Anais do XX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178
Anais do V Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420
22 e 23 de setembro de 2015
LUTA CONTRA O RACISMO À LUZ DA TEORIA DO
RECONHECIMENTO DE AXEL HONNETH
Marcia de Almeida Abade
Artur José Renda Vitorino
Faculdade de Direito
Centro de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas
[email protected]
Política e Fundamentos da Educação
Centro de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas
[email protected]
Resumo: Ao se discutir formas possíveis de implementação de ações públicas no combate ao racismo,
se faz necessário uma pesquisa objetiva sobre a origem de comportamentos discriminatórios em uma determinada sociedade, assim como suas possíveis
causas e consequências diretas e indiretas. De posse
de tal conhecimento, toda e qualquer análise de resultados de políticas afirmativas ficará guarnecida de
elementos que permitirão justificar sua implementação assim como servirão de base para antecipar seus
possíveis resultados. Este estudo tem como objetivo
catalisar as teorias de comportamento social criadas
por Axel Honneth e trazê-las para o contexto nacional, avaliando se o conceito de normatividade é realmente característica da Teoria do Reconhecimento,
fato que, se comprovado, mostraria aderência para a
Teoria de do Reconhecimento diante do problema da
discriminação racial no Brasil.
Palavras-chave: Educação, Racismo, Reconhecimento, Direitos Humanos, Sociedade, Comportamento.
Área do Conhecimento: Grande Área do Conhecimento: Ciências Humanas – Sub-Área do Conhecimento: Educação – CNPq.
1. INTRODUÇÃO
A partir do estudo de obras de autoria do filósofo e sociólogo Axel Honneth como Luta por Reconhecimento
[1] e Sofrimento por indeterminação [2] e de reflexões
de estudiosos brasileiros como as contidas em A teoria Crítica de Axel Honneth [3], foi realizada uma
análise visando investigar a aderência da Teoria da
Luta por Reconhecimento [1] ao contexto e realidade
brasileira no que diz respeito ao enfrentamento da desigualdade racial. Para a identificação e avaliação do
grau de normatividade da Teoria da Luta por Reconhecimento, esta investigação utilizou-se da análise
histórica do surgimento e evolução dos Direitos Humanos, e, mais especificamente, do direito à igualdade no contexto mundial.
Uma vez comprovada a possibilidade de aplicação
transnacional da Teoria do Reconhecimento [1], tornou-se possível a evolução para uma análise de conformidade dos conceitos envolvidos em território nacional. Desta forma, a linha de estudo proposta transita
por: (2) uma rápida análise dos conceitos envolvidos
na Teoria da Luta por do Reconhecimento de Axel
Honnet, (3) uma pesquisa sobre o comportamento social transnacional, relacionando-o com as conquistas
dos Direitos Humanos Universais, e finalmente (4) um
comparativo entre as fases de evolução dos Direitos
Humanos e as fases de evolução do reconhecimento,
apresentadas pela Teoria de Honneth.
2. AXEL HONNETH E A TEORIA DA LUTA POR RECONHECIMENTO
O tema central dos estudos do filósofo e sociólogo
Axel Honneth e objeto desta análise é a teoria conhecida como Luta por Reconhecimento [1]. Tal teoria
nasce de uma releitura realizada por Honneth sobre
trabalhos de autoria de Hegel, complementadas por
um embasamento mais pragmático [3]. Honneth invoca autores de diversas disciplinas, enriquecendo seus
argumentos com estudos empíricos de pesquisadores
renomados em suas áreas de conhecimento [1].
A teoria do reconhecimento de Honneth busca conhecer o processo pelo qual um ser humano se torna parte de um grupo social, desde o seu nascimento até a
sua inserção e interação na sociedade, através da interiorização e exteriorização de sentimentos e atitudes provocadas pelos diversos relacionamentos complexos entre o indivíduo e seus semelhantes e, em
consequência, construir a sua própria definição de
movimentos sociais [1]. Para o filósofo, o processo
ético que envolve o reconhecimento é a base normativa de toda a dinâmica social, e responsável pelos
conflitos ou pela harmonia social, conforme existe a
adequação ou não dos indivíduos em seus grupos sociais de inserção [1]. A Teoria do Reconhecimento
trabalha, basicamente, com três conceitos: a autoconfiança, o autorrespeito e a autoestima [1]. Cada
um destes três pilares do reconhecimento estão relacionados respectivamente aos conceitos de amor, direito e solidariedade, presentes nos escritos de Hegel
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(Jena, 1801 a 1807). Estes conceitos são resgatados
por Honneth, que os alimenta de argumentos trazidos
da psicologia, da medicina, da psiquiatria e da própria
filosofia [1,2 e 3]. A tabela abaixo demonstra de modo
resumido como os conceitos se relacionam na teoria
de Axel Honneth:
Tabela 1. Os três pilares da Teoria do Reconhecimento.
Autorrelação
Formas
de
Reconhecimento
Formas
de
Desrrespeito
Ameaças
à
personali
dade
Autoconfiança
Amor
Integridade
Física
Autorrespeito
Direitos
Autoestima
Solidariedade
Maus tratos, violência
Privação,
exclusão
Ofensa
Integridade
Social
Integridade
Moral
3. NORMATIVIDADE
O processo de identidade social, típica do ser humano, o levou a se reunir em grupos sociais que o reconhecem como igual [1]. O grupo, por sua vez, através
das inúmeras intervenções e experiências com outros
grupos e com a natureza, reorganizaram-se em grupos maiores. Nem sempre essa reorganização é natural. Podem ocorrer situações de domínio armado,
religioso, social ou territorial. De qualquer modo, conforme os grupos vão travando conflitos e lidando com
novas experiências, vão reconstruindo sua identidade
e seus valores de reconhecimento.
A discussão dobre os Direitos Humanos, que se inicia
logo após o final da primeira guerra mundial [5] é um
marco importante para a retomada da questão que
envolve ideais de reconhecimento globalizados.
A sequência histórica do surgimento e avanços dos
Direitos Humanos no mundo corrobora a ideia da sequência de reconhecimento estabelecida por Honneth
[1], porém em termos globalizados. Um grupo social
precisa, inicialmente, reconhecer-se como grupo (autonomia), para que posteriormente se julgue merecedor de direitos (autorrespeito) e se concretize como
parte da sociedade global (autoconfiança).
Em forças opostas, a divisão do mundo em nações
independentes possibilitou a segmentação da humanidade em grupos politicamente e geograficamente
organizados, criando mais uma espécie de reconhecimento, a chamada soberania nacional.
Surge assim um novo conflito de reconhecimento, trazendo à tona a dicotomia entre o reconhecimento
como indivíduo e o reconhecimento social. Por ser
parte de um grande grupo transnacional, reconhecido
como ser humano, o indivíduo já é possuidor de determinados Direitos – são os chamados Direitos Naturais. Porém, por fazer parte de um grupo menor, e
aderente a sua estrutura de comportamento, o indivíduo é possuidor de outro conjunto de Direitos, aqueles organizados sob o domínio de uma Nação, são os
direitos do cidadão nacional. Nem sempre as duas
esferas de direitos são coerentes, fato que pode provocar conflitos. A normatividade fica, por assim dizer,
prejudicada pela soberania nacional. Este tem sido o
maior obstáculo para os órgãos de fiscalização dos
Direitos Humanos Universais [5], que se limitam a orientar e sugerir políticas que preservem os Direitos
Fundamentais dentro de cada Estado ou Nação.
4. DIREITOS HUMANOS UNIVERSAIS OU COSMOPOLITISMO
Ao trazer a discussão sobre direitos humanos para o
contexto desta pesquisa, é possível estabelecer um
relacionamento surpreendente entre as fases de reconhecimento utilizadas por Honneth em sua teoria de
eticidade [1] e as gerações dos Direitos Humanos [5].
A luta dos grupos sociais por reconhecimento universal parece se apresentar com as mesmas características da luta do indivíduo por reconhecimento em
seu grupo social.
Utilizando-se de classificações utilizadas por estudiosos como Alexandre de Moraes [8] e Norberto Bobbio
[7], a história dos Direitos Humanos do século XX organiza-se em três gerações de conquistas.
Cada uma das chamadas gerações ocorre em decorrência ou como uma reação da sociedade mundial a
determinados acontecimentos, fatos históricos ou situações econômicas, políticas e sociais, ou seja, estão correlacionadas com o contexto histórico cronológico mundial [5].
A primeira geração (Liberdade) ocorre com o avanço
do liberalismo econômico, e surge para impor limites
aos estados totalitários. São os chamados direitos negativos, pois limitam o poder do estado [8].
A segunda geração (Igualdade) surge para impor aos
estados responsabilidades sociais. Ocorre através
dos sindicatos e organizações trabalhistas. São
exemplos as leis do trabalho, as leis eleitorais e algumas leis de proteção a minorias ou grupos considerados hipossuficientes como mulheres e crianças [8].
A terceira geração (Fraternidade) já é uma reação à
globalização. Institui direitos a recursos naturais, meio
ambiente e outros direitos difusos como a paz e a felicidade [8].
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A tabela abaixo ilustra o possível relacionamento entre as fases da Teoria do Reconhecimento e
as gerações dos Direitos Humanos.
Tabela 2. Gerações dos Direitos Humanos e as fases da
Teoria do reconhecimento.
Geração dos Direitos
Humanos
Fase Teoria
Reconhecimento
1a. Geração - Liberdade
2a. Geração - Igualdade
3 ª Geração - Fraternidade
Amor - Autonomia
Direitos - Autorrespeito
Solidariedade - autoconfiança
Com este comparativo em mãos, é possível vislumbrar, se utilizando dos conceitos de reconhecimento
trazidos por Honneth, que o processo social de discriminação de determinadas etnias, características físicas, religião ou nacionalidade pode ser identificado
como responsável pela destruição do pilar do autorrespeito dos grupos alvos. A partir da ruptura ou
deterioração do autorrespeito, o grupo vítima da negação de direitos se torna vulnerável e subjugado, desacreditando ser digno dos mesmos direitos do grupo
que não os reconhece mais como iguais.
Desta forma, assim como nos Direitos Humanos, é
possível afirmar que há características normativas na
Teoria do Reconhecimento de Axel Honneth, porém
limitadas pela formação social e jurídica de cada país
(Soberania Nacional). E indo além, que as possibilidades de enfrentamento da problemática da discriminação racial devem se concentrar na recuperação do pilar identificado como Autorrespeito no grupo afetado,
ou seja, a estratégia de promoção da igualdade deve
se concentrar em políticas que promovam o autorrespeito nos indivíduos e grupos negros, através da garantia de seus Direitos e do acesso e participação nos
diversos grupos sociais componentes da sociedade
em geral.
5. CONCLUSÕES
Este estudo permitiu o contato com diversas áreas do
conhecimento das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. A Teoria do Reconhecimento de Axel Honneth
apresenta grande complexidade e requer avaliações e
análises que excedem o escopo deste projeto de iniciação científica. Os conceitos e relacionamentos observados imprimem a necessidade de análises mais
profundas sobre o desenvolvimento social, composição, conflitos, associações e demais formas de organização social.
O relacionamento das fases da Teoria do Reconhecimento com as gerações dos Direitos Humanos abre
grande possibilidade para a aplicação da Teoria de
Honneth nas Ciências Jurídicas, conjuntamente com
as Ciências Sociais, buscando, de maneira integrada,
ações reais que promovam a igualdade e o fim da discriminação racial no Brasil e no mundo.
AGRADECIMENTOS
Sinceros agradecimentos aos alunos do grupo de Política e Fundamentos da Educação, que, comprometidos e dedicados à busca por conhecimento, durante
as discussões ocorridas nos encontros periódicos, colaboram enormemente para o aprofundamento de
ideias e conceitos de cada participante.
REFERÊNCIAS
[1] Honneth, A. (2011), Luta por reconhecimento: a
gramática moral dos conflitos sociais. 2ª ed. Editora 34, São Paulo.
[2] Honneth, A. (2007), Sofrimento por indeterminação. São Paulo, Esfera Pública, São Paulo.
[3] Melo, R. (2013), A teoria crítica de Axel Honneth.
1ª ed., Editora Saraiva, São Paulo.
[4] AZEVEDO, C.M.M. (2007), Anti-racismo e seus
paradoxos, Editora AnnaBlume, 2a edição, São
Paulo
[5] DOUZINAS, C. (2009), O fim dos Direitos Humanos. Editora Unisinos, São Leopoldo
[6] COSTA, S. (2006), Dois Atlânticos: teoria social,
anti-racismo, cosmopolitismo, Editora UFMG,
Belo Horizonte.
[7] BOBBIO, N. (1992), A era dos direitos. Editora Elsevier, Rio de Janeiro
[8] MORAES, A. (2002), Direitos Humanos Fundamentais,Editora Atlas, 4a. Edição, São Paulo.
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