Embaixador Sergio Amaral faz a apresentação de Luis Alberto Moreno, observado pelos professores Marcus Vinícius Freitas (à esquerda) e Luiz Alberto Machado (à direita). 040 crise PRESIDENTE DO BID ANALISA EFEITOS DA CRISE FINANCEIRA EM PALESTRA NA FAAP No dia 23 de abril de 2009, alunos e professores da FAAP, em especial os dos cursos de Relações Internacionais e de Economia, tiveram oportunidade de assistir a uma interessante palestra do presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Luis Alberto Moreno, que apresentou sua visão da crise financeira internacional e seus efeitos sobre os países da América Latina e do Caribe. Ao apresentá-lo ao público presente, o embaixador Sergio Amaral, diretor do Centro de Estudos Americanos da FAAP, destacou que antes de Luis Alberto Moreno ser eleito presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (em que assumiu o cargo em 1º de outubro de 2005), ele serviu como embaixador da Colômbia nos Estados Unidos da América (EUA) por sete anos, sendo o artífice de uma melhora dramática nas relações entre a Colômbia e os Estados Unidos. Sua realização mais notável foi o bem-sucedido esforço para construir um forte apoio bipartidário no Congresso norte-americano para a aprovação de programas de assistência à Colômbia de mais de US$ 4 bilhões. Esses recursos contribuíram para uma transformação material positiva na segurança e na economia da Colômbia. O 040_BID_rq213.indd 40 embaixador Moreno desempenhou também um papel fundamental na renovação e extensão das preferências aduaneiras do ATPA (Andean Trade Preference Act) em 2002 e foi um dos promotores das negociações para um acordo de livre comércio entre a Colômbia e os EUA. Moreno formou-se em Administração de Empresas e Economia pela Florida Atlantic University, em 1975, e tem um mestrado em Administração de Empresas (MBA) pela American Graduate School of International Management, da Universidade de Thunderbird, realizado em 1977. Por sua atuação distinta no campo do jornalismo, recebeu a Nieman Fellowship da Universidade de Harvard para realizar estudos na instituição, entre setembro de 1990 e junho de 1991. O presidente do BID dividiu sua palestra em três partes: na primeira, examinou a origem da crise; na segunda, focalizou as três fases da crise por ele identificadas; e, na última, expôs suas conclusões. A origem da crise Luis Alberto Moreno afirmou que a origem desta crise encontra-se no excesso de construção de moradias nos EUA nos últimos anos e na estrutura de financiamento que se criou para financiá-las. 09/06/2009 14:29:51 As condições favoráveis de financiamento para a moradia levaram a aumentos de preços que tornavam cada vez mais atrativa a compra da moradia e seu financiamento, criando assim um círculo aparentemente virtuoso de acumulação de capital, maior financiamento e melhores padrões de vida para os norte-americanos. No entanto, este círculo aparentemente virtuoso dependia das expectativas contínuas de valorização das moradias, especialmente as que foram financiadas nos últimos anos através das chamadas hipotecas subprime. No momento em que estas expectativas de valorização não puderam se concretizar, muitos dos devedores constataram que suas dívidas valiam mais do que suas moradias e, com isso, tinham pouco incentivo para continuar pagando as dívidas. O setor financeiro, por muito tempo, não prestou atenção a estes riscos, o que o levou não só a emprestar em grandes quantidades, mas também a criar instrumentos financeiros que lhe permitiam reproduzir as hipotecas e gerar mais oferta de ativos financeiros, de crescente complexidade e muito pouco transparentes em seus níveis de risco. As três fases da crise no mundo “Todo este castelo de cartas”, explicou Moreno, “começou a desmoronar em meados de 2007, quando surgiram as primeiras dúvidas sobre as hipotecas subprime e sobre outros instrumentos financeiros alavancados por elas.” Durante a primeira fase da crise internacional, que se estendeu até meados de 2008, a percepção era de que os problemas pareciam restritos a umas poucas entidades financeiras e, embora a confiança do consumidor nos EUA tenha começado a cair e a atividade do setor da construção a debilitar-se, não parecia que a economia entraria em recessão, nem muito menos que se instalaria uma crise financeira sistêmica. Porém em meados de 2008 começou a ficar evidente que muitas entidades financeiras estavam contaminadas com hipotecas subprime ou outros instrumentos derivados delas e que havia, ademais, outros instrumentos financeiros de elevado risco que, até este momento, haviam escapado da supervisão oficial e da vigilância cuidadosa dos investidores, tais com os créditos default swaps e diversas formas de derivados de cobertura de risco. Isto deu início à segunda fase, em que a crise adquiriu características sistêmicas e, gradualmente, começou a afetar o setor real da economia. Esta segunda fase se tornou bem mais aguda na metade de setembro de 2008, com a quebra do banco Lehman Brothers, que gerou uma sensação de pânico entre os investidores acerca dos riscos em todo o sistema financeiro e tornou evidente que não havia uma estratégia consistente para responder aos casos de entidades financeiras em situação de risco. O contágio foi imediato e o pânico se espalhou rapidamente, em consequência da interligação e da interdependência dos mercados em escala planetária, uma das características mais perceptíveis da globalização. 040_BID_rq213.indd 41 Presidente do BID, Luis Alberto Moreno. Esta segunda fase se estendeu até algumas semanas atrás, mas é possível que estejamos entrando em uma terceira fase, na qual, desde que o conjunto das decisões de política acordadas principalmente pelos EUA e pelos países europeus surta efeito, poderia se iniciar imediatamente uma recuperação dos sistemas financeiros e do crescimento econômico dos países desenvolvidos. “Entretanto”, alertou Moreno, “ainda é muito cedo para cantar vitória, e existem muitas dúvidas ainda por esclarecer”. As três fases para a América Latina Depois de analisar as três fases da crise a partir de uma perspectiva geral, o presidente do BID fez um exame das três fases da crise a partir de uma perspectiva estritamente latino-americana. Sob essa perspectiva, disse: “Durante a primeira fase da crise financeira, as economias emergentes da América Latina, em particular, estiveram bastante isoladas das vicissitudes dos mercados financeiros do mundo desenvolvido. Nesta primeira fase, falavase do descolamento do mundo em desenvolvimento, posto que as condições financeiras para os países em desenvolvimento continuaram sendo muito favoráveis, o comércio mundial continuou crescendo e os preços dos produtos básicos continuaram aumentando. Porém, durante a segunda fase, o descolamento chegou ao fim e as economias emergentes viram-se subitamente afetadas pela escassez de recursos financeiros, pela 09/06/2009 14:29:54 042 crise Da esquerda para a direita, momentos antes da palestra: Christer Manhusen, presidente da Câmara Sueco-Brasileira de Comércio; embaixador Sergio Amaral, diretor do Centro de Estudos Americanos da FAAP; Luis Alberto Moreno, presidente do BID; e Luiz Alberto Machado, vice-diretor da Faculdade de Economia. queda do comércio mundial e pelo despencar dos preços das commodities. Na terceira fase, que possivelmente está se iniciando agora, as economias emergentes seguirão seguramente acopladas ao mundo desenvolvido, como tem sido o habitual, porém a efetividade das políticas que se adotem influirá muito em suas possibilidades de recuperação e em sua resistência a possíveis choques futuros.” Sobre o Brasil Ao se referir especificamente ao Brasil, o presidente Moreno elogiou a atuação do governo brasileiro, por ter tomado medidas nas quatro frentes possíveis: redução na taxa de juros, estímulo fiscal, adoção de políticas setoriais e medidas para conter o desemprego. Ao elogiar as iniciativas tomadas pelo governo brasileiro, Moreno frisou: “O Brasil tomou medidas em todas essas frentes e, em alguns casos, com inovações que foram muito acertadas.” Ele também destacou o fato de que o Brasil foi o primeiro país a responder à crise com políticas de estímulo ao crédito para o setor exportador. Por fim, Moreno ponderou que o principal risco que os países da América Latina enfrentam é a instabilidade macroeconômica, causada por falta de espaço para tomar medidas de estímulo fiscal ou de financiamento. E concluiu observando que o Brasil encontra-se em situação diferenciada por possuir “situação fiscal e de dívida bastante sólida”. Considerações finais Fazendo uma comparação com épocas anteriores, o presidente do BID destacou que esta é uma crise não inflacionária, uma vez que a queda dos preços das 040_BID_rq213.indd 42 commodities eliminou a pressão sobre o nível geral de preços. “É importante assinalar”, lembrou, “que este é um fenômeno novo na América Latina, uma vez que no passado os períodos de crise resultavam em importantes aumentos de inflação”. Luis Alberto Moreno afirmou também que a taxa de pobreza na América Latina caiu de 48%, nos anos 1970, para 33%, em 2008. “Se a crise durar mais um ano, as taxas de pobreza não aumentarão mais do que dois pontos percentuais. Uma crise prolongada por três anos levaria a um aumento muito maior e a efeitos mais persistentes”. O presidente do BID encerrou sua palestra reiterando que as políticas que forem adotadas nos próximos meses, tanto pelos países desenvolvidos como pelos países emergentes, serão cruciais para a maior ou menor duração da crise. “Do lado dos países desenvolvidos”, disse, “é essencial que se recupere a confiança dos consumidores e dos investidores sobre sua própria situação econômica, a solidez do setor financeiro e a estabilidade fiscal”. “Todavia”, alertou, “nenhuma dessas coisas está ainda garantida”. Pelo lado dos países em desenvolvimento, é necessário não apenas a recuperação do mundo desenvolvido, mas também a certeza de que contarão agora com o financiamento necessário para os anos futuros, que os protejam do risco de uma crise de financiamento, “cujo risco aumenta quanto mais se prolongue ou se torne mais aguda a crise e a queda dos preços das commodities, ou no caso de que cheguem a ocorrer aumentos substanciais nas taxas de juros no mundo desenvolvido”. As palavras finais de Luis Alberto Moreno foram: “Nada disso parece fácil, porém não há nenhuma dúvida de que agora, mais do que nunca, existem vontade política e possibilidades de coordenação internacional.” 09/06/2009 14:29:55