Renata Siqueira Bueno - Ascensão por Julia Coelho e Renan Araujo, 2014 Dentro do contexto urbano, somos permitidos a nos enxergar apenas como parte de uma multidão, a aglomeração nos impossibilita uma consciência de autonomia total e pela inércia formamos um grupo. Essa consciência pode sofrer variações, estimulada, por exemplo, por ruídos que ativam a coletividade desse grupo: comportamentos duvidosos ou acontecimentos inesperados. A subitez de uma queda provoca uma reação que é, por excelência, coletiva. O indivíduo que cai ganha um rosto e uma qualidade: a fraqueza, atribuída por esse grupo que agora compartilha do mesmo sentimento. As fotografias se propõem a localizar em outra esfera esse indivíduo que cai, talvez na esfera do sagrado ou do absurdo, apesar da queda ele continua anônimo. O instante da fotografia impossibilita que saibamos o que aconteceu depois, não sabemos quem ele é, talvez não interesse: podia ser qualquer um. A cena captada, que poderia ser um still de um filme proibido ou um registro descompromissado, adquire um caráter misterioso e imaculado, se desassociando da qualidade da fraqueza. É como se o corpo tivesse sido acometido por um momento de luz divina, uma força exterior que desestrutura o indivíduo e o obriga a ter a consciência de autonomia em relação ao coletivo ao seu redor. Aqueles que aparecem caindo nas fotografias são na verdade amigos, atores ou dançarinos convidados para simular a ação. Isso não é algo que deve estar necessariamente explícito ou oculto. A intenção é que nunca possamos ter certeza de nada através da imagem, essa dúvida é da natureza da fotografia. Percebemos em Ascensão o confronto entre as especificidades da técnica e o conceito do trabalho. Através de uma reflexão sobre o instante fotográfico, Renata se utiliza de aparelhos analógicos que evidenciam o embate entre dois tempos distintos. Talvez seja esse o tempo da fotografia analógica que possibilite à imagem uma força que faz da queda algo da ordem muito mais do poder, que da falência. Os lugares definidos para as tomadas fotográficas são sempre aqueles onde o indivíduo nunca pode se encontrar em solidão: ou por haver uma aglomeração de pessoas ou pela existência de uma arquitetura construída para abrigar esse corpo coletivo ou, em último caso, pela impossibilidade de não haver a subtração dos rastros humanos na cena. Espaços sem a delimitação de serem públicos ou privados, possíveis de serem identificados ou não. Espaços onde seja evidente a construção da cena ou, ainda, onde haja uma casualidade do instante na captura da imagem. Texto de Julia Coelho e Renan Araujo para a exposição Ascensão de Renata Siqueira Bueno na Galeria Marcelo Guarnieri, Ribeirão Preto em 2014.