III Simpósio Nacional Discurso, Identidade e Sociedade (III SIDIS)
DILEMAS E DESAFIOS NA CONTEMPORANEIDADE
Formação de professores para o ensino de Língua Portuguesa na
UFOP: análise de programas disciplinares
Andressa Cristina Coutinho Barboza1
Este estudo tem a proposta de compreender como tem se dado a formação do
professor para o ensino de língua portuguesa na universidade após as mudanças
educacionais ocorridas nos anos 1990. A LDB 9394/96 instituiu mudanças fundamentais
no trabalho de formação de professores, das quais podemos citar a indicação da
universidade como locus privilegiado para essa formação (artigo 62). Outra mudança
marcante validada por esta lei e ratificada pelo Parecer CNE 04/1998 estabelece a ampla
veiculação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), aqui concebidos como
instrumentos de orientação do trabalho pedagógico.
Diante destas normatizações legais, temos o interesse de investigar como a
universidade tem organizado seu currículo e efetivado suas práticas de ensino de modo a
propiciar aos futuros professores conhecimentos teóricos e práticos que possam amparálos no exercício da profissão docente. Mais especificamente, propomos análise dos
programas disciplinares do curso de licenciatura em Letras oferecido pela Universidade
Federal de Ouro Preto.
Este artigo é organizado em três partes. A primeira recupera a trajetória de
pesquisas que tomaram a formação de professores para o ensino de língua portuguesa
como objeto de pesquisa. A segunda discute organização curricular do curso de letras da
UFOP, buscando especificar o lugar da licenciatura em língua portuguesa junto às demais
habilitações oferecidas por esta graduação. A terceira analisa os programas de uma
disciplina específica da licenciatura em língua portuguesa, com a proposta de dar a ver
aspectos discursivos que influenciam a seleção dos saberes considerados necessários
para a formação de professores de língua portuguesa nesta instituição.
1. A formação de professores para o ensino da língua portuguesa como objeto
de pesquisa
Pesquisas anteriores elegeram a formação de professores para o ensino da língua
portuguesa como objeto de análise. Motivados por uma visível dispersão teórica e
metodológica nesta formação, projetos de cooperação acadêmica dedicaram-se à
compreensão do estatuto epistemológico de disciplinas de Metodologia do Ensino da
1
Doutora em Educação. Universidade Federal de Ouro Preto.
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Língua Portuguesa (doravante MELP) oferecidas nos cursos de Letras e Pedagogia das
universidades brasileiras. A seguir, apresentamos alguns dos resultados obtidos duas
pesquisas que investigaram os conhecimentos veiculados em disciplinas de MELP e suas
práticas de ensino.
1.1.
Cooperação acadêmica entre a UFMA, a USP e a UFRN
Em 2008, a Universidade Federal do Maranhão (UFMA) desenvolveu o Projeto de
cooperação acadêmica: disciplinas de licenciatura voltadas para o ensino da Língua
Portuguesa, juntamente com a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade do Rio
Grande do Norte (UFRN). Este projeto partiu da hipótese de que as práticas de ensino, a
seleção do conhecimento e os saberes mobilizados em disciplinas de MELP dariam a ver
qual é a concepção de professor de Língua Portuguesa na atualidade.
A análise dos currículos de cursos de Letras e Pedagogia das instituições de ensino
superior brasileiras evidenciou existência de uma diversidade de nomenclaturas dadas à
disciplina de MELP, bem como um a oscilações em relação aos seus procedimentos
teórico metodológicos destas disciplinas. Diante disso, não estamos lidando com uma
disciplina curricular, mas várias (MELPs), que possuem o papel de transmitir ao futuro
professores os saberes relacionados à metodologia do ensino da língua portuguesa.
Para estes pesquisadores, a indefinição de MELP também tange aos objetivos da
disciplina, o que a impede de ser um lugar para reflexão e construção de um
conhecimento que venha a sustentar a prática pedagógica do professor em formação,
consequentemente, transformando-a em um espaço de divulgação. O levantamento
realizado pela investigação iniciada em 2008 assinalou que as aulas de MELP divulgavam:
a) pesquisas acadêmicas que reafirmam a crise de ensino do país; b) teorias que não
estão diretamente relacionadas com o ensino da Língua portuguesa, mas são de
afinidade do responsável pela disciplina; c) os documentos oficiais de ensino, usados
apenas para realimentar polêmicas já estabelecidas, ou seja, as propostas oficiais estão
ocupando o lugar de embasamento, uma vez que constam da bibliografia e até mesmo
ocupam um grande tempo das aulas em sala, no caso da disciplina MELP.
Conforme os pesquisadores envolvidos nesse projeto de cooperação acadêmica,
esses fatores dificultam a configuração de MELP como um conjunto de conhecimentos e
procedimentos representativos de uma área particular de conhecimento. Questionou-se
se essa dispersão poderia impossibilitar a configuração da formação de professores para
o ensino da língua portuguesa como um campo intelectual.
De acordo com Bourdieu (2011, p. 69), a compreensão da gênese social de um
campo possibilitaria a apreensão daquilo “que faz a necessidade específica da crença que
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o sustenta, do jogo de linguagem que nele se joga, das coisas materiais e simbólicas em
jogo que nele se geram”. A noção de campo procura explicar que “as lutas que tem lugar
no campo intelectual têm o poder simbólico como coisa em jogo, quer dizer, o que nela
está em jogo é o poder sobre um uso particular de uma categoria particular de sinais e,
deste modo, sobre a visão e o sentido do mundo natural e social.” (p. 72)
As considerações alcançadas por esta pesquisa indicam que a forma pela qual as
disciplinas de MELP comparece nos currículos dos cursos de Letras e Pedagogia (como,
por exemplo, o uso de variadas nomenclaturas) e as diferentes escolhas teóricas e
práticas pedagógicas dos docentes que a lecionam dificultam a caracterização desse
conjunto disciplinar como um campo intelectual de caráter autônomo, marcado por
relações objetivas, concretas e específicas.
1.2.
Cooperação acadêmica entre a UNIFAL e a USP
Em 2009, a Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL) e a Universidade de São
Paulo
(USP)
desenvolveram
o
projeto
de
cooperação
acadêmica
Disciplinas
de
licenciatura voltadas para o ensino da Língua Portuguesa. Esse segundo projeto foi
aprovado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) e
recebeu financiamento para sua execução durante agosto de 2009 a julho de 2011. De
maneira mais específica, esta investigação analisou os programas de ensino dos cursos
de Letras e Pedagogia de universidades mineiras e paulistas, no intuito de perceber a
existência de um objeto específico que pudesse caracterizar MELP como uma disciplina2
(no sentido foucaltiano do termo).
Com base nos resultados obtidos pela investigação anterior, estes pesquisadores
consideravam que a MELP não se constituía como um campo intelectual, no interior do
qual os saberes sobre língua/linguagem e acerca de seu ensino se encontrariam em uma
perspectiva crítica de complementaridade, oposição, diferença ou confronto. Com a
proposta de encontrar indícios epistemológicos que pudessem relacionar as diferentes
disciplinas curriculares responsáveis pelos conhecimentos de MELP, esta investigação
buscou perceber se a MELP poderia se constituir como uma disciplina, ou seja, se poderia
ser delimitada por um conjunto de regras de existência, de formação e de normatividade
institucional.
Para Foucault (1996) a “disciplina é um princípio de controle de produção do
discurso. Ela fixa os limites pelo jogo de uma identidade que tem a forma de uma
reatualização permanente das regras” (p. 36). Ou seja, no interior de uma disciplina, os
discursos instituem campos de objetos, concorrem na produção de formas de
2
A palavra disciplina (em itálico) retoma a acepção do termo dada por Foucault (1996).
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subjetividade, estabelecem diferenciações, presenças, exclusões, saberes e verdades
acerca de como pensar, ser e agir, quando os sujeitos estão ocupando determinadas
posições e formas de autoridade. Tendo um “papel positivo e multiplicador”, uma
disciplina se definiria por “um domínio de objetos, um conjunto de métodos, um corpus
de proposições consideradas verdadeiras, um jogo de regras e de definições, de técnicas
e de instrumentos” (p. 30).
Com base neste postulado teórico, o trabalho investigativo realizado pelos
pesquisadores do projeto de cooperação acadêmica entre UNIFAL e USP procurou
caracterizar as relações polêmicas que constituem os processos internos e externos de
delimitação de MELP como uma disciplina. Mais especificamente, buscou-se evidenciar a
existência de fronteiras que pudessem demarcar o domínio disciplinar de MELP. Para
tanto, essa investigação optou por duas linhas metodológicas, uma documental e outra
etnográfica. Na perspectiva etnográfica foram analisados os currículos e os programas de
disciplinas de cursos de Letras e Pedagogia nos estados de Minas Gerais e São Paulo. Na
perspectiva etnográfica, foi constituído um corpus de registro de aulas de disciplinas
voltadas para a formação do professor de língua portuguesa, de universidades mineiras e
paulista.
O corpus obtido por meio dos esforços conjuntos de todas as equipes está em fase
final de compilação.
Na análise documental, foi possível identificar a recorrência de
alguns conteúdos que sinalizam a existência de um enquadre institucional comum. Já na
análise dos diários de campo, de um lado, foram verificadas regularidades quanto às
práticas metodológicas e, de outro lado, um grau elevado de flexibilidade no tratamento
das temáticas, considerando-se da formação específica dos docentes observados.
Embora com nuances descobertas no próprio processo de pesquisa, os dados
parecem apontar para uma dispersão. O lugar epistemológico, acadêmico e educacional
dos saberes e práticas de/sobre formação do professor de Língua Portuguesa constitui-se
como um espaço institucional não caracterizado, a ser preenchido, muitas vezes, por
uma atuação ocasional de cada profissional/professor universitário que traga seu perfil de
formação para a construção do trabalho com a MELP.
A recorrência de objetos de ensino e de procedimentos metodológicos permitiu a
identificação de regularidades na constituição de MELP. Quanto ao domínio de objetos,
mostraram-se como preponderantemente recorrentes no interior da disciplina de
metodologia do ensino de Língua Portuguesa os seguintes temas: escrita, leitura, prática
de
análise
de
textos
e
gramática.
Quanto
aos
procedimentos
e
métodos,
os
investigadores destacam a presença da análise de textos literários e de textos de alunos
do Ensino Básico como sendo regulares na disciplina MELP.
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Demais resultados parciais da pesquisa, advindos da análise dos dizeres dos
professores que ministram MELP, demonstram variados procedimentos e modos de
tratamento dos conteúdos, o que assinala um campo conceptual e metodológico de alto
grau de flexibilidade. Esta grande variação foi interpretada como uma dificuldade
acentuada em garantir-se que a formação dos professores se dê em nível aceitável no
âmbito da universidade.
De acordo com os pesquisadores envolvidos nesta cooperação acadêmica, ao que
tudo indica, sob a égide da pós-modernidade, foram construídos cursos que procuravam
afastar-se dos efeitos restritivos da ideologia, rotulada como “elitista” e “autoritária”, e
não se buscou alternativas para gerar os efeitos organizadores da articulação entre os
saberes originários do vivido e o conhecimento armazenado, produzido e articulado na
universidade.
2.
A formação para o ensino de Língua Portuguesa na UFOP
Com base nas considerações apontadas pelas investigações anteriores, este
estudo parte do pressuposto de que a formação de professores para o ensino da Língua
Portuguesa na universidade não pode ser configurada como um campo ou uma disciplina,
uma vez que é marcada pelo signo da dispersão. Essa dispersão está relacionada: a) ao
currículo que organiza essa formação específica, dada das variadas apresentações das
disciplinas de MELP; b) às diferentes práticas dos professores responsáveis por essas
disciplinas, o que assinala a subjetividade das escolhas teóricas e metodológicas que
individualizam essas práticas.
Entendendo-se a formação de professores pela universidade como um processo
formal de escolarização, fundamentamos nossas análises na noção de cultura escolar.
Segundo Julia (2001, p. 10-11), a cultura escolar pode ser compreendida como “um
conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um
conjunto de práticas que permitem a transmissão desses conhecimentos e a incorporação
desses comportamentos”. Essas normas e práticas são coordenadas por finalidades e
devem ser analisadas considerando-se o corpo dos profissionais encarregados pela
aplicação dos dispositivos pedagógicos.
As pesquisas apresentadas anteriormente realizaram análises transversais que
objetivavam a comparação de currículos e práticas de ensino de diversas instituições de
ensino superior. Diferentemente delas, esta pesquisa toma a formação de professores
para o ensino da língua de língua portuguesa como objeto de um estudo longitudinal.
São investigados os currículos e as práticas de ensino em vigor nos cursos de Letras e
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Pedagogia da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP)3. Mais especificamente, neste
trabalho, apresentamos a análise do currículo do curso de licenciatura em Letras desta
instituição.
São fontes e objetos de nossas análises os seguintes documentos relativos ao
curso de Letras da UFOP: a) o Projeto Pedagógico do Curso (2008); b) o ementário de
disciplinas; c) as grades curriculares de suas habilitações; d) as grades horárias de 2011
e 2012; e) planos de disciplinas elaborados em 2010 e 2011; f) os currículos dos atuais
docentes, disponíveis na Plataforma Lattes CNPq; g) os dados de matrícula e resultados
de processos seletivos divulgados no site da UFOP nos anos de 2011 e 2012.
Diante dos resultados obtidos pelas investigações anteriores, partimos da hipótese
de que a relação mantida entre esses documentos institucionais podem denotar, pelo
menos, duas configurações distintas para formação de professores no curso de Letras da
UFOP: 1) a diversidade exprime especificidade, ou seja, as variações presentes na
organização curricular do curso de Letras não impedem ou favorecem a construção de
um projeto pedagógico coerente e articulado de formação de professores; 2) a
diversidade dá-se de maneira aleatória ou desvinculada de um projeto de formação de
professores, o que dá à dispersão um aspecto negativo, contraproducente, em se
tratando da formação de professores para o ensino da Língua Portuguesa.
2.1.
A licenciatura em Língua Portuguesa na UFOP
O curso de licenciatura em Letras da UFOP foi instituído em 1980 e reconhecido pelo
Ministério da Educação e Cultura em 1987. O curso é circunscrito ao Departamento de
Letras (DELET)4 e, desde 1993, o curso de possui cinco habilitações: 1) Licenciatura em
Língua Portuguesa; 2) Licenciatura em Língua Inglesa; 3) Bacharelado em Tradução; 4)
Bacharelado em Estudos Linguísticos; 5) Bacharelado em Estudos Literários.
O último Projeto Pedagógico do Curso de Letras foi elaborado em 2008 e implantado
no segundo semestre do mesmo ano. Conforme este projeto, o curso de Licenciatura em
Língua Portuguesa enfatiza a formação do professor-pesquisador e seu egresso
3
São apresentados dados parciais do projeto de pesquisa Formação de professores para o ensino
da Língua Portuguesa: disciplinas e práticas de ensino, desenvolvido na Universidade Federal de
Ouro Preto pelas pesquisadoras Profa. Dr. Andressa Cristina Coutinho Barboza (coordenadora) e
Profa. Dra. Leandra Batista Antunes, pelas bolsistas Janaína Mayra Nascimento (PIVIC/UFOP) e
Nizete Mendes Gottschalck (PIVIC/UFOP) e pelas colaboradoras Profa. Ucy Soto, Profa. Dra.
Kassandra da Silva Muniz e Profa. Ms. Janaína Zaidan Bicalho Fonseca.
4
O Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS-UFOP), localizado na cidade de Mariana (MG),
abriga dos Cursos de Letras (Departamento de Letras - DELET), Pedagogia (Departamento de
Educação - DEEDU) e História (Departamento de História – DEHIS).
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deve estar apto a atuar no magistério do Ensino Fundamental e do Médio,
como também a continuar seus estudos nos níveis de pós-graduação.
Deve ter domínio linguístico-discursivo e literário da língua portuguesa,
nas suas manifestações oral e escrita, em termos de produção e recepção
textual, além de ter consciência das variedades linguísticas e culturais
(UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO, 2008, p. 24).
A comparação da grade curricular obrigatória das cinco habilitações do curso de
Letras nos permite depreender o primeiro ano do curso (primeiro e segundo períodos) é
um “ano básico”, ou seja, todas as disciplinas são oferecidas aos ingressantes no curso
de letras. Em relação à sua grade curricular, o ano básico prevê a preparação do aluno
para os estudos universitários (Produção de Texto e Metodologia Científica); uma
disciplina de formação comum em Letras (Estudos Clássicos); e, pelo menos, duas
disciplinas específicas voltadas para cada habilitação. No caso da licenciatura em língua
Portuguesa, duas disciplinas são oferecidas no segundo período: Gêneros Discursivos e
Textuais e Fundamentos da Educação: História, única disciplina do semestre oferecida
pelo Departamento de Educação (DEEDU).
Neste ponto, é importante observar que, de acordo com sua ementa, a disciplina
Gêneros do Discurso e Textuais (60 horas) ocupa o lugar de primeira disciplina de MELP
do curso de Letras da UFOP: “Estudos sobre Gêneros do discurso e do texto. Análises
teóricas e reflexões sobre o ensino”. Apesar da imprecisão do texto da ementa, entendese que disciplina deva oportunizar reflexões sobre o ensino dos gêneros discursivos e
textuais, de modo a colocar o aluno de graduação no papel de futuro professor.
Essa distribuição da grade curricular nos permite inferir que a formação do
professor para o ensino de Língua Portuguesa possui caráter interdepartamental. Isso
denota que o Departamento de Letras não concebe a formação de professores como uma
de suas atribuições específicas. Outro aspecto desta grade curricular é sua pouca de
interdisciplinaridade: nas ementas das disciplinas é possível identificar, claramente, qual
disciplina atende, de maneira específica, cada habilitação.
Após o ano básico, os alunos devem optar pela matrícula em uma das habilitações do
curso. No segundo semestre de 2011, o curso de Letras contava com a matrícula de 399
alunos, assim distribuídos nas habilitações (BARBOZA e NASCIMENTO, 2011):
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Neste gráfico, é possível perceber que a matrícula para a licenciatura em Letras
naquele semestre foi equivalente a 67% do total de aluno matriculados no curso. Isso
quer dizer que significativa parte dos egressos do curso de Letras da UFOP é composta
por potenciais professores de Língua Portuguesa. Estes dados reforçam a importância de
se evidenciar como a estruturação o curso tem procurado atender à formação específica
destes futuros professores.
No segundo ano do curso (terceiro e quarto períodos), são mantidas disciplinas
comuns a todas as habilitações e as licenciaturas em Língua Inglesa e Portuguesa
apresentam quatros disciplinas de cunho pedagógico (duas em cada semestre), oriundas
do Departamento de Educação. Isso reforça a observação anterior, de que a formação de
professores na instituição tem caráter interdepartamental. Acreditamos que isso assinale
a vinculação das áreas de Educação e Letras tendo em vista o ensino vinculado de
diferentes saberes, os quais são necessários para o exercício da docência: os saberes
específicos de uma determinada área de conhecimento e os saberes necessários para o
exercício de uma profissão (BARBOZA, no prelo).
No quarto período do curso (segundo ano), é oferecida a segunda disciplina de
MELP da licenciatura em Letras: Língua Portuguesa: Didática da Licenciatura (60 horas).
Sua ementa aborda concepções de ensino, objetivos e conteúdos do ensino da língua
materna, relação professor e aluno e avaliação da aprendizagem. Esta disciplina é uma
teórica e, de acordo com sua disposição na grade curricular, antecede as disciplinas
práticas de Estágio Supervisionado, iniciadas no quinto período (terceiro ano do curso).
É importante observar que, ao final do segundo ano do curso, é previsto que o
aluno de licenciatura em Letras tenha cursado vinte e três disciplinas obrigatórias, das
quais apenas duas possuem ementas que tocam, teoricamente, questões relacionadas ao
ensino da Língua Portuguesa. É com essa formação teórico-metodológica de MELP que os
alunos enfrentarão quatro semestres de Estágio Supervisionado.
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No terceiro ano do curso, são oferecidas três disciplinas de MELP. No quinto
período, as disciplinas de Estágio Supervisionado de Observação no Ensino Fundamental
(105 foras) e Português como Segunda Língua (L2) e, no sexto período, Estágio
Supervisionado de Regência no Ensino Fundamental (105 horas). As disciplinas de
estágio são práticas, preveem a realização de estágio em campo (escola pública ou
instituições socioeducativas) e a elaboração de um relatório. Português como Segunda
Língua é uma disciplina de carga teórica e prática (60 horas), que objetiva a formação de
professores para o ensino da Língua Portuguesa como L2 para surdos.
No quarto e último ano do curso, são oferecidas outras três disciplinas de MELP:
no sétimo período Estágio Supervisionado de Observação no Ensino Médio (105 horas) e
no oitavo período, Estágio Supervisionado de Regência no Ensino Médio (105 horas) e
Ensino/Avaliação de Leitura e Produção de Textos (60 horas). Apenas no oitavo período
da licenciatura em Língua Portuguesa é oferecida a disciplina Psicolinguística (60 horas),
uma disciplina teórica que não indica, em sua ementa, relação com o ensino e, portanto,
não é considerada, neste trabalho, como uma disciplina de MELP.
Conforme sua ementa, a disciplina teórica Ensino/Avaliação de Leitura e Produção
de Textos prevê a reflexão de práticas de ensino, avaliação e a elaboração de propostas
alternativas para essas práticas. Entende-se que nessa disciplina deva ser feita uma
discussão das práticas de ensino observadas e mobilizadas durante dos quatro semestres
de Estágio Supervisionado.
A grade curricular da licenciatura em língua portuguesa é composta por quarenta
disciplinas obrigatórias. Destas, quinze (37,5%) são disciplinas pedagógicas, oferecidas
pelos departamentos de Letras (DELET) e Educação (DEEDU) e voltadas para a formação
de professores. O Departamento de Letras é responsável pelo oferecimento das oito
disciplinas de MELP deste currículo, que correspondem a 20% das disciplinas obrigatórias
da habilitação destinada à formação específica do professor para o ensino da Língua
Portuguesa. De considerarmos apenas as disciplinas obrigatórias oferecidas pelo DELET,
essa proporção é de 25%.
Como parâmetro comparativo para estes números, observamos a carga horária de
disciplinas específicas na grade curricular dos bacharelados que não envolvem o
aprendizado de uma língua estrangeira. O cálculo entre a proporção de disciplinas gerais
e específicas em cada uma destas habilitações nos levou às seguintes constatações: a
habilitação de Estudos Linguísticos possui 29% de disciplinas específicas e a habilitação
em Estudos Literários possui 42% de disciplinas específicas em sua grade curricular.
Além de uma menor carga horária para as disciplinas específicas de MELP na
habilitação de licenciatura em Língua Portuguesa, é importante salientar que as
licenciaturas do curso de Letras da UFOP (língua portuguesa e língua inglesa) não
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apresentam a exigência de monografia de final de curso. Isso quer dizer que os alunos
que seguem a licenciatura não têm a oportunidade de receber orientação para produzir
um projeto de pesquisa e desenvolver um trabalho de cunho científico que possa ser
aprimorado em nível de pós-graduação. Este dado dá a ver a contradição entre perfil
desejado para o egresso destas habilitações (professor-pesquisador) e a formação
efetivamente oferecida no curso.
2.2.
Heterogeneidade discursiva em programas de disciplina de MELP
Neste momento, propomos perceber como os objetivos curriculares de uma dada
disciplina e os objetivos particulares do professor por ela responsável são mesclados no
corpo do documento institucional Programa de Disciplina. Com base da definição de Julia
(2001) para cultura escolar, compreendemos que o Programa de Disciplina faça parte do
conjunto de normas que define quais conhecimentos e condutas devem ser ensinados,
tendo em vista o perfil e as competências e habilidades desejados para os formandos nas
modalidades bacharelado e licenciatura do curso de Letras, conforme declarado em seu
Projeto Pedagógico do Curso.
O Programa de Disciplina é um documento oficial que apresenta, basicamente,
quatro informações: 1) Cabeçalho de identificação da disciplina (nome, código,
departamento/unidade e carga horária); 2) Ementa; 3) Conteúdo Programático; 4)
Bibliografia. O Cabeçalho e a Ementa são estabelecidos e fixados institucionalmente. O
Conteúdo Programático e a Bibliografia são selecionados pelos professores responsáveis
pelas
disciplinas
no
início
de
cada
semestre
e
apresentados
em
Assembleia
Departamental para aprovação.
Diante do exposto, acreditamos que a categoria de heterogeneidade discursiva
(DUCROT apud MAINGUENEAU, 2011) seja bastante produtiva para analisarmos as
diferentes vozes presentes na constituição deste documento. Sabendo-se que o
Programa de Disciplina possui partes produzidas por autores diferentes e que, por
exigência institucional, precisam ser inter-relacionadas, percebemos a existência de uma
polifonia intrínseca a este documento assim disposta:
•
Enunciador – Colegiado de Curso, que define a obrigatoriedade do Programa de
Disciplina, define a sua parte fixa (Cabeçalho e Ementa) orienta a necessidade de
atualização de sua parte flexível (Conteúdo e Bibliografia) semestralmente.
•
Locutor – Professor responsável pela disciplina, que deve atualizar o Conteúdo e a
Bibliografia de seu Programa. Esta atualização deve ser aprovada em Assembleia
Departamental de Curso no início de cada semestre.
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•
λ - Professor-pesquisador, que se implica na elaboração do Programa de Disciplina de
tal forma que suas afinidades teóricas e investigativas transparecem no corpo do
documento.
Nossos objetos de análise são dois programas da disciplina de MELP Gêneros
Discursivos e Textuais, oferecida no primeiro ano (segundo período) da habilitação de
licenciatura em Língua Portuguesa. Mais especificamente, analisamos o programa
veiculado em 2008, como anexo do Projeto Pedagógico de Curso, e o programa
atualizado para o oferecimento da disciplina no segundo semestre de 2011.
A Ementa do programa de 2008 estabelece que a disciplina deva versar acerca
dos “Estudos sobre os gêneros do discurso e do texto. Análises teóricas e reflexões sobre
o ensino”. Naquele ano, o professor da disciplina organizou o Conteúdo Programático em
três unidades que podem se sintetizadas em: 1) Noções preliminares (linguagem,
interação verbal, discurso e sujeito/produção e recepção); 2) Fundamentação teórica
(domínios de atividades, tipologias discursivas, gêneros e hibridização; 3) Gênero e
ensino
(aplicação,
parâmetros
curriculares
e
manuais
escolares).
A
bibliografia
selecionada possui nove itens, os quais abarcam autores da Análise do Discurso de linha
francesa, pesquisadores brasileiros que discutem a utilização dos gêneros discursivos e
textuais no ensino e documentos curriculares oficiais.
O Conteúdo Programático de 2011-2 foi organizado em quatro unidades. Em
relação ao programa de 2008, foi acrescida a unidade inicial, que tratou a noção de
gênero na literatura e na retórica. As demais unidades do programa anterior foram
mantidas na sequência, com alterações.
Em Noções preliminares foi acrescentado um tópico acerca da Análise do Discurso
(AD) e da Linguística Textual (LT) e excluída a noção de sujeito. Em Fundamentação
Teórica, houve o detalhamento dos autores e dos conceitos a serem trabalhados na
disciplina em sete tópicos, com destaque para os seguintes acréscimos: “Schneuwly (LT):
os gêneros como mega-instrumentos de comunicação” e “Miller e Bazerman: o gênero
como ação sóciorretórica”. Em Gênero e ensino, não há menção sobre a aplicação das
teorias na relação de ensino-aprendizado e mantém-se o estudo dos parâmetros
curriculares e dos manuais de ensino.
Em relação a 2008, a bibliografia do programa de 2011-2 foi ampliada (19 itens).
São acrescidas obras autores da Análise do Discurso e da Linguística Textual e livros que
tratam do ensino dos gêneros na escola. Apesar do acréscimo da temática da retórica no
programa da disciplina, não há a menção de um título específico que trate deste tema na
bibliografia.
A comparação dos dois programas torna perceptível que alteração mais recente
do documento esteja ligada à formação do docente que fora responsável pela disciplina
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em 2011-2. No Currículo Lattes do professor-pesquisador (λ), consta o desenvolvimento
de um projeto de pesquisa atual que busca produzir reflexões teóricas sobre a
Retórica/Argumentação no campo dos estudos linguístico-discursivos. Provavelmente,
esse seja o fator que motivou o acréscimo da nova temática no programa recente.
Além disso, o tema da retórica não consta na ementa da disciplina, ou seja, não é
indicado institucionalmente como parte obrigatória da formação do licenciando em língua
portuguesa durante o oferecimento desta disciplina de MELP. Isso aponta para a
potencial sobreposição da voz do professor-pesquisador (λ) à voz do Locutor, o professor
responsável pela disciplina.
Observamos que o professor-pesquisador (λ) procura criar a adesão de seus pares
para a importância das alterações acerca do conteúdo programático da disciplina,
utilizando-se da citação de autoridade (MAINGUENEAU, 1997). Isso se dá por meio da
exposição dos nomes dos teóricos que serão trabalhados na segunda parte do Programa
da Disciplina Gêneros Discursivos e Textuais, dedicado às noções preliminares. Nesta
ocasião, teóricos associados aos estudos de retórica, análise do discurso e linguística
textual
aparecem
lado
a
lado,
relacionados
aos
variados
conceitos
que
serão
aprofundados ao longo do semestre. Não há menção acerca de como essas teorias teriam
aplicabilidade no ensino.
Cumpre esclarecer que discussões acerca da aplicabilidade das diferentes teorias
estudadas ao ensino talvez tenham sido feitas no campo das práticas. Isso aponta para a
importância de cotejarmos objetos relativos às normas da cultura escolar com indícios
das práticas pedagógicas postas em vigor pelos professores responsáveis pelas
disciplinas na graduação, de modo a termos mais clareza acerca da composição e
efetivação do currículo de MELP na formação do professor para o ensino da Língua
Portuguesa na Educação Básica.
Considerações finais
Os resultados das pesquisas de cooperação acadêmica apresentadas inicialmente
podem ser observados nos Programas das Disciplinas de MELP da UFOP: a) apesar da
diversidade de nomenclaturas, essas disciplinas apresentam como elemento identificador
a abordagem do ensino da Língua Portuguesa, como L1 ou L2; b) as teorias veiculadas
são selecionadas de tal forma a relacionar-se, diretamente, com a formação e as
investigações desenvolvidas pelo professor da disciplina.
Acredita-se que a análise da prática pedagógica dos docentes responsáveis pelas
disciplinas relacionadas à Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa seja essencial
para termos uma compreensão mais clara a respeito de como vem sendo efetivada a
III Simpósio Nacional Discurso, Identidade e Sociedade (III SIDIS)
DILEMAS E DESAFIOS NA CONTEMPORANEIDADE
formação do professor para o ensino de Língua Portuguesa na Universidade Federal de
Ouro Preto.
Espera-se que este estudo possa contribuir com as demais pesquisas que
investigam aspectos curriculares e práticas de ensino voltadas à formação do professor
em universidades brasileiras e, mais especificamente, à formação do professor de língua
portuguesa.
Referências bibliográficas
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Formação de professores para o ensino de Língua Portuguesa