RESENHA DE NOTÍCIAS CULTURAIS
Edição Nº 51
[ 18/8/2011 a 24/8/2011 ]
Sumário
CINEMA E TV...............................................................................................................3
Folha de S. Paulo - A vida secreta de Marighella............................................................................3
O Globo - Mario Sergio Conti assume o ‘Roda viva’.......................................................................4
O Estado de S. Paulo – Entre desenho e Espinosa........................................................................4
Folha de S. Paulo - Mostras e novo livro lembram 30 anos da morte de Glauber...........................6
Correio Braziliense - Lenda urbana ................................................................................................6
Isto é - Senna versus Dzi croquettes...............................................................................................8
O Globo - Em nome do pai..............................................................................................................8
TEATRO E DANÇA....................................................................................................10
Folha de S. Paulo -: Ópera carnavalesca de Zé Celso honra tradição de Oswald de Andrade... .10
O Estado de S. Paulo - Matrimônio inspirado no Circo.................................................................11
O Estado de S. Paulo - Corpos que tiranizam os olhares.............................................................12
Bravo – Nossa aposta Roberta Estrela D'Alva .............................................................................13
ARTES PLÁSTICAS...................................................................................................14
O Globo - Dois é demais ..............................................................................................................14
Isto é - Associações orgânicas......................................................................................................17
O Globo - Altos sentidos................................................................................................................18
MÚSICA......................................................................................................................20
O Estado de S. Paulo - Múltiplo indivisível....................................................................................20
O Estado de S. Paulo - As horas cariocas de Thaís......................................................................21
Estado de Minas - Cidadão do mundo .........................................................................................22
O Estado de S. Paulo - Batuque das Gerais.................................................................................22
Correio Braziliense - Virtuose que virou compositor......................................................................24
Isto é - Sertanhol...........................................................................................................................25
Folha de S. Paulo - Zélia Duncan faz 30 anos de carreira com Tatit e Itamar..............................26
LIVROS E LITERATURA...........................................................................................26
Correio Braziliense – Fome de palavras .......................................................................................27
O Estado de S. Paulo - Pobres agentes secretos cubanos...........................................................28
Veja - A valentia da burocrata.......................................................................................................30
O Estado de S. Paulo - Obra de João Almino é premiada em Passo Fundo................................31
ARQUITETURA E DESIGN........................................................................................32
Correio Braziliense - A fé segundo Oscar Niemeyer ....................................................................32
O Estado de S. Paulo - Obra de Arte Total na Casa de Vidro.......................................................33
QUADRINHOS............................................................................................................35
Correio Braziliense - Metrópole em claro e escuro........................................................................35
MODA.........................................................................................................................36
Bravo - Yes! Nós já não temos banana ........................................................................................36
OUTROS.....................................................................................................................38
Correio Braziliense - Mitos indígenas ...........................................................................................38
O Globo - O pensador das periferias na era digital.......................................................................39
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CINEMA E TV
FOLHA DE S. PAULO - A vida
secreta de Marighella
No ano em que ex-guerrilheiro comemoraria centenário, documentário revela vida íntima do ícone da
esquerda e traz rap inédito de Mano Brown
MORRIS KACHANI
DE SÃO PAULO
(18/8/2011) "Um dia, faz 40 anos, eu estava indo com meu pai para a escola e ele disse: 'Vou te
contar um segredo: seu tio Carlos é o Carlos Marighella'". Assim começa o documentário
"Marighella", de Isa Grinspum Ferraz, com estreia prevista para outubro. Em uma hora e 40 minutos,
"Marighella" desfia a trajetória do ícone da esquerda brasileira que acabou baleado e morto dentro de
um Fusca em 1969, em São Paulo.
Meio século da história do país pode ser contado a partir dos acontecimentos em sua vida: a gênese
do comunismo baiano, mulato, do qual Jorge Amado era partidário; o conflito entre integralistas e
comunistas; a legalização do Partidão; a clandestinidade; a frustração com Stálin; o golpe militar e,
por fim, a luta armada.
Mas o que torna "Marighella" único é o olhar íntimo que só quem era de dentro da família seria capaz
de documentar: "Tio Carlos era casado com tia Clara. Eles estavam sempre aparecendo e
desaparecendo de casa. Era carinhoso, brincalhão, escrevia poemas pra gente. Nunca tinha
associado o rosto dele aos cartazes de 'Procura-se' espalhados pela cidade", continua a voz em off
da própria Isa, que assina direção e roteiro do filme.
"A ideia é desfazer o preconceito que
até pouco tempo atrás havia contra meu
tio. Era um nome amaldiçoado, sinônimo
de horror. Além da vida clandestina e do
ciclo de prisões e torturas, procuramos
mostrar também o poeta, estudioso,
amante de samba, praia e futebol, e
acima de tudo o grande homem de
ideias que ele foi", diz Isa, socióloga
formada na USP.
Na esteira da pesquisa que foi feita,
surgiram algumas revelações. Clara
Charf, companheira de Marighella de
1945 até sua morte, hoje aos 86,
Marighella (à dir.) com a sobrinha Isa no ombro, ao lado da
companheira Clara Charf e do resto da família Grinspum em 1962
desenterrou uma pasta que pertencia a
ele,
na
qual
aparecem
correspondências, mapas e esboços de ações guerrilheiras. A produção também descobriu uma
gravação de Marighella para a rádio Havana, de Cuba. Em sua fala tipicamente cadenciada, ele
anuncia o rompimento com o Partido Comunista e a adesão à luta armada. Mesma época em que
intelectuais europeus como o cineasta francês Jean-Luc Godard passam a enviar remessas de
dinheiro em apoio à sua causa.
O filme ainda traz trilha sonora de Marco Antônio Guimarães e Mano Brown e depoimentos
esclarecedores de militantes históricos, como o crítico literário Antonio Candido: "Marighella
encarnava moral e psicologicamente o seu povo. Ele era pobre e não abandonou sua classe".
Já a judia Clara enfrentaria resistência do pai ao assumir o relacionamento, no que acabou se
transformando numa versão tropical de "Romeu e Julieta". "Carlos era preto, comunista e gói (não
judeu)", lembra Clara, aos risos. "Mas era muito doce e, no fim, conquistou a todos."
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O GLOBO -
Mario Sergio Conti assume o ‘Roda viva’
Jornalista começa em outubro no programa, que volta a ser feito ao vivo
Luiz Fernando Vianna
(18/8/2011) Nos últimos três anos, o “Roda viva”, da TV Cultura, trocou quatro
vezes de apresentador. A quinta mudança no comando do mais antigo programa
de entrevistas da televisão brasileira acontecerá em outubro, com a estreia de
Mario Sergio Conti nas noites de segunda-feira. Diretor de redação da revista
“Piauí” — cargo que também ocupou na “Veja” e no “Jornal do Brasil” — e autor
do livro “Notícias do Planalto”, Conti aceitou o convite sob a condição de o
programa voltar a ser ao vivo, o que não vinha acontecendo com Marília Gabriela,
apresentadora desde o ano passado.
— É um elemento jornalístico para o programa ter uma temperatura. A TV aqui e
na França, que conheço um pouco, é muito engessada, ensaiada, editada. Acho importante ter a
surpresa, a intervenção do acaso — afirma o jornalista, que também pediu o fim dos entrevistadores
fixos, retornando o formato de pessoas ligadas ao tema do entrevistado, e nova mudança de cenário,
agora a cargo de Daniela Thomas. A saída de Marília Gabriela, segundo a Cultura, deveu-se à
impossibilidade de ela ser apresentadora exclusiva, já que tem programas no SBT e no GNT. “O
objetivo é o de garantir a máxima independência”, afirmou a emissora em nota. Entrevistas gravadas
irão ao ar nas duas próximas semanas, e em setembro haverá uma seleção de bons momentos dos
25 anos do “Roda viva”. Desde 2008, com a saída de Paulo Markun, também passaram pela bancada
Carlos Eduardo Lins da Silva, Lillian Witte Fibe e Heródoto Barbeiro.
Para Conti, tantas alterações não significam uma crise de identidade. — É natural que, ao longo de
25 anos, o programa vá mudando, atualizando-se, fazendo experiências — diz ele, que só teve
algumas passagens pelo vídeo quando foi correspondente da Rádio Bandeirantes em Paris, na
década passada, e colaborou para a TV do mesmo grupo. — É entrevista, coisa que faço há muitos
anos. Vou ter humildade, me espelhar nos outros apresentadores do “Roda viva” e tentar me virar.
Ainda não há entrevistados confirmados, mas Conti quer nomes que tenham projeção, no mínimo,
nacional, “gente que faz o Brasil, pensa o Brasil”.
E ele ressalta o fato de o programa ter mais de uma hora de duração, com apenas três intervalos.
— Em termos de TV, é um programa longo, permite uma reflexão — diz. Conti diz que não aceitaria
a proposta se a “Piauí” já não estivesse completando cinco anos e com um perfil consolidado. A
edição de agosto, que foi decisiva para a demissão de Nelson Jobim do Ministério da Defesa, foi o
recorde de tiragem: 58 mil mais 15 mil extras.
As memórias da prisão do economista Persio Arida e o perfil do presidente da CBF, Ricardo Teixeira,
em números recentes, também atraíram novos leitores. Mesmo assim, a publicação ainda não dá
lucro, admite o jornalista.
Ele também vem dedicando quase todas as noites à tradução de “Em busca do tempo perdido”, de
Marcel Proust. A Companhia das Letras quer publicar o primeiro dos sete volumes em 2012. — É um
trabalho difícil, mas para mim, que sou dispersivo, é bom. O Proust me dá um norte, uma âncora —
diz.
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O ESTADO DE S. PAULO –
Entre desenho e Espinosa
A Alegria se inspira na animação de Miyazaki e na obra do filósofo
Luiz Carlos Merten
(19/8/2011) Felipe Bragança embarca no domingo para Buenos Aires, onde vai participar, com Marina
Meliande, de um debate com o crítico de Clarín, um dos principais jornais (o maior?) do país, sobre A
Alegria. Durante quatro finais de semana, o filme terá exibições na capital da Argentina. É um avanço.
No recente Festival de Gramado, diretores da Argentina, do Chile e de outras cinematografias latinoamericanas queixaram-se de que o cinema brasileiro, com raras exceções - Cidade de Deus, Tropa
de Elite (1 e 2) -, quase nunca circula em seus países.
A Alegria estreia hoje em São Paulo, depois de percorrer o circuito dos festivais. Cannes, Roterdã e
São Francisco foram alguns no exterior, Tiradentes, no Brasil. Vários elementos poderão sugerir que
Bragança e Marina estão impregnados pelas experiências de Apichatpong Weerasethakul. O rio, a
floresta, seres estranhos e movimentos de câmera ao som de drone music, tudo parece conectar A
Alegria com Tio Boonmee, ou Mal dos Trópicos. Bragança, numa entrevista por telefone, diz que cada
um é livre para fazer as conexões que quiser, mas ressalta - o jardim interno da casa, que lembra as
florestas do autor tailandês, já estava num de seus curtas, bem antes que ele ouvisse falar de "Joe",
como Api é chamado. A própria casa pertence à sua família e é ali que ele festeja seus aniversários,
até hoje.
O caso é tão bizarro que merece ser contado.
Bragança havia combinado um horário para a
entrevista. Na hora, o repórter liga e dá na caixa
postal. Logo, a assessora de imprensa liga para
dar um outro número. À espera do telefonema, o
diretor resolveu dar uma "descidinha". Uma dupla
numa bicicleta roubou seu celular. Imagens da vida
cotidiana no Rio. O filme nasceu, como projeto, do
desejo de Bragança de falar da cidade. Ele escreve
o roteiro, Marina é sua interlocutora privilegiada. Os
dois filmam juntos e, depois, ela faz a montagem
(mas ele fica palpitando).
Falar sobre a cidade, mas numa chave pouco banal. Os elementos cotidianos são subvertidos pelo
fantástico. O filme nasceu de uma mistura que pode parecer extravagante - do desejo de conciliar a
animação de Miyazaki e a filosofia de Espinosa. Não são muitos os diretores capazes de fazer essa
ponte (e a sustentação oral de seus objetivos). Os jovens de A Alegria conseguem. O filme é sobre
essa garota exasperada porque não consegue mais ouvir falar do fim do mundo. Seu primo leva um
tiro na Baixada Fluminense e some. Aparece um misterioso visitante - quem é?
É, no mínimo, curioso que A Alegria, por conta das idiossincrasias do mercado, esteja estreando no
mesmo dia que Onde Está a Felicidade?, do casal Carlos Alberto Riccelli/ Bruna Lombardi. Alegria e
felicidade parecem estados de espírito próximos, senão similares, mas não existem filmes mais
diferentes. A Alegria fala de juventude - e também das relações entre pai e filha -, de mistérios. Por
todos os lugares em que têm passado, Bragança e Marina sentem que os jovens são mais atraídos
pelo clima do filme. O público mais velho muitas vezes fica desconcertado, mas participa do debate,
sempre que ele se apresenta.
O que mais perturba é a própria natureza dos personagens. Os jovens são muitas vezes confrontados
com a violência - como o diretor, quando teve seu celular furtado. Na ficção, eles ficam dando voltas,
impotentes para enfrentar/resolver a complexidade do mundo ao redor. Nada a ver com a urgência de
um Bróder, de Jeferson De, por exemplo. A pegada de Bragança e Marina é mais poética.
No Brasil - e em Tiradentes, o festival, por excelência, do cinema de invenção -, a conexão de A
Alegria com Apichatpong Weerasethakul foi muito comentada. Em Cannes, Bragança admite que se
surpreendeu com outras conexões que foram feitas - e nas quais ele nem havia pensado. O cinema
brasileiro dos anos 1970, um tanto de Júlio Bressane, tudo bem, mas o cinema português
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contemporâneo? Pois o que os críticos franceses viram foi um fantástico próximo ao de Manoel de
Oliveira, que naquele ano, apresentava O Estranho Caso de Angélica, e Miguel Gomes, de Aquele
Querido Mês de Agosto. Apesar dos jovens, o elenco é dominado pelos veteranos - e Maria Gladys,
mais até do que Márcio Vito, também muito bom, humaniza cada cena em que aparece. "Tivemos
muita sorte de contar com esses atores extraordinários", diz Bragança.
FOLHA DE S. PAULO -
Mostras e novo livro lembram 30 anos da morte de Glauber
Ciclos de filmes se espalham pelo mundo; Nelson Motta prepara biografia sobre a juventude do
cineasta
Acervo de 30 mil documentos foi transferido para a Cinemateca, em SP, que faz sessão com família
LÚCIA VALENTIM RODRIGUES
(22/8/2011) Da Espanha à Argentina, da Holanda ao Japão, passando por Nova York e voltando ao
Brasil, as homenagens dos 30 anos de morte de Glauber Rocha se espalham pelo mundo.
Hoje completam-se 30 anos da morte do mestre do cinema novo, em decorrência de septicemia, no
Rio.
Os eventos passam pelo aval do Tempo Glauber, instituição carioca administrada pela família e
responsável por preservar e difundir sua obra. "Glauber virou um ícone pop", diz Paloma Rocha, filha
que dirige o órgão.
Ela diz que as celebrações só não são mais felizes porque foi cancelado, sem grandes explicações, o
convênio com o governo que repassaria uma verba de R$ 200 mil.
O acordo foi assinado em dezembro e suspenso em junho. Paloma encaminhou um pedido para
reavaliação, que ainda está em tramitação.
Com disso, diz, teve de gastar parte do espólio proveniente da venda do acervo de Glauber para o
Ministério da Cultura e contrair uma dívida de R$ 200 mil para fazer a manutenção do espaço.
Demitiu seis empregados. Hoje o Tempo Glauber funciona com sete pessoas. "Gostaria que
tivéssemos uma estabilidade mínima", sugere Paloma, de Brasília, onde estava para evento na UnB.
Até o começo deste mês, 30 mil documentos sobre o cineasta estavam no Tempo Glauber para
digitalização. Agora, foram para a Cinemateca, em São Paulo, onde já estava alocado material doado
pelo próprio diretor.
Para marcar a transferência e a efeméride, "O Leão de Sete Cabeças" (1971) será exibido em sessão
com presença de Paloma e dos responsáveis pela cópia restaurada.
Na televisão, o Canal Brasil exibe no próximo sábado "Abry", sobre a mãe de Glauber, e "Diário de
Sintra", com fragmentos em super-8 do último ano de vida dele.
A TV Senado programou um ciclo de filmes que vai até domingo. Amanhã, às 14h, o Senado
promove solenidade com a presença de três gerações: a mãe, Lúcia, a filha Paloma e a neta Sara.
Em outubro, sai o livro "Primavera do Dragão", de Nelson Motta. Ele, que conheceu o cineasta numa
première do emblemático "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1963), volta no tempo para contar a
juventude de Glauber.
"Adoro histórias de artistas quando jovens. Este é um romance de formação", afirma, saudoso: "Já
não se fazem glauberes como antes".
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CORREIO BRAZILIENSE
- Lenda urbana
Grupo de roqueiros brasilienses lança o filme O cavaleiro do além, ficção baseada em história
ocorrida no Entorno do DF, e pensa transformá-lo em uma série
Yale Gontijo
(23/8/2011) Quantos de nós já não ouviram falar de uma história com toques surreais que dariam
uma ficção? Sem experiência em direção cinematográfica, três profissionais do rock da cidade
resolveram transformar uma delas, ocorrida no Entorno do Distrito Federal, num filme. Loro Jones
(ex-guitarrista do Capital Inicial), Magu Cartabranca (tecladista da banda Sepultura, de Brasília) e
Rogério Aguas assinam o roteiro, a direção e inúmeras outras funções do curta-metragem de baixo
orçamento O cavaleiro do além.
O protagonista da fita rodada no Entorno não é nenhum herói. “Um homem estava atacando e
violentando mulheres numa cidade do Entorno. Ele escolhia as vítimas na saída da missa. A partir de
um certo momento, as pessoas começaram a duvidar da existência do criminoso e o caso virou uma
espécie de lenda urbana”, explica Rogério Aguas, um dos diretores, sem poder entregar o município
em que a história real se passou por conta de represálias. O ator que vive o papel título é Ednaldo
Dunga de Jesus. Outros personagens são o pastor (Alonso Martins) e a beata (Tereza Bernardino).
Isso sem contar os próprios diretores, que também estão na frente das câmeras.
Os três já trabalham juntos há anos. Eles produziram o CD Rock solidário, cuja venda é revertida para
projetos de caridade. Porém, a estreia na direção cinematográfica envolveu muita conversa. Às
vezes, até alguma boa dose de discussão. “O trabalho foi do jeito que você está vendo. Nem sempre
a gente concordava com tudo.
Mas o importante é dizer que a gente se divertiu muito”, descreve Cartabranca. Os realizadores
cobriram do próprio bolso os custos, que alcançaram o valor de R$ 10 mil. Foi necessário uma
semana fazendo os ajustes da gravação que seria empreendida em duas noites.
O filme transita entre gêneros do cinema como o suspense, a comédia e o faroeste. Assim, como na
vida real, a discussão gira em torno da existência real ou não do agressor. Inspirada nos filmes do
diretor mexicano Alejandro González Iñarritu, uma sequência eleva a mesma discussão a nível global.
“Nós chamamos o Murilo Lima (outro ex-integrante do Capital) para uma cena gravada no Hotel
Nacional quando o tema é discutido”, adianta Aguas.
O infinito é o limite para esse trio. “A ideia é transformar o cavaleiro numa série. A nossa audiência na
cidade em que o filme foi rodado está exigindo que a gente já faça outro filme”, antecipou
Cartabranca. “Esse filme também será o pontapé inicial de um longa-metragem”, revelou Aguas sobre
o projeto de O contrato. Para Jones, é a chance de autonomia artística. “No Capital, eu fiz muito
videoclipe. Achava horroroso esse negócio de usar um bando de pancake na cara e ficar obedecendo
tudo que o diretor mandava fazer.
A gravadora tinha muito controle sobre o trabalho. Era muito chato. Eu faço o que eu quero. Faço
porque me dá prazer”, resume. O som captado direto na câmera e a falta de aparatos de iluminação
deixam a produção com certo ar de precariedade. A trilha sonora é original e foi composta pelos
próprios diretores. Leva elementos de blues e rock and roll. A fita deverá ser exibida na Mostra
Brasília do 44º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro em setembro.
Quem são os diretores?
Loro Jones, 50 anos
Foi guitarrista da banda Capital Inicial e um dos pioneiros do rock em Brasília nos anos 1980.
Atualmente, é produtor musical
Rogério Aguas, 43 anos
Trabalha em cinema há mais de 20 anos. É um dos organizadores do CD Rock solidário, com
participações de Murilo Lima, Márcio Baldone, Loro Jones e Carmem e Giuliano Manfredini
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Magu Cartabranca, 52 anos
Tecladista e vocalista da banda Sepultura (de Brasília). É também jornalista e apresentador do
programa O libertário, transmitido pelo Canal 8 da Net
ISTO É -
Senna versus Dzi croquettes
Dois documentários sobre ícones brasileiros aceleram na corrida rumo ao Oscar nessa categoria em
ascensão
Marcos Diego Nogueira
(24/8/2011) Foi dada a largada da “corrente pra frente” e desta vez não por brasileiros mas pela
imprensa americana: com críticas positivas, o documentário “Senna”, sobre o piloto brasileiro morto
em 1994, vem sendo apontado como um dos favoritos ao Oscar desde a sua estreia nos EUA, na
semana passada. Coincidência ou não, um filme brasileiro quer tentar uma vaga na mesma categoria
e não está medindo esforços. Trata-se de “Dzi Croquettes”, a mais premiada produção do gênero até
hoje no País, registro da trajetória da irreverente trupe de teatro e dança que enfrentou a ditadura.
Pode parecer uma disputa injusta, mas, em comum, as duas produções precisam de gasolina. E
muito lobby.
Produção inglesa, “Senna” sai na frente. Conta com o suporte da Producers Distribution Agency, que
no ano passado levou o documentário “Exit Through the Gift Shop”, sobre o artista inglês Banksy, a
uma bilheteria de US$ 3 milhões nos EUA e à indicação nessa mesma categoria. Já “Dzi Croquettes”
mantém a independência do projeto iniciado há dois anos. Não contou com patrocínio, apenas com a
coprodução do Canal Brasil. Seus diretores, Raphael Alvarez e Tatiana Issa, correm contra o tempo
para arrecadar US$ 23 mil, que é o custo mínimo para lançar o filme nos EUA, pré-requisito para ser
selecionado.
A exibição do longa em três sessões diárias em Nova York e Los Angeles pelo período de uma
semana inclui-se no chamado Oscar Qualifying Package, um pacote de qualificação para o Oscar.
“Estamos usando os serviços de um site, que recebe doações de qualquer valor em troca de
suvenires do filme”, diz Tatiana. Faltam ainda US$ 13 mil. O cineasta britânico Asif Kapadia, diretor
de “Senna”, não terá de fazer esforços no orçamento, já que seu filme bateu o recorde de bilheteria
para documentários na Grã-Bretanha. A produção vem sendo novamente elogiada por focar a luta de
Senna contra os movimentos políticos na Fórmula 1, tema quente hoje em Hollywood, que prepara
dois blockbusters centrados em campões das pistas.
O GLOBO -
Em nome do pai
André Miranda
(24/8/2011) Numa viagem ao Chile, a
diretora Flávia Castro visita a casa
para onde seus pais se mudaram, em
1972, fugidos da ditadura militar. Seu
objetivo era procurar histórias sobre
Celso Afonso Gay de Castro, seu pai,
morto em 1984, aos 41 anos. Os
donos se recordam que alugaram a
propriedade para brasileiros, mas não
lembram detalhes. Até que um deles
pergunta: “Ele era uma pessoa
importante?” Flávia diz rapidamente,
meio por instinto, meio com
consciência: “Para mim, sim.”
A cena faz parte do documentário
“Diário de uma busca”, o primeiro
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longa-metragem de Flávia, que tem pré-estreia para convidados hoje e estreia no Rio em circuito
comercial na sexta-feira. O filme é o relato de uma filha atrás da memória do pai, de importância
óbvia, que morreu em circunstâncias misteriosas em Porto Alegre, quando ela tinha 19 anos, mas que
sobreviveu em suas lembranças. O resultado, porém, ultrapassou o tom pessoal que o motivou:
“Diário de uma busca” foi o vencedor, em 2010, dos prêmios de melhor documentário dos festivais do
Rio e de Biarritz. Além disso, o filme está há dez semanas em cartaz em Paris e já foi exibido em
onze festivais no Brasil e no mundo. — Eu sempre escrevi, gosto de escrever. Passei a vida inteira
escrevendo diários, contando esta história da minha família — conta a diretora. — Então, certa vez,
eu vi o “No sex last night”, da Sophie Calle, e me dei conta de que era possível fazer um filme com
situações pessoais. O que diferencia meu documentário é um ponto de vista que ainda não foi
utilizado no cinema brasileiro, o dos filhos dos militantes.
Os pais de Flávia — a mãe, viva e bastante presente no documentário, é Sandra Macedo — se
casaram um mês após o golpe militar de 1964. Os dois eram membros de partidos comunistas de
Porto Alegre e participavam de reuniões contra o regime militar. Anos depois, Celso foi preso pelo
Dops e torturado. Para evitar novas prisões, então, deixou os filhos — Flávia tem um irmão mais
novo, João Paulo Castro, o Joca — com seus tios e partiu junto com Sandra para o Chile, seguindo
os passos de centenas de refugiados brasileiros. As crianças viajaram depois.
Também como muitos refugiados, a família teve que deixar o Chile após o golpe contra o presidente
Salvador Allende, em 1973, e foi para o exílio na França. Celso e Sandra terminaram se separando, e
ele acabou na Venezuela, onde se casou de novo e teve uma filha, Maria, que conviveu com o pai
apenas até os 2 anos e meio de idade. Com a anistia do governo brasileiro, em 1979, todos
retornaram ao Brasil, sendo que Celso já estava novamente divorciado.
O fato marcante para a história de Flávia, e que certamente foi peça fundamental para sua motivação
em realizar seu documentário, ocorreu em Porto Alegre, em 4 de outubro de 1984. Acompanhado de
um amigo, Celso, que trabalhava parte como jornalista e parte como assessor parlamentar, entrou no
apartamento de um cidadão alemão, ex-cônsul do Paraguai. Celso e o amigo morreram, e o alemão
foi baleado. A versão das autoridades foi de que os dois invadiram o apartamento para assaltar,
acabaram cercados pela polícia e se suicidaram. O caso foi noticiado nos jornais e veio a se descobrir
que o alemão havia sido um agente nazista, inclusive com fardas e documentos guardados em casa.
— Meu filme é muito mais sobre a vida do que sobre a morte. Ele refaz uma trajetória de vida, é um
filme sobre uma família, uma experiência, uma infância — diz Flávia. — É curioso que algumas
pessoas, depois de assistirem ao documentário, me procuram para contar suas perdas. São histórias
que não têm muito a ver com a minha, mas elas sentem uma proximidade.
O projeto de “Diário de uma busca” começou a sair do papel em 2002. O primeiro interlocutor de
Flávia foi seu irmão Joca, que surge em vários momentos do documentário debatendo com a diretora
as motivações de se contar a história e também auxiliando-a na busca pela memória paterna. Num
desses, ele fala: “O filme é teu, a história é tua, a linguagem é tua, o olhar é todo teu. Sinto que você
quer que eu compartilhe contigo essa história, mas essa não é a história que eu faria.”
— Em todos os debates sobre o filme, a primeira pergunta que as pessoas fazem é se o Joca gostou
— brinca Flávia. — É porque ele marca muito uma posição. Ele é antropólogo, tem uma relação
diferente com esta história. Mas pensamos o projeto juntos, conversamos bastante durante todo o
tempo. O resto da família também foi acompanhando e se acostumando aos poucos com a ideia.
Minha avó paterna e minha mãe primeiro se perguntavam qual era a razão para se fazer o filme. Mas,
depois, eu me lembro que perguntei para minha mãe se ela gostaria de assistir a um corte maior do
documentário, antes que ele ficasse pronto. Ela disse que não. Disse que o filme era meu e só veria
depois.
“Diário de uma busca” se alterna entre viagens da família para recordar o passado, leituras das cartas
deixadas pelo pai e entrevistas com personagens da época, muitos deles questionando as alegações
para a morte. Flávia entrevista policiais, jornalistas, legistas, amigos e parentes. Descobre situações
misteriosas em torno do caso, como o sumiço de documentos e ordens para que os jornais parassem
de cobrir o crime. E, de certa forma, ela também entrevista a si mesma buscando a imagem do pai
que ficou no passado. — Não é que eu não me conformei com sua morte, mas eu queria ir atrás da
verdade — diz ela. — Escrevi o roteiro antes. Eu sabia que queria um documentário com planos fixos
9
e narração em off sobre a infância, e planos em movimento para a leitura das cartas. Eu só não sabia
o que iria encontrar na investigação sobre sua morte. Meu desejo era ter uma estrutura dramatúrgica
que se aproximasse de um filme de ficção.
Talvez por inspiração, enquanto trabalhava em seu documentário Flávia escreveu outro roteiro, desta
vez de uma ficção propriamente dita. “A memória é um músculo da imaginação”, ainda em préprodução, será sobre um adolescente refletindo acerca da vida. Não será autobiográfico, mas
certamente trará o grande tema que persegue Flávia. Será, sim, uma nova busca pela memória. ■
TEATRO E DANÇA
FOLHA
DE
S. PAULO
- Ópera carnavalesca de Zé Celso honra tradição de Oswald de
Andrade
"Macumba Antropófaga" alterna citações de manifesto modernista com derivações de genial
teatralidade
LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA
(18/8/2011) O teatro musical brasileiro. "Macumba Antropófaga", do Oficina, é uma ópera
carnavalesca que honra a tradição de seu inspirador, Oswald de Andrade, como poesia cênica de
exportação.
O "Manifesto Antropófago", de Oswald de Andrade (1890-1954), escrito em 1928, é um texto curto.
A partir dele José Celso Martinez Corrêa criou uma extensa dramaturgia, toda armada em versos,
quase sempre musicados, remetendo às frases do manifesto direta ou lateralmente.
Uma novidade na trajetória recente do Teatro Oficina é a ocupação confortável do seu terreno
circundante, pertencente a Silvio Santos.
Diante da proposta do empresário, de o Estado brasileiro trocar um terreno seu por aquele, o lugar,
antes disputado belicosamente, tornou-se espaço de encenação, e o alvo da ação referida no título
virou a presidente Dilma Rousseff.
É nesse sonhado ambiente que, depois de uma caminhada/prólogo até o vizinho TBC (Teatro
Brasileiro de Comédia) para evocar Cacilda Becker, surgem sob uma tenda os personagens de
Oswald e Tarsila do Amaral bebendo absinto e comendo rãs.
Será dali que o sóbrio Oswald de Marcelo Drummond partirá para, já dentro do teatro, despojar-se da
vida burguesa e propor sua revolução cultural.
TEMAS DO MOMENTO
A estrutura narrativa dá conta maravilhosamente da primeira metade do espetáculo, alternando
citações do manifesto, literais e cantadas, com derivações oportunas de genial teatralidade.
Em diálogo com a tradição oswaldiana do poema piada, e por certo emulando a tradição da revista,
Zé Celso não cessa de reverberar assuntos locais e internacionais do momento, que vão se
alternando com as falas de Oswald.
Essa variação de planos não se sustenta até o fim, principalmente porque a estrutura repetitiva das
cenas, sempre cumprindo ciclos que vão do confronto entre o desregramento e a ordem até a vitória
esmagadora de bons desregrados contra maus repressores, não ajuda. Ao final, há uma exaustão
mútua de atuadores e espectadores, ainda que solidários na satisfação pelo realizado.
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Como sempre acontece nas encenações do Oficina, há o saldo positivo do coro, que se entrega
plenamente e alcança milagres. Ocorre que, quando exaurido, sua pretendida sensualidade reverte
no oposto. O gozo vira obrigação e o que era generoso empenho e intenção libertária revela-se
submissa alienação.
O mesmo ocorre com o homenageado. Se Oswald de Andrade foi controverso, a versão que Zé
Celso apresenta de seu texto é didática e aponta uma leitura necessária. Talvez a meta de fazer de
seu objeto de desejo -o território alheio- a razão de ser do seu teatro obrigue a esse estreitamento
programático.
Para além dessas contradições, trata-se de um belo e originalíssimo musical.
O ESTADO DE S. PAULO -
Matrimônio inspirado no Circo
Ubiratan Brasil
(23/8/2011) A obra teatral de Ariano Suassuna sempre foi alvo de afagos e elogios - com exceção de
O Casamento Suspeitoso, cuja nova montagem estreia na quinta-feira, no Teatro do Sesi. "De todas
as que montei, esta foi a mais atacada", comenta Suassuna no prefácio da edição em livro da peça,
lançada pela José Olympio. "Disseram que eu estava repetindo tipos e situações já usados no Auto
da Compadecida e que empregara, nesta comédia, mais do que na primeira, meios vulgares e
grosseiros de comicidade, além de criar personagens sem sentido."
Tamanha resistência não intimidou o diretor Sérgio Ferrara, responsável pela nova montagem. "É
uma dramaturgia difícil, ao contrário do que se pensa", comenta. "Como os personagens são tipos, a
plateia não vai simpatizar se os atores não humanizarem suas interpretações."
Por conta disso, Ferrara - que já montou clássicos tanto nacionais (Barrela) como estrangeiros
(Mercador de Veneza) - apostou em um tom circense, que ameniza a farsa e garante uma
cumplicidade mais imediata do público. Escrita em 1957 e ambientada na pequena Taperoá, no
interior da Paraíba, O Casamento Suspeitoso mostra as armações que antecedem o matrimônio entre
Geraldo (Joaz Campos) e Lúcia Renata (Suzana Alves). Ele é filho de Dona Guida (Bete Dorgam),
mulher que comanda a cidade na base do grito, enquanto ela não passa de uma interesseira, de olho
em uma grande herança que o futuro marido está para receber.
Lúcia conta com o apoio da mãe Susana (Nani de Oliveira) e de seu amante Roberto Flávio (Nicolas
Trevijano). Os empregados da família, Cancão (Marco Antônio Pâmio) e Gaspar (Rogério Britto),
também se envolvem na história para tirar vantagem da situação, enganando tanto o Frei Roque
como o Juiz Nunes, ambos interpretados pelo veterano Abrahão Farc. Enfim, instala-se a conhecida
comédia de erros com um sotaque do romanceiro popular nordestino. Ou, como diz Suassuna em seu
prefácio, uma peça que segue a "tradição do teatro grego e romano, do elisabetano, do espanhol e
francês clássicos, do goldoniano, do alemão oitocentista, enfim, do teatro que considero o grande
teatro e que se opõe ao contemporâneo, "o teatro de ruína", expressão que subscrevo integralmente".
Para conseguir tal efeito, Ferrara buscou acentuar a malandragem que permeia cidades pequenas,
aquela que é maliciosa e ingênua, ao mesmo tempo. "Não se trata de uma montagem realista, mas
de uma comédia sem caricatura - o importante é o signo, não o exagero."
Foi o que norteou especialmente o trabalho de Pâmio e Britto, cujos personagens se assemelham a
João Grilo e Chicó, do Auto da Compadecida. No equilíbrio de espertezas (enquanto Cancão é o
malandro, Gaspar passa-se por ingênuo), os atores encontraram inspiração em outra dupla famosa.
"Depois de uma observação da Bete Dorgam, percebemos que nossos personagens se parecem com
Oscarito e Grande Otelo", conta Pâmio. "Foi a chave ideal para criarmos nossa parceria em cena."
Habituado a papéis marcados por riqueza dramática (encenou, por exemplo, o belo monólogo
Mediano), Marco Antônio Pâmio surpreende no cômico, criando um personagem em que a linguagem
corporal é tão importante como a voz. Também feliz em sua caracterização está Suzana Alves, ainda
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conhecida como Tiazinha: como Lúcia Renata, ela alterna com precisão ingenuidade e astúcia,
fazendo o arco perfeito da moça que só pensa em se casar por interesse.
"Ela tem experiência em teatro e relevou um ótimo timing para a comédia", comenta Ferrara, que
pediu ao elenco controlar o sotaque nordestino, a fim de evitar a caricatura.
O mesmo cuidado se estendeu ao cenário e figurinos. Concebidos por J.C. Serroni, ambos apostam
no tom circense inspirado pelo diretor. "Como o casamento é mote da peça, criamos um arco que faz
a moldura no palco com imagens de santos casamenteiros", conta ele, que também elaborou uma
cortina formada pelo mesmo tecido dos véus. Já os figurinos trazem as características da vestimenta
do interior nordestino.
A trilha sonora e também a sonoplastia, que reforça especialmente a comédia, são executadas ao
vivo, por João Paulo Soran e Breno Amparo. Para completar a trupe circense, Sonia Maria e José
Rosa formam uma espécie de coro, participando do bando que tenta aplicar o golpe em Geraldo.
"Nossa intenção é trazer novamente o teatro popular que marcou o início da sala do Sesi", diz
Ferrara.
O ESTADO DE S. PAULO -
Corpos que tiranizam os olhares
Helena Katz
(23/8/2011) Mesmo sabendo, não é sempre que nos lembramos que o ponto de onde se avista o
espetáculo faz toda a diferença no que dele se percebe. Assistir Lugar do Outro é viver no corpo essa
experiência de forma muito clara.
Acomodada em oito plataformas móveis, cada qual com quatro assentos, a plateia vai sendo
deslocada pelo espaço vazio do quarto subsolo do Sesc Pinheiros, onde a Cia. Damas em Trânsito e
os Bucaneiros apresenta, até 14 de setembro, seu novo espetáculo, às terças e quartas, às 21 horas.
Trata-se de uma experiência oferecida a somente 32 espectadores por noite. Nela, a reflexão sobre o
lugar que o outro ocupa se instaura já no momento em que, ao sentar-se, você deixa de ser plateia
anônima, e torna-se parte de um grupo. A você e seus companheiros de plataforma serão ofertadas
as mesmas oportunidades e as mesmas perdas na observação do que vai se passar. Somos
"depositados" por um tempo em um lugar, e depois empurrados para lá e para cá, em um roteiro que
vai armando e desmanchando formas distintas de espacialidades, mas sem mexer na relação palcoplateia, que permanece lá, mesmo não existindo um palco formal. A plateia passa a fazer parte, mas
somente como parede móvel a delimitar as formas que o espaço vai tomando.
Ao contrato de observador de fora que a plateia geralmente estabelece nos teatros, aqui soma-se um
outro traço, o da passividade: nós sentados e sendo conduzidos para onde não escolhemos, em um
roteiro já determinado do que e de como vou ver. A mobilidade imposta às plataformas-riquixás edita
o olhar de seus "passageiros", que se tornam corpos-câmeras, enquadrando a dança que se oferece.
Uma desconfortável relação de poder se escancara: vestidos de preto, como os manipuladores de
teatro de bonecos ou de sombras, trabalham duro empurrando os pesados "riquixás", aparentemente
submetidos a essa função. Todavia, o que fazem em nós, tiraniza nossa percepção. Quem escraviza
quem?
Em Lugar do Outro, a companhia não abandona seu interesse em continuar a explorar a relação
corpo-arquitetura-som a que chama de "dança de ocupação", pois ocorre em espaços abertos. Em
2008, por exemplo, com Puntear, transformou muretas, jardins e escadas da Casa das Rosas em
cenário. Todavia aqui, o foco se adensa em um ponto específico: pergunta sobre a possibilidade do
viver isoladamente, e vai montando diferentes tamanhos de distâncias entre os 32 da plateia, entre
cada um deles, entre nós e a obra.
Uníssono. Enquanto cada qual está sozinho, faz algo singular, mas quando os quatro intérpretes se
reúnem, transformam-se em um uníssono de uma mesma coreografia. Nesse momento, o jeito
próprio de dançar se atenua, como se não fosse possível mantê-lo quando se está junto, ecoando,
aliás, o uníssono dos conjuntos em que a plateia foi transformada. Não surge nenhum traço da
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multidão, aquele tipo de agrupamento estudado, entre outros, pela dupla Antonio Negri-Michael Hardt,
que publicou, em 2004, um livro sobre o assunto.
A companhia nasceu em 2006, dentro do Estúdio Nova Dança, o endereço, na cidade de São Paulo,
da geração que descobriu, nos anos 1990, a improvisação como possibilidade de dramaturgia para a
dança. Como uma das suas representantes, carrega traços da deficiência estrutural desse segmento,
que é a falta de entendimento sobre o que seria o rigor artístico necessário para a sua produção.
No caso do Lugar do Outro, o elemento mais vulnerável está na escolha dos materiais que dançam.
O elenco dança de forma competente, e com uma sintonia segura, indispensável para a linguagem da
improvisação que emprega. A questão não está em como dançam, mas no que dançam.
Dirigidos por Alex Ratton Sanchez com clareza e pertinência, os quatro intérpretes tocam
instrumentos, fazendo parte da ótima trilha de Gregory Slivar - lotada de rastros, sobretudo de
Smetak (1913-1984), músico suíço que se mudou para o Brasil em 1937, e foi transformado pelos
tropicalistas em uma referência. Trata-se de uma soma de talentos que demonstra poder ainda bem
mais do que o que apresenta agora. E o comprometimento de todos eles é o fiador de que muito em
breve, estarão no lugar de destaque que já demonstram merecer.
BRAVO –
Nossa aposta Roberta Estrela D'Alva
A atriz de 33 anos, que o diretor Antunes Filho define como "absolutamente extraordinária", se
destaca na França durante a Copa do Mundo de poesia falada
Por André Toso
(Agosto/2011) Há cinco anos, nem mesmo
Roberta Estrela D'Alva sabia o significado de
poetry slam, competição em que poetas
recitam versos para um júri. Desde o dia 4 de
junho, porém, a atriz paulista é uma das
principais representantes da modalidade tanto
no Brasil como no exterior. Ela conquistou em
Paris o terceiro lugar num torneio que reuniu
concorrentes de 15 países, a 8a Copa do
Mundo de Slam.
Chegou à França como zebra, já que os
brasileiros não têm nenhuma tradição em
disputas do gênero, mas acabou seduzindo a
torcida e logo passou a figurar entre os favoritos. No confronto derradeiro, só pontuou menos que os
canadenses Chris Tsé, segundo colocado, e David Goudreault, o campeão. O resultado impressiona
ainda mais quando se considera que Roberta apresentou-se em português, enquanto os outros
finalistas falavam inglês ou francês, idiomas compreensíveis pelos jurados. Legendas exibidas no
fundo do palco traduziam as poesias da atriz.
Antes de se destacar na Europa, a intérprete de 33 anos já despertava o interesse de um mito do
teatro nacional, Antunes Filho. "Assim que a vi pela primeira vez em ação, fiquei hipnotizado. Ela é
absolutamente extraordinária e intensa, um gênio capaz de declamar poemas com todo o corpo",
exalta o diretor, que não costuma distribuir elogios.
Nascida em Diadema, Roberta trocou o ABC paulista pela capital do estado para cursar artes cênicas
na Universidade de São Paulo. Ainda estudante, participou da fundação do Núcleo Bartolomeu de
Depoimentos, coletivo que estimula o diálogo entre o teatro épico e o hip-hop. Depois, em 2004,
ajudou a implantar a Frente 3 de Fevereiro, grupo que pesquisa e combate o racismo. A militância e
trabalho de atriz levaram-na a descobrir documentários estrangeiros que retratam o poetry slam,
criado nos Estados Unidos durante a década de 1980 pelo poeta Marc Smith.
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Para se aprofundar no assunto, viajou a Nova York e presenciou alguns duelos. As regras do jogo
exigem que os participantes declamem poemas de si com no máximo três minutos de e não se
utilizem de trilha sonora e figurino. Devem recorrer apen expressão corporal. "A nota depende do
uanto cada jurado se emociona com a performance. Não é uma simples avaliação da melhor poesia",
explica a atriz.
Quando resolveu encarar a Copa do Mundo, Roberta contatou os organizadores franceses, que a
aceitaram após conhecer a Zona Autônoma da Palavra (ZAP!). O espaço paulistano, idealizado pela
intérprete e pelo Núcleo Bartolomeu em 2008, agrega praticantes do poetry slam no Brasil. Lá a atriz
atua como mestre de cerimônias. As disputas ocorrem toda segunda quinta-feira de cada mês.
Qualquer pessoa pode participar. O vencedor ganha livros, DVDs e outros prêmios culturais. "Mas o
que importa mesmo é a celebração, e não a competição", diz Roberta, que está terminando um longa
sobre poetry slam com a documentarista Tatiana Lohmman.
ARTES PLÁSTICAS
O GLOBO -
Dois é demais
De ‘office boys’ a artistas consagrados, a trajetória de sucesso da dupla osgemeos
Gilberto Scofield Jr. e Márcia Abos
(21/08/2011) No ateliê-oficina que possuem no Cambuci, bairro de classe média baixa na zona
central de São Paulo, os artistas plásticos e irmãos gêmeos idênticos Otávio e Gustavo Pandolfo, de
37 anos — conhecidos pela assinatura osgemeos — rabiscam furiosamente em cadernos e revistas
enquanto falam. Passa das 20h30m de uma quarta-feira, única brecha na agenda dos artistas para a
conversa, que flui tranquila e animada, apesar do horário. É difícil achar um tempo para falar com os
dois. Muitas das imagens de seus trabalhos publicadas nas próximas páginas vieram por email entre
uma e outra reunião ou viagem de trabalho ao longo da semana. As fotos dos dois foram feitas às
13h de um sábado. E a maior parte dos futuros trabalhos não podia ser mostrada porque fazia parte
de alguma exibição que ainda está por vir, e eles tentam manter segredo.
Não são poucos. Na próxima sextafeira, por
exemplo, quem for à Estação da Leopoldina
para o festival Back2Black vai mergulhar num
ambiente idealizado e construído por
osgemeos e pelo cenógrafo e artista plástico
Sergio Marimba. A dupla faz mistério sobre o
trabalho, mas avisa que o público vai se
surpreender: trata-se de uma ambientação
interativa, capaz de levar o público para
dentro do universo paralelo onde vive a
imaginação destes artistas. É também a
primeira vez que osgemeos unem música —
que sempre embalou seu processo criativo —
a instalações, esculturas e pinturas. Eles são responsáveis pela direção criativa do festival e tiveram
voz ativa na escolha do line up, quase uma volta às origens para quem começou na cultura hip hop,
dançando break nas ruas de São Paulo nos anos 80, antes de descobrir os muros.
Mês que vem, osgemeos expõem em Vilnius, na Lituânia, numa parceria inédita com a mãe, a
bordadeira Margarida Kanciukaitis Pandolfo, de 68 anos, descendente de lituanos. Ela irá acrescentar
ainda mais detalhes, com seus bordados, às intrincadas tramas que os irmãos costumam criar nas
roupas e adereços de seus inconfundíveis personagens amarelos. Em outubro, os irmãos fazem uma
exibição de trabalhos inéditos no Museu Vale, em Vitória, no Espírito Santo. Isso sem falar nas obras
que produzem sem qualquer propósito específico, apenas para dar vazão aos impulsos criativos que
parecem não parar de brotar daquelas cabeças.
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— Na nossa vida, tudo aconteceu na hora que tinha de acontecer. A essência é que a gente sempre
acreditou no que faz — diz Gustavo. — Sempre soubemos que a melhor forma de se comunicar com
o mundo externo era através do desenho, da arte. Mesmo com a família, os amigos, com todo
mundo: a gente preferia desenhar a conversar.
A disputada agenda evidencia não apenas a trajetória bem-sucedida de uma dupla de artistas de rua
que conseguiu transportar suas criações da paisagem urbana e marginal de São Paulo para o cenário
mainstream de galerias, museus e até castelos ao redor do mundo e no Brasil. Mais que isso. Ainda
que, de vez em quando, continuem a grafitar pelas ruas da capital paulista, osgemeos estão entre os
mais importantes e influentes artistas contemporâneos do país, uma unanimidade de crítica e de
público cujos trabalhos podem ser apreciados de graça num muro da Avenida 23 de Maio, em São
Paulo, ou comprados na galeria paulistana Fortes Vilaça por US$ 57 mil (telas de 2m de altura por
1,6m de largura). Desde que se entre na fila, aliás, porque não há telas disponíveis.
— Eles têm menos tempo de estúdio do que eu gostaria — diz, rindo, a galerista Marcia Fortes, dona
da Fortes Vilaça e representante dos artistas no Brasil.
Mas osgemeos não ligam para isso e fazem questão de colaborar em projetos em que o retorno
financeiro vale menos do que o desafio da criação.
— Eles sabem que nem tudo é para vender — diz o artista plástico Vik Muniz, fã confesso da dupla,
sobre a importância da liberdade e do prazer no trabalho criativo.
Dois desses desafios, inclusive, figuram na lista dos dez melhores trabalhos de arte de rua do mundo,
segundo o jornal inglês “The Guardian”, numa lista publicada há duas semanas. São os únicos
artistas a aparecerem duas vezes, ao lado de feras da arte de rua como o inglês Banksy, o americano
Keith Haring e o espanhol Sam3. Nas fotos, escolhidas pelo designer e escritor Tristan Manco,
figuram o castelo histórico de Kelburn, em Ayrshire, na Escócia, uma propriedade do século XIII
grafitada em 30 dias por osgemeos e pelos artistas brasileiros Nina Pandolfo (mulher de Otávio) e
Nunca, em 2007. Outro é a intervenção feita em dez dias por eles e o artista italiano Blu num prédio
abandonado da Avenida Fontes Pereira de Melo, em Lisboa, no ano passado.
— Tudo depende, mas nestes casos, com uma escala dessas, o desafio foi mesmo o grande tesão —
diz Otávio.
Nas quase duas horas de conversa em seu ateliê — uma caótica mistura de oficina mecânica, estúdio
de arte, barracão de escola de samba e depósito de brinquedos, esculturas e quadros (chama a
atenção o quadrinho “I love vandalism”, pregado na parede) —, Gustavo e Otávio não pararam um
minuto sequer de desenhar. Ora rabiscam com esferográfica num caderno esboços de figuras
humanas, contornos de bichos, coisas penduradas no ar, frases soltas. São centenas de caderninhos
acumulados até hoje desde que eram pequenos, uma formidável fonte de inspiração e teste para os
trabalhos definitivos. Outras vezes, interferem com canetas do tipo pilot em revistas velhas, brincando
com letras como nos grafites de rua.
O que não significa que não estejam prestando atenção. A conversa segue normalmente entre um
desenho e outro.
— Quando vamos a um restaurante que tem nas mesas aquelas toalhas de papel, Otávio sempre
pede uma caneta e desenha durante todo o jantar. Nunca esqueço de levar canetas na bolsa — conta
Nina, lembrando, entre risos, da pergunta da sobrinha de 14 anos do casal, ao observar o hábito do
tio de desenhar sem parar: “Tio, você tem TOC?”
— A gente está cada vez mais dentro do nosso universo de criação. Estamos cada vez explicando
menos. Está tudo muito ali. É difícil hoje em dia se rotular — diz Gustavo, o mais falante da dupla,
enquanto desenha.
— E o que é que a gente faz? É arte contemporânea? Está certo que a gente não chama de grafite o
que faz numa galeria. Ou street art. É um trabalho de arte que está sendo exposto, só isso. Mas as
pessoas precisam de rótulos, precisam enquadrar aquilo. Então rotulem como quiserem, porque
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nosso papel é continuar produzindo. É conceitual? É contemporâneo? É um pouco de tudo —
completa Otávio, o mais cerebral, enquanto desenha.
Gustavo e Otávio trocam de cadernos e revistas sem sequer se olhar. Não dizem o que o outro vai
fazer, por onde ir, que desenho terminar. Um simplesmente continua desenhando onde o outro parou
e, aos poucos, as imagens, frases, letras, formas vão surgindo. A prática ajuda os artistas a criar uma
mítica a respeito deles mesmos. Dizem que conversam por telepatia e que, mesmo quando não estão
perto um do outro, “estão sempre juntos”. Juram que vivem num mundo paralelo próprio.
— Eles sempre foram assim, desde que começaram a desenhar, ainda aos 4, 5 anos — lembra a
mãe, Margarida.
Toda a família, aliás, foi uma inspiração e um apoio na carreira da dupla, que começou ainda na
infância no Cambuci. Margarida, ela mesma uma artista frustrada, decidiu amparar os sonhos dos
filhos de uma maneira que seus pais, muito pobres, não puderam fazer por ela.
— Sempre que o dinheiro dava, trazia alguma coisa para eles experimentarem: canetas diferentes,
papéis com novas texturas, tintas especiais — conta ela.
— Quando eles cresceram, depois do curso técnico de desenho no Ensino Médio, passaram a
frequentar a cena hip hop na estação do metrô de São Bento e a gente ficava um pouco preocupado.
No início não entendia aquilo como arte. Depois, vi que eles faziam uma arte de rua que enchia os
olhos, embelezava a cidade e demonstrava todo o talento que tinham — conta o pai Walter Pandolfo,
72 anos. — É um orgulho.
O irmão mais velho, Arnaldo, de 48 anos, um desenhista técnico que trabalhou por 15 anos com
design de vidros, passou de fonte de inspiração dos irmãos mais novos para colaborador. Hoje,
contribui projetando a maioria das instalações e esculturas dos gêmeos.
— Às vezes, eu digo: “Vocês querem fazer um escultura do personagem de vocês, mas com essas
canelas finas e esse cabeção, a escultura não vai se sustentar” — diz Arnaldo, às gargalhadas.
— Há quatro anos, decidi ajudar os dois
cuidando da parte administrativa do
trabalho e deixando-os usarem o tempo
somente com o processo criativo — diz a
irmã, a administradora de empresas
Adriana, de 45 anos, anjo da guarda
financeiro da dupla.
Otávio e Gustavo desenham, pintam,
constroem brinquedos (embriões do que
são hoje esculturas e instalações) desde
muito pequenos. Na pré-adolescência,
descobriram os muros com a ajuda da
cultura hip hop, como um meio de falar ao
mundo. Mas desde sempre sabiam que
queriam viver de arte. Em 1997, Otávio
abandonou o emprego de office boy num
banco. Gustavo fez o mesmo. Passaram
três anos juntos, quase reclusos, criando sem parar na busca de uma identidade própria. O esforço
valeu e, em 2005, eles foram convidados pelo influente galerista americano Jeffrey Deitch para expor
em Nova York. Um ano depois, conquistaram o Brasil com a mostra recordista de público na Fortes
Vilaça.
— Quando fui a essa exposição, fiquei morrendo de inveja. Tinha fila na porta, gente de todo tipo.
Mas a maior sacada é que, mesmo tendo uma identidade muito clara, ela não limita seu
desenvolvimento artístico — avalia Vik Muniz.
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A carreira evoluiu para trabalhos periódicos no exterior (já expuseram em países de todos os
continentes, menos na África) e no Brasil, encomendas especiais (fizeram um quadro para o produtor
e vocalista do Black Eyed Peas, will.i.am., e o jogador Ronaldo tem várias telas), a criação de
identidade visual para filmes e até lançamentos de carros.
— O bom do Brasil é que ainda dá para fazer muita coisa por aqui — diz Gustavo.
— Quando você vai para fora é que percebe isso melhor — completa Otávio.
Os dois trocam os cadernos. E continuam a desenhar loucamente.
ISTO É - Associações
orgânicas
Cem anos de arte brasileira na Coleção Itaú em Exposição, na qual as obras são relacionadas mais
por conceitos do que por cronologia
Nina Gazire
(24/8/2011) Grande parte das coleções
de arte de bancos brasileiros teve
início na década de 1960, voltando-se
para a aquisição de obras produzidas
em períodos precedentes, em geral a
pintura modernista de 1920 a 1940.
Mas à medida que a arte brasileira
avançava na produção de novas
linguagens, essa jovem produção
passou também a integrar o programa
de aquisições dessas instituições. Na
exposição “1911 – 2011: Arte
Brasileira e Depois, na Coleção Itaú”,
em cartaz em Belo Horizonte, é
possível fazer um percurso por cem
anos da arte feita no Brasil. Embora a
coleção ostente grandes nomes do
Modernismo, como Lasar Segall e
Cícero Dias, o diferencial da curadoria
“Paraíso”, de Albano Afonso
de Teixeira Coelho – responsável pela
coleção e também curador coordenador do Museu de Arte de São Paulo – está na ausência de um
historicismo. Na mostra, que tem projeto cenográfico de Daniela Thomas e Felipe Tassara, a arte
contemporânea e a arte modernista estão dispostas lado a lado, a partir de uma proposta que
“aproxima as obras umas das outras por meio de uma associação orgânica”, como explica Teixeira
Coelho.
O curador trabalhou sobre um recorte de 170 obras, agrupando-as em seis eixos temáticos. Em “Na
linha da ideia”, estão reunidas obras que questionam a funcionalidade e a finalidade da arte e se
alinham às propostas feitas pela arte conceitual da década de 1960. Um exemplo é a série de cartões
produzida por Amélia Toledo, que fazia parte da publicação “On-Off”, de 1973, – criada com o artista
Julio Plaza – e dava instruções didáticas para a realização de intervenções artísticas. Também
integram este eixo temático a série “Paraíso”, fotografias que reproduzem obras de artes perfuradas,
feitas por Albano Afonso entre 2001 e 2005, e “Campo de energia”, objeto feito de metais oxidantes
por Antonio Dias em 1991. “Estas obras são feitas em momentos distintos, mas todas possuem um
forte caráter conceitual. Mas cada uma trabalha o conceitual de maneira diferente”, enfatiza o
curador.
Para além da diversidade da coleção, outro fator importante do projeto está na itinerância. Desde
2006, a coleção do Itaú tem sido mostrada em diferentes exposições, mas sempre em São Paulo. O
projeto de itinerância foi retomado no ano passado com a exposição “Brasiliana Itaú”, que viajou pelo
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Brasil. A presente mostra “1911-2011 Arte Brasileira e Depois, na Coleção Itaú” deixa Belo Horizonte
no mês de setembro e chega ao Rio de Janeiro em outubro. Em 2012, a coleção viajará pela primeira
vez ao Exterior e será apresentada em Buenos Aires.
O GLOBO - Altos
sentidos
Carlito Carvalhosa inaugura hoje, no MoMA, a instalação ‘A soma dos dias’, fazendo do átrio do
museu uma experiência sensorial
Fernanda Godoy
(24/8/2011) Quando o pano diáfano que forma as espirais da obra “A soma dos dias” escorrega
suavemente da altura de 19 metros do átrio do MoMA (Museum of Modern Art), as equipes do museu
e do artista plástico Carlito Carvalhosa extravasam a alegria e o alívio em aplausos, gritos, abraços.
Circulando sem parar pelo novo espaço que acaba de criar em um dos museus mais importantes do
mundo, Carvalhosa transborda emoção e expectativa diante da abertura ao público de Nova York,
hoje.
— É maravilhoso expor aqui, é um museu incrível. Tenho uma curiosidade enorme de ver qual vai ser
a reação do público. Mas a arte é uma coisa para a vida toda, vou continuar fazendo muitas outras
coisas em outros lugares. Não existe uma sensação de “agora cheguei lá” — diz o artista, logo após o
“parto” de sua obra no MoMA, induzido com perícia por integrantes de sua equipe, do alto de um
guindaste, na tarde de domingo.
Mas a verdade é que o paulistano de 49
anos, que despontou na década de 1990
e vive no Rio desde 2002, dividindo-se
entre a casa no Jardim Botânico e o
ateliê em São Cristóvão, chegou
realmente aonde poucos na arte
contemporânea chegam. Formado pela
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
da USP, Carvalhosa estudou gravura
com Sergio Fingermann, aparecendo no
cenário artístico nos anos 1980, com o
grupo Casa 7, no qual também estavam,
entre outros, Fábio Miguez e Nuno
Ramos — como eles, fazia pinturas de
grandes dimensões, que aos poucos
cederam espaço a esculturas e, agora,
instalações, como “A soma dos dias”,
exposta na Pinacoteca do Estado de São
Paulo, no ano passado.
A OBRA, erguida a 19 metros de altura, no MoMA: duas espirais de
tecido translúcido formam um labirinto onde o som ambiente se
acumula ao longo dos dias
Foi lá que ele cativou uma delegação de
visitantes do MoMA, organizada pelo
curador de América Latina da instituição,
Luis Pérez-Oramas, e integrada pelo
diretor do museu, Glenn D. Lowry. O
grupo havia ido à Pinacoteca ver a
retrospectiva de Antonio Dias, mas
acabou conquistado pela obra de
Carvalhosa. Ali mesmo surgiu a ideia de
levá-la para o átrio do museu novaiorquino, um privilegiado lugar de
passagem para quem visita a coleção
permanente
e
as
exposições
temporárias, onde ela ficará exposta até
14 de novembro.
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— Foi amor à primeira vista para todos. Ficamos fascinados com a peça. Uma sorte, porque é uma
obra difícil de descrever com palavras ou mesmo fotografias, é preciso ter a experiência. É assim com
a arte verdadeiramente participativa — diz Pérez-Oramas, também curador da Bienal de São Paulo
de 2012.
Concertos ‘invisíveis’ de Philip Glass
A obra de Carlito Carvalhosa, duas espirais de tecido branco levíssimo (todo o pano da montagem
pesa apenas 40 quilos) e translúcido, interconectadas, que formam um labirinto por onde o visitante
se perde em um mundo etéreo, tem um sistema de captação do som ambiente que vai se
acumulando e modificando com a soma dos dias, daí o nome.
— A gravação vai se sobrepondo dia a dia, como uma construção sonora. As coisas mais recentes
vão apagando as mais antigas, como na memória — explica Carvalhosa.
Como aconteceu em São Paulo, o trabalho terá a participação do pianista e compositor Philip Glass,
que fará concertos dentro do espaço de “A soma dos dias”, brincando com a ideia de invisibilidade, já
que o público não o vê tocar, apenas ouve. Os concertos de Glass e de outros músicos ocorrerão
entre setembro e novembro, sem divulgação prévia de horários. O anúncio será feito apenas no dia
do show, por meio da conta do MoMA no Twitter.
— “A soma dos dias” é um trabalho que tem muitos sentidos e que depende muito de quem o visita.
O que esta obra faz é criar uma outra experiência de um lugar já conhecido — diz Carvalhosa.
O diretor da Pinacoteca, Marcelo Araújo, conta que a escolha da obra de Carvalhosa, que teve a
curadoria de Ivo Mesquita, é um resultado estimulante também para o museu brasileiro.
— É um êxito constatado, é a mesma peça que esteve na Pinacoteca, agora no MoMA, um museu
que é referência. A produção brasileira de artes visuais está ganhando visibilidade, temos notado um
interesse significativo de instituições dos EUA e da Europa — afirma Araújo, que está trabalhando em
parceria com a Tate Modern, de Londres, para uma exposição da obra de Mira Schendel em 2014.
Pérez-Oramas aponta a própria criação do cargo de curador de arte latino-americana, em 2006, como
evidência do interesse da instituição em avançar na sua tradição, que já incluiu retrospectivas das
obras de Candido Portinari e Roberto Burle Marx, entre outros. Para 2014, ele trabalha na preparação
de uma grande mostra de Lygia Clark.
— Do ponto de vista do MoMA, a decisão de reforçar a relação é muito clara. Há uma abertura muito
grande para a arte brasileira e da América Latina, isso está no DNA do Mo- MA. Mas é certo que as
instituições dos EUA entenderam que houve um esgotamento de seu cânone, que era hora de
renovar.
Carvalhosa reconhece que o momento de valorização das artes visuais brasileiras no cenário
internacional o ajudou a chegar ao Mo- MA, mas não arrisca palpites sobre para onde ou como serão
seus próximos passos no exterior. Ele ainda tem uma exposição marcada para este ano na Casa de
Cultura Laura Alvim, em Ipanema, e uma mostra na nova sede do MAC (Museu de Arte
Contemporânea) de São Paulo, no prédio de Oscar Niemeyer que vinha sendo ocupado pelo Detran.
— Estou entusiasmado com a ideia de que este trabalho vai ser visto por muita gente, por todo tipo
de gente, aqui em Nova York. É para isso que a gente faz arte. Em termos de carreira, é difícil saber
o que vai acontecer.
Um Brasil complexo
Com a visão dupla de quem trabalha para o MoMA e para a Bienal de São Paulo e um conhecimento
profundo da arte e da sociedade brasileiras, Pérez-Oramas enxerga uma realidade mais rica do que a
do celebrado modernismo dos anos 1950:
19
— O que estamos vendo no Brasil é o resultado de uma sociedade muito complexa, que conseguiu,
felizmente, multiplicar seus mecanismos de comunicação consigo mesma, graças à transparência
trazida pela volta da democracia. Os últimos 16 anos de governo potencializaram uma enorme força
cultural, que se expressa com muitos estilos de linguagem, com muita diversidade.
Em termos institucionais, o avanço é nítido. Tanto Marcelo Araújo como Luis Pérez- Oramas relatam
uma relação mais simétrica, mais equilibrada, com projetos de parceria entre instituições da América
Latina e dos EUA ou da Europa.
— As instituições culturais dos países latino- americanos, sobretudo aqueles em que se
estabeleceram regimes abertos, inteligentes e democráticos, amadureceram, encontraram uma
solidez que não tinham antes — diz o venezuelano Pérez-Oramas.
MÚSICA
O ESTADO DE S. PAULO -
Múltiplo indivisível
Zé Miguel Wisnik lança quarto CD da carreira e faz nova trilha para o Grupo Corpo
Lucas Nobile
(18/08/2011) - Polivalência nunca foi um defeito, mas ainda há quem insista em defender que uma
pessoa é incapaz de atuar em diversos campos com extrema excelência. Aos 62 anos - mesmo sem
precisar provar mais nada a ninguém -, Zé Miguel Wisnik mostra novamente seus múltiplos talentos,
assinando a trilha de Sem Mim, novo espetáculo do Grupo Corpo, e lançando o quarto disco de sua
carreira.
Produzido por Alê Siqueira, o álbum duplo tem logo em seu título, Indivisível, uma brincadeira com a
característica de polivalente de Wisnik. Sujeito vasto, ubíquo, ele é um só, mas tem todo o direito de
exercer com maestria os papéis de compositor, letrista, pianista, ensaísta, autor de trilhas para teatro
e dança e escritor dos respeitados livros O Som e o Sentido (1989) e Veneno Remédio: O Futebol e o
Brasil (2008).
Na divisão dos dois discos de Indivisível - com belo projeto gráfico assinado por Elaine Ramos -, um
deles tem doze faixas com arranjos mais violonísticos. Já o outro conta com treze temas cujo clima é
ditado pelo piano.
No primeiro, com o violão de Arthur Nestrovski em todas as faixas, além de musicar poemas de
Fernando Pessoa (Tenho Dó das Estrelas), Carlos Drummond de Andrade (Anoitecer), Ludwig
Rellstab (com adaptação de Nestrovski), de letrar Serenata, de Franz Schubert, e de fazer uma
versão para tema de Henri Salvador e M. Modo (Eu Vi), Wisnik assina parcerias com nomes que
dispensam apresentações. Chico Buarque, que participa do disco cantando Embebedado; Jorge
Mautner, em Tempo Sem Tempo; Ana Tatit e Zé Tatit, na anti-homofóbica Eva e Adão ou Marchinha
da Família; Vadim Nikitin, no samba Sem Fundos; e Nestrovski, em Acalanto.
"Foi um disco surgido por encontros. Não só em relação às parcerias, mas também sobre o
amadurecimento da interpretação das canções. O Sergio Reze (bateria e percussão) mora aqui na
rua de cima. Tem uma sala de ensaios muito boa na casa dele e não teve aquela coisa de os músicos
chegarem no estúdio, aprenderem a música na hora para gravar. As músicas atingiram uma certa
maturidade para serem gravadas", conta Wisnik, que também gravou temas de autoria só sua, como
o grande destaque do disco, o samba Errei com Você, A Serpente, Presente e Sócrates Brasileiro,
em homenagem ao ex-craque, sendo uma das faixas que contam com o violão de 7 cordas de Swami
Junior.
No outro disco, desenhado pelo piano, destaque para as parcerias de Wisnik com Guinga (Ilusão
Real e Canção Necessária, esta uma "resposta" a Canção Desnecessária, de Guinga com Mauro
Aguiar), Alice Ruiz (Dois em Um), Luiz Tatit (Tristeza do Zé), o próprio Mauro Aguiar (Nossa Canção)
20
e Marcelo Jeneci (O Primeiro Fole e Feito Pra Acabar, que batiza o primeiro disco do pianista e
acordeonista).
Questionado sobre o fato de gravar em sua voz temas seus anteriormente gravados por nomes como
Maria Bethânia (Cacilda), Gal Costa (Embebedado), Elza Soares e Zélia Duncan (Presente) e Mônica
Salmaso (Mortal Loucura), Wisnik responde: "Eu sempre aprendo muito quando vejo grandes
intérpretes gravando no estúdio, sempre absorvo algo de bom. Como compositor, quando eu gravo as
minhas músicas é um depoimento meu que está ali".
Trilha do Corpo. Não menos digna de nota é a trilha de Wisnik para o novo espetáculo do Grupo
Corpo, Sem Mim. Ao lado de Carlos Núñez, com extenso trabalho de pesquisa, o compositor teve
como ponto de partida canções de Martín Codax, do século 13. "Tínhamos a intenção de trabalhar
sobre essas canções em uma faixa de 15 minutos para o disco do Carlos Núñez, Alborada do Brasil,
mas ela acabou ficando de fora do álbum. No fim das contas, a ideia se desenvolveu em 50 minutos
para a trilha do espetáculo", diz Wisnik.
O ESTADO DE S. PAULO - As
horas cariocas de Thaís
Cantora mostra o repertório de seu segundo disco, ôÔÔôôÔôÔ
Roberta Pennafort
(18/08/2011) - Thaís Gulin não merece o aposto maldoso e reducionista de "a namorada de Chico
Buarque". Quem conhece sua voz e seu cabelo cor de abóbora só pelo recente CD de Chico ou das
revistas e sites de fofoca pode até cair nessa. Mas os que dão mais atenção a seus dois bons CDs do
que aos rumos de seu relacionamento amoroso sabem de seus méritos, e a veem como uma
interessante novidade que o século 21 trouxe à MPB.
Esta noite, o público paulistano, que não a recebe desde 2008, pode conferir a performance da
cantora curitibana carioca no Tom Jazz. O repertório intercala músicas dos dois trabalhos, o primeiro,
de 2007, com seu nome, e o segundo, ôÔÔôôÔôÔ, que saiu recentemente.
Chico (Se Eu Soubesse), Tom Zé (Ali Sim, Alice) e Adriana Calcanhotto (Encantada) deram a ela
músicas inéditas, vestidas no CD por arranjos que se utilizam das cordas de violões, baixo, banjo,
cavaco, viola, guitarra, cello e harpa, e mais sopros, piano, percussão e programações.
As duas primeiras foram apresentadas no show de estreia no Teatro Rival, no Rio, há duas semanas,
assim como Horas Cariocas e ôÔÔôôÔôÔ, composições próprias, Água, hit de Kassin, e Cinema
Americano, de Rodrigo Bittencourt, e devem se repetir no Tom Jazz.
Foi uma noite tumultuada, tanto por um microfone que insistia em não colaborar como pelo frisson
causado pela presença sorridente de Chico. "Onde ele vai tem fotógrafo mesmo", diz Thaís, que não
vê por que falar explicitamente sobre o amor dos dois, que se revela nos CDs deles - os lararás
lararis de Se Eu Soubesse têm duas versões, com as duas vozes.
"Não tem muito mistério nem o que falar. Tem um lado estranho de já se ter um primeiro disco,
críticas ótimas, e de repente as pessoas ficarem falando do trabalho por outro caminho. Isso
confunde o público. Mas não vou gastar minha energia. Procuro pensar em fazer música."
Sonoridade. A energia tem sido direcionada para traduzir a rica sonoridade do CD no palco, onde
Thaís, jeito de menina sapeca e voz com personalidade, é acompanhada de Frado e Alexandre Prol
(violões/guitarras), Chiquinho Chagas (teclados e acordeom), Thiago Silva (bateria/percussão),
Lancaster Lopes (baixo) e Marlon Sette (trombone).
ôÔÔôôÔôÔ tem muito de sua vivência carioca. Ela veio para a cidade há oito anos, com 23, sem
conhecer ninguém. Queria continuar fazendo teatro e buscando seu som, ser mais livre. Fez seus
CDs com calma, "nenhum compromisso", compondo sozinha, pelas madrugadas, e com parceiros
(Kassin/Ana Carolina, Moreno Veloso).
De estandarte nas mãos, cravado na Praia do Arpoador na capa do CD, ela entra no universo do
samba do Rio já na abertura, a faixa-título, na qual promete acabar com o desfile da escola de samba
com sua falta de jeito.
21
"Falo do samba e canto com esse olhar distante, estrangeiro, como uma mistura que não se mistura."
ESTADO DE MINAS
- Cidadão do mundo
Kiko Ferreira
(18/8/2011) O cantor, compositor e violonista mineiro Rafael Dias tem carisma, experiência de palco
e, agora, chega ao primeiro disco oficial. Hoje com 26 anos e 11 de carreira, o músico começou a
tocar em bares, passou pelo Manifesto Primeiro Passo e fez sua primeira participação em disco no
CD Identidades, produzido por Chico Amaral em 2006. Dois anos depois, foi um dos selecionados na
primeira edição do projeto Vozes do Morro, que busca talentos nas vilas, favelas e periferias de Belo
Horizonte .
Rafael veio do Alto Vera Cruz e se destacou entre os
outros concorrentes pela agilidade do violão, a voz
agradável e a poesia simples e direta da música 22 de
fevereiro. Em 2009, foi para Londres estudar línguas e
investir na carreira. Lá, formou o trio Live Brazil, com o
baixista e engenheiro de áudio NSherif, de Angola, e o
baterista moçambicano Elias Manolios, estudante de
música da Salford University. No ano passado, voltou ao
Brasil e começou a gravar este Identity, de oito faixas,
que reflete a temporada internacional.
A sonoridade do CD mescla sons latinos, africanos,
americanos, europeus e brasileiros, numa mistura com
apelo universal. O drama dos imigrantes ilegais surge já
na primeira faixa, No one is illegal, um samba funk com
virada de reggae que inclui uma boa participação do
rapper brasileiro Lil’ Dawg, que vive em Nova York. Com
pegada disco, Maria lembra a sonoridade de final dos
anos 1970, e tem apelo para pista. A veia mais latina está
em La luna, com Cubanito, com levada que lembra o
chicano Carlos Santana, reforçada com o timbre da
guitarra de Luiz Peixoto. Já Te-te-te é samba rock parente
de Jorge Benjor.
Rafael Dias mostra a força da nova
geração de músicos mineiros
O álbum caminha para o final com o samba Me and you, no qual o suingue mineiro fica mais
evidente; faz uma parada romântica na charmosa I believed in you e faz conexão mais explícita com a
África em Cativeiro, com citação de Humbiumbi, que os brasileiros conhecem pela adaptação do
angolano Filipe Mukenga, e na releitura de Djavan. A última faixa é a cinematográfica Capoeira, que
parece trilha sonora de filme sobre capoeira.
Cotação: Bom
O ESTADO DE S. PAULO -
Batuque das Gerais
Cena mineira com base no samba começa a ganhar mais projeção para fora do Estado
Lauro Lisboa Garcia
(20/8/2011) Os shows dos representantes do novo samba mineiro tiveram grande repercussão na
série de shows do programa Conexão Vivo em Salvador, na semana passada. Dois deles - o cantor,
violonista e compositor Gustavo Maguá e o violonista de 7 cordas, compositor, produtor e arranjador
Thiago Delegado - acabam de lançar robustos álbuns de estreia e confirmam que tanto o samba
como a música instrumental mineira ligada a esse gênero estão em alta.
22
Além deles, a superbanda Senta a Pua! e o coletivo Samba do Compositor - projeto de Miguel dos
Anjos, Mestre Jonas e Dudu Nicácio (do Dois no Samba) - protagonizaram alguns dos melhores
shows do evento. Trocando impressões, eles representam uma cena que se fortalece em Minas
(onde naturalmente o samba sempre existiu de alguma forma) e começa a se projetar para fora do
Estado.
Mestre Jonas é um dos nomes de ponta dessa
cena. Violonista, cantor de voz potente e
compositor gravado por diversos intérpretes, ele
também criou o projeto Samba na Madrugada em
Belo Horizonte. Sua música tem forte ligação com
a religiosidade e a cultura mineira de matriz
africana, como mostrou no ótimo CD de estreia,
Sambêro, lançado em 2010.
Jonas, Maguá e Delegado vêm de escolas
musicais diferentes, produzem os próprios
trabalhos mas não se encaixam no perfil clássico
do sambista. Eles expandem essa música que
tem base no samba, mas difere da tradição, seja
com influência de rock, choro, ijexá, gafieira ou
das harmonias mineiras.
Parceria. Gustavo Maguá e Thiago Delegado durante
show na Bahia
A receita conquistou os baianos que vibraram com os shows. Banda que está na ativa desde 2007
em Belo Horizonte, a Senta a Pua! sacudiu o público com seu suingue de gafieira, choro e sambajazz instrumental, com cordas, percussão e metais. Quando Elza Soares entrou para cantar com eles
clássicos como Malandro (Jorge Aragão/Jotabê), Se Acaso Você Chegasse (Lupicínio Rodrigues) e O
Neguinho e a Senhorita (Noel Rosa de Oliveira/Abelardo Silva) o bicho pegou. Foi antológico. Igual
quando a baiana Mariene de Castro se juntou à roda do Samba do Compositor.
Cantor versátil e carismático, de voz calorosa e bem projetada, Maguá, como ele mesmo diz, "é só
alegria". No show, incrementou sua suingueira com colaboração marcante do paulista Marco Mattoli,
do Clube do Balanço.
No CD Vol. 1, gravado com apoio da Conexão Vivo, Maguá buscou a sonoridade dos anos 1970.
Suas influências vêm desde o sambalanço de Jorge Ben e Wilson Simonal, a baianidade de Gilberto
Gil e Caetano Veloso, o samba de João Nogueira, até a "malandragem diferente" de Zeca Pagodinho
e Seu Jorge, gafieira e pagode. Assinando canções com vários parceiros - Thiago Dibeto, Paulinho
Motta, Renegado, Ricardo Acácio -, Maguá também traz novidades de Oleives, Rai Medrado, Vitor
Santana e Celso Viáfora.
Violonista desde a adolescência, ele começou a cantar há cinco anos em Belo Horizonte. Como
compositor diz que sempre trabalha com bom humor, como uma espécie de cronista do cotidiano, na
melhor tradição do samba. "Não vejo a coisa pura, clássica do samba em Minas, no meu caso menos
ainda, com influência do rock e outros gêneros. Mas o que amarra mesmo minhas composições é o
samba."
Habilidoso e versátil, Thiago Delegado tocou com Maguá e com o Samba do Compositor em Salvador
e trabalha com uma penca de artistas em Minas. Seu primeiro trabalho solo, Serra do Curral, quase
todo instrumental, é uma mistura de suas influências - samba, choro e bossa - e também uma
congregação com seus conterrâneos. Juarez Moreira, uma de suas influências, é um de seus
convidados. O outro é o carioca Edu Krieger, parceiro na faixa-título, a única com letra e vocal.
Delegado começou a tocar piano ainda criança e passou para o violão aos 12 anos, tendo João
Gilberto como referência inicial, depois Baden Powell, Raphael Rabello e Dino 7 Cordas. Tornou-se
profissional aos 22, tocando na noite MPB, samba e choros elaborados.
Coletivo. "O disco veio de um processo natural, de encontros com pessoas que me ajudaram a
desenvolver um projeto pessoal", diz Delegado. Tocando em trio, com quarteto e bandas maiores,
23
com "o negócio de improvisar" ele diz que abriu mais a cabeça para o universo da música mineira,
presente no CD.
O músico considera Serra do Curral um trabalho coletivo, que representa bem sua geração de
instrumentistas mineiros, como Flávio Henrique, Sérgio Danilo, Rafael Martini, Pedro Trigo, Warley
Henrique, Aloízio Horta, Juliana Perdigão, Cléber Alves e vários outros. "Como estou no meio desse
furacão em Minas, quis reunir a turma toda."
Integrante da banda da cantora Aline Calixto - outra voz de grande expressão nessa cena mineira -,
ele deixa sua marca, tanto pela sonoridade de seu instrumento como na produção de uma série de
outros artistas, caminhando para ser uma espécie de Paulão 7 Cordas das Gerais. É um nome a se
prestar atenção.
CORREIO BRAZILIENSE -
Virtuose que virou compositor
O violonista gaúcho Yamandu Costa realiza show na Sala Villa-Lobos para o lançamento do CD
Mafuá, gravado na Alemanha
Irlam Rocha Lima
(22/8/2011) Ao participar de um festival no sul da Alemanha, em 2005, Yamandu Costa foi ouvido
pelo produtor Peter Finger, que estava na plateia e ficou impressionado com as qualidades do
instrumentista brasileiro. “Tudo naquele jovem violonista parecia estar em perfeita sintonia: técnica,
musicalidade, ritmo, humor e uma exuberante alegria ao tocar”, elogia Finger.
Entusiasmado, ele quis ver Yamandu em ação por mais tempo. Então o convidou para gravar um CD
no estúdio montado em sua casa, na cidade de Osnabrueck. Por já ter assumido outros
compromissos, o músico gaúcho demorou para aceitar o convite. Isso ocorreu em 2007, quando
voltou à Alemanha. “Finger tinha em casa um complexo de gravadora, anfiteatro e loja de música,
onde realizava concertos e gravava CDs”, revela o violonista. “Tudo era voltado para a sonoridade e a
acústica do violão, desde a arquitetura da casa até os mínimos detalhes do estúdio”, acrescenta.
Resultado: gravou Mafuá, o que viria a ser seu primeiro álbum solo, e superou as expectativas de
Finger, não apenas por captar cada nuance da admirável execução, como também por revelar um
ótimo compositor por trás do violão. Lançado inicialmente na Europa, o disco saiu recentemente no
Brasil, distribuído pela gravadora Biscoito Fino.
Hoje, às 20h, na Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional, o brasiliense poderá ouvir o violonista tocar as
músicas desse trabalho, em show com entrada franca. “Das 13 faixas gravadas, 10 são composições
minhas. Algumas estavam guardadas e outras foram feitas próximo à gravação. Abro o repertório
com El negro del blanco, que fiz com Paulo Moura e deu título ao álbum que gravamos juntos”, conta.
Repertório
De autoria de Yamandu são, também, Elodie, Samba pro Rafa, Bachbaridade, Bostemporânea,
Caminho de luz, Zamba zuerta e Tipo bicho. “Elodie fiz para minha mulher (Elodie Boundy), que
também é musicista e foi coprodutora do Mafuá. O tema que dá nome ao CD é de autoria de
Armandinho Neves; e Zezé Gomes assina Quem é você; enquanto Lalão é de um compositor com o
mesmo nome.”
Yamandu vê Mafuá como um disco emblemático, por ser o primeiro solo e pela possibilidade de
mostrar o seu trabalho de compositor. “Eu vinha trabalhando há algum tempo nestes temas, mas
ainda relutava em gravar coisas compostas por mim. Mas aí senti que já tinha amadurecido e quis
gravá-los. Então foi como romper o cordão umbilical.”
Som brasiliense
Antes de Yamandu, quem for à Villa-Lobos poderá apreciar o som de músicos brasilienses. O
violonista Jaime Ernest Dias e o bandolinista Dudu Maia farão apresentação de meia hora, cada.
Jaime, acompanhado por Hamilton Pineiro (contrabaixo), José Cabrera (teclado) e Rafael dos Santos
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(percussão) e tendo como convidada especial a violinista Liliana Gayoso, mostrará composições
próprias como Pintando o sete e Choro de Liliana. “Vamos fazer, também, os clássicos do choro Rosa
(Pixinguinha) e Santa Morena (Jacob do Bandolim)”, adianta o violonista.
Dudu Maia levará temas instrumentais de sua autoria, entre os quais Inciso, Liberta coronha e Não
tem coré coré. “Incluímos no repertório alguns standards de choro, entre os quais Brejeiro (Ernesto
Nazareth), Um a zero (Pixinguinha) e Noites cariocas (Jacob do Bandolim)”, anuncia o bandolinista.
Ele terá a companhia do grupo Aquattro, formado por Fernando César (violão sete cordas), Pedro
Vasconcellos (cavaquinho) e Valério Xavier (pandeiro).
ISTO É -
Sertanhol
O sucesso "Chora, Me Liga", da dupla João Bosco & Vinícius, vira mania na América Latina, ganha
versão em espanhol e inaugura um novo gênero
Ivan Claudio
(24/8/2011) A música “Chora, Me Liga”, que há dois anos anima as baladas sertanejas no Brasil, está
se tornando um fenômeno também na América Latina. Vertida para o espanhol com o título “Llora, Me
Llama”, a canção da dupla João Bosco & Vinícius pode ser ouvida na voz de, pelo menos, duas
dezenas de bandas estrangeiras. Foi gravada por artistas colombianos, peruanos, venezuelanos e,
claro, argentinos – em Buenos Aires, a canção é uma mania que sobreviveu ao fim do verão e
aquece o frio inverno portenho. É ouvida em rádios, lojas, bares e, especialmente, nas pistas de
dança. Caiu tanto no gosto popular que passou a ser usada pelas torcidas dos grandes times como
grito de guerra – o tom romântico, obviamente, foi trocado por agressões verbais ao torcedor
adversário. O primeiro time a usá-la foi o Newell’s Old Boys, logo seguido pelo River Plate. Não se
tem notícia se o Boca Juniors aderiu à febre, mas o YouTube traz um clipe do hit, dedicado ao time
do coração de Maradona.
João Bosco, que se refere a si mesmo como “o japonês” da dupla, diz que ficou sabendo do
fenômeno justamente pelo futebol. Ao visitar o blog do jogador argentino Sergio Aguero, do
Manchester City, ele leu com surpresa – e alegria – que a música era a preferida do atacante. “A
partir daí, sempre recebíamos da Argentina emails de amigos com filmes de celular mostrando
pessoas cantando o nosso refrão”, diz. Nem João Bosco nem Vinicíus foram conferir o fenômeno in
loco: não sobra tempo na agenda de 25 shows por mês, fechada até o ano que vem. Por isso, não
puderam também aceitar os inúmeros convites para se apresentar no país. Eles pretendem, contudo,
tirar “uns três ou quatro dias de folga” para visitar as rádios locais: “Não conseguimos dar conta da
demanda de apresentações no Brasil. Nosso foco ainda está aqui”, afirma João Bosco.
Mesmo com a crise fonográfica, o mercado latino ainda representa uma mina de ouro para os artistas,
mas, ultimamente, raros nomes nacionais têm conseguido furar o bloqueio do idioma antes
conseguido por gente como Roberto Carlos e Caetano Veloso. Há dois anos, a dupla Victor & Leo
lançou um CD e um DVD em espanhol, “Nada es Normal”, e no início do ano o cantor Luan Santana
estrelou um comercial de tevê em Buenos Aires. Tudo leva a crer que, com o câmbio favorável e a
grande afluência de brasileiros à cidade, a onda do sertanejo universitário tenha ido na bagagem.
Redes de fast-food portenhas servem sua versão da feijoada, e os difíceis cortes de carne argentinos
já trazem tradução para o português. Nos outlets apinhados de brasileiros sempre se ouvem Bruno &
Marrone e outras duplas de sucesso. Nada, contudo, que se iguale ao estouro de “Chora, Me Liga”.
João Bosco, que está preparando com Vinícius a versão em espanhol dessa música e de outros
sucessos, dá uma pista para se entender a mania.
Ele lembra que o estilo de sua dupla traz elementos dos ritmos do Sul, como o chamamé, originário
do norte da Argentina, e a polca paraguaia, gêneros musicais muito comuns em Mato Grosso do Sul,
Estado onde nasceram e cresceram, que faz fronteira com o Paraguai. De fato, estudiosos da música
sertaneja detectam em sua formação esses dois estilos sonoros.
E também da guarânia – a dupla Cascatinha e Inhanha, por exemplo, gravou “Índia”, mais tarde
recuperado pelo tropicalismo, via Gal Costa. Trata-se, portanto, de uma estrada de mão dupla: o
nosso sertanejo foi influenciado pelo som dos países fronteiriços e, agora, devolve o resultado
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deglutido e transformado. Outra fonte de inspiração para os rapazes de bota e camisa xadrez é a
canção romântica mexicana, mais precisamente, o cantor Cristian Castro, cujas baladas derramadas
integram o repertório de runo & Marrone, Marlon & Maicon, Guilherme & Santiago e das extintas
duplas Rick & Renner e Edson & Hudson.
O que estaríamos assistindo, então, seria ao surgimento de um novo estilo: o sertanhol.
FOLHA DE S. PAULO -
Zélia Duncan faz 30 anos de carreira com Tatit e Itamar
Cantora estreia espetáculo baseado na obra do primeiro e prepara disco com canções do segundo
Em cartaz a partir do dia 3, "Tô Tatiando" usa personagens das canções de Tatit para criar roteiro
teatral
MARCUS PRETO
DE SÃO PAULO
(24/8/2011) Zélia Duncan nasceu em Niterói (RJ), mas morava em Brasília quando começou a cantar,
em 1981. Tinha 16 anos e vivia ali desde os seis.
Nesse período, ouvia os discos "estranhos" do irmão mais velho: os recém-lançados álbuns de
estreia de Itamar Assumpção, de Arrigo Barnabé, do grupo Rumo.
Matava aula para tocar violão com Cássia Eller. Quando não estavam cantando, as duas iam passar
as tardes garimpando as novidades na loja Jegue Elétrico, especializada em música independente.
Ali, complementavam a discoteca apresentada pelo irmão de Zélia com outros álbuns que acabavam
de ser lançados. Na lista, os das cantoras Eliete Negreiros, Cida Moreira e de outros nomes ligados à
vanguarda paulistana, então em evidência. É nesse passado que Zélia se debruça agora, quando
comemora 30 anos de carreira.
Com lançamento previsto para o começo do ano que vem, a cantora prepara seu já esperado álbum
dedicado às canções de Itamar. Ela é, afinal, o principal elo entre o obscuro repertório do compositor
paulista e o grande público das trilhas de novela e da programação das rádios.
O disco deve contar com muito material inédito de Itamar -inclusive canções que ele escreveu pouco
antes de morrer, em 2003, especificamente para a voz de Zélia.
Antes disso tudo, no entanto, a cantora prepara o espetáculo "Tô Tatiando", criado a partir do
repertório de Luiz Tatit, outro artista ligado à vanguarda paulistana. E, pela primeira vez nesses 30
anos, ela atua menos como cantora e mais como atriz. "A gente está encenando as músicas dele",
ela diz, enfatizando a palavra "encenando". "Não é show, mas é música. É uma brincadeira com as
personagens que existem naquelas canções."
Sim, haverá dois músicos no palco, que vão se revezar entre violões, guitarras e sopros. Mas o foco é
mesmo a interpretação, a cena. Para tanto, Zélia convidou a atriz Regina Braga para dirigir e ajudar
na concepção -o que inclui amarrar as tais personagens das letras de Tatit. Há um mês, as duas
estão "internadas" em uma sala de ensaios no Alto da Lapa.
Cofundador do grupo Rumo, Tatit tornou-se, há três décadas, mestre em compor nas linhas de
fronteira entre o canto e a fala -tanto musical quanto poeticamente.
"Estou gostando de comemorar meus 30 anos nesse território", diz Zélia. "Como a antidiva, a
anticantora. Comemorar com o anticanto." Segundo instruções que vem recebendo de Regina, ela
não precisa "soltar a voz". Não precisa nem ser afinada. "Aqui é teatro, aqui ela pode tudo", diz a
diretora.
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LIVROS E LITERATURA
CORREIO BRAZILIENSE – Fome de palavras
Escritor piauiense radicado em Brasília há mais de 30 anos, Menezes y Morais lança décimo primeiro
livro: um romance de ideias ambientado na capital federal.
Felipe Moraes
O escritor detalha o livro A íris do olho da noite:
personagens reais e também com a cara de Brasília
(18/8/2011) Desde adolescente, Menezes y
Morais senta-se em frente à mesa de
trabalho e só sai dali quando consegue se
libertar dos pensamentos que antes
ocupavam a sua mente. Quando firma os
pés no chão e levanta-se da cadeira, é
inevitável, ele reclama de dor, as costas
estão moídas. Sua mãe, Isabel Menezes
de Morais, costumava gritar para ele: “Vem
comer, meu filho!”. Hoje, não é mais assim.
Mas a produção ainda é obstinada,
esfomeada: de 20 livros inéditos, já
publicou 11. O mais recente é o romance A íris do olho da noite (Thesaurus), que ele lança hoje, às
19h, no restaurante Carpe Diem. Mais chegado à poesia, Morais diz que a ficção o consome durante
várias estações. “Passo de dois a quatro anos em processo de gestação. Quando não tem mais como
correr daquilo, faço um espelho dos personagens, me sento diante do computador e só Deus sabe”,
explica.
Dos nove volumes restantes, ele ainda guarda um romance, uma novela, um livro de contos, um de
ensaios de história e uma coletânea de entrevistas (com Cora Coralina, Jorge Amado e outros
autores). O resto é poesia. “Me considero essencialmente poeta. Mas isso não quer dizer que, aqui,
eu seja um poeta de férias escrevendo um livro. São métodos diferentes”, delineia. No caso de A íris,
o processo começou ainda no século passado e só terminou em 2006. De lá para cá, veio “apertando
parafusos, melhorando a linguagem”.
O cuidado do escritor, natural de Altos, no Piauí, foi em criar uma escrita com a cara de Brasília. A
história concentra conflitos e discussões em torno de um casal liberal: um economista e uma
professora, formados na UnB, e pais de dois filhos pré-adolescentes. A malha narrativa, adianta
Morais, não cede ao melodrama. “Não cai no sentimentalismo ou na tragédia. É um romance de
ideias, psicológico, e com um pouco de história real”, classifica.
De carne e osso
Em meio aos conflitos, discussões e encontros, aparecem personagens reais da cidade: o poeta
Cassiano Nunes e o compositor Renato Matos, por exemplo. Morais segue a trilha deixada por Dante
Alighieri na Divina comédia. “Pessoas que Dante não gostava foram colocadas no purgatório ou no
inferno”, diverte-se. “Essa técnica foi retomada por Balzac e Jorge Amado. Na minha visão, é uma
sacudida no leitor. E faz com que ele pense: ‘É ficção ou realidade?’”, continua.
Formado em jornalismo, Morais aprendeu a amar a literatura por incentivo da mãe, que o alfabetizou
com livros de cordel. Na rede instalada na varanda de casa, o menino gostava de se espreguiçar para
trás e ficar de cabeça para baixo, enquanto ouvia as frases saindo da boca da mãe. Pai de seis filhos
— um já falecido — e avô de três netos, ele vê a literatura local como madura e com identidade
própria. “Temos muita gente produzindo coisas boas no teatro, na literatura, no cinema e na música.
Brasília já tem uma dicção própria em todas essas áreas”, acredita. E trata a escrita como uma
atividade ao mesmo tempo egoísta e generosa. “É um ato solitário e radicalmente solidário”, diz.
27
O ESTADO DE S. PAULO -
Pobres agentes secretos cubanos
Morando em kitchenettes, dando aulas de salsa e infiltrando-se entre os anticastristas de Miami, eles
são personagens de Fernando Morais
Antonio Gonçalves Filho
(19/8/2011) A história dos agentes secretos infiltrados por Cuba nas organizações anticastristas
renderia um bom filme de espionagem. Nada parecido com as superproduções de James Bond, até
mesmo porque os espiões caribenhos vivem na penúria quando desembarcam na Flórida, o paraíso
dos dissidentes cubanos. Obrigados a esconder a identidade, esquecer parentes e aceitar os piores
empregos para não levantar suspeitas entre anticastristas de organizações sediadas na Flórida,
alguns desses agentes acabaram atrás das grades. O repórter e escritor Fernando Morais, autor da
biografia da militante comunista Olga Benário, entrevistou tanto espiões cubanos presos nos EUA
(René Gonzales) como mercenários que praticaram ataques terroristas em Cuba, explodindo bombas
em hotéis de luxo para prejudicar o turismo na ilha de Fidel, hoje uma das principais atividades
econômicas cubanas após o colapso da ex-URSS. Essa história é contada no livro Os Últimos
Soldados da Guerra Fria, já nas livrarias.
O autor. Cuba enfrenta hoje, segundo Morais,
organizações criminosas que querem acabar com
o turismo na ilha, praticando sequestros e
atentados
É provável que ela não renda um filme charmoso
como os da série dedicada ao agente 007, mas o
produtor Rodrigo Teixeira, que comprou os direitos
do livro, anteviu o potencial de histórias como a da
Operação Peter Pan, planejada pela CIA em 1960,
que levou 14 mil crianças cubanas para os EUA, e
de personagens malucos como o mercenário
salvadorenho Raúl Ernesto Cruz León. Condenado
à morte, ele teve a pena convertida para 30 anos
de cadeia por ter explodido bombas em hotéis de
Paulo Liebert/AE
Havana. Num deles, os estilhaços de um cinzeiro
de metal atingiram a garganta de um turista italiano de 32 anos, matando-o na hora. Além do
aloprado Cruz León, que adotou como herói Sylvester Stallone, Morais conta a história de chefões
das organizações anticastristas que financiam o terrorismo contra Cuba e de dissidentes célebres que
moram em Miami. Um deles é o folclórico Rodolfo "El Jefe" Frómeta, sempre visto em trajes militares.
Outro é o escritor Norberto Fuentes, que considera a comunidade cubana de Miami simplesmente
desprezível - embora influente, pois 57% de seus integrantes apoiam uma ação militar americana
contra Cuba.
As ações de grupos anticastristas sediados nos EUA não se restringem, segundo seu livro, a
manifestos contra Fidel, mas incluem voos clandestinos de dissidentes para espalhar o terror na ilha.
A resposta de Cuba é enviar agentes para se infiltrar nesses grupos. Essa é uma nova "guerra fria"?
É a guerra fria estrebuchando, pois não existe mais a União Soviética. Historicamente, ela terminou
no dia em que Gorbachev entregou o poder para Ieltsin. A guerra fria ficou localizada num pedacinho
do planeta, numa distância que vai daqui a Piracicaba, 160 quilômetros entre Havana e Key West. É
uma coisa retrô num mundo em que o Vietnã fabrica motores Porsche e a China vira uma potência
capitalista. Um dos maiores financiadores dos grupos radicais da Flórida é primo de primeiro grau do
filho de Fidel. Isso faz lembrar um pouco a história dos Capuleto e Montecchio, uma tragédia
shakespeariana em pleno Caribe.
Por que, então, Cuba incomoda tanto os EUA? Não lembra também aquela história do filme O Rato
Que Ruge?
28
A verdade é que Cuba não representa uma ameaça. Os EUA gastam por dia com a defesa o que
Cuba gasta numa década. E por que, então, o governo americano embarca nessa onda de agressões
dos grupos radicais de Miami? Por causa da importância da Flórida para as eleições. Não há
candidato a presidente, seja democrata ou republicano, que não vá fazer o beija-mão na Little
Havana, tomar a bênção dos chefões. Mas seria uma injustiça dizer que todos são iguais em Miami.
Então, escrevi um capítulo em que falo das três Cubas diferentes lá existentes.
Numa enquete que mediu o grau de animosidade da população da cidade com a Revolução Cubana,
segundo seu livro, mais de 50% da comunidade cubana defendeu um ataque militar dos EUA para
derrubar o governo cubano. Como é isso?
Foram 57% que defenderam uma ação armada, seja do governo americano, seja dos dissidentes
existentes em Cuba.
Em 1994, ano do ressurgimento dos balseiros, o governo cubano decidiu não reprimir as fugas, que
se tornaram cada vez mais numerosas. O novo êxodo não poderia ter colocado em risco a
estabilidade política do regime cubano?
Foi uma decisão muito emocional de Cuba. Isso aconteceu 14 anos depois do êxodo de Mariel,
quando saíram de Cuba 130 mil pessoas (o país tem pouco mais de 11 milhões de habitantes).
Clinton não teve alternativa, assinando um acordo que hoje permite a entrada de 20 mil cubanos por
ano nos EUA. Uma coisa curiosa é que os EUA, no acordo, pedem a Cuba para reprimir
coercitivamente a saída de balseiros, porque Mariel se converteu num problema para os americanos,
uma vez que, na época, saíram 40 mil delinquentes e criminosos comuns, além de condenados por
latrocínio. E a CIA tinha uma preocupação adicional: os agentes de inteligência infiltrados entre os
que deixaram a ilha.
Com a descoberta de que René González era um agente infiltrado por Havana para investigar
organizações anticastristas nos EUA, ficou claro que a rede de informantes formada logo após o
esfacelamento da União Soviética tinha a aprovação de Fidel e seu irmão Raúl Castro. Conhecer as
atividades desses grupos impede, de fato, ataques contra Cuba?
Um fato curioso: divulgada a notícia do esfacelamento da URSS, um navio da Alemanha Oriental que
deveria entregar leite a Cuba deu meia volta imediatamente, como um burocrata jogando a caneta às
6 da tarde. Cuba, para economizar energia, desligou aparelhos de ar-condicionado e desviou para a
produção agrícola a pouca gasolina que existia, obrigando o país a trocar açúcar por bicicletas
chinesas. Você pode imaginar o desespero. Foi um período dificíl também do ponto de vista político,
porque o setor de serviços sempre foi o calcanhar de aquiles de Cuba, que precisa salvar sua
economia pelo turismo. Com o fim da URSS, os atentados foram dirigidos à indústria turística - e não
há nada que espante mais o turista que uma bomba, o que justifica a infiltração de agentes nas
organizações anticastristas.
Um personagem tragicômico do livro é o salvadorenho Raul Ernesto Cruz León, contratado pelo
anticastrista Cruz Abarca, o Barrigão, para explodir hotéis. Como é esse mercenário?
Ele não estava nem muito interessado no dinheiro, mas indo atrás da fantasia de virar Sylvester
Stallone e conquistar Sharon Stone. Pagava-se US$ 1.500 por bomba e o sujeito ainda corria o risco
de ser morto, ir para o paredão. Salvo um ou outro caso, é gente que faz isso não por ideologia, mas
por desequilíbrio.
Mas, no caso dos agentes enviados por Cuba aos EUA, todos eles eram preparados, como você
mostra, ao contar a história da Rede Vespa, grupo de 12 homens e 2 mulheres que se infiltrou nos
EUA para espionar as organizações anticastristas...
Sim, todos tinham cursos acadêmicos, salvo o René González, que se formou em economia na
cadeia. Ele é um dos três cidadãos americanos do grupo. Um deles foi beneficiado por delação
premiada e dois estão na cadeia, René e Tony Guerrero, formado em engenharia espacial na
Ucrânia, que, para sobreviver, deu aulas de salsa para gays em Key West.
29
O que move essas pessoas, o nacionalismo? Como é que o agente infiltrado Tony Guerrero,
aconselhado pelo governo cubano a não ter filhos com sua mulher Maggie, para não prejudicar sua
atividade, aceita essa intervenção em sua vida privada?
É curioso, porque parece um pai falando com o filho de 15 anos , mas é o que acontece, de fato. É
isso, é o nacionalismo que move essas pessoas.
Mas esse credo ideológico não sofreu abalos entre os cubanos?
Dos dois lados vem diminuindo, tanto no cubano como na Flórida, digo, a geração mais nova, mais
interessada em salsa e diversão do que em bombas, embora existam 41 organizações anticastristas
em Miami. Em Cuba há muito menos radicalismo entre jovens do que entre os velhos.
Surpreende o fato de Cuba gastar uma miséria para manter agentes infiltrados, algo em torno de US$
200 mil por ano, segundo seu livro...
Pois é, esses agentes moravam em kitchenettes de estudantes. O Gerardo (Hernández Nordelo,
conhecido pela alcunha de Manuel Viramóntez), que era o chefe do grupo, ia para o Miami Herald
vender cartoons por US$ 100. O Roque (Juan Pablo Roque, agente infiltrado, quase um sósia de
Richard Gere), um coronel piloto de caças, virou motorista de caminhão e personal trainer. É o oposto
do que a gente vê nos filmes de James Bond. Eles viviam na pindaíba.
VEJA - A valentia
da burocrata
Mulher de Guimarães Rosa, Aracy de Carvalho salvou centenas de judeus do nazismo, mas manteve
ern sigilo os detalhes de seu feito — que uma nova obra traz à luz
Luis Guilherme Barrucho
(24/8/2011) De 1936 a 1941. período que antecedeu a fase mais sinistra da II Guerra Mundial, o
Brasil recebeu levas de judeus alemães que fugiam do terror perpetrado por Adolf Hitler. Dando
guarida a esse fluxo migratório estava Aracy de Carvalho — personagem por muito tempo lembrada
apenas como a segunda mulher do diplomata e escritor João Guimarães Rosa (1908-1967). o autor
de Grande Senão: Veredas. Chefe da seção de passaportes do consulado brasileiro em Hamburgo,
ela desafiou o antissemitismo encampado nos bastidores do governo de Getúlio Vargas e facilitou a
concessão de centenas de vistos para judeus. No mesmo período conheceu Rosa, cônsul adjunto,
com quem passou a compartilhar a cama e a indignação com a crueldade do nazismo. Só quatro
décadas depois, em 1982, Aracy seria laureada com a mais alta honraria para os não judeus que se
arriscaram para proteger vítimas do Holocausto - foi declarada "Justa entre as Nações" pelo governo
de Israel. O casal manteve na sombra esse capítulo de sua vida - que o livro Justa — Aracy de
Carvalho e o Resgate de Judeus: Trocando a Alemanha Nazista pelo Brasil trata de iluminar.
Mesclando fatos da biografia da mulher de Rosa com relatos dos refugiados a quem ela ajudou, a
historiadora brasileira Mônica Raisa Schpun, da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais da
França, distingue a realidade do mito em torno do ativismo secreto de Aracy e fornece a exata
dimensão de seu heroísmo. A obra retrata uma mulher destemida, capaz de embarcar sozinha com o
filho de 5 anos em um navio rumo à Alemanha e de amargar privações até se firmar no consulado.
Poliglota e culta, no Brasil ela era vítima do estigma que então marcava as mulheres separadas. Na
Alemanha, terra de sua mãe, chegou a viver de favores. "Aqui não temos nada, a roupa da cama está
rasgando, vai ser difícil arranjar-nos até a senhora trazer roupas", escreveu à mãe em 1937.
Enquanto Aracy se adaptava ao país, assistiu à expulsão dos judeus do funcionalismo público,
testemunhou seu banimento das escolas e universidades e os viu perder seus direitos e propriedades
(o extermínio em massa só começaria em 1941, dois anos depois de iniciada a guerra). Nessa
mesma época, o governo Vargas restringiu a entrada de judeus no Brasil, por meio de circulares
secretas nas quais eles eram referidos como "essa espécie". Responsável pela concessão de vistos
em Hamburgo, Aracy passou a omitir dos superiores qualquer informação que identificasse um
requerente como judeu. Como havia cotas para certas ocupações, fazia com que um comerciante
figurasse nos papéis como agricultor ou turista, se necessário. E liberava tudo em prazos recordes.
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"Ela corria sérios riscos. Se fosse descoberta, poderia ser demitida e entregue às forcas nazistas", diz
Mônica Schpun.
Da mesma forma que não mencionava nas cartas à mãe o que fazia, mesmo depois de finda a guerra
Aracy evitou falar sobre o assunto. Em uma de suas poucas declarações a respeito, nos anos 80.
disse: "Nunca tive medo. Quem tinha medo era o Joãozinho. Mas ele não se metia e me deixava ir
fazendo". Seu silêncio alimentou mitos como o de que abrigava perseguidos em sua casa e os
ajudava na fuga. Nada disso é confirmado em Justa. O livro afirma, no entanto, que os judeus já
escolhiam o Brasil como destino por saber que no consulado havia uma funcionária que facilitava
vistos. Em algumas ocasiões, estabeleceu-se um vínculo afetivo entre a burocrata e os refugiados.
Ela se manteve amiga do casal Margareih e Hugo Levy até o fim da vida. A Hugo, que era membro de
uma associação sionista, Aracy de fato ofereceu acolhida em sua casa em Hamburgo. Seu ímpeto de
ajudar perseguidos políticos voltou a se manifestar durante a ditadura militar no Brasil: ela chegou a
esconder o cantor Geraldo Vandré, autor do hino esquerdista Pra Não Dizer que Não Falei das
Flores. "Minha mãe se emocionava com o desespero dos que eram forçados a deixar para trás casas
e pertences", diz se filho, Eduardo Tess, hoje com 82 anos.
Rosa e Aracy (ou Ara, como ele a chamava) viram de perto o recrudescimento do nazismo durante a
guerra. Nos seus últimos anos lá, já era proibido emitir vistos a judeus, cujo destino eram os campos
de concentração. Em uma anotação de 1941 em seus diários, o escritor registrou: "Passeei de
automóvel com Ara. Até crianças de 4 anos com o distintivo amarelo, infamante!". Quando teve de
sair da Alemanha, em 1942 — o Brasil afinal se bandeará para o lado dos aliados —. o casal foi
mantido por 100 dias num hotel, em poder da Gestapo, até se estabelecer a troca de diplomatas entre
os dois países em guerra. Casados em 1948, permaneceriam juntos até a morte do escritor. Rosa
dedicou a Aracy sua obra maior. Grande Senão: Veredas. E foi para ela também que deixou os
direitos autorais do livro como herança. Aracy morreu em março deste ano. aos 102 anos. Seu nome
fica para sempre associado a uma obra-prima da literatura e a um exemplo universal de
solidariedade. •
O ESTADO DE S. PAULO -
Obra de João Almino é premiada em Passo Fundo
Raquel Cozer
Passo Fundo
(24/8/2011) Ainda se ambientando a Madri, depois de três anos e meio como cônsul-geral em
Chicago, o diplomata João Almino trocou nesta semana os 40ºC da cidade espanhola por dias
gélidos em Passo Fundo( RS),onde foi anunciada, anteontem à noite, sua vitória no 7º Prêmio Zaffari
& Bourbon de Literatura, pelo romance Cidade Livre (Record).
Quinto livro de uma série que tem Brasília como pano de fundo, Cidade Livre seguiu uma tradição das
obras anteriores do autor ao superar 227 outros romances na escolha do júri – dos cinco títulos de
Almino que envolvem a capital federal, apenas o segundo, Samba Enredo (1994), não recebeu
nenhuma honraria importante no País. Mas o Zaffari & Bourbon, como lembra, oferece hoje ao
vencedor “o maior prêmio brasileiro não estatal”, R$ 150 mil.
“Fico contente sobretudo porque estou em boa companhia. Aqueles que foram previamente
premiados são todos bons escritores”, diz, sobre nomes como Mia Couto e Cristovão Tezza. “Isso
sem falar na minha concorrência nesta edição. Havia lido vários dos dez antes mesmo de serem
finalistas, era muita coisa boa”, comentou ontem pela manhã, durante entrevista coletiva na 14ª
Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo, o diplomata, reconhecido pelo apoio que dá à causa
da literatura brasileira no exterior.
Assim como na ficção, Almino tem várias passagens por Brasília – viveu na cidade por um período
antes de cursar o Instituto Rio Branco e, depois, nas funções de diplomata. Descobriu no local uma
cidade que serve também como metáfora. “Não é só uma cidade, é um projeto que acompanha toda
a história do Brasil independente,associada a esse sonho de modernização.”
Nascido na cidade norte-riograndense de Mossoró em 1950, dez anos antes da fundação de sua
cidade-personagem, Almino disse que via desde o começo dois caminhos possíveis para sua ficção.A
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primeira era o regionalista, desde sempre alimentada pelas várias temporadas que passou no sertão
do Ceará e pela leitura privilegiada que pôde fazer de romances como os de Graciliano Ramos na
pequena biblioteca de seu pai. Mas sentiu que a segunda permitiria maio inovação. “A ideia de tratar
de Brasília coincidiu com o momento em que havia uma mudança política importante no Brasil.
Achava que a literatura tinha que tomar um rumo novo. Não podia ser aquela literatura altamente
engajada do ponto de vista da crítica e do regime militar. Precisava de um horizonte novo, e Brasília
era um espaço vazio naquele momento”, conta, sobre o caminho que o levou a Idéias para Onde
Passar o Fim do Mundo, de 1987, e às obras subsequentes.
Almino buscou em todas as obras um diálogo, não necessariamente central, com os novos meios de
comunicação, mas é em Cidade Livre que essa característica se manifesta de forma mais clara.
Embora o romance aborde, como os outros, o período de formação da cidade, para escrevê-lo o
autor recorreu a uma linguagem de blog, ferramenta de publicação usada pelo narrador na história
como instrumento para colher informações para o livro que pretende criar. Ligado (“mas não muito”)
na internet e em redes sociais, chegou a criar um blog durante a feitura da narrativa para se inteirar
de suas possibilidades. Já a tecnologia do livro digital, um dos temas da Jornada de Passo Fundo, é
parte indissociável de sua vida. “Antigamente eu viajava com uma sacola de livros grandes, muito
pesados. Hoje coloco tudo dentro do Kindle e é suficiente para uma viagem inteira”, diz. E viagens
são uma constante na vida e na obra de Almino. Nômade por gosto e por profissão, o escritor e
diplomata inclusive fez das viagens elementos importantes de seu quinteto de Brasília, que em alguns
casos torna-se apenas ponto de passagem de personagens em deslocamento. E serão elas, também,
o mote do livro que ele agora escreve. Neste caso, diz ele, o protagonista “já saiu, começa viajando”.
ARQUITETURA E DESIGN
CORREIO BRAZILIENSE - A fé
segundo Oscar Niemeyer
Aos 103 anos e lúcido, arquiteto lança no Rio de Janeiro um livro que tem entre os destaques os
monumentos religiosos projetados por ele. Apesar de ser ateu, o mestre é referência na concepção
de templos
Thalita Lins
(23/8/2011) O arquiteto Oscar Niemeyer é uma daquelas personalidades que não misturam as
convicções pessoais com os compromissos de trabalho. Ateu, ele é autor de dezenas de projetos que
incluem catedrais, igrejas e capelas construídas em Brasília, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e até no
exterior, em países como Argélia e Alemanha. Somente na capital da República, o carioca de
Laranjeiras projetou sete monumentos: Capela Nossa Senhora da Alvorada, Igreja Nossa Senhora de
Fátima, Capela do Palácio do Jaburu, Igreja Apostólica Ortodoxa Antioquino de Brasília, Catedral
Santa Maria dos Militares Rainha da Paz, Capela do Anexo IV da Câmara dos Deputados e Catedral
Metropolitana de Brasília. Esta última é famosa no mundo inteiro e tornou-se um dos cartões-postais
da cidade e do Brasil.
As sete belezas do maior nome da arquitetura brasileira estarão presentes no livro As igrejas de
Oscar Niemeyer com outras criações de mesma magnitude, entre elas composições que não
chegaram a sair dos croquis. O lançamento da publicação está marcado para hoje, na Galeria Anna
Maria Niemeyer, no Rio de Janeiro. O livro reúne imagens em cores das construções, projeções,
esboços e relatos da vida do arquiteto expostos por ele mesmo. Na obra, Oscar Niemeyer conta, aos
103 anos de idade, como aceitou dar vida a edificações voltadas para cultos sagrados.
Além do livro, também será lançada a décima edição da revista Nosso Caminho. Desta vez, o
trabalho presta uma homenagem ao arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé. Respeitado profissional,
Lelé trabalhou com Niemeyer em Brasília, onde desenvolveu produtos construídos com materiais prémoldados. A edição conta ainda com a divulgação da parceria de Niemeyer com o mineiro Gustavo
Pena, batizado de Encontro das águas.
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Em entrevista ao Correio, Niemeyer destacou a sua intenção ao publicar um livro contendo apenas
criações arquitetônicas religiosas, falou sobre os comentários de ser o ateu mais religioso do Brasil e
adiantou quais serão seus próximos trabalhos (leia Seis perguntas para).
Originalidade
Para
o
professor
do
Departamento de Arquitetura
da Universidade de Brasília
(UnB) José Carlos Coutinho, o
título do livro de Niemeyer, por
si só, já é surpreendente. “A
surpresa é que, mesmo sendo
ateu, comunista e materialista,
ele ainda assim é pai de
vários monumentos dotados
de espiritualidade. Sinal de
que a própria Igreja se rende
ao que ele projeta. Niemeyer é
um criador autêntico e ele se
orgulha dessa originalidade”,
acredita o docente.
Fernando Andrade, na Catedral: "Os traços são marcantes, não tem como errar
ao dizer de quem é a obra"
O traço de Niemeyer também
impressiona quem não é especialista em arquitetura. “Não sei explicar como ele consegue fazer
obras voltadas à religião. Só pode ser uma coisa divina. Tudo que ele desenhou tem um sentimento
dele”, acredita a auxiliar de serviços gerais Thaís Miranda Jesus, 30 anos. Moradora da Ceilândia, ela
costuma frequentar a Catedral Santa Maria dos Militares (Rainha da Paz), no Eixo Monumental.
“Assim como ele (Oscar), eu não tenho religião, mas quando entro aqui, sinto paz”, resume.
Assim como Thaís, a vendedora Josyleide Pereira Santos, 39 anos, diz sentir-se em casa quando
entra na Igreja Nossa Senhora de Fátima, mais conhecida como Igrejinha, construída na 307/308 Sul.
“Não há diferença alguma se ela foi feita por um religioso ou um descrente em religião. O que importa
é que a igreja traz uma sensação de tranquilidade, foi muito benfeita e tem um certo requinte. Eu
acho que ela tem um design diferente”, descreveu a moradora de Sobradinho. Desenhado por
Niemeyer, o espaço ganhou formas que, de longe, já identificam a autoria da obra. “Os traços dele
são marcantes, não tem como errar ao dizer de quem é a obra”, afirma o auxiliar administrativo
Fernando Andrade, 27 anos.
O ESTADO DE S. PAULO -
Obra de Arte Total na Casa de Vidro
Camila Molina
(24/8/2011) Estrela da arquitetura mundial, o holandês Rem Koolhaas visitou anteontem a Casa de
Vidro de Lina Bo Bardi pela primeira vez. Estava com tanto frio que ficou por pouco tempo na
sexagenária residência da arquiteta ítalo-brasileira, uma construção suspensa e transparente entre
árvores do bairro do Morumbi. “É interessante que Lina Bo Bardi tenha descoberto a conexão entre
folclore e a modernidade, combinação que acredito não ter visto em nenhum outro lugar”, diz
Koolhaas ao Estado, referindo- se às tantas peças de arte popular que fazem parte da coleção da
arquiteta, morta em 1992, e que decoram a casa. Mas a visita do holandês tinha um propósito
específico – ele e cerca de outros 30 criadores vão participar de exposição, em 2012,na Casa de
Vidro de Lina, um projeto internacional com curadoria do suíço Hans Ulrich Obrist. Obrist também é
uma estrela, está entre os curadores mais influentes do mundo da arte.Tanto ele quanto Koolhaas
realizam amanhã, às 11 horas, uma palestra no teatro do Sesc Pompeia (Rua Clélia, 93, tel. 38717700), onde apresentarão para o público, ao lado da designer Petra Blaisse, o projeto da mostra na
Casa de Vidro do Instituto Lina Bo e Pietro Maria Bardi, marcada para ocorrer entre setembro de 2012
e janeiro de 2013. Em processo inicial, a lista dos participantes, nacionais e estrangeiros, ainda não
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está fechada, mas o curador vai anunciar alguns nomes – entre eles o do artista Cildo Meireles e do
arquiteto inglês Norman Foster.
“Comecei a ser curador por causa da minha cozinha”, diz Hans Ulrich Obrist. Ele se refere à
exposição que organizou na cozinha de sua casa, quando tinha 23 anos, e da qual participaram a
dupla suíça Fischli & Weiss e o francês Christian Boltanski. “Foi uma experiência fundamental, algo
que nunca quis perder, por causa da intimidade, do tipo de arte produzida numa escala
completamente diferente do museu”, continua o curador.
“No século 20, os museus acabaram ficando cada vez maiores, como shopping centers, e essa
condição da escala humana acabou correndo o risco de desaparecer”, diz Obrist. “A escala
doméstica”, completa Koolhaas. “Por um momento na história da arte,é assustador que a escala
humana possa desaparecer, mas acho que isso não ocorrerá como um todo e por isso participo de
um projeto como esse (d aexposição na Casa de Vidro)”, completa o arquiteto holandês, vencedor,
em 2000, do prêmio Pritzker, e homenageado no ano passado com o Leão de Ouro da 12.ª Bienal de
Arquitetura de Veneza, autor da tese de “enclosed city”, a ideia central de projetos que ampliam o
espaço público e minimizam o privado.
A exposição na Casa de Vidro em São Paulo tem como conceito o trabalho de intervenção artística–
e multidisciplinar – na escala íntima e sutil com a residência e sua história e com a obra de sua
criadora. “O projeto é sobre a casa, mas os artistas terão completa liberdade para usar o espaço
externo com suas árvores, o belo estúdio que há no piso inferior, o arquivo de Lina, com seus
desenhos, sua coleção de arte”,conta. “É sobre a ideia de a exposição ser uma casa e de a casa ser
uma exposição”,afirma Obrist,que faz referência ao conceito de obra de arte total (gesamtkunstwerk)
na residência,a “reconfiguração temporária” da Casa de Vidro com os trabalhos dos artistas. O
curador á organizou, por exemplo, projetos anteriores na Huerta de San Vicente, casa do poeta
Federico García Lorca na Espanha, e na Nietzsche Haus, na Suíça.
“Há alguns anos estou interessado em Lina Bo Bardi, existe um fascínio por ela”, conta Hans Ulrich
Obrist, que conheceu primeiramente, em 2000, o SESC Pompéia projetado pela arquiteta e esteve na
Casa de Vidro no ano passado. “Um dos motivos da escolha de Lina para esse projeto foi a invenção
dos extintos cavaletes (de vidro) para o Masp, com os quais se podia olhar a obra de arte de uma
maneira diferente. Também podemos ver aqui na casa a ideia de uma gravidade desafiadora.”
O projeto é realizado pela produtora espanhola Isabela Mora em colaboração com o Instituto Lina Bo
e P. M. Bardi. Além de futura inscrição na Lei Rouanet, um comitê de apoio privado foi criado com
colecionadores brasileiros e estrangeiros (entre eles,o Instituto Inhotim). A exposição ainda vai
abranger a edição de livro e filme, dirigido por Gustavo Moura.
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QUADRINHOS
CORREIO BRAZILIENSE -
Metrópole em claro e escuro
Felipe Moraes
(23/8/2011) A capital paulista
ganha, em dois lançamentos
editoriais, os contornos de uma
narrativa gráfica em preto e
branco e de uma prosa que colore
a periferia de uma sensibilidade
que não se vê nos noticiários. São
reproduções calorosas de uma
cidade que é, ao mesmo tempo,
referência de progresso e abismo
de desigualdades sociais. O
quadrinista Marcelo d’Salete, da
Zona Leste, e o poeta e escritor
Sérgio Vaz, Zona Sul, cada um a
seu modo, reproduzem faces e
becos de São Paulo com um olhar
de dentro: parecem descrever
seus próprios vizinhos, resgatar
lembranças ou até registrar as impressões de uma experiência diariamente intensa. A graphic novel
Encruzilhada (Barba Negra/Leya) e a coletânea de textos Literatura, pão e poesia (Global) são como
flagrantes da vida urbana. E do que ela tem de belo e doloroso.
Marcelo d’Salete foi criado em São Mateus e, quando adolescente, trabalhou como office boy no
centro. “Quando comecei a trabalhar com ilustração e design, acabei circulando muito pela Vila Maria,
depois, regiões próximas de Tiradentes. De certa forma, as histórias do livro têm a ver com essa
trajetória e com que venho vendo e conhecendo tanto de quadrinhos quanto de São Paulo mais
recentemente”, conta o desenhista, que chegou a morar em Brasília no ano passado. Mas uma nova
oportunidade de emprego o levou de volta para o Butantã, Zona Oeste. Os quadros de Encruzilhada
economizam nos diálogos — uma herança que vem da paixão pelo cinema de Takeshi Kitano e Alfred
Hitchcock— e preenchem os espaços vazios com borrões sombreados, nebulosos: os personagens
humanos compõem a paisagem de prédios pálidos, anúncios publicitários e pichações.
“Quis representar as coisas da forma como as vejo”, delimita. Atento aos detalhes, d’Salete modificou
a sua observação: se antes via e rascunhava simples esboços, hoje capta imagens com uma câmera
fotográfica. “É mais para a construção visual da história. Para o roteiro, parto de conversas com
colegas, familiares, e histórias que me chamam a atenção”, revela. Numa delas, Brother, sobre irmãs
que vendem DVDs piratas na calçada, a inspiração veio de uma cena que ele viu com os próprios
olhos. Em outras, a existência de moradores de rua excluídos e de pessoas comuns é traçada pelo
entrelaçamento com a imaginação.
Do bairro
Sérgio Vaz não acredita em arte pela arte. “Só sou bom escritor se falo da minha aldeia. Sou
extremamente engajado e descaradamente panfletário”, ele diz. As crônicas e contos de Literatura,
pão e poesia são novidade para ele, mais familiarizado com os versos. Mas o conteúdo ainda é um
estrato específico de onde ele vive, em Taboão da Serra, grande São Paulo. “Sou um cara da
periferia, um cara que sempre quis que o bairro fosse um lugar bacana para se viver. Quero escrever
contra o racismo, a violência policial, quero falar que os pobres também beijam na boca. Acho que
sou um psicólogo das coisas. Quero decifrar o boteco e por que ele está cheio às 10h da manhã, para
ver se é porque está cheio de pessoas desempregadas”, acrescenta.
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A atitude cidadã é aferrada à comunidade: ele escreve pensando sempre na sua “quebrada”. E não
reclama se disserem que tem “vista curta”. “Não consigo imaginar um cara na Inglaterra lendo e
entendendo. Mas, como as coisas estão lá hoje em dia, é bem capaz que ele entenda!”, brinca. E
reitera: “Não sei como atingir outras pessoas. Falo de vizinhos, gente da rua de baixo, da rua de
cima”. Esses sujeitos vivos, tão próximos a Vaz — quem sabe frequentadores do sarau da
Cooperativa Cultural da Periferia (Cooperifa), criada por ele na Zona Sul —, amplificam uma
expressão cultural que a crueldade das ruas costuma abafar. Mas que grita e vibra nos parágrafos
ágeis de Vaz.
MODA
BRAVO -
Yes! Nós já não temos banana
(Agosto/2011) Finalmente, o circuito internacional reconhece uma moda brasileira que explora
elementos da nossa cultura sem clichés. Três estilistas têm mérito nisso: Ronaldo Fraga, André Lima
e Lino Villaventura
A cultura brasileira nunca esteve tão presente entre estilistas do país que vêm se destacando no
exterior. Mas aqui é preciso pensar em "cultura brasileira" para além das praias do Rio de Janeiro, do
Carnaval na Sapucaí, do futebol e da Amazónia. Não que esses clichés que tanto nos definem lá fora
sejam ignorados pelos atuais expoentes da moda nacional. Ronaldo Fraga, Lino Villaventura e André
Lima não brigam com a ideia consolidada de Brasil - só a apresentam de outra forma. Eles continuam
explorando conceitos como o tropicalismo e a sensualidade, por exemplo, porém ampliam sua
interpretação. Trocam o aclamado litoral pelo interior. No lugar do discurso sobre a biodiversidade das
florestas, vão atrás das histórias de mitologia passadas de geração a geração. Ao tomar o samba
como referência, elegem as canções mais tristes de Lupicínio Rodrigues e Nara Leão, em vez da
euforia de um samba-enredo. E assim conquistam um espaço inédito nas passarelas internacionais.
Sim, porque no fim do século 19, a aristocracia rural do país simplesmente importava as roupas de
Paris e por isso vivia em um desconforto considerável, com vestimentas pesadas e muitas camadas
de tecido debaixo do tórrido sol carioca. Mais tarde, quando começamos a produzir moda no Brasil, o
que fazíamos era usar como padrão o que estava em alta na Europa. E foi fácil se valer dessa
postura por causa de um dado geográfico: o fato de ficarmos no hemisfério oposto ao das ditas
nações desenvolvidas. Grosso modo, conquistaram fama por aqui os estilistas que, durante o nosso
verão, enfrentavam os invernos europeu e norte-americano em busca de orientação para o que iriam
propor nas lojas seis meses depois. E, no meio do ano, naturalmente, espiavam como os estrangeiros
se vestiam no calor. O mercado brasileiro - e a crítica - valorizava as tendências previamente
"aprovadas" em Paris e Nova York. Foi assim que trabalharam profissionais de renome, como o
paraense Dener Pamplona de Abreu (1937-1978) e o paulista Clodovil Hernandes (1937-2009). A
maioria de seus modelos não era desenhada para o corpo mais volumoso da mulher brasileira e para
o clima dos trópicos. Eles abusavam dos cortes secos e de veludos e lãs.
A partir dos anos 2000, o uso das vitrines do exterior como uma espécie de cartilha virou um recurso
mais sofisticado, digamos assim. Nossos estilistas dominaram de tal forma a linguagem cosmopolita
que muitos deles passaram a trabalhar para algumas das principais grifes estrangeiras. É o caso do
mineiro Francisco Costa, desde 2002 à frente da direção criativa da nova-iorquina Calvin Klein.
Outros acabaram ocupando lá fora um espaço bastante condizente com a força de atuação que
desfrutam no país. Em 2003, o paulistano Carlos Miele abriu a primeira loja com seu nome em Nova
York. Miele ainda desfila na Semana de Moda de Nova York desde 2002 e integra o Conselho de
Designers de Moda da América, instituição que reúne estrelas da ordem de Carolina Herrera, Marc
Jacobs e Tom Ford. Em 2007, foi a vez do também paulistano Alexandre Herchcovitch a inaugurar a
sua filial em Tóquio. Herchcovitch realizou em 1998 seu primeiro desfile no exterior, na embaixada
brasileira em Londres. Em 2000, estreou na Semana de Prêt-à-Porter de Paris e, quatro anos depois,
figurava na lista da Semana de Moda de Nova York. Para confirmar essa sua afinidade com os
padrões internacionais, duas pecas em látex assinadas por ele fazem parte do acervo do museu
Metropolitan, de Nova York. A moda também cresceu no Brasil com a ampliação das faculdades
especializadas - há hoje mais de 130 cursos de graduação no setor - e com o aperfeiçoamento das
semanas de desfiles, como a São Paulo Fashion Week e a Fashion Rio, que atualmente atraem
críticos de prestígio de Paris e Milão e são notícia no mundo todo.
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BARQUINHOS DE PAPEL
Agora, pode-se dizer que vivemos um terceiro momento no país: estilistas têm se destacado tanto
aqui quanto no exterior justamente por acrescentar elementos da cultura brasileira em seu repertório.
Eles, no entanto, aumentam o entendimento dos clichês de Brasil ao ir muito além das imagens
esperadas, como a da mulher sensual, a do Maracanã lotado e a das escolas de samba. Ao mesmo
tempo, não deixam de usar referências que permitem que os estrangeiros identifiquem o país em
suas. "Ronaldo Fraga, Lino Villaventura e André Lima, três expoentes da moda atual, abusam das
cores e dos grafismos, que são características muito presentes em nosso repertório. Aliás, cores e
grafismos são dados também das nossas artes visuais e do design", diz o historiador João Braga, que
junto com o jornalista Luís André do Prado acaba de lançar o livro História da Moda no Brasil (Pyxis
Editorial, págs., R$ 120). Ao mesmo tempo, o mineiro Ronaldo Fraga, por exemplo, idealiza peças
que representam muito bem toda a herança barroca. Ele faz roupas pensando também em cenários,
sons, coreografias. Sob seu comando, os modelos transformam-se em personagens de uma peça de
teatro. Esqueça portanto o simples caminhar por uma passarela neutra. A memorável coleção de
verão 2008, baseada nas várias facetas da cantora capixaba Nara Leão e intitulada Lindonéia, por
exemplo, foi mostrada com o caminho tomado por centenas de barquinhos de papel. Uma ideia
singela e de um efeito para lá de poético. Além de remeter diretamente a uma brincadeira de
dobradura comum no Brasil. Claro.
Com passagem por escolas de Nova York e Londres, é no entanto de Passira, município em
Pernambuco, e de Pirapora, em Minas Gerais, que Ronaldo tira grande parte de sua inspiração. No
vilarejo pernambucano, o estilista mantém relações de parceria com bordadeiras, que inclusive vêem
seu nome impresso na etiqueta de cada peça de roupa que costuram. O uso de bordados e rendas
ajuda a reforçar uma postura importante para Ronaldo. Em vez de exaltar as curvas femininas, como
seria talvez natural para um estilista brasileiro, ele é avesso a qualquer coisa que lembre esse clima
mais liberal da praia: "Nunca espere um decote do Ronaldo. O pudor sempre percorre suas
coleções", diz João Braga. Com um tom lúdico, o estilista também recorre bastante ao universo da
música: as composições dor de cotovelo de Lupicínio Rodrigues viraram a coleção Quantas Noites
Não Durmo, do inverno 2004, com vestidos de brocados e florais sobre algodão da Paraíba. Mas aqui
é bom lembrar: o samba que escolhe não é o da bateria das escolas do Rio, e sim a melancolia do
mestre gaúcho.
BETHÂNIA E O CURUPIRA
Outro estilista que tem conquistado cada vez mais reconhecimento no exterior com uma arte que
amplia os clichês da cultura nacional é André Lima. "Não gosto de um feminino docinho. Prefiro as
mulheres com um instinto mais animal", diz o estilista paraense. Com uma obra que inclui muitos
vestidos longos estampados, de seda ou tricô, André cria peças para mulheres sedutoras. Mas não
se engane. Ele também não cai na ideia da sensualidade por si só. Suas referências são as cantoras
Maria Bethânia e Clara Nunes, que ele chama de "musas" e que não se consagraram exatamente
pela beleza física. Elas têm mais a ver com uma personalidade forte e é para mulheres assim que
André trabalha. Não à toa as pessoas dizem que não é qualquer uma que veste um modelo seu. Para
isso, é preciso ter certa atitude. Muito dessa sua visão deve ter vindo da infância no casarão colonial
em Belém. Herdado do avô materno, era dominado por dez mulheres: a mãe, professora de
português e matemática, a avó costureira, três tias também professoras, duas irmãs e três
empregadas. Ele lembra que as dez, com temperamentos distintos, faziam da casa uma espécie de
novela mexicana e que cada uma tinha um jeito próprio de se vestir. Com muita estampa.
A estamparia é um ponto alto na produção de outro estilista fundamental para a moda brasileira atual:
Lino Villaventura. Nascido também em Belém do Pará, Lino toma a Amazônia como principal
inspiração. Mas, de novo, o estilista não fala da exuberância da floresta. Escolhe tratar das lendas e
dos mitos dos povos da região e assim suas criações assumem um tom surrealista. São de lá
histórias como a docurupira, guardião da mata que se apresenta na forma de menino com os cabelos
vermelhos e os pés virados para trás, ou a do boto, que vive nos rios da Amazônia e durante a noite
se transforma em um belo rapaz. Os críticos costumam dizer que, diante das peças de Lino, tem-se a
sensação de terem entrado em um sonho: "A explicação para as minhas criações limita o que se vê,
já que a inspiração não é palpável. Ela é intuída, como uma obra de arte", diz o estilista. Com um
corte exótico e roupas muitas vezes feitas a mão, Lino também explora bastante o universo das artes
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plásticas em seu trabalho. Os bichos da artista mineira Lygia Clark (1920-1988) estão em saias de
palha de buriti, e as pinturas sobre o Brasil do alemão Johann Moritz Rugendas (1802-1858) são
lembradas com o uso de plumas indígenas e joias feitas de semente. "Quando comecei, não existia
moda autoral neste país. Modestamente, esse mérito é meu", diz Lino. Precursor ou não, a moda
brasileira pede mais Villaventuras, Fragas e Limas. E tudo indica que eles virão. Como conclui
Ronaldo Fraga: "O brasileiro está no momento certo de trilhar sua autonomia na moda porque nunca
houve uma época com tanta autoestima no país. Mas acho que o termo não é a busca de uma
identidade nacional, e sim de sua apropriação".
OUTROS
CORREIO BRAZILIENSE -
Mitos indígenas
(20/8/2011) Instalação em formato de cobra com mais de 100 metros feita de bambus, fotos, vídeos,
peças de artesanato e outros objetos revelam séculos da cultura de várias etnias brasileiras
Para completar um passeio
completo pela exposição Séculos
indígenas é preciso percorrer 110
metros de extensão. É o tamanho
da cobra feita com bambus
trançados
que
ocupa
os
corredores em espiral do Memorial
dos Povos Indígenas desde 9 de
agosto. A sensação é a de entrar
num túnel histórico com passagens
pela cultura indígena brasileira. O
projeto da enorme serpente foi
feito por arquitetos especializados
em bioestruturas e executado por
quase 30 profissionais, incluindo
artistas plásticos e designers. Todo
O Memorial dos Povos Indígenas sedia até 10 de outubro a exposição, que
o processo foi supervisionado por
conta com trabalhos de Darcy Ribeiro e dos irmãos Villas-Bôas, entre
representantes das tribos e levou
outros.
apenas três semanas para ficar
pronto. “Em algumas etnias existe o mito da cobra gigante, que veio do outro lado do mundo e
aportou no Brasil. É uma história sobre a chegada dos europeus”, registra Rosane Kaigang,
funcionária da fundação que dá nome à exposição, da etnia kaigang.
Na cabeça da cobra estão expostas peças de artesanato procedentes do acervo do próprio Memorial,
da Fundação Darcy Ribeiro e do projeto Séculos Indígenas do Brasil. Além de fotografias mostrando
o trabalho de indigenistas, como os irmãos Villas-Bôas e o antropólogo Darcy Ribeiro, estão expostas
fotos de Paulo Metz, João Ripper e Piotr Jaxa. No meio do passeio, um tronco simboliza o ritual do
Quarup (em homenagem aos mortos e realizado anualmente pelas comunidades do Parque do Xingu,
no Mato Grosso). Caixas de som emitem vozes de líderes indígenas que foram assassinados. O
visitante pode se sentar no centro e meditar.
Um passo adiante, dentro de um oca de palha trançada e apelidada carinhosamente de coco, é
exibido de forma intermitente um vídeo que mistura animação e documentário, baseado no romance
Maíra (1976), de Darcy Ribeiro. “A história conta o mito de criação do mundo. É uma maneira de
mostrar a nossa cosmovisão para os outros povos”, acredita Rosane. O quadro de 15 monitores
trabalhando na exposição é composto por indígenas e não indígenas. São representantes das etnias
patamona, tukano, kamayurá, tupiniquim, dessana, apurinã, mudoruku, baré e aticum..
Samantha Ro’otsitsina Juruna, 25 anos, filha do falecido líder xavante e deputado federal Mário
Juruna, é aluna do mestrado em desenvolvimento sustentável pela Universidade de Brasília e está
trabalhando como uma das mediadoras da exposição. “Eu conheci muita coisa de outras etnias. Acho
que é justamente esta a função da mostra: mudar a visão das pessoas em relação aos indígenas”,
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explica. Para trabalharem na exposição, os monitores fizeram cursos e visitas a museus e centros
culturais, como o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), de Brasília.
A partir de setembro, a segunda fase da mostra contará com visitas agendadas de escolas do Distrito
Federal. Para que a relação com os alunos em sala de aula com as etnias indígenas fosse
modificada, professores da Secretaria de Educação fizeram cursos desde o ano passado. A
exposição fica em cartaz até 10 de outubro no Memorial dos Povos Indígenas. Existem propostas de
itinerância em instituições do Rio de Janeiro e Espírito Santo.
O GLOBO -
O pensador das periferias na era digital
Marcus Vinícius Faustini, que criou editais de funk e ‘lan house’, mostrará ‘passinho do menor’ para
Pierre Lévy na sexta-feira
Luiz Fernando Vianna
(23/8/2011) Nos anos 1990, Marcus Vinícius Faustini era um jovem diretor de teatro que montava
peças sobre a realidade social brasileira. Hoje, prestes a completar 40 anos e no centro de vários
projetos, ele aplica o que aprendeu no teatro para mudar essa realidade. Com uma maturidade que
surpreende quem o conheceu na década passada, Faustini é um artista/pensador do que pode haver
de mais interessante na era digital, trocando o fetiche consumista da tecnologia pelo uso dela por
moradores de periferias — palavra que adota com significado geográfico e econômico.
— Estamos vivendo de novo algo que a Tropicália fez: inventar um modo de dizer como é a cultura
brasileira. Esse movimento que vem das periferias é tão potente quanto a Tropicália, embora mais
diluído e com atores que não são tão próximos dos jornalistas — diz. Nascido em Duque de Caxias e
crescido em Santa Cruz, Faustini foi até Papai Noel de supermercado para sobreviver, e a primeira
vez que teve a carteira assinada foi como contínuo do Banco do Brasil. Salvou-se, segundo diz, pelo
“discurso”: Marx, literatura e as peças que lia na Escola de Teatro Martins Pena.
— Eu pensava: “Sou pobre, feio e moro longe. Então, tenho que ler uma peça por dia.” Isso me deu
uma formação, organizou uma história da cultura brasileira na minha cabeça. Mas é preciso dar uma
viradinha nessa história — diz.
‘Pobre é invenção’
A virada começou nos anos 1990,
quando, segundo ele, iniciativas como
AfroReggae e Nós do Morro sinalizaram
que as periferias não queriam ser
representadas pela classe média, mas
criar suas próprias representações.
— O pobre é a maior invenção da
cultura brasileira. Ele já foi o homem
tosco, agrário; o que vem para a cidade
e se deslumbra; o marginal, o
revolucionário... Um
esquema
de
representações sempre em busca da
identidade, não da subjetividade —
afirma.
Sua nova maneira de ver a arte se consolidou a partir de “Carnaval, bexiga, funk e sombrinha”,
documentário rodado em 2005 sobre os grupos de Clóvis (ou bate-bolas).
— Fui Clóvis e via a alta complexidade daquela operação. Mas, para a academia, o Clóvis é o folião,
o folclórico, o ingênuo; e a imprensa o vê como violento. Pensei: “Isso é performance. Esses caras
saindo de uma garagem e um monte de gente olhando é arte contemporânea. Só não é lento” —
conta ele, com ironia.
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A conclusão se desdobrou em outra: fenômenos de periferia estigmatizados por supostas ligações
com tráfico e violência devem disputar as verbas de arte contemporânea. A ideia chegou a seu
melhor momento neste mês, quando Faustini — agora superintendente de Cultura e Sociedade a
convite da secretária estadual de Cultura, Adriana Rattes — lançou os editais do funk e da lan house.
Ele fará caravanas em setembro para atrair inscrições.
Na próxima sexta-feira, no auditório da Petrobras no edifício Torre Almirante, Faustini participará, ao
lado de Pierre Lévy, da mesa “Cibercultura e transformação social”, na qual exibirá para o pensador
francês vídeos com o “passinho do menor”. Encontráveis no YouTube, são danças feitas por jovens
de periferia em seus bairros ao som de funk — sem qualquer apologia ao sexo e à violência.
— Se estivessem só dançando na rua, seria um fato da vida. Mas, ao botarem uma câmera, isso tem
uma potência estética. O upload dá uma nova dimensão. Aquilo tem kuduro, frevo, funk, também é
intervenção urbana. E daqui para a frente será assim: muitos vão produzir cultura, não só os artistas
extraordinários. A gente vive a era da reprodutibilidade do autor — diz.
Todas as suas ações são voltadas contra uma visão paternalista dos pobres (“Favela é potência, não
carência”) e a favor do uso de meios artísticos e tecnológicos para que as pessoas falem de si e
tracem seus destinos. Por meio de conceitos seus como “mapas”, “inventários” e “monstros”, ele criou
seu livro “Guia afetivo da periferia” — que vai virar filme e quadrinhos — e faz oficinas como as do
projeto Agência de Redes para a Juventude, que está selecionando 30 jovens para “desincubarem”
suas ideias com R$ 30 mil cada — verba da Petrobras.
— É a cultura como disparador de ações na vida. O pobre esteve tão fora dos meios de produção
subjetivos que pôs o nome de seu filho de John Lennon da Silva.
Amanhã, Faustini inicia com Heloisa Buarque de Hollanda as “Gôndolas do teleférico”, entrevistas
transmitidas do teleférico do Complexo do Alemão pelo site www.apalpe.word press.com.
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ASSESSORIA DE IMPRENSA DO GABINETE