O DIA-A-DIA EM SALA DE AULA
assim.
Não sei se vai interessar a Coordenação, mas resolvi escrever mesmo
Não vejo a sala de aula apenas como um local de estudo, mas a vejo
como uma grande família onde discutimos, debatemos, dialogamos sobre os
assuntos relacionados à aprendizagem, aos problemas e às dificuldades
encontradas no cotidiano.
Todos têm a liberdade de falar, dizerem o que sentem e discutirem suas
opiniões, falar sobre seus ideais.
Ouço a todos, e tento ajudá-los, compreendê-los, principalmente
estimulando-os, criativa e psicologicamente. Uso frases como estas: “ Você é
capaz, não tem idade pra aprender”, “ Enquanto há vida, há esperança”. “
Nunca é tarde para começar”.” A vida continua, a força de vontade vence
qualquer problema”.” Não desista, lute, seja forte”. “ Você é inteligente, sua
atividade está ótima”, etc...
Gostaria que todos aprendessem a aprender e se tornassem pessoas
melhores, solidárias, capazes de enfrentar o mundo, a vida com competência e
ética.
Ao trabalhar em sala utilizo textos e assuntos complementares, falo
sobre Deus, família, valores morais e vida em sociedade. Aconselho-os a
agirem com ética e seriedade.
É importante falar sobre Deus, porque esse tema promove a união, a
paz. Só Deus é capaz disso, dar-nos força e coragem para enfrentar a vida com
serenidade.
Muitos não têm contato direto com a família, alicerce base para a vida e
isso lhes faz falta.
Trato a todos com carinho, amabilidade e paciência.
Em sala coloco-me em evidência, exponho-me como exemplo, para que
eles também se soltem e comecem a falar.
Há ainda muitas pessoas que não sabem ler e escrever, mas a distância
os impede de virem para a escola, nem nós temos como ir até sua casa.
Uma maneira de resolver esse problema seria colocarem escolas perto
da casa deles.Existem sítios em que o Programa ainda não chegou lá.Não é
fácil para estes alunos, produzirem textos escritos, pois a própria vida os inibiu
com preconceitos e desigualdade social, mas sabem dizer as coisas na
oralidade.
Tem falta de auto-estima, muitos deles não tiveram boas experiências
com o ensino regular.
Para eles é uma dificuldade muito grande ler e escrever criticamente.
Alguns têm problemas de visão, outros são um pouco lentos para raciocinar,
esquecem facilmente e precisam retornar às leituras.
Se para nós não é muito fácil produzir textos, colocar as idéias no
papel, imagine para eles, mas sua leitura de mundo é muito ampla.
Existem muitos pontos a serem reavaliados, principalmente problemas
que eles têm ou trazem de suas vidas, se há falhas não são só do professor,
mas de todo contexto social e histórico em que vivem.
Acredito que só aula teórica do papel para o quadro não resolva para
estes alunos, a prática daquilo que ouvem é mais eficiente, a valorização do
que eles sabem fazer, ensinando uns aos outros em sala de aula. Por exemplo:
estou falando de um assunto, mas não tenho como levá-los a experimentar
isso, mas outro aluno o faz por mim,ensinando e orientando o colega.
Nós temos noção, entendemos bem tudo, mas eles, às vezes, entendem
de outra maneira.
Se tivéssemos acesso a vídeos, fitas, música, ou outros recursos a
aprendizagem seria mais completa.
Talvez seja um sonho alto demais para nós atualmente, mas no futuro
pode se tornar realidade, se todos trabalharmos para isso.
Devido a poucas condições financeiras, e dificuldades de trabalho, os
alunos, e também a população pobre, principalmente os homens, migram em
busca de trabalho e melhores condições de vida, que infelizmente nosso
município não oferece. Existem tantas maneiras de criar frentes de trabalho
para este povo, falta apenas interesse das autoridades.
Os alunos desistem da escola, porque precisam sair para trabalhar,
ganhar o sustento seu e da família.
Não é fácil para mim, vê-los desistirem, quase já, no final das aulas,
mas o que posso fazer?
O mundo destes alunos é muito sofrido, cheio de dificuldades, lutas,
fracassos, e pouquíssimas vitórias.
Observo em seus rostos cansados, às vezes, abatidos, a tristeza, o sono,
o trabalho penoso, e sei que é um sacrifício para eles virem à noite estudar.
Suas mãos são calejadas da lida diária para pegar no lápis.
Eu também sofri pra estudar, não foi fácil, mas, consegui, porque a
força de vontade foi maior. Espero que muitos dos meus alunos também
consigam.
MARIA VERA LUCIA DA SILVA TOMAZ DA COSTA
Alfabetizadora de São Tomé (RN)
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