SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(2) 1996 DINÂMICA MIGRATÓRIA RECENTE NO INTERIOR PAULISTA PAULO DE MARTINO JANNUZZI Demógrafo, Analista da Fundação Seade, Professor da PUCCAMP A migração vem se tornando, já há algumas décadas, a componente demográfica mais importante para a explicação da redistribuição espacial da população pelo Estado de São Paulo. Nos anos 80, com a progressiva redução dos diferenciais de fecundidade e mortalidade pelo estado, os fluxos migratórios interestaduais, inter-regionais e intra-regionais passaram a ter um peso ainda maior na dinâmica populacional dos municípios e regiões paulistas. Na presente década, não há evidências empíricas que se contraponham a essa tendência. Se, por um lado, tal fato vem colocando o campo de estudos da migração em posição de destaque na agenda da pesquisa demográfica no estado – o que, em si, é um aspecto positivo –, por outro, introduz dificuldades adicionais na já complexa atividade de elaborar projeções populacionais – temática para a qual este artigo visa contribuir. Se persistirem as tendências apontadas anteriormente, a qualidade das estimativas populacionais futuras dependerá, cada vez mais, da consistência das hipóteses sobre os níveis e padrões etários da migração no estado. Antecipar cenários futuros consistentes para a migração – ou para qualquer outra componente demográfica – é uma atividade de extrema complexidade, dada a natureza multifacetada dos processos demográficos. Dimensões econômicas, sociais e culturais concorrem, simultânea e independentemente, para a conformação dos níveis e padrões de fecundidade, mortalidade e migração. Entre as condições ditadas pela estrutura econômica e a manifestação demográfica há uma interface de mediação extremamente complexa, que pode amenizar, potencializar ou mesmo inverter os efeitos primários das condições estruturais. A crise paradigmática em que se encontra a teoria explicativa da migração é outro fator que dificulta a tarefa de delineamento de hipóteses para a dinâmica migratória futura. Nas palavras de Simmons (1987:1) “... a diversidade de padrões migratórios que têm sido descobertos e de modelos conceituais que têm sido desenvolvidos para analisá-los conduziu-nos a uma crise teórica. Os modelos explicativos existentes são muito específicos para contextos ou preocupações particulares. Eles parecem ser incapazes de integrar os diversos padrões de mobilidade, contextos históricos e tradições de pesquisa das várias disciplinas científicas”. Além disso, a progressiva desvinculação entre produção econômica e emprego na sociedade contemporânea vem colocar em xeque abordagens teórico-metodológicas que pressupõem uma relação mecânica entre mobilidade populacional e emprego industrial. Manifestações mais recentes do processo de urbanização no Brasil – em especial a contra-metropolização aludida por Martine (1994) e o acirramento da polarização do crescimento demográfico em direção a alguns centros urbanos no interior do estado (Bógus e Baeninger, 1995) – também introduzem elementos novos na discussão dos níveis e padrões migratórios futuros da população paulista. Por fim, e não menos importante para o estabelecimento de hipóteses para a migração, destaca-se a lacuna de informações estatísticas – atuais e passadas – sobre a realidade social, econômica e demográfica em nível microrregional. O desprestígio das atividades relacionadas ao planejamento público, neste final de século, tem se refletido de forma desastrosa sobre as agências oficiais de coleta, processamento e disseminação de dados estatísticos, em especial sobre o IBGE. Portanto, não é de se estranhar que, transcorridos mais de quatro anos da realização do Censo Demográfico, não se disponha de quais- 92 DINÂMICA MIGRATÓRIA RECENTE NO INTERIOR PAULISTA quer informações públicas sobre os quesitos investigados especificamente no questionário da amostra do Censo. Acrescente-se a isto o fato de que a migração tem sido historicamente o componente demográfico menos visado nos levantamentos amostrais intercensitários (Patarra e Cunha, 1987). Para o Estado de São Paulo, felizmente, esta lacuna de informações censitárias sobre migração e outros aspectos da realidade socioeconômica vem sendo contornada pelo uso de outras fontes alternativas. Graças à confiabilidade das Estatísticas Vitais no Estado (Waldwogel et alii, 1994; Paes, 1994), algumas questões sobre a dinâmica migratória já vêm sendo respondidas. Vários trabalhos têm contribuído para descrever o novo quadro redistributivo da população no estado e os diferenciais regionais de migração líquida nos anos 80, bem como para avançar no entendimento dos determinantes do processo.1 Para regozijo dos pesquisadores da migração no estado e alívio dos formuladores de hipóteses de projeções, é possível ainda complementar o quadro da dinâmica migratória estadual com os resultados de dois surveys realizados nos anos 90: a pesquisa de campo do Projeto “Migrações, Emprego e Projeções Populacionais”2 e a Pesquisa de Condições de Vida (PCV) da Fundação Seade. Assim, com o objetivo de contribuir para o entendimento da dinâmica recente da mobilidade populacional no interior paulista e fornecer subsídios para a elaboração de hipóteses acerca dos níveis e padrões migratórios a serem incorporadas nas projeções demográficas para o Estado de São Paulo, este artigo apresenta um painel descritivo do perfil sociodemográfico dos migrantes e dos diferenciais regionais da migração recente no interior paulista, na forma possibilitada pela PCV Interior de 1994. ANÁLISE DA MIGRAÇÃO PELA PCV 1994: POTENCIALIDADES E LIMITAÇÕES A Pesquisa de Condições de Vida é um survey domiciliar voltado à caracterização da situação socioeconômica das famílias a partir do levantamento de informações em cinco áreas temáticas: renda, inserção no mercado de trabalho, acesso a serviços de saúde, instrução e habitação. Esta pesquisa foi realizada, pela primeira vez, na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), em 1990. Em 1994, o levantamento contemplou, além da RMSP, os 37 municípios do estado que possuíam, em 1991, mais de 80 mil habitantes na zona urbana. Ainda que não se trate de uma pesquisa voltada à avaliação de tendências demográficas, o questionário levanta algumas informações de interesse para pesquisadores da área: idade, sexo, etnia, nupcialidade, estrutura familiar, parturição, mês e ano do último filho nascido vivo, natureza do parto e quesitos relacionados à migração. Sobre estes últimos, o questionário coletou dados, para todos os membros da família, sobre o estado de nascimento (quesito aberto), local de procedência migratória (categorizado em seis alternativas: o mesmo município, do município de São Paulo, de outros municípios da RMSP, de outros municípios do interior, de outros estados e de outros países), tempo de residência no estado, tempo de residência na RMSP (só para moradores desta região), tempo de residência no município atual, tempo de resi- QUADRO 1 Quesitos com Informação Intrinsecamente Demográfica da PCV 94 Variável Idade Sexo Etnia Posição na Família Situação Conjugal Parturição Mês/Ano do Último Filho Nascido Vivo Natureza do Parto Estado de Nascimento Tempo de Residência no Estado Tempo de Residência no Município Atual Tempo de Residência na RMSP Tempo de Residência no Domicílio Atual Município de Residência Anterior Município onde Trabalha Tipo de Quesito aberto categórico – 2 cat. categórico – 4 cat. categórico – 13 cat. categórico – 7 cat. aberto aberto categórico – 4 cat. aberto aberto aberto aberto aberto categórico – 6 cat. categórico – 2 cat. Fonte: Fundação Seade. 93 População-Alvo todos membros da família todos membros da família todos membros da família todos membros da família todos membros da família mulheres de 10 anos ou mais mulheres de 10 anos ou mais mulheres de 10 anos ou mais todos membros da família todos membros da família todos membros da família todos, só p/ PCV/RMSP todos membros da família todos membros da família Ocupados de 10 anos ou mais SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(2) 1996 1994; Cunha e Baeninger, 1994), não foi passível de ser captada pela PCV. Os limites metodológicos e interpretativos da PCV na compreensão da dinâmica migratória no estado não devem se constituir em obstáculo para sua utilização como fonte alternativa para a análise do fenômeno.3 Na realidade, ao estudioso da migração não resta outra opção senão trilhar por outros caminhos menos convencionais para entender aspectos da dinâmica migratória no estado, enquanto não se publicam resultados mais abrangentes. Vale observar que, para a RMSP, a PCV pode ser usada com maior potencialidade. Através desta pesquisa é possível estudar aspectos da migração para a região em dois momentos (1990 e 1994), além da migração intrametropolitana e da mobilidade pendular para o trabalho e escola dentro da RMSP. Além disso, pode-se ter uma indicação da parcela da emigração que se deslocou para o interior do estado. dência no domicílio atual e local de exercício do trabalho (categorizado em duas alternativas: mesmo município de residência ou outro diferente). Tais informações, ainda que muito úteis e insubstituíveis em sua atualidade, apresentam algumas limitações para a compreensão da dinâmica migratória regional passada. Estas limitações referem-se ao tipo de delineamento de pesquisa, à forma de coleta das informações e ao plano amostral implementado. Como toda pesquisa amostral de delineamento sincrônico, o migrante identificado em uma região é aquele residente no momento da realização da entrevista. Muitas pessoas podem ter passado pela região e se deslocado ou falecido antes do momento da pesquisa. Movimentos sazonais de mão-de-obra podem não ser captados dependendo dos meses em que se realizou a coleta de dados. As características demográficas e socioeconômicas do migrante referem-se ao momento da entrevista, não ao período em que ele migrou. A categorização adotada quanto ao local de última procedência não permite reestabelecer a origem microrregional dos fluxos captados, nem avaliar a proximidade dos mesmos em relação ao local de residência atual do migrante, algo que tem se tornado cada vez mais importante na análise da dinâmica migratória no país, e em particular no estado (Baeninger, 1994). Não é possível, assim, diferenciar fluxos inter-regionais daqueles de natureza intra-regional. Também não é possível identificar a origem rural/urbana do movimento, o que, em certa medida, não traz grandes conseqüências para a análise, já que os fluxos do tipo urbano-urbano tornaram-se predominantes já nos anos 70 (Bógus e Baeninger, 1995). A impossibilidade de reestabelecer a origem microrregional do fluxo no interior paulista não permite o estudo da parcela provavelmente mais numerosa e dinâmica da migração no estado, pois, se de fato houve o arrefecimento de fluxos migratórios de longa distância como aponta Martine (1994), é de se esperar que os migrantes com mobilidade intra-estadual tenham aumentado sua participação no contingente total de migrantes no estado. Já nos anos 70, a mobilidade intra-estadual respondia por 58% dos fluxos de migrantes residentes no estado (Jardim et alii, 1991). Em função dos objetivos gerais da pesquisa, privilegiou-se a coleta de dados nos municípios com perfil urbano-industrial e de médio/grande porte do interior paulista. Assim, se é possível captar a migração para cidades mais industrializadas, de maior dinamismo econômicoregional e com maior oferta de serviços públicos, o mesmo não se pode dizer com relação à migração para cidades pequenas e médias ou para aquelas com estrutura econômica mais voltada à produção agropecuária. Neste sentido, a intensa atividade imigratória para municípios de pequeno porte, estâncias hidrominerais e balneários do litoral, antecipada na bibliografia corrente (Martine, DEFINIÇÕES OPERACIONAIS A definição operacional do conceito de migrante não é uma decisão metodológica trivial. Está relacionada com a natureza espacial da unidade de análise (migração intramunicipal, intrametropolitana, inter-regional, internacional, etc.), com a temporalidade do processo migratório em estudo e com o contexto histórico associado ao mesmo. A adoção de uma unidade de análise mais abrangente ou cortes temporais mais elásticos levam, em geral, a resultados muito distintos e, possivelmente, divergentes com relação a outros trabalhos, como bem observam – em contextos distintos – Martine (1980) e Simmons (1987). A adoção de uma definição de migrante apresenta ainda algumas dificuldades adicionais quando a fonte dos dados é uma pesquisa amostral, como o caso em questão, pois, às considerações metodológicas da unidade espacial de análise e da temporalidade, deve-se juntar o pragmatismo operacional ditado pela possibilidade de desagregação da amostra. Por fim, deve-se ter em conta que a qualidade da declaração do tempo de residência é outro fator condicionador da definição operacional. De fato, a análise descritiva do tempo de residência das pessoas que declararam vir de outras localidades revelou a forte atratividade digital a que esta informação está sujeita na PCV. Identificou-se uma preferência sistemática por anos de residência finalizados em 0 e 5, como pode ser visto no Gráfico 1. O Índice de Myers relativo aos anos de residência de migrantes é de 29,3 contra 3,0 dos naturais. Depois de diversas tentativas de definição operacional, buscando compatibilizar os vários aspectos anteriormente mencionados, decidiu-se que: 94 DINÂMICA MIGRATÓRIA RECENTE NO INTERIOR PAULISTA hinterlândia dos municípios compreendidos. Como já se observou anteriormente, a migração captada pela PCV é aquela que se processa nos centros urbanos médios, de maior porte ou de maior dinamismo econômico regional. De fato, a taxa líquida de migração centrada em 1985, derivada das Estatísticas Vitais e Censo Demográfico de 1991, é de 100 migrantes por mil pessoas no conjunto das Acurs, valor substantivamente maior que a verificada para a totalidade do interior (22 por mil). - migrante é toda pessoa cujo município de residência anterior tenha sido diferente do atual há menos de 14 anos; - para atender às demandas específicas do trabalho e às perspectivas futuras de análise, a população migrante foi segmentada em três grupos: migrantes recentes (tempo de residência de 0 a 3 anos), migrantes com tempo de residência de 4 a 8 anos; e migrantes com tempo de residência de 9 a 13 anos. Vale lembrar que, entre os não-migrantes, estão incluídos os indivíduos que, mesmo não sendo originários do município atual, lá residem por 14 anos ou mais. Tendo em vista a necessidade de avaliar, tanto quanto possível, manifestações espacializadas do processo migratório no interior paulista, promoveu-se uma desagregação dos dados da PCV Interior em seis conjuntos de municípios, segundo critérios de homogeneidade do comportamento demográfico e econômico das Regiões Administrativas que os englobam. Assim, Americana, Bragança Paulista, Campinas, Indaiatuba, Jundiaí, Limeira, Mogi-Guaçu, Piracicaba, Rio Claro, Santa Bárbara d’Oeste e Sumaré compõem um único conjunto: a Agregação de Centros Urbanos da Região Leste (Acur Leste). A Acur Oeste congrega Araçatuba, Catanduva, Marília, Presidente Prudente e São José do Rio Preto. A Acur Norte reúne os municípios de Araraquara, Barretos, Franca, Ribeirão Preto e São Carlos. A Acur Central é composta por Bauru, Botucatu, Itapetininga, Itu, Jaú e Sorocaba; a Acur Litoral, por Cubatão, Guarujá, Praia Grande, Santos e São Vicente e, finalmente, a Acur Vale do Paraíba, por Guaratinguetá, Jacareí, Pindamonhangaba, São José dos Campos e Taubaté. Não se pode esperar, naturalmente, que a migração captada em cada agregado de centros urbanos regionais seja representativa do que se passa na totalidade da CARACTERÍSTICAS DO MIGRANTE RECENTE DO INTERIOR A população migrante representa cerca de 31% da população das cidades onde se realizou a pesquisa e dividese em proporções muito próximas entre as três classes de tempo de residência: migrantes com tempo de residência de 9 a 13 anos perfazem 9,2% da população pesquisada; aqueles com 4 a 8 anos de residência correspondem a 10,8% da amostra; e os recentes, com até 3 anos de residência, compreendem 11,1% da população. Dado o interesse prioritário nas tendências recentes da migração, toma-se como objeto de análise principal, nesta seção, o conjunto de migrantes com tempo de residência de 0 a 3 anos. Com o objetivo de eliminar o efeito composicional exercido pelos filhos de migrantes nascidos no município de residência atual sobre as características da população não-migrante, excluiu-se do conjunto em análise a população de 0 a 14 anos. A seletividade por idade é uma característica da migração recente no interior, tal como em outros movimentos populacionais no país de modo geral. Dentre estes migrantes recentes, cerca de 50% são jovens entre 15 a 29 anos . A classe modal dos migrantes recentes é a de 20 a 24 anos, com freqüência relativa de 18%. Tal distribuição etária apresenta-se bastante distinta em relação à da população natural (Tabela 1), em que os jovens entre 15 e 29 anos totalizam 34%. Nas principais faixas etárias da população ativa (de 20 a 44 anos), há um predomínio de homens entre os migrantes recentes, algo que não ocorre entre os naturais. No balanço geral, juntando-se todas as classes de idade, há um equilíbrio numérico entre homens e mulheres na população de migrantes recentes. Parecem pouco significativos os traços de seletividade migratória por etnia. A população classificada como branca compõe a grande maioria entre migrantes e naturais (mais de 77% nos dois casos). Negros e amarelos aparecem com uma participação relativa ligeiramente superior entre os migrantes recentes. A distribuição da população de 15 anos e mais por status conjugal revela uma proporção maior de solteiros e de pessoas em união consensual entre os migrantes recen- GRÁFICO 1 Distribuição da População, por Tempo de Residência Interior do Estado de São Paulo (1) – 1994 Em % Anos de residência no município atual Fonte: Fundação Seade. Pesquisa de Condições de Vida – PCV Interior 1994. (1) Corresponde às Acurs, que são conjuntos de municípios com perfil urbano-industrial e/ou de médio e grande portes do interior paulista. 95 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(2) 1996 TABELA 1 TABELA 2 Estrutura Etária e Razão de Sexo da População de 15 ou Mais, Naturais e Migrantes Recentes, segundo a Faixa Etária Interior do Estado de São Paulo(1) – 1994 Parturição Média das Mulheres Casadas ou em União, Naturais e Migrantes Recentes, segundo a Faixa Etária Interior do Estado de São Paulo (1) – 1994 Estrutura Etária Razão de Sexo Faixa Etária Natural Migrante Recente Faixa Etária Natural Total Migrante Natural Recente Migrante Recente 100,0 100,0 95 15 a 19 Anos 12,9 15,2 104 97 20 a 24 Anos 11,1 18,2 104 106 25 a 29 Anos 11,2 15,1 100 117 30 a 34 Anos 10,3 13,3 94 115 35 a 39 Anos 10,1 11,3 95 101 40 a 44 Anos 9,4 8,1 96 111 45 a 49 Anos 7,9 4,6 78 71 50 a 54 Anos 6,7 4,8 91 118 55 a 59 Anos 5,5 2,7 89 115 60 a 64 Anos 4,6 1,9 83 99 65 a 69 Anos 3,9 1,8 70 75 70 Anos ou Mais 6,3 2,9 76 70 15 a 24 Anos 25 a 34 Anos 35 a 44 Anos 45 a 50 Anos Média Média pd(2) 104 1,4 2,1 2,8 3,3 2,5 2,5 1,6 2,1 3,3 4,1 2,6 2,9 Fonte: Fundação Seade. Pesquisa de Condições de Vida – PCV Interior 1994. (1) Corresponde às Acurs, que são conjuntos de municípios com perfil urbano-industrial e/ou de médio e grande portes do interior paulista. (2) Baseada na estrutura etária de mulheres naturais. ração das projeções populacionais para o estado nos anos 80, os diferenciais de nível de fecundidade entre mulheres migrantes e não-migrantes são menores hoje do que já foram no passado. Esses resultados parecem dispensar a necessidade de projetar separadamente as populações migrante e natural. A análise da escolaridade média da população de 15 anos e mais revela que os migrantes recentes são, em média, mais instruídos que a população natural, mesmo controlando-se o efeito da estrutura etária mais jovem do primeiro grupo. Em todas as faixas etárias analisadas, a proporção de migrantes recentes com pelo menos o 2o grau completo é mais elevada que entre os naturais. A escolaridade padronizada de migrantes é de 7,1 anos contra 6,8 dos naturais. O estereótipo comumente associado aos migrantes como indivíduos de baixa qualificação é, pois, no mínimo simplista demais para caracterizar os migrantes encontrados no interior paulista. Migrantes ocupados com pelo menos o 2o grau completo auferem rendimento total cerca de 20% maior que os naturais ocupados com o mesmo nível de instrução (Tabela 3). Controlando-se o efeito composicional da estrutura etária mais velha dos naturais ocupados, verificase que as diferenças de rendimento entre os dois grupos de ocupados se amplificam: se as estruturas etárias fossem iguais, os migrantes receberiam 34% mais que os naturais. Considerando-se os indivíduos ocupados que completaram, na melhor das hipóteses, o 1o grau, a relação não se mantém, já que os naturais passam a apresentar rendimentos um pouco mais elevados que os migrantes recentes, a despeito da estrutura etária mais jovem destes últimos. A julgar por estes dados, a desigualdade na percepção de rendimentos para os migrantes é maior do que para os naturais. Em termos de situação ocupacional, a população migrante de 15 anos ou mais apresenta taxa de ocupação mais Fonte: Fundação Seade. Pesquisa de Condições de Vida – PCV Interior 1994. (1) Corresponde às Acurs, que são conjuntos de municípios com perfil urbano-industrial e/ou de médio e grande portes do interior paulista. tes: enquanto entre estes cerca de 36% são solteiros e 12% estão em união consensual, entre os naturais tais categorias perfazem 31% e 7%, respectivamente. Em contrapartida, viúvos e casados apresentam maior incidência entre os naturais. Observe-se que tais características devem-se, em grande parte, às diferenças entre as estruturas etárias das duas populações. Vale observar também que, agrupando-se os casados e as pessoas unidas consensualmente em uma única categoria conjugal, as diferenças entre migrantes e naturais deixam de ser expressivas: 55% dos migrantes são casados/unidos e 58% dos naturais estão nesta categoria. Esses fatos sugerem que, controlados os efeitos das diferenças nas estruturas etárias, o padrão conjugal entre as duas populações é muito semelhante e que, portanto, parcela significativa da migração recente é de natureza familiar. Mulheres migrantes há até 3 anos apresentam um nível de fecundidade um pouco maior que as naturais em todas as faixas etárias. A parturição média, padronizada segundo a estrutura etária das mulheres naturais, é de 2,9 filhos para as migrantes recentes e de 2,5 para as naturais, fato explicado pela fecundidade mais alta das mulheres migrantes provenientes de outros estados. Mulheres migrantes há mais de 3 anos apresentam parturição muito próxima às naturais. Comparativamente ao quadro analisado por Rodriguez Wong (1986), quando da elabo- 96 DINÂMICA MIGRATÓRIA RECENTE NO INTERIOR PAULISTA elevada e menor taxa de inatividade comparativamente à população natural. Controlando-se, no entanto, o efeito composicional da estrutura etária mais jovem dos migrantes recentes, as relações se invertem: se os migrantes tivessem a mesma estrutura etária que os naturais, eles apresentariam taxas de ocupação mais baixas (54,8% contra 56,8% dos naturais) e taxas de inatividade mais altas (38,2% contra 36,4%). O desemprego entre migrantes recentes é mais alto que entre os naturais em idade ativa de 15 anos ou mais, característica que se mantém – e até se acentua – se as diferenças entre as estruturas etárias das PIAs forem consideradas. Com relação ao setor de atividade, as diferenças nas participações relativas entre migrantes recentes e naturais são mais expressivas nos serviços domésticos/construção civil e serviços sociais (educação, saúde, utilidade pública, etc.). Cerca de 20% dos migrantes recentes ocupados trabalham no setor serviços domésticos/construção civil e 11,1% nos serviços sociais. Para os naturais, as participações relativas nestes setores são de 13,5% e 17,8%, respectivamente. Observe-se que na indústria de transformação, onde os requerimentos de qualificação profissional são maiores, as diferenças nas participações relativas de migrantes e naturais são inferiores a 2,5 pontos percentuais. TABELA 3 Nível de Instrução, Escolaridade e Renda Média Mensal Total da População de 15 Anos ou Mais, Naturais e Migrantes Recentes Interior do Estado de São Paulo(1) – 1994 Instrução, Escolaridade e Renda Natural Nível de Instrução (%) Com Até 1o Grau Completo Com 2o Grau Completo ou Mais Migrantes Recentes 75,0 25,0 69,7 30,3 Escolaridade (em anos) Média Média Padronizada (2) 6,8 6,8 7,5 7,1 Renda Média dos Ocupados (em reais) Total Com Até 1o Grau Completo Com 2o Grau Completo ou Mais Com Até 1o Grau Completo pd (3) Com 2o Grau Completo ou Mais pd (3) 439 298 740 298 740 460 252 897 273 990 Fonte: Fundação Seade. Pesquisa de Condições de Vida – PCV Interior 1994. (1) Corresponde às Acurs, que são conjuntos de municípios com perfil urbano-industrial e/ou de médio e grande portes do interior paulista. (2) Baseada na estrutura etária da população natural de 15 anos ou mais. (3) Baseada na estrutura etária da população natural ocupada de 15 anos ou mais. TABELA 4 DIFERENCIAIS REGIONAIS Distribuição dos Ocupados, segundo Setor de Atividade Econômica e Situação Ocupacional da População de 15 Anos ou Mais, Naturais e Migrantes Recentes Interior do Estado de São Paulo (1) – 1994 Em porcentagem Setor de Atividade e Situação Ocupacional Naturais Migrantes Recentes Total 100,0 100,0 56,8 23,1 57,8 20,8 13,5 17,0 18,0 9,0 17,8 1,6 20,0 16,9 17,9 11,1 11,1 2,2 6,8 8,8 36,4 33,4 100,0 56,8 6,8 36,4 100,0 54,8 9,4 38,2 Ocupados Indústria de Transformação Serviços Domésticos/ Construção Civil Comércio Serviços para Produção Serviços para Consumo Serviços Sociais Outras Atividades Desempregados Inativos Taxas Padronizadas (2) Ocupados pd Desempregados pd Inativos pd O conjunto de municípios situados a leste do estado reúne o maior contingente de migrantes recentes dentre todos. Cerca de um terço dos migrantes levantados residiam nestes municípios (Acur Leste) por ocasião da pesquisa. As Acurs Norte e Vale do Paraíba apresentaram os menores volumes de migrantes recentes. Considerandose o impacto do fluxo migratório sobre a população residente dos municípios receptores, as Acurs Litoral e Oeste foram as que apresentaram as maiores intensidades de migração recente, com taxas de 141 e 130 migrantes por mil habitantes.4 Embora não se disponha de informação sobre a proximidade ou não destes fluxos, a intensificação da migração na Acur Oeste deve decorrer da migração proveniente dos pequenos e médios municípios da própria região em direção aos principais centros urbanos pesquisados no Oeste. Nos municípios da Acur Central, o fenômeno migratório parece ter as mesmas características. A julgar pela distribuição de migrantes por coorte de chegada (ou, equivalentemente, por classe de tempo de residência), os municípios das Acurs Norte e Central parecem ter apresentado uma redução da intensidade migratória a partir de 1991 comparativamente ao período anterior. Estas duas Acurs foram as únicas que apresentaram proporções de migrantes recentes menores do que a de Fonte: Fundação Seade. Pesquisa de Condições de Vida – PCV Interior 1994. (1) Corresponde às Acurs, que são conjuntos de municípios com perfil urbano-industrial e/ou de médio e grande portes do interior paulista. (2) Média padronizada baseada na estrutura etária da população natural de 15 anos e mais. 97 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(2) 1996 Litoral, ao contrário, a participação dos migrantes de outros estados é um pouco maior que a média. Na Acur Norte, a participação de migrantes de outros estados/países é bem mais elevada (43%), em detrimento da participação daqueles provenientes da RMSP (9%). A maior parte dos migrantes recentes do interior não naturais do Estado de São Paulo provêm da região Norte/ Nordeste e dos estados limítrofes Minas Gerais e Paraná. Para a Acur Litoral, destaca-se a elevada proporção de migrantes recentes nascidos no Norte/Nordeste. Na Acur Norte e em menor medida nas Acurs Vale do Paraíba e Leste há uma participação significativa de migrantes nascidos em Minas Gerais. A mobilidade pendular para o trabalho parece ser significativa pelas Acurs. Cerca de 13% da população ocupada de 15 anos ou mais do interior trabalha em município diferente daquele onde reside. Para os migrantes recentes, este percentual sobe para 19%. Nas Acurs Leste e Oeste, 30% e 40%, respectivamente, dos migrantes ocupados deslocam-se para trabalhar em outro município, enquanto entre os naturais ocupados das mesmas localidades as proporções correspondentes são de 11% e 7%. Há diferenças significativas entre os perfis etários da população migrante recente pelo interior paulista, como ilustra o Gráfico 2. A faixa de maior concentração de migrantes, nas Acurs, é a de 20 a 29 anos, com exceção da Acur Vale do Paraíba, onde 40% da população migrante tem até 19 anos. Na Acur Litoral, os migrantes recentes apresentam-se mais dispersos entre as faixas etárias mais avançadas em relação às outras regiões, fazendo com que a idade média dos migrantes seja de 28,6 anos, 2,3 anos a mais que a médias das Acurs. A Acur Norte tem sua população migrante concentrada nas faixas etárias mais jovens e adultas, o que faz com que apresente a menor idade média entre os grupos analisados (24,3 anos). A maior carga de dependência (52%) é verificada na Acur Leste. Em termos da distribuição por sexo, com exceção da Acur Oeste, todas as outras apresentam maior proporção de homens entre os migrantes recentes na faixa de maior intensidade migratória (de 15 a 29 anos). Considerandose a totalidade das faixas etárias, o balanço migratório masculino prevalece mais intensamente apenas nas Acurs Vale do Paraíba e Norte. Em todas as Acurs, o tamanho médio das famílias de chefes migrantes recentes é de, no mínimo, 3,4 membros, atingindo o valor máximo de 4,0 pessoas na Acur Vale do Paraíba. Todos estes perfis demográficos dos migrantes recentes, embora distintos regionalmente, indicam a importância da migração familiar na composição dos fluxos regionais recentes. A população migrante recente também mostra diferenciais regionais significativos em termos de níveis de escolaridade e rendimento médio mensal dos ocupados, TABELA 5 Distribuição e Intensidade da Migração Recente, segundo a Acur de Residência Atual Interior do Estado de São Paulo (1) – 1994 Em porcentagem Distribuição Migrantes por Coorte de Chegada Migrantes Recentes Acur Leste Oeste Norte Central Litoral Vale do Paraíba Distribuição Taxa Migratória 0a3 Anos 4a8 Anos 9 a 13 Anos Total 33,0 14,0 11,0 14,0 16,0 10,7 13,0 8,8 11,2 14,1 36,9 43,9 36,9 38,0 39,5 35,1 32,1 39,2 38,2 34,0 28,0 24,0 23,9 23,8 26,5 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 12,0 9,9 38,0 33,9 28,1 100,0 Fonte: Fundação Seade. Pesquisa de Condições de Vida – PCV Interior 94. (1) Corresponde às Acurs, que são conjuntos de municípios com perfil urbano-industrial e/ou de médio e grande portes do interior paulista. migrantes com tempo de residência entre 4 e 8 anos. A elevada proporção (44%) de migrantes recentes na Acur Oeste em relação aos migrantes com 4 a 8 anos de residência (32%) é outro indício da intensificação da migração para os centros urbanos nesta região, algo que a análise dos saldos migratórios relativo à década passada já parecia indicar.5 Metade dos migrantes recentes nas Acurs provêm de cidades do próprio interior paulista, seguidos por aqueles provenientes de outros estados e/ou países (31% dos migrantes) e da RMSP (19%). Tal padrão é, no entanto, diferenciado pelas Acurs, especialmente em relação à participação de migrantes do interior e de outros estados/países. Nas Acurs Central e Oeste, a migração intraestadual tem peso maior que a média das Acurs. Na Acur TABELA 6 Composição dos Fluxos Imigratórios, por Origem, segundo a Acur de Residência Atual Interior do Estado de São Paulo(1) – 1994 Em porcentagem Origem Acur Leste Oeste Norte Central Litoral Vale do Paraíba Interior Municípios da RMSP Municípios do Interior 20,0 20,0 9,0 21,0 21,0 19,0 19,0 48,0 55,0 48,0 58,0 44,0 53,0 50,0 Outros Estados/Países 32,0 25,0 43,0 21,0 35,0 28,0 31,0 Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Fonte: Fundação Seade. Pesquisa de Condições de Vida – PCV Interior 94. (1) Corresponde às Acurs, que são conjuntos de municípios com perfil urbano-industrial e/ou de médio e grande portes do interior paulista. 98 DINÂMICA MIGRATÓRIA RECENTE NO INTERIOR PAULISTA GRÁFICO 2 riormente. Os migrantes ocupados residentes na Acur Norte possuem os maiores níveis de rendimento, seguidos daqueles das Acurs Oeste e Central. O rendimento médio mensal dos migrantes da Acur Litoral é o mais baixo dentre as demais. Eliminando-se o efeito composicional da estrutura etária, a maior taxa de desemprego entre os migrantes recentes foi a verificada na Acur Vale do Paraíba. A Acur Litoral tem os menores níveis de desemprego e os maiores índices de ocupação da população em idade ativa. A Acur Leste registra a menor taxa de ocupação da PIA, comparativamente às demais. Distribuição dos Migrantes Recentes, por Faixas Etárias, segundo as Acurs Acur/Interior do Estado de São Paulo (1) – 1994 Em % 35,0 25,0 30,0 Acur 20,0 Norte 15,0 CONSIDERAÇÕES FINAIS Vale do Paraíba 10,0 Central Oeste 5,0 0a9 Anos Com o objetivo de levantar subsídios para o estabelecimento de hipóteses de níveis e padrões migratórios a serem incorporadas nas projeções populacionais para o Estado de São Paulo, apresentou-se neste artigo um quadro descritivo da migração recente pelo interior do estado, de acordo com as informações coletadas pela PCV 1994. Um dos aspectos importantes levantados através dos dados da PCV diz respeito às características demográficas da população migrante. Jovens entre 15 e 29 anos, de ambos os sexos, provenientes de localidades do próprio estado compõem o contingente principal de migrantes recentes identificados nos municípios pesquisados. A migração “inter-interiorana” é predominante, mas também são expressivos os fluxos migratórios oriundos da Região Metropolitana e de outros estados. Há fortes indicações da predominância de migração de natureza familiar. A Leste 0,0 20 a 29 Anos Litoral 40 a 49 Anos 60 Anos ou Mais Fonte: Fundação Seade. Pesquisa de Condições de Vida – PCV Interior 94. (1) Corresponde às Acurs, que são conjuntos de municípios com perfil urbano-industrial e/ou de médio e grande portes do interior paulista. como revelam os indicadores padronizados.6 Retirandose o efeito composicional da estrutura etária, as Acurs Norte, Central e Oeste apresentam proporção de migrantes recentes com 2o grau completo ou mais muito superior à observada nas Acurs Leste, Litoral e Vale do Paraíba. Migrantes residentes na Acur Litoral apresentam, comparativamente às demais, a menor escolaridade média. O comportamento do rendimento médio mensal padronizado dos ocupados segue a mesma lógica descrita ante- TABELA 7 Caracterização Sintética dos Migrantes Recentes, segundo a Acur de Residência Atual Interior do Estado de São Paulo(1) – 1994 15 Anos e Mais Pd (2) Acur Interior Leste Oeste Norte Central Litoral Vale do Paraíba Razão de Sexo Razão População Dependência de 15 a 39 População População Total Anos Total Idade Média População Total Migrantes Recentes de 15 a 39 Anos (%) 26,3 26,2 26,2 24,3 25,8 28,6 53,0 51,0 54,0 59,0 57,0 49,0 45 52 39 38 39 43 101 99 91 112 104 99 26,0 55,0 47 113 Tamanho da Família População Total Migrantes com 2o Grau e Mais (%) Escolaridade Média Renda Média dos Ocupados (em reais) 107 104 92 113 116 105 3,4 3,6 3,4 3,6 3,6 3,5 30,0 26,0 35,0 37,0 36,0 25,0 7,5 7,0 7,8 7,9 8,0 6,9 460 440 497 511 484 385 8,8 9,6 9,1 6,7 7,9 6,5 57,8 55,9 57,1 57,7 56,1 66,3 120 4,0 26,0 8,0 438 12,8 58,1 Fonte: Fundação Seade. Pesquisa de Condições de Vida – PCV Interior 1994. (1) Corresponde às Acurs, que são conjuntos de municípios com perfil urbano-industrial e/ou de médio e grande portes do interior paulista. (2) Padronizações pela estrutura etária verificada no conjunto das Acurs. 99 Taxa de Desemprego (%) Taxa de Ocupação (%) SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(2) 1996 fecundidade de mulheres migrantes é mais elevada do que a das naturais, algo que não se mantém para mulheres de coortes de migração mais antigas. O estereótipo do migrante pobre, semi-alfabetizado e subempregado não corresponde ao daquele encontrado no interior paulista. Na realidade, a população migrante parece poder ser segmentada em pelo menos dois contingentes, de acordo com suas características socioeconômicas: há um grupo menos escolarizado, que aufere rendimentos mais baixos que a população natural e que, provavelmente, está empregado em ocupações no setor de serviços domésticos/construção civil; e outro segmento composto por indivíduos de escolaridade mais elevada, com rendimentos maiores do que a população natural e alocados em setores mais modernos da economia. Ao que parece, este segundo segmento é relativamente mais numeroso entre os migrantes do que entre os naturais. Há indicações de diferenças regionais significativas tanto na intensidade migratória quanto nos perfis demográficos e socioeconômicos dos migrantes recentes. Os municípios mais populosos do Litoral e do Oeste do estado parecem estar apresentando taxas de migração elevadas, comparativamente à sua população residente. Os fluxos dirigidos aos municípios do Norte e Centro do estado parecem estar se arrefecendo em relação ao que já foram há quatro anos. Campinas e outros municípios da região leste constituem-se, em termos de volume, no destino final do maior número de migrantes recentes identificados na pesquisa. Em todas as Acurs, em especial nas Litoral e Leste, a mobilidade pendular para o trabalho é expressiva. O migrante que se dirigiu aos centros urbanos mais populosos da região norte do estado é mais novo, com escolaridade mais elevada, maior rendimento, proveniente de outros municípios do próprio interior ou de outros estados e, com maior freqüência, do sexo masculino. Nas Acurs Leste e Vale do Paraíba, as famílias de migrantes são um pouco maiores e os indivíduos possuem escolaridade mais baixa, com rendimentos menores e sujeitos a taxas de desemprego e carga de dependência mais elevadas. Migrantes residentes nos centros urbanos do Litoral têm idade média mais elevada e maiores taxas de ocupação no mercado de trabalho. As Acurs Central e Oeste destacam-se por apresentar migrantes com níveis médios de instrução mais elevados, provenientes em larga medida de municípios do interior do estado – provavelmente da própria hinterlândia dos municípios pesquisados. A análise descritiva aqui apresentada tem utilidade intrinsecamente qualitativa no estabelecimento de hipóteses de migração para as regiões do estado, decorrente das limitações inerentes ao uso de uma fonte de dados não es- pecífica para análise da dinâmica migratória. São insuficientes para estabelecimento de níveis quantitativos de migração líquida por sexo e idade – uma das informações básicas na metodologia adotada para as projeções demográficas no estado. No entanto, tais apontamentos são úteis – e até o momento insubstituíveis7 – para o balizamento qualitativo das hipóteses alternativas quanto aos padrões e tendências da migração pelo estado, na presente década. NOTAS Agradeço as sugestões e comentários de colegas pesquisadores do Projeto “Migrações, Emprego e Projeções Populacionais”, do Nepo e da Fundação Seade para a elaboração deste artigo. À professora Neide Patarra agradeço também pela minha iniciação nos estudos de migração e incentivos pessoais e materiais à minha formação acadêmica. 1. Para tanto ver: Perillo (1992), Fundação Seade (1992), Baeninger (1994), Patarra e Baeninger (1994), Cunha e Baeninger (1994), Jannuzzi (1994), Bizelli (1995), Caiado (1995) e Bógus e Baeninger (1995) . 2. Conduzida pelo Nepo e Nesur/Unicamp, em 1993. 3. Em uma eventual reaplicação da pesquisa, talvez se pudesse modificar a forma de coleta de alguns quesitos, assim como acrescentar alguns novos, nos moldes recomendados pelas Nações Unidas (1972) e Carvalho e Machado (1994). 4. Taxas calculadas como a razão entre a proporção de migrantes recentes na Acur em relação ao total do interior e proporção de pessoas da Acur (também relativa ao total do interior). Conceitualmente são medidas similares às taxas líquidas de migração derivadas de saldos migratórios, fornecendo, pois, uma indicação da intensidade do fluxo migratório em direção aos municípios considerados. 5. Naturalmente, estas indicações supõem, de forma implícita, que as taxas de re-migração de migrantes é a mesma em todas as Acurs. 6. As padronizações das medidas apresentadas na Tabela 7 tomaram por base a distribuição etária do conjunto das Acurs do interior em cada variável avaliada. Vale ressaltar que taxas padronizadas são valores hipotéticos que só assumem significado em uma perspectiva comparativa. 7. Os resultados da PNAD 1993 tornaram-se disponíveis após a elaboração da análise aqui apresentada. Uma avaliação preliminar da incidência de não-naturais do estado residentes no interior paulista pela PNAD é muito próxima, em nível e padrão etário, ao levantado pela PCV. Na PCV, há uma incidência ligeiramente maior de não-naturais (2 pontos percentuais maior) nas faixas etárias de 15 a 59 anos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAENINGER, R. “Homogeneização de tendências populacionais em São Paulo”. IX Encontro de Estudos Populacionais. Anais... Caxambu, Abep, 1994, p.473-498. BIZELLI, E.A. “Considerações sobre a urbanização interiorana”. São Paulo em Perspectiva. São Paulo, Fundação Seade, v.9, n.3, 1995, p.38-45. BÓGUS, L.M. e BAENINGER, R. “Redesenhando o espaço no interior paulista: desconcentração e expansão urbana”. São Paulo em Perspectiva. 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