REPORTAGEM horas antes do show, mil ingressos foram revendidos em meio a muito tumulto: – Foi uma loucura. Era tanta gente querendo, que não dávamos conta de atender o público. Pegamos um saco para colocar o dinheiro arrecadado, e tínhamos de pisar dentro para caber – diverte-se o produtor caxiense. O show em Caxias começou às 22h de 1º de outubro de 1986, com uma hora de atraso. Ferronato lembra que, mesmo com venda de ingresso acima do previsto, ainda havia cerca de 300 pessoas querendo entrar no ginásio do RJ: – Com medo que derrubassem as portas e desse confusão, decidimos liberar a entrada quando começou o show. Hoje, pensando, vejo que fizemos loucura. Na plateia, havia muitos adolescentes, dos 12 aos 14 anos, acompanhados dos pais. O RPM conquistou essa faixa etária porque era uma banda mais pop. Os jovens dos 16, 17 anos, queriam saber mais de Ultraje, Titãs, que eram mais rock. Na próxima sexta, o RPM volta a Caxias. Vinte e cinco anos depois da apresentação no RJ, é bem provável que não atraia a mesma multidão de 1986. O sucesso não é o mesmo. Desde 1985, houve duas separações do grupo, uma delas após problemas atribuídos à disputa de egos e uso de drogas. Mas após idas e vindas, a Revolução Por Minuto ressurge. Para alegria dos antigos fãs e em busca dos novos. Fale com o repórter [email protected] LETRAS DE AMOR E POLITIZADAS O RPM era paixão, moda e estilo. Garotas idolatravam Paulo Ricardo e Deluqui como se fossem príncipes encantados. Garotos tentavam imitar o vocalista e o guitarrista aderindo a seus cortes de cabelo e vestindo camisetas sem mangas idênticas às dos músicos. As canções eram compostas por Paulo Ricardo e Schiavon, formado em piano e programação musical e que até pouco tempo comandava a banda do Domingão do Faustão. Algumas letras que conquistaram milhões de admiradores falavam de amores, alguns impossíveis. Caso de Olhar 43, um megassucesso: “Seu corpo é fruto proibido É a chave de todo o pecado e da libido E prum garoto introvertido como eu É a pura perdição”. Como boa parte das bandas nacionais emergentes nos anos 1980, quando a ditadura já definhava e os jovens transformavam a música em canal para desabafo, o RPM criticou o governo e a roubalheira de dinheiro público. Lançou Revolução Por Minuto – daí a sigla do nome da banda –, um hino juvenil. Da bagagem musical do RPM também saíram covers com novos arranjos, como London London, de Caetano Veloso, e outras que deram o molho para músicas próprias. Light my Fire, do The Doors, teve trecho incluído no meio de Rádio Pirata. A canção anunciava uma postura rebelde e de enfrentamento às injustiças: “Preparar a nossa invasão E fazer justiça com as próprias mãos Dinamitar um paiol de bobagens E navegar no mar da tranquilidade Toquem o meu coração Façam a revolução”. A 4 Maria Cristina Calcagnotto Rocha tietou o grupo defronte ao Alfred e foi uma das entrevistadas de Pedro Bial ‘É mágica ou química, como preferir’ FLORIPA IN CONCERT, DIVULGAÇÃO Siliane Vieira dade. Acho que conseguimos. Mesmo revelando todas as disputas de ego e vaidade que permearam a trajetória do RPM, o especial da Globo Por Toda Minha Vida, que foi ao ar em novembro de 2010, acabou por incentivar o grupo a voltar à ativa. A produção reconstruiu os passos da banda, passando pelos momentos de sucesso absoluto e fãs desesperadas, e chegando até as brigas e a separação precoce. – O programa nos fez repensar toda nossa história e ver que podíamos mudar o final – comenta Paulo Ricardo. E a retomada gerou frutos. O disco Elektra, lançado em 2011, é um deles, e a turnê que passa por Caxias do Sul na próxima sexta é outro. O momento da banda revela um olhar ao passado sonoro, ainda que com pés bem fixos no contemporâneo. Confira a entrevista que Paulo Ricardo concedeu ao Almanaque por e-mail. Almanaque: ‘Elektra’ vem acompanhado de um disco de remixes. Como os fãs têm recebido a novidade? Há muita crítica por parte dos mais roqueiros? Paulo Ricardo: Fomos os primeiros a remixar uma canção no Brasil, Louras Geladas, em 1985. Hoje, numa cena dominada por DJs, isto é mais do que natural. de estúdio, cada músico desenvolveu outros trabalhos. Relacionando com a bagagem individual, quais elementos (novos ou não) cada integrante do RPM levou para o disco novo? Paulo Ricardo: Na verdade, RPM é RPM. De certa forma, deixamos de lado estas ‘individualidades’ e nos amalgamamos em algo maior que a soma dos quatro quando trabalhamos em conjunto. Há uma influência mútua muito Almanaque: Durante o longo forte e o resultado é o que se período sem lançar álbuns pode chamar de mágica, ou química, como preferir. Almanaque: ‘Elektra’ lembra muito o RPM dos anos 1980. Trata-se de uma consequência musical natural ou o disco foi pensado para ser um retorno às origens? Paulo Ricardo: Ambos. Depois de muita reflexão a partir do MTV RPM 2002, decidimos compor e gravar naturalmente, sem tentar soar RPM, mas também sem se incomodar quando isto acontecesse. Buscar uma evolução sem perder o estilo, a identi- Almanaque: Os anos 2000 trouxeram uma penca de bandas inspiradas na sonoridade dançante dos anos 1980. Você tem acompanhado este movimento? Há algum grupo que tenha chamado sua atenção? Paulo Ricardo: Nessa retomada de timbres oitentistas, sem dúvida The Killers foi o mais bem-sucedido e emblemático. Almanaque: Vocês estão tratando esta volta do RPM como definitiva? Paulo Ricardo: Definitivamente (risos)!