UNIDADE DE MEDIAÇÃO E ACOMPANHAMENTO DE CONFLITOS DE CONSUMO
TELEMÓVEL. PROMOÇÃO. LIMITAÇÃO AO STOCK EXISTENTE. BOA FÉ
JOÃO LIMA CLUNY
Factos: Um consumidor folheia uma revista de uma determinada entidade, na qual
encontra uma oferta promocional de um auricular bluetooth que lhe seria entregue se
adquirisse um determinado telemóvel.
No caso concreto, o consumidor interessado naquela promoção decidiu adquirir o
produto, na esperança de receber o auricular no momento da celebração do contrato. Tal
não veio a suceder, pois a empresa em questão afirmou que não tinha o auricular
disponível, não estando sujeita, desse modo, a nenhuma obrigação para com o
consumidor. A reclamada refugiava-se na circunstância de que a promoção apenas teria
efeito mediante a disponibilidade do stock.
Resolução: No caso em análise estamos perante um contrato de compra e venda
associado a uma promoção. Neste sentido, a entidade vendedora ao lançar a promoção
acima referida tem a obrigação de assegurar os meios necessários ao seu cumprimento.
De facto, segundo o artigo 9.º, n.º 1, da Lei de Defesa do Consumidor, “o consumidor
tem direito à protecção dos seus interesses económicos, impondo-se nas relações
jurídicas de consumo a igualdade material dos intervenientes, a lealdade e a boa fé,
nos preliminares, na formação e ainda na vigência dos contratos.”. Também o artigo
227.º, n.º 1, do Código Civil prevê que “quem negoceia com outrem para conclusão de
um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as
regras da boa fé (…)”. Assim sendo, tendo o consumidor adquirido o produto em causa
aliciado pela promoção da entidade vendedora, não deve ser aceitável que esta possa
escusar-se ao cumprimento da obrigação baseando-se na limitação do stock disponível.
Se o fizer, estaremos perante um caso de desconformidade entre a obrigação assumida
pelo vendedor na celebração do contrato – entrega do telemóvel e do auricular bluetooth
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– e a prestação que efectivamente veio a ser feita (entrega apenas do telemóvel). Neste
sentido, referem-se os artigos 762.º, n.º 1, do Código Civil, que estabelece que “o
devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está obrigado” e 763.º,
n.º 1, do mesmo diploma que prevê que “a prestação deve ser realizada integralmente e
não por partes (…)”. Para além disso, a entidade vendedora violou o artigo 2.º, n.º 1, do
Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, que regula a compra e venda de bens de
consumo, que dispõe que “o vendedor tem o dever de entregar ao consumidor bens que
sejam conformes com o contrato de compra e venda” e o artigo 2.º, n.º 2, alínea a), do
mesmo diploma que prevê que o bem não é conforme ao contrato quando não for
conforme à descrição que dele é feita pelo vendedor.
Neste contexto, os artigos acima mencionados exigem que a entidade vendedora
actue de boa fé também no momento em que lança estas promoções, de forma a cumprir
integralmente o contrato que celebra com o consumidor. Nestas situações, é dever da
entidade vendedora informar os consumidores do stock que tem disponível, devendo
este ser equivalente ao número de aparelhos afectados à promoção. Só desta forma se
pode falar de um efectivo respeito pelo dever de boa fé contratual, pois só assim os
consumidores saberão previamente que ao comprarem o respectivo aparelho este estará
ou não abrangido pela promoção.
Neste contexto, o consumidor tem direito a exigir que lhe seja entregue o auricular
referido na promoção. Se tal não for efectivamente possível, deverá ser-lhe entregue o
montante equivalente ao valor do bem referido na promoção.
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