Nem Teoria do Nicho ou Teoria Neutra explicam a composição das assembléias de briófitas epífilas em pequenas escalas espaciais na Amazônia Central Eduardo dos Santos Pacífico nas assembléias deve ser determinado Introdução Os fatores estruturais e por características ambientais que determinantes para a composição das relacionam as espécies capazes de se assembléias estabelecer em determinados locais. são diversos, como condições e variações ambientais locais e características das Teoria Neutra da Biodiversidade e espécies, entre outros. Não há um Biogeografia como um processo não consenso da importância relativa de determinístico alternativo a Teoria do cada um destes fatores na composição Nicho. das assembléias (Hérault 2007). A Biodiversidade e Biogeografia (Hubbell Teoria do Nicho, elaborada inicialmente 2001) presume que as comunidades por Grinnell (1917), é usualmente ecológicas são estruturadas por deriva utilizada para explicar estes padrões de (estocasticidade composição. Diversas definições foram todos os indivíduos de uma assembléia propostas para o termo nicho, sendo possuindo uma de reproduzir, morrer ou migrar (Hubbell Hutchinson (1957), que definiu nicho 2005). De acordo com a Teoria Neutra, como condições os mecanismos que geram diferenças bióticas e abióticas que determinam os entre os padrões de composição das limites dentro dos quais as espécies espécies estão ligados à capacidade de podem persistir e manter populações dispersão dos indivíduos (McGill et al. viáveis. De acordo com esta teoria, cada 2006). Portanto, as assembléias mais indivíduo se estabelecerá somente em próximas devem ser mais similares do habitats onde as condições ambientais que as assembléias mais distantes locais sua (Gaston e Chown, 2005). Assim, a Desta Teoria do Nicho e a Teoria Neutra das mais um utilizadas conjunto forem sobrevivência intrínsecas Em 2001, Hubbell propôs a de propícias e reprodução. a à A Teoria demográfica), igual forma, considerando a Teoria do Nicho, buscam o padrão de composição das espécies composição Neutra explicar das probabilidade o padrão espécies da com de de nas 1 assembléias utilizando processos distintos. diversas proteínas responsáveis por rehidratar o organismo eficientemente Diversos organismos têm sido (Glime 2007). O sombreamento parece estudados à luz das duas teorias. não ser também limitante, pois, em Algumas vezes a Teoria do Nicho geral, briófitas estão bem adaptadas à explica melhor os padrões encontrados ambientes sombreados. e, em outros casos, a Teoria Neutra Apesar da alta capacidade de parece ser mais adequada (e.g. Cottenie dispersão dos esporos de briófitas, o 2005, Thompson & Townsend 2006). observado na natureza é que a maioria De maneira geral, a Teoria Neutra tende dos esporos é depositado a até 2 m de a explicar melhor os padrões de sua origem (Crum 1972, Glime 2007). composição de Muitas briófitas são caracterizadas por organismos residentes, como plantas possuírem dispersão limitada em escala (Chave 2004, mas veja Chu et al. 2007). local (Hedenâs et al. 2003). Soma-se Isto ocorre, pois organismos sésseis têm ainda o fato de que outra forma muito maiores restrições quanto a dispersão, o comum de dispersão é a dispersão que torna a dispersão um fator mais vegetativa, importante localmente a colônia (Frahm 2008). de na assembléias composição das comunidades. Desta Briófitas possuem características capaz forma, de apesar expandir dos esporos possuírem grande distintas de todas as outras plantas, dispersão por como a ausência de lignina, que auxilia (principalmente na sustentação e na proteção contra luz também por insetos e pela água), a ultra-violeta. Além disso, não possuem distribuição de muitas espécies de um sistema condutor por traqueídeos, briófitas é restrita (Frahm 2008, Glime limitando ou dificultando o transporte 2007). interno de água, nem capacidade diferentes pelo de meios vento, mas raízes, Neste contexto, este projeto visa impossibilitando a absorção de água do identificar se a Teoria do Nicho ou a substrato (Glime 2007). A umidade Teoria Neutra são capazes de explicar também parece não ser um fator as limitante, pois muitas briófitas são assembléias tolerantes à dessecação, produzindo ao residentes menos 74 proteínas específicas durante sciophilum períodos de estiagem, além de produzir grande tolerância apresentada pelas diferenças na de na composição briófitas espécie (Arecaceae). das epífilas Astrocaryum Devido à 2 briófitas à condições ambientais muito abundantes (Zartman & Ilkiu- importantes para plantas, como umidade Borges 2007). Como a palmeira A. e luz, espera-se que a Teoria do Nicho sciophilum possui filotaxia em forma de não explique o padrão de composição roseta, é possível identificar a ordem de das assembléias de briófitas. Por sua expansão das folhas. Desta forma, foi vez, devido às restrições na dispersão, coletado um folíolo da parte média espera-se que a Teoria Neutra explique (estimada visualmente) da quinta folha o padrão de composição de diferentes expandida de 23 indivíduos de A. assembléias. Portanto, espera-se que às sciophilum. condições ambientais locais não estejam Buscando correlacionar as correlacionadas com as diferenças de características composição assembléias, distância geográfica entre os pontos de enquanto que a distância entre as coleta (variáveis preditoras) com a assembléias deve estar correlacionada composição das assembléias de briófitas com diferenças na composição das epífilas espécies necessário avaliar a similaridade entre entre de as briófitas entre as assembléias. ambientais (variável locais resposta), e fez-se todos os pares de pontos quanto a cada variável. Desta forma, mostrou-se adequado o uso de matrizes pois Métodos Este estudo foi realizado na possibilitou avaliar simultaneamente a Reserva do Km 41, parte da Área de similaridade de cada variável entre cada Relevante Projeto Interesse Dinâmica Ecológico do par de pontos. Assim, foram feitas três Biológica de matrizes, uma para as condições Fragmentos Florestais (INPA/STRI), ambientais locais, outra para a distância uma área de floresta de terra firme na geográfica entre as assembléias e uma Amazônia Central (02°30’ S; 59°52’ O). última Como morfotipos nas assembléias. Para a sistema de estudo, foram para a composição dos utilizadas as assembléias de briófitas comparação epífilas que vivem sobre os folíolos da importantes palmeira morfotipos de briófitas epífilas foi (Arecaceae). Astrocaryum Estas sciophilum assembléias de na quais fatores distribuição são dos de realizado um teste de Mantel parcial. briófitas, limitadas às superfícies das Este teste estima a correlação entre duas folhas, possuem tamanho que facilita matrizes, controlando o efeito de uma seu estudo, são facilmente encontradas e terceira matriz (Legendre & Legendre 3 1998). Para correlacionar a composição sciophilum amostrados em cada local de de morfotipos e as características coleta. Posteriormente, a fotografia foi ambientais, excluiu-se o efeito da transformada em preto e distância Considerou-se a parte branca geográfica, correlacionar a e para composição de branco. da fotografia como a área na qual a morfotipos e a distância geográfica, incidência excluiu-se o efeito do ambiente. Todos diretamente o folíolo de A. sciophilum e os dados foram analisados com o a parte preta da fotografia como a área programa R (R Development Core coberta pelo dossel. Em seguida, foi Team 2008). contabilizada a porcentagem de dossel luminosa pode atingir A construção da matriz de (parte preta) na imagem. A distância do composição dos morfotipos de briófitas folíolo de A. sciophilum amostrado até o foi feita utilizando os folíolos de A. igarapé foi calculada no mapa da sciophilum. Foi analisado com uma lupa Reserva do km 41, plotando-se os o folíolo inteiro de A. sciophilum. pontos de coleta e medindo a menor Foram anotados os morfotipos de distância até o igarapé mais próximo. briófitas epífilas presentes em cada Foi realizada uma correlação espacial de folíolo. Com estes dados, foi construída Pearson uma matriz binária de presença e Dutilleul para avaliar se as variáveis ausência dos morfotipos de briófitas em ambientais cada folíolo. Em seguida, foi feita uma Como não houve indício de correlação matriz de dissimilaridade para cada par entre de Pearson=0,048; pontos da amostra usando o ajustada pelo estavam elas (F método de correlacionadas. da gl correlação corrigidos de pelo coeficiente de Jaccard (Krebs 1989). método de Dutilleul=20,052; p=0,837), Desta forma, foi obtida a matriz de ambas composição dos morfotipos. possibilitar a comparação, as duas Para a construção da matriz de características ambientais, foram variáveis utilizadas. ambientais Para foram foram padronizadas. Foi feita uma única utilizadas duas variáveis: cobertura de matriz das duas variáveis ambientais dossel sobre o folíolo e distância da com o índice de dissimilaridade de assembléia ao igarapé mais próximo. distância euclidiana (Krebs 1989). Esta Para estimar a cobertura vegetal sobre o matriz folíolo, foi tirada uma fotografia digital ambiental referente à luminosidade e a do dossel sobre os indivíduos de A. distância ao igarapé mais próximo entre representa a dissimilaridade 4 os folíolos. Portanto, quanto menores os pontos de coleta até o igarapé mais valores na matriz, mais similares eram próximo foi de 128,87 m (dp=118,64 as condições ambientais de cobertura de m). dossel e distância ao igarapé entre os pontos. A similaridade da composição de morfotipos de briófitas epífilas entre Para distância criar uma entre os matriz da os indivíduos de A. sciophilum não indivíduos estava correlacionada com as diferenças amostrados, os pontos de coleta foram nas transformados controlando em coordenadas características o efeito ambientais, da distância planares. Em seguida, foram calculadas geográfica entre pontos de coleta (r de as distâncias em linha reta entre cada Mantel parcial=-0,039; p=0,659). A par de pontos coletados, criando a composição das espécies de briófitas matriz geográfica da distância entre os epífilas pontos de coleta. Com as três matrizes correlacionada com a distância entre os (composição dos morfotipos, variáveis indivíduos ambientais e distância geográfica), foi controlando o efeito das características realizado o teste de Mantel parcial para ambientais (r de Mantel parcial= saber o quanto as variáveis ambientais e 0,020; p=0,624). também de não A. estava sciophilum, - a distância geográfica explicavam o padrão de distribuição das espécies de Discussão briófitas. O fato de que a similaridade da composição das espécies de briófitas Resultados No total foram identificados sete epífilas não é correlacionada com as características ambientais indica que a morfotipos, sendo a maioria encontrada Teoria em todas as assembléias (média ± dp do composição de espécies. Desta forma, a número de morfotipos em cada folha: 5 riqueza de briófitas epífilas, segundo ± 1 morfotipos). Os 23 indivíduos de A. este estudo, parece não ser influenciada sciophilum coletados estavam distantes por condições ambientais locais em entre si de 141 a 2691 m (média ± dp: florestas de terra firme na Amazônia 1281 ± 567 m entre si). A cobertura Central. do Nicho não explica a média do dossel sobre as folhas A ausência de correlação entre coletadas foi de 93,84% (dp=10,29%), distância geográfica e similaridade de enquanto a distância média entre os composição das espécies de briófitas 5 epífilas registrada neste estudo indica ser um fator limitante, pois as espécies que a Teoria Neutra também não já puderam atingir todos os ambientes. explica o padrão Em Um ambiente estável por um fragmentos florestais, a dispersão de período de tempo suficiente para o briófitas é evidenciada como um fator estabelecimento das briófitas epífilas, limitante, na somado a grande tolerância das briófitas composição das espécies (Pharo & às variações ambientais, podem tornar a Zartman 2007). Contudo, as populações Teoria do Nicho e a Teoria Neutra se tornam reprodutivamente viáveis na improdutivas na explicação dos padrões superfície de plantas em menos de seis de composição das espécies de briófitas. meses Caso processos relacionados à Teoria causando (Zartman Somado encontrado. a diferenças & esta Shaw 2006). capacidade de do Nicho ou à Teoria Neutra possuam colonização, existem evidências de que importância em décadas espécies de briófitas nas assembléias, (aproximadamente 20 a 30 gerações), estes padrões podem ser importantes no briófitas se momento da colonização do local. estabelecer em todo o fragmento, Porém, dado o tempo necessário para removendo pela que populações de diferentes espécies fragmentação prévia (Zartman 2003). da assembléia possam se estabelecer em Neste caso, as espécies já atingiram alta todos densidade em todo o ambiente, tornando composição, caso exista, desaparece. apenas três epífilas o efeito conseguem causado os na estruturação lugares, o das padrão de a dispersão menos importante. Este Os processos que estruturam as processo deve ter ocorrido da mesma assembléias podem atuar de diferentes forma em florestas contínuas. Apesar da maneiras dependendo do nível trófico e dispersão dos esporos ser pequena em da ambientes florestais devido à baixa taxa (Thompson & Townsend 2006). Este de estabelecimento e ventos fracos estudo foi realizado com um grupo de dentro da floresta (Økland et al. 2003), organismos com curto tempo de geração o tempo em que as populações já e ocupam o ambiente pode ter sido ambientais adversas. Estudos futuros suficiente para a colonização de grandes poderiam relacionar os padrões de áreas composição gerando alta densidade no ambiente. Assim, a dispersão deixa de característica grande das tolerância de às espécies condições assembléias com diferentes características da história de vida, como organismos com tempo de 6 geração longo e pouca tolerância à alpine meadow communities. mudanças ambientais. Annals of Botany, 100:807–812. Cottenie, K. 2005. environmental Agradecimentos Ao Paulo Enrique, professor, processes Integrating and spatial in ecological orientador e amigo para todas as horas e community dynamics. Ecology em todos os momentos. Ao Glaucólise, Letters, 8:1175–1182. um exemplo de amor a ciência e Crum, H. 1972. The geographic origins dedicação na orientação. Aos monitores of Fabricera e Lelê, pessoas incríveis, que America's me ajudaram demais e serviram de forest. Journal of the Hattori exemplo. À todos os professores que Botanical Laboratory, 35:269- passaram pelo EFA 2009 e ajudaram, 298. the mosses of eastern North deciduous especialmente ao amigo Adal, Cíntia, Frahm, J. P. 2008. Diversity, dispersal Rafael, Zé, Jochen, Gonçalo, Mário e and biogeography of bryophytes Flávia (mosses). (coordenadora). Obrigado a Biodiversity todos os amigos do EFA: Tosha, Marcel Conservation, 17:277-284. Bebê, Claudinha, Carine, Musgo, Mary, Gaston, K. J. & S. L. Chown. 2005. Mari, Pati, Papito, Tico, Paulinha, Lua, Neutrality Caio, Zézo, Lilian, Diogo, Guiga e Functional Ecology, 19:1-6. Felipe. Muitíssimo obrigado Glime, Carolzinha. O céu é só uma promessa... J. and the M. 2007. niche. Bryophyte ecology. Physiological ecology. Acessado em 8 de Referências maio de 2009 Chave, J. 2004. Neutral theory and <http://www.bryoecol.mtu.edu/> community ecology. Ecology Letters, . 7:241–253. Grinnell J. 1917. The niche-relationship Chu, C.J., Y.S. Wang, G.Z. Du, F.T. of the California thrasher. Auk, 34:427– Maestre, Y.J. Luo & G. Wang. 33. 2007. On the balance between Hedenâs, H., V.O. Bolyukh & B.G. niche and neutral processes as Jonsson. 2003. drivers of community structure distribution of along a successional gradient: Populus tremula in relation to Spatial epiphytes on insights from alpine and sub7 dispersal mode. Journal of Vegetation Science, 14:233–242. Hérault, B. 2007. Reconciling niche and of opportunity. Ecology, 84:1909–1919. Pharo, E.J. & C.E. 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