Salvador, Montevidéu e Buenos Aires (1808-1889) 1 Lina Aras (UFBA; Brasil) 2 Cleide de Lima Chaves (UFBA; Brasil) A presente comunicação objetiva discutir as relações sociais, econômicas e políticas estabelecidas entre Salvador, Montevidéu e Buenos Aires no período de 1808 a 1889. O estudo 3 dessas relações vem revelando, ao longo da pesquisa histórica , a dinâmica, estabelecida logo nos primeiras séculos de ocupação européia pela nações ibéricas na América. O porto e as cidades portuárias foram se constituindo ao longo de suas histórias em centro comerciais por excelência diante da atividade comercial ser predominante. Na América, esta função não se modificou ao longo da formação dos Estados nacionais, fazendo com que chegassem ao início do século XIX, com suas funções consolidadas. A circulação das embarcações, sejam elas brigues, sumacas, barcas, escunas e, posteriormente, das embarcações a vapor, fizeram circular e movimentar, de continente a continente, produtos e serviços diversos, que faziam com que as relações entre as sociedades se tornassem mais próximas e estabelecessem linhas comerciais que contribuíam para o dinamismo comercial do século XIX. Os portos, as suas respectivas cidades e as regiões em seu entorno, trazem em comum períodos de conflitos bélicos permanentes, atividades comerciais e políticas intensas, envolvendo populações de uma e outra área, isto porque não se pode negar a grande presença de estrangeiros representantes ou mesmo proprietários de casas comerciais em um ou outro porto, ampliando as fronteiras comerciais e articulando políticas externas que viriam a apoiar tais atividades comerciais. Registre-se o fato de que, apesar de vivenciar experiências políticas diversas – de um lado a monarquia brasileira, de outro as repúblicas platinas – esse fato não ficou alheio às polêmicas enfrentadas pelos grupos econômicos envolvidas neste circuito – Salvador – Montevidéu e Buenos Aires, tendo que enfrentar, como veremos adiante, questões de ordem política, social e, até mesmo, de mentalidades. Quando relaxou, nos meados do século, os tendões que à Europa o ligavam, pode o governo brasileiro desempenhar um papel ativo no continente: por um lado, buscou implementar um estratégia platina, não ao estilo de uma política hegemônica – embora não se furtasse a demonstrações imperialistas – mas de obstáculos ao surgimento de hegemonia; por outro, desencadeou ativa política de estreitamento com as nações do continente, mediante convênios de 4 amizade, limites, comércio e navegação. 1 Professora do Mestrado e do Departamento de História da Universidade Federal da Bahia. Mestranda em História no Mestrado em História da Universidade Federal da Bahia. 3 Este texto faz parte das discussões implementadas nos dois projetos de pesquisa que vem sendo desenvolvidos sobre as relações comerciais entre a Bahia e o Prata. O primeiro, coordenado pela Profª Lina Maria Brandão de Aras – Duas regiões: A Bahia e o Prata (1750/1889) e, o segundo, pela mestranda Cleide de Lima Chaves, onde desenvolve Projeto de Pesquisa “A Bahia e as nações do Prata. Comércio Internacional e política externa (1850/1889)”, sob a orientação da primeira. 4 CERVO, Amado Luiz e BUENO, Clodoaldo. A política externa brasileira (1822-1889). São Paulo: Ática, 1986. . P. 39. 2 O porto de Salvador era considerado um dos mais importantes centros econômicos do Brasil colônia, principalmente a partir de 1549, com a fundação da cidade e a instalação do Governo Geral na Bahia, tornando ao longo do tempo o porto imprescindível para Portugal e para a montagem da colônia. Sua importância vai perdurar durante todo o século XVII e o século XIX, até o início do século XX. Para Salvador, a Baía de Todos os Santos é o maior acidente geográfico brasileiro deste gênero e sua base de sustentação enquanto cidade portuária. Esta baía representa o papel de pequeno mar interior, com navegação bastante ativa em função da boa localização do porto, seguro, largo e profundo que tem por núcleo a cidade de Salvador, que fica à sua entrada. A função do porto baiano como ponto de escala e entreposto comercial, se estendeu por todo o século XIX. Mesmo a abertura dos canais de Panamá e Suez e o advento da navegação a vapor, que encurtaram as distâncias e agilizaram as viagens, não minimizaram a sua importância. Muitos navios vindo de outros continentes para os portos do Prata ou do sul do Brasil, aqui atracaram para reparo e abastecimento, confirmando a importância do porto de Salvador na circulação comercial.5 A Abertura dos Portos em 1808, ocorrida após a chegada da Família Real ao Brasil, significou um importante momento de dinamização da circulação de embarcações com pessoas e mercadorias no porto de Salvador, pois com a transferência da Corte e da nobreza, acompanhadas da estrutura burocrática portuguesa, ampliou-se o mercado consumidor interno e, consequentemente, externo. Uma das conseqüências disso foi o aparecimento de outras praças comerciais nas pautas de importação/exportação da Bahia e do Brasil. Neste porto entravam os escravos provenientes do tráfico, as manufaturas da Europa e da América do Norte, a carne salgada do Sul e do Prata. Daí saía a produção do açúcar, do tabaco e da farinha do Recôncavo6, dos diamantes da Chapada, e mais tarde café e cacau, dentre outros produtos. Já no século XIX as péssimas condições do porto de Salvador provocava revoltas militares na Bahia, envolvendo a Marinha, reivindicando melhores condições de salubridade para os portos. Na primeira metade do século XIX esses motins foram freqüentes, reivindicando melhores soldos, condições de higiene e da alimentação nas embarcações, 5 ROSADO, Rita de Cássia Santana de Carvalho. O porto de Salvador: modernização e projeto. 1854/1891. Salvador: UFBA, 1983. P. 23. 6 MATTOSO, Katia M. de Queirós. Bahia: a cidade do Salvador e seu mercado no século XIX. Salvador, HUCITEC, 1978. gerando inclusive tentativas de modernização do porto, o que só vai ocorrer de fato no início do nosso século. Um documento interessante aponta para essa necessidade de um regulamento para o porto, tomando como modelo, inclusive, um dos portos do Prata. O autor Antônio Pedro de Carvalho, intendente da Marinha, propõe em 1835 um regulamento para o Porto da Bahia: parte extraído do regulamento do Porto de Toulon, parte do de Montevideo e parte propriamente minhas, accomodadas ao peculiar deste Porto7 Segundo Katia Mattoso, a participação do porto da Bahia na navegação de longo curso brasileira durante o século XIX foi de 20% em média, daí a necessidade de reformas em seu principal porto. A falta de boas vias de comunicação terrestre entre Salvador e o resto da província privilegiava a população estabelecida nas proximidades da capital e no litoral. Salvador, tão mal ligada a seu próprio território, tinha, em contrapartida, excelente comunicação por via marítima, com todo o litoral do país e com o exterior. Novamente, Katia Mattoso explicita: Caravelas, galeotas, fragatas, brigues e bergantins; naus, navios urcas, sumacas e até avisos – estes navios minúsculos de grande velocidade que num constante vai e vem traziam as ordens da Metrópole e levavam-lhe as respostas – cingiam os mares em todas as direções: de Portugal para a África, para o Brasil, para o Rio da Prata, para as Índias distantes. Do Brasil para o Rio da Prata, para as 8 Índias, para a África, para Portugal, finalmente . A Bacia do Prata oferecia outros parceiros aos comerciantes instalados na praça de Salvador diante das facilidades de navegação apresentada. A Bacia do Rio da Prata é formado por esse rio e pelos rios Paraná, Paraguai e Uruguai, oriundos do planalto brasileiro, todos navegáveis. Apresenta-se como um imponente estuário com capacidades portuárias em ambas as margens9. Constituiu-se numa das áreas geográficas da América Latina onde foram travadas o maior número de guerras entre os estados nacionais pela posse de territórios. Seus portos mais importantes - Montevidéu e Buenos Aires - tiveram o papel fundamental de promover a integração comercial da região com o mundo. Buenos Aires, após Rosas, apesar dos navegantes descrevê-lo como um dos piores portos do Prata10, foi o centro político da nação (até hoje) e conseguiu o predomínio da região, com um desenvolvimento acelerado, promovido pelos governos dessa segunda metade do século passado. 7 APEB, Maço 3236 - 24/03/1835 – Intendência da Marinha Idem, ibidem, p. 62. 9 OYARZÁBAL, Guillermo Andrés. La navegación en el Rio de la Plata: una aproximación a las características náuticas y portuarias rioplatenses en la segunda mitad del siglo XVIII. Bahía Blanca: Cadernos del Sur, 1996. 10 Idem, Ibidem. 28 COSTA, op. cit. 8 O porto de Buenos Aires, permaneceu fechado ao comércio legal durante quase todo o período colonial, principalmente por imposição do Vice-Reino do Peru, que sempre considerou o 11 comércio de Buenos Aires danoso aos interesses dos mercadores limenhos , visto que a bacia hidrográfica do Prata representava o circuito e meio de circulação de mercadorias contrabandeadas. Buenos Aires estava submetido político-administrativamente ao Peru, região de grande concentração de prata, que queria impedir qualquer avanço econômico desta região a título de preservação de seus próprios privilégios. Essa política restritiva do Peru até 1776 favorecia o contrabando na região do Prata, atividade alternativa para burlar o monopólio comercial espanhol, tendo se tornado local privilegiado dessa prática. Impedidos de uma participação legal no comércio, os portenhos viam-se atraídos para o exercício de práticas comerciais ilícitas, tais como a introdução ilegal de escravos pelo rio da Prata, 12 lãs, etc. Com as Reformas Bourbônicas e com a criação, em 1776, do Vice - Reino do Prata e logo em seguida, numa busca de um novo método de exploração do tráfico ultramarino, com o Regulamento do “Comércio Livre” das Índias, em 1778, o comércio da região platense foi diretamente beneficiado, abrindo-se para a presença estrangeira. Depois, com a sua independência política da Espanha a partir de 1816, a formação dos Estados nacionais e os primeiros passos para sua organização constitucional, as repúblicas do Prata na segunda metade do século XIX integram-se no sistema de livre comércio internacional. Entretanto, 13 a segunda metade do século XIX foi um período conturbado na região platina. Montevidéu, mesmo possuindo melhores condições de navegação, pois é banhado pelo Rio da Prata e pelo Oceano Atlântico, após a sua independência do Brasil na Guerra Cisplatina, transformou-se num “Estado tampão”14 entre a República da Argentina e o Império brasileiro, não conseguindo portanto destacar-se tanto quanto o porto de Buenos Aires. Após 1852, quando Juan Rosas, governador/ditador da província de Buenos Aires, é derrotado, instaura-se um período de equilíbrio nas duas regiões. É nesse momento que o porto de Montevidéu passou a se constituir em zona livre de comércio, independente das amarras portenhas. Montevideo empezaba a ser visto como el término natural de los viajes, cosa que no ocurria antes. (...) En Montevideo hay possibilidad de trasladar la mercadería a almacenes donde medienate el pago de una pequeña tasa pueden estar por tiempo indeterminado, hasta su reembarco. (...) El movimiento de buques de ultramar a partir de 1834 era mayor que en 11 GARCIA, Emanuel S. da Veiga. O comércio ultramarino espanhol no Prata. São Paulo: Perspectiva,1982. TEJERINA, Marcela V. El comercio hispano-lusitano a fines del siglo XVIII: una propuesta alternativa para analizar la presencia portuguesa en el Río de la Plata. Bahía Blanca: Cuadernos del Sur, no. 26, 1996. 13 POMER, Leon. Os conflitos na bacia do Prata. São Paulo: Brasiliense, 1979. 14 JUMAR, Fernando. Los portugueses, la Colonia del Sacramento y el Río del Plata, 1680-1777. Montevidéu: no prelo, 1995. 12 Buenos Aires. Las provincias del Litoral legislan en favor de la salida por Montevideo, considerándola una província más.15 Durante da Guerra da Cisplatina pelo porto de Salvador foram embarcados mantimentos pedidos pelas tropas sitiadas na Banda Oriental, buscando atender sem demora as tropas envolvidas naquele episódio. Cumprindo com as ordens de V.Exª pedi ao Tenente João Franscisco de Oliveira Botas para intimar aos Comandantes das Embarcações de transporte de tropa portuguesa aqui arribadas de Montevideo a nenhuma demora, que deverão Ter-se este porto, logo que recebão os mantimentos pedido, e em consequencia disto saiu hoje o Brigue Americano” Os estaleiros de Salvador e mesma da Bahia eram famosos por todo a América. A arte de construir embarcações levou ao seu controle por parte da Intendência da Marinha, que em 01 de setembro de 1827 atendeu a pedido de verificação de condições de navegabilidade de uma “escuna pertencente a Aleixo Lotelius e Guilherme Menage” que deveria ser utilizada para circular no porto de 16 Salvador ou mesmo navegar para Rio da Prata. O intenso comércio entre os portos manteve-se apesar das questões políticas. O Diário da Bahia, que constatemente noticiava a saída de embarcações com tripulantes e mercadorias para o Prata, registrou em 02 de maio de 1833 a entrada do brigue argentino Esperança, que seguia para Buenos Ayres, comandado pelo Capitão John Guarder, com capacidade de 133 toneladas, com carga de 116 caixas com assuçar, 133 barricas com rapaduras e 5 fardos com aniagem para ser entregue ao comerciante portenho John Gillner. Em meados do século passado surgiriam interesses novos, nascidos após o período de consolidação das independências em relação às metrópoles ibéricas dos anos 1820, como as inúmeras questões de fronteira, a abertura do comércio exterior e migrações, das disputas pelo predomínio econômico desenvolvidas especialmente pelos portenhos, a exemplo do projeto de reconstruir o Vice - Reino do Prata sob o governo de Buenos Aires, momentos esses que marcaram a região platina. Esses interesses tomam concretude a partir de 1851 e 1856, quando dos acordos comerciais e de amizade travados entre as repúblicas do Uruguai e da Argentina e o Brasil. As guerras por disputa de fronteiras entre Brasil, Uruguai e Argentina, e pelo direito de navegar nas águas da bacia do Prata, em 1850, começaram no momento em que o governador de Buenos Aires, Juan Rosas, impôs o bloqueio dos rios da bacia platina ao comércio e à navegação de outros países17. O Uruguai serviu, então, de palco de lutas, visto que a sua localização é estratégica, banhado pelo Oceano Atlântico e pelo Rio da Prata. As tropas brasileiras acabaram vencendo a Guerra contra Rosas e a Argentina abriu novamente a bacia para a navegação internacional. Com o final da Guerra, a partir de 1853 delineou-se o período de conformação definitiva das repúblicas da Argentina e Uruguai, inclusive com criação de uma nova Constituição na Argentina, 15 MILLOT, Julio e BERTINO, Magdalena. Historia Economica del Uruguay. Montevideu: Fundacion de Cultura Universitária, 1991. Tomo I, P. 154. 16 APEB, Maço 3230. Intendência da Marinha. sinalizando ainda, segundo a tese de Moniz Bandeira, o “expansionismo brasileiro”. Assim, estava contido o expansionismo territorial argentino, fazendo com que o porto de Montevidéu e a própria nação oriental ampliasse suas relações com os vizinhos do Brasil e, de certa forma, criasse condição para o estreitamente das relações econômicas entre as duas nações. no curso da década de 1850, o Império do Brasil impôs aos países daquela região um sistema de alianças e de acordos, que visavam não ao equilíbrio de forças, mas à consolidação de sua hegemonia, em substituição à de França e Grã18 Bretanha . Na Bahia da segunda metade do século XIX, a partir dos anos 60, o comércio sofreu uma das piores crises, especialmente o setor açucareiro. Esta crise estava ligada à concorrência com o açúcar das Antilhas, pela descoberta na Europa do açúcar extraído da beterraba e pela escassez da mão-de-obra escrava pela interrupção do tráfico negreiro, diminuindo o preço do produto e arruinando muitos donos de engenhos baianos.19 A partir de 1850, cresce na pauta dos produtos exportados pela Bahia o fumo. “A cultura do fumo sempre possibilitou uma renda elevada ao Estado, mesmo quando o açúcar era o principal artigo de exportação e também quando cedeu seu primeiro lugar para o cacau”20. E mesmo com a crise açucareira nessa segunda metade, o açúcar ainda contribuía com mais da metade das exportações baianas. Recapitulação da Importação Despachada para consumo n’alfândega da Bahia nos annos financeiros seguintes: Em réis. PROCEDÊNCIA Gram Bretanha 1850 à 1851 7,412:869$0 5 Portugal 806:978$212 1851 à 1852 8,620:320$4 7 1,086:074$8 4 Hespanha Hollanda 70:202$047 - Estados Unidos 1852 à 1853 8,810:684$6 1 1,077:591$1 3 25:140$468 1853 à 1854 7,543:256$39 4 984:036$407 1857 à 1858 11,800:356$42 1 1,449:734$009 21:840$736 71,608$303 1858 à 1859 11,721,951$6 07 1,317,818$83 7 88,501$736 32:062$500 22:245$864 - 80,070$644 30,152$176 19:803$114 369:505$253 438:576$727 289:234$824 614,653$197 995,206$763 351:437$674 341:023$159 303:684$766 572,650$679 853,759$808 196:518$057 - 206:674$105 - 153:633$488 - 308,589$235 12$000 321,869$825 - 543:570$370 Estados do Rio da Prata África Negrícia De Valparaíso 293:711$727 - Outros fatores, como as epidemias da febre amarela (1854-55) e do cólera morbus (1857-58), contribuíram com a crise econômica vivida na Bahia21, que deverão ser analisados 17 REICHEL, Heloisa J., GUTFREIND, Ieda. Fronteiras e guerras no Prata. São Paulo: Atual, 1995. BANDEIRA, Moniz. O expansionismo brasileiro e a formação do estados na Bacia do Prata: da colonização à guerra da tríplice aliança. São Paulo: Editora Ensaio, 1995, pp. 157-158. 19 TOURINHO, Maria A. de C. O Imperial Instituto Bahiano de Agricultura: a instrução agrícola na Bahia na segunda metade do século XIX. Salvador: Dissertação de Mestrado, 1982. PANG, Eul – Soo. O Engenho Central do Bom Jardim na economia baiana ( 1875-1891). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1979.MATTOSO, Katia M. de Queirós. Bahia, século XIX: uma província no Império. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1992. 20 BORBA, Silza Fraga Costa. Industrialização e exportação de fumo na Bahia 1870-1930. Salvador: Dissertação de Mestrado - UFBA, 1975. 21 REIS, Onildo David. O inimigo invisível: epidemia do cólera na Bahia em 1855-56. Salvador: Dissertação de Mestrado, UFBA, 1994. 18 no contexto das relações entre as duas regiões22. Trabalhos sobre a epidemia na Bahia23 apontam para a importância do evento e suas consequências desastrosas, porém sem fazer ligação da epidemia nas regiões do Prata. Recuando no tempo, a historiadora Roseli Santaella24 aponta interseções de outras epidemias que chegaram a atingir as duas áreas. Além do cólera, a presença de pestes de sarampo e varíola já havia assolado na região de Potosí, no século XVI, que levara à morte grande número de nativos, causando uma desestabilização da mão – de - obra. A preocupação com este tipo de acontecimento – as epidemias – afetava diretamente pois segundo informava o presidente da Audiência de Charcas, os braços negros serviam para remediar a falta de braços nas minas, dizia ser conveniente a utilização de negros do Brasil. Apontava como principal vantagem o fato de serem mais fortes que os naturais. Além disso, a pouca distância por mar entre o Brasil e Buenos Aires facilitaria a viagem. A epidemia do cólera morbus ocorreu na Bahia, no período que vai de 1855 a 1856, trazido à Bahia pelo navio “Imperatriz” do Pará e que, por sua vez foi, trazido pela galera portuguesa “O Defensor” da cidade do Porto, onde causou centenas de mortes. Os estudos chegaram a apontar para uma pandemia, já que o cólera tinha devastado quase todos os continentes. O porto era, então, a porta de entrada de muitas mercadorias, mas também de graves enfermidades, através de marinheiros de vários navios nacionais e estrangeiros, sem falar nas péssimas condições de salubridade do porto e das embarcações. As enfermidades eram uma das causas de maior preocupação da gente do mar. Essas epidemias adentravam a cidade através do seu porto. Mesmo com a crise econômica vivida pela Bahia na segunda metade do século XIX, advinda da crescente extinção da mão-de-obra escrava e da crise açucareira com a substituição e expansão da lavoura cafeeira no Rio e em São Paulo, segundo Rita Rosado, Cidade intermediária entre os interesses dos grupos capitalistas externos e da comunidade produtora e mercantil local, Salvador, através do seu porto, conservou significativa importância regional. Fosse para prestar socorros, comercializar ou contrabandear, a importância geográfica e estratégica do porto fez de Salvador cidade-comercial e ofereceu oportunidades lucrativas a comerciantes estrangeiros e brasileiros 25 A cidade da Bahia estava continuamente exposta às moléstias pelo constante movimento do seu porto. Ao mesmo tempo que não possuía infra-estrutura para receber os marinheiros que desembarcavam contaminados por todo tipo de doença. No Rio da Prata, por exemplo, a incidência do escorbuto, doença provocada pela carência de vitamina C no organismo, principalmente nos finais do século XVIII, levou a morte vários 22 Inspetoria de Saúde do Porto de Salvador. DAVID, Onildo Reis. O Inimigo invisível: epidemia do cólera na Bahia em 1855-56.Dissertação de Mestrado em História da UFBA, 1994. 24 STELLA, Roseli Santaella. Entre a situação legal e a de fato: o comércio de Buenos Aires com o Brasil no século XVI. Cuadernos del Sur, Universidade Nacional del Sur, Bahia Blanca, Argentina, n°26, 1996. 23 marinheiros. Somente mais tarde, com o descobrimento da relação da enfermidade com a falta de vegetais e frutas frescas é que conseguiu-se um certo controle da mesma, melhorando a qualidade dos alimentos levados para a tripulação. Outro problema grave, que não tinha relação direta com a qualidade das embarcações, mas com seus tripulantes, foi a sífilis, doença venérea causada principalmente pela promiscuidade do marinheiros, enfermidade também incontrolável na época. Por isso mesmo a epidemia de cólera morbus no Rio da Prata, atingindo principalmente 26 os portos de Buenos Aires e Montevidéu, trazida para a região com o fim da Guerra do Paraguai em 1870, vai assombrar a Bahia e a própria região platina fazendo com que fossem criados vários mecanismos para evitar a propagação da mesma. Nesse período, exatamente porque o Rio da Prata torna-se local de manobras militares da guerra, da entrada e saída de armamentos, mantimentos, soldados e os cadáveres dos milhares de mortos na guerra, que eram jogados nos rios que desembocavam na bacia do Prata, acabou ficando suscetível a todo tipo de moléstia em seus portos. O cólera morbus na Bahia se torna endêmico a partir de 1858, manifestando-se sobretudo em marinheiros entre 1869 até 1879. Alastrou-se por todo o Recôncavo e até uma parte do Agreste baiano, atingindo as populações de Cachoeira, Santo Amaro, Feira de Santana e Jeremoabo. Em 1874, aparecia através de um comunicado da Inspetoria de Saúde do Porto de Salvador a primeira notícia na Bahia do cólera morbus em Buenos Aires: Tenho a honra de levar ao conhecimento de V. Excia que pus de observação o vapor inglês Mensselin proveniente de Buenos Aires, porto infeccionado da cólera morbus e por trazer a este vapor a carta suja. Outrossin dirijo-me a V. Excia. para que se digne de dar às suas ordens ao Chefe da Estação para que não consinta a entrada das embarcações provenientes daquele porto para ancoradouro sem que 27 sejam previamente visitados por esta Inspeção. Esse aviso vem, portanto, num momento em que o governo da província se esforçava em combater e não permitir que a epidemia fizesse vítimas e prejudicasse ainda mais a sua economia. A febre amarela que chegou na Bahia de 1849-1854, trazida pelo brigue Brasil, proveniente de Nova Orleans e que a documentação do Consulado Argentino na Bahia continuava sinalizando, até mesmo no ano de 1885. Abaixo, a correspondência do Cônsul Pereira Marinho: ...essa Província entendeu dever por em prática no intuito muitíssimo louvável de opor um obstáculo à propagação da febre amarela que infelismente apareceu nesta capital e tem dizimado mais ou menos a sua população, ...... com o máximo desejo de concorrer quanto me seja possível para o desaparecimento do mal que aflige os habitantes desta cidade, tendo tomado nota de tudo quanto V. Excia há por como fazer chegar ao meu conhecimento e recomendar-me com relação a tão momentoso assunto28 Percebe-se com o depoimento preocupado do Conde Pereira Marinho, um dos homens mais ricos da província, traficante de escravos, inclusive depois de 1850 e que tinha casa comercial no Rio Grande e no Rio da Prata, que a epidemia não fazia seleção de classe social ou de cor. Todos, sem exceção, estavam suscetíveis a ela e por isso mesmo era preciso combatê-la visto que a 25 ROSADO, Rita de C. Santana de Carvalho. O porto de Salvador modernização em projeto: 1854/1891. Salvador, Dissertação de Mestrado, 1983. 26 LUNA, Felix. Breve historia de los argentinos. Buenos Ayres, Editorial Planeta, 1993. 27 APEB, Maço 5318 – 03/02/1874 – Inspetoria de Saúde do Porto elite não poderia detê-la apenas com o seu poder econômico, mas com medidas de saúde efetivas e urgentes na capital. As notícias do cólera no Prata chegam à Bahia com um certo atraso. Como a via de comunicação mais rápida era a marítima, as informações para chegarem de um porto a outro 29 dependiam da oferta de embarcações que pudessem circular e aportar. Segundo Stuart Schwartz a duração de uma viagem de Salvador para Buenos Aires durava 21 dias, sem contar que muitas vezes ocorriam paradas nos portos do Rio de Janeiro e Rio Grande. Pode-se então estimar uma viagem de 30 a 40 dias no máximo. Após 1874, somente em 1886 uma outra notícia denuncia o cólera no Prata. Contudo daí por diante parece que a Província decide tomar providências para impedir a entrada de navios vindos 30 daquela região , prova inclusive de sua recente experiência com a epidemia, sejam suspeitos os navios saídos depois do dia 1° do porto de Buenos Aires, e que só possam aqui ser recebidos depois de fazerem quarentena de rigor na Ilha Grande e bem afim os demais portos da República Argentina e Oriental. O comércio exterior da Bahia foi muito afetado pela epidemia do cólera. A Bahia era abastecida de carne salgada do Rio Grande do Sul e do Prata, tanto no período epidêmico na Bahia, quanto no Prata vai ser interrompido esse comércio, causando problemas de abastecimento no porto de Salvador. A entrada e saída de navios no porto de Salvador no período das epidemias reduz bastante, afetando o fornecimento de produtos (carne, farinha, outros) na cidade e desencadeando uma revolta no início de 1858 denominada depois como o motim da “carne sem osso e farinha sem caroço” em que os revoltosos se queixavam contra o alto preço e a má qualidade das mercadorias. Essa revolta pode ser relacionada à própria crise de abastecimento, cujos produtos estão vinculados ao comércio da Bahia com o Prata, visto que, com as dificuldades instaladas nesse comércio a crise, certamente, foi agravada. Os estudos classificam essa retração como consequência do pavor e do número de mortes na população, diminuindo assim a produção e comercialização de produtos. Na Bahia, isso afetou tanto a chegada da carne de charque produzida no Prata, quanto também a circulação de pessoas das duas nacionalidades, já que o porto de Salvador era considerado parada obrigatória dos navios que se destinavam para o Sul e das embarcações que saíam de lá. Em 1880, com a chegada do cólera no Prata, a Bahia já tomava sua providências. Observa-se na documentação que segue abaixo como ficou abalada as relações comerciais da Bahia com a região platense: ...fica proibida a importação nos portos nacionais de diversos generos de procedencia argentina ou oriental; e bem assim que até Segunda ordem, fiquem fechados os portos nacionais, exceto o da ilha Grande, a todos os navios 28 APEB, Maço 1167 - 11/06/1885 - Consulado Argentino na Bahia SCHWARTZ, Stuart B. Segredos Internos: engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550-1835. São Paulo: Companhia das Letras, 1988, p.161. 30 APEB, Maço 5318 – 06/11/1886 – Inspetoria de Saúde do Porto 29 procedentes da República da Argentina e de quaisquer portos infeccionados pelo 31 cólera morbus. Até mesmo os vigias da Baía de Todos os Santos já estavam avisados de uma possível aproximação de navios platenses, o que estava expressamente proibido pelo Ministro do Império. Atesta ainda esse documento as imediatas medidas tomadas contra a epidemia, que os baianos já conheciam de outros tempos, quando foi anteriormente atingido pela doença e que não queria ver a província sendo novamente vítima de tão funesta moléstia. As epidemias vieram posteriormente acompanhadas de reformas urbanas realizadas em várias cidades ocidentais na segunda metade do século XIX e nas primeiras décadas do século XX. A ideologia que permeava essas mudanças era a de “civilizar os costumes”, ou no nosso caso “desafricanizar os costumes”, retirar da barbárie especialmente os povos colonizados, onde a presença negra e mestiça era predominante. No caso do Brasil, as reformas só chegariam no início do nosso século, findada a escravidão e o sistema monárquico. Para a Argentina, essas modificações vieram bem mais cedo, inspiradas diretamente nas reformas parisienses, quando a República seria 32 tomada de exemplo de civilização já mesmo no final do século XIX . Essa ideologia estava presente na Gazeta Médica da Bahia. Em 1871, um extenso relatório da Inspetoria de Saúde Pública da Bahia divulgava dados estatísticos da mortandade em Salvador, causada principalmente por “febres e beri-beri”. Ao comparar essas estatísticas com outras capitais do mundo, a exemplo de Paris e Londres, destaca “a de Montevidéo e Buenos-Ayres, 33 cidades reputadas geralmente como eminentemente salubres” . Conclui o relatório reclamando do abandono vivido pela saúde pública na cidade e que só em tempos de epidemia a capital recebia uma atenção maior nas questões de higiene e salubridade. Para a Bahia, os entraves ao tráfico internacional de escravos na África, a partir de 1850, fizeram surgir outras possibilidades de investimentos no seu comércio internacional. O tráfico ilegal de escravos iria perdurar até 1853, com a forte perseguição da frota inglesa aos navios brasileiros na costa d’África, impondo ao Brasil o acordo estabelecido em 1850. Desde a vinda da Coroa portuguesa para o Brasil, a Inglaterra procura garantir na América os mercados necessários para a sua indústria, visto que estava limitada no mercado europeu. A evidência disso foram os acordos diplomáticos e comerciais, que praticamente estabeleciam um monopólio na ex-colônia portuguesa34. A extinção do tráfico intercontinental, portanto, é decorrente das relações estabelecidas entre o Império brasileiro e os interesses políticos e comerciais ingleses e garantir, para esses últimos, uma hegemonia nas Américas. Os problemas enfrentados pelo Brasil na contenção ao tráfico, aguçou formas alternativas de entrada de escravos africanos no Brasil. O porto de Montevidéu, que já possuía 31 APEB, Maço 5318 – 26/11/1886 – Inspetoria de Saúde do Porto Ver a obra “Facundo: civilização e barbárie” do argentino Domingos Sarmiento, um dos primeiros trabalhos abordando o assunto na América Latina. 33 Gazeta Médica da Bahia, nº 102, 31/10/1871. 32 um importante comércio de escravos antes da independência e da abolição da escravidão naquela região, permaneceu como um porto de passagem de levas de escravos que foram introduzidos no Brasil após a proibição do tráfico. Um caso clássico da historiografia do tráfico é o comércio de africanos transportados pelo navio Rio de La Plata, de bandeira uruguaia, capturado em novembro de 1834, transportando 523 escravos procedentes de Angola.35 Pierre Veger analisando a presença africana em Montevidéu questionou a existência de uma “colônia de africanos livres” naquela cidade, considerando que tal fato nada mais era que uma forma de “importar escravos para passá-los em seguida fraudulentamente ao Brasil. Os africanos são ostensivamente importados na “Banda Oriental” com contratos de trabalhadores livres e permissão do governo de Montevidéu.”36 Ainda em 1856, quando da proibição e intensificação da perseguição ao tráfico de escravos pelos ingleses, em documento confidencial do Ministério da Marinha ao presidente de província da Bahia, demonstra as relações com a república uruguaia e a conivência e proteção dada pela mesma aos escravistas, sejam grandes proprietários ou comerciantes baianos: O facto de se admittirem escravos a matricula nos navios nacionais para portos estrangeiros tem dado logar à questões desagradáveis, quando os ditos escravos desertão e procurão prevalecer-se do favor da legislação dos paizes que não reconhecem a escravidão, e convindo evitar semelhante questão, sempre diffíceis e odiosas, e mesmo o prejuíso dos proprietários de escravos julgo acertado recomendar a Vossa Excelência para que o force a Capitania do Porto dessa província que nos despachos das embarcações para taes portos, a excepção do Estado Oriental, com quem temos tratado, que nos garante a entrega dos desertores e escravos, não admitta a sua matricula marinheiros que não sejam livres, fazendo comprehender aos donos dos escravos o risco, que correm de os perder, e que quando por meios brandos, não consiga convencê-los se negue a conseção da matrícula.37 O comerciante português Joaquim Pereira Marinho estabelecido na praça de Salvador, como traficante ilegal de escravos mantinha intenso comércio de carne seca com o sul, utilizando esta mercadoria na implementação das transações comerciais com a costa 34 MATTOS, Ilmar Rohloff de. O Tempo Saquarema: a formação do Estado Imperial. São Paulo, Hucitec, 1990. 35 BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil. A Grã – Bretanha, o Brasil e a questão do tráfico de escravos. 1807-1869. São Paulo: EDUSP, 1976. P. 139. 36 VERGER, Pierre. Fluxo e refluxo do tráfico de escravos entre o Golfo de Benin e a Baía de Todos os Santos – do século XVII ao XIX. São Paulo: Corrupio, 1968. p. 370. 37 APEB. Avisos recebidos do Ministério da Marinha, 31/01/1856. africana. Desde 1850 até 1875, encontramos embarcações da sua propriedade dirigindo-se para o os portos do Sul, mais freqüentemente o Rio Grande do Sul e Montevidéu38. Com o fim do tráfico e as proibições e perseguições advindas da legislação, manteve seu comércio nestes portos, afastando-se paulatinamente do tráfico e dedicando-se ao comércio das carnes e de outros produtos que circulavam neste circuito, tornando-se um dos grandes monopolistas da carne de charque na Bahia. A demanda de consumo das carnes produzidas no sul, especialmente no Rio Grande não conseguia abastecer satisfatoriamente as praças atendidas pelo comércio de Pereira Marinho, fazendo com que ele se instalasse em Montevidéu e passasse a empenhar-se em manter acesso esse fluxo comercial. Dentre as atividades de Pereira Marinho no Prata encontra-se uma atividade diplomática, tendo o mesmo sido Vice - Consul da Argentina na Bahia no período de 1851 a 1865, mesmo que sua atividade comercial estivesse mais concentrada em Montevidéu, se benficiou dela, fazendo constantes viagens ao Rio da Prata.39 A intensa participação do Brasil no comércio oriental advém desde o fim da Guerra Cisplatina em 1828, que transformou o Uruguai em nação independente politicamente mas permanecendo dependente dos portos e comerciantes brasileiros. Outros portos na Bacia do Prata, a exemplo dos localizados nos rios Paraná e Uruguai, realizavam intensas transações comerciais pois aí se localizavam grande número de saladeiros (como se chamavam os produtores platinos de charque) mantendo um ativo intercâmbio comercial com o Brasil. Além de por esses rios transitar o charque argentino, produtos brasileiros como o açúcar, o tabaco, o arroz e a farinha também por eles seguiam em sentido oposto. Certamente ocorreram interrupções nas relações entre a Bahia e o Prata, especialmente durante os períodos de guerra e de epidemias, constituindo-se em momentos de exceção na história das duas regiões. A historiografia tradicional estabeleceu uma separação entre a América portuguesa e espanhola e esse novo processo de rompimento da dicotomia teórico - metodológica nas abordagens referentes à América como um todo contribuíram para um redescobrimento entre as regiões do continente americano. É o que a historiografia mais recente vai chamar de uma história de longa duração, ou a chamada permanência histórica. Prova disso será o MERCOSUL, que na atualidade se 38 APEB, Portaria de embarcação – Polícia do Porto. APEB. Vice – Consulado da Argentina na Bahia, 1842 – 1889. 40 ARAS, Lina Maria Brandão de. A Bahia, A Argentina e o MERCOSUL 39 firma como um acordo econômico primeiramente entre o Brasil e a Argentina, perpetuando relações já estabelecidas desde o período colonial. Dentro desse contexto, a Bahia e a Argentina no século XX vão se interrelacionar em seus processos de industrialização. E a Argentina “é o primeiro país a estabelecer relações comerciais com a Bahia dentro dos parâmetros do MERCOSUL. E nas exportações do Nordeste para o MERCOSUL registra-se a liderança do Estado baiano”40.