AS MUDANÇAS NA PAISAGEM CULTURAL DO BAIRRO DO
VARADOURO, JOÃO PESSOA/PB.
FERREIRA, ANNA CRISTINA ANDRADE (1); TINOCO, MARCELO BEZERRA DE
MELO (2); ARAÚJO, NATÁLIA MIRANDA VIEIRA DE (3)
1. UFRN. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo
Centro de Tecnologia/UFRN – Campus Universitário Lagoa Nova – Natal/RN – CEP: 59078 - 970
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2. UFRN. Departamento de Arquitetura e Urbanismo
Centro de Tecnologia/UFRN – Campus Universitário Lagoa Nova – Natal/RN – CEP: 59078 - 970
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3. UFRN. Departamento de Arquitetura e Urbanismo
Centro de Tecnologia/UFRN – Campus Universitário Lagoa Nova – Natal/RN – CEP: 59078 - 970
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RESUMO
Para elaboração deste trabalho serão analisadas as mudanças ocorridas no Bairro do Varadouro,
considerado um dos locais mais antigos da cidade de João Pessoa/PB, além de estar inserido dentro
do perímetro de tombamento federal e estadual de seu Centro Histórico. Ali está localizado o antigo
Porto do varadouro, ou Porto do Capim, por onde se iniciou a conquista da Capitania, e que funcionou
como principal entreposto comercial da cidade até a década de 1930, quando as atividades portuárias
foram transferidas para o município vizinho, Cabedelo. Desde então o bairro tem passado por
mudanças importantes, inclusive com a chegada de comunidades de baixa renda na década de 1950,
algumas décadas após a transferência do porto. Estas dividem espaço com as edificações históricas
restantes e a margem do rio Sanhauá. Não se pretende esgotar o assunto, mas entender como as
alterações urbanas e sociais podem ter agido sobre a paisagem cultural local. Considerando que uma
paisagem ao perder suas características automaticamente começa a dar vida a uma nova, ao se falar
em áreas preservadas, a perda dessas características implica na perda dos dados históricos e culturais
de um local e uma sociedade. A área também tem sido alvo de projetos de requalificação por parte dos
órgãos de proteção, onde a premissa principal é a remoção das comunidades residentes. Como se
trata de uma área ás margens de um rio há ainda a necessidade da recuperação ambiental das áreas
degradadas, sobretudo as áreas de mangue, que foram paulatinamente aterrados pela comunidade do
Porto do Capim. Assim, percorrendo-se a história do bairro pretende-se discutir sua verdadeira vocação
e entender como se deu o processo de decadência a que chegou, sendo o ponto de início da historia da
cidade hoje abandonado, e ao mesmo tempo como os projetos de requalificação desenvolvidos
procuram respeitar o seu passado.
Palavra-chave: Paisagem Cultural; Comunidade; Varadouro.
INTRODUÇÃO
A maior parte do Bairro do Varadouro está inserida no perímetro delimitado como Centro
Histórico de João Pessoa, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado
da Paraíba – IPHAEP, em 1982, e pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional –
IPHAN, em 2007 (mapa 01). Desde a década de 1980 tem sido alvo de diversos projetos de
requalificação, alguns pontuais voltados a restauração e recuperação do patrimônio edificado,
outro mais amplos englobando trechos da malha urbana. Para além da intenção
preservacionista o que se percebe é uma forte tendência em transformar a área em um polo
turístico.
Mapa 01: Perímetro de proteção rigorosa federal e estadual com entorno e marcação dos bairros.
Fonte: Base da Prefeitura de João Pessoa editado em novembro de 2013.
Situado às margens do rio Sanhauá, ali se encontra um dos pontos iniciais de ocupação da
cidade, o local onde foi criado o antigo porto após a chegada dos colonizadores, hoje
desativado, e edificações que remontam ao período de ascensão da área como centro
comercial da cidade. Após a desativação das atividades portuárias a área entra em
decadência, com grande evasão dos moradores que ocupavam o casario antigo. Em paralelo
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a isso os aterros onde outrora se situavam as instalações do porto passam a ser ocupados por
comunidades de baixa renda, que ocupam as margens do rio até os dias atuais.
Eis um resumo do cenário observado no Varadouro nos dias atuais, mas que está prestes a se
modificar novamente com a realização de mais um projeto de requalificação, que pretende a
remoção das comunidades ali situadas para instalação de equipamentos voltados ao turismo.
Ao longo deste artigo pretende-se apresentar a trajetória do bairro desde sua fundação,
buscando o entendimento das transformações impostas a paisagem local.
Para efeito deste estudo foram definidos três momentos de sua expansão urbana: (1) do
século XVI a XVIII onde se relata como ocorreu a fundação da cidade e suas transformações
urbanas ligadas principalmente ao porto; (2) os séculos XIX e XX, lapso temporal onde se
situa a sua expansão a partir da contribuição de uma rede ferroviária inicial e transferência das
atividades portuárias para a cidade de Cabedelo e, (3) os séculos XX e XXI, que descreve
aspectos do seu tecido urbano em transformação, bem como uma abordagem sobre as
iniciativas de valorização patrimonial em escala urbana e arquitetônica.
Evolução urbana do Bairro do Varadouro
1. Século XVI a XVIII – Fundação da cidade, início da ocupação urbana e
implantação do Porto.
Os relatos históricos demonstram que a ocupação da capitania da Paraíba remonta de uma
sucessão de tentativas de conquistas a partir de 1574. De acordo com SANTOS (2001, p.
103-104) ela se consolidou em 1584 com a construção do Forte de São Felipe e São Tiago,
situado nas proximidades da margem esquerda do rio Paraíba. A implantação definitiva do
forte só viria a ocorrer em 5 de agosto de 1588, mesma data de fundação da cidade de Filipéia
de Nossa Senhora das Neves, nome em homenagem a santa do dia, que se instalou na
porção mais elevada do sítio. Sua topografia privilegiada favorecia a visualização e o controle
do território circundante, e seguia os preceitos empregados em outras povoações da coroa
portuguesa. O núcleo inicial da cidade logo recebeu edifícios oficiais, como; câmara, cadeia,
açougue, armazéns de açúcar, determinantes no traçado do núcleo recém-fundado, e em sua
parte mais baixa, próxima ao rio, tem início a construção do Porto do Varadouro, que
localizava-se na margem esquerda do rio Sanhauá, afluente do rio Paraíba, único canal de
entrada para a cidade de Filipéia a partir do litoral (REIS FILHO, 2000, p. 124).
Defronte do dito rio, um pouco mais para o Sul, fica a boca do Varadouro, que
faz uma larga baía estendendo-se quase um quarto de légua para o interior,
(...), mas no ano de 1637 o diretor da mesma Capitania, em virtude de ordem
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S. Excia. o supremo Conselho fez construir ali armazém grande e capaz com
um bonito molhe ou dique no varadouro, onde atracassem as embarcações, e
se embarcasse ou desembarcasse o açúcar, para cômodo de utilidade dor
mercadores (HERCKMANS, 1982, p. 42).
Conforme descrições sobre a ocupação portuguesa na capitania no inicio do século XVII,
havia uma clara distinção entre o sistema de arruamento na porção mais alta, com aspecto
mais reticular, e a mais baixa da cidade, apontada como irregular e orgânica. Essa região
ribeirinha foi liberada para abrigar as instalações de apoio às atividades portuárias, como
oficinas náuticas, galpões, paióis, armazéns e alojamento para soldados e oficiais
encarregados da defesa da cidade (RAYNAUD, 2006,151-152). Uma iconografia datada de
aproximadamente 1637 (figura 01) traz o registro das vias, limites, cruzamentos e pontos
marcantes, sobretudo as edificações das ordens religiosas já existentes nesse período. Na
representação percebe-se que tais construções delimitam um eixo que liga o rio à parte mais
elevada da cidade. Dentre esses edifícios a maior parte pertence às ordens religiosas (Igreja
Matriz de Nossa Senhora das Neves [1], Mosteiro de São Bento [2], Conjunto Franciscano [3],
Convento Carmelita [4], Santa Casa da Misericórdia [5], Conjunto Jesuíta [6] e Igreja de São
Frei Pedro Gonçalves [7]), o que demonstra que as atividades religiosas e portuárias foram
forças determinantes para a configuração urbana da cidade, um primeiro núcleo de integração
correspondente ao cruzamento entre a Rua Direita e a Rua Varadouro, hoje Duque de Caxias
e Ladeira de São Francisco, respectivamente (MOURA FILHA, 2012, p. 173-175).
Figura 01: Representação da Frederica Civitas, de Jan van Brosterhuisen mostrando as primeiras
ocupações, o traçado e a localização das ordens religiosas na cartografia holandesa entre os anos de
1637-1645(1647).
6
5
7
2
1
4
3
Fonte: Adaptação a partir de MOURA FILHA, 2012, p. 168.
No período entre os anos de 1634 e 1645 a capitania esteve sobre o domínio dos holandeses,
onde suas principais edificações foram usadas como fortificações, sua população foi reduzida
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e as ordens religiosas expulsas. Segundo ALMEIDA (1978) a Paraíba pouco se beneficiou
desse período quanto a melhoramentos e ampliação do núcleo urbano.
Reconheça-se como de justiça que a Paraíba saiu ganhando algo com a
ocupação holandesa, não tanto em obras materiais, porque neste particular
viu apenas melhorado o forte do Cabedelo, o do Varadouro, a construção de
um armazém com um trapiche sobre o Sanhauá, sem mais nenhuma
realização do tipo arquitetônico (ALMEIDA, 1978, p. 213).
Foi um período de batalhas e desmonte do patrimônio construído na cidade alta e próximo ao
porto do Varadouro, na parte baixa da cidade, que abrigava os armazéns de açúcar,
fortificações e igrejas. Segundo MOURA FILHA (2012, p. 261) os poucos recursos financeiros,
a baixa produção açucareira, a transferência da sede administrativa do país para o Rio de
Janeiro, as catástrofes naturais (secas e cheias), e o demorado processo de anexação do
território à capitania de Pernambuco, fizeram com que houvesse uma estagnação econômica
que influiu diretamente na tímida evolução urbana durante a segunda metade do século XVII e
parte do século XVIII.
A crise por que passava a capitania abria possibilidades de remodelação da cidade num
processo muito lento. Suas estruturas edificadas tais como igrejas, colégios, seminários,
câmara e cadeia, entre outros foram sendo reconstruídas ao sabor da disponibilidade de
recursos. As fortificações tiveram prioridade, apesar de algumas propostas de reconstrução
não terem sido realizadas, “a cidade ia sendo reconstruída sobre as estruturas pré-existentes,
não se expandindo para além do pequeno núcleo de ‘povoação’ definido no passado”
(MOURA FILHA, 2012, p 318). A precariedade das edificações inseridas na área do porto é
descrita em um relato datado de 1699.
No Varadouro, o Capitão Grangeiro situou o porto e a “alfândega velha”, visto
que, em 1696, o novo edifício ainda estava por construir. Registrou, também,
a existência de um “passo ou armazém”, certamente, o “paço do Varadouro”,
construído em 1675, para a instalação da “balança e trapiche” de
comercialização do açúcar. Quanto às ruas, assinalou a “rua do Varadouro
para a cidade”, partindo do porto e desembocando na Rua Nova, à esquerda
do Mosteiro de São Bento, tendo um traçado pouco semelhante às vias de
ligação representadas na anterior cartografia holandesa (MOURA FILHA,
2012, p.320).
Assim, mesmo com uma estrutura precária, a zona portuária do Varadouro se consolidou por
meio do funcionamento do Porto do Capim, da Alfândega, do Tesouro Provincial e dos
armazéns de mercadorias (SCOCUGLIA, 2010, p. 108).
É no início do século XVIII, em seu primeiro quartel, ainda sobre a estrutura urbana herdada
do século XVII, que muitos lotes passaram a ser doados, sobretudo na Rua Nova (hoje
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General Osório), Rua Direita (atual Duque de Caxias), e na Rua do Varadouro
(correspondente à Ladeira de São Francisco). A tímida expansão da cidade nesse século,
portanto, se deu em boa parte privilegiando razões de ordem econômica, mercado de terras e
disponibilidade de recursos naturais. Segue-se um período sem grandes avanços, e a partir
de 1756 inicia-se um momento de decadência econômica, influenciada pela transferência da
comercialização do açúcar que passa a ser feita através do porto do Recife.
2. Século XIX a XX – Expansão e consolidação urbana, implantação da rede
ferroviária e transferência do Porto para Cabedelo.
Assim permaneceu a cidade até a primeira metade do século XIX, que será marcada por
diversos eventos políticos que indicam transformações nos espaços dos núcleos urbanos no
Brasil. Tais eventos são intensificados pela independência declarada em 1822, que inicia uma
fase de melhoramentos urbanos, como abertura e alargamento de vias.
Conforme SCOCUGLIA (2010) o Varadouro já apresentava consolidada a sua vocação como
polo comercial da então Cidade da Parahyba, por abrigar formações edilícias importantes
como o Porto do Capim, a Alfândega, o Tesouro Provincial, e os armazéns. A dinâmica
comercial e urbana do bairro, portanto, se davam entre as praças 15 de Novembro, Álvaro
Machado e Napoleão Laureano. Na década de 1850 é realizado um diagnóstico dos
alinhamentos das construções e logradouros no perímetro do Varadouro, para mais tarde
promover a abertura da Estrada do Aterro (hoje Avenida Sanhauá) e a construção de um cais
(SCOCUGLIA, 2010, p.109). Neste mesmo ano foi aberta a Rua da Imperatriz, atual Rua da
República, que auxiliaria a ligação entre a cidade e o rio, por se situar “em linha reta à Ponte
Sanhauá, para maior comodidade do transito dos que vierem em direção à cidade alta [...]”
(RODRIGUES, 1961, p.22-23).
Dentre as mudanças apresentadas podemos destacar ainda a acorrida dos anos de 1857 a
1859 quando foi construída a estrada paralela ao rio Sanhauá, que ligava a ponte de mesmo
nome à Praça da Gameleira, atualmente chamada Praça Álvaro Machado, essa estrada se
tornaria o caminho por onde se instalou a rede ferroviária (RODRIGUES, 1961, p.25). Em
1868 ocorreu outra importante intervenção na área do Varadouro, a Ponte Sanhauá, que
atravessa o rio de mesmo nome e atualmente liga as cidades de João Pessoa e Bayeux,
passa por uma reforma, sendo “construída com estrutura em ferro importado da Inglaterra,
reforçada estruturalmente ao longo dos anos, pois servia como um dos acessos principais da
capital com o interior do estado” (SCOCUGLIA, 2004, p.207).
Importante destacar que o nome Estrada do Aterro remete à iniciativas intervencionistas que
visavam sanar problemas causados por áreas alagadiças lindeiras às praças Álvaro
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Machado, Napoleão Laureano e XV de Novembro. Essas áreas representavam
provavelmente barreiras naturais à fluidez da dinâmica comercial auxiliada pelas pela
instalação da ferrovia e da estação a partir da década de 1880.
Nos anos de 1884 e 1885 ocorre a construção da estação ferroviária Great Western e a
implantação e urbanização da antiga Praça da Estação, que passou a se chamar Largo da
Gameleira, atual Praça Álvaro Machado, sendo toda a área calçada e arborizada. No ano
seguinte, em 1886, houve a inauguração da linha de bondes da Ferro-Carril Paraibana que
circulava por todo o centro da cidade e possuía uma de suas paradas no Varadouro, próximo
a estação ferroviária (DIEB, 1999, p.57; 62). Da estação, inicialmente administrada pela
Companhia Estrada de Ferro Conde D’eu e depois pela inglesa Great Western Railway,
partiam ramais que chegavam à Sapé (1881), Mulungu (1882), Pilar (1883), Guarabira (1884),
Cabedelo (1889), Campina Grande (1907), Santa Cruz e Natal (1884), estas duas ultimas no
Rio Grande do Norte.
Já no início do século XX a existência do porto fez com que a área fosse ocupada por muitos
estabelecimentos de uso comercial. Lá eram negociados diversos produtos nacionais e
importados, e se localizaram as primeiras lojas de departamento da cidade, alfaiatarias, etc.
Devido ao baixo calado do rio Paraíba a entrada e saída de alguns produtos ocorriam por
transporte terrestre, principalmente através da ferrovia, fato que fez da Praça Álvaro Machado
funcionasse uma área auxiliar do porto, reforçando a vocação comercial do bairro
(SCOCUGLIA, 2010, p. 108).
Na década de 1920 houve a tentativa de construção de um novo porto no varadouro (Imagens
01 e 02), que pudesse receber embarcações maiores. As obras chegaram a ser iniciadas,
mas logo o projeto foi abandonado e a atividade portuária deslocada para o município de
Cabedelo, os resquícios desses atracadouros podem ser vistos até hoje em meio à mata
densa entre a área de domínio da via férrea e o rio. Nesse período ocorreram melhorias
urbanas na cidade, como a criação da rede de esgoto e implantação da estação elevatória da
cidade na Praça Álvaro Machado. Na década de 1930 as reformas urbanas continuam. Estas
contemplavam demolições de imóveis para aberturas de avenidas, alargamento e criação de
novos logradouros e praças (SCOCUGLIA, 2010, p. 81-110; 2004, p. 82).
Depois de um período de estagnação das intervenções portuárias, a administração pública
redireciona seus interesses para o contexto higienista e de embelezamento. No início da
década de 1930, durante a administração de Argemiro de Figueiredo, um período de
renovações instaura-se na cidade. Dentre essas renovações podem-se citar: a demolição de
alguns edifícios coloniais no final da Avenida Maciel Pinheiro que resultou na abertura da
Praça Antenor Navarro, e a transformação de uma sequência de outros edifícios na Rua João
Suassuna, em direção a praça XV de novembro. Os casarões que foram demolidos e
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reformados deram lugar a um acervo de estilo eclético e Art Decó, tendências arquitetônicas
predominantes na época (SCOCUGLIA, 2010, p.110).
Imagens 01 e 02: Construção do cais provisório, em 07 de março de 1922, e estado dos
atracadouros no ano de 2004.
Fonte: Acervo Humberto Nóbrega / Imagem cedidas pela COPAC-JP.
Pode-se observar que o desejo pela renovação da capital paraibana não se limitou à
transformação da forma urbana, mas da sua arquitetura. O ideário progressista republicano
das elites se expressava no espaço da cidade através das novas conexões do Varadouro com
outros destinos de importância comercial, sendo realizados mediante ferrovias.
3. Século XX a XXI – Transformação urbana e reconhecimento como patrimônio
histórico.
As transformações urbanas do Bairro do Varadouro ocorridas no início do século XX dizem
respeito ao processo de degradação, descaracterização e desmonte parcial do acervo
edificado do Varadouro.
A partir da década de 1940, depois da inauguração do Porto de Cabedelo em 1935, as
atividades portuárias são transferidas para aquele município gerando um processo gradual de
expansão da cidade na direção norte. Paralelamente a isso, intervenções feitas no Parque
Sólon de Lucena e abertura da Avenida Epitácio Pessoa, ajudaram na ocupação de outros
bairros da capital (Tambiá, Torre, Roger, Cruz das Armas, Jaguaribe, etc.), bem como à
expansão em direção as praias urbanas (Tambaú e Cabo Branco) (SCOCUGLIA, 2010, p.
111).
O Varadouro passa a ser ocupado por outras atividades de comércio e serviços –
marmorarias, madeireiras e oficinas mecânicas – que não condizem com a destinação original
dos edifícios existentes no bairro, o que vem causando impactos sobre o tecido urbano e seus
componentes. Apesar do valor arquitetônico, urbanístico e paisagístico, o bairro convive com
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a perda da vitalidade uma vez que os espaços permeáveis aos acessos visuais foram
obstruídos conforme a necessidade de adequação aos novos usos. A herança colonial do
traçado da região impossibilita que a relação pedestre x veículos ocorra de maneira
satisfatória. Com relação ainda ao trânsito e as vias nas áreas centrais da cidade de João
Pessoa:
Gradativamente, verificou-se o deslocamento de parte do comércio e dos
serviços localizados no centro para outros bairros, próximos as grandes
artérias de transporte centro/orla. Prejudicado pelo sistema viário de ruas
estreitas e espaços insuficientes para estacionamento, bem como pela
ausência de mobiliário urbano de qualidade, o trânsito da área central
tornou-se caótico, afugentando consumidores com maior poder aquisitivo
(SCOCUGLIA, 2010, p. 82).
Na década de 1950 a centralidade do Varadouro entra em decadência, sendo dois os motivos
principais para que isso ocorra: a desativação do porto e o crescimento da cidade no sentido
centro-praia, com a urbanização da Avenida Epitácio Pessoa. Por volta desta década
consolida-se a ocupação das margens do rio Sanhauá por moradores de baixa renda,
inicialmente com a fixação de famílias de pescadores no local do antigo porto. Durante a
década de 1960 tem início a expansão da ocupação da Comunidade do Porto do Capim, cujo
perímetro é delimitado pela Rua Porto do Capim e Rua Frei Vital, se estendendo até a
margem oeste do rio Sanhauá, ocupação que perdura até os dias atuais. Segundo dados da
prefeitura, em 2007 havia 297 famílias morando em habitações assentadas sobre os aterros
que foram realizados às margens do Rio Sanhauá desde o ano de 1976 (SCOCUGLIA, 2004,
p.111-118). Em abril de 2014 a prefeitura cadastrou 314 habitações na mesma área (PMJP,
2014, 3).
Com o declínio econômico o uso habitacional começa a se tornar escasso nos casarões
existentes no bairro, dando lugar ao uso comercial. Na década de 1990 tem início a ocupação
irregular de outra área do Varadouro onde se situavam galpões da fábrica de cimento Nassau,
próxima à Estação Ferroviária, dando início a Vila Nassau. Ampliação da Vila Nassau com
habitações sobre o mangue e fechamento de alguns galpões de depósito (SCOCUGLIA 2010,
p. 113).
Conforme COSTA (2009, p. 108), a primeira iniciativa para delimitação de um perímetro de
interesse histórico e cultural na cidade de João Pessoa data de meados da década de 1970,
quando a prefeitura define poligonal de preservação rigorosa por ocasião da publicação do
primeiro plano diretor da cidade. Ainda na década de 1970 é criado Instituto do patrimônio
Histórico e Artístico da Paraíba – IPHAEP que no transcorrer do início dos anos 1980 atua no
tombamento de alguns logradouros públicos. A delimitação do perímetro inicial do Centro
Histórico de João Pessoa foi estabelecida pelo Decreto Estadual nº 9484 de 10 de maio de
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1982, e nele estavam contidos o bairro do Varadouro e o Porto do Capim. Alguns anos depois,
em 1987, é criada a Comissão Permanente de Desenvolvimento do Centro Histórico de João
Pessoa – CPDCHJP, órgão mantido através de um convênio entre os governos do Brasil e da
Espanha, com objetivo de desenvolver projetos na área de proteção (COSTA, 2009, p. 117).
Ao longo do final do século XX e início do XXI ocorreram ações de revitalização e
requalificação da área do Varadouro, como a recuperação da Praça Anthenor Navarro e seu
casario, restauração de alguns bens materiais como o Hotel Globo, a Fábrica de Vinho Tito
Silva e a Igreja de São Frei Pedro Gonçalves, dentre outros.
A construção do Terminal Rodoviário de Passageiros de João Pessoa, ocorrida na transição
das décadas de 1970 e 1980, redefiniu a configuração viária e auxiliou uma retomada da
centralidade urbana do Varadouro (SCOCUGLIA, 2010, p.111). No início do século XXI, a
implantação do Terminal de Integração do Varadouro, localizado nas proximidades do
Terminal Rodoviário, vem complementar a recuperação da importância da área.
Além dessas novas inserções na área de intervenção do Porto do Capim, persistem
exemplares arquitetônicos que traduzem o ápice das atividades portuárias como a
Superintendência da Alfândega, o Edifício Sede da Alfândega, o Tesouro Provincial, Estação
Ferroviária de João Pessoa, a Estação Elevatória de Esgotos e os Galpões Portuários
adjacentes. Algumas dessas edificações sobressalentes se encontram atualmente sem uso
podendo servir de suporte para atividades que auxiliem na revitalização da área juntamente
com adequação do seu espaço urbano (COSTA, 2009, p. 138).
Segundo Marília DIEB (1999) ao final do século XX as praças da cidade encontram-se em
razoável estado de conservação, com exceção das duas praças no Varadouro, a Praça Álvaro
Machado e a Praça XV de Novembro, e duas na cidade alta, a Praça Dom Ulrico e a Praça Rio
Branco.
Em função de modificações no sistema viário do Varadouro, a Praça 15 de
novembro perdeu boa parte de sua área, resumindo-se a dois pequenos
canteiros em meio a movimentada via, cuja superfície, que lhe foi subtraída,
serve hoje como pátio de manobra e estacionamento para caminhões e
veículos. Na Praça Álvaro Machado encontra-se instalado um posto de
gasolina, que ocupa toda sua área – uma provável concessão feita
irregularmente a particulares (DIEB, 1999, p.128).
No início do século XXI são realizadas algumas ações de preservação na área. Em 2000
ocorre o tombamento da Ponte Sanhauá pelo IPHAEP, órgão de proteção do patrimônio
histórico estadual, através do Decreto nº 21722 de 07 de agosto, e em 2004 a revisão do
perímetro de tombamento Estadual do Centro Histórico de João Pessoa, pelo Decreto
Estadual nº 25138. Em 2008 ocorre o tombamento federal, por parte do Instituto do Patrimônio
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Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, através do processo 1501-T-02 (perímetros mostrados
no mapa 01).
Atualmente tem-se desenvolvido projetos de requalificação e recuperação da área do
Varadouro, O Projeto de Requalificação do Porto do Capim e criação do Parque Sanhauá. Em
ambos um dos focos principais é a retirada da população residente nas comunidades do Porto
do Capim e Vila Nassau, uma população já enraizada a área e que participa de seu cotidiano,
a recuperação das áreas de mangue e requalificação das praças, além da inserção de
equipamentos e atividades voltadas ao turismo cultural, como arenas para eventos, piers para
passeio de barco e mirantes, justamente nas áreas de onde serão removidas as
comunidades.
CONCLUSÃO
Toda a trajetória histórica do Varadouro demonstra a importância da área para a cidade de
João Pessoa, como ponto inicial de desenvolvimento de seu sitio urbano e palco de
acontecimentos importantes. A área possui características fisiográficas privilegiadas, como a
proximidade com o rio Sanhauá e a topografia, que ditaram o uso e ocupação ali empregados,
as edificações instaladas e mudanças urbanas.
Para além da história e do patrimônio material, seu patrimônio imaterial e natural possui um
valor inegável, foram as atividades ali implantadas que ajudaram a estreitar os laços
rio-cidade, que tem sido renegado durante todo o período de decadência pela maior parte da
população, mas não pelos moradores que ali residem.
Nos estudos sobre paisagem parece haver um consenso sobre o limite de suas mudanças,
pois a medida que uma área perde a maior parte das suas características morfológicas e
culturais imediatamente ela passa a dar origem a uma nova paisagem. Assim, as mudanças
impostas pelos projetos de requalificação de fato atuarão como extintores de alguns de seus
elementos, modificando mais uma vez a vocação da área, de comercial e habitacional para
um polo de exploração turística.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Horácio de. História da Paraíba I. 2ed. João Pessoa: Editora Universitária da
UFPB, 1978.
COSTA, Ana Luíza Schuster da. Perímetro de Proteção do Centro Histórico de João
Pessoa: Três décadas de história. João Pessoa: PPGEU/UFPB, 2009. (Dissertação de
mestrado)
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DIEB, Marilia Azevedo. Áreas Verdes Públicas da Cidade de João Pessoa: Diagnóstico e
Perspectiva. João Pessoa: PRODEMA/UFPB, 1999. (Dissertação de Mestrado)
HERCKMANS, Elias. Descrição Geral da Capitania da Paraíba - 1639. João Pessoa: A
União, 1982.
MOURA FILHA, Maria Berthilde. De Filipéia à Paraíba: uma cidade na estratégia de
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3° COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO - DESAFIOS E PERSPECTIVAS
Belo Horizonte, de 15 a 17 de setembro
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