c e n t r o
d e
i n f o r m a ç ã o
d o
m e d i c a m e n t o
O R D E M D O S FA R M A C Ê U T I C O S
Medicamentos e pediatria
A maior parte dos medicamentos prescritos em pediatria
não foram testados em crianças. Segundo a Food and Drug
Administration (FDA) só 20 a 30 % dos fármacos aprovados
por este organismo têm indicação para uso pediátrico.1 Na
proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Con­
selho relativo a medicamentos para uso pediátrico é referi­
do que mais de 50% dos medicamentos utilizados no trata­
mento das crianças, na Europa, não foram objecto de ensaios
nem de autorização específica para uso pediátrico.2
Ensaios clínicos
A falta de investigação nos diferentes grupos da popula­
ção pediátrica deve­se à combinação de diversos factores
entre os quais se podem citar o baixo retorno financeiro
para a Indústria Farmacêutica, dificuldades em realizar
ensaios clínicos devido a questões éticas, necessidade de
equipamento e técnicas médicas apropriados para pedia­
tria e falta de especialistas em farmacologia pediátrica.1
Muitos dos medicamentos usados em pediatria apenas
estão aprovados em adultos. No entanto, os dados não
podem ser extrapolados para as crianças, pois a biodis­
ponibilidade, farmacocinética, farmacodinâmica, eficácia
e efeitos adversos podem diferir significativamente entre
os doentes pediátricos e adultos, bem como entre os sub­
grupos da população pediátrica devido às diferenças de
idade, maturação de órgãos e doença.3,4
Medicamentos
Para além da falta de medicamentos aprovados com indi­
cação para uso nos diferentes grupos da população pedi­
átrica existem outros problemas com a farmacoterapia:
– Falta de formulações adequadas. Muitas especialidades
farmacêuticas só estão disponíveis em formas de dosagens
sólidas formuladas para adultos e que não podem ser fa­
cilmente reformuláveis. O uso de comprimidos ou cápsu­
las para a preparação de formulações líquidas adequadas
para pediatria é um risco na ausência de informações so­
bre a estabilidade físico­química e microbiológica e a bio­
disponibilidade.5
– Falta de medicamentos com concentrações adequadas.
Grande parte dos medicamentos que estão comercializados
em formulações líquidas só existem em concentrações ina­
dequadas para uma medição rigorosa de pequenos volumes
correspondentes à dose requerida para pediatria, o que obri­
ga a diluição dessas preparações podendo originar graves
erros de medicação. Por outro lado, relativamente às con­
centrações de medicamentos orais e injectáveis, tem de se
ter em consideração a sua osmolaridade para evitar efeitos
adversos relacionados com a hiperosmolaridade a nível do
tracto gastrointestinal e no local da injecção (flebites).5
– Excipientes não referidos e/ou indesejáveis nos medi-
camentos. Existem especialidades farmacêuticas que con­
têm na sua formulação excipientes não referidos ou inde­
sejáveis em pediatria. Alguns desses excipientes como,
por exemplo, o álcool benzílico, fenol, propilenoglicol, sul­
fitos, etc. são referidos como causadores de efeitos ad­
versos em pediatria.5
Experiência num hospital materno-infantil
Nos Serviços Farmacêuticos de um hospital materno­infan­
til em que a área pediátrica representa uma fracção domi­
nante, os problemas relacionados com a terapêutica farmacoló­
gica são uma constante diária da actividade farmacêutica.
Para tentar solucionar estes problemas recorre­se a:
– Fraccionamento das formas farmacêuticas sólidas e
preparação de papéis medicamentosos;
– Preparação de formulações líquidas orais a partir de
especialidades farmacêuticas devidamente suportadas por
estudos de estabilidade físico­química e microbiológica;
– Diluição das formas líquidas injectáveis;
– Importação directa de medicamentos não comerciali­
zados em Portugal;
– Utilização de medicamentos órfãos;
– Utilização de medicamentos sem aprovação em pedia­
tria (uso off label) desde que esteja documentado o seu
uso ou não haja alternativas terapêuticas.
Farmacovigilância pediátrica
A identificação e notificação das reacções adversas a medi­
camentos (RAM) é particularmente importante na população
pediátrica e requer especial atenção, atendendo a que:6
– A acção dos fármacos e a sua farmacocinética nas crian­
ças, é diferente da dos adultos;
– A natureza e curso das doenças e as RAM podem diferir
entre adultos e crianças;
– As doenças crónicas requerem tratamento crónico e a
susceptibilidade às RAM pode variar durante a vida da crian­
ça com a idade, crescimento e desenvolvimento;
– Os dados de segurança na população pediátrica não po­
dem ser extrapolados dos dados dos adultos, porque certas
RAM podem manifestar­se apenas nas crianças;
– As crianças podem não ser capazes de expressar clara­
mente as RAM, por isso muitas reacções podem não ser
detectadas.
Estes problemas são mais relevantes quando os fármacos
envolvidos não estão autorizados para utilização em pedia­
tria como é o caso dos não aprovados, os de uso off-label
e formulações extemporâneas.
Os erros de medicação são uma importante causa de reac­
ções adversas. Em pediatria estão muitas vezes associados
com a adaptação para uso pediátrico de medicamentos com
dosagens e formulações de adultos. É importante que as
Setembro/Outubro 2006
Boletim do CIM
Director: J. A. Aranda da Silva
Boletim do CIM
Setembro/Outubro 2006
RAM suspeitas de ocorrerem neste contexto de erros de
medicação sejam notificadas.6
Neste processo de farmacovigilância pediátrica deverão es­
tar envolvidos a população pediátrica e os seus familiares,
as autoridades regulamentares, a indústria farmacêutica,
os profissionais de saúde, organizações de doentes, os sis­
temas de saúde e os meios de comunicação.6
Incentivar a investigação
de medicamentos para uso pediátrico
Têm sido tomadas algumas iniciativas a nível internacional
– Agência Europeia do Medicamento (EMEA), FDA e orga­
nizações profissionais – com o objectivo de estimular o de­
senvolvimento de medicamentos para pediatria, aumentar
a disponibilidade de formulações apropriadas e de medica­
mentos adequadamente testados para serem usados em
pediatria e melhorar a informação disponível para os pro­
dutos não autorizados para uso pediátrico.
A nível da EMEA foram elaborados vários documentos (di­
rectivas comunitárias, regulamentos, normas) que irão dar
um contributo importante para o desenvolvimento de me­
dicamentos seguros, eficazes e adequadamente formulados
para pediatria:
– Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do
Conselho relativo a medicamentos para uso pediátrico
Nesta proposta são apresentados incentivos, medidas re­
gulamentares e outras medidas de apoio em matéria de
investigação e desenvolvimento clínicos para que os novos
medicamentos pediátricos e os já comercializados se pos­
sam adaptar plenamente às necessidades específicas das
crianças.2
– Note for Guidance on the Clinical Investigation of Medicinal Products in the Paediatric Population
Directiva comunitária relativa a ensaios clínicos que esta­
belece os requisitos específicos para proteger as crianças
que participam em ensaios clínicos.
– Guideline on Conduct of Pharmacovigilance for Medicines
used by Paediatric Population
Guia básico para o planeamento de actividades de farma­
covigilância pediátrica.6
– Regulamento (CE) n.º 141/2000 relativo a medicamentos
órfãos
Estabelece um procedimento comunitário de atribuição do
estatuto de medicamento órfão e cria incentivos à investi­
gação, ao desenvolvimento e à introdução no mercado de
medicamentos com este estatuto.
– Reflection Paper: Formulations of Choice for Paediatric
Population
É feita uma reflexão sobre formulações pediátricas cujo ob­
jectivo é desenvolver medicamentos que:7
✓ ofereçam formas de dosagem e concentrações adequadas
para a pediatria;
✓ contenham unicamente excipientes seguros para todos
os subgrupos pediátricos;
✓ contemplem formas de administração adaptadas às ne­
cessidades das crianças.
Nos Estados Unidos da América foi implementada legislação
e regulamentos específicos para incentivar a realização de
ensaios clínicos em crianças, que conjuga medidas de incen­
tivo e obrigações, e graças à qual se conseguiu fomentar a
elaboração de medicamentos para uso pediátrico – Best Pharmaceuticals for Children Act (BCPA); FDA Pediatric Rule; Food
and Drug Administration Modernization Act (FDAMA).1
O Grupo Espanhol de Farmácia Pediátrica (GEFP) tentou so­
lucionar o problema de falta de ensaios clínicos em pediatria,
actuando como promotor científico dos ensaios clínicos dos
medicamentos que pretende estudar e deixando o papel de
promotor económico ao laboratório fabricante dos mesmos.8
Informação sobre o uso
de medicamentos pediátricos
É importante aumentar a informação sobre o uso de me­
dicamentos em pediatria, pois uma maior disponibilidade
da informação pode contribuir para aumentar o seu uso
seguro e eficaz. Neste sentido já foram tomadas algumas
iniciativas a nível europeu:2
– EudraCT – base de dados de ensaios clínicos criada pela
directiva comunitária relativa aos ensaios clínicos, que é
fonte de referência para a informação sobre todos os estu­
dos pediátricos em curso ou já concluídos, realizados tanto
na Comunidade Europeia como em países terceiros;
– Iniciativas previstas na proposta de regulamento do
Parlamento Europeu e do Conselho relativo a medicamen­
tos para uso pediátrico:
✓ rede europeia – criação pela EMEA de uma rede euro­
peia de redes nacionais e europeias, investigadores e
centros com conhecimentos e experiência específicos
em matéria de realização de estudos na população em
idade pediátrica;
✓ inventário das necessidades terapêuticas da população
em idade pediátrica – elaborado pelo Comité Pediátrico.
Embora a indústria farmacêutica esteja actualmente sob
alguma pressão para efectuar ensaios clínicos em pedia­
tria, muitos dos dados publicados na literatura têm resul­
tado do esforço individual dos investigadores.
Conclusão
Apesar das medidas legislativas e regulamentares que têm
sido implementadas, dos incentivos e das expectativas cria­
das, as dificuldades relacionadas com a terapêutica farma­
cológica dos doentes pediátricos ainda continuam a ser um
problema na prática diária dos farmacêuticos hospitalares.
Para resolução destes problemas, uma das actividades im­
portantes dos farmacêuticos consiste em seleccionar e co­
ligir dados sobre a experiência clínica dos novos medica­
mentos para pediatria e sobre formulações extemporâneas
de medicamentos adaptados à população pediátrica.
Maria Luísa Serrano Duarte Rosa
Marina Isabel Chumbinho de Albuquerque
Maria Filomena Tavares Oliveira
Serv. Farm. Hospital de Dona Estefânia
Bibliografia
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23591005en.pdf (acedido em 23.09.06).
7. Comittee for Medicinal Products for Human Use. Reflection paper:
Formulations of choice for the paediatric population. EMEA. 28.07.06
www.emea.eu.int/pdfs/human/peg/19481005en.pdf (acedido em
23.09.06)
8. Hidalgo E. Farm Hosp, 2002; 26 (5): 263­65.
Após a introdução do clorodiazepóxido em 1960, e devido
à sua relativa segurança, as benzodiazepinas (BZ) rapi­
damente substituíram os barbitúricos e os hipnóticos se­
dativos.1 As BZ apresentam ampla margem terapêutica,
não produzindo insuficiência respiratória fatal ou colapso
cardiovascular, sempre que não se associem a outros de­
pressores do sistema nervoso central (SNC).2 Apesar dos
aspectos favoráveis, as BZ têm causado preocupação pelo
facto de poderem causar dependência física e psíquica,3­5
não serem isentas de reacções adversas que podem ser
graves como o síndrome de abstinência, bem como pela
possibilidade de utilização abusiva ou associada ao con­
sumo de drogas ilícitas.3
As BZ são utilizadas pelas suas propriedades hipnóticas,
ansiolíticas, miorrelaxantes e anticonvulsivantes.6­8 Com
a introdução de BZ de alta potência com maior efeito te­
rapêutico e rápido início de acção, como alprazolam ou
lorazepam, foram descobertos novos usos terapêuticos,
como em ataques de pânico, na doença bipolar, mania
aguda ou agitação aguda.9
As BZ podem causar efeitos adversos, tais como sono­
lência, falta de concentração, ataxia, descoordenação mo­
tora, fraqueza muscular, diplopia, vertigem, confusão e
problemas de memória.1 Podem tornar mais lento o tempo
de reacção1,10 e diminuir o discernimento. Num estudo em
condutores envolvidos em acidentes de tráfico, o uso de BZ
foi associado a um maior risco.10 É referida a associação
entre o uso de BZ e sintomas depressivos, com ideias de
suicídio nalguns casos.1 Têm sido descritas reacções para­
doxais com agravamento da insónia, ansiedade ou da agres­
sividade.6 As BZ de acção longa são as mais vulgarmente
associadas com a diminuição das capacidades cognitivas;
as que têm metabolismo oxidativo e semividas mais longas,
como clorodiazepóxido, diazepam e flurazepam, acumulam­
­se mais facilmente causando sedação prolongada.11
As BZ interagem sinergicamente com outros depressores
do SNC (hipnóticos, antidepressores sedativos, neurolép­
ticos, anticonvulsivantes, anti­histamínicos e álcool).1
O tratamento prolongado pode provocar tolerância,2,10
que pode ser atribuída à diminuição da sensibilidade dos
receptores e não está necessariamente relacionada com
o abuso, a dependência ou um aumento da dose.2 A tole­
rância ao efeito hipnótico desenvolve­se rapidamente,1,6
em poucas semanas de uso regular;12 a tolerância ao efei­
to ansiolítico surge mais lentamente.1,6 Pode manifestar­se
por perda de eficácia ou necessidade de aumento da dose
para manter o efeito. No entanto, a maioria dos estudos
de seguimento não sugere uma perda significativa de efei­
to ansiolítico com o tempo, nem proporciona evidência
notável de aumento de dose.13
As BZ não são fármacos de abuso, mas o abuso de BZ é
comum entre pessoas que abusam de álcool, cocaína,
opiáceos ou hipnóticos sedativos.4 Deve haver precaução
particularmente em doentes com história de abuso.1
Pode desenvolver­se dependência com umas semanas ou
meses de uso regular.12 Como resultado, surgem sintomas
de abstinência após uma rápida redução da dose ou supres­
são abrupta do seu uso.1 São factores potencialmente as­
sociados com o desenvolvimento de dependência: uso pro­
longado, curta duração de acção, altas doses, alta potência,
dependência de outros medicamentos ou de álcool, altera­
ções de personalidade e uso sem supervisão médica.10
A curto prazo os sintomas de retirada são principalmente
de ansiedade.1,10,14 Adicionalmente são comuns: insónia,
tremor, sudação,1,14 aumento do ritmo cardíaco e da pres­
são sanguínea,1 perda de apetite e peso, zumbidos e pro­
blemas de percepção.14 Os sintomas agudos mais graves
como convulsões e delírio, mais comuns em paragens
abruptas, são raros.1,6 O início dos sintomas pode ir des­
de umas horas até 3 semanas após a suspensão do tra­
tamento; a duração e a gravidade dependem de factores
como a semivida de eliminação da BZ e a idade do doen­
te.14 Em 10­15% dos casos as manifestações só desapa­
recem passados vários meses, às vezes anos. Os principais
sintomas que se prolongam são insónia, depressão, sin­
tomas sensoriais ou motores, problemas gastrointestinais
e de memória.6
Se o doente decide parar o tratamento com BZ hipnó­
ticas deveria ser animado a uma redução progressiva das
doses,6,14 com apoio psicológico se necessário.12 O pro­
grama de redução da dose deve ser iniciado com consen­
timento e cooperação do doente, que deve ser alertado
dos riscos de dependência com o uso a longo prazo15 e de
que os sintomas que vai ter são pela retirada da medica­
ção e não uma recaída. No caso de doentes que tomam
doses únicas ao deitar, especialmente se for durante anos,
a retirada costuma ser difícil.14 Não se podem parar se os
doentes têm actualmente uma crise ou uma doença que
necessite de este tratamento. Nalguns casos, por exem­
plo, se os doentes são também dependentes de álcool,
pode ser necessário referenciar o doente a equipas espe­
cializadas.10
A interrupção nunca deve ser brusca, mas sim seguir uma
redução progressiva,7 de um décimo a um quarto da dose
diária em cada uma a duas semanas.6,7 Em doentes selec­
cionados e motivados obtiveram­se altas percentagens de
êxito, mesmo nos que tomaram durante anos.12 Uma es­
tratégia consiste em passar a uma dose equivalente de uma
BZ de longa duração de acção como o diazepam, antes do
início da redução da dose,6,12,14,15 sendo tomado de prefe­
rência à noite.14 Se aparecem sintomas de abstinência deve­
­se manter a dose da BZ até desaparecerem,14 mas de
preferência não aumentar.6,14 Caso seja necessário, a redu­
ção quinzenal da dose pode ser ainda menor. É preferível
que a retirada seja lenta; o tempo para chegar à suspensão
completa pode ser de 4 semanas a mais de um ano.14
Com frequência as BZ são prescritas a idosos, particular­
mente sensíveis aos potenciais efeitos adversos.6,11 A de­
terioração cognitiva associada com o envelhecimento e a
demência podem piorar.1 Vários estudos têm sugerido que
as BZ aumentam o risco de quedas e dos acidentes de
viação no idoso.1,10,11,12,14 As provas de aumento do risco
de fractura da anca com o uso de hipnóticos apresentam
divergências e são incompletas; no entanto, quando pres­
critos nos idosos deve­se considerar esse risco potencial.10
As BZ, especialmente as de longa semivida, devem ser
evitadas neste grupo etário sempre que possível.12
Outras alternativas para a insónia são o zolpidem e
zopiclone, com acção curta, e o zaleplon de acção muito
curta.10 São fármacos com propriedades similares às BZ,
não relacionados estruturalmente,10,12,14 mas que actuam
nos mesmos locais de acção do SNC.6,12 Se bem que a
tolerância e a insónia de ricochete sejam fenómenos ra­
ros, existe a possibilidade de dependência e sintomas de
Setembro/Outubro 2006
Uso racional de benzodiazepinas
Boletim do CIM
Setembro/Outubro 2006
retirada.12 Devem ser usados por períodos curtos (máximo
4 semanas para zolpidem e zopiclone e 2 para o zale­
plon).10,14 Foram desenvolvidos para tentar evitar algumas
das desvantagens das BZ (sedação diurna, dependência,
sintomas de abstinência),6,16 mas actualmente não existe
evidência de diferenças clinicamente relevantes em eficá­
cia ou segurança.6,12,14,16
Até 15% dos adultos referem sintomas de insónia persis­
tente ou grave (pelo menos 3 noites por semana durante
um mês). Acontece especialmente em mulheres, idosos e
doentes com problemas psiquiátricos ou médicos. São po­
tenciais causas de insónia: estímulos externos (luz, ruído),
somáticos (dor, dispneia), problemas fisiológicos (jet lag),
psicológicos (ansiedade, depressão) e efeitos no sono de­
vidos ao consumo de cafeína, álcool ou medicamentos.12
Para um correcto tratamento da insónia há que conhecer
e considerar a causa.6,14 Podem utilizar­se medidas não
farmacológicas como higiene do sono, relaxação ou tera­
pia comportamental.6 Pode ser útil por exemplo realizar
um diário do sono12,14 e avaliar e tratar os factores de saú­
de que o podem afectar (stress, depressão, apneia do
sono, asma, nictúria, dor, abuso e dependência de cafeína,
álcool ou nicotina).14
Devem realizar­se ajustes no estilo de vida para promover
o sono (higiene do sono): não se deitar após uma refeição
abundante;12,14 horário regular, incluindo os fins­de­sema­
na;6,12,14 realizar exercício suave ou moderado durante o dia;
evitar o tabaco, a cafeína ou o excesso de álcool;14 boas
condições ambientais;12 evitar as sestas, o exercício físico
intenso e actividades estimulantes ao fim da tarde.6,12
As BZ são os fármacos de primeira escolha, devendo a se­
lecção ser individualizada segundo a idade e as patologias
associadas, o tipo de insónia e as características farmaco­
cinéticas do fármaco.14
Na ansiedade é preferida a psicoterapia. Nas formas agu­
das pode ser instaurada simultaneamente uma BZ, de
preferência de longa duração de acção como o diazepam,
no máximo durante algumas semanas. O efeito ansiolítico
deve ser exercido durante o dia, o que coloca problemas
na condução de veículos ou máquinas.6
mático, o tempo máximo da prescrição duma BZ são 2­3
noites; se a insónia estiver associada com doença previ­
sivelmente limitada, é razoável um tratamento intermi­
tente durante 2 a 3 semanas no máximo.12
Quando as BZ se usarem como hipnóticas o tratamento
não deverá ultrapassar as 4 semanas, nem as 8 a 12 se­
manas quando utilizadas como ansiolíticas, incluindo nes­
tes períodos a redução gradual da dose. Em certos casos
poderá ser necessário prolongar, mas isto não deve ocor­
rer sem reavaliação do doente. As BZ só estão indicadas
em doença grave, incapacitante ou o quando o indivíduo
está sujeito a ansiedade extrema.18
Na insónia crónica também se devem preferir as interven­
ções não farmacológicas, recomendando­se o tratamento
farmacológico só para doentes com formas graves ou in­
capacitantes.14 Neste caso, o tratamento deve ter em vis­
ta aliviar causas subjacentes como a depressão.12 O uso
crónico deve ser identificado, estimulando quando ade­
quado, a paragem gradual.10
A evidência de benefícios com o uso de hipnóticos a longo
prazo é escassa; há evidência, pelo contrário, de que pro­
vocam efeitos prejudiciais, mas a satisfação dos doentes
com a sua eficácia é alta.14,16 Existe um contraste entre as
recomendações científicas e a prática.14 O uso racional
destes fármacos optimizará a sua eficácia, diminuindo as
complicações inerentes a um manuseamento negligente;
permitirá a normalização do seu uso beneficiando os do­
entes e também eliminará a rejeição irracional que causam
num importante sector da população médica.7
O seguimento e avaliação da prescrição de BZ pelos pró­
prios médicos é importante.14 A discussão com o doente
dos objectivos e limitações da terapêutica pode ser uma
ajuda para minimizar o risco de tratamentos crónicos para
problemas agudos; deve existir um plano para a paragem
da terapêutica, reavaliando a necessidade de tratamento
a curto e a longo prazos.4
Para conseguir um uso adequado destes fármacos devem
ser reforçadas as iniciativas dirigidas aos profissionais de
saúde e aos doentes.
RECOMENDAÇÕES DE USO
Bibliografia
O uso de BZ continua a aumentar, sendo dos fármacos
mais prescritos em muitos países.14 De acordo com dados
do INCB (International Narcotics Control Board) o consu­
mo de BZ na Europa é muito superior ao de outros conti­
nentes e tem vindo a aumentar nos últimos anos.3 A nível
europeu, Portugal apresenta um dos maiores níveis de
utilização de BZ, como foi indicado no relatório do INCB
do ano de 2004, que aconselhou analisar a prática de
prescrição e utilização das BZ.17
Apesar da publicação de diversas normas sobre uso apro­
priado das BZ, a prescrição inadequada é ainda uma preo­
cupação.10
Em geral, os hipnóticos devem ser utilizados só por perío­
dos muito curtos (idealmente intermitentemente e não
mais do que uns dias) para aliviar insónia grave causada
por acontecimentos de curta duração ou por doença, só
após uma cuidadosa avaliação e quando medidas não far­
macológicas se tenham mostrado insuficientes.12 Nesse
caso usar a menor dose eficaz,4,12,14,15 o menor tempo pos­
sível,12,14,15 de preferência intermitentemente (uma noite
em cada duas ou três) 6,12,14 e com interrupção gradual.14
Por exemplo, em insónia provocada por um sucesso trau­
Aurora Simón
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
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Medicamentos e pediatria - Ordem dos Farmacêuticos