COERÊNCIA ENTRE FALAR E FAZER Ir. Florinda Dias Nunes, sjbp Mt 23, 1-12 faz parte do 5º livrinho na organização de Mateus. É o texto do 31º Domingo do Tempo Comum. O evangelista continua mostrando a polêmica entre Jesus, o Mestre da Justiça e os chefes do povo, sendo que o capítulo 23 é o ponto máximo desta polêmica. Jesus ensina o povo a não confiar nas autoridades que o mantem dominado. Conteúdo e contexto Jesus se encontra em Jerusalém. O texto forma uma perícope única. É possível, porém perceber dois momentos além da introdução: v. 1-3 – introdução vv. 4-7 – comportamento dos doutores da lei e dos fariseus vv. 8-12 – como deve se comportar quem segue Jesus v. 1-3 – introdução Jesus fala aos discípulos pela primeira vez na presença das multidões, deixandoo claro o sentido da autoridade. Revela quem são as autoridades do povo e o que pretendem e diz que os doutores da lei e os fariseus têm autoridade para interpretar a Lei de Moisés, pois a conhecem. Quanto ao povo, deve fazer e observar o que eles dizem, mas não imitá-los, porque falam e não praticam (cf. v. 3). O evangelista vai a pormenores, tanto no descrever o comportamento dos chefes, como no referir-se ao modo em que o povo deve agir. vv. 4-7 – comportamento dos doutores da lei e dos fariseus Eles colocam pesados fardos para os outros carregarem e “não estão dispostos a movê-los nem sequer com um dedo” (v. 4). Com esta expressão Jesus toma posição entre o povo e as autoridades, corta o caminho das autoridades injustas. A partir daqui o povo não irá mais servir aos interesses delas, pois Jesus desmascara-as, mostrando o novo que a justiça do Reino traz. O modo como Jesus fará isto é mostrando que no lugar de construírem uma religião de amor e justiça, os doutores da lei e os fariseus transformaram a religião em legalismo, ou seja, numa religião sem profecia, uma religião do puro e do impuro. Na verdade, Jesus retoma o Dt 18, 15.18 em que Deus garantiu a Moisés que um profeta o substituiria. Profeta é pessoa profundamente comprometida com a justiça. Em seu lugar apareceram os doutores da Lei e os fariseus que defendem o legalismo e não a vida. E buscam prestígio na vida civil e religiosa: “Fazem todas as suas ações só para serem vistos pelos outros. Eles usam faixas largas, com trechos da escritura, na testa e nos braços e põem na roupa longas franjas. Gostam de lugar de honra nos banquetes e dos primeiros lugares nas sinagogas” (vv. 5-6). Em outras palavras, usam pedaços da escritura para mostrar ao povo que estão comprometidos com o projeto de Deus, mas na realidade buscam seus próprios interesses, só por pura busca de prestígio. Estes privilégios mantêm o povo dominado sob o peso de enorme fardo. A ironia de Jesus é cortante. “Gostam de ser cumprimentados nas praças públicas e de serem chamados de Mestre” (v. 7). Ele mostra ao povo que essas autoridades só apreciam o título de mestre. vv. 8-11 – como deve se comportar quem segue Jesus E a seguir, Jesus lhes tira esse título dizendo: “Quanto a vós, nunca vos deixeis chamar de Mestre, pois um só é vosso Mestre e todos vós sois irmãos” (v. 8). O desmascaramento das autoridades injustas começa mostrando que elas são agentes de opressão e não de liberdade e vida para o povo. Jesus, o Mestre da nova Aliança (cf. Jr 31,31-34), vem mostrar que o novo consiste em não ambicionar privilégios. Todos são irmãos, filhos de Deus e seguidores de Cristo. Suprime assim, toda a hierarquia. É uma chamada de atenção também para nós, pois estamos tão acostumados a buscar hierarquias que nem nos damos conta da gravidade dessa busca e ambição. E isto não será um fardo pesado para o nosso povo? Jesus acabou com toda esta diferença entre as pessoas e colocou como valor absoluto a fraternidade e o serviço mútuo: “o maior dentre vós deve ser aquele que vos serve” (v. 11). É o serviço-profecia como fez Moisés, Jesus e todos os que se colocam no caminho do discipulado. É grande quem é capaz de doar-se para que a vida esteja em primeiro lugar. Deixemos a Deus a tarefa de exaltar as pessoas, pois somente a ele compete humilhar quem se exalta e exaltar quem se humilha (cf v. 12). De uma coisa podemos estar certos, Deus dá a cada pessoa o que é necessário para realizar sua missão aqui na terra. Concluindo É preciso libertar o povo, fazendo-o saber que só o Deus verdadeiro é Pai, e quer liberdade e vida para todos seus filhos. E que é mestre quem ensina o caminho da justiça, levando todos à liberdade e à vida. Em síntese Jesus está dizendo ao povo e aos seus discípulos que devem desconfiar de todos os que não lhes ensinam o caminho da liberdade e da vida. Deixemos que a Palavra de Deus nos questione: Confiamos na misericórdia de Deus para conosco? Ele nos ama e sabe do que precisamos. A nós é suficiente colocarmo-nos em sua presença e colaborarmos para que o seu plano de amor chegue a todas as pessoas. (cf. Storniolo, Como ler o Evangelho de Mateus..., 168-169; Gorgulho, A justiça dos pobres. ..., 209-210)