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A AMPLIAÇÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO SUPERIOR: O
PROUNI E O REUNI EM QUESTÃO
COLLEONI, Cristini (UNIOESTE)1
ORSO, Paulino José (Orientador/UNIOESTE)2
Contexto da Reforma do Estado no Brasil e a educação
A partir da década de 1990, a reforma do aparelho do Estado no Brasil, bem
como os novos rumos tomados pelo capitalismo, após as crises estruturantes do capital
nas décadas de 1970 e 1980, resultou em diferentes mudanças nos setores econômicos e
sociais. O novo modelo de acumulação do capital, caracterizado pela flexibilização da
economia, passou a exigir também da educação novas demandas e desafios. Isso
ocorreu notadamente com a Educação Superior.
Desde a sua origem no Brasil, a universidade tem como objetivos a mudança
social bem como ser responsável pela modernização da economia nacional,
“capacitando a força de trabalho e qualificando os recursos humanos para permitir
maior competitividade internacional” (BRITO, 1999, p.23). Assim, no decorrer das
transformações da sociedade brasileira, a universidade passou por diferentes reformas,
tornando-se fundamental para a efetivação dos projetos de modernização da sociedade.
Desta forma, a partir de 1990, a Educação Superior brasileira passou por
transformações em diversos setores, principalmente no que diz respeito à política
universitária. Entretanto, foi a partir do governo de Fernando Henrique Cardoso que as
questões relacionadas à Educação Superior passaram a ganhar maior ênfase no debate
acadêmico, em função das medidas de incentivo a privatização do ensino e
sucateamento das universidades públicas. Estas e outras medidas que serão expostas a
seguir, estão pautadas nas políticas neoliberais que se efetivaram, no Brasil, no decorrer
da década de 1990, notadamente durante o governo de FHC – Fernando Henrique
1
Mestranda em Educação na Universidade Estadual do Oeste do Paraná e professora da rede municipal de
educação da cidade de Cascavel, PR. E-mail: [email protected]
2
Doutor em educação pela UNICAMP. Professor adjunto da UNIOESTE.
1
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Cardoso. Neste período, o país passava por uma forte crise econômica e a inflação
deixava ainda mais acentuada a divisão de classes da sociedade brasileira.
FHC, Ministro da Fazenda na presidência de Itamar Franco3, implantou o Plano
Real, que tinha como objetivo livrar o país da crise fiscal e lançá-lo rumo ao
desenvolvimento. Porém, foi o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado,
escrito por Bresser Pereira, em 1995, que implantou alterações extremamente radicais,
jamais vistas na história do Brasil.
Na educação também houve reformas que alteraram a política educacional
brasileira. Medidas como a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB lei nº
9394/96) e o Plano Nacional da Educação de 1997, previam alterações em todos os
níveis de ensino. Na Educação Superior, com o intuito primordial de conter gastos, o
governo cortou verbas das universidades públicas, criou medidas de parceria com o
setor privado, incentivando a abertura de diversas IES – Instituições de Ensino Superior
-, modificando o quadro do ensino superior no Brasil, que ficou marcado pelo
“sucateamento, mercantilização, desconstrução, precarização, destruição sistemática,
empresariamento, privatização etc.” (MINTO, 2006, p. 140).
Segundo Dourado e Oliveira (1999), as transformações no mundo do trabalho
devem ser contextualizadas nos atuais “cenários contemporâneos” que se baseiam na
inter-relação de três matrizes fundamentais, a saber: “a revolução técnico-científica ou
tecnológica, o processo de globalização e o projeto neoliberal” (DOURADO e
OLIVEIRA, 1999, p. 5 e 6). Para os referidos autores, as transformações na sociedade
contemporânea resultaram no aumento do desemprego, da fome, da miséria, violência,
exclusão social, enfim, contribuíram para o crescimento da desigualdade e da divisão de
classes. Estas transformações passaram a exigir então, a reestruturação da produção e do
trabalho que colocaram em xeque a formação e qualificação do trabalhador. Para
Dourado e Oliveira,
Tal questão relaciona-se, de um modo geral, com o processo de
globalização do capital, pautado pela competição, por um padrão de
eficiência e pela minimalização do papel do Estado, pela
reestruturação produtiva que incorporou e incorpora, cotidianamente,
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Itamar Franco governou o Brasil desde dezembro de 1992 a dezembro de 1994.
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os avanços tecnológicos e as novas técnicas de organização da
produção e do trabalho (DOURADO e OLIVEIRA, 1999, p. 7).
As mudanças,
[...] impõem modelo de liberdade econômica, de eficiência e de
qualidade, como mecanismo balizador da competitividade que deve
prevalecer no mundo dos negócios. Os parâmetros da eficiência e
qualidade tornam-se, no novo cenário mundial, fundamentais para
sobrevivência e lucratividade no mercado competitivo. (DOURADO e
OLIVERIA, 1999, p. 7).
As reformas educacionais na América Latina e em especial, no Brasil, vêm
sendo implantadas com base na cartilha de instituições multilaterais como o Banco
Mundial e Fundo Monetário Internacional, dentre outros. Segundo Dourado e Oliveira,
A idéia básica presente nas reformas educativas, nas décadas de 80 e
90, em consonância aos organismos internacionais, é que os sistemas
de ensino devem se tornar mais diversificados e flexíveis, objetivando
maior competitividade. Por isso, a igualdade de acesso e/ou
universalização do ensino, em todos os níveis, e a qualidade de ensino
e/ou universalização da qualidade aparecem como antíteses. Parece ser
impossível ampliar vagas e oferecer condições de permanência na
escola e na universidade, com o mesmo nível de qualidade e
eficiência, em função da diversidade e condições existentes
(DOURADO e OLIVEIRA, 1999, p. 9 e 10).
A expansão da educação e do conhecimento tidas como fundamentais, são
expressas por uma lógica mercadológica, segundo Dourado e Oliveira (1999). Desta
forma, para o capitalismo globalizado, a expansão da educação está ligada a
competitividade, a flexibilidade, modernização, desempenho, eficiência e qualidade e há
a compreensão de que o conhecimento e a formação destes recursos humanos são de
responsabilidade da educação, sobretudo da universidade, já que a Educação Superior é
o nível de ensino responsável pela formação direta de mão-de-obra qualificada pronta
para atuar no mercado de trabalho.
Na Educação Superior, em especial na universidade pública, a grande
preocupação está centrada na ampliação da demanda e massificação do ensino, bem
como a reforma da universidade, de modo geral, pois há a ideia de que a Educação
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Superior, historicamente, vem sendo chamada a auxiliar no desenvolvimento do país e
na sua inserção no mundo globalizado e competitivo.
No Brasil, segundo Dourado e Oliveira (1999, p. 13), as reformas educativas
encaminhadas pelo MEC a partir de 1990 para a Educação Superior, promoveram
alterações da identidade das universidades e com o redirecionamento da função social
do Estado. Assim, houve a transferência dos assuntos relacionados à educação para o
setor privado, visto que este se apresentaria como o natural promotor da eficiência e
qualidade do ensino, pois o Estado sozinho, não é capaz de lidar com a educação. Desta
forma, as alterações neste nível de ensino resultaram em
[...] novas formas de regulação e gestão da universidade brasileira, com
base em mudanças: estruturais (interpenetração entre esfera pública e
privada); institucionais (diferenciação de modelos de organização
acadêmica); diversidade programática, dentre outras (DOURADO e
OLIVEIRA, 1999, p. 13).
A partir da nova LDB, diversas iniciativas foram tomadas até a conclusão do
PNE, que resultou em um grupo de metas a serem efetivadas ao longo da Década da
Educação. Segundo Dourado e Oliveira (1999, p. 16), a proposta para a Educação
Superior está pautada em dois níveis. O primeiro se estrutura em observações gerais
sobre este nível de ensino no Brasil e o segundo, estão centrados os indicativos de
políticas e concepções que vão desde a graduação, pós-graduação, avaliação,
financiamento, currículo, etc.
Uma das constatações, considerada grave, segundo os autores, refere-se ao baixo
índice de acesso à universidade, o que exige políticas de ampliação do acesso,
“objetivando atender à crescente pressão pela sua expansão, de modo a atingir
patamares mais aceitáveis de acesso no panorama latino-americano” (DOURADO e
OLIVEIRA, 1999, p. 16). Contudo, essas políticas de expansão do acesso devem se
equilibrar entre os setores públicos e privados de forma que mantenham “a
diversificação do sistema de educação superior e, consequentemente, pela superação do
modelo único (indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão)” (Idem).
O Estado passou a incentivar o setor educacional privado. Em troca da isenção
de impostos, as IES privadas destinariam vagas à camada da população menos
favorecida economicamente. E, enquanto as IES privadas cresciam, as Universidades
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Públicas passavam por problemas diversos desde o sucateamento da estrutura física até
a falta de professores.
Em relação à Educação Superior na década de 1990, a reforma do Estado
redefiniu o papel da educação no novo modelo de acumulação. O Estado, cumprindo
seu papel, transferiu para os diferentes setores a responsabilidade para com a educação.
A preocupação em atender a demanda em relação à ampliação das vagas, ou dito
de outra forma, a massificação do acesso à universidade. Mas apenas como medida para
evitar o conflito entre as classes antagônicas da sociedade e cumprir as exigências das
imposições dos OIs - Organismos Internacionais -, sem a garantia da democratização, da
equidade, da qualidade e dos recursos necessários a esta modalidade de ensino.
Segundo Sguissardi (2006), no ano de 1994, devido o incentivo ao setor privado,
o número de IES privadas era quase 56% maior do que as IES públicas.
Em 1994, das 851 IES, 192 (22,5%) eram públicas e 659 (77,5%)
eram privadas. Em 2002, das 1637 IES, 195 (11,9%) eram públicas e
1442 (88,1%) eram privadas. Nesse período de oito anos, as IES
privadas passaram de 77,5 para 88,1%. O número de IES cresceu
92%; o de IES públicas permaneceu estável; o de IES privadas
cresceu 118%. O mesmo fenômeno verifica-se em relação à evolução
das matrículas. No período 1994 – 2002, para um aumento do total de
matrículas da ordem de 109%, o do setor privado foi de 150%, três
vezes maior que o do setor público, de apenas 52% (SGUISSARDI,
2006, p. 1028).
No estado do Paraná, segundo dados da SETI – Secretaria da Ciência,
Tecnologia e Ensino Superior4, em 2002 o número das IES privadas chegou a oitenta; as
Universidades Federais eram apenas duas; as estaduais eram seis e as IES municipais
eram de apenas sete.
Havia uma forte expectativa de mudanças, em relação a estas e outras questões
na candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva, que após oito anos de governo FHC, se
tornou eleito presidente da República, em janeiro de 2003. Já no início do governo, as
discussões em torno da Educação Superior voltaram a tomar força, visto que, o cenário
da Educação Superior, pós-governo FHC era crítico.
4
Disponível em: http://www.apiesp.org.br/ensino.html. Acesso em: 18 de maio de 2011.
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Segundo Silva Júnior (2007), nos dados do MEC/INEP, em 2004, as vagas
públicas neste nível de ensino tiveram acréscimo de 16% e 84% no setor privado. Essa
diferença entre o setor público e privado se deu, segundo o autor citado, pela expansão
das IES (Instituições de Ensino Superior) privadas em virtude da reforma do Estado de
1995. Silva Júnior (2007) também aponta o grande número de vagas ociosas tanto nas
universidades públicas quanto nas privadas. Segundo o autor, isto se deu por vários
fatores dentre os quais está à grande desigualdade entre as classes na sociedade
capitalista. Neste sentido, em relação às universidades privadas, diferentes medidas
foram tomadas como, por exemplo, a fusão de turmas com baixo número de alunos,
atrasos nos salários dos professores, etc. O outro agravante é devido ao crescimento no
número de IES privadas que passou para 45%, entre 2001 e 2003, aumentando
consideravelmente o número de vagas ociosas nestas instituições. A origem destes
problemas se encontra também nas promessas de transformações e do “novo cidadão
brasileiro” do projeto político do governo FHC (SILVA JÚNIOR, 2007, p. 95 e 96).
A Reforma Universitária no Governo Lula
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva apresentou propostas para a reforma
universitária. Segundo Orso (2007b), na apresentação do livro “Educação, sociedade de
classes e reformas universitárias” 5, as políticas de reforma foram apresentadas como
sendo participativas, democráticas e descentralizadas. Porém, isso é uma falácia visto
que, desde a sua origem no Brasil, “por trás da criação da universidade se escondia um
projeto de sociedade elitista”, concebida pela elite “como o principal instrumento para a
construção e viabilização de um projeto burguês de educação para o Brasil” (ORSO,
2007b, p. 4 e 5). O autor alerta pelo fato de que o discurso se resume na necessidade de
democratizar o acesso ao Ensino Superior, ampliando o número de vagas e melhorando
a qualidade. Mas, “se analisarmos a questão numa perspectiva mais ampla, veremos que
a razão maior da reforma se encontra na crise pela qual o capital está submetido e no
endividamento externo” (Idem, p. 6).
5
Educação, sociedade de classes e reformas universitárias / Paulino José Orso (org.). – Campinas, SP:
Autores Associados, 2007.
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Com a intenção de cumprir uma das metas propostas pelo PDE – Plano de
Desenvolvimento da Educação6 e as promessas de democratização do acesso à
Educação Superior, o governo Lula criou, a partir da medida provisória nº 213 de 2004,
o PROUNI – Programa Universidade Para Todos, instituído pela Lei nº 11.096 de 13 de
janeiro de 2005 – e o REUNI – Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e
Expansão das Universidades Federais, pelo decreto nº 6.096 de 24 de abril de 2007.
No caso do PROUNI, o objetivo do programa é conceder bolsas7 de estudos
parciais e integrais aos estudantes que não têm condições de pagar por cursos de
graduação e/ou sequenciais de formação específica, em instituições privadas de
Educação Superior, com ou sem fins lucrativos. A bolsa é destinada aos alunos de baixa
renda que cursaram todo o Ensino Médio em escolas públicas; aos que estudaram em
colégios particulares com bolsa integral; aos alunos com necessidades especiais e aos
professores da rede pública que desejam cursar outro curso de licenciatura ou
pedagogia, independente da renda; além de cotas para negros e indígenas. Os alunos que
não forem contemplados com a bolsa integral poderão ainda se inscrever no FIES –
Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior, desde que a instituição de
ensino a que fazem parte esteja credenciada no projeto junto ao Ministério da Educação.
Entretanto, os alunos que usufruírem o FIES, deverão, ao contrário do PROUNI, quitar
suas dívidas com os cofres públicos em até duas vezes o tempo de utilização do
financiamento. Além disso, o governo federal criou a Bolsa Permanência que é a
destinação de uma bolsa no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), destinadas a alunos
que possuem bolsa integral (COLLEONI, 2009, p. 42 e 43).
Já o REUNI se constitui em um programa de ampliação do acesso e permanência
dos alunos na Educação Superior, em instituições federais de ensino, no nível de
graduação. Segundo o Decreto nº 6.096/2007, as principais diretrizes do Programa em
relação ao acesso à Educação Superior são: “redução das taxas de evasão, ocupação de
6
O PDE foi lançado pelo MEC no dia 24 de abril de 2007, pelo decreto nº 6.094/2007, com a promessa
de garantir a qualidade da educação brasileira. Para saber mais: SAVIANI, Dermeval. PDE – Plano de
Desenvolvimento da Educação: Análise crítica da política do MEC. Campinas, SP: Autores
Associados, 2009.
7
Segundo Sguissardi (2006, p. 1043), há a possibilidade de troca de cerca de 10% das vagas ou 8,5% da
receita bruta, na forma de bolsas para alunos de escola pública, entre outros.
7
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vagas ociosas e aumento de vagas de ingresso, especialmente no período noturno [...];
ampliação de políticas de inclusão e assistência estudantil” (In: SAVIANI, 2009, p. 88).
Segundo o Relatório do Primeiro Ano de atuação do REUNI8, antes do
Programa apenas 24,3% dos jovens entre 18 e 24 anos tinham acesso a Educação
Superior. Com a implantação do REUNI e desde as políticas iniciadas em 2003 com o
PROUNI, o governo Lula, segundo entrevista concedida por Fernando Haddad9,
quadruplicou o atendimento na Educação Superior. Além disso, desde o início das
políticas de expansão do acesso foram criadas outras 13 universidades federais e outros
100 novos campi.
Com o REUNI, segundo o Relatório citado acima,
Considerando 2007 como ano referencial, quando o número de vagas
em cursos presenciais de graduação totalizava 132.451, os projetos
institucionais pactuaram um aumento para 146.762, o que representa
acréscimo de 11%. No entanto, essa meta foi superada e em 2008 as
universidades federais ofertaram um total de 147.277 vagas, o que
equivale a um aumento de 14.826 vagas (REUNI 2008 – Relatório de
primeiro ano. Disponível em: http://reuni.mec.gov.br).
Ao que se pode perceber, desde o início do governo Lula não há como se negar
que o número de alunos matriculados nas universidades brasileiras teve um aumento
considerável. Somente no estado do Paraná, no segundo semestre de 2010, mais de
5.000 alunos foram contemplados com as bolsas do PROUNI, segundo informações na
página do MEC. Entretanto, é necessário fazer algumas análises no que diz respeito às
intenções do Estado na criação de determinadas políticas sociais, pois se concebe o
Estado como uma instituição que tem uma função a cumprir e, de acordo com Saes
(2001), é
[...] de assegurar a coesão da sociedade de classes vigente, mantendo
sob controle o conflito entre as classes sociais antagônicas e
impedindo dessa forma que tal conflito deságüe na destruição desse
modelo de sociedade. (SAES, 2001, p. 96).
8
Disponível em: http://reuni.mec.gov.br. Acesso em julho de 2010.
Matéria disponível em:
http://portal.mec.gov.br:80/index.php?option=com_content&task=view&id=11941. Acesso em julho de
2010.
9
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Com o intuito de acatar as recomendações dos Organismos Internacionais, o
governo Lula está cumprindo sua função de mostrar números, visto que a ampliação do
número de alunos matriculados nas IES faz parte das propostas advindas destes
organismos. A democratização do acesso à Educação Superior, tão prometida e
almejada pelos estudantes brasileiros parece estar ocorrendo.
Porém, já nos primeiros anos do PROUNI, ficou constatado que há uma grande
quantidade de alunos usufruindo bolsas do programa e que não fazem parte das classes
menos favorecidas, economicamente. Ou seja, alunos de classe média, alguns até filhos
de diretores de instituições privadas10 e que usufruem a bolsa que poderia ser destinada
a alunos que realmente não têm condições de pagar por uma formação no nível superior.
O próprio governo afirmou na mídia que muitas informações prestadas pelos alunos no
ato da inscrição do programa não são fidedignas. Além do mais, a qualidade do ensino
ministrado por muitas Instituições Privadas, é no mínimo, discutível.
Em relação ao REUNI, há uma grande polêmica em relação a uma das medidas
propostas pelo programa que diz respeito à proporção de 18 alunos de graduação por
professor. Nas primeiras aproximações com o tema, observou-se que professores novos,
chamados professores-equivalente (não efetivos), seriam contratados para atender à
demanda de alunos, entretanto, estes professores teriam uma carga horária excessiva e
desproporcional ao salário.
Desta forma, questiona-se: Quais os interesses do Estado em democratizar o
acesso à Educação Superior? Políticas que ampliam o número de matrículas, mas
colocam em xeque a qualidade do ensino; políticas, de OIs, os países em
desenvolvimento que reafirmam a divisão de classes, podem ser consideradas medidas
de democratização do acesso ao ensino? As medidas que colocam em risco as questões
de equidade, permanência e acesso, a partir da universidade, demonstram-se
contraditórias.
10
No mês de junho de 2010, a Rede Paranaense de Comunicação apresentou uma reportagem no jornal
“Paraná TV”, na qual denunciou filhos de funcionários ligados à diretoria de IES privadas em uma
determinada instituição do estado, que usufruem de bolsas do PROUNI, nos cursos de medicina. Segundo
investigações dos jornalistas, os estudantes em questão são de classe média alta e estão usufruindo
ilegalmente de bolsas que poderiam ser destinadas a estudantes realmente necessitados. Em maio de
2011, o programa “Fantástico”, da Rede Globo, voltou a fazer novas denúncias relacionadas ao PROUNI.
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Além do mais, por que foi criado primeiramente um programa para as IES
privadas (PROUNI), sendo que, na época em que o mesmo foi criado, eram as
universidades públicas que enfrentavam os maiores problemas?
Nas análises de Pereira (2009), a universidade brasileira vem há tempos
passando por sérias crises em relação a sua política educacional. Segundo a autora, a
Educação Superior parece ser encarada como um problema, pois se vêem os
investimentos voltados para esta modalidade de ensino como um custo e não um
investimento. A ideia central de cortes de gastos não percebe o retorno que a
universidade pode dar para a sociedade. Além do mais, segundo Ristoff apud Pereira
(2009), a universidade ainda é percebida como um espaço para poucos privilegiados.
Desta forma, é necessário que se busque um programa que permita a ampliação do
acesso na universidade, notadamente pela classe trabalhadora.
Neste contexto, o PROUNI surgiu como uma medida para ampliar o acesso a
Educação Superior, porém, como já constatado, há um grande número de estudantes
matriculados nas universidades privadas, enquanto nas públicas, o índice é bem menor.
A forma neoliberal de gerir as políticas de educação superior
permitiram que o setor privado no Brasil responda hoje por 88% da
oferta das vagas e por 71% das matrículas, fazendo com que ele seja
um dos maiores do mundo (Censo da Educação Superior – INEP/
2004). Com o auxílio da rede privada, a oferta de vagas para o ensino
superior hoje cobre 86% dos concluintes do ensino médio. No entanto,
o Censo da Educação Superior de 2004 demonstra que apenas 10%
dos jovens na faixa de dezoito a vinte e quatro anos a estão
freqüentando (PEREIRA, 2009, p. 45).
A autora ainda revela que, no Censo de 2004, as vagas ociosas nas IES privadas
estavam em 49,5% antes do PROUNI, enquanto que nas IES federais, o índice era de
0,9% e, nas estaduais, 4,7%.
Não se esquecendo da função pela qual a universidade ficou incumbida no início
da década de 1990, como instituição responsável pela formação do homem globalizado,
parece haver uma disparidade em relação ao número de alunos matriculados na
universidade às ofertas de emprego. “A expansão atual do sistema de educação superior
não tem sido acompanhada por uma abertura de oportunidades no mercado de trabalho”
(PEREIRA, 2009, p. 46).
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Portanto, o acesso à Educação Superior por meio do PROUNI demonstra que o
objetivo do programa parece ser o de formar o exército de reserva para atuar na política
de desenvolvimento do país. De acordo com a autora,
O cenário econômico que estamos vivenciando está demonstrando que
os efeitos da democratização educacional não acarretam a
democratização social, mas que podem produzir novas e mais
dolorosas desigualdades. A educação funcionalista empreendida [...],
revela-se perversa para os estudantes e muito benéfica para o mercado
(PEREIRA, 2009, p. 46).
Parece que não há mais a preocupação em relação à formação integral do
homem, pautada na ciência, na sua formação intelectual e moral, pretendida no modelo
humboldtiano de universidade. Atualmente, o que conta na formação do indivíduo é a
sua ‘empregabilidade’. O fundamental diz respeito à ‘capacidades’11 que o trabalhador
tem a mais no seu currículo e que o tornam mais competitivo.
Valdemar Sguissardi (2006) também aponta suas considerações em relação às
políticas para a Educação Superior, no Governo Lula e aponta que, apesar de o governo
criticar a gestão de FHC e intencionar superá-la, houve mais continuidade do que
ruptura na proposta de reforma apresentada pelo Projeto de Lei nº 7.200/2006. Esta
proposta, se aprovada for, “tenderá a apresentar mudanças que aprofundariam o caráter
neopragmático e eficientista da reforma em curso nos últimos anos” (SGUISSARDI,
2006, p. 1021), devido o caráter neoliberal desta proposta. Sendo assim, a universidade
brasileira transitaria pelos ajustes dos modelos clássicos de universidade, o
humboldtiano e o napoleônico, e seguiriam o ‘modelo da universidade mundial do
Banco Mundial’ (Idem, p. 1024). O novo sistema nacional de avaliação (SINAES)
parecia ser, segundo o autor, a única medida mais próxima de uma possível ruptura com
a política para a educação superior do governo passado.
Em relação ao PROUNI, Sguissardi (2006, p. 1043) apresenta que os cálculos
financeiros indicaram que, se fossem ofertadas as vagas ociosas em Instituições
Federais de Ensino Superior, o custo seria menos oneroso e estaria coerente com a
proposta de ampliação do ensino superior, proposta pelo governo Lula.
11
Estas ‘capacidades’ vão desde domínio de mais de um idioma, conhecimentos em informática, estágios,
intercâmbios, etc.
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Carvalho (2006) também expressou suas opiniões em relação ao PROUNI.
Segundo a autora, é necessário compreender em que contexto econômico o programa
foi criado. No decorrer da década de 1990, a política fiscal sofreu alterações para
controlar o déficit público. Em 1998, FHC fez um acordo com o FMI no qual o então
presidente deveria garantir um superávit primário para assegurar a sustentabilidade da
dívida externa. Para isso, houve reformulações na economia brasileira, como citado
anteriormente.
No governo Lula, a elevação do superávit primário aconteceu por meio do
aumento da carga tributária e cortes nos gastos públicos, inclusive das verbas destinadas
à educação, saúde, salários, etc.
Tanto no governo FHC quanto no governo Lula, o Estado criou parcerias entre
os setores público e privado. Mas, segundo Carvalho (2006), no caso da Educação
Superior, a política de incentivos e isenções fiscais remonta aos anos finais da década de
1960, mais precisamente em 1966, com a criação da Lei nº 5.172/66, que institui o
Código Tributário Nacional. Este código
[...] determinava a não-incidência de impostos sobre a renda, o
patrimônio e os serviços dos estabelecimentos de ensino de qualquer
natureza. Em outras palavras, as organizações privadas de ensino
superior gozaram do privilégio, desde a sua criação, de imunidade
fiscal, não recolhendo aos cofres públicos a receita tributária devida
(CARVALHO, 2006, p. 982).
A imunidade,
[...] refere-se ao Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial
Urbana (IPTU), o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza
(ISSQN), ambos de competência do poder municipal, além do
Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza (IRPJ) e do
Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (para imóveis
localizados em zonas rurais), ambos de competência da União. As
filantrópicas, além da imunidade, gozam da isenção da cota patronal
da Previdência Social. Em contrapartida, exige-se a destinação da
receita bruta em gratuidade (CARVALHO, 2006, p. 983) 12.
12
Para maiores informações: C.f. CARVALHO, Cristina Almeida de. O PROUNI no governo Lula e o
jogo político em torno do acesso ao ensino superior. In: Educação e Sociedade, Campinas, vol. 27, n.
96, out. 2006.
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Com o incentivo ao setor educacional privado houve a expansão no número de
matrículas, cursos e instituições. Mas, esse excessivo número de vagas era superior ao
número de alunos que terminavam o Ensino Médio, o que se compreende que não são
apenas os formandos do Ensino Médio que buscam vagas na Educação Superior.
Como se sabe, nem todos os estudantes têm condições de custear uma formação
superior. No setor privado, isso resulta em inadimplência e/ou desistência. E mesmo o
FIES (Programa de Financiamento Estudantil) não tem sido suficiente para evitar estes
problemas devido aos critérios do financiamento. Neste contexto, o PROUNI é criado
com a intenção de conceder bolsas, principalmente aos estudantes carentes
(CARVALHO, 2006, p. 985).
O PROUNI foi apresentado como o programa que incluiria o trabalhador na
Educação Superior. Para isso, houve e há até hoje uma forte propaganda na mídia que o
apresenta como a principal medida para a democratização do acesso à universidade.
Mas, Carvalho (2006) levanta diversos questionamentos em relação à
efetividade do programa e um dos apontamentos que a autora faz diz respeito à
desigualdade social visto que, conforme a autora,
[...] as camadas de baixa renda não necessitam apenas de gratuidade
integral ou parcial para estudar, mas de condições que apenas as
instituições públicas, ainda, podem oferecer, como: transporte,
moradia estudantil, alimentação subsidiada, assistência médica
disponível nos hospitais universitários e bolsas de trabalho e pesquisa
(CARVALHO, 2006, p. 994).
Carvalho (2006), assim como outros tantos pesquisadores das políticas para a
ampliação do acesso à Educação Superior, questiona a qualidade e eficiência do
PROUNI e afirma que este foi criado não com a intenção de garantir educação de
qualidade à classe trabalhadora. Mas sim, de regulamentar a Educação Superior privada
conforme os novos moldes das finanças públicas.
Coerente com a nova lógica das finanças públicas, o diagnóstico do
aumento de vagas ociosas – no segmento privado -, combinado à
procura por ensino superior das camadas de baixa renda, fundamentou
a proposta do MEC de estatização de vagas nas instituições
particulares em troca da renúncia fiscal. Este trabalho sugere que o
Programa Universidade Para Todos deve operar [...] em benefício da
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recuperação financeira das instituições particulares endividadas e com
alto grau de desistência e de inadimplência. As instituições mais
beneficiadas parecem ser as lucrativas, que não apenas estão
submetidas às regras mais flexíveis, como também obtêm maior ganho
relativo em renúncia fiscal, em troca de um número reduzido de bolsas
de estudos (CARVALHO, 2006, p.995).
O que se percebe em relação ao PROUNI é que há um grande divisor de águas
em relação a sua função de ampliar o acesso à Educação Superior. De um lado, há
pesquisadores que afirmam que o governo está apenas exigindo que as IES privadas
cumpram seu papel social, conforme a Constituição Federal. Por outro, há os que
afirmam que o programa serve como meio de descentralizar a responsabilidade do
Estado como órgão mantenedor da educação superior. Enfim, são diversas as pesquisas
relacionadas à questão do acesso. Por isso, esta questão não está encerrada. A que se
propõe, é buscar analisar quais as reais intenções de programas como o PROUNI e o
REUNI que afirmam garantir o acesso da classe trabalhadora na universidade.
À guisa de conclusão
O que fica evidente nas propostas de reforma da Educação Superior Brasileira é
que as principais modificações da universidade sempre atenderão os interesses do
Estado. Contudo, não se pode negar que as alterações no setor, proferidas durante o
governo Lula, tiveram pontos positivos. Tanto o PROUNI quanto o REUNI, trouxeram
um aumento no número de estudantes matriculados nas IES brasileiras.
Porém, não se pode deixar de apontar que estas medidas possuem intenções
econômicas e político-ideológicas que têm o objetivo de garantir o desenvolvimento do
capitalismo. Se por um lado, tais políticas objetivam os interesses da classe dominante,
por outro permitem que a classe trabalhadora, que até então se mantinha aquém das
universidades, tenha condições de se qualificar e buscar, dentro dos limites de classe,
possíveis transformações na sociedade.
Entretanto, não se pode esquecer que um novo modelo de sociedade com uma
educação de qualidade e melhores condições para todos, só ocorrerá mediante a intensa
luta de classes. Sendo assim, somente com a luta por um ensino de qualidade e pelas
melhores condições na educação pública, com políticas que vão desde a Educação
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Básica até a Educação Superior é que se poderá afirmar que a educação no Brasil é para
todos.
Esta sociedade não está pronta e acabada. Ela está em constante transformação e
os rumos que ela toma são ditados pelos sujeitos que fazem a história e que tem o poder
de transformá-la. Assim, é na luta de classes e nas contradições da sociedade capitalista
que se devem travar as primeiras mudanças. A universidade é um espaço de lutas e
decisões. Por isso, se deve continuar na defesa do acesso e na garantia da qualidade do
ensino, principalmente, público. O direito à educação de qualidade está garantido em
lei. Logo, é dever do Estado cumprir esta função, coerentemente aos interesses da
maioria, ou seja, da classe que sustenta o poder – a classe trabalhadora.
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