5. h Figura 27.5 1 Esta força exerce-se numa linha de tamanho infinitesimal, dl em torno do ponto P. Trata-se, portanto, de uma força infinitesimal. 3 A expressão (27.2) exprime a lei de Jurin, segundo a qual a altura h varia inversamente com o raio do tubo capilar. Esta expressão foi deduzida para tubos capilares cilíndricos, e mostra que a altura a que sobe (ou a que desce) um líquido num capilar varia com o inverso do seu raio. Se o tubo não for cilíndrico, a dependência continua a ser a mesma mas agora r é uma dimensão típica do tubo. De interesse é também a capilaridade entre lâminas. No caso de um líquido que molha o vidro, este subirá na zona entre duas lâminas colocadas muito perto uma da outra com as faces paralelas, como mostra a Fig. 27.8. d L θ h h d Figura 27.6 Vamos considerar que o comprimento L de cada lâmina é muito maior do que a separação d entre elas. O peso do líquido que sobe entre as lâminas até à altura h é ρ L h d g . A resultante das forças de tensão superficial é 2 Lγ cos θ (a componente vertical é Lγ cos θ para cada lâmina; a componente horizontal de uma lâmina anula-se com a da outra). Da igualdade das duas forças, ρ L h d g = 2 Lγ cos θ resulta h= 2γ cos θ ρ dg (27.3) semelhante a (27.2). Na tabela seguinte indicam-se alguns ângulos de contacto. Pares líquido/sólido Água-vidro Álcool etílico-vidro Água-prata Mercúrio-vidro Ângulo de contacto (θ) 0º 0º 90º 140º No caso do par água-vidro o ângulo de contacto é 0º e diz-se então que a água molha o vidro. Ao invés, se o ângulo for de 180º, o líquido não molha. Se θ < 90º fala-se em molhagem parcial e se θ > 90º em não molhagem parcial. Num recipiente grande, devido à acção da gravidade, a superfície de separação líquido-ar é plana e horizontal 4 excepto junto das paredes do recipiente onde as situações são as apresentadas em (a) e (b) da Fig. 27.6 para o caso de um líquido que molha e que não molha, respectivamente. (a) (b) líquido que molha líquido que não molha Figura 27.7 A curvatura da superfície de um líquido associada à molhabilidade pode tornar possível a flutuação de um corpo num líquido de menor densidade (caso de uma agulha colocada sobre a superfície livre da água num copo. θ = 0º θ = 180 º Figura 27.8 Se o material é molhado pelo líquido, como no lado esquerdo da Fig. 27.7 (ângulo de contacto nulo) a força de tensão pode fazer com que o objecto mergulhe mesmo que tenha densidade inferior à do líquido. Se o objecto for longo, de comprimento L a força de tensão 2 Lγ pode igualar a resultante da força gravítica e da impulsão, mg − I , e o objecto não afunda. No lado direito da Fig. 27.7, o líquido não molha o objecto (considera-se um ângulo de contacto de 180º, pelo que as forças de tensão superficiais são verticais), e o objecto pode flutuar mesmo que o seu peso exceda a impulsão. Para qualquer uma destas situações se verificar o peso, mg, terá de ser pequeno. Formação de gotas Já sabemos que uma gota de líquido no ar tende a ser esférica para assim minimizar a sua superfície. Quando uma gota está em queda a força gravítica aplica-se da mesma maneira a todas as suas partes e, por isso, tal como dentro de uma estação espacial a gota fica exactamente esférica. Mas devido à resistência do ar há, de facto, um leve achatamento quando a gota cai. Vamos ver brevemente o mecanismo de formação de uma gota de líquido na extremidade de um tubo contendo esse líquido. Quando o líquido abandona o tubo, o tamanho da gota aumenta gradualmente até atingir um valor bem definido, com mostra a Fig. 27.9. 5 r Figura 27.9 Enquanto a gota não for suficientemente grande, as forças de tensão superficial são suficientes para contrabalançar a força gravítica impedir a separação da gota do resto do líquido. A gota separa-se quando o seu peso igualar a força de tensão superficial que a segura. Antes da separação da gota forma-se uma espécie de um pescoço (Fig. 27.9 do lado direito) cujo raio é um pouco menor que o raio do tubo. A força de tensão superficial que actua ao longo da circunferência desse pescoço é 2π rγ . Esta força é igual ao peso no momento da separação 2π rγ = mg , (27.4) sendo r o raio do pescoço, e m a massa da gota. Medindo-se o peso da gota e o raio do pescoço no momento da separação, pode calcular-se a tensão superficial. 6