CONTRIBUIÇÕES DA TEOLOGIA DA ESPERANÇA PARA A FORMAÇÃO
DOCENTE
ALVORI AHLERT
Doutor em Teologia, Área Religião e Educação, pela EST, RS, Mestre em Educação nas
Ciências, pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
(UNIJUI), Professor Adjunto da Universidade Estadual do Oeste do Paraná –
UNIOESTE campus de Marechal Cândido Rondon, membro do Grupo de Extensão e
Pesquisa em Educação Física Escolar (GEPEFE) e do Grupo de Pesquisa “Cultura,
Fronteira e Desenvolvimento Regional”. [email protected] .
Resumo: Este texto é resultado de uma pesquisa bibliográfica que estuda a esperança
como contribuição no processo de formação docente a partir da Teologia da Esperança
de Jürgen Moltmann. Entende-se que a esperança se constitui como eixo temático capaz
de conduzir e sustentar a ressignificação e a revitalização da reflexão no seio da
formação docente. Os resultados da investigação afirmam a esperança como um eixo de
reflexão capaz de contribuir na formação de professores críticos, reflexivos e
autônomos, capazes de olhar para além dos limites objetivos do ensinar e realimentar a
dimensão subjetiva, possibilitando a superação da resignação, desilusão, cansaço e
desgaste que a tarefa de ensinar e aprender tem sofrido diariamente.
Palavras-chave: Teologia da esperança, crise docente, formação de professores.
Introdução
É explícita e indiscutível a existência de uma crise na profissão docente. Ela se
evidencia mais e mais pela baixa auto-estima destes profissionais, pela sua baixa
eficácia, pela tímida intervenção social dos docentes, pelo número crescente de doenças
entre professores, pela desilusão e renúncia dos professores em verem na sua profissão
um instrumento de transformação social, pela diminuição na busca por essa profissão
entre as novas gerações, pela degradação da imagem social do professor, sem falar da
baixa valorização econômica dessa profissão. Este quadro de crise da profissão docente
se constitui num dos fenômenos que mais desafia a formação de professores na
atualidade. E a(s) resposta(s) aos desafios não serão proposições isoladas de uma ou
duas áreas do conhecimento. Sem dúvida alguma passam por uma nova racionalidade,
por concepções ideológicas claras, por planejamentos políticos e técnicos, por teorias de
ensino e aprendizagem, por uma sinergia entre a Ciência da Educação e as outras áreas
do conhecimento. Mas, também passa pelas questões subjetivas, dentre as quais umas
das questões fundamentais são a esperança. A esperança é subjetiva. Está dentro de cada
sujeito como forma necessária de sobrevivência em menor grau, e como impulso para
avanços e busca de objetivos transformadores da realidade em maior grau. Pois a
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esperança tem estreita relação com ausência e carência. Ela tem referências com a falta
de algo para o sujeito ou sujeitos e, por isso, produz a convicção de solucionar esta
carência, acionando todas as possibilidades de luta e construção de alternativas e a
criatividade para a construção de novos modelos para uma ação emancipatória. Além
disso, a esperança se transforma em redes de energia capazes de mobilizar outras
pessoas para uma sinergia em favor da superação da crise.
Portanto, o presente estudo focaliza a principal obra de um dos principais
pensadores da teologia européia do século XX. Trata-se da Teologia da Esperança, de
Jürgen Moltmann. Objetivamos fazer uma leitura teológica da esperança, aproximandoa com as ciências d a educação com vistas a entender a esperança como contribuição
fundamental para a formação docente em face dos desafios da educação no século XXI.
Metodologia
Esta pesquisa tem como objetivo investigar, através de uma pesquisa
exploratória e bibliográfica que, segundo Gil (1999, p.65), “é desenvolvida a partir de
material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos”, a
contribuição da esperança para a formação do professor, de modo a que esta capacite
para enfrentar a complexidade que a sociedade atual exige das funções docentes no
contexto atual da educação.
Confluências da teologia com a educação e sua importância na universidade
enquanto lugar da formação docente
No Ocidente o termo Teologia nasce da conjução das palavras Deus, na língua
grega θεóς, theos = deus, e da palavra grega λóγος, logos, = palavra, por extensão λόγια,
λέγειν, logia, légein = verbo, palavra, discurso, estudo, conhecimento. A teologia se
constitui como ciência a partir do século XII (GUTIERREZ, 1983, p17). Do ponto de
vista cristão, a teolgia é a reflexão que os cristãos fazem sobre a presença de deus na
história da humanidade, ou o falar acerca ou a partir de Deus. Numa perspectiva mais
atual, pode-se falar em reflexão crítica acerca das relações que os seres humanos
estabelecem, ou falam e pensam sobre deus ou deuses, deusa ou deusas. Portanto, uma
ciência que tem como objeto a divindade, o sagrado, as relações dos seres humanos com
a divindade, com o sagrado, o valor do ser humano, o valor da vida e da história
humana. Esta reflexão teológica representa importante contribuição na universidade na
atualidade. Os reflexos da Modernidade ainda cegam a realidade acadêmica e as
ciências duras (naturais) e tecnológicas continuam tendo a hegemonia de recursos e
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ainda são as preferidas de quem busca um lugar na academia. O acoplamento e a
subserviência das ciências duras, tecnológicas e biotecnológicas, ao mundo sistêmico,
do poder e do dinheiro, têm favorecido estas ciências na academia. No entanto, a
humanidade, apesar de todo o desenvolvimento científico e tecnológico continua
vivendo o horror das guerras, de genocídios, do terror, da violência urbana, da fome, da
miséria, da solidão, da doença, das catástrofes e daquelas provocadas pela ação egoísta e
inconseqüente do ser humano.
Por isso, mais do que nunca, faz-se necessário uma reafirmação das ciências
humanas na academia e, por extensão, da formação docente. E entre as ciências
humanas a reflexão teológica pode ser uma contribuição importante, principalmente a
da crítica ideológica e, dentro dela, o impulso para o diálogo interdisciplinar. Em
parceria com outras disciplinas, como a filosofia, a antropologia, a sociologia, a teologia
pode contribuir para que a universidade mantenha e sustente sua função histórica que é
a busca da verdade. A função da crítica ideológica da teologia pode enriquecer o
diálogo atualizado sobre a interdisciplinaridade, pois a teologia é a forma mais radical
de diferenciar entre o eterno e o efêmero, entre deus/es e o ser humano. Neste sentido,
ela pode lançar posições alternativas frente à hegemonia absoluta e positivista das
ciências duras na universidade e, por extensão, na formação de professores, para que se
garanta a reflexão da diversidade construtivista de um conhecimento que possibilita
uma formação integral do ser humano. O imenso desenvolvimento tecnológico exige
das ciências humanas, especialmente da formação docente, uma reflexão ética que traga
um equilíbrio entre o técnico e o humano mediante a orientação sobre os valores
necessários para uma vida com integridade e sustentabilidade. É neste contexto que a
teologia pode contribuir na construção de uma ética,de um conjunto de valores
necessários para uma boa formação docente.
Além disso, é urgente desterritorializar os saberes. Conforme Maria Teresa
Pozzoli, “Existe um novo conceito de fronteira, que na sociedade da aprendizagem não
é a que separa os elementos antagônicos, é um tecido, poroso e transparente, através do
qual, num processo de osmose, os que temos chamado “contrários” se mesclam e
encontram seu lugar para o diálogo: a ordem e a desordem, o vazio e a forma, o que se
pensa e o que se sente.” (2007, p.179)1
1
Existe un nuevo concepto de frontera, que en la sociedad del aprendizaje no es la que separa los
elementos antagónicos, es un tejido, poroso y transparente, a través del cual, en un proceso osmótico, los
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Assumir este modo de pensar significa adotar um trabalho de desenvolvimento
humano que tem conseqüências éticas e estéticas. Neste sentido, a interdisciplinaridade
entre a teologia e a pedagogia pode facilitar a articulação do pensamento complexo
neste tecido poroso e transparente, no qual se mesclam os contrários e se estabelece um
diálogo entre a ordem e a desordem, entre o vazio e a forma, entre o que se pensa e o
que se sente. A confluência entre a teologia e a pedagogia é histórica. São parceiras de
longa data. Basta lembrar aqui que o autor da Diática Magna, Johann Amos Comenius
era teólogo e pedagogo e escreveu sua grande obra na confluência das duas áreas do
conhecimento. “‘Comenius foi teólogo e pedagogo em uma única pessoa.’ (Henkys,
1993, p.77) Seus escritos traziam a marca do diálogo ininterrupto entre teologia e
pedagogia.” (AHLERT, 2006, p.53)
Assim, a teologia, compreendida como uma educação “[...] construída sobre
uma visão de ser humano e de sociedade na relação explícita com a fé cristã na
perspectiva do Reino de Deus” (STRECK, 1994, p.14), em confluência com a ciência
da educação oportunizam uma reflexão interdisciplinar carregada de ressignificações
para a educação, o que, por sua vez, pode resgatar o sentido do ser humano, dos sonhos
da humanidade, das utopias sociais necessárias para uma transformação eficaz das
estruturas que desumanizam e diminuem o ser ser humano. O diálogo sustentando na
esperança como eixo referencial possibilita refazer a reflexão, superar as contradições,
evidenciar novas perguntas e acrescentar novas dimensões à formação docente com o
intuito de superar sua crise.
A Teologia da Esperança de Jürgen Moltmann
Jürgen Moltmann é um dos principais teólogos do século XX, ainda vivo e
reflexivo neste início de século XXI. Ele nasceu em 1926, em Hamburgo, na Alemanha.
Foi prisioneiro num campo de concentração na Inglaterra. Estudou teologia, tornando-se
pastor da Igreja Luterana. Em 1967 tornou-se professor de teologia sistemática na
Universidade de Tübingen. Como professor de teologia e pesquisador tornou-se o
criador da “Teologia da Esperança”. Nesta obra publicada em 1964, e que o tornou
conhecido como um dos grandes teólogos do século XX, desenvolve as idéias da
realização do Reino de Deus como promessa fundamental da Sagrada Escritura cristã.
Nela afirma a importância da escatologia na doutrina bíblica do Novo Testamento; a
que hemos llamado “contrarios” se mezclan y encuentran su lugar para el diálogo: el orden y el desorden,
el vacío y la forma, lo que se piensa y lo que se siente. (A tradução livre é nossa).
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escatologia, não como crença em fatos concretos remetidos para os finais dos tempos,
mas como um impulsionador para a teologia que sustente a ação cristã no mundo.
Enquanto para os gregos a esperança sai da “Caixa de Pandora” ou, segundo
Aristóteles, o “sonho de quem está acordado”, para a filosofia cristã a esperança é a fala
escatológica do futuro com Jesus Cristo. Ela trabalha a realidade da ressurreição de
Jesus Cristo e anuncia o futuro do ressuscitado. Produz-se, assim, uma fé apoiada na
esperança. Segundo Moltmann, “[...] por meio da fé, o homem entra no caminho da
verdadeira vida, mas somente a esperança o conserva neste caminho”. (MOLTMANN,
1971, p. 8) Essa fé nada tem a ver com fuga do mundo, com resignação ou desistência
de lutar em favor da vida. A fé apoiada na esperança leva o ser humano a se envolver, a
se implicar com a realidade. Pela fé a esperança luta por uma realidade corporal e
terrena, pois crê na revivificação (ressurreição) corporal. Daí que, aquele que possui
esta esperança não mais se satisfaz com as leis e as necessidades desta terra. Não se
acomoda diante da inevitabilidade da morte, nem aceita que os males que geram outros
males sejam vistos como naturais e imutáveis. É uma esperança que não traz quietude,
mas inquietude; não traz paciência, mas impaciência; não acalma o coração, mas é o
próprio coração inquieto no ser humano. “Quem espera em Cristo não pode mais
contentar-se com a realidade dada, mas sofre por causa dela e começa a contradizê-la”.
(MOLTMANN, 1971, p. 8)
A esperança toma a sério as impossibilidades que querem se apresentar em tudo
o que é real. Ela permite ver o movimento, a latência, as múltiplas e inacabadas
transformações da s coisas. “Ela não toma as coisas como na sua estática ou inércia,
mas como caminham, se movem e são mutáveis em suas possibilidades.”
(MOLTMANN, 1971, p.13) É a esperança e o pensamento não são uma utopia no
sentido de um “sem lugar”, mas orientam para aquilo que “ainda não tem lugar” e que
pode vir a tê-lo.
Aqui a teologia centrada na esperança se constitui de uma atualidade ímpar.
Vive-se hoje incessantemente o presente. Os seres humanos estão cada vez mais presos
no presente. Um presente congelado, sem compromissos, sem responsabilidades, sem
deveres, sem possibilidades outras. Dá para dizer que a pedagogia, assim como as
demais ciências humanas vivem num presenteísmo, frustrando-se a projeção de um
futuro.
Milton Santos aponta para isso no contexto da educação, mais especificamente na
realidade do ser professor. Ele nos lembra que vivemos cada vez mais sob a tirania do
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dinheiro e da informação em rede que tem gerado pobreza, exclusão, miséria. A técnica
tem conduzido para o que se opõe à vida matematizando a existência e desenvolvendo
um pensamento meramente calculante. Diante disso, ele desafia a retomarmos a busca
pela liberdade e pela verdade, o que é o destino do educador. Quanto mais o trabalho do
professor for livre, mais estará educando para a cidadania. Quanto mais seu trabalho for
acorrentado, mais estará produzindo individualidades débeis. (SANTOS, 1998)
Daí a necessidade de se resgatar a utopia, a esperança, acreditando que um outro
mundo é possível. Os professores precisam assumir seu lugar de intelectuais na
sociedade, e para isso pesquisar e trabalhar. Esse trabalho de intelectuais e educadores
deve ser fundado no futuro. Intelectuais olham para o futuro. Não buscam o aplauso,
mas unicamente a verdade. Por isso são “inadministráveis”. Professores como
intelectuais são fermento de uma verdadeira e intensa atividade de pesquisa – ensino –
pesquisa. Jamais renunciam à crítica, pois renunciar à crítica significaria permitir o
assassinato interno da democracia. Significa, num esforço de interpretar, desvendar a
realidade. Significa ajudar e oferecer à comunidade educativa a enfrentar as situações da
realidade. (SANTOS, 1998) Daí que, como intelectuais, os professores precisam tornarnos indivíduos sem serem individualistas. O indivíduo forte busca aperfeiçoar-se
diariamente. Isso significa tornar-se consciente do mundo, do seu lugar,da sua
comunidade, da sociedade, de si mesmo. Indivíduos fortes não recusam opiniões
opostas, mas constroem outras e novas opiniões a partir do embate de idéias, pois a
crítica acelera a produção do pensamento e isso se torna produção coletiva do
pensamento.
A formação docente está dentro do modelo do pensamento presenteista, o que
tem provocado grandes frustrações, pois o resultado do processo educativo é de longo
prazo, ou seja, não é instantâneo, em tempo real como é a marca da atualidade. Segundo
Moltmann (1971, p.17), a objeção contra o futuro, contra aquilo que ainda não existe, é
um prolongamento histórico do deus de Parmênides, para quem “o mundo nunca foi,
nunca será, pois agora ele existe como um todo.” A filosofia, com Kierkegaard, tentou
lutar contra o aparente engano da esperança cristã, afirmando a presença sempiterna de
Deus, capturado no presente contínuo. A mesma acusação Moltmann faz contra
Ferdinand Ebner para quem “a vida eterna é simplesmente a vida do absoluto presente,
e concretamente é a vida do homem na consciência da presença de Deus.” (apud
MOLTMANN, 1971, p.19)
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Por isso a necessidade de se furar o tempo e mover a história, impulsionado pela
esperança. A esperança absorve e sustenta as dores do cotidiano e ainda permite à
pessoa esperar pelo inesperado. A esperança empurra para o movimento. Viver na fé e
na esperança descortina uma vida que se faz história e, assim, possibilita amar para além
do existente, do igual, do preso no presente. Ela
[...] torna possível um amor que é mais do que philia, amor ao existente e
ao igual, mas ágape, amor para com o não-existente, amor para com o
desigual, com o indigno, sem valor, perdido, transitório e morto; um amor
que é capaz de tomar sobre si o que há de aniquilador na dor e no
alienamento de si, porque tira a sua força da esperança na cratio ex
nihilo.” (MOLTMANN, 1971, p.210)
Essa esperança significa a bem-aventurança para os excluídos. Ela se constitui
em eixo de sustento e condução para cansados, sobrecarregados, marginalizados,
atormentados, famintos, desiludidos, depressivos, apontando para uma parusia fora
deste presente acabado e pronto. E essa espera restaura a vida certificando que o
presente não é um presente contínuo, mas um aberto dialético.
Em 2004 o próprio Moltmann fez um balanço dos quarenta anos de sua Teologia
da Esperança. Para ele a Teologia da Esperança foi ressiginficada nos movimentos
teológicos contextualizados, que buscaram evidenciar o sofrimento humano, tanto no
“terceiro mundo”, como em países ditos desenvolvidos. Na América Latina surgiu a
Teologia da Libertação, iniciada com Gustavo Gutierrez em 1971. Nos EUA, no
contexto do Movimento de Justiça Civil, tomou forma a Teologia Negra com Jim Cone.
Assim também na Coréia com Ahn,Byun-Mu nasceu a Minjung-Theologie, na Índia a
Dalith-Theologie, no Japão a Barakumim-Theologie. Todas elas movimentaram seu
contexto comunitário e social. “Elas produziram teologia e a trouxeram para a terra.
Elas tornaram a verdade concreta: a verdade é sempre concreta quando ela é aquela
verdade que liberta”. (MOLTMANN, 2004, p.65) Neste balanço, Moltmann ainda
chama atenção para uma grave situação que se implantou nas últimas décadas e que
solapa a esperança, a libertação. Segundo ele os cursos universitários se tornaram
meramente cursos profissionalizantes, tornando-se agências para o desenvolvimento de
competências. Assim, desaparece do estudo a curiosidade, o interesse pelo objeto, o
prazer o conhecimento, a investigação científica, a reflexão e a autonomia do
pensamento crítico. Tudo se resume hoje ao desenvolvimento de competências técnicas.
Desafios para a formação docente
A formação docente para os desafios que a atualidade coloca aos professores
precisa desconstruir as velhas estruturas de formação e identificar os constrangimentos
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para construir novas esperanças. Os professores necessitam, cada vez mais,
desenvolverem
capacidade crítica,
autonomia de pensamento,
conhecimentos
atualizados, discernimento entre o que é supérfluo (lixo) na formação, e o que é
emancipador para as novas gerações.
A profissionalidade que as novas condições sociais exigem é a
capacidade de assumir uma perspectiva crítica que, trabalhando com
conhecimentos atualizados, permita enfrentar com sabedoria os
problemas complexos, tomar decisões oportunas e adequadas e
implementar soluções socialmente negociadas que possam transformar
positivamente as realidades de cada contexto.” (SÁ-CHAVES, 2002, p.
53)
Isso exige uma formação docente capaz de romper com o paradigma fechado e
acabado do positivismo tecnicista, para assumir uma nova racionalidade epistemológica
que coloque na ordem do dia uma perspectiva interpretativista, carregada de um
relativismo subjetivo e que caracterize o pensamento complexo atual. Na atualidade, a
formação docente precisa correr os riscos da fé, ou seja, assumir o salto para o escuro;
salto que permite romper com o presenteísmo. É preciso contrapor ao paradigma
positivista, assentado nos mitos da racionalidade, objetividade e verdades universais,
perspectivas mais relativizantes e coerentes com a capacidade reflexiva e argumentativa
do ser humano.
Segundo Sá-Chaves (2002, p.53), significa assumir um forte caráter
emancipatório construído na Teoria Crítica da Escola de Frankfurt, que busca a
transformação da autoconsciência dos indivíduos de modo a constituí-los para serem
capazes de determinar coletivamente o tipo de vida que desejam e o tipo de ações que
precisam realizar, para tornar concretizar as condições sociais que possibilitam viver
estas escolhas. Isso requer uma mudança conceitual na formação docente que
desenvolva a capacidade de pensar, de tomar decisões, de elaboração de projetos de
ação conseqüentes, solidários e inovadores, de reformular e avaliar projetos e de
reincorporara as tradições subjetivas das tradições sapienciais da humanidade. A
fragilidade docente no contexto atual está no processo limitado de sua formação, que
historicamente tem estado centrado na escolarização que privilegia a aquisição e o
desenvolvimento de técnicas de ensino.
No nosso entender, isso obriga introduzir na atual formação docente o resgate
das utopias, pois as utopias foram castradas historicamente pelo controle político,
social, econômico, ideológico e profissionalizante dos modelos formativos dos
docentes. Urge um paradigma eficaz capaz de fazer a interligação entre a teoria e a
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prática. Precisa-se de uma formação docente sustentada numa nova racionalidade, que
tenha como um dos pilares a reflexão genérica que provoque o acordar da consciência
do professor. (Cf. SÁ-CHAVES, 2002, p.78) E isso significa recuperar a utopia como
condição de possibilidade, para acionar a função produtora do possível, levando para o
desenvolvimento de um pensamento que afirma o futuro como uma alternativa, como a
diferença do presente dado e acabado, da emancipação, da flexibilidade e da
reconstrução e construção cultural.
Conclusões
Acreditamos que a abordagem da esperança, enquanto tema central na reflexão
teológica de Moltmann, pode oxigenar os temas pedagógicos que tratam do papel e da
formação do educador, das metodologias, dos modos de aquisição de conhecimentos e
da avaliação destes processos formativos, pois seus princípios constitutivos estão
imersos dialeticamente nas realidades humanas e sociais, tendo como pano de fundo a
pesquisa, o estudo e a ação, o papel do docente e educando como sujeitos e a vida como
um sistema dinâmico que requer o entendimento do cotidiano, dos sonhos, dos mitos e
das crenças. A esperança precisa ocupar o pensamento para levar o ser humano para a
ação. Por isso a formação docente deve levar para dentro de sua subjetividade o tema da
esperança, pois, como afirma Moltmann, “Se é a esperança que conserva a fé em vida, a
sustenta e a impele para frente; se é a esperança que introduz o crente na vida de amor,
também deve ser a esperança que mobiliza e impulsiona o pensamento da fé, o
conhecimento e a reflexão sobre o ser do homem, da história e da sociedade.” (1971,
p.23)
Desta forma, a esperança se torna um eixo sobre o qual se estabelece a
interlocução dos saberes educacionais, bem como inquietude e tormento reflexivo. Com
isso a esperança abre horizontes de futuro, um futuro amplo e aberto. A esperança,
segundo Moltmann, “[...] é chamada e capacitada para a transformação criadora da
realidade, pois possui uma perspectiva que se refere a toda a realidade”. (1971, p.25)
Dessa forma o autor desafia para uma fé num futuro aberto. Uma esperança da fé que
não se acomoda nas coisas do presente que,
[...] provoca e produz perenemente ideais antecipatórios de amor em
favor do homem e da terra, modelando ao mesmo tempo as novas
possibilidades emergentes à luz do futuro prometido, e procurando, na
medida do possível, criar o melhor mundo possível, porque o que está
prometido é possibilidade total. Ela, por conseguinte, sempre desperta a
“paixão do possível”, os dons inventivos, a elasticidade nas
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transformações, a irrupção da novidade depois do velho, o engajamento
no novo. (MOLTMANN, 1971, p.25)
No nosso entender, essa esperança nascida da fé, que na concepção de
Moltmann trata da fé cristã, também pode ser relacionada com a fé antropológica, pois,
“[...] a fé é uma dimensão antropológica inerente a todo o ser humano, seja cristão,
budista, ateu marxista, ateu secularizado, etc. Porque a fé é uma estrutura de valores
significativos para existência humana, que mostra a cada um o que deve fazer e como
deve estruturar a sua vida, além de ser um princípio cognoscitivo que permite distinguir
o que é importante para cada um.” (AHLERT, 2007, p. 327) Desta forma a esperança
pode constituir-se num eixo reflexivo para ressignificar a formação docente e lançar
novos lampejos na escuridão na qual se encontra a profissão docente em nossos dias. É
preciso olhar para além dos limites objetivos do ensinar e realimentar a dimensão
subjetiva, para possibilitar a superação da resignação, desilusão, cansaço e desgaste
diário que a tarefa de ensinar e aprender tem sofrido nestes tempos tão incertos,
inseguros e complexos.
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