V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ PERCEPÇÃO AMBIENTAL E QUALIDADE DE VIDA SOB O OLHAR DO CIDADÃO: ESTUDO DE CASO NA VILA DE SÃO SEBASTIÃO DE ARAPIXI -CHAVES –ILHA DO MARAJÓ –PA. Renato H. de Vilhena (PPGEO/UFPA) Biólogo, Mestrando em Geografia – PPGEO/UFPA. [email protected] Marlene P. de Oliveira (PPGEO/UFPA) Geógrafa, Especialista – UFPA. [email protected] RESUMO Fundamentados em estudos realizados sobre a percepção ambiental, o presente trabalho aborda temática relacionada à compreensão das relações do indivíduo com o meio ambiente, especialmente em áreas de proteção ambiental (APA). Esta pesquisa foi desenvolvida com o objetivo de analisar a percepção ambiental dos moradores da Área de Proteção Ambiental do Arquipélago do Marajó (Apa Marajó), mais precisamente na Vila de São Sebastião de Arapixi, no município de Chaves-PA. A fim de atingir o objetivo proposto será aplicada uma metodologia específica fundamentada na análise do discurso e da observação. Enquanto resultados, o trabalho encontra-se em fase inicial, porém já com muitas observações in loco, o que permitiu a elaboração de algumas considerações a respeito deste estudo 1 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ 1. INTRODUÇÃO Os impactos ambientais têm sido disseminados pela falta de práticas de manejo adequadas às diferentes paisagens e suas particularidades. Alterações no clima, na distribuição geográfica da água e na fertilidade do solo têm colocado em questionamento as atitudes antrópicas devido aos prejuízos socioambientais acarretados, especialmente após a Revolução Industrial no século XVIII. Na atualidade, a questão ecológica encontra-se casa vez mais presente no cotidiano da sociedade, por meio da divulgação pela mídia ou pelas nítidas alterações verificadas nas diferentes paisagens (JACOBI, et. al., 2004:1). Discussões sobre a temática ambiental vêm se tornando comuns e prioritárias na sociedade brasileira, principalmente depois da realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - Rio 92. Contribuiu para isso, também, a realização da Conferência Infanto Juvenil e Nacional de Meio Ambiente em Brasília, no ano de 2003 (FERNANDES, et. al., 2004, p. 01). A realização dos eventos anteriormente citados permitiu, assim, uma análise da situação ambiental do planeta, a avaliação das ações antrópicas sobre o meio, como também traçar metas no sentido de resgatar e proteger a qualidade de vida da população. A partir desse momento as questões ambientais assumiram um papel de grande destaque na esfera das preocupações mundiais, tornando-se mais discutidas dentre os principais grupos sociais envolvidos (industriais, agricultores, pecuaristas, governantes, ambientalistas). Porém, mesmo com a repercussão desses eventos, ainda não é consistente a mudança da postura humana em relação à conservação ambiental, dado a falta de empenho da sociedade como um todo, e não apenas de grupos engajados em movimentos ambientalistas, em ampliar uma percepção favorável em relação aos elementos ambientais e fatores relacionados. A falta de uma maior e real participação social na proteção do meio ambiente, no caso brasileiro, ocorre em decorrência de alguns fatores específicos. Na realidade, antes que se houvesse enraizado no país um movimento ecológico, o Estado criou diversas instituições para gerir o meio ambiente, a fim de que investimentos de organismos internacionais pudessem ser obtidos e aplicados em projetos federais. Associados a essa realidade, movimentos pontuais ocorreram no Brasil relacionados à questão ambiental, ao mesmo tempo em que os pesquisadores locais começaram a receber a influência do movimento ecológico internacional (GONÇALVES, 2004, p. 15). Nota-se, então, que o movimento ecológico não se difundiu, com a mesma intensidade, em 2 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ relação às diferentes parcelas da sociedade, especialmente em relação aquelas que apresentam baixas renda e escolaridade. Enquanto políticas públicas conservacionistas, de caráter prático, ressalta-se, no Brasil, a criação da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938) em 1981 e, posteriormente, a normatização e criação das Unidades de Conservação (UC’s). Estas se constituem num instrumento relevante para a preservação dos recursos naturais, atuando também como locais de aprendizagem e sensibilização da comunidade acerca da problemática ambiental (JACOBI, et. al., 2004, p. 02). Nesse sentido, as Unidades de Conservação, e, entre essas, a Área de Proteção Ambiental (APA), constituem-se num mecanismo viável e adequado de preservação dos recursos ambientas no sentido de contribuir, como instrumento da política ambiental em âmbitos federal, estadual e municipal, para a consecução dos objetivos do desenvolvimento sustentável (CABRAL & SOUZA, 2005, p. 11). As APA’s têm por objetivo disciplinar o processo de ocupação, proteger a diversidade biológica e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais, observando a manutenção da qualidade dos atributos ambientais que ensejam sua criação, constituindo-se em instrumento institucional que apontam para a necessidade de se reduzir externalidades negativas que comprometam a eficiência econômica e o bem-estar da sociedade. (CABRAL; SOUZA, 2005, p. 48). Entretanto, o estabelecimento de regras, e leis que atribuem o que deve ser feito não traz a mesma reação de um trabalho educativo que construa e esboce modos. Nesse sentido, uma das maiores dificuldades para a proteção dos ambientes naturais está na existência de diferenças nas percepções, dos valores e na importância atribuída a esse fator entre indivíduos de culturas diferentes ou de grupos sociais econômicos distintos em ambientes distintos (FERNANDES, et.al., 2004, p. 02). Apesar das imposições legais, as atitudes desenvolvidas pelas comunidades de uma APA, sem a conscientização e/ou o acompanhamento constante de uma autoridade legal, trazem consigo implicações ambientais bastante significativas com poder de alteração dessa paisagem. A compreensão do modo como essas comunidades vêem e se relacionam com o meio ambiente é imprescindível ao sucesso da conservação proposta. O estudo da percepção ambiental torna-se então, fundamental para que se possa compreender melhor as inter-relações entre o homem e o ambiente: seus anseios, satisfações, insatisfações, julgamentos e conduta. Assim, a educação ambiental exercida em Unidades de Conservação (UC’s) constitui uma importante ferramenta para subsidiar o debate ecológico, propiciando a inter- 3 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ relação dos processos de aprendizagem, sensibilização, questionamento e conscientização na prática da conservação ambiental, fundamental para a formação de cidadãos críticos e plenos (JACOBI, et. al., 2004, p. 02), pois como afirma TUAN (1980): “Os problemas humanos quer sejam econômicos, políticos ou sociais, dependem do centro psicológico da motivação, dos valores e atitudes que dirigem as energias para os objetivos. As atitudes e crenças não podem ser excluídas nem mesmo da abordagem prática, pois é prático reconhecer as paixões humanas em qualquer cálculo ambiental. (...) e de algum modo todos eles se referem à maneira pela qual os seres humanos respondem ao seu ambiente físico – a percepção que dele têm e o valor que nele colocam”. (TUAN, 1980, p. 01 e 02). Na realidade houve o desenvolvimento de políticas públicas voltadas à conservação do meio ambiente. Porém, a consciência ambiental ainda necessita ser despertada por meio de práticas voltadas diretamente à população envolvida. Na realidade, o processo decisório concernente à política de preservação e conservação dos recursos naturais implica na consideração das diferenciações regionais e locais, por meio da elaboração de planejamento como norteador de uma gestão ambiental dinâmica. 1.1 TEMA O tema desse estudo se constitui na avaliação da percepção ambiental segundo metodologia de análise oral e visual dos moradores situados na Vila de São Sebastião de Arapixi, que pertence ao município de Chaves-PA 1.2 HIPÓTESES As hipóteses levantadas foram as seguintes: a) A percepção ambiental é formada segundo as informações obtidas ao longo da formação de um indivíduo; b) O comportamento desenvolvido é fortemente influenciado pela percepção que o homem tem sobre o ambiente; c) A conservação de uma área é realizada a partir da ação de indivíduos conscientizados. 4 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ 1.3 OBJETIVOS O objetivo geral da pesquisa é o de analisar a percepção ambiental e a qualidade de vida dos moradores situados na Vila de São Sebastião de Arapixi, no município de Chaves, que faz parte da Área de Proteção Ambiental do Arquipélago do Marajó – PA. Enquanto objetivos específicos buscaram-se compreender as relações entre a percepção ambiental e a qualidade de vida em áreas de proteção ambiental. Identificar os principais problemas socioeconômicos e fazer uma analise da participação socioeconômica (emprego e renda) dos moradores da Vila. Utilizar os resultados da analise da percepção ambiental como indicativos para a elaboração e implementação de ações que visem à melhoria da qualidade de vida dos moradores. 2. METODOLOGIA O desenvolvimento desse estudo exige uma metodologia apropriada, que consiga, de modo conjunto identificar as formas de expressão oral e visual do ser humano acerca de sua percepção sobre meio ambiente natural. A identificação conjunta é imprescindível na comparação entre o que é “falado” e o que é “observado” por parte de cada entrevistado. Os procedimentos metodológicos dividem-se em duas fases: Primeira fase: A pesquisa bibliográfica e documental será desenvolvida ao longo de todas as etapas da pesquisa, fornecendo subsídios teóricos para sua execução, sendo também responsável pela coleta e análise de todos os documentos oficiais e legislações incidentes sobre a área em estudo, além dos estudos sobre: sustentabilidade, intervenções em áreas de preservação ambiental, percepção ambiental e relações entre percepção ambiental e qualidade de vida. A segunda fase: Terá como objetivo reconhecer a área de estudo, a fim de viabilizar a etapa de coleta de dados como o perfil socioeconômico dos moradores, as condições socioambientais desses espaços, além de definir as questões, os objetivos e estratégias da pesquisa (entrevistas com moradores e lideranças locais). Envolverá as seguintes etapas: apresentação do projeto a órgãos competentes e lideranças comunitárias, observação direta, entrevistas, sistematização e análise dos conteúdos, acompanhado de revisão bibliográfica inicial. 3. A ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DO ARQUIPÉLAGO DO MARAJÓ A Lei nº 9.985, de 18/07/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC estabelece sua criação associada à seleção de áreas significativas, ou seja, 5 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ refere-se à escolha da localização e à conformação desse espaço territorial, mediante o objetivo de proteção e manejo (MILLANO, 2000 apud DIEGUES, 1996, p. 21). De acordo com o SNUC, há três formas de implementação de unidades de conservação no Brasil: àquelas que não permitem a presença do homem exceto, em alguns casos, para visitação pública; às que permitem a presença humana em casos específicos, como populações tradicionais e povos indígenas; e aquelas que consideram legal a presença humana em seu interior, inclusive com o desenvolvimento de atividades controladas, direta ou indiretamente, pelo Estado, como é o caso especifico das Áreas de Proteção Ambiental brasileiras (CABRAL & SOUZA, 2005, p. 12). Dessa maneira a elaboração do decreto de criação de uma Área de Proteção Ambiental se constitui num instrumento da política ambiental, interessante no ponto de vista socioeconômico, por caracterizar-se como área de desenvolvimento sustentável, na qual as atividades humanas devem ser exercidas com responsabilidade, no sentido de permitir integridade e manutenção da qualidade ambiental do referido espaço em dimensão intra e intergerencial. (CABRAL & SOUZA, 2005, p. 47). Dentro desse contexto a Área de Proteção Ambiental se apresenta como um dos importantes instrumentos utilizado pelo poder público para proteger e conservar uma parte do território que se encontra sob o domínio de particulares e apresente também características naturais relevantes para tal procedimento. Essa área mesmo pertencendo a seus proprietários terá um controle do uso do solo e dos recursos naturais, onde serão desenvolvidas atividades ecologicamente sustentáveis, tendo um retorno econômico para a população que nela reside, levando em consideração suas especificidades sócio-culturais. Segundo (SOUZA, 2000 apud CABRAL & SOUZA, 2005, p. 49) a abordagem sistêmica do meio ambiente, por meio da gestão ambiental, propicia uma aplicação mais próxima da realidade, pois cria canais de comunicação nos quais os fatores ambientais são identificados, analisados, ponderados e administrados, observando inúmeras áreas do conhecimento, permitindo, assim, a compreensão global dos problemas e também a aplicação de soluções ambientalmente mais adequadas. Partindo desse pressuposto, para a criação de uma Área de Proteção Ambiental, faz-se necessário a elaboração de um plano de gestão ambiental, que visa planejar e orientar a gestão integrada, descentralizada e participativa, de modo a assegurar a conservação do patrimônio natural e a melhoria da qualidade de vida das populações que vivem na área. Busca também estabelecer diretrizes e orientar programas, projetos e ações que venham a ser empregados na unidade de conservação, envolvendo assim as diversas esferas do poder público, como também, os moradores que ali residem. 6 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ Sendo assim, a APA Marajó é a maior unidade de conservação do estado do Pará, com 5.500.000 hectares ou 55.000 quilômetros quadrados, e também considerada a maior unidade de preservação do Brasil. O limite da área é com o oceano Atlântico, o rio Amazonas e a baía do Marajó. Essa Unidade de Conservação foi criada pelo artigo 13 da Constituição Estadual do Pará, de 05 de outubro de 1989, devendo o Estado, levar em consideração a vocação econômica da região, ao tomar decisões com vista ao seu desenvolvimento e melhoria das condições de vida da gente marajoara. Figura 1. Área de abrangência da APA MARAJÓ. Fonte: Sema (2010) Abrange os municípios de Afuá, Anajás, Breves, Cachoeira do Arari, Chaves, Curralinho, Muaná, Ponta de Pedras, Salvaterra, Santa Cruz do Arari, São Sebastião da Boa Vista e Soure. Inserido na conjuntura do Arquipélago marajoara o município de Chaves teve sua origem relacionada ao período colonial, mais precisamente à organização do espaço pelas Missões na aldeia dos índios Aruans, que habitavam todo o litoral do Marajó. Com uma população de 17.572 habitantes distribuídos principalmente na zona rural, o município de Chaves está localizado no Estado do Pará, na zona litorânea do Marajó. Pertencem a Chaves ainda as localidades de Prainha, Arrozal e Arapixi (Figura 2). A área deste município é de 9.695 Km² e representa 1.948 % do Estado do Pará, 0.3396% da região norte e 0.154% do Brasil (PLANO DIRETOR, 2006). O Rio Arapixi é considerado um dos principais acidentes geográficos do arquipélago do Marajó no município de Chaves. A vila de São Sebastião do Arapixi apresenta uma população com aproximadamente 387 famílias, e está localizada na margem direita do referido rio. 7 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ Figura 2 – Mapa de localização da Vila de São Sebastião de Arapixi. Fonte: IBGE (2005) Apesar de a área de estudo apresentar potencialidades naturais, observa-se também a existência de práticas de uso do solo e manejo dos recursos naturais, que se não forem devidamente orientadas e controladas podem provocar a degradação ambiental, que como conseqüência traz resultados negativos, como alteração e desequilíbrio do meio ambiente, prejudicando assim o ecossistema envolvido. Um exemplo disso é que às margens do rio Arapixi, estão situados um lixão a céu aberto e o cemitério da Vila. Figura 3 – Vista aérea da Vila de São Sebastião de Arapixi. Fonte: Vilhena, 2009 8 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ A ocupação humana sem planejamento, por meio de suas atividades contamina os cursos d’água; as práticas incorretas do uso do solo vêm provocando problemas acentuados como, erosão e assoreamento dos rios que é prejudicial para a longevidade dos recursos hídricos dessa região; a pecuária acarreta por sua vez, pisoteio e compactação do solo; a população residente apresenta renda média-baixa. Considerando os aspectos acima citados, é possível verificar que a população situada nos limites territoriais da APA apresenta características próprias que implicam em ações utilitaristas, desprezando, em parte, as noções de manejo e preservação do meio ambiente que deveriam aplicar. Sabendo-se que as ações estão relacionadas à visão de mundo de cada indivíduo, tendese a inferir que os elementos naturais, para os moradores, têm valor enquanto recursos para a dominação e não para a preservação. Portanto, quando se trata em estudar e analisar a qualidade de vida das pessoas e as ações praticadas é importante trabalhar a partir da visão que cada grupo ou indivíduo tem do significado do termo “meio ambiente natural” e, principalmente, de como cada grupo percebe o seu ambiente e os ambientes mais abrangentes em que está inserido. São fundamentais na formação de opiniões e no estabelecimento de atitudes individuais, as representações coletivas dos grupos sociais aos quais os indivíduos pertencem. Daí a importância de se identificar qual a representação social que cada parcela da sociedade tem do meio ambiente natural. 4. PERCEPÇÃO AMBIENTAL DOS MORADORES DE ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL A percepção ambiental pode ser definida como a tomada de consciência do ambiente na qual o homem está inserido, em que cada indivíduo percebe, reage e responde diferentemente, frente às ações sobre o meio em que vive (FERNANDES, et al, 2004, p. 01). Sendo assim, através da percepção ambiental são estabelecidas as relações de afetividade do indivíduo para com o ambiente, suas expectativas, satisfações e conduta. As respostas ou manifestações são, portanto, resultados das percepções, dos processos cognitivos, julgamentos e anseios de cada indivíduo. Segundo Ferrara, 1999, é condição da percepção ambiental gerar conhecimento a partir da informação retida, codificada nos usos e hábitos. Percepção é informação na mesma medida em que informação gera informação: usos e hábitos são signos do lugar informado que só se revela na medida em que é submetido a uma operação que expõe a lógica de sua linguagem. A autora considera a percepção ambiental como uma atividade de interação do homem com o seu meio, levando em consideração as trocas de informações e conhecimentos prévios, a partir das 9 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ experiências, escolhas e comportamentos que irão caracterizar aquele ambiente (FERRARA, 1999, p. 151). Percepção é tanto a resposta dos sentidos aos estímulos externos, como a atividade proposital, na qual certos fenômenos são claramente registrados, enquanto outros retrocedem para a sombra ou são bloqueados. Muito do que percebemos tem valor para nós, para a sobrevivência biológica, e para propiciar algumas satisfações que estão enraizadas na cultura (TUAN, 1980, p. 04). Segundo TUAN, 1980, essa percepção ocorre através de mecanismos perceptivos, que são dirigidos por estímulos externos, captados pelos cinco sentidos. Apresentando-se em dois aspectos: o cognitivo e o afetivo. O cognitivo é aquele que compreende a inteligência, incluindo as motivações, humores, como também os conhecimentos prévios. A mente organiza e representa a realidade percebida através de esquemas perceptivos e imagens mentais. Enquanto o afetivo está relacionado aos sentimentos e laços que o indivíduo desenvolve em relação ao meio em que está inserido. Portanto o aspecto mais importante é o cognitivo, enquanto que o afetivo é considerado como a energia que envolve o sistema. Dessa maneira, a afetividade é o impulso que direciona a percepção, ou seja, a emoção da vinculação das pessoas ao seu espaço. O indivíduo processa mentalmente as informações que o meio e a herança cultural lhe oferecem e a conduta é construída mediante o equilíbrio entre os fatores internos e externos. Portanto, percepção ambiental é uma forma de conhecimento, processo ativo de representação que vai muito além do que se vê ou penetra pelos sentidos, mas é pratica representativa de claras conseqüências sociais e culturais. A percepção entendida nessa dimensão não é apenas conseqüência de estímulos que do exterior atuam sobre a sensibilidade do individuo, mas ao contrário, supõe uma elaboração de informações que ocorrem no seu interior (FERRARA, 1999, p. 18). Ainda segundo Ferrara, 1999. (...) a imagem aponta para a primeira e maior característica da percepção ambiental como forma de informação do local e sobre o local, ou seja, a percepção ambiental não se opera como totalidade, mas como processo que se desenvolve entre signos aglomerados sem convenções que criam uma membrana de opacidade, de neutralidade significativa do ambiente (FERRARA, 1999, p. 18). Desse modo a percepção ambiental supõe a capacidade que o ser humano possui de gerar informações a partir dos impactos ambientais, que constituem seu cotidiano, a partir dessa 10 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ produção, o ser humano conhece seu ambiente e é capaz de, sobre ele produzir significados e ações. O conhecimento de como e porque as pessoas agem de determinada forma, associado ao levantamento da organização comunitária, das redes de influência e da intensidade e forma de participação da comunidade e suas organizações, permite determinar onde e como agir para promover a participação de todos os envolvidos num manejo mais adequado do ambiente natural. Nesse sentido, o estudo prévio sobre a percepção ambiental de uma determinada população pesquisada, irá indicar as características do grupo, levando pesquisadores e planejadores ao seu conhecimento e ao desenvolvimento de programas definidos de acordo com a identidade local, seus valores, sua forma de enxergar, interpretar e se relacionar com o ambiente. Dessa forma é possível promover a participação ativa de grande parte do grupo no processo de educação ambiental. Por meio do conhecimento de como as pessoas percebem e compreendem os diferentes ambientes de seu convívio é que são obtidos dados singulares e demonstrativos sobre o modo de como elas desenvolvem suas atividades e se relacionam com a natureza, determinando desde as coisas mais sensíveis e simples, até as mais complexas. (FERNANDES, et al, 2004, p. 01). A percepção conseqüentemente influência o comportamento humano, mas para manter um ambiente de qualidade, o comportamento precisa ser dirigido para atos específicos. Esses atos precisam ter precedência sobre outras ações que irão refletir em diferentes valores. Os hábitos pessoais transmitem as prioridades de valor de um indivíduo, e as práticas exercidas no ambiente devem ser voltadas para valores ambientais. A informação e educação do público consideram-se indispensáveis para o desenvolvimento de atitudes direcionadas à ética ambiental. Contudo, o controle do ambiente deve influenciar o comportamento grupal, atraindo assim a participação de muitos indivíduos para a consecução de metas ambientais comuns, que irão promover a conscientização das pessoas sobre os problemas ambientais. O despertar dessa conscientização consiste em informar o publico sobre a relevância de um fenômeno para suas vidas. Informar no sentido de educar. Assim, por meio da participação ativa da população nos assuntos ambientais é possível diagnosticar os interesses relativos a essas questões. Torna-se importante então, para a definição e implementação de projetos de educação ambiental, que se conheça o público-alvo, no que diz respeito às suas características econômicas, culturais e educacionais, seus conhecimentos sobre a problemática ambiental, verificado por meio do estudo de percepção ambiental. Consideram-se então necessários diversos componentes para se atingir todas as dimensões abrangidas pela educação ambiental: interesse e conhecimento acerca do meio ambiente natural, 11 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ postura crítica e consciência diante dos próprios hábitos (JACOBI, et al., 2004, p. 02). Desse modo a educação ambiental é definida como um processo de reconhecimento de valores e clarificação de conceitos, objetivando o desenvolvimento das habilidades e modificando as atitudes em relação ao meio, para entender e apreciar as inter-relações entre os seres humanos, suas culturas e seu meio biofísico. Estando também relacionada com a prática das tomadas de decisões e a ética que conduzem para a melhoria da qualidade de vida (SATO, 2003, p. 23). A educação ambiental é reconhecida também como um processo que consiste em propiciar às pessoas uma compreensão critica e global do ambiente, para elucidar valores e desenvolver atitudes, que lhes permitam adotar uma posição participativa a respeito das questões relacionadas com a conservação e adequada utilização dos recursos naturais, para melhoria da qualidade de vida e a eliminação da pobreza extrema e do consumismo desenfreado (MEDINA,1998, p. 70). Para que os projetos de educação ambiental sejam efetivos deve-se promover simultaneamente, o desenvolvimento de conhecimento, de atitudes e de habilidades necessárias à preservação e melhoria da qualidade ambiental. Nesse sentido a elaboração de estratégias de educação ambiental baseia-se em estudos prévios sobre percepção ambiental. De acordo com o que foi abordado anteriormente, serão realizadas entrevistas com a finalidade de verificar a relação que os moradores demonstram ter com o lugar onde vivem, a fim de atingir os objetivos propostos anteriormente. 5. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES A necessidade de produzir conhecimentos ou criar novas metodologias na área de gestão ambiental, como instrumentos capazes de produzir efeito social e ambientalmente desejável, seja para minimizar e/ou até mesmo impedir que agressões ambientais de natureza grave, decorrentes da má gestão pública municipal com grande descaso da população, quer seja pela omissão ou conivência, relacionadas ao rio Arapixi – Ilha de Marajó, bem como, contribuir para o desenvolvimento da Educação Ambiental a nível local/global enquanto uma política publica capaz de promover a conscientização ecológica que nos permita refletir sobre os problemas ambientais que afetam a qualidade de vida das pessoas, possibilitando descobrir as causas dos problemas, procurando encontrar soluções alternativas e através dos diversos mecanismos de participação comunitária contribuir para a construção de uma proposta de EA que corresponda aos interesses da comunidade. Após as primeiras observações in-loco e algumas pesquisas documentais, foi observado que apesar de ter sido instituída com o objetivo de elaborar e executar o zoneamento ecológico- 12 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ econômico, visando à conservação da biodiversidade, o desenvolvimento e melhoria da qualidade de vida da população marajoara; preservar as espécies ameaçadas de extinção e amostras representativas dos ecossistemas e implementar projetos de pesquisa científica, educação ambiental e ecoturismo, podemos afirmar que todos esses objetivos caminham a passos lentos, embora o processo de criação da APA-Marajó tenha sido formalizado em outubro de 1989. Em conversas informais com os moradores da Vila de São Sebastião de Arapixi, fica evidente que existe uma confusão entre as reuniões que aconteceram na década de 80, para a criação da APAMarajó e as reuniões que ocorreram a partir de 2008, que objetivaram a criação da Reserva de Biosfera do Marajó (Rebio Marajó). Muitos dizem não se lembrar de reuniões ocorridas no período da criação da APA e sim das que aconteceram para a Rebio Marajó. Alem do seu status preceituado na Constituição do Estado do Pará (Art. 13), o Arquipélago do Marajó já é estabelecido por Lei Estadual como APA (Área de Proteção Ambiental) – privilégio jurídico facultado pelo SISNAMA (Sistema Nacional de Meio Ambiente) – conjunto consolidado de Leis ambientais que conformam a macro-política pública ambiental-ecológica do Estado Nacional. O status APA torna uma área ecológica protegida oficialmente contra processos de intervenção artificial que possam degradar os ecossistemas. O atual sistema de Unidades de Conservação de Proteção Integral e Uso Sustentável, na região da costa norte do Brasil, é ainda insuficiente para garantir a conservação e o manejo racional dos recursos naturais. É preocupante o fato de uma APA, criada desde 1989, ou seja, passados mais de 20 anos, ainda não apresentar seu conselho gestor, e por conseqüência o plano de manejo, essencial à sua gestão. Se falta vontade política por parte do poder público local, o que diremos dos órgãos públicos ambientais e das ONGS ambientalistas, que permitiram que tal situação se estendesse ao longo de tanto tempo? É de lamentar que tais mandamentos legal e constitucional, respectivamente, no que se refere à área do Marajó, não venham contando com a devida observância e o necessário trato oficial, por parte dos poderes públicos e das autoridades responsáveis, em geral, de todos os níveis, incluindo o Ministério do Meio Ambiente, o IBAMA e a SECTAM, como seria de esperar-se. Sequer os referidos mandamentos e suas condições essenciais de proteção e preservação do complexo Marajó têm sido divulgados para a população marajoara que desinformada em seu coletivo informal, permanece alheia às obrigações socioambientais, o que resulta em detrimento à integridade ecológica enquanto a sociedade civil não venha a ser instruída e incentivada a assumir sua condição coletiva de cidadania detentora da propriedade ambiental marajoara. 13 V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis – SC – Brasil _______________________________________________________ 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CABRAL, Nájila Rejanne Alencar Julião; SOUZA, Marcelo Pereira. Área de proteção ambiental: planejamento e gestão de paisagens protegidas. São Carlos: Rima, 2005.158p. DIEGUES, Antônio Carlos Sant’ana. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo: Hucitec, 1996. 169p. FERNANDES, Roosevelt Souza, et al. Uso da percepção ambiental como instrumento de gestão em aplicações ligadas às áreas educacional, social e ambiental. Disponível em <http//:www.redeceas.esalq.usp.br / Percepção_Ambiental.pdf> Acesso em 05 de dezembro de 2009. FERRARA, Lucrecia D’ Alessio. Olhar periférico. São Paulo: Edusp, 1999.277p. GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. São Paulo: Contexto, 2004.148p. JACOBI, Claudia Maria; FLEURY, Lorena Cândido; ROCHA, Ana Carolina Costa Lara. Percepção ambiental em unidades de conservação: experiência com diferentes grupos etários no parque estadual da Serra do Rola Moça, MG. Belo Horizonte: Anais do 7º Encontro de Extensão da UFMG, 2004. p. 01-07. MEDINA, Nana Mininni. O desafio da formação de professores para educação ambiental. In: PEREIRA, Carvalho. Educação ambiental: ação e conscientização para um mundo melhor. Belo Horizonte: SEE – MG, 2002. p.69-84. PARÁ, Plano Diretor Municipal – POM – PA, Registro de Informações Municipais Preliminares, Chaves, 2006. SATO, Michèle. Educação ambiental. São Carlos: Rima, 2003.66p. TUAN, Yi-Fu. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. São Paulo: Difel, 1980.288p. 14