III ENECS - ENCONTRO NACIONAL SOBRE EDIFICAÇÕES E COMUNIDADES SUSTENTÁVEIS DESENVOLVIMENTO DE UM AQUECEDOR SOLAR DE ÁGUA DE BAIXO CUSTO E FÁCIL INSTALAÇÃO Marcelo Figueira de Mello Precoppe ([email protected]) Acadêmico em Engenharia Florestal/ Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” / USP. Sergio Oliveira Moraes ([email protected]) Professor Doutor/ Departamento de Ciências Exatas/ Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” / USP. RESUMO Este projeto visa difundir e capacitar o cidadão de baixa renda, escolas e outros a construir um aquecedor de água que atenda uma família de quatro pessoas, e cujo custo final, com acessórios e componentes, não ultrapasse o valor de R$ 150,00. O aquecedor utiliza um tambor metálico de 200 litros pintado com tinta preta fosca, manta metálica para servir de refletor e tubo de polietileno para a condução de água. O tambor para reservatório e aquecedor de água e a manta refletora são posicionados sobre um cavalete feito de madeira proveniente de caixas de frutas, voltados para o norte e com inclinação acompanhando a latitude do local. Palavras-chave: aquecimento solar, aquecedor popular, aquecimento de água. DEVELOPING A LOW COST AND EASY TO INSTALL SOLAR WATER HEATER ABSTRACT This Project aims to train people to build a low cost solar water heater; it is mainly focused on low income families and public schools. The system can supply a 4 members family and the final cost, including the material and installation, is less than R$ 150.00. It is an integrated system where the collector and the reservoir is the same piece: a 200 liters re-used black metal tank. To increase solar incidence an aluminum sheet is placed underneath it. The water is conducted through polyethylene hoses. The structure is placed facing north, over an easel which the inclination depends of the latitude of the local. The easel is build with discarded wood fruit boxes. Keywords: popular solar water heater, low cost solar water heating system 1. INTRODUÇÃO O aproveitamento da energia solar é uma preocupação bastante antiga em todo o mundo, contudo, só nas últimas décadas foram aprimoradas técnicas que possibilitaram a construção de componentes, que tornaram viável sua utilização com alto rendimento e custos compatíveis com outras fontes clássicas de energia. No Brasil, apesar das imensas áreas propícias para captação da radiação solar, ainda hoje não há uma política explícita para sua utilização. O desenvolvimento de equipamentos adequados ficou bastante prejudicado, também, pela falta de um padrão construtivo, o que ocasionou, ainda, a incompatibilidade na adaptação dos coletores às construções civis que quase sempre não são projetadas para recebê-los corretamente. Desta forma, ocorreu uma crescente preferência por outras formas de aproveitamento de energia em detrimento da energia solar, fato que só agora passa a ser modificado em função de razões econômicas e ecológicas (NEYELOFF, 1981; SILVA, 1992; HERGE-VIGIAL e SUAREZ, 1991). As crises na geração e distribuição de energia elétrica, aliadas ao seu alto custo, têm cada vez mais reforçado a necessidade de sua utilização racional e consciente. Recentes estudos realizados por empresas do setor de geração e distribuição de energia elétrica mostram a existência de um pico de demanda de potência elétrica entre 18 e 19 horas. Uma análise em separado considerando apenas o consumo residencial mostra um pico de demanda ainda mais intenso durante esse horário. As evidências indicam que a maior contribuição para o surgimento deste pico se deve ao aquecimento de água através de chuveiros residenciais. No uso doméstico, estima-se que 26% do consumo de energia elétrica sejam devido ao aquecimento de água nos chuveiros elétricos (LABSOLAR, 2001). Embora o sistema convencional de aquecimento por energia solar que utiliza placas coletoras e reservatório de água quente seja bastante atraente do ponto de visto do uso racional de energia elétrica, seu custo é ainda proibitivo para a população de baixa renda. Some-se a isto o hábito de consumo de nossa população que faz desse sistema um “desperdiçador” de água, uma vez que não nos acostumamos ainda a racionalizar seu uso, isto é, a economia de água durante o banho. O volume de água envolvido nos sistemas de duchas (chuveiros com aquecimento solar ou a gás) é bastante maior que no chuveiro elétrico, onde o próprio aquecimento de água é função da abertura do registro e não só da potência do aparelho empregado. Para tentar equacionar simultaneamente as variáveis: diminuição da utilização de energia elétrica, baixo custo, facilidade de implantação do sistema e racionalização da utilização da água é que se desenvolveu o presente projeto: utilizar materiais acessíveis, facilmente encontrados no comércio e instalação que não necessite de alterações estruturais e hidráulicas. 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1. Construção e instalação O sistema é composto de um tambor de ferro galvanizado, pintado de preto fosco, malha de alumínio para reflexão da luz para o tambor (Figura 1), e cavalete de madeira construído com caixas-de-fruta descartadas (Figura 2 e Figura 3). O cavalete serve para inclinar o tambor, e sua altura depende da latitude do local; utiliza-se a latitude adicionada de mais 15 graus, objetivando obter raios perpendiculares no período de inverno – o mais crítico para o aquecimento da água. O refletor é posicionado de baixo do tambor e apoiado no cavalete (Figura 4). A estrutura fica voltada para o norte. Para evitar a perda de calor por convecção e para capturar as ondas de infravermelho coloca-se um plástico de estufa ao redor do tambor (Figura 5). Figura 1 – Um tambor galvanizado pintado de preto funciona como coletor e reservatório. Figura 2 – A madeira da caixa-de-fruta descartada é utilizada para a construção do cavalete. Figura 3 – Cavalete para o apoio do tambor construído com madeira de caixa-de-fruta. Figura 4 – Refletor é colocado sob o tambor para aumentar a incidência. Figura 5 – Plástico ao redor do tambor evita perdas por convecção e impede a perda de radiação de ondas longas. Objetivando a fácil instalação, utiliza-se a água do cavalete da água-de-rua, fazendo-se desnecessário mudanças de encanamento e drenagem da caixa d’água. Coloca-se um T de PVC antes da torneira do cavalete, no qual é colocado um adaptador de polietileno (Figura 6). Desta saída, conecta-se a mangueira de polietileno que conduz a água até o banheiro. Esta condução é externa e a mangueira passa por dentro de garrafas PET para que a água seja aquecida durante seu transporte, funcionando como um pré-aquecedor (Figura 7). Evita-se a quebra de parede fazendo a mangueira entrar pela própria janela do banheiro (Figura 8). No banheiro, próximo ao registro do chuveiro coloca-se uma torneira para o controle da vazão de água quente. O chuveiro fica então com duas torneiras, a original com água da caixa d’água (fria) e a torneira que leva a água para o aquecedor (quente) permitindo temperar a água para o banho (Figura 9). Depois do registro a mangueira sai do banheiro e segue para o aquecedor, que pode estar localizado acima ou a baixo do chuveiro pois é a pressão da água-de-rua que conduz a água (e não a pressão da caixa d’água). Figura 6 – Com um T faz-se o desvio da água do cavalete da rua para o aquecedor. No detalhe o T e o adaptador de polietileno em PVC. Figura 7 – Mangueira de polietileno passa por dentro de garrafas PET, funcionando como um pré-aquecedor. Condução externa evita reformas. Figura 8 – Mangueira entra pela janela fazendo-se desnecessária reformas na residência. Figura 9 – No banheiro a torneira original passa a ser de água fria e a do polietileno de água quente. No aquecedor, a água fria entra pela parte inferior do tambor e a água quente sai pela parte superior (Figura 10) voltando para o banheiro – passando pelas garrafas PET. No cano do chuveiro é colocado um T por onde a água quente entra (Figura 11). Figura 10 – No aquecedor a água fria entra pela parte inferior do tambor e sai pela parte superior. Figura 11 – Entrada de água quente; tubulação externa dispensa mudanças no encanamento. 2.2. Viabilidade e eficiência Na residência onde está instalado o primeiro chuveiro solar, está sendo monitorada a temperatura da água resultante do aquecimento solar. Estas medidas permitem o estudo da economia gerada pelo aquecedor solar em relação ao convencional e, portanto a determinação do tempo de retorno do investimento. Os dados meteorológicos de Piracicaba são monitorados há dezenas de anos pelo posto meteorológico da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, o que permitirá a verificação da atipicidade ou não do período sob estudo. 2.3. Divulgação e capacitação Visando tornar esta tecnologia acessível a todos, oficinas e manuais serão realizados. Primeiramente será elaborado um guia de construção simplificado que conterá as informações e instruções básicas necessárias para aqueles que querem implantar um aquecedor em seus lares. Utilizando-se deste material será construído um aquecedor na Escola Estadual “Professora Jaçanã Altair Pereira Guerrini”, por meio de uma oficina que pretende envolver professores e moradores do bairro. Optou-se por realizar a oficina numa escola devido ao potencial de exemplificação que uma instituição de ensino possui. Com a construção e instalação do aquecedor solar na escola, espera-se despertar a curiosidade dos alunos e seus pais, além dos próprios servidores da instituição, a exemplo do que vem ocorrendo entre os vizinhos do local onde foi instalado o primeiro aquecedor. Ao término de 2003 será feita a publicação da versão final do guia prático de construção e instalação e contará com os resultados do estudo de viabilidade e eficiência. Os manuais serão disponibilizados nas principais bibliotecas da cidade No campus de Piracicaba da USP será realizada uma oficina no Centro de Ciências, Educação e Artes “Luiz de Queiroz”. Onde será aplicada a versão final do guia prático e será construído um aquecedor que fará parte do acervo do Centro de Ciências onde tecnologias adequadas para os lares serão apresentadas. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO (PRELIMINARES) O aquecedor foi construído na casa de um dos autores em maio de 2002 e está em pleno funcionamento desde julho do mesmo ano. As horas de serviço para a compra de material, construção e instalação não superaram 68 h. O custo total foi de R$ 149,70 como mostra a Tabela 1. Tabela 1 – Materiais e despesas para construção e instalação do aquecedor solar. Produto Preço (R$) Cavalete Madeira de caixa de fruta Grátis Parafusos 3,60 Pregos 2,10 Coletor e refletor Fundo para galvanizado (900 ml) 13,00 Água Raz (900 ml) 3,20 Esmalte sintético preto fosco (900 ml) 13,20 Rolo de pintura 1,99 Pincel 1,99 Tambor 200 litros recuperado 30,00 Manta de alumínio (3m2) 12,00 2 Plástico de estufa (3 m ) 14,30 Hidráulica Braçadeiras (6 unidades) 4,50 Fita veda rosca (50 m) 2,50 Registro esférico (PVC) 6,70 T em PVC 0,94 T em latão 3,70 Adaptadores de polietileno em PVC (3 un.) 2,13 Adaptadores de polietileno em latão (4 un.) 15,04 Bucha redutora em PVC (2 unidades) 3,54 Niple em latão 0,27 Tubo de polietileno (50 m) 15,00 TOTAL 149,70 O sistema tem atendido plenamente a demanda de consumo de água quente de uma casa de 3 residentes. Desde sua instalação, durante este 7 meses de utilização, somente nos meses de julho e agosto foi necessário ligar o chuveiro elétrico – na posição “morna” – quando o banho ocorria entre 2 e 9 horas da manhã. Mesmo com as atuais demandas de energias não-convencionais, ainda é grande o número de pessoas que desconhecem as aplicações e vantagens da utilização da energia solar. Isso se deve a inacessibilidade destas tecnologias e a insuficiência de informações dirigidas às grandes massas (BEZERRA, 1990). O sistema de aquecimento solar convencional está presente numa imensa minoria de lares pois se trata de uma tecnologia inviável as casas populares. O presente projeto vem suprir esta lacuna, apresentando por meio de guias práticos, não-acadêmicos, um sistema de aquecimento de água que necessita de pequeno investimento e dispensa mudanças hidráulicas e estruturais. 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEZERRA, A.M. (1990) Aplicações práticas da energia solar: aquecedor de água, fogão solar, secador de frutos, destilador de água, silo secador de grãos. São Paulo, Nobel. HERGE-VIGIAL, J.L., SUAREZ, R. (1991) Analysis of a plastic solar collector. Energy Conversion. Management, v.31. LABSOLAR (2001) Laboratório de Energia Solar/ Departamento de engenharia Mecânica/ Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis – SC. Disponível em <http://www.labsolar.ufsc.br/portug/index.htm>. Acesso em: 17 de janeiro de 2003. NEYELOFF, S., BARTOK, J.R. (1981) Design, construction and evaluation of a low cost solar collector for rural applications. St. Joseph, USA: ASAE. PROCEL, ELETROBRÁS e PUC-Rio, (1997) Relatório 337, Pesquisa de posse de eletrodomésticos e hábitos de consumo: Eletropaulo: Relatório Básico, Rio de Janeiro - RJ. SILVA, L.A. (1992) Coletor de Polietileno: uma alternativa de aproveitamento de energia solar a baixo custo. Dissertação-Mestrado em Agronomia / Energia na Agricultura – Unesp. Botucatu - SP.