Programa de Assessoria a Pastoral (Pp)
JONAS
Paulo Cesar Bottas
Nancy Cardoso Pereira
Roberto Natal Baptista
Dario Geraldo Schaeffer
SebastiZio Armando Gameleira Soares
Paulo Roberto Garcia
Rolf Schuenemann
Mariano Marchitiello
Zwinglio Mota Dias
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CEDI Centro ~cumenicode Docurnentaqb e Informa@o
Av. Higien6pok. 983 - 0 1238 - S o Paulo SP Fone: (011) 825-5544
Rua Santo Amaro. 129 222 11 - Rio de Janeiro RJ Fone: (021) 224-6713
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Neste ano estaremos completando 500 anos de conquista
do nosso continente, pelos europeus. Com isso, estd sendo
avaliado todo o projeto de evangeliza~ao que marcou esse
perlodo.
Neste context0 cabe o livro de Jonas. l~Mosaicosda
B1bliaM n h e r o 4, recne vdrias reflexaes em torno do livro
deste pequeno profeta de poucas palavras.
Desejamos que esta leitura possa oferecer elementos
para uma discussao crftica sobre o significado de 1992.
Paulo Roberto Garcia
Programa de Assessoria
Pastoral
wMosaicos da BibliaIn refine textos do campo bXblico
aue circulam entre colaboradores e participantes da
produ~i30 de conhecimento do Pr
Pastoral.
poderao
Todos
os
textos
Afe Jonas!!! 0 profeta da covarde intolerancia, 04
Paulo Cesar Bottas
Todo o mundo habitado, 07
Nancy Cardoso Pereira
E a novidade veio de dentro da baleia, 11
Roberto Natal Baptista
Evangelizaqbo e Exploragbo
-
irmas de 500 anos, 16
Dario Geraldo Schaeffer
0 desencontro entre Jonas e Deus, 20
Sebastiso Armando Gameleira Soares
Jesus e os Marinheiros
-
Jonas e os discipulos, 24
Paulo Roberto Garcia
Jonas e a Cidade, 27
Rolf Schuenemam
Jonas...
humor, resmungos e andncio, 32
Mariano M a r c h i t i e l l o
A fragilidade do profeta suscita a sabedoria e a forga
do povo, 38
Zwinglio Mota Dias
0
4
Mosaicos dn Bfblie 4
- Jonas
AFE! !! JONAS
(0
profeta da covarde intolerancia)
Paulo C6sar Bottas
0 livro de Jonas 8 claramente didatico e evidencia a
miseric6rdia de Deus. At& ax, nada de mais. Indtil querer
ser mais didata que o prdprio escritor. No entanto, existe
uma dimensdo oculta da personalidade do profeta
sua
sobre as quais me parece
covardia e intolerancia
necess6rio uma pequena reflexdo. Quantas vezes somos tornados
de uma grande covardia e queremos transform&-la num ato de
coragem que atinge a intolerancia? Que Deus 6 maior que
nosso coraqdo, que sua loucura 6 mais s6bia que os homens;
que nao d6 pedra a quem lhe pede pdo s80 coisas sabidas mas,
talvez, nao interiorizadas na nossa pr6tica eclesial e, na
maioria das vezes, eclesidstica.
-
-
Jonas foge da face de Deus quando soube que o havia
chamado para profetizar. E vai para Tdrsis, que representava
aos olhos dos hebreus o fim do mundo. Como bom covarde e
traidor vai para os "cafundds do Judasu, na linguagem
popular. Entra no barco, desce para o fundo e donne
profundamente. Freud explica o 6bvio. S6 faltava Jonas
gritar: "Quero a minha mae!!!I1. A volta ao Gtero, a
dependsncia absoluta pelo apagamento da sua consciencia. 0
mar
cobre-se de faios, trovdes e a tempestade sacode o
barco e amedontra os marlnheiros, ecumenlcos, porque cada um
comeqava a gritar para o seu Deus (Jonas 1 , ) 0 nosso
covarde Jonas, dono da religido "verdadeiraI1, seguro da sua.
f6, 6 despertado pelo lloutroll,
de outra fi? e religido. k
cobrada a sua adesao ao momento existencial que desafia a
vida de cada um. Deus interv6m pel0 diferente do seu servo
que devia ser fiel. Deus interv6m e faz conhecer o seu
designio pelos slmbolos esot6ricos dos homens: jogam a
sorte, que cai sobre Jonas. 0 transcendente se manifests
pela sorte e Jonas 6 obrigado a declarar a sua fe: "Sou
hebreu e venero a Iahweh,o Deus do ceu, que fez o mar e a
terran (Jonas 1,9)
.
0s
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marinheiros
temem
e
fazem- justiqa
segundo
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Wicos
de Bfblie 4
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Jones
indicaqao da sorte pdblica de Jonas, da sua covardia. Antes
por&m, na sua miseric6rdia e piedade tentam salvar Jonas e
quanto mais se esforqam para atingir a praia tanto mais o
mar se enraivece. Pedem perdao para n%o ofender o Deus do
covarde profeta, langam-no ao mar, que se acalma, e rendem
culto cada um a seu Deus.
Assim termina o ciclo da covardia de Jonas...
seu segundo cimento.
negando o
Na sua segunda descida ao titero materno, Deus, na sua
misericerdia, se utiliza de um grande peixe, que a tradigao
popular identificou
como uma baleia-mamlfero dos mares.
Jonas fica corn terror e medo e parece arrepender-se diante
da situaqao de perigo e promete tudo para salvar a pele.
Diante de tanta generosidade e vontade de
converter-set
Deus nao duvida e sem vacilar tem miseric6rdia e salva
Jonas, atirando-o em Nlnive. Do seu terceiro nascimento, nas
praias de Nlnive, Jonas vai atingir as sombraa- da
intolerancia. Profetiza em Nlnive estipulando um prazo-de 40
dias para a convers%o. Como no dilCivio e no exodo, a
tentaqao do desert0 se faz por: sofrimento, expiagao,
esperanCa, jejum e oraqao. 0 rei decreta o tempo da
expiaqao: "Hornens e animais, do graddo e mitido, n%o provarao
nada! Eles nao pastargo e nao beberao 6gua. Cobrir-se-ao de
panos de saco, invocarao a Deus com vigor e se converterd
cada qual de seu caminho perverso e da violencia que estd em
suas maosn (Jonas 3,7-8).
Deus, vendo a sua prdtica e obras, se arrepende, volta
atr6s e ndo castiga Ninive, a grande cidade, "onde hd mais
de cento e vinte mil homens, que ndo distinguem entre
direita e esquerda, assim como muitos animaisu.
Jonas fica irado e, na sua intolerancia, cobra de
Iahweh dizendo: nNao era justamente isso que eu dizia quando
estava ainda em minha terra. Por isso fugi apressadamente
para Tarsis, pois eu sabia que tu 6s um Deus de piedade e de
ternura, lento para a ira e rico em amor e que se arrepende
do malN (Jonas 4 , 2 ) . Jonas fica t3o p... da vida, bate o pg,
mostra que esta "porraqul!! ! ! I 8 - com o seu aeao moscrando o
limite da garganta
e pede para MORRER. Deus ainda pergunta
qual o motivo de tanta I1brabezal1e ira. Jonas nao responde e
desafia de novo Iahweh. Sai da cidade, constr6i uma tenda e
fica vendo se a cidade vai ou nao ser destruida. Deus, com
uma santa paciencia, tenta evidenciar para Jonas a sua
miseric6rdia e faz crescer uma manoneira para lhe fazer
sombra e esfriar a cabega.
-
Qua1 nada, Jonas sacode os ombros para o gosto divino,
mas fica bem alegrinho com a mamoneira. Deus, para dar outro
toque em Jonas, manda um verme que seca a manoneira e ela
seca. Deus manda um sol e um vento que ardem a cuca de
Jonas. 0 profeta intolerante nao se d6 conta dos sinais de
-
Pv.
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Centro ~ c ~ i De
c DocunentegBo
o
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Higien6polis, 983
01238 SP
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Mosaicos da B f b l i e 4
- Jones
p & i ~6
Deus, e reafirma, que 6 melhor morrer do que viver s6 porque
Deus nao havia destruldo Nlnive. Para todo intolerante, a
ternura d torturante e o seu dogmatism0 d sem volta e sem
ningudm.
Jonas, o nosso ecologista primaz, tem pena da manoneira
que secou mas nao se compadece dos habitantes de Nlnive.
Mostra sensibilidade para com a natureza e a sua cegueira
para as coisas humanas. Jonas intolerante continua girando
em torno do seu umbigo, fechado ao gesto largo da
miseric6rdia, exigindo uma vinganqa que chega 2s raias do
sadismo.
Deus perdoa Nlnive. De Jonas ninguggl soube nada. 0
livro nao conta, termina com Deus mostrando-lhe a sua
babaquice: "Tu tens pena da mamoneira, que nbo te custou
trabalho e que nao fizeste crescer, que em uma noite existiu
e em uma noite pereceul' (Jonas 4.,10).
Dizem que Jonas morreu de enfarte, outros af imam. que
foi de blcera, outros que ficou louco de pedra. 0 certo
ningu6m sabe...
No tiltimo carnaval, juram que o viram contra o nu dos
homens e das mulheres, distribuindo panfletos, comunicados,
fazendo novenas e instigando o 6dio e a intolerancia. Jonas
nao consegue ser feliz , brincar ,
ser terno, nem amar
ningu6m. Continua proclamando que Iaweh vai matar todo mundo
e mandar pro inferno. Persegue os que nbo s%o o seu espelho,
manda calar a boca dos que profetizam, baixa decretos,
bulas, instruqdes.
0s colunistas sociais juram que ele se assumiu e tern
desfilado entre plumas e paetes nos bailes do Municipal com
a fantasia da sua cria~%o, Ho esplendor da vinganqa de
Iawehn, mas que fica irado e quer morrer porque nunca
consegue o primeiro prgmio.
E Iahweh, na sua ternura e piedade entre um sorriso e
outro continua tentando mostrar a Jonas a sua miseric6rdia e
quanao perae a pacigncia, de v e z em quando, m t r e uma
tentativa e outra, se desabafa no alto dos c0us, solta urn
raio seco, na imensidao azul e repete mais uma vez: AFE
JONAS ! !
Peulo Cbser Bottes C f r e i dominiceno, d r o da w i p e do Program & Assessoria B Pastoral
e da d i r e t o r i a do CEDI
Centro Ecunhico & Docunenta~Boe InformagBo; l assessor M Secretaria da
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Culture da Prefeitura Municipal de SBo Peulo.
Av. H i g i e n 6 p l i s . 983 e/c CEDI
01238 SBo Paul0 SP.
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llosaicoo
da Bfblia 4
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phgfm 7
Jones
TODO 0 MUNDO HABITADO
Nancy Cardoso Pereira
Sempre se falou da baleia e nem era baleia: era um
peixe grande. Mas nas hist6rias para as crianqas e no senso
comum E! tido quase como certo: foi uma baleia que engoliu
Jonas. Que outro peixe nosso conhecido poderia ser?
E que conhecemos poucos peixes grandes o suficiente
para engolir um profeta inteirinho.
Mas, algumas vezes Deus precisa de peixes enormes que
engulam profetas inteiros como process0 necessdrio de
conversao.
fi que os profetas tambgm precisam se converter.
A hist6ria de Jonas
conhecida.
Deus quer que Jonas converta Nlnive.
-.
Isto Jonas nao entende nem quer entender: Nlnive 6 a
grande cidade, capital do Impgrio que destruiu Jerusalem,
levando cativa as liderangas e deixando a terra assolada.
Por que agora esta proposta de profetizar em Nlnive?
Jonas n8o aceita a convocaqSo e toma caminho e decisgo
concrarias as oraenaaas por Deus. Para Jonas a grande cidade
de Nlnive n8o merece alternativa ou perspectiva: merece a
condenaqdo e o castigo de Deus.
Fechado no mundo de suas concepqdes aonde a boa nova de
salvaqdo 6 uma questao exclusiva e nacional, isto 6, que diz
respeito aos judeus e a JerusalE!m, Jonas n8o consegue pensar
a profecia em termos de todo o mundo habitado.
Trancado na compreensao de Deus que se molda aos
interesses do nacionalismo judeu, Jonas n80 consegue
perceber as implica~desinternacionlalistasda profunda crise
econamica e polltica que reduziu Israel a quase nada. Para
Jonas a proposta 6 de se fechar nos limites imediato- e
CEDI
Av.
- Centro Ecutmbico De Docuncntec:? c
- 01238 - SP - F? T z i :
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Inforrne~lo
'311) 825.5544
curtos da religiao nacional, fazendo-se de surdo 3s
exigencias de uma profecia que d& conta de todo o mundo
habitado.
A mensagem de Deus de crltica e salvaqdo na forma de
profecia ndo pode ser mudada. 0 profeta, sim.
Entao comeqa o processo de conversdo de Jonas.
E neste
importantes.
processo
o
conteGdo
e
a
metodologia
sao
Jonas vai
encontrar-se com gente diferente em
fuga. Marinheiros corajosos, senslveis e cheios de f6.
sua
De peixes, ventos, mares e vermes:
No confront0 que se estabelece a partir da tempestade
que ameaqa a vida de todos no barco, a espiritualidad-dos
marinheiros se mostra firme e senslvel, aberta a aprender
com a ftiria do mar e preocupada com a sobrevivgncia de
todos..
.
Mas Jonas se mantem insenslvel e isolado, incapaz de
aprender. Jonas vai para o pordo e d o m e , insenslvel h fGria
do mar e ao perigo que ameaqa a todos. Deus vai lanqar mao
das forqas e criatividade da natureza para converter Jonas.
Jonas e lanqado ao mar... porque ii sua fuga de Deus que
precipita as 6guas e o ciiu. J6 que o profeta nao consegue
perceber a fala da natureza toda as exigencias de Deus..
6
lanqado ao mar. 0 mar participa profeticamente da vontade de
Deus. 0 mar reage e responde aos prop6sitos divinos. 0 s
marinheiros, pel0 trabalho e conviv~ncia, conhecem o mar, e
podem falar de Deus a partir do mar. Assim que Jonas d
lanqado fora, o mar se acalma.
.
"E Deus ordenou que
Jonasa@(1,17).
urn grande
peixe
engolisse
E o peixe esta no iugar certo, na imra certa para
participar da vontade de Deus.
Em todo o pequeno livro, a natureza, animais e plantas,
ventos e sol, participam do processo de conversao do
profeta. 0 que Deus exige de Jonas ndo 6 somente que anuncie
a palavra prof6tica em Nlnive, mas que tenha uma compreensao
da totalidade. Que aprenda a perceber no outro, no
diferente, em toda a cria~do,a presenqa divina.
...
mas 96
Na barriga do peixe Jonas faz sua oraqdo
consegue pensar e ansiar pel0 Templo: "...p ensei que ndo
voltaria a ver teu santo TemploM ( 2 , 6 ) . Jonas continua preso
a sua-experigncia limitada-.-
Av.
CEDI - Centro E h i c o De Docrmmnta~Boe Infonne~Oo
Higien6poLis. 983 - 01238 SP - SP Tel: (011) 825.5544
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Hosaicos da B f b l i a 4
- Jones
phgina 9
Senslvel a vontade profgtica de Deus, o peixe sabe
aonde cuspir o profeta: em Ninive. Jonas vai sendo empurrado
para sua miss8o. 0 grande peixe foi sobrevivencia e abrigo,
processo e instrumento.
Mas o texto insiste em afirmar a insensibilidade de
Jonas. Eram precis0 tres dias para atravessar toda Nlnive.
Jonas, de m6 vontade, faz o percurso num dia. E o inesperado
acontece: Nlnive ouve a palavra profgtica e se converte.
Todos: desde os maiores, at6 os menores. 0 processo de
conversao a l c a n ~ ao pal6cio e o rei e ati! mesmo os animais
sao incluidos no jejum que 6 proclamado:
"...
NinguBm pode comer nada. Todas as pessoas e
tambgm os animais" (3,7).
Apesar de Jonas, apesar do profeta, a palavra de Deus
de crltica e julzo 6 acolhida e gera transformag80. Mudanga
que passa pel0 povo e pelas estruturas de poder..
o que
t a m b h diz respeito aos animais. Afinal, eles sdo atores
importantes nesta novela.
.
A iiltima cena i! triste. 0 profeta se irrita com Deus
porque teve misericdrdia da cidade. Jonas queria o rigor da
palavra que julga sem oferecer alternativa de salvagao.
Jonas prefere morrer a ser desmoralizado pela conversdo de
Nlnive. Na saida da cidade, Jonas constr6i um abrigo. Ao seu
lado nasce uma planta que vai oferecer sombra para alegria
do profeta.
No dia seguinte, um verme seca a planta a pedido de
Deus
.
Janas
se irritar com o vento quente que vai queimar
sua cabega e lamenta a planta que secou.
Deus conclui a hist6ria dizendo:
ItEssa planta cresceu numa noite e na noite
seguinte desapareceu. Voc6 nada fez por ela, nem a fez
crescer, mas mesmo assim cem pena aeiai EntZo, eu com
muito mais razdo, devo ter pena da grande cidade de
Nlnive, onde hd mais de cento e vinte mil criangas
inocentes e tambgm muitos animaisl@ (4,lO).
A histdria termina sem a conversao de Jonas.
Toda a natureza participou ativamente, com todos seus
movimentos e poderes da profecia, apesar do profeta. k que a
exigdncia da profecia diz respeito a todo o mundo habitado.
A palavra de Deus exige profetas que, solid6rios com a
humanidade
e
a
natureza,
rompam
0s
esquemas
institucionalizados da religido e nacionalismo estreito.
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CEDI
Centro Ecunkico De Docunenta~Poe InformegZo
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noseicos de B t b l i e 4
-
Jonas
pegina 10
A profecia ndo est6 trancada na vontade do profeta. A
profecia - juXzo e salvacao
est6 no trabalho dos
marinheiros e nos movimentos da natureza.
-
0 grande peixe e o verme, a tempestade e o forte vento,
o sol nascente e o vento vindo do leste, os animais e a
planta
todo o mundo habitado como fala profetica de Deus.
...
Quantos peixes grandes sera0 precisos para engolir os
profetas que ainda n80 aprenderam a ouvir a palavra de Deus
que sopra aonde quer?
Nency Cerdoso Pereire 6 pastore de l g r e j a Metodista no B r a s i l e fez mestredo em B t b l i e no
Institute Ecunhico de Pbs-Greduegio em C i k r i e s da R e l i g i l o , em Slo Bernerdo do Canpo.
Rue JosC Neves, 50/102H
04650
SBo Peulo
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CEDI
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+gins
Jonas
11
E A NOVIDADE VEIO DE DENTRO DA BALEIA
Roberto Natal Beptlsta
Era UM vez un care chernedo Jonas. Deus disse a ele: 08Fece-mun favor. D& un p f l o
at& a c i a de Nfnive e diga eo pow, de Lh para toner j e i t o e t r e t e r & se converter,
p o r w eu d o ando nada s a t i s f e i t o cam ales. Se as coises d o arderen, eles v h ver o que
acontuel *
Jones tanou un susto, quase caiu de costas, diente de un pedido tHo estrarho, p i s
Nfnive ere une cidade estrengeira, c a p i t a l da Assfria, o meior inimigo do povo de Israel.
Jonas respondeu:
"0 qw? 0 Senhor est6 pensendo que w sou doido? Nfio quero n m saber! Eles 6 que
se vireml 0 Senhor esth a f i m de eceber corn eles? Bem-feito! Melhor para d s . 0 Senhor 160
sebe que eles estHo doidos pare acaber corn a gente?"
Jonas G o teve &ides.
Foi at6 o porto da cidade, conprou une passegem nun navio,
a f i m de se mander pare ban longe. Fugir
...
Mas o pobre Jonas cku azer. 0 nevio einda nSo estava Longe da costa, qurtndo c c m g ~ w
ma tcapcstadc de errepiar os c a k l o s . 0 nevio balengava, os marirheiros corriirp de u lodo
para o w t r o , egerravmn-se eo mastro, m i e n socorro aos s u m deuses estrangeiron.
Jones d o estava nem af. Dormia trenqiiilamente, nune boa, recostado nun canto do
navio. Chegw o cornendante e Lhe passou un sebio: "Cane 6 que 6 , s w moco, n i o vai dar un
j e i t o ? P w m 6 voce? NH0 esth vendo o perigo? Por que voce n i o pede e s w Deus que nos Livre
desta tormente?Ia
E o mar f iceve cad8 vez meis bravo.
08Temosque descobrir o c u l p e d ~ ! ~ ~
lotcastigo de Deuso8, diziem os merinheiros.
Puando ouviu isto, Jones se a r r e p i w todo. 0s marinheiros, cano ere costune w l e
tenpo, t i r e r m a sorte para ver quern s e r i e o culpedo. E a sorte ( i s t o 6, o azar) ceiu em
a h i s t 6 r i a de sum fug..
cilna de quem? Adivinhe. Ceiu em cima do Jones, qua c m t o u e t&
Os marinheiros Lhe disseram:
todos..
YRap8z, isso
1-60 &
coisa que se face.
E agora? V
6 mrer
.I0
Jonas reconhecendo a sue rulpe disse e el-:
j e i t o de voces se salverern".
IoPodem me joger no mar.
0s marinheiras r i n d a f l z e r a n uma u l t i m o t m t a t i v a & &mar B costa.
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0
hico
#&kWto.
Mosaicoa de B f b l i a 4
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Jonas
@gin0 12
NPo tiverarn jeito. Jogarm Jonas no mar. E a tempestede Logo se ecelmou.
.
Tschikrumm..
Jonas caiu na Bgua. Veio un peixe daquelc tamenho e
Engoliu Jonas. Engoliu inteirinho.
Jonas f i c w t r e s dias e trCs noites dentro de un peixe. Devia ser
... nheecol
beleir.
JB
pensou?
Mas, depois desse pertodo, Deus fez o peixe langar Jonas na preia.
EntPo, Deus chegou e repetiu a mesme converse de antes: I1Veje se c r i e jeito,
Estou precisando que voce vB a Y f n i ~ e . . . ~
Jonasl
Deste vez, Jonas obedeceu. TembeaP, depois de una dessesl
Jonas chegou a Wfnive e f i c w abismedo com o tamenho da cidede. Andar u d i a
i n t e i r o peles ruas, gritando qw o povo &via so converter, porque, do contrhrio, a cideda
s a r i s &strut& em 40 d i m .
Inpressiomntel 0 povo wreditou, saborr nem conhecesse o s u j e i t o
atanrwiando a notfcia. Eles disseram: lVamos ebandoner o caminho perverso e p6r f i m b
v i o l h c i a . Todo mndol Qwrn sebe, o Senhor terA compeix6o de n 6 ~ ? ~
Isso
*
f o i o que todo o
povo fez.
Quando Jonas v i u que o povo havia se convertido, v i r w um fera. 0 que e l e queria
arrasede. E isso d o aconteceu.
memo 6 qw a cidede fosse &strut&,
Jonas retirou-se da c i d d e . Estava de rneu hunor. E disse a Deus: "Eu q w r o
morrer. E s t w desgostoso da vidaM.
Deus f i c w can pen8 do seu m i g o Jonas. Tlo cabegudo, m s t l o s i e t i c o
voce estB assim t l o nervoso, Jonas?"
-
wsrrr,
6
Upor que
J m , f o r e & cidedc, queris descenaer. Mas o s o l estava m i t o qumte, pegado
fogo. E n t l o Daus fez nascer un p4 &
bea ea cilne & cebega dele. W w s o a k a
gostosal', disse Jonas, s a t i s f e i t o . E dormiu at6 o w t r o die.
Mas Deus eprontou mais una: no outro die, bem cedo, mandou un verme rocr o p6 de
mamona. D i t o e f e i t o : o pe de menrne secou. Jonas, de novo, v i r w m a fera. 0 s o l nesceu
ainda mais quente. Jonas d o lltavan agiientando, parecia que i r i e morrer. De novo d e s e j w e
morte, dizendo: "E melhor morrer do que continuer vivendo deste elt to".
Deus perguntw a Jonas: "Escute aqui. Voce ache c e r t o f i c a r bravo deste j e i t o s6
por cause de un p6 & mamone?8m
Jonas d o teve dthida e respondeu no eto: "Acho certo, s i n
Senhorl 0 Senhor d o acha qw i s t o 6 um ~acanagear?~
Dcus d o perdeu tenpo. ~ ~ P oolhe
is
equi, seu c a b e ~ adural Voce d o ache qua doveria
se preocqaar e t e r pena & todo
assa p o v b & Wfnive'lm
F i m da histbrie...
(Extratdo da r e v i s t a i n f a n t i l I1AL6 M u d o u , no. 27/28, 1989, Tab060 da Serra, p. 1114).
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A primeira impressdo, quando lemos o livro de Jonas, 6
de que temos diante de n6s uma estdria para crianqa. Uma
est6ria muito divertida e cheia de aventuras.
A est6ria blblica do homem Jonas, que 6 engolido por um
grande peixe, encontra eco em outras culturas. Entre os
marinheiros fenfcios circulava uma lenda sobre um homem que
fora engolido por um grande peixe, ap6s uma tormenta. Este
peixe, mais tarde, o teria vomitado sobre a terra. Na
Grgcia, tambBm temos a lenda de Perseu e de Hgrcules. Este
Gltimo fora tragado por um monstro marinho e libertado ap6s
tres dias, completamente calvo.
0 livro de Jonas 6 um dos mais breves da Blblia. Possui
apenas 47 versos. Este pequeno livro, entretanto, nos cativa
pela enorme originalidade de seu contetido e pel0 seu belo
estilo.
0 que parece mais chamar a atenqao, porBm, sdo seus
enormes paradoxos. Em nenhuma outra parte da Bfblia
encontramos tantos. Logo de inlcio. a figura do profeta
realqa a nossos olhos. Vemos em Jonas urn anti-her6i. Um
profeta manhoso, desobediente, teimoso e nem um pouco
misericordioso. Como se ndo bastasse, ndo o encontramos
falando em JerusalBm ou qualquer outro lugar onde o ptiblico
pudesse ser os piedosos judeus. Encontramo-lo, isto sim,
falando aos pagdos na grande cidade de Nlnive. Deus tambgm
aparece para nos surpreender. Ndo o vemos preocupado corn a
salvaqdo de seu povo Israel. A sua aqdo e vontade parece s6
visar os pagaos.
0 estilo da narrativa tamb6m nos surpreende. 0 autor
sabia muito bem que ndo poderia trazer tamanha novidade
teolijgica e tamanha crltica 3 naqdo sendo atraves de um
conto tdo diferente como este. Um l i m o repleto de ditos
prof&icos,
como podemos encontrar nos demais profetas,
talvez, jamais atingisse os seus objetivos, tamanha a
novidade contida em Jonas.
Temos como pano de fundo a reforma de Esdras e Neemias.
estilo sapiencial nos permite situar o livro como
s6culo
V
a.C.
Jonas
revela
produto
do
final
do
caracterlsticas de grande conhecedor da tradiqdo e dos
profetas, do mundo (de Tdrsis a Nlnive), do comercio
marltimo, do mundo urbano e do culto. Podemos, inclusive,
situar o seu lugar sociol6gico em JerusalBm. Jonas O produto
da cidade.
0 seu
A iconografia das catacumbas 6 um impressionante
testemunho do impact0 que o livro de Jonas produziu na
igreja primitiva. Se observarmos a freqiiencia dos assuntos
pintados nas catacumbas iremos nos surpreender com o
I
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Ckseicos 6 B f b l i a 4
- Jones
p6gina 14
resultado. A cena do bom pastor aparece 114 vezes. Jonas
aparece em segundo lugar com 57 obras. Em terceiro, 53
vezes, temos a ressurreiplo de Lbzaro. Por que esta
freqiigncia? Iremos encontrar a resposta ao notarmos a funglo
das catacumbas; neste lugar de sepultura dos cristaos
encontramos os testemunhos da ressurrei~dode Jesus.
Mas qua1 a ligagao entre Jonas e Jesus? Temos o
testemunho desta ligapao nos evangelhos. Mateus, por
exemplo, narra que quando fariseus pediram um sinal divino
que autenticasse a missao de Jesus, este recorrera ao sinal
de Jonas: "assim como Jonas passou tres dias e tres noites
no ventre da baleia, assim tamb6m o filho do Homem passard
tree dias e tres noites no seio da terra8' (Mateus 12.40)
Jonas, portanto, pela prdpria boca de Jesus, vem iigurar a
imagem da ressurrei~ao.
.
Como simbolo da ressurreigdo, o livro de Jonas vem nos
trazer uma mensagem de renovagao e esperanga. Ressuscitar 6
nova chance, d novidade de vida. Como nbs precisamos, de
novidades a cada dia! 0 livro de Jonas 6 puro evangelho. Ele
nos convida a viver ao lado de um novo Deus.
0 livro de Jonas anuncia o Deus que vem. Ele 6 o Deus
criador de todas as coisas. Vemos os marinheiros forgarem
Jonas a confessar o seu Deus, assim como eles invocaram seus
deuses. Deus torna-se em Jonas verdadeiramente universal,
antecipando a mensagem do evangelho de Jesus. Ele 6 o deus
de todos, cheio de misericdrida e de ternura.
nunc cia, tambem um novo JavB, um novo Deus para o povo
de Israel. 0 autor do livro conseguiu atraves desta
narrativa, desta estarinha, trazer um ensino teoldgico
absolutamente exceptional. Ele questions o Deus desfigurado,
reduzido e legalista. Propde o ressurgimento do Deus
libertador, hist6rico de Israel.
Jonas, portanto, condena o nacionalismo de restringir a
salva~loe do reivindicar da graga e misericbridia s6 para
si. Portanto, reinterpreta a confissdo de fe. Entender a
mensagem de Jonas B questionar a p r e p r i a f5 d a q u e l e que a
entende. Questionar 15 buscar a novidade. f3 reinterpretar. f3
fazer m a nova leitura da realidade.
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lloseicw da B f b l i a 4
- Jones
Pegina 15
0 livro de Jonas fala a todos. Para o mundo langa a
esperanqa da renova~ao, de uma tgnova novidadeN. Na igreja .
nos obriga a olhar al6m dos muros que nos cercam e nos
dividem. Sera que nao somos todos n6s mais ou menos Jonas? E
se for verdade, que Deus 6 outro?
Roberto Natal Baptista 6 te6log0,
mestrando em B f b l i a no Institute E c d i c o & P6s-
Gra&agBo em C i k i a s da ReligiBo, em SBo Bernardo do Canpo.
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lb8aicoa da B f b l i a 4
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Jonas
pdgim 16
E V A N G E L I Z A ~ ~E~ OEXPLORA~AO
E3Kpressees de revolta meditadas
-I
lus e
~ DES5 0 0 ANOS
sombra de Jonas.
Dario Gereldo k h e c f f e r
I1Celebrar 10s 500 anos es) celebrar un m a s s a ~ r e . ~ ~
(Juanita Vasquez , India zapoteca-mixe de Yala%&ag-.
Mclxico)
1.
The Mission
Ndo h6 mdquina do tempo que possa fazer voltar atr6s a
triste e vergonhosa hist6ria da implantaqbo do colonialismo
moderno em nosso mundo nos dltimos 500 anos. Nada trard de
volta h vida os 70 milhdes de Sndios desrespeitados,
roubados, desalojados e massacrados pela Bnsia conquistadors
e destruidora da concupisc~ncia, forqa motora das ambi~6es
que moveram os povos europeus h6 500 anos a ocuparem as
terras Wgdescobertas@@ custa do extermlnio de milhdes de
seres cujos descender.:es at6 hoje nbo tern reconhecidos seus
mais elementares direitos de serem gente.
Nao me refiro somente aos massacres que hoje continuam
acontecendo, especialmente no Brasil, com os Sndios. Refirome, tambgm, aos milhdes de negros, que vivem e sofrem a
discriminaqao social e econemica que o assim chamado mundo
moderno lhes impde e com isto lhes tira parte da existencia.
Nbo somente no terceiro mundo, mas em paises ricos, como
Estados Unldos e Africa do Suit conaiqdes ae reiaqao social
medievais fazem corn que tenham de lutar pelos mfnimos
direitos de viverem em sua prepria terra.
Quantas vidas e quantas ldgrimas j6 niio custou esta
luta pela liberdade em todo o mundo?
Refiro-me igualmente aos milhdes de crianqas que- n8o
passam de urn an0 de vida, ou se passam, ter8o como destino a
rua, o desamparo, a discriminaqao, a perseguiqao e o
extermlnio.
Refiro-me tambgm aos trabalhadores brasileiros, homens
e - mulheres, tio longamente. espoliados por consecukivos-
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desplanejamentos econamicos, cuja finalidade seqiiencial
tinica Q a despoderizagdo das classes trabalhadoras.
Hoje, a AmQrica Latina 4 obrigada a ter que ouvir e
sentir o que Paulo Francis, inteligente e apaixonado
american6fil0, diz a respeito do MQxico: que estaria muito
melhor se fosse englobado pelos Estados Unidos, pois entao
ndo precisaria exportar sua melhor mdo-de-obra para 16.
Expressa-se a$ um p6s-neocolonialismo, que ndo opta mais
pela exploragdo, via relagaes econamicas, mas pela ocupagao
e, quem sabe, anexagdo. Algo nem tdo "neoN assim.
Alids, a ansia de conquista que levou espanh6ist
ingleses, portugueses, franceses, holandeses a ocuparem, em
todos os sentidos, a Am4rica Latina, at4 hoje ndo mudou na
questao metodol6gica. Serd que a grande festa que a ONU
proporcionard ao mundo em 92 aqui, no Brasil, terd coragem
de analisar esta metodologia? Nao o creio.
As igrejas tern assumido como sua missao histerica a
tarefa de coordenar os trabalhos de conquista em nivel
ideol6gico. Com esta atitude, instrumentalizaram-se para
servir ao poder econamico na criagdo de um substrato de
sustenta~do necessdrio para a consolidagdo desta ocupaqdo.
Esta, ao mesmo tempo que era dirigida pela concepqao
econamica de que as terras descobertas e conquistadas
deveriam gerar riquezas para manter as matrizes, criava a
necessidade de haver uma ocupaqao da consciencia religiosa,
cultural, enfim, ideol6gica, para que a submissdo nao se
fizesse h forqa de armas, mas tambgm em nivel de aceitaqao,
de compreensao e de concordancia.
Mesmo que isto nao tenha sido conseguido totalmente,
foi, a meu ver, o papel mais terrlvel, a miss%o mais
diab6lica
a de fazer com que fosse quebrada a vontade de
serem povos limes, que concordassem com esta submissao e,
corn isto, com seu desaparecimento, seu massacre em todos os
sentidos. Vozes inicialmente criticas de figuras mitol6gicas
da hist6ria do Brasil, como Manoel da Nbbrega, manifestaramse conscientemente a favor da submissdo dos indios:
uSu]eitando-se o gentio, cessardo muicas maneiras ae haver
escravos mal-havidos e muitos escrtipulos, porque sera0 os
homens escravos legitimos, tornados em guerra justa, e terao
servigo e vassalagem dos lndios e a terra se povoar6 e Nosso
Senhor ganhard muitas almas e Vossa Alteza terd muita renda
nessa terratt.
-
Ou entdo a afirma~aode Jose de Anchieta: ItA conversao
destes (indios de Piratininga) ndo cresceu tanto como a da
Bahia, porque nunca tiveram sujeigdo, que d a principal
parte necessdria para este neg6ciow.
Um testemunho mais recente de um evangQlico luterano de
Santa Catarina, faz com que esta realidade chegue mais perto
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ph~ine18
de 116s. Contou-me que, quando crianga, participou de cagadas
aos bugres com seu pal. Conta ele que o grupo de caga
conhecia os costumes dos lndios e que a melhor Bpoca para
matd-10s era a de suas festas. Quando bebiam e danqavam,
ficavam tdo cansados, que era f6cil cortar-lhes as cabegas,
enquanto
dormiam.
Homens,
mulheres,
crianqas
eram
indiscriminadamente massacrados a golpes de espadas e facdes
por pessoas que no domingo seguinte estavam no culto de sua
Igreja como se nada tivesse havido.
0 que leva a isto? 0 que pastores e a Igreja Luterana
da 6poca disseram a isto? Estd a1 uma tarefa de pesquisa
para as ncomemoragdes~ldos 500 anos.
Mas creio que tambem as outras Igrejas evangelicas
deveriam dar urn passeio hist6rico pesquisador em suas
concepgdes e pregaqdes, ou nas razdes porque vieram ao
Brasil,
America Latina tao sofrida e explorada. Certamente
havera surpresasl
2.
Jonas
Por ser um livrinho cheio de surpresas (Schwantes), a
hist6ria do profeta Jonas deverd nos ajudar a iluminar um
pouco, dentro dos limites deste espaqo de meditagao biblica,
as distorqdes e at6 as razdes da missao colonialista que
transformou este continente tao rico, tao belo e tao bem
habitado, num espago ocupado por povos massacrados e
explorados, historicamente escravos.
"Grite
contetido da
Java sobre
mais de 120
contra a grande cidade de Nlnivew (Jonas 1,2). 0
tarefa dc Jonas era anunciar julzo. 0 julzo de
uma metrepole, cuja populaqao infantil era de
mil crianqas (4,ll)
.
fi esta a palavra de JavB. E ela precisava ser
profetizada, "porque a maldade daquela gente chegou aos meus
ouvidosU diz Jav6 ( 1 2 ) A maldade nZo B especificada e
parece nao ser de grande interesse para a estrutura de
contetido do livro. Outra 6 a mensagem central que a
saplencla lsraelita quer nos transmltlr. E esca mensagem e
uma das surpresas que nos sao reservadas.
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@giw 19
Jones
Jonas 6 representante dos que crgem na justiqa de Javb,
a mesma que caiu sobre Sodoma e Gomorra, que destruiu Acab e
que castigou Davi. Jonas representa a concepqao de Jav6,
como urn Deus que ama seu povo, que d longanimo, mas que
castiga a injusti~a com a morte, sem que haja volta. Jonas
6 partid6rio de correntes, digamos, fundamentalistas e
radicais do profetismo, que se mantinham, pel0 vies do
conservador, sempre ligados aos poderes do templo e da lei.
Jonas aqui representa a mentalidade dos senhores do templo e
dos donos da interpretaqao da lei.
Dario Geraldo Schaeffer 6 secrethrio executivo do l n s t i tuto Universidede Popular
em BelWPA.
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Uosaicos
ch Bfblia 4
- Jones
0
p4ainr 20
DESENCONTRO ENTRE JONAS E DEUS
Sebestiso Armando Cameleira Soares
"..
.de pano de saco, desde os
menoresM (leitura de Jonas 3,5-9)
maiores
at8 os
E muito estranho. Um profeta 8 encarregado de pregru- a
conversao. Aqui, porQm, a intimidade do profeta Q devassada
e aparece cruamente como Q ele quem necessita de converterse.
Jonas sabe dever proclamar uma noticia terrlvel: a
grande cidade de Nlnive, a importante capital est6 arrasada.
Apesar de perceber que Deus o chama, recusa-se a ir e at9
foge na direqdo contraria,
Enfrentar Nfnive, famosa por sua maldade e ainda sendo
urn profeta estrangeiro devia ser dureza dobrada. E 5
incerteza, qua1 ser:a a reaq%o? A propria vida corria
perigo. 0 poder assirio era bem conhecido desde h6 muito por
sua crueldade. Tudo isto 8 o que n6s imaginarfamos como
sendo as razi5es da desesperada fuga do profeta.
N%o era, porCm, nada disto. 0 pr6prio Jonas o
esclarece. fi que h6 um desencontro fundamental entre ele e
Em
termos
humanos,
diriamos
que
h6
uma
Deus
Itincompatibilidade de gOniosal. Jonas Q duro corn o pecado,
nao suporta quem pratique violencia e, por isso, ndo pode
estar de acordo com a pacigncia infinita de Deus, sempre
disposto a perdoar. Est6 longe de ter apreendido as l i ~ d e s
aprendidas por Osgias depois de tanto sofrimento. Para ele
as pessoas (e as cidades) se dividem em boas e mas. Ele
mesmo, pel0 visto, deve catalogar-se, como aquele homem rico
do Evangelho, do lado dos bons Espontaneamente entende-que
Deus seja justo juiz, mas tem invenclvel dificuldade- de
imagin6-lo como pura graqa. E claro que para ele a salvaqao
6 prgmio, ndo oferecimento gratuito. E ndo desiste. No fim
de tudo, como nos conta o capltulo 4, ainda espera por um
milagre que faqa justiga. Mesmo tendo visto que Deus
perdoara os ninivitas, vai-se assentar pensativo, ansioso
por W e r o que aconteceria 3 cidadeu. Quem sabe, &Ancia--
.
.
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Hosaicos & Bfblia 4
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Jones
aguardava que, afinal, Deus deixasse de ser tolo e tomasse
alguma atitude mais firme. Talvez lhe passasse pela cabeqa a
pergunta: "Como a humanidade pode levar a sgrio um Deus tao
b o n d ~ s o ? ~llN%o
~
ser6 por isso que nunca se chega a uma
soluq30 final?"
Jonas se parece com muitos de n6s quando temos
dificuldade de compreender ser o perdao a atitude central do
cristao. Quantas vezes j6 nao escutei de irmdos e irmas
cristas o seguinte desabafo: Se Pinochet, esse frio
assassin0 de multid6es, for levado ao cgu, eu pref iro nao
estar 16. k racioclnio de Jonas, de quem nao suporta o
perdao. Ora, quem for afinado com nosso Pai, que tem
"cora~ao de maen@ (Cf. Isalas 46,3; 49,14-16; Osgias 11) e
desejar "chuva e sol sobre justos e injustosn (Mateus 5,45).
Hd no comportamento de Deus algo que tem a ver
profundamente com a liberdade construtiva. A chance de
recomeqar se oferece sempre, a pessoa 8 construgdo sem
cessar, nenhuma situaqdo d obrigatoriamente final. Tudo pode
comeqar de novo. 0 perdao insiste em enxergar inocencia onde
outros s6 v@em marcas de feridas abertas (Isalas 1,18).
No jeito de atuar dos ninivitas hd duas coisas que
particularmente encantam a Deus.
A primeira B a solidariedade com a Natureza. Pessoas e
animais sentem-se debaixo do mesmo destino. Todos devem
vestir-se de sac0 e jejuar (v. 7-8). A humanidade B do mesmo
barro da terra, da mesma famllia do chao de roqa (Genesis.
2,7) ; os animais estao al bem perto e tao parecidos que at8
poderia pensar na possibilidade de virem a ser sua companhia
basta pensar no macaco, no cao, no
(Genesis 2,18 a 20)
gato, no papagaio
...
-
Em
diversos
momentos,
a
~ 1 b l i a ressalta
essa
solidariedade bdsica, esse parentesco lntimo da pessoa com a
natureza (Genesis 3,17-19; Isalas 1 1 1 - 9 , 0s 4,2-3) Desde
tempos remotos a humanidade intuiu muito bem que a relagao
homem-natureza tem a ver
com gestos de casamento. DaX os
mltos e os rituais de fertilidade, inciuinao a prostituiggo
sagrada, rito excleso, ato mais pleno de imitagdo do
matrimanio dos deuses com a Mae Terra. Dominar a criagao,
avanqar por sobre a terra tem a ver com a delicadeza dos
gestos de amor no leito nupcial (I1N%o sei se sou dominado ou
se domino.. 11) l1AdamU@(humanidade) e "adamah" (chao de
roqa) sao feitos um do outro, sao feitos um para o outro,
para chegarem a ser " m a s6 carneN. 0 destino dos humanos.se
confunde com o destino da terra. A
industrializaqao
capitalista atual 6 a demonstraqao mais evidente disto. As
pessoas se destroem (basta pensar na maneira como se
alimentam, respiram e exercitam o pr6prio corpo) ao
destrulrem os recursos da terra. A civilizaqao da produqao e
do consumo desenfreados chega a estimular as pesscias a
.
. .
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llosaicoa da Bfblia 4
- Jonas
&inn
22
super-alimentar-se: matam a si mesmas pelo excesso, matam os
outros por lhe retirarem quase tudo nao lhes deixando nem o
mlnimo, matam animais e plantas pelo puro prazer de consumir
sempre mais e sempre de maneira mais sofisticada (falsa).
A outra coisa que encanta a Deus 6 a solidariedade
entre as pessoas. 0 que aconteceu em Nlnive 6 indicagao
clarissima do caminho de superagao da violgncia (Jonas 3.8).
A conversao da
cidade equivale ao momento no qua1 seus
habitantes aceitam reconhecer-se em igualdade de condigao:
"Vestiram-se de saco, desde o maior at6 o menorIn (v.5). E
preciso que o "rei desga de seu trono, tire de si as vestes
reais, cubra-se de pano de sac0 e assente-se sobre a cinzaw
(v.6). Em outras palavras, 6 preciso que o poderoso volte a
experimentar sua condiqao humana, baixe do lugar que o
separa, desvista-se daquilo que lhe confere apargncia de
superioridade, e se assente na cinza como todos os pobres.
Reconhega o seu pecado, isto 6 , reconhe~a-se do mesmo barro
que todas as outras pessoas, iguale-se. S6 h6 esse caminho
de superag%o da violencia.
E por isso que o Novo Testamento insiste tanto no
reconhecimento e na confissao do pecado (Atos dos Ap6stolos
e Eplstolas Paulinas). Nao se trata de mortalismo doentio. E
algo bem mais profundo e completamente sadio. Reconhecer-se
pecador 6 vencer todo sentimento de superioridade e autosufici0ncia. @ desvendar para si mesmo a prepria verdade
antropol6gica de ser como os outros. E s6 isso que
precisamos para obter o perdao.
0 perdao 6 a experigncia profunda de sentir-se amado e
aceito do jeito que 2 .- 6 , comeqando pela profunda e radical
aceita~do de si mesmo, ao superar aqueles sentimentos de
culpa que fazem a pessoa desprezfvel a seus pr6prios olhos.
0 sentimento de culpa bloqueia nosso relacionamento cara os
outros e paraliza-nos na caminhada. Torna-nos parallticos,
enfermos e fr8geis. Eis o paradoxo: S6 o honesto e tranquil0
(ndo neur6tico) reconhecimento de nossa pequenez nos
W e
fortalece
verdadeiramente
pela
solidariedade
experimentamos com os outros (Lucas 22,31s).
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S 6 quem se sabe pecador pode sentir-se irmao. E pode
aceitar profundamente um Deus que perdoa e acolhe. Jonas
pensava-se melhor que os ninivitas. Dal o seu drama e sua
dificuldade de compreender o comportamento de Deus. 0
profeta precisou de converter-se. Por mais incrlvel que
possa parecer foi o rei de NSnive quem lhe deu a liq80
Quem poderia prever: Um rei que precede um profeta! Mas a
Biblia 6 assim mesmo, relativiza crenqas inabaldveis e
desarruma certezas fdceis. Chama ao imprevisivel. Resta
Deus, inabaldvel na sua graqa. Em nossa imaturidade, 6-nos
dificil levar a sgrio um Deus tao born....
....
Sebasti6o Armando Gemeleira Soares 6 b i b l i s t a ,
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lloosicos do Blblia 4
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pdgfna 24
JESUS E 08 MARINHEIROS
- JONAS E 08 D I S C ~ P U L O ~
Urn confronto na comparagdio dos relatos
Paulo Roberto Garcia
Quando lemos o relato da tempestade acalmada por 3eeus
em Marcos 4,3S-S,20, reconhecemos, como pano de fund-; a
hist6ria de Jonas 1.
Neste relato, a hist6ria de Jesus foi contada a luz da
experigncia de Jonas. S6 que ela foi contada ao contr6rio. 2
o que veremos a seguir.
JONAS E JESUS
- CONVERG&NCIAS
A hist6ria & contada ao contrdrio a partir de elementos
semelhantes:
0 primeiro 6 c barco em meio B tempestade no mar. 0
mar representa, nos dois relatos, as forqas cabticas
(concretas) que buscam destmir a vida. Basta lembrar--qbeo
mar ameaqa o barco de Jonas e o de Jesus e era a habktaea
da legi80 de esplritos irnpuros (Marcos 5).
0 segundo 6 que tanto Jonas como Jesus estao dormindo e
sao violentamente interpelados a colaborarem na luta contra
o caos.
0 terceiro elemento aparece na vit6ria contra o caos.
Ela 6 resultado da a ~ d odesses personagens. Jonas pede
que seja jogado ao mar. Jesus enfrenta e exorciza o mar e a
sua legiso de representantes.
JONAS E JESUS, DISC~PULOSE MARIbTBEIROS
- DIVER
Em cima da semelhanqas, surge um novo enfoque, que 6
destacado pelas divergencias entre esses relatos.
A primeira divergencia aparece na pr6tica dos dois
personagens centrais: Jonas foge-darvontade de Deus; 3eeus.a
-
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executa
-
phgina 25
Jonas
.
A
segunda
aparece
na
prdtica
secunddrios. 0s marinheiros, em Jonas,
compreender o poder de Deus e a conversdo.
nao conseguem discernir quem e Jesus. Ndo
hd incredulidade e medo.
dos
personagens
estdo abertos a
J6 os discipulos
h6 conversao! S6
A terceira aparece na continuidade dos dois relatos. 0
de Jonas tem sua seqiiencia enfocando o profeta. E, diga-se
de passagem, uma triste figura de profeta. k relapso em sua
missdo, dos trgs dias necess6rios para anunciar a mensagem h
cidade, ele a cumpre apenas por um dia.
insensivel ao
valor da vida
vale mais uma planta que a vida de todos os
habitantes de uma cidade. Curto de palavras, s6 proclama uma
pequena frase, tambem 6 teimoso em realizar a vontade de
Deus e de duro coragdo para compreende-la. Quanto aos
marinheiros, o relato termina por mostr6-10s convertidos.
-
No relato de Warcos, 6 enfocada a luta de Jesus contra
as forgas cabticas que reduzem a vida a situagdes inumanas
(Marcos 5,l-20). Quanto aos discipulos, os demanios t8m mais
sensibilidade do que eles e os habitantes da cidade de
Gerasa, para compreender o poder de Deus que se manifestava
na pr6tica de Jesus
o poder de triunfar contra o caos.
-
JESUS E 08 MARINHEIROS
CONFRONT0
-
X JONAS E OS IDISC~PULOS
0
0s dois relatos apresentam no confront0 corn o caos dois
tipos de personagens distintos.
Jesus e os marinheiros
aparecem
como os que,
discernindo o poder de Deus, enfrentam o caos a partir do
conceito da centralidade da vida. Para tanto nao podemos
esquecer que, enquanto os marinheiros lutam a todo custo
para nao ter que jogar Jonas ao mar (mesmo que para isso
necessitem sacrificar a carga), Jesus, em Marcos 4, enfrenta
o mar para salvaguardar a vida e, em Marcos 5, restitui a
vida a alguern ao qua1 todos buscavam acrescentar correntes.
Jonas e os discipulos s%o os que t&m dificuldade em
discernir o poder de Deus. 0 centro do mundo O seu preconceito. Diante dessa inversdo, coisas t6m mais valor que
gente. Por isso Jonas se apieda da aboboreira que morreu mas
aguardava ansiosamente a morte de toda uma cidade.
0s discipulos, por sua vez, n%o discerniam aquilo que
os dem8nios tranqiiilamente entendiam
o poder de Deus que
manifestava-se em Jesus e ameaqava a existencia deles. A
incompreensdo leva a inversao de ver uma cidade lamentando a
morte dos porcos (impuros na concepgao judaica), verdadeiros
representantes do poder do caos, ao inves de alegrarem-se
corn a vitdria da Vida.
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Jonas
phgina 26
Enquanto a prdtica de Jesus e dos marinheiros vence o
caos e, consequentemente, promove a vida, a prdtica de
Jonas, dos disclpulos e dos moradores de Gerasa torna-se
verdadeira propagadora do caos.
Em uma prdtica, a vida vale mais que tudo. Em outra,
coisas valem mais que a vida.
- 5 0 0 AN08
MRICA
LATINA
DE CONFRONT0
A hist6ria de nosso continente pode ser contada a
partir da luta contra o caos, que se faz presente de forma
violenta. A vida, desde o inlcio do period0 de coloniza~ao,
d agredida e solapada em todas as instdncias. Nestes 500
anos de evangelizagao (ou colonizagao?), o nosso continente
foi marcado por duas prdticas distintas.
De um lado, frente a milhares de vidas condenadas b
morte, est%o aqueles que ndo tiveram a sensibilidade de
discernir o poder e a vontade de Deus e, carregados de temor
e incredulidade, alimentaram as forgas cabticas.
De outro lado, estao aqueles que, discernindo o poder
de Deus e sua vontade, anunciaram por palavras e lutas a
vitoria da vida sobre o caos, e, muitas vezes, com o custo
da pr6pria vida, alimentaram um novo amanha d e esperanqa.
Essa prdtica 6 a verdadeira evangeliza-gao, semente do novo
que h6 de surgir!
Paulo Roberto Garcia 6 mecnbro da equipe do Program de Assessoria B Pastoral do Centro
-
EcLBZnico & Docunenteg6o e InforwmgBo CEDI, professor & Novo Testamento da Faculdade& Tcologia
da I g r e j a l k t o d i s t a e pastor da I g r e j a Metodista no Brasil.
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M @ ~27
M
Jonas
JONAS E A CIDADE
Rolf Schwnemem
I1A cidade 6 uma estranha senhora que hoje sorri e
amanha te devora1I juramento d f g 8 0 sSaltimbancos8@
-
Ao longo do processo secular de formaqdo das cidades
tem havido em parte um sentimento misto de atraqao e
repulsa, de fasclnio e amendrontamento. A cidade, ou B vista
como espaqo de comodidade e llboa-vidatl,ou como lugar
originador de todos os males. Este sentimento misto torna-se
um componente constante dos seres humanos que habitam a
cidade. Quando ndo se est6, gostar-se-ia de estar; quando se
estd, gostar-se-ia de estar fora. Este vai-e-vem vai
refletir-se no mod0 pel0 qual h6 participaqdo na sua vida e
na forma pela qual se assume mais ou menos uma consciPncia
urbana
.
Para as pessoas com maiores recursos (e ndo s6 elas)
torna-se comum a fuga nos fins de semana, feriadees, fgrias.
Assim, criam-se verdadeiros refdgios paradisiacos em sitios,
chdcaras, casas de veraneio na serra e no mar, etc. 0 que
revela isso? Depreende-se que hd a construqao e participaqao
no espaqo urbano, usufrui-se deste espaqo, mas, ao mesmo
tempo, renega-se este espaqo. Nao ocorre um compromisso
autgntico e afetivo com a cidade enquanto espaqo de vida
aceitdvel em sua plenitude. Na medida em que as pessoas sao
massa e ndo povo, em que s%o n h e r o s e nao pessoas, ignorase a responsabilidade pelo que acontece em seu interior. 0
adiantado e irreversivel processo de urbanizaqdo em curso
leva a refletir, enquanto comunidades cristgs, acerca da
missdo e tarefa neste contexto. Neste sentido Jonas pode ser
ilustrativo e altamente conscientizador.
Etnocentrismo x Ecumenismo ou "Daqui n6o saio, daqui,
ningu6m me tiraDg
Escrito de forma criativa, a novela de Jonas apresenta
um drama comovente e sumamente desafiador. No seculo V a.C,
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Hosaicos
da B f b l i a 4
- Jones
@aim 28
Cada contempordneo dele podia reconhecer-se em Jonas. De
forma diddtica o escritor une hist6ria de marinheiros e a
rotina palaciana numa est6ria que estabelece uma comunicaqao
no mlnimo perturbadora com seus leitores e ouvintes.
Jonas, visto individual ou coletivamente, parece ser um
tipo psicol6gico confuso, cheio de problemas e complicaq6es.
Sua identidade estd em crise dentro do context0 cultural e
social. Perturbado pelo clima hostil imperante no seu tempo,
tem dificudades em romper com o seu grupo cultural, Btnica e
religiosamente. Tipifica a Israel perdido como pequena
provfncia dentro do vasto impgrio persa. Seu fechamento
impede uma abertura aos demais povos. Jonas enquista-se
covardemente na comunidade pura dos eleitos e recusa-se a
a
estabelecer relagdes com o mundo maior. ImSe este mundo
cidade de Nfnive
estd malt entao que se dane!I8
assim
pensa.
-
-
-
Quem sabe vivemos urn process0 semelhante nas noarsas
comunidades e Igrejas cristas, imersas nas grandes cidades?!
Ao inv6s de estabelecermos um didlogo franco e aberto, de
rompermos com o nosso etnocentrismo eclesial, enclausuramonos em nossas capelas, sacristias, templos e catedrais.
Enquanto o mar ruge e, em nossa volta, Nlnive se decompde,
dormimos no berqo esplgndido de nossa piedade, curtindo a
nossa paz espiritual totalmente desconectados da realidade.
Este enquistamento nos impede de andar na direqdo de um
ecumenismo aberto ao didlogo e comprometido na prdtica com a
promoqi30 de vida plena e abundante.
Ortodoxia X Ortopraxia ou Palavras sao palavras nada
mais do que palavras
Jonas d homem de fd. Aprendeu o catecismo. Fez sua
profissao de f6. Participa da Escola Dominica1 e sabe de cor
os fundamentos de sua religiao. No navio diz:
"Sou hebreu, e temo ao Senhor, o Deus do cgu, que fez o
mar e a terraff. (1,9) e j6 fora da cidade, ap6s a pregagao:
It...
pois sabia que Deus B clemente e misericordioso, tardio
em irar-se e grande em benignidade e que se arrepende do
malw ( 4 , 2 )
Apesar deste conhecimento dos conteddos, quem,
no entanto, age concretamente para combater o ma1 sao os
pagads. A seu mod0 e com base em sua experiencia silo eles
que fazem tudo para evitar o naufrdgio do navio. S80 os
ninivitas e o seu rei que agem para deter em seu meio as
forgas de morte, arrependendo-se de seu mau caminho.
.
Continuamente homens, mulheres, jovens e crianqas, sem
relaqao constante e direta com vida comunitdria crist8, sdo
bem mais senslveis aos apelos por vida que ecoam em sua
volta. Ateus, descrentes, indiferentes em materia religiosa
procuram vir de encontro hs interpela~des da realidade e
buscam, na prgtica, saldas contra tudo o que ameaqa a vida.
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A ortodoxia, a conf iss%o da reta doutrina nao d suf iciente.
Na maioria dos casos ela segrega, isola e limita para uma
aqdo soliddria com todos os homens e mulheres.
0s
marinheiros e ninivitas apontam a ortopraxia, enquanto agao
consciente e acertada dentro do contexto, como necessdria e
insubstitulvel. NBo d a toa que Jesus disse:
"Nem todo o que diz: Senhor! entrard no reino dos
ceus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai que estd
nos ~ d u s @(Mateus
~
7,2 1)
.
Morte
&
Vida ou 8e o grgo de trigo n&o morrer...
Quando n8o-crentes assumem a proposta de Deus, os
crentes, os fidis ficam enciumados. Jonas fica profundamente
chateado com o movimento coletivo de arrependimento. Quem
sabe 6 adepto do "quanta pior, melhor8'. Prefere morrer a
abrir m80 dos seus princlpios. Eles lhe sao tdo caros que
abandon&-10s significa a perda da razao de viver. Na verdade
nao era necessaria a sua morte, mas somente a morte das9suas
convicq6es e propostas. A perseveranqa no gueto religiose e
institutional, com tudo o que isto representa em termos
concretos, impede uma autentica promoqao da vida.
0 Novo Testamento mostra Jesus como o verdadeiro Jonas
com a sua morte e ressurreiqao. 0s trgs dias e noites no
ventre do peixe prefiguram a morte e ressurreiqao do Filho
de Deus (Mateus 12,40). A auto-preservaqao nao contribui
para o estabelecimento da vida. "Se o grao de trigo, caindo
na terra, n%o morrer, fica ele s6, mas se morrer, produz
muito frutoN (Jodo 12,24). 0 fechamento, o isolamento, o n%o
abrir-mdo mantdm o atual estado de sofrimento e ndo-vida que
estd em nossa volta.
Como cristaos e denominagdes cristas temos que passar
pelo ventre do peixe para sermos expelidos para dentro do
coraqdo, assumindo suas contradigdes e conflitos e a1
atuando numa aqao solid6ria em funq80 do Reino de Deus. Uma
" ~ a l v a q d o que
~ ~ reproduz os males mais hediondos de nossa
sociedade urbana
o
individualismo,
o
egoismo,
a
competigao, etc
nao 6 digna de ser chamada por este nome.
0 constante repensar de nossa ag%o e dos instrumentos da
missdo nas grandes cidades sao o imperativo primeiro para
transformar a cidade num espaqo de vida.
-
Vida
ningu&m
&
-
Ecologia ou Todos se salvam ou n8o se aalva
A proposta de vida e arrependimento traz embutida uma
dimensdo muitas vezes ignorada por 116s. Em sua amplitude
inclui ndo somente os seres humanos, mas tambgm os animais.
fi digno de nota a confissao de Jonas ao Deus criador do cdu
e da terra. 0 movimento de penitancia dos ninivitas inclui
todas as criaturas ( 3 , 7 - 8 ) . A tregua, o cair em si tornlmk-se
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Mosaicos da Bfblia 4
- Jonas
p8gins 30
bem amplos. Isso B altamente sugestivo para as nossas
cidades ameaqadas pelo desequillbrio ecoldgico. Curioso B
que inclusive a prepria legislaqao B acionada. (E fez-se
3,7) A preservaqdo da vida, a sua
proclamar e divulgar
manutenqao pela sua abranggncia nos leva a considerar que a
salvaqao n%o pode ser pensada de forma exclusiva para os
seres humanos. A redescoberta nos nossos dias desta dimensao
c6smica lanqa urn serio desafio 5s comunidades que leem a
novela de Jonas. Todo o nosso espaqo de vida espera pela
redenqdo. A tomada de consci~ncia, a mudanqa de nossa
mentalidade e uma nova legislagdo estao na raiz de uma
cidade habitdvel e cheia de vida.
...
Gratuidade, ou: Nao h6 nada melhor do que perder tempo
(Neruda)
Uma questdo de fundo marca as relaqdes humanas. Jonas,
sentado ao sol, recebe providencialmente a sombra de uma
planta. Ao ser devorada por uma broca, reacende o seu
temperamento ranzinza ( 4 , 8 )
Meio desmaiado por causap do
calor, volta a soltar seus impropkrios. Diante disso Deus
responde, perguntando:
.
"Vote estd com d6 de uma mamoneira, que nao lhe
custou trabalho, que nao foi vocg quem fez crescer, que
brotou numa noite e na outra morreu? E eu, ser6 que ndo
vou ter pena de Nlnive, esta cidade enorme, onde moram
mais de cento e vinte mil pessoas, que ndo sabem
distinguir a direita da esquerda, alBm de tantos
animais?" (4,lO-11)
.
Esta pergunta ecoa at6 os nossos dias. Numa sociedade
meritocratica, onde nao h6 espago para a gratuidade, a
experiencia crista da benignidade de Deus coloca o desafio
de romper com tudo o que nbo aproxima as pessoas por causa
da auto-afirmaqao e auto-suficigncia que norteiam as
rela~des inter-pessoais. Como comunidades e Igrejas somos
interpelados para o estabelecimento de referenciais novos em
que o individualismo possa dar lugar a solidariedade e a
competiqdo 5 colaboraqao.
Contraditoriamente Deus ndo manifesta sua gldria pelos
meritos de Jonas, mas pelos demBritos. Poder-se-ia dizer que
Deus 6 vitorioso na fraqueza e nao na auto-suficiencia de
seus servos. Mesmo pessoas que fogem de sua responsabilidade
sao usadas por Deus para transformar nossa realidade. Em sua
miseric6rdia Deus com sua palavra e aqdo transforma
situaqdes. Se Deus dependesse apenas de seu povo, nosso
mundo estaria muito mal. Em sua a980 contlnua, presente na
hist6ria e no mundo, Deus nao desampara a sua criatura e sua
criaqdo. TambBm o contratestemunho serviu e serve para que
pessoas de forma critica apontassem e apontem para uma aq%o
concreta e decidida em pro1 da justiqa e fraternidade entre
pessoas, grupos e povos.
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nosaicos
da B f b l i a 4
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pegim 31
Janas
Colocados na cidade, somos interrogados:
"Que se passa contigo, agarrado ao sono?I1 (1,6)
nQue fi z e ~ t e ?(1,lO)
~~
IgQue faremos c ~ n t i g o ?(1,ll)
~~
"k razodvel essa tua iraIg (4,4.9)
"Nao deverei eu ter compaixdow (4,ll)
Happy-end para Jonas (nas Am6ricas)
Jonas estd sentado na cobertura verde do prgdio do
Banco BANESPA em Sdo Paulo, tomando
sombra de um cipreste
um chopp bem gelado. Nao estd amargurado nem contrariado.
Afinal, sua missao tivera pleno Oxito. Havia assumido com
determinagdo a tarefa conferida pelas coroas inglesa,
francesa, espanhola e portuguesa de converter da impiedade
para a verdade todos os pagdos habitantes das terras
amerfndias. 0 jufzo fora anunciado e nem tardaram- cinco
sOculos e eis que restam poucos infieis. Milhde+kr".ou
atendeltam h palavra, ou morreram. As culturas pagas, quase
nao existem mais. A evangelizagao foi um sucesso. A
conquista dos povos deu certo. Jonas conseguiu em meio a
toda esta empresa preservar a sua identidade religiosa e
cultural. A santa cruzada em terras amerlndias estd
conclulda. "Sabendo que 6s Deus que cumpres a tua palavra,
fui, falei e sobretudo agi. 0 resultado ndo tardouu.
Jonas, as vezes, durante a noite, tem alguns pesadelos,
pois o seu inconsciente lhe devolve algumas cenas pouco
am6veis e tranquilas (massacres, destrui~des,mortes, etc.),
mas logo o sono vem e a paz de esplrito o envolve. Afinal,
sempre existem pedras no caminho. Por isso, bebamos! a sua
safidel!!!
Rolf Schuenenrem 6 dwtorando na P o n t i f f c i a Universidade Catblica do Rio de J a n i r o e
pastor da l g r e j a Evangdlica de ConfissPo Luterana no B r a s i l , em MauB/SP.
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Jonas
JONAS...
p 6 # i ~32
HUMOR, RESMUNGOS E A N ~ N C I O I
Mariam Marchitiello
0 livro de Jonas B uma hist6ria particularmente bem
escrita e curta. Contem s6 quatro capltulos onde notamos-um
desejo dos autores de se aperfeiqoarem como povo de-;*l)eus..
Como diria hoje urn militante: 6 urn livro "curto e grossom,
ou seja, o livro vai direto ao assunto e o diz com poucas
palavras.
Na verdade, o que temos no livro B uma historieta
satirica, com forqa parab61icat uma espgcie de Itnarrativa
exemplarI1. Apresenta ~modelos padr%otl de comportamento para
ver e pensar a situaqao da sua Bpoca. N%o 4 uma pardbola
propriamente dito. Pois faz uma caricatura direta de um
profeta, e nao relata de algugm que seria comparado com um
profeta.
De todo mod0 6 uma narrativa interessante e sedutora
como veremos a seguir.
0
humor: o estilo anti-her6i do profeta
A Blblia, para mim, as vezes assemelha-se a uma dessas
revistas atuais que sempre trazem uma pdgina humoristica. 0
livro de Jonas, num primeiro momento, parece-me ser uma
dessas p6ginas. Afinal de contas a est6ria d divertida e
surpreendente.
Fala de Jonas em duas situaqdes bem ao estilo do que
classificamos de 11anti-her6i11. A primeira: na
malograda
fuga de sua miss%o, e a segunda: na sua ira magoada, quando,
finalmente forqado a entregar a mensagem a Nlnive,
inesperadamente v& a cidade arrepender-se e ser poupada por
Jav6.
0 lado engraqado da est6ria estd na forma de Jave
interferir nessas duas situagbes. Na primeira, quando da
precipitada fuga, encontramos a narrativa de uma GRANDE
tempestade, um GRANDE medo dos marinheiros, que os leva a
joga-lo ao mar, e de um GRANDE peixe- que o engoliu. E por
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Mosaicos da Blblia 4
-
3
Jones
quando ainda estava em minha terra? Por isso fugi
apressadamente para Tarsis; pois eu sabia que tu 6s um
Deus de piedade e de ternura, lento para ira e rico em
amor e que se arrepende do mallt (Jonas 4,2).
Entre resmungos e frustragdes, Jonas pede a morte por
quatro vezes: uma na tempestade quando pediu para ser
langado ao mar ( , 2 ); depois, quando da conversdo dos
ninivitas (4,4), e, quando seca a mamoneira, por mais duas
vezes pede a morte .(4,8-9)
.
'
Diante de tanto resmungo, Jonas d6 at6 a impressdo de
que JavB se tornou um inimigo do seu povo. Alibs, na 6poca
da redaqdo do livro, no p6s-exflio, havia gente que
realmente pensava assim (confira Lamentagdes 2,4-5), o que
contrastava com a confissdo feita outrora antes do exllio,
de que a mdo e o brago de JavQ tinham realizado vit6rias
para o seu povo (veja o Salmo 44,3-4).
A histdria dessa estdria
Antes de continuarmos nossa reflexdo, conv6m apresentar
o chdo onde se assenta a est6ria de Jonas, visto que j6
desconfiamos
que
a
narrativa
disfarga
e
revela,
simultaneamente, uma realidade do povo da Blblia.
Na verdade, o l i m o de Jonas ndo irrita mas conquista o
leitor. fi um l i m o csmico, mas ndo inofensivo para a nossa
f6. Quero dizer corn isto que o humor, em Jonas, nos faz
sorrir at6 o momento em que coloca uma verdade tao profunda
quanto grave. No seu final, Jonas 6 ridlculo. Mas n6s
aceitamos facilmente que Deus ndo extermine os que ndo sao
dos nossos?
E qua1 B esse ch%o onde upisan o l i m o de Jonas?
Colocaria a r e d a ~ a odo livro entre os s6culos VI e V
a.C., na dpoca de Esdras e Neemias. 0 reino de Judd, nao
existe mais. Tornara-se uma inexpressiva provfncia persa. 0
segundo templo fora erguido com dificuldades: foi decidido
pela corte (2 Cranicas 36,23), financiado pel0 Estado
(Esdras 6) e ndo respondia aos problemas bbsicos dos
repatriados, que estavam em situagao precdria (Rute 1).
A entao pequena comunidade judaica corria o risco de
ser integrista, nacionalista e clerical. Fechada em si
mesma, ciumenta da pureza da raga, estd sob o domfnio dos
sacerdotes e escribas, e portanto tem horizontes muito
estreitos. 0 6dio contra os povos que foram instrumentos de
sua corrupgiio e da perda de sua identidade nacional a
encerra numa religiao nacionalista feroz. A obsessao pelo
pecado, que 6 a causa da destruigdo de tudo segundo os
profetas, os levou a multiplicar as liturgias penitenciais.
Enfim, o Deus dos patriarcas e dos profetas estb, agora,
Av.
CEDI - Centro Ec&ico
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Mosaicog da B l b l i a 4
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35
Jones
monopolizado em proveito de Judd. A Santidade s6 existe em
JerusalQm.
Com
efeito,
Jonas
representa
esse
nacionalismo
endurecido que ndo quer enxergar alem dos limites de seu
templo, da capital e de seu pals. Portanto, 6 uma narracao
que surgiu em circunstancias particulares da vida do povo da
Biblia, isto Q, em meio aos problemas prdprios que agitavam
a comunidade no pds-exilio.
0
anfincio: o comportamento de Jonas e de Jav6 ontem e
hoje
Ndo h6 no livro nenhum indicio de envio ou missZio para
converter nag6es estrangeiras. Nem se diz que os de fora do
povo de Israel se aceitassem a Tor6 deviam ser incorporados
a Israel, mesmo que porventura viessem voluntariamente a
querer participar do povo de Deus.
Chama bastante a atenqdo que B dltima interpelagao
feita por Jave a Jonas (4,ll) ndo haja uma resposta, e
encerre o livro. Ao fazer isso, o autor joga a discussdo em
diregdo aos leitores que, ao concluir a leitura, acabam se
sentindo na obrigaqdo de discuti-la. E 6 justamente isso que
acontece conosco hoje.
Nossa situaqdo nao 4 muito diferente da do povo da
Biblia que produziu o livro de Jonas. Apenas precisamos
fazer a transposigdo do tipo de sociedade.
Para n6s a alianga entre "tronoIg e "altarw foi
teorizada no seculo passado, de tal mod0 que equivaleu 5
sacralizaqdo do poder estabelecido. Antes dessa teoriza~80,
jd se praticava isso h6 muito tempo.
E, de fato, na nossa dilacerada America Latina, a
pr6tica dessa sacralizagdo do poder estabelecido, tanto o
polltico como o clerical, j6 est6 alcanqando 500 anos. Nisto
somos parecidlssimos com as atitudes de Jonas. E creio poder
afirmar que muito poucas vezes, ou talvez nunca, tentou-se
dar uma resposta a pergunta que Deus faz no final do livro
de Jonas.
Ainda sofremos o embate de duas forgas opostas: de um
lado, a natureza bravia existente na America desde o tal
lldescobrimentoug
e ainda nZio suficientemente dominada pela
mao humana, e do outro, a natureza canalizada por g m p o s de
poder econ8mico para proveito pr6prio Bs nossas custas. 0
Estado seria o representante, ndo da vontade geral, e
portanto ndo da vontade de Deus que fala hoje, como outrora,
na busca ansiosa e profunda, existente no coragdo do povdo,
mas sim representante da modernizagdo que marginaliza e
sacrifica povos.
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- Jones
P b i 36
~
Coloco como importante e inadidvel fazermos uma
transcriqdo do texto de Jonas, mexendo com as feridas de
morte que nos foram impostas. Talvez a celebraqdo dos 500
anos de Evangelizaqao da Amgrica possa ser o momento
proplcio para isso...
...
fico
pensando,
por
exemplo,
como
ficariam
transcritos os capltulos 3 e 4 de Jonas no nosso contexto. E
nas divagaqaes os vejo assim:
A palavra de Deus foi dirigida uma segunda vez ao Luiz,
atraves da reflexao de grupo, estudo e oraqao, nestes
termos :
I1Toma tua coragem com as duas maos e vai anunciar a
minha vontade aos cristaos de fachada 16 da grande capital.
Grita contra eles, tanto na rampa de Baal como nas galerias
do Congresso e nas escadarias do Templo, mas correndo o
risco de ser preso, porque as abominaqdes, principalmente
dessa raqa, ja se tornaram intolerdveisN.
E desta vez Luiz se levantou e iniciou a tarefa. Nao
era nada fdcil, porque a capital e suas cidades satelites
sdo muito povoadas. Mas ele inventou um jeito original para
que todos ouvissem. Gritava e dizia: "Basta! J6 preencheram
sua medida. Pelos quatro planos de massacre vocss tern
quarenta dias para se redimirem, depois disso a capital e os
subarbios serdo devastadosm. E de povo arrasado temos
experiencia a partir do que fizeram hs naqdes indlgenas, h
raga negra, escravizada na AmGrica, e ti natureza amazenica.
Se bem que essa devastaqao toda nao tem nada a ver com Deus,
como se tem apregoado por al!
0s moradores da capital acreditaram no evangelho e
aconteceu uma revoluqbo de mentalidades e comportamentos. 0s
que nos governam e os congressistas ficaram sabendo e,
deixando Baal, entraram nesse movimento, renunciando hs
falcatruas, maracutaias e a todo tipo de abominaqao.
Inclusive, o amor ao dinheiro e as honras desapareceram.
Cada um dos latino-americanos expulsou o policial de
sua c a b e ~ a , especialmente o policial eclesidstico colocado
em todos ao longo desses 500 anos.
Para acabar com nossa fome e a do mundo, e corn a morte
prematura de muitos da Amgrica, todos num s6 coraqdo
voltaram-se contra os imperialismos, que s6 sabem fazer
guerra em golfos, canais e ilhas, e que sbo abenqoados- em
nome de Deus e se consideram justos e santos.
Foi uma festa por toda a parte. Ningugm mais era
solitilrio e marginalizado, explorado e triste. Quando Deus
viu essa festa, adiou a devastaqdo. Vendo isso, Luiz ficou
furioso e comeqou a esbravejar nos jornais e na TV, dizendo:
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Wouicoe & Bfblia 4
- Jonas
phgina 37
ItEu sabia que Deus 8 cheio de compaixao e misericordioso,
lento para a c6lera e rico em bondade e que nunca resolve
tirar a limpo as necess6rias prestaqdes de contas dos maus,
mas agora, por favor, ache um outro para pregar. Estou
chateado! Pref iro morrer do que ver issoIt
.
E Id no fundo do seu coraqdo, uma wvozlt lhe dizia:
"Luiz, vocg tem motivos para ficar tao ~ a n g a d o ? Mas
~ ~ Luiz
foi se trancar em sua casa e nao queria mais participar de
nada. E de 16 ainda esperava o castigo para os mentores de
tantos planos que, por 500 anos, e principalmente nos
Ciltimos acabaram com a vida do povo.
Um dia indo fazer suas compras, viu um vira-lata
abandonado olhando-o suplicantemente. Luiz o adotou, tratou
dele, acarinhou-o.
Dali a trgs dias, o cdo morreu.
Luiz ficou
inconsoldvel e ndo queria mais comer, preferia morra;, Psi
quando ld no fundo do coraqdo veio aquela "vozW d e - n o v o
dizendo: "Vote tem razao de estar tao contrariado a s ~ i m ? ~e,
acrescentou: "VocO
apegou-se a este bichinho que achou
grande e crescido, mas v6 la!!! Eu entendo sua dor. Mas vocO
nao quer me entender. Por que nao haveria de ter a f e i ~ a o
para com estes miserdveis da capital e dos subtirbios? Sao
cento e vinte milhdes de subnutridos, pobres, muitos
analfabetos que nem ao menos sabem distinguir o que 8
amanhecer e anoitecer, pois parte deles est6 nas fabricas ou
nas conduqdes nessa hora, e muitos
sabem ainda menos,
distinguir religiao da f8..."
Pensando bem, com sinceridade... creio que estou mais
para Jonas que pra Jav8. Analisem at8 onde tem ido nossa
luta contra a opressao e exploraqdo em nome do libertador?
Serd que n%o usamos Deus e a religido para salvar s6 o nosso
grupo ou movimento?
Por que depois de 500 anos com cruz, reza, pregaqao e
toda sorte de recursos religiosos, a Am8rica Latina continua
oprimida, explorada, ridicularizada, como caloteira na
dlvida externa e os seus moradores naturais, os amerlndios,
massacrados?
Por que com quase 500 anos de idade ainda n%o somos um
povo de Deus Jav6, mas sim ao "deus dar6?"
Mariano Marchitiello 4 Professor de B f b l i a e mestrando no l n s t i t u t o Ecunhico do P6aGredua~Boem C i h e i a s da Religilo, em Slo Bernardo do Cempo, SHo Peulo.
Rus Francisco Barros Leite, 685
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Mosaicos da B f b l i a 4
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Pfoiw 38
Jonas
A FRAGILIDADE DO PROFRTA SUBCITA A BABEDORIA
E A F O R W DO POVO
Zwinglio Hots Dies
Introdu#o
>
& muito perigoso e nada recomend6vel fazer paralelismos
na hist6ria. 0 leitor da Blblia, no entanto, dif icilmente
escapa desta tentagdo, pois o tema da Blblia 6 a hist6ria da
humanidade, apresentada atraves da experigncia de povos e
pessoas, por meio de est6rias, ditos populares e express6es
culturais (religiosas). Mas ndo se trata de um compendia de
hist6ria universal.
No contexto da hist6ria particular de
um povo se projeta uma visa0 global da humanidade a partir
das experisncias, visijes e sonhos gestados no interior da
experihcia desse povo.
0 centro estruturante de todo o
relato blblico d a intervengdo do Deus desse povo no
conjunto de sua compreensdo da histeria tornando-se assim a
chave de interpreta~dopara todos os acontecimentos em que
se vi envolvido. Como a grande maioria dos textos blbXicos
se refere a gestos e ag6es historicamente concretes, f i c a
diflcil escapar do paralelismo com as situa~desque o leitor
vive em seu presente.
Nao importa o tipo de interpretaqao
que se lhes d6. Mesmo com todas as media~desque possam ser
feitas e usando de todas as metodologias interpretativas que
se conhecem, os paralelismos se estabelecem e o sentido do
texto pode ser torcido, manipulado, ma1 usado, etc. Estamos
sempre correndo este perigo, razao porque conhecer o mais
possivel o contexto de qualquer relato e ter uma visa0 o
mais exaustiva possivel de nossa prepria realidade se impde
como condicdo imprescindivel para uma compreensdo no mlnimo
razodvel da rnensagem biblica.
Isto porque toda andlise e
toda interpretagao representa sempre uma leitura, a escolha
de uma determinada posiqao a partir da qua1 olhamos o objeto
de nossa visbo. Todo ponto de vista 6 a vista a partir de
um determinado ponto, uma determinada posi~ao, como disse
alguem, explicando o 6bvio que nem sempre percebemos.
Vamos, pois, refletir sobre Jonas tomando todas esses
cuidados e correndo o risco de nossas limitagdes e
carencias.
Quem sabe aquela experiencia extravagant%- e
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@gins 39
Jones
inusitada nos trds alguma luz para a tarefa que temos diante
de 116s.
0
context0 de Jonas
A est6ria de Jonas se passa no ano 400 a.c. Tempos
diflceis, de muito sofrimento, de muita opressbo. Vivia-se
num mundo unipolar tendo o impgrio persa estabelecido a sua
pax em todos os quadrantes.
E isso j6 durava mais de um
sgculo!
Dominaqao international militar, polltica e
econemica.
A diferenqa dos asslrios e dos babil6nios os
persas ndo foram tbo brutais, pois sofisticaram certas
formas de controle dando a muitos a ilusdo de liberdade. No
que se refere 3s pr6ticas culturais-religiosas, por exemplo
stiditos
a
manutenqao
de
suas
permitiram
aos
seus
caracterlsticas desde que nao representassem ameaqas ao
establishment imperial.
Mas a exploraqao e opressao eram
implacdveis. A arrecadaqao de impostos foi aperfeiqoada e a
pobreza e miseria marcavam a vida da maioria da populagdo.
l*Tomamos dinheiro emprestado at8 para o tributo ao reiw
(Neemias 5,4).
A serviqo do poder imperial na Palestina
Neemias e Esdras, com financiamento governamental persa
restauraram o Templo, reedificaram Jerusalgm e puseram em
vigor a lei de Moisgs para recuperar a identidade do povo em
base 3 triade Lei, Templo e Jerusalgm, recompondo a tradiqao
que mantinha o povo integrado mas, ao mesmo tempo, submisso
dominaqao persa.
Mas esta alianqa significava o fim dos sonhos
israelitas. 0 reordenamento internacional impost0 e mantido
pel0 imperio aniquilava de vez as possibilidades de Israel
vir a cumprir seu destino hist6rico de "luz para as naqdesw.
A situaqBo era diflcil, os tempos estavam fechados. Alguns
buscavam
alternativas,
Jonas,
embora
sem
entender
completamente isto, O um deles.
Mas haviam tamb8m outros
que em linguagem apocallptica, ou atravgs de acontecimentos
ins6lidos e absolutamente dissonantes em relaqbo ao tom das
vozes dominantes, anunciavam a irrupqdo de algo novo que
romperia com a alianqa com o denominador. 0s exemplos sao
muitos:
a) A hist6ria de Joel, que provavelmente 6 da mesma
gpoca anuncia, em tom apocallptico, a irrupqao do Espirito
da liberdade que libertard os escravos e escravas (Joel
2,28-3,2).
b) 0 livro de Rute, por seu lado, inverte tudo para
escandalo dos profissionais e aproveitadores da religiBo
of icial que, eram, ao mesmo tempo, os dirigentes mdximos da
naqiio israelita. A alternativa niio vird de Jerusalgm. Vird
dos camponeses e atraves das mulheres.
0 Messias- n3o
nascerd em Jerusal&m, mas em Belgm.
E serd descendente de
uma estrangeira!
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Mos8icos da Bfblia 4
- Jonas
Fd~im40
c) J6 levanta seu protest0 contra o sofrimento a que o
justo estd submetido.
d) Eclesiastes denuncia o trabalho vazio e alienado.
e) Cantares canta o corpo, a sensualidade, contra os
rigorismos moralistas e sacralizadores de opressao flsica
que sujeita os corpos e as mentes aos interresses do sistema
imperial.
Todas essas obras de s6bios como assinala M. Schwantes
sdo "severas crlticas aos que acreditavam-se tranquilos,
porque estdo acomodados a leis e sacriflcios, a dogmatism0 e
Templow.
-
0 texto de Jonas d parte desta tradiqao mlstica.
$ uma
espdcie de novela que recobra a mem6ria dos profetas para
atualiza-la ao context0 daqueles tempos de dominaflo,
acomodagao, manipulaqao e sobressaltos.
A
narrativa
0 texto de Jonas estd armado de forma muito peculiar.
Em dois momentos temos o personagem Jonas exercendo o papel
principal mas de forma diametralmente oposta. Em parte do
primeiro capltulo, no segundo e parte do terceiro ele 6 o
her6i ou o santo. Aquele que cumpre a missao que lhe foi
Aqui ele se insere de cheio na tradigao
confiada.
profGtica, fala como algudm que experimenta a sorte dos
sofredores, dos empobrecidos, dd seu recado, anuncia
contetidos embora nao os entenda. Outros sao os interpretes.
No segundo momento, cap. 4, assume posiqao contrsria.
fi
outro.
Nao mais representa a tradi~do dos pobres mas a
mentalidade
dos
senhores do
templo,
dos
donos?-: dainterpretaqao de lei.
Sua irritagao deve-se h dent-dairrupgao da ira divina contra os pagdos. Parece aos
sacerdotes e juizes que, centralizados em Jerusalim,
administravam a alianqa com o imp4rio e haviam reduzido a
atuaqao de Deus na hist6ria b sua prdpria aqao a partir da
lei e do Templo. Sua diretriz era: a misericdrdia de Deus
para nds, seus julzos devastadores para os outros.
Este Jonas nao podia entender e nem aceitar a
misericdrdia de Deus para com os ninivitas Por isso se
irrita porque Deus os trata como se hebreus fossem!
Mas
o
texto
nao
apresenta
apenas
Jonas
como
protagonista.
Na verdade os mais importantes na narraava
sao outros.
Em primeiro lugar temos os marinheiros e
depois, os habitantes da grande cidade de Nlnive e o seu
rei.
Isto d muito importante de observar porque introduz uma
novidade que rompe corn a tradigao dos guardiaes do Templo.
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.'
,-*
:I
:
Mosaicas de B f b l i e 4
- Jonas
pegina 41
Ao reconhecer sua infidelidade no capitulo 1, Jonas dd
aos marinheiros a oportunidade para que interpretem a
mensagem de que ele d portador. Sao eles que lhe explicam a
profecia que ele devia anunciar.
Aceitam a mensagem que
Jonas possui para transmitir, se convertem 2 JavG, tornam-se
hebreus !
Na fragilidade, ignorancia e estupidez de Jonas, o
profeta enviado, o povo (no caso os marinheiros) se desperta
para compreender sua situaqdo e agir em consequencia. E a
sabedoria e forqa do povo, construlda atrav6s de sua pr6pria
condigao histbrica, social e cultural, que lhe permite
interpretar a mensagem que lhe 6 transmitida por algugm que
nao tem a minima noqao do que de fato estd acontecendo. Mas
Jonas no seu limite se curva diante dessa interpretagbo e
recupera a tradiqao dos pobres da qua1 era parte e
depositdrio.
Em segundo lugar temos um outro personagem
importante quanto os marinheiros: o povo de Nlnive.
t%o
Se no lo capitulo o cendrio 6 formado pelo navio e a
situaqao do narrador 6 nos levar aqueles que nele estavam,
no capltulo 3 o cendrio d composto pelas ruas de Nlnive e
inclui o povo e seu monarca, que adere a decisao do povo sem
nada acrescentar ou impor.
0 que nos interessa destacar aqui d o fato de que tanto
no capltulo 1 como no capitulo 3 a atenqao do texto recai
sobre a r e a ~ a o2 profecia. Nao sobre a pessoa do profeta,
mas sobre quem faz a interpretaqao da palavra.
Nem mesmo
esta, seu contefido e seu significado, merece maior atenqao.
A gnfase estd posta sobre os intgrpretes. Eles 6 que silo de
fato os verdadeiros protagonistas da hist6ria de Jonas. Sua
reagao 6 que interessa. Assim no capltulo 3 a populagao 6 a
primeira a reagir.
Toma posiqao frente as ameagas do
profeta. Cre e convoca a todos para o jejum. Trata-se de
uma reagao plena e completa. Ao ver isso o monarca age em
meio a seu povo e em continuidade a ele.
Assume a mesma
atitude: converte-se com todo o povo.
0 texto nao diz
explicitamente de que se convertem.
Mas fica evidente,
levando-se em conta a tradigao prof&tica, que se trata de
uma conversao dtica.
"Maus caminhosl@ deve ser entendido
como llopressZioll
winjustiqafl. Mas se trata tambGm de uma
conversdo a Jav6, creram no Deus de Jonas, apesar da
incornpetencia do profeta na realizaqao do seu trabalho. A
profecia por ele anunciada consta de apenas cinco palavras
Ninive era uma
(em hebraico) e foi s6 isto que ele fez.
cidade grande e se necessitava de tres'dias para percorre-la
(3,3) e Jonas andou apenas um dia (3,4) e tinha pouco a
dizer: ItAinda quarenta dias Ninive serd destruida" (3,4).
Fica evidente que o povo, destinatdrio da mensagem, passou
tambgm a ser seu portador ao interpretar o sentido das
palavras de Jonas. Des-cobriram o sentido real e vital da
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Jonas
p4ginm 42
lvpalavra do Senhorm (1.1). Somente Jonas nao entendeu o que
fazia o Esplrito do Senhor Itque fez o mar e a terratt(1,9).
Em todo o texto fica evidente a contraposiqdo entre
Deus e seu profeta.
Ambos agem de forma totalmente
distinta. Jonas, preguiqoso e sem visa0 reduz seu trabalho
o quanto pode aceitando a versdo institucional de agbo de
Deus na hist6ria. Contenta-se com a situaqao estabelecida e
6 incapaz de perceber as surpresas que sobressaltam a
hist6ria.
Era normal para um hebreu esperar a destruig80
dos pagaos que os oprimiam.
Deve ter miseric6rdia deles?
Isto B absurdo!
E Jonas
Mas os caminhos de Javg sao surpreendentes.
ficou sem ter o que responder a Deus que, com ele, mas
apesar dele, salvou Nlnive.
1. A re-criagiio do povo d e Deus no meio da histbrim-
A tragddia das Igrejas atravgs dos tempos tern sido a
E
sua auto-identifica~ao como o povo exclusive de Deus.
esta d a repetiqao da tragddia experimentada pelo Israel
blblico. A busca de hegemonia no cendrio das n a ~ d e s ,mesmo
que esta hegemonia fosse apenas te6rica out entao, indireta,
encoberta, aliada com os poderes dominantes, nas diferentes
conjunturas que se foram sucedendo, marcou a vida de Israel
e tem marcado a vida das Igrejas.
Na experiencia do povo hebreu que o Antigo Testamento
nos relata percebemos o desvio de Israel da vocaqao a que
foi chamado.
0 conflito entre poder e servigo a todas as
naq6es se estabelece logo que
as elites dirigentes se
entusiasmam e se embriagam com as possibilidades que o
exercicio do poder politico, econ8mico e religiose, lhes
oferecem.
A proposta original de ser uma bengbo, urn barn
para todas as naqdes, d ofuscada pelo brilho do exercxcio do
poder para si. 0s servidores do povo se transformam em seus
alianqas com poderes maiores
sao
dominadores.
As
estabelecidas e Israel, apesar dos conflitos internos, vai
perdendo com rapidez, na medida da consolidaqdo da
monarquia, seu lugar singular na hist6ria. k nesse process0
que surge o movimento profgtico. Movimento de oposiqao, que
batalha em favor de sua vocaqdo original e vai descobrindo
que a condi~doae povo de Deus tem limites bem mais amplos
que a raqa ou as condiq6es s6cio-hist6ricas de um povo
especlfico.
0 acionar dos profetas recuperando a proposta original
de JavC para os hapiru (0s hebreus) ganha contornos Bticos e
politicos muito claros e se choca frontal e definitivamente
com a versdo religiosa institucional da casa real de Davi.
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-
W~M
43
Jones
0 povo de Deus deixa de ser uma
nacionalidade
constitulda e estratificada para constituir-se na estirpe
dos sofredores, oprimidos e empobrecidos deste mundo. & no
meio deles que Jav6 est6 presente e atua. Jave 6 a fonte, a
forqa e o poder da vida. Tudo o que produz mais vida para
os que estao no vale da morte 6 sinal da aqao de Jav6.
E Jav6 fala e age pela instrumentalidade daqueles que
aparentemente nao contam para os jogos de poder dentro da
hist6ria, seja em nfvel local, regional ou international.
Age por meio de situagdes, iniciativas e atitudes dos
empobrecidos que intuem, no meio das condiqdes anti-vida que
tem de enfrentar, os valores fundamentais da vida que Jav6
mesmo representa.
Por outro lado, de forma surpreendente e ins6lita
estabelece desafios e conduz a trama da histdria andando por
caminhos jamais pensados pelas institucionalidades que se
vao estabelecendo atraves do ordenamento econ6mic0, social,
cultural e juridic0 das sociedades humanas.
Jav6 atua
livremente, seu Esplrito que 6 o Espirito da Vida atravessa
a Hist6ria e suscita a forqa que impede a sua destruigao que
6 sempre iminente por causa da embriaquez do poder que
acomete os homens e as mulheres.
Nesse process0 nem sempre os instrumentos da agao de
Jav6 sdo conscientes do que estao realmente fazendo. Jonas
realizou um trabalho mas nao entendeu o que estava fazendo.
0s destinatdrios de sua mensagem perceberam, muito mais do
que ele, do que se tratava.
Tanto os marinheiros como os
habitantes de Ninive souberam interpretar o sentido da agao
de Jonas numa proporqao infinitamente superior a ele.
A
fragilidadde do profeta suscitou forgas e capacidade at6
ent%o ocultas no meio do povo que lhe possibilitavam
reorientar suas vidas mudando o curso de sua hist6ria. Esta
reorientagao veio do meio do povo.
Nao foi imposta por
instrumentos autoritdrios e nem avalizada pelas estruturas
de poder existentes.
0 rei curvou-se 2i vontade do povo.
Obedeceu ao novo movimento da hist6ria em lugar de ser
obedecido. Foi conduzido em lugar de conduzir.
Se o Esplrito de Jave se aninha nas dobras da hist6ria
aconchegando-se entre os deserdados deste mundo a Igreja
estd convocada a rever continuamente suas atividades,
posiqdes e pronunciamentos. fi precis0 deixar de ser como um
Jonas contemporaneo, que ndo entende sua missao e nao
percebe a vontade de Deus para o povo. Mais que isso, se o
Esplrito se move no interior da hist6ria suscitando a forqa
da vida entre aqueles que nao tem passado nem presente mas
que buscam a vida no futuro, entao os que receberam a
"Palavra do Senhorl1 tem que se esforqar para descobrir a
comunidadde de vida que ele estd re-criando continuamente
fora de Jerusal6m e longe da Tord.
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Pogim 44
Mas o Esplrito de Deus se move entre o povo e move o
povo por meios muito prdprios, que desafiam nossas andlises
conjunturais, politicas econdmicas e hist6ricas.
Sempre
somos unilaterais e marcados por nossa prdpria situaqao
hist6rica.
Privilegiamos determinadas vis6es e certos
E
feixes de conceitos sobre a vida e sobre a hist6ria.
fazemos isto enquanto grupo, classe e indivlduos. Com isso
perdemos a visa0 mais ampla da vida que inclui seus
mistBrios e os gestos pequenos e simples que dbo origem a
suas grandes torrentes.
Interessante que o Esplrito age
exatamente por ai, sem violentar os cddigos culturais e
dando preferencia aos gestos que, entre os empobrecidos,
geram os sinais de que a vida B sempre possivel.
Nao B gratuito que a est6ria de Jonas se passe um
s6culo depois do estabelecimento da pax persa.
E acontece
para anunciar a possibilidade de mudanqa, de vida nova que
se contrapee e nega o establishment de injustiga e opress0lo.
2. As perplexidaden don religiosos ante as aurgrmsas:
geradas pelo Espirito na hist6ria.
No capltulo 4 de Jonas nos deparamos com urn dialog0
muito estranho.
Jonas, portador da mensagem de Jav6 o
interpela de forma agressiva e irritada porque nao entende
sua 16gica. Sua visa0 de Deus se enquadra e se limita a
missao religiosa do Templo, que, por sua vez corresponde aos
interesses da elite dominante aliada aos persas e que se
beneficiava da sujeiqao do povo hebreu 3s imposigdes do
poder persa.
0s ndo-hebreus, ou seja os pagaos estavam
destinados 3 ira divina de Jave. Mas Jave resolve salvar os
ninivitas, transform&-10s tambem em seu povo.
Sinal de
mudan~a, sinal da irrupgao do novo numa situagao hist6rica
aparentemente j d def inida e fechada.
Jonas cumprec sua
tarefa contrariado, com ma-vontade.
Faz tudo pela metade.
0
Mas mesmo assim o resultado 6 animador, surpreendente..
povo responde h JavB e escapa da condenaqao.
Jonas fica
amargurado porque ndo era isto que ele esperava. A ira de
Deus contra os nao-enquadrados no modelo de povo-escolhido,
sim. A misericdrdia, o perdao e uma nova possibilidade de
Ele ndo entende e se exaspera.
E o texto
vida, nao.
Jonas amargurando sem poder
termina com um final infeliz.
entender e muito menos responder a pergunta crucial de Jav6
sobre a necessidade de misericdrdia para com o povo de
Nlnive!
Se a aqbo de Jav6 foi surpreendente frente- aos
parhetros tradicionais israelitas ela obedece tam.& ao.seu
prop6sito de re-criar continuamente as condigbes de vida
para todas as suas criaturas.
Como nas outras novelas da 6poca recolhidas no Antigo
Testamento, a aqdo de Jave 6 revelada atraves de
acontecimentos que ocorrem no meio do povo empobrecido. e
-
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- Jonas
Pegins 45
oprimido que revelam a possibilidade e precariedade das
estruturas que se pretendem monopolizadoras e porta-vozes
dnicas da mensagem da vida.
A est6ria de Jonas, como de
Joel, de Rute e tantos outros nos revela um fato
surpreendente: a irrupgdo dos anseios de vida, ou seja de
obedigncia a JavB, no meio daqueles que, aparentemente est%o
condenados para sempre ao reverso da vida.
E que d
precisamente ld que o Esplrito de Jav6 estd atuando, movendo
a hist6ria apesar dos poderes que pretendem o seu fim.
Estamos h6 escassos 400 anos antes do acontecimento
mais revelador da atuagdo do Esplrito de Jav6: Jesus Cristo.
A conversdo dos ninivitas B sinal da universalidade da
promessa da vida para todos.
E isto num tempo de trevas,
quando ndo parece mais haver alternativas a proposta do
poder dominante que jd se impde h6 cerca de um seculo!
Por outro lado o texto de Jonas nos convida a um
enfoque completamente diferente daquele a que os religiosoa,
os profissionais da religiao (no bom e mau sentidoi da
expressdo), os piedosos ante seus pr6prios olhos, est%o
acostumados a exercitar. 0 texto coloca sua Gnfase sobre os
destinatarios da mensagem. Ndo leva em conta nem o emissor
e nem o contetido da mensagem. 0 que interessa no relato B o
povo destinatdrio e sua reaqdo a possibilidade de vida nova,
diferente, gratificante.
0s marinheiros e o povo de Nlnive 6 que sao os
verdadeiros protagonistas da trama em que Jonas, contra sua
vontade, se vt2 envolvido.
Nesta est6ria nos defrontamos com urn Jave ecum&nico,
universalists, que salta os limites que Israel em sua autoconsciencia de povo-escolhido lhe havia imposto.
E a vida
do povo, e do povo empobrecido e oprimido que interessa a
JavB. S%o eles que, no drama da vida constroem a trama da
hist6ria, reconstrulndo valores e abrindo caminhos para a
llcivilizaqdo do amoruu, como quer D.
Helder Camara,
inaugurada por Jesus de NazarB.
Em contrapartida os religiosos, aqueles que dividem o
e uelesuu,que se pretendem guardides do
mundo entre vtn6svt
sagrado, representantes oficiais de Jav6, se ocupam de si
mesmo e nZio percebem a forqa da vida presente entre os
lloutrosuu,os pisoteados e esquecidos nos caminhos da
hist6ria. Ou entdo se ocupam da mensagem cuidando de suas
formulagdes, construindo verdades em nome de JavB, que ndo
passam de expressdes de seus pr6prios interesses e sde. suas
institui~des.
Mas na medida em que a vida do. povo
empobrecido e humilhado ndo se constitui na carnea e no
sangue dessas verdades, elas morrem antes mesmo de ver a
luz, contaminando e cegando seus portadores que assim ndo
conseguem nem ver e nem discernir a agdo do Esplrito no
interior mesmo das-variadas e misteriosas pulsees da. v i b .
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llossicoa & Bfblie 4
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pagina 46
Jonas
Nlnive era capital da Assiria, naqdo subordinada 3
dominagdo persa como os hebreus. Mas nagao pagd para estes,
que j6 os havia oprimido por tanto tempo e que s6 merecia o
ddio dos judeus. A misericbrdia de Jav6 para os ninivitas
era por isso incompreensivel para Jonas. Salvar os inimigos
de Israel? Dar-lhes a oportunidade de vida, da mesma forma
que era oferecida aos hebreus?
Jonas ficou com raiva de
Jav6 e extravasou esta raiva!
Estava cego e cego ficou.
Nao teve visao para ver o ~splritode Javg no meio do povo
empobrecido e oprimido dos assirios de Nlnive.
Pensou a hist6ria corn rigidez e estreiteza. Tinha como
os demais hebreus o sonho de liberdade e da reconstrugao do
Reino de Israel mas apavorou-se ante o lmfechamentoN da
hist6ria impost0 pelos persas.
Objetivou, junto com os
llderes do Templo esse sonho, que virou dogma, perdendo a
forga da vida que lhe era inerente. Esta foi uma das razdes
do fracasso nacional de Israel. Ao nao perceber a forga da
vida no meio do povo empobrecido e oprimido deixou de ser
uma beng%o, um bem para os demais, porque passou a viver.em
f u n ~ a ode si mesmo, de suas pr6prias e limitadas visdes.
0 evangelho vai surgir mais tarde dando plenitude a
esses sinais que o precederam.
E hoje continua como um
desafio remetendo-nos para o meio da histbria, ali onde a
vida nasce nos pequenos gestos de solidariedade, de servigo
e de amor, de promogdo da justiga e da liberdade, ainda que
pequenos e frdgeis.
S6 ndo devemos nos esquecer que os
grandes e caudalosos rios nascem de pequenos e muitas vezes
escondidos riachos perdidos e esquecidos nas montanhas.
Zwingtio Mote Dies 6 pastor de l g r e j a Presbiteriana Unida e Secrethrio Geral .do Centro
Ecunhico de DocrmentegPo e Informagio
CEDI.
R u e Santo Amaro, 129
22211
Rio de Janeiro
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Programa de Assessoria a Pastoral (Pp) Paulo Cesar