N E G Ó C IO S A indústria do combate Identificadas no passado como indústria do medo, empresas que atuam no setor de segurança diversificam negócios para contribuir com a queda dos índices de violência A ndré Vendrami A té dezembro de 2007, o número de acidentes de trânsito registrados pela Polícia Rodoviária Federal chegou a 116.719, cerca de 5% a mais em relação aos dados de 2006. Um estudo produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública revela que em 2005 o número de furtos e roubos de veículos no país chegou a aproximadamente 530 mil. No mesmo período, 345 mil residências e estabelecimentos comerciais foram assaltados. Na internet, as ameaças de vírus e tentativas de invasão de sistemas chegaram a 250 mil só durante o ano passado, a mesma quantidade de ameaças registradas nas duas últimas décadas. Essa mistura de dados desenha em parte o cenário da insegurança pública brasileira, revelando a mola propulsora do mercado de segurança eletrônica no país. Considerando a venda de produtos e serviços, o setor faturou R$ 1,25 bilhão em 2006 e estima crescer, em média, 16,2% durante os próximos cinco anos. Segundo a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), o crescimento esperado para o setor em 2007 era de 23%. E é nessa fatia de mercado que várias empresas estão apostando. É o caso da Life, graduada em 2002 no Centro Regional de Inovação e Transferência de Tecnologia (Critt) da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG). A empresa trabalha pela segurança no trânsito, com o objetivo de reduzir acidentes. Para isso, monitora e auxilia o motorista a aplicar conceitos de direção defensiva. O projeto, pioneiro no país, nasceu de uma visita do empreendedor Reinaldo Mansur à Alemanha, em 1971. Próximo à cidade de Frankfurt, o empresário observou um test drive e percebeu que o motorista recebia aulas de direção defensiva e primeiros-socorros. Mansur, que é médico, mas já havia sido motorista profissional e mecânico, resolveu trazer a experiência para o Brasil. Com a ajuda do pai, o empreendedor idealizou um aparelho chamado centrígrafo. O equipamento, testado em ônibus, fazia o monitoramento das ações do veículo. “Além desse cuidado na direção, encontramos outra vantagem, que foi a de aumentar em 80% a vida útil dos pneus”, destaca Mansur. Em 1995, Mansur criou a Life para produzir o aparelho. Precisando de apoio e suporte tecnológico, no ano seguinte procurou o Sebrae, e no final de 1996 a Life tornou-se a primeira empresa incubada pelo Critt. A partir da incubação, a tecnologia do centrígrafo evoluiu para um aparelho eletroeletrônico capaz de monitorar os giros do motor do veículo. Em 1998, chegaram a um sistema quase totalmente eletrônico. Em 2000, a empresa recebeu o prêmio de Inovação Tecnológica do Sebrae – em conseqüência desse prêmio, o Ministério da Ciência e Tecnologia concedeu ao Critt computadores e equipamentos. Veículos monitorados O G3, nome do orientador eletrônico comercializado pela Life, além de ser um rastreador via GPRS, permite informar ao motorista sobre locais perigosos na estrada, mas não interfere na condução do veículo e apenas registra dados. “Ele mensura se o motorista está tomando cuidado ou se está dirigindo de qualquer jeito. Ele alerta para o comportamento da direção Locus • Janeiro 2008 15 E G Ó C IO DIVULGAÇÃO/ LIFE N Linha de produção da Life: foco da empresa é a segurança nas estradas. Acima, o empreendedor Ricardo Mansur. S em função da estrada”, explica Mansur. “Nossa preocupação sempre foi a valorização do ser humano, fazendo um trabalho voltado para a prevenção de acidentes. O difícil é colocar na cabeça do empresário e do motorista que o aparelho não deve ter função punitiva e sim tornar-se um conscientizador, um instrumento de capacitação”, conclui. Hoje a Life conta com 18 funcionários, entre eles uma equipe de engenheiros. Seus principais clientes são empresas de ônibus como as catarinenses Viação União, Viação Santo Anjo e as empresas Itapemirim e Viação Progresso. A empresa acaba de lançar um sistema que permite o rastreamento on-line, para que o cliente, ou a própria Trânsito mais seguro A FotoSensores, maior empresa da América Latina em tecnologia de semáforos, ganhou menção honrosa no Prêmio Finep de Inovação Tecnológica 2007. Com sede em Fortaleza, a FotoSensores nasceu em 1993 no Parque de Desenvolvimento Tecnológico da Universidade Federal do Ceará (Padetec). A tecnologia dos fotossensores é desenvolvida pela empresa desde 1995 e já gerou soluções integradoras para o gerenciamento de trânsito: sistemas capazes de registrar avanços de semáforos, excesso de velocidade e parada sobre a faixa de pedestres. O sistema foi implantado nas ruas de Fortaleza em 1996. Ao todo, foram instalados 56 equipamentos fotossensores, que registraram quase 150 mil infrações naquele ano. Em 2002, a frota da cidade aumentou para pouco mais de 400 mil veículos e o número de equipamentos instalados para 91. As infrações caíram para 51,8 mil, quase 35% do número registrado antes de o sistema funcionar. Segundo o Detran do Ceará, a quantidade de infrações registradas no estado em 2006 foi de quase 20 mil, numa frota com cerca de um milhão de veículos. Os resultados obtidos fizeram com que outras cidades do país, principalmente as capitais, se interessassem pelo sistema comercializado pela FotoSensores. Entre os clientes da empresa estão as cidades de Aracaju, Recife, Florianópolis, Blumenau, Natal, Franca e São Luís do Maranhão. 16 Locus • Janeiro 2008 Life, monitore o gasto de combustível. Além disso, é possível interferir de forma indireta na condução do veículo, alertando o motorista, por meio de um módulo GPS, sobre os riscos de acidente. Outra empresa mineira atuante no setor de segurança é a Star Sat, graduada em julho do ano passado na Incubadora de Empresas de Patos de Minas. Idealizada para atuar no ramo de rastreamento de veículos via satélite, a empresa expandiu horizontes e oferece soluções de logística e gerenciamento de risco veicular. “Atualmente o rastreador não tem apenas função antifurto ou anti-roubo. Um bandido que entra em um caminhão sabe desmontar o aparelho. Nosso trabalho hoje é 90% administração da frota e 10% recuperação de roubos”, esclarece o proprietário da empresa, Mauro Teixeira. O sistema comercializado, além de bloquear o veículo em caso de furto, localiza-o via satélite ou pelo sistema de transmissão de dados via telefonia celular. Mas conta também com outras funcionalidades, como informar, a cada minuto, a temperatura da câmara fria dos caminhões. “Nós disponibilizamos mais serviços. Para desligar um veículo existem bloqueadores que custam apenas 10% do valor de um rastreador”, afirma Teixeira. A Star Sat, hoje com oito funcionários, nasceu em 2004. Como muitos empreendedores, Teixeira tinha planos de ter um negócio próprio, mas não sabia em que área atuar. A escolha pela segurança nos transportes veio da experiência de ter trabalhado com seguradoras e percebido a exigência de que as frotas asseguradas tivessem rastreadores instalados. Apesar da demanda, não havia muitas empresas oferecendo o serviço no mercado. Na incubadora, Teixeira aprendeu a fazer o projeto e o plano de negócios que resultariam na Star Sat. Durante os seis primeiros meses de incubação realizou testes de produto e no semestre seguinte dedicou-se a uma nova análise do mercado. Só depois passou a comercializar o rastreador. A es- pera valeu a pena: hoje a empresa já rende, anualmente, em média 1.300% do valor investido inicialmente. A perspectiva da Star Sat é dobrar de tamanho em 2008, a partir da expansão regional. “Eu foquei a empresa muito aqui na porta. Agora quero crescer em torno da cidade também”, conclui. Inovação reconhecida Em Campinas, interior de São Paulo, a Griaule Biometrics, residente até 2005 na Incubadora de Base Tecnológica da Unicamp, a Incamp, vem se destacando no desenvolvimento de soluções em biometria – uso de características biológicas em mecanismos de identificação como reconhecimento facial ou de impressões digitais – e já recebeu seis certificações do FBI, a polícia federal norte-americana, o que torna a empresa apta a participar de licitações realizadas nos Estados Unidos. O programa desenvolvido pela Griaule foi reconhecido pelo Departamento de Justiça do governo americano em 2006 como a melhor tecnologia do mundo na área de biometria. Entre os produtos da empresa, apenas um é hardware: um coletor de impressão digital que trabalha o controle de acesso. Um painel com um teclado colhe a impressão digital e, ligado a uma porta elétrica, reconhece essa impressão e permite o acesso. Porém o foco da produção da empresa é a criação de plataformas para desenvolvedores de softwares, ou seja, criar as bases dos programas. Com base no modelo de negócios Eletronic Software Download, a empresa permite ao cliente interessado baixar o programa pela internet, testá-lo por 90 dias e depois comprar sua licença. “A idéia é atingir o maior número de pessoas com essa facilidade em instalar e comprar o produto”, afirma o gerente de marketing da Griaule, Paulo Ribeiro. Atualmente, 80% dos clientes da empresa estão no exterior. “No Brasil, a biome- tria ainda encontra resistência. Embora goste de tecnologia, o brasileiro espera para ver como vai funcionar e só depois, quando nota que as pessoas estão usando, passa a confiar e compra”, ressalta Ribeiro. Segundo ele, apesar do crescimento do uso da biometria no país, os negócios da Griaule no exterior vão melhor devido às facilidades de investimentos em equipamentos, muito mais baratos, e também pela tradição cultural do uso dessa tecnologia. A Griaule foi fundada em 2002, fruto da aposta dos empreendedores Iron Daher e José Alberto Canedo no setor ainda pouco conhecido e desenvolvido no Brasil. Na época, os sócios investiram R$ 6 mil para o primeiro pagamento de funcionários e do aluguel. Hoje, a empresa fatura em média R$ 4 milhões ao ano e 40% da equipe de pesquisa e desenvolvimento é estrangeira. “Muitas pessoas de fora vêm estudar na Unicamp, um centro de excelência. É natural que a gente acabe trabalhando com elas”, afirma Ribeiro. Em 2008, a empresa pretende integrar à equipe algum profissional chinês, de olho nos negócios com o gigante asiático. Os principais clientes da Griaule estão na área de saúde, entre eles a Unimed, que pretende utilizar a biometria no esquema de autorização de consultas. Há outros clientes importantes, como o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a empresa de telefonia Oi e a própria Unicamp – que utiliza o sistema de biometria para evitar fraudes no vestibular. No estado de Tocantis, o software de coleta de impressão digital para carteira de identidade também foi produzido pela Griaule. Casas inteligentes Incubada no Instituto Gênesis, da PUC-RJ, a Future House apostou no filão da automação residencial para ingressar no setor de segurança. “A questão da segurança está envolvida em praticamente todos os sistemas implantados pela emLocus • Janeiro 2008 17 E G Ó C IO S DIVULGAÇÃO/ FUTURE HOUSE N Sinohara, da Future House: tecnologia para segurança de imóveis de luxo. Entre os clientes da empresa, um xeique do Catar e moradores de zonas nobres do Rio de Janeiro. presa”, enfatiza Hélio Sinohara, um dos sócios. A idéia de trabalhar com “casas inteligentes” trouxe o desenvolvimento de tecnologias inéditas no país. Por exemplo, um sistema no qual uma luz acende durante a noite quando uma criança ou idoso se aproxima de uma escada ou então que ilumine, via sensores, um ambiente onde seja possível que alguém queira se esconder. A empresa trabalha em três setores interligados: automação residencial, controle de iluminação e sistema de entretenimento com áudio e vídeo. Um sistema voltado especificamente para segurança é o de simulação de presença, no qual luzes se acendem alternadamente pela casa quando o proprietário não está – e pode até ter associação com áudio, como ligar rádio ou televisão. Esses produtos são chamados Sistemas Indiretos de Segurança, pois não fazem uso de câmeras. Alguns produtos desenvolvidos pela Future House chegam a ser engraçados. É o caso do Cachorro Virtual, um sistema no qual um sensor capta a passagem de uma pessoa por algum local da residência 18 Locus • Janeiro 2008 – um quintal, por exemplo – e uma caixa de som emite um forte latido de cão. Após 10 segundos, as luzes da casa se acendem como se alguém fosse verificar o que está acontecendo. Chamado de segurança preventiva, esse tipo de sistema tem como público-alvo pessoas físicas com alto poder aquisitivo, da classe AA, e proprietários de imóveis de valor estimado entre R$ 2 milhões e R$ 10 milhões. Entre os projetos desenvolvidos pela Future House estão o de automação e sistemas de vídeo da mansão do xeique do Catar, de residências de alto padrão como no Edifício Chopin, em Copacabana, e em bairros da zona Sul e da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, além de outras nas regiões de Búzios, Angra dos Reis e Itaipava. Segundo Sinohara, o investimento inicial na empresa foi de no máximo R$ 10 mil. “Cada um trouxe de casa uma cadeira, o seu PC e eu arranjei dinheiro pra comprar um armário e uma bancada”, conta. O empresário acredita que o setor de tecnologia de segurança deve se expandir. “Primeiro, pelo crescimento da vio- DIVULGAÇÃO/ F-SECURE lência no país, que gera necessidade de proteção pessoal. Segundo, pelo aumento do poder aquisitivo das pessoas, o que faz com que tenham cada vez mais condições de investir em segurança”, finaliza. Ameaças ocultas Estender a segurança de ambientes físicos para ambientes virtuais tornou-se o grande desafio do início deste século. Como conseqüência, o volume de negócios em segurança de informação não pára de crescer. “Embora seja um mercado desenvolvido, os números ainda são nebulosos. Mas estima-se que gire em torno de 100 milhões de dólares no mundo”, afirma o responsável pela área de tecnologia da F-Secure, Gabriel Menegatti. A FSecure Corporation é uma empresa finlandesa, líder de mercado em soluções de segurança para usuários móveis, operadoras e provedores de serviços, com filial no Brasil há apenas três anos. Os serviços oferecidos vão além dos antivírus, antispywares e antiadwares. A empresa atua no mercado corporativo, com controles de aplicativos, auditoria de e-mail e controle de spam. No varejo, aposta no F-Secure Internet Security 2007 – uma espécie de antitudo – que, além de proteger o computador de ameaças, ainda permite o controle ao acesso de determinados sites, permitindo que os pais monitorem o que os filhos vêem na internet. Foi a F-Secure que contabilizou a quantidade de 250 mil malwares – nome dado às ameaças vindas da internet – só em 2007. Menegatti acredita que neste ano a quantidade de ataques ou tentativas deve crescer ainda mais. “Isso se dá por conta de todas essas novas tecnologias como Web 2.0, smartphone e outros dispositivos eletrônicos que permitem que as pessoas fiquem mais tempo on-line e que mais brechas acabem surgindo”, esclarece. A empresa, que também tem filiais no Japão, Estados Unidos, França, Alemanha, Menegatti, da F-Secure: invasores de PCs criam maneiras cada vez mais sofisticadas de espionagem. Suécia e Reino Unido, possui laboratórios em San Jose, na Califórnia (EUA), em Helsinque, na Finlândia, e na Malásia. “Estamos posicionados estrategicamente em três hemisférios diferentes. Assim as ameaças que surgem no Japão, por exemplo, são detectadas antes de os computadores da América serem ligados e infectados”, revela Menegatti. Segundo ele, a empresa leva de duas a seis horas para solucionar um problema e lançar uma atualização dos softwares, enquanto as concorrentes demoram entre quatro e 10 horas. As infecções por vírus e as tentativas de invasão de computadores não têm mais a finalidade de danificar os PCs ou, no caso de empresas, prejudicá-las no mercado. Segundo Menegatti, os ataques atuais têm interesse em geração criminosa de renda e os invasores criaram maneiras sofisticadas de espionar as ações do usuário e com isso coletar informações sigilosas, como senhas bancárias. “O Brasil é um dos principais players de mercado para a criação de spyware para banco, já que o país também é referência mundial para plataforma de banco on-line e relacionamento on-line com clientes”, explica Menegatti sobre a necessidade de proteção. Locus • Janeiro 2008 19