CATS 2014 – Congresso de Arquitetura, Turismo e Sustentabilidade
PATRIMÔNIO: DESENVOLVIMENTO E PRESERVAÇÃO EM UM
SÍTÍO DO SÉCULO XVIII
Marcelo da Rocha Silveira
Professor Doutor - UFRJ
(Universidade Federal do Rio de Janeiro)
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RESUMO
A cidade é o resultado de todo um passado que se manifesta na sua estrutura urbana e
arquitetônica. Portanto, entender a formação da cidade é construir elementos capazes de
possibilitar a compreensão das contradições e dos conflitos das classes urbanas na
formação de seu habitar. Contudo entre a preservação e o desenvolvimento urbano,
diversos conflitos emergem, Tomando o caso de Ouro Preto como uma cidade que
possui enorme importância no quadro turístico e cultural no Brasil, pode-se afirmar que
ela pode servir de exemplo para diversas outras cidades pois é uma cidade reconhecida
por ser um grande pólo turístico, universitário e atrativo de diversas empresas
mineradoras. Fato que acarretou um crescimento a um ritmo elevado e de difícil
assimilação tanto para os moradores quanto para sua a população flutuante. Esse
crescimento gerou novas áreas de ocupação, que têm como perfil dominante o caráter
residencial, tendem a não seguir o mesmo padrão de tipologia construtiva do centro
patrimonial da cidade e vão crescendo por adições sucessivas de construções sem que
haja consolidação do espaço. Atualmente, Ouro Preto tem ocupações de risco em série
ao longo dos morros; em áreas íngremes e junto a cursos d’água, causando, muitas
vezes, desequilíbrio na ordem da cidade e na imagem que é feita desta. Os problemas da
região periférica de Ouro Preto são semelhantes aos problemas presentes em uma
metrópole. Assim, perpassa na antiga capital mineira uma identidade ilusória de cidade
ideal, mas que não tem correspondência com a cidade real.
ABSTRACT
The city is the result of a whole past that manifests itself in its urban and architectural
structure. Therefore, to understand the formation of the city is necessary to build elements
enable to allow the understanding of the contradictions and conflicts of urban classes in
the formation of their dwelling. However between preservation and urban development,
many conflicts emerge, Taking the case of Ouro Preto as a city that has great importance
in the tourist and cultural scenery in Brazil, it can be stated that it can serve as an
example for many other cities.Ouro Preto is a city known for being a major tourist center,
university and attraction of various mining companies. This fact led to an increase at a
rapid pace and difficult to assimilate both for residents and for its floating population.This
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growth has created new areas of occupation, which are dominant profile residential
character, tend not to follow the same pattern of building typology of the assets of the city
center
and
will
grow
by
successive
additions
of
buildings
without
space
consolidation.Currently, Ouro Preto has occupational hazards in series along the hillsides
and in steep areas and along the waterways, causing an imbalance in the order of the city
and its image. The problems of the peripheral region of Ouro Preto are similar to
problems found in a metropolis. Therefor, the old capital of Minas Gerais, has an ideal
image, which does not correspond with its reality.
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1.
A FORMAÇÃO DO ESPAÇO URBANO
Argan alerta que: “Na cidade, todos os edifícios são representativos e, com
freqüência, representam as malformações, as contradições, as vergonhas da
comunidade” (1992, p. 243). Verifica-se assim que a cidade é o resultado de todo um
passado que se manifesta na sua estrutura urbana e arquitetônica. Portanto, entender a
formação da cidade é construir elementos capazes de possibilitar a compreensão das
contradições e dos conflitos das classes urbanas na formação de seu habitar.
Para se pensar as questões relativas à habitação, é necessário entender o
espaço urbano em que esta se insere, pois pode-se atentar para uma correspondência
intrínseca entre a configuração dos lotes urbanos e a arquitetura que será realizada. A
partir daí, também pode-se afirmar que a cidade tem seu crescimento determinado em
função da questão habitacional, que acaba por comandar o próprio desenho da cidade.
Todavia, também é importante perceber a capacidade dos objetos arquitetônicos em se
adaptar mais facilmente às transformações de ordem econômica e social do que o do
tecido urbano.
No caso da formação das cidades brasileiras, a moradia detém particular
importância, já que a formação urbana se desenvolveu do particular para o geral. A partir
de uma linha contínua de sucessão de casas se constituía a cidade, aproveitando o
acidental e o particular para constituir o todo (SANTOS, 2001). Ainda nos dias atuais, as
cidades brasileiras continuam sendo representativas da sociedade, pois como lembra
Abreu: “As áreas metropolitanas brasileiras são, na atualidade, uma das expressões
espaciais mais acabadas da formação social brasileira, refletindo a coerência e as
contradições dos sistemas econômico, institucional e ideológico prevalecente no país”
(ABREU, 2006, p. 16).
2.
TURISMO E DESENVOLVIMENTO
Dentre os diversos tipos de turismo existentes, certamente o turismo cultural tem
um papel importante no orçamento das cidades que possuem relevância histórica. No rol
das cidades brasileiras que possuem tal importância, aquelas em que estão presentes
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edificações do período colonial são as que, em muitos casos, detém a primazia no afluxo
de turístas.
Cidades como Parati, Tiradentes, Olinda, Diamantina, Ouro Preto, são exemplos
de sítios urbanos que preservam seu casario colonial e que, por causa disso,
desenvolvem diversos eventos como atrativos para a consolidação do turismo.
Contudo entre a preservação e o desenvolvimento urbano, diversos conflitos emergem,
fazendo com que a assertiva de Argan se torne pertinente.
Tomando o caso de Ouro Preto, cidade que possui enorme importância no
quadro turístico e cultural no Brasil, pode-se afirmar que ela pode servir de exemplo para
diversas outras cidades de Minas Gerais e do Brasil, como um exemplo dos conflitos e
contradições que o turismo pode gerar.
3.
OURO PRETO: EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Ouro Preto se edificou a partir do século XVIII, sendo a capital de Minas Gerais
entre 1823 e 1897. Eleita Monumento Nacional em 1938i e elevada a Patrimônio Cultural
da Humanidade pela UNESCO em 1980, a cidade comporta ainda duas instituições
educacionais de nível superior, a Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e o
Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG), e a primeira multinacional brasileira, a Alcan.
Tais fatos fizeram da cidade mineira um grande polo turístico, universitário e
atrativo de diversas empresas mineradoras. Isso acarretou um crescimento a um ritmo
elevado e de difícil assimilação tanto para os moradores quanto para a população
flutuante de turistas e estudantes.
Enquanto os olhares se voltam para a cidade colonial com seu rico acervo,
diversos problemas que vêm se desenvolvendo, são deixados de lado.
A preocupação excessiva com o turismo gerou um processo de padronização
das
construções
que
nem
sempre
os
moradores
conseguem
se
submeter.
Consequentemente, tem-se a perda do sentimento de pertencimento e identidade com o
local.
Pode ser observado também, uma inversão de prioridades ou valores por parte
do poder público, já que, ao invés de atender as necessidades da população local, a
preferência é dada ao grande afluxo de pessoas que visita a cidade todos os dias – seja
com hospedagem, com alimentação ou a outros serviços ligados direto ao turismo – ou
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aos estudantes e aos funcionários que lá chegam e precisam de moradia e serviços,
como entretenimento, saúde e produtos de consumo.
Ocorre, portanto, um processo conhecido por gentrificação, ou seja, há a
substituição das atividades realizadas em determinado local com a alteração do padrão
sócio econômico. Sendo assim, os moradores dos antigos núcleos acabam sendo
obrigados a se deslocar para as áreas periféricas da cidade, já que o valor de terra tornase alto para os padrões econômicos da população nativa (AGUIAR, 2008).
Essas novas áreas de ocupação, que têm como perfil dominante o caráter
residencial, tendem a não seguir o mesmo padrão de tipologia construtiva, e assim
crescem por adições sucessivas de construções sem que haja consolidação do sítio
urbano.
Tal crescimento espontâneo verificado num curto período de tempo trouxe
consigo consequências graves, como déficit de espaço público, de serviços e
equipamentos, além de má qualidade ambiental.
Atualmente, Ouro Preto tem ocupações em série ao longo dos morros;
ocupações de riscos, em áreas íngremes e junto a cursos d’água. (fig. 1 e 2).
Fig. 1 - Encosta em Ouro Preto
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Fig. 2 – Ouro Preto com Vila Aparecida ao fundo
Habitações estas que surgiram da apropriação dos moradores e sem
planejamento algum, causando desequilíbrio na ordem da cidade e na imagem que é
feita sobre Ouro Preto. Há então, devido a sua geografia montanhosa, poucas áreas
propícias
a
fornecer
moradias
de
baixo
custo
em
condições
adequadas.
Consequentemente, as encostas são tomadas por famílias de baixa renda.
A ocupação desordenada do espaço acaba por suscitar práticas incompatíveis
com a utilização do solo, causando não somente problemas sociais e urbanos, mas
também a destruição da paisagem do sítio patrimonial. Tal fato entra em conflito com a
proposta de cidade patrimonial e gera uma falta de unidade do sistema urbano e
paisagístico da cidade.
Pode-se então destacar dois modos diversos de ocupação do solo. Um realizado
a partir da ocupação inicial no período colonial – centro histórico – e outro formado
principalmente após os anos 1960 quando a cidade conhece um novo período de
crescimento associando turismo e patrimônio. Como observa Leila Aguiar (2008), a
relação entre o turismo e o sítio patrimonial torna-se um elemento importante para auxiliar
a economia do município. Assim, “A proposta de democratização do patrimônio que vem
à tona nesse momento frequentemente era associada ao desenvolvimento turístico dos
espaços preservados” (VASCONCELLOS, 1977, p, 43).
Nesse sentido, a evolução histórico-urbana de Ouro Preto pode ser estudada
levando em conta o seu relevo e a formação de caminhos-eixos que condicionaram a
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formação atual da cidade. Foi nas encostas de morros e margens dos rios, que teve o
primeiro interesse de ocupação, devido à economia vigente. Os primeiros arraiais
surgiram sem planejamento algum, com casas dispostas segundo o capricho dos
moradores, estabelecendo-se ao redor das lavras de mineração e entre duas igrejas
matrizes recém-formadas, o que resultou em ruas, caminhos e becos estreitos e
tortuosos, dificultando a locomoção e comprometendo as boas condições de moradia.
Um ou outro caminho pode ser demarcado com um melhor traçado, fazendo-se
o arruamento, em virtude de sua importante transitoriedade, como aquele que ficou
conhecido por Estrada Tronco. A partir de então, a antiga Vila Rica foi se desenvolvendo:
O Arraial do Pilar e o Arraial do Antônio Dias, separados pelo Morro de Santa Quitéria
(atual Praça Tiradentes), sendo este último responsável por desempenhar o papel de
centro administrativo. Tais núcleos compunham o centro da cidade. Ao longo da Estrada
Tronco, que ligava o bairro Cabeças ao de Santa Efigênia, estendendo-se rumo ao
município de Mariana, novas áreas de ocupação de caráter mais periférico se
consolidavam. (Fig. 3)
Fig. 3 Ocupação territorial de Ouro Preto - ca. 1780 (VASCOCELLOS,1977)
A partir deste eixo formou-se a cidade patrimônial, a qual pode ser considerada
hoje uma cidade formal, pois nela há a atenção do poder público, com a preocupação de
atendimento de normas arquitetônicas e urbanisticas.
Por outro lado, os bairros de Padre Faria, Morro Santana, São João e São
Sebastião são exemplos desse processo de suburbanização, o qual se constitui por uma
dinâmica de crescimento extensivo, com uma urbanização pouco regulamentada. São
regiões que cresceram nas encostas que circundam a dita cidade formal.
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Como já disse Álvaro Domingues “o subúrbio é uma das variantes da condição
periférica, normalmente contextualizada num padrão de urbanização que atingiu uma
escala reduzida”.
Essas localidades são chamadas de periferia não necessariamente por sua
posição geográfica, mas sim sociológica, pois tais bairros estão quase sempre
desajustados e distantes das ações governamentais, visto que o fechamento das práticas
sociais está voltado mais uma vez para o turismo.
4.
QUESTÕES URBANAS E SOCIAIS
Um caso que pode ser tomado como exemplo paradigmático do crescimento
desordenado e sem a interferência direta do Poder Público Municipal em Ouro Preto é o
bairro de Vila Aparecida (Fig. 4). Esta parte da cidade começou a se configurar por volta
do final dos anos 1980. Suas construções, em sua maioria de residências, foram
edificadas de modo espontâneo, sem qualquer projeto urbano ou arquitetônico
institucional e mesmo sem qualquer infraestrutura provida pelo poder público. Contudo,
devido ao fato de a primeira legislação municipal de uso e ocupação do solo ser de 2006,
tais construções acabam por não poder ser consideradas ilegais.
Fig. 4: Vila Aparecida – Ouro Preto
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Embora este bairro tenha surgido à parte do poder público e sem as
condicionantes que propiciavam o surgimento das vilas oitocentistas, ele exibe certas
formas de ocupação muito semelhantes a do período colonial: ruas estreitas e tortuosas,
calçadas exíguas, casas implantadas nos limites do lote, adequação do lote ao perfil
topográfico, práticas construtivas baseadas nas tradições locais (Figuras 5 e 6).
Fig. 5: Vila Aparecida
Há então a existência de um bairro que de certo modo dá continuidade a modus
aedificandi presente em uma tradição ouro-pretana e que, ao mesmo tempo, constitui um
recorte urbano que contrasta, pelo menos em termos estilísticos, com a cidade
patrimonial.
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Fig. 6: Vila Aparecida
É necessário também atentar que enquanto a área patrimonial adveio de uma
classe relativamente abastada por causa da exploração do ouro, Vila Aparecida é um
recorte urbano constituído por uma classe desprovida de boas condições financeiras e
que ainda sofrem com um processo de gentrificação da cidade. Assim, ela é fornecedora
de uma mão-de-obra para cidade formal, ao mesmo tempo em que se configura como
uma vergonha para a imagem da cidade colonial, já que contrasta com a paisagem
urbana vendida em cartões postais e em sites oficiais.
Contudo, ainda que este estudo esteja focado nesta cidade mineira, cabe
questionar se ele também não é extensivo a outras cidades brasileiras, mesmo aquelas
que não possuem um centro patrimonial. Pois entre uma classe usufrui dos benefícios de
diversos serviços que uma cidade pode oferecer e uma outra parte da população que
acaba por ser excluída destes mesmos benefícios, existe barreiras invisíveis, porém
muito bem definidas espacialmente.
Vila Aparecida é uma Ouro Preto que a Ouro Preto não quer ver, que o turista
não quer visitar, que a prefeitura não quer aplicar a legislação. Entretanto, Vila Aparecida
é também um parte da cidade que reproduz sua arquitetura e sua espacialidade segundo
os moldes da cidade formal. Pois como observa Silveira:
Haveria uma possibilidade de se alçar a um status socio cultural
superior, já que houve a incorporação de elementos encarados como
valores da tradição cultural. Este tipo de apropriação, denominada
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usualmente de kitsch, seria justamente a redução de um repertório
estético estabelecido por camadas culturais superiores e reapropriadas
por
outras
classes
segundo
seus
os
padrões
de
entendimento.(SILVEIRA. 2013, p. 80, 81)
Segundo o autor, é importante perceber que esse tipo de procedimento acaba
por ser uma afirmação identitária do próprio morador que reproduz uma arquitetura que
ele já considera dotada de valor – em termos culturais, sociais, econômicos.
Assim, Vila Aparecida, e tantas outras periferias urbanas brasileiras, realiza um
diálogo complexo com a dita cidade formal. Ora ela procura reproduzir seus códigos
construtivos, ora ela se contrapõe à espacialidade urbana daquilo que turistas e
moradores formais gostariam de ver. Ela é tanto um produto de valorização excessiva do
solo, quanto um prejuízo a paisagem que a cidade patrimonial desejaria consolidar.
5.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A população em geral continua a valorizar somente o lado turístico e estético da
cidade, criando com isso a imagem de uma cidade cartão-postal, emoldurada pelas suas
belas montanhas. Contudo, os problemas da região periférica de Ouro Preto são
semelhantes aos problemas presentes em diversas outras cidades turísticas brasileiras.
Assim, perpassa na antiga capital mineira uma identidade ilusória de uma cidade ideal,
ou seja, que representa um passado idílico com belas casas típicas de um uma época e
que atualmente tudo funciona devido a grande atenção do poder público. Contudo, essa
suposta cidade ideal não tem qualquer correspondência com a cidade real, aquela do diaa-dia dos moradores, com seus problemas não resolvidos, com a falta de intervenção
pública. A ausência de articulação dessas realidades acaba resultando no desequilíbrio
social, econômico e urbano visto hoje.
A solução de tais problemas se revela não só como um caráter de vontade
politica, mas também pode estar presente em um agir por parte população. Para que
esse agir possa acontecer, talvez seja importante pensar especialmente em uma
educação patrimonial. Isso acaba por se apresentar como um mecanismo importante
para a formação de consciência do valor da história e da herança que se recebe dessa
cidade, assim como tantos outros sítios patrimoniais brasileiros. Leonardo Castriota
observa que o patrimônio histórico deve-se tornar “o lugar do cotidiano e deve ser
incorporado ao dia-a-dia da cidade, substituindo a ideia ultrapassada de museu santuário
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onde só se vai aos fins-de-semana para ver como viviam nossos avós” (CASTRIOTA,
2003, p. 217).
Nesse sentido, a educação patrimonial deve visar principalmente uma integração
entre as diversas realidades e a sua respectiva valorização. Conflitos urbanos e
paisagísticos certamente não serão resolvidos de maneira imediata, simplesmente
através de educação. Porém, provavelmente em médio e longo prazo, vá promover um
melhor entendimento, por parte da população, de seus problemas, de suas contradições
e de suas demandas, e, assim, propiciar ações políticas que possibilitem a mudança de
tal realidade urbana e social.
Para tanto, o primeiro passo talvez seja possibilitar o diálogo e o encontro entre
todas as partes que constituem a vida urbana: moradores, turistas, estudantes,
profissionais de outras localidades. Não se pode esquecer que construções periféricas
fazem parte da história e da vida da cidade. Nesse sentido, os prédios da cidade
patrimonial, da periferia, do subúrbio, da favela são, do mesmo modo, o resultado de todo
um passado, mas também de um presente que se manifesta na sua estrutura urbana e
arquitetônica.
Propiciar a interação dos habitantes é, principalmente, criar mecanismos para
relacionamento mais consistente e profundo entre os saberes locais, entre as diversas
partes da cidade e entre os diferentes segmentos sociais e econômicos que estão
presentes na cidade como um todo. Acredito que não seja possível o desenvolvimento de
tais mecanismos sem que haja um processo educativo amplo e que conte principalmente
com a participação das instituições públicas de ensino superior e de formação de
profissionais ligados ao patrimônio, à arte, à culturaii. Pois cada um que vive a cidade,
seja ele um turista, um novo morador, um habitante de antigas raízes familiares, cada um
possui “certo tipo de coerência. Entretanto, esta remeteria a toda uma complexidade
relacionada a questões de ordem afetiva, cultural, simbólica, funcional, hierárquica,
histórica” (SILVEIRA, 2013, p.126). Com isso, Ouro Preto possa talvez contar uma
história que transcenda o seu passado, e, consequentemente, saber que patrimônio é
algo que se faz no e para o presente com a participação de cada um desses agentes,
pois toda cidade é um organismo por demais complexo e que vai muito além de uma bela
imagem que se queira vender.
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REFERÊNCIAS
ABREU, Maurício de Almeida. A evolução urbana do Rio de Janeiro. 4ª ed. Rio de
Janeiro: IPP, 2006.
AGUIAR, Leila Bianchi. O IPHAN e o desenvolvimento turístico nos conjuntos urbanos
preservados. In: Anais da I oficina de pesquisa histórica no IPHAN. Rio de Janeiro,
IPHAN, Copedoc, 2008.
ARGAN, Giulio Carlo. História da arte como história da cidade. São Paulo: Martins
Fontes, 1995.
CASTRIOTA, L. B. Nas encruzilhadas do desenvolvimento: a trajetória da preservação do
patrimônio em Ouro Preto. In. CASTRIOTA, L. B (org.). Urbanização brasileira:
redescobertas. Belo horizonte: C/arte, 2003.
DOMINGUES, Álvaro. (sub)úrbios e (sub)urbanos, o mal da periferia e a mistificação dos
conceitos. Disponível em http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/1588.pdf Acessado em
jun 2012.
SANTOS, Paulo Ferreira dos. Formação de cidades no Brasil colonial. Rio de Janeiro:
Editora UFRJ, 2001.
SILVEIRA, Marcelo. A cidade informal: arquitetura e projeto. Rio de Janeiro: RioBooks
Editora, 2013.
VASCOCELLOS, Sylvio de. Vila Rica; formação e desenvolvimento, residências. São
Paulo: Perspectiva, 1977.
i
A inscrição de Ouro Preto como Patrimônio Mundial baseou-se na importância do ciclo do ouro no século
XVIII para o florescimento da civilização brasileira, cujo legado histórico e cultural a cidade revela de forma
excepcional. Assim a singularidade do patrimônio arquitetônico e artístico e o elevado estado de conservação
fizeram com que Ouro Preto fosse acolhida sem ressalvas pelo Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco.
Fonte: portal.iphan.gov.br
ii
Ouro Preto conta com a FAOP (Fundação de Artes de Ouro Preto, com curso técnico de Conservação e
Restauro), com o IFMG (Instituto Federal de Mina Gerais, com curso de Tecnologia em Conservação e
Restauro), com a UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto, com cursos de Arquitetura e Urbanismo e
Museologia)
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