Artigo apresentado no formato pôster no VI Seminário Nacional de Psicologia e Direitos Humanos:
Nenhuma Forma de Violência Vale a Pena.
BRASÍLIA: A CRESCENTE VIOLÊNCIA E AS CONTRADIÇÕES ENTRE O
PLANO PILOTO E AS CIDADES – SATÉLITES
Rócio Stefson Neiva Barreto1
RESUMO
O presente trabalho visa a buscar um maior entendimento da atual fase de Brasília, com
relação ao crescimento da cidade e à exponencial violência da região. Busca-se aqui,
ainda, problematizar a segregação dos pobres e excluídos, nas cidades-satélites, e as
elites, no plano-piloto.
Essa separação entre habitantes das cidades que cercam Brasília e o plano-piloto é
evidente e muito marcada. Ao contrário de em outras grandes metrópoles do Brasil, em
Brasília, quem mora nas regiões de alto poder aquisitivo tem pouco ou nenhum contato
com a pobreza, a miséria, a fome, a violência e tantos outros problemas típicos de
regiões menos favorecidas. Isso pode gerar, dentre outras coisas, uma enorme
intolerância por parte dos habitantes dessas regiões mais ricas. Brasília, a propósito, tem
figurado nos noticiários do país, nos últimos anos, como foco de questões de intensa
intransigência cultural, como mostra o ótimo exemplo do índio pataxó Hã-há-hãe (ou
Galdino Jesus dos Santos), queimado em 1997 por jovens da classe média brasiliense,
quando um deles se justificou, de forma lamentável, afirmando crer se tratar de um
mendigo, não de um índio.
Esse trabalho toca ainda em um velho problema brasileiro: a diferença de ação entre
policiais nas regiões mais ricas e nas mais pobres, sendo os Direitos Humanos, nestas
últimas, totalmente ignorados.
Vários estudos foram usados a fim de desvendar a questão dessa crescente intolerância
cultural em Brasília, dentre eles, o princial: “Juventude, violência e cidadania: os jovens
de Brasília”, de Júlio Jacobo Waiselfisz. Citam-se também estudos menos específicos,
principalmente de Michel Foucault, que trabalhou muito bem a questão das novas penas
após a Revolução Francesa.
PALAVRAS-CHAVES: Brasília, violência, plano-piloto, cidade-satélite, Hã-há-hãe,
Galdino Jesus dos Santos, polícia, intolerância.
1
O autor é graduado em Ciência Política, Ciências Sociais (Bacharelado e Licenciado) ambas graduações
pela Universidade de Brasília – UnB, Especialista em Democracia Participativa, República e Movimentos
Sociais na Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG e Especialista em Negociação Coletiva na
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRS. Contato [email protected]
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Nenhuma Forma de Violência Vale a Pena.
BRASÍLIA: A CRESCENTE VIOLÊNCIA E AS CONTRADIÇÕES ENTRE O
PLANO PILOTO E AS CIDADES – SATÉLITES
1 . INTRODUÇÃO
Em 20 de abril de 1997, o Brasil assistiu, perplexo, ao crime cometido contra
Galdino Jesus dos Santos, o índio pataxó Hã-há-hãe, que foi queimado enquanto dormia
em um ponto de ônibus, após ter chegado à capital federal para discutir com a FUNAI a
respeito da demarcação da reserva Caramuru-Catarina-Paraguaçu, no sul da Bahia.
O que mais chocou o país, nesse episódio, além da crueldade dos agressores, foi
o fato de ele ter ocorrido não nas periferias, como é costume nos noticiários brasileiros,
mas cometido por jovens de classe média. Um deles, para se justificar, disse ainda ao
Correio Braziliense, no dia seguinte, dia 21 de abril de 1997: “Foi apenas uma
brincadeira. Não sabíamos que era um índio. Pensamos que fosse um mendigo”.
Dada essa lamentável justificativa, fica o sentimento de intolerância imperante
nos grandes centros urbanos. Gays, negros, prostitutas, mendigos, índios... Que grupo
minoritário está salvo das mãos de vândalos e assassinos? Falando especificamente do
Distrito Federal, palco do crime, entre 1975 e 1995, segundo o Ministério da Saúde,
houve um aumento de 702% nas taxas de homicídios cometidos por jovens da região.
Em 29 de março de 2007, o Diário de Pernambuco noticiou outro escândalo de
intolerância na capital federal:
Alunos africanos da Universidade de Brasília (UnB) foram vítimas de
ação racista na madrugada de ontem. Por volta das 4h, as portas de
três apartamentos da Casa do Estudante Universitário (CEU) foram
incendiadas. Os moradores acordaram com a fumaça. Foi ouvido
também o barulho de explosão, possivelmente de uma bomba caseira.
Responsáveis pela ação ainda esvaziaram os extintores de incêndio
do primeiro e do segundo andares para impedir que o fogo fosse
apagado. Todos os apartamentos onde moram estudantes africanos
tiveram as portas marcadas com cruzes vermelhas.
O aluno de Administração de Empresas Samory de Souza divide o
apartamento 106 com três amigos, todos de Guiné Bissau. Ele conta
que um deles acordou sufocado com a fumaça e, desesperado,
acordou os outros companheiros. "Eu me levantei porque meu amigo
alertou sobre a fumaça. Fomos procurar pelos extintores. Nenhum
funcionava, só um do terceiro andar", conta.
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Nenhuma Forma de Violência Vale a Pena.
As manifestações de racismo são comuns na morada estudantil. No
mês passado, as paredes dos corredores foram pichadas com frases de
repúdio aos africanos. Na ocasião, segundo os alunos, a UnB teve
todo o cuidado para que a situação fosse contornada. Ontem, parte
dos estudantes promoveram uma manifestação contra a violência e
falta de segurança.
O ato violento com elevada carga de intolerância racial ocorre um dia
depois da ministra Matilde Ribeiro, afirmar que não é racismo um
negro se insurgir contra um branco.2
Para se estudar esses fenômenos de violência, torna-se necessária a distinção
entre plano-piloto e as cidades-satélites. E é nisso em que se basearão as linhas a seguir.
2. PLANO-PILOTO E CIDADES-SATÉLITE: O ABISMO QUE OS SEPARA
Segundo Júlio Jacobo Waiselfisz diz em “Juventude, violência e cidadania: os
jovens de Brasília”, os “jovens que freqüentam as cidades-satélites percebem as relações
interpessoais como mais amigáveis, mais companheiras, mais solidárias, havendo lugar
para a mistura de classes sociais”. Essa percepção, ele completa, “vai de encontro às
relações humanas no Plano Piloto, nas quais existiria uma permanente tentativa de
afirmação do poder político e econômico”.3
No citado estudo, Waiselfisz organizou algumas entrevistas de brazilienses,
dentre as quais, podemos citar alguns interessantes fragmentos que reforçam a tese do
parágrafo anterior. Um aluno da escola pública de uma cidade-satélite diz que as
pessoas do plano-piloto são “mais cabeça alta, eu sou, eu posso, eu tenho”, enquanto
outro diz que Brasília “joga para as cidades-satélites os mendigos, limpa o que não
serve”. Um terceiro completa ainda, afirmando que a capital “sempre fixou os mendigos
e tudo, sempre foi pegando, limpando, colocando nas cidades-satélites. Hoje em dia,
está mais difícil, você anda e vê pobre na rua, que você não via antes. Brasília está
perdendo aquele controle que tinha no começo”. É, provavelmente, porém, de um aluno
de uma escola particular do plano-piloto uma das mais interessantes citações, quando
ele diz: “As cidades-satélites são as cidades normais, o Rio é favela, tudo misturado
com as cidades. Aqui não, aqui já tem uma separação, pessoal pobre mora lá e a gente
2
Ver matéria completa em <url: http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/clipping/marco-2007/violencia-e-racismo-embrasilia> : disponível em 20/05/2009.
3
WAISELFISZ, Júlio Jacobo, Juventude, violência e cidadania: os jovens de Brasília, Cortez Editora,
1998, p. 22.
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aqui. Você perde um pouco da vivência porque você só convive com gente de classe
mais alta, todo mundo é metido demais.” “Lá no Espírito Santo estudei com filho de
bandido, filho de prostituta e tal. O pessoal botava só a camisa do uniforme, era aquela
roupa que ele vinha durante o ano todo. A mistura das classes sociais era bem maior e
então você tratava as pessoas de igual para igual, porque justamente você tinha a
convivência com o pessoal mais humilde. Isso é bom, você não convive só com
pessoas da mesma classe, você não vive numa redoma.”
É claro que a segregação social existe em todas as cidades do país, mas, ao
menos quanto ao campo espacial, em Brasília a demarcação é muito mais evidente,
visto que a separação entre pobres e ricos acontece entre uma cidade e outra e não
apenas entre bairros ou até mesmo entre favela e asfalto, como acontece na maioria das
metrópoles brasileiras. Se no Rio de Janeiro (que o último estudante citou), temos a
imensa favela da Rocinha ao lado da burguesa Barra da Tijuca, na capital federal,
vemos uma cidade empurrando para as outras o que ela julga não prestar.
As cidades-satélites são comumente vistas como foco de violência e de
desamparo social. O plano-piloto, porém, se mantém como molde a ser alcançado pelas
demais cidades. O não contato com a pobreza, como disse um dos alunos entrevistados,
denota a péssima reação por parte de alguns endinheirados quando vistos frente a tal
situação de exclusão. Com essa segregação tão forte no Distrito Federal, grupos pobres
e minoritários culturalmente (como o índio pataxó Hã-há-hãe) se vêem constantemente
abalados e em perigo, quando na capital.
Um bom exemplo dessa falta de contato por parte dos brasilienses do planopiloto com a violência das cidades-satélites está contido na fala de um aluno que
transitou por ambas as regiões. Ele diz: “Há três meses atrás cheguei a morar em cidadesatélite. Quando você fala que há violência, que há assalto, ninguém acredita, mas
quando você mora, você vive, você sente a diferença. Tem mais violência. Em cidadesatélite a coisa que mais você vê é violência. Você passa na rua e está acontecendo
alguma coisa: é tiro durante as noites, gritos, tudo”. Ele ainda completa: “Lá no
Paranoá, no final de semana, a gente não consegue dormir. Tiro para tudo quanto é lado,
gritaria, a gente fica morrendo de medo. Mas não se ouve aqui, próximo ao Lago, mas
lá... Lá onde eu morava, no Guará, que é um lugar tranqüilo, no mínimo três vezes por
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semana você ouvia dizer que alguém matou fulano ali, às vezes até por besteira. Um
vizinho meu brigou com o cunhado, foi em casa, tinha uma arma - cabeça-quente. Era
uma coisa que não tinha motivo nenhum para tirar a vida de uma pessoa. Só porque viu
a arma cheia de bala matou o cunhado e deu um tiro na cabeça.”
Waiselfisz levantou alguns dados coletados a partir de perguntas a moradores
brasilienses, que consistiam em questionar se Brasília era mais ou menos violenta que
outras cidades. Moradores, alunos, jovens e profissionais da educação divergiram
totalmente quanto a isso, variação esta que deve estar intimamente ligada a seus locais
de moradia: se no plano-piloto (para quem respondeu “menos”) ou se nas cidadessatélites (para aqueles que responderam “mais”).
Para não nos prendermos exclusivamente nos estudos de Waiselfisz, podemos
citar a preocupação que Rosimeri Aquino da Silva e Leônidas Roberto Taschetto
apresentam em seu artigo “Direitos humanos e polícia”4, quando mostram a contradição
entre a preocupação pós-Revolução Francesa em humanizar a pena, a fim de “corrigir”
o criminoso, e a realidade das cidades brasileiras, em especial em seus subúrbios, áreas
menos visadas pela mídia. Dizem eles que esse período de transição de filosofias
“inaugura uma mudança em que a alma, mais do que o corpo, deve ser penalizada. Mas
a arte de matar, contudo, não deixa de existir, ela continua ainda por longo período de
tempo, sendo substituída por procedimentos mais rápidos e menos dolorosos”,
gradativamente menos apresentada como espetáculo público. A perda de um direito ou
de um bem “passa a ser incorporada de forma definitiva no sistema penal ocidental.
Passa-se a investir na disciplina rígida do corpo, com interferência direta e subjetiva no
direito à liberdade e restrição dela”. Os autores lembram ainda que a privação da
liberdade, “na Idade Média, não era considerada uma sanção penal. O encarceramento
simplesmente cumpria uma função temporária de guarda e contenção do réu até o
momento do julgamento.” Assim, “a prisão existia somente como uma espécie de antesala de suplícios, servindo temporariamente de depósito-contenção e custódia do réu,
em condições subumanas, onde o réu esperava a celebração de sua execução”.5
4
Disponível em <url:
http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/civitas/article/viewFile/4869/3645>, em 20/05/2009.
5
Extraído do artigo presente na já citada página da Internet, p.3.
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Como poucas coisas no mundo são isoladas, Silva e Taschetto mostram como
esses maus tratos aos criminosos não são exclusividade do Brasil, tampouco dos
governos militares que ocuparam o poder por aproximadamente duas décadas no nosso
país.
O emprego de métodos desumanos contra os inimigos não é uma
exclusividade dos governos militares ditatoriais. Temos exemplos
bem mais recentes e vivos, como a polêmica Prisão de Guantánamo,
criada pelos Estados Unidos para isolar e interrogar prisioneiros
considerados terroristas. É um tanto paradoxal a criação de uma
prisão diferenciada na mais potente democracia ocidental: ao mesmo
tempo em que se prega o direito a liberdade, presenciamos uma
situação de exceção institucional, ou melhor, um Estado de exceção
no qual os direitos humanos internacionais não têm o mesmo
estatuto, a mesma legitimidade, pois não se sabe exatamente o que
acontece com os presos naquela prisão, a que regime estão
submetidos, se métodos de tortura e humilhação são utilizados. 6
Essas contradições são muito exploradas por Michel Foucault e seu clássico
“Vigiar e Punir”, uma das obras pioneiras sobre o tema. Lá, ele mostra como
antigamente as punições eram corporais, vexatórias, com o criminoso sendo exposto em
praça pública, sofrendo agressões físicas ou mesmo sendo assassinado diante dos olhos
da população, que, em êxtase, apreciava o extermínio daquele que ousou transgredir as
regras da sociedade; de quebra, o rei ainda saía fortalecido, mostrando o exemplo do
que aconteceria com aquele que, porventura, fizesse o mesmo.
A Revolução Francesa, então, trouxe à tona a preocupação com o indivíduo, os
Direitos Humanos, mas fica a questão: que são as punições e as ações policiais hoje,
mais especificamente no Brasil, senão um exemplo do que pode acontecer àqueles que
não obedecerem às leis, uma afirmação do poder público, um colírio para os olhos das
classes média e alta?
Foucault diz que “o que faz com que o poder se mantenha e que seja aceito é
simplesmente que ele não pesa só como uma força que diz não, mas que de fato ele
permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber, produz discurso”. Assim, “devese considerá-lo como uma rede produtiva que atravessa todo o corpo social muito mais
do que uma instância negativa que tem por função reprimir”.7
6
7
Idem, p. 5.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1988a, p.8.
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No Brasil, porém, não podemos deixar de associar o desrespeito aos Direitos
Humanos com os governos ditatoriais que por aqui passaram, cujas filosofias ainda
impregnam fortemente as Forças Armadas e a Polícia Militar do nosso país. A
tolerância àqueles que se opõem ao sistema vigente (que é nada além do que fazem os
bandidos, sejam de que época forem) é sempre muito estreita por parte da polícia, com
constantes agressões físicas contra os infratores.
Estudos acerca do posicionamento dos governos militares são extremamente
ricos em autores com Skidmore e vale destacar uma citação sua, apenas sobre o governo
Médici, para não desviarmos em demasiado do nosso foco, que é a violência nos dias
atuais, em Brasília.
As forças de segurança sob a ditadura de Médici contavam com o
medo para ajudá-las a descobrir e eliminar os “inimigos internos” do
Brasil. A repressão atingiu especialmente os grupos que tentavam
organizar as classes trabalhadoras. Os sindicatos, por exemplo, eram
submetidos a controles draconianos. Os membros do clero que
tentassem organizar qualquer atividade potencialmente política
passavam a ser vigiados, incomodados, quando não submetidos a
humilhações mais graves. As forças de segurança também vigiavam
de perto qualquer forma de organização envolvendo os moradores de
favelas e os trabalhadores rurais. (...) Até 1973 os poucos
remanescentes das guerrilhas haviam renunciado a essa crença. O
governo Médici também disseminara o medo entre os membros da
elite. As famílias de presos políticos raramente encontravam um
advogado que quisesse patrocinar sua causa. A imprensa era outra
instituição intimidada pela repressão. A prisão e a tortura de
jornalistas, as pressões ou incentivos sobre os proprietários de
jornais, juntamente com a censura direta, haviam reduzido quase toda
a mídia, exceto uns poucos semanários de pequena circulação, à
condição de líderes de torcida do governo, ou no mínimo de simples
caixas de ressonância das informações geradas no palácio
presidencial.8
Em Brasília, houve recentemente uma violenta invasão, por parte da polícia, ao
lar de idosos, em Recanto da Ema. Fatos como este não ocorreriam no Lago Norte, Sul
ou Sudoeste, afinal aqui moram pessoas com maior poder aquisitivo, além de haver uma
maior visibilidade por parte da imprensa. Voltando ao estudo de Waiselfisz,
questionamo-nos: se um morador do Recanto da Ema respondesse à pergunta sobre
Brasília ser mais ou menos violenta que as outras metrópoles brasileiras, ele responderia
o mesmo que um habitante do plano-piloto?
8
SKIDMORE, Thomas. Brasil de Castelo a Tancredo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988, p.354.
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A intolerância em Brasília, porém, é, provavelmente, maior que nas grandes
metrópoles, pois o contato entre os dois mundos – de ricos e pobres – é muito menos
extenso.
As cidades-satélites, com essa intransigência de todas as partes, vão figurando
entre as mais violentas do país, segundo dados do Ministério da Justiça: Luziânia, a cem
metros de Brasília, está em 10º lugar no ranking de cidades com o maior número de
homicídios no país, onde 119 pessoas foram assassinadas no ano de 2005, uma média
de 63,95 assassinatos por cada grupo de cem mil habitantes. Temos ainda as seguintes
cidades: Águas Lindas (35 mortes por 100 mil), Recanto das Emas (35,5) Planaltina
(32, 82), Santa Maria ( 30,34) e Valparaíso (29,9).
O governador José Roberto Arruda (DEM) considera que “a escalada da
violência nas proximidades da capital é o resultado da expansão urbana nos últimos
anos”. Auxiliares do governador são mais incisivos. “Para eles, a explosão da violência
é resultado direto da distribuição de lotes pelo ex-governador Joaquim Roriz (PMDB)”.
Segundo tais assessores, “Roriz facilitava a ocupação de vastas áreas urbanas, mesmo
sem condições de oferecer infra-estrutura e emprego para as crescentes levas de
imigrantes. Sem maiores expectativas, essas pessoas estariam cada vez mais vulneráveis
à ação da criminalidade.”9
Outro problema diagnosticado – dessa vez por Miguel Lucena, delegado da
Polícia Civil do Distrito Federal – é o tráfico de drogas (em especial, cocaína, merla e
maconha) de regiões relativamente próximas, como Bolívia e Colômbia. 10 Se
compararmos essa situação com as principais metrópoles brasileiras, em especial Rio e
São Paulo, verificamos a mais propícia localização geográfica de Brasília para tal
tráfico do exterior.
3 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assim, portanto, várias são as razões que levaram Brasília à passagem de
cidade-modelo para metrópole violenta. O fator, porém, que torna a situação brasiliense
9
Informação retirada do site da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência), na página <url:
http://www.abin.gov.br/modules/articles/article.php?id=1038>, disponível em 20/05/2009.
10
Informação retirada da mesma fonte citada acima.
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peculiar, em relação às demais metrópoles do país, é a delimitação mais marcante entre
os habitantes das cidades-satélites e os do plano-piloto.
Essa segregação tão marcante entre ricos e pobres, inexistente nas outras
grandes cidades brasileiras, foi, a nosso ver, o principal motivo para a crescente
intolerância cultural de Brasília. A solução para uma maior harmonia no convívio entre
as diferentes classes sociais passa por uma maior conscientização dos ricos e um melhor
preparo da polícia (de forma a evitar que agressões aos Direitos Humanos sejam
frequentemente cometidas nas cidades pobres).
Resta, por fim, a reflexão sobre a importância do contato com outras culturas.
Viver numa bolha de perfeição, longe dos problemas pelos quais outras classes sociais
passam, gera, invariavelmente, uma terrível sensação de distanciamento e intolerância
extrema, que é o que vem apresentando Brasília nos últimos anos, justamente quando as
cidades-satélites incharam e viraram um reduto de miséria.
4. BIBLIOGRAFIA
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1988.
______. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 1988.
SILVA, Rosimeri Aquino da; TASCHETTO, Leônidas Roberto. Direitos humanos e
polícia.
Disponível
em
<url:
http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/civitas/article/viewFile/4869/3645>, em
20/05/2009.
SKIDMORE, Thomas. Brasil de Castelo a Tancredo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.
WAISELFISZ, Júlio Jacobo. Juventude, violência e cidadania: os jovens de Brasília,
Cortez Editora, 1998.
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