UNIVERSIDADE SAGRADO CORAÇÃO III SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE LINGUAGENS EDUCATIVAS: EDUCAÇÃO MÍDIA E CULTURA ANAIS 09 a 12 de março de 2010 Bauru – SP PRESIDENCIA DO EVENTO E DA COMISSÃO ORGANIZADORA MS. ENGº. RODRIGO ROCHA CHANCELER DRª. IR. ELVIRA MILANI REITORA DRª. IR. ILDA BASSO DIRETORA DO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS ORGANIZAÇÃO GERAL DO EVENTO Profª Drª Marileide Dias Esqueda COMISSÃO ORGANIZADORA Profª. Daniela Luchesi Prof. Ms. Dariel de Carvalho Profª. Ms. Eveline Ignacio da Silva Profª. Esp. Giovana Gobeth Prof. Ms. Cláudio J. Corradi Júnior Profª. Drª. Maria de Lourdes M. Tabaquim Profª. Drª. Marileide Esqueda Profª Drª. Marly de Jesus Bonome Vita Profª. Drª. Nair Leite Ribeiro Nassarala Profª. Drª. Regina Maria Furigo Profª. Drª. Rosa Tolón Profª. Drª. Sandra Saes de Oliveira Profª. Ms Valéria Biondo Jornalista Alex Costa Relações Públicas Penélope Santos EQUIPE DE APOIO Áurea Cardoso Santos Marie Yokomizo Cristiano Silva Eliete Bueno COMISSÃO CIENTÍFICA Presidente: Profª. Drª. Maria de Lourdes M. Tabaquim Prof. Dr. Alberto de Vitta Profª. Drª. Ana Celina Guimarães Prof. Dr. Antônio Walter Ribeiro de Barros Junior Profª. Drª. Irmã Ilda Basso Profª. Drª. Irmã Susana de Jesus Fadel Profª. Drª. Leda Aparecida Francischone Profª. Dr.ª Marileide Esqueda Profª Drª Marilene Cabello Di Flora Profª. Drª. Sandra de Oliveira Saes Profª. Drª. Sandra Fiorelli de Almeida Penteado Simeão Prof.ª Drª. Sara Nader Marta S6124 Simpósio Internacional de Linguagens Educativas (3. : 2010 : Bauru, SP) Anais do 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas: educação mídia e cultura, Bauru, 09 a 12 de março de 2010. – Bauru : Universidade Sagrado Coração, 2011. 401p : il. I. Universidade Sagrado Coração. II. Título APRESENTAÇÃO Temos o prazer de confirmar a realização do III Simpósio Internacional de Linguagens Educativas promovido pelo Centro de Ciências Humanas da Universidade Sagrado Coração (USC), para o período de 9 a 12 de março de 2010. O objetivo geral deste III Simpósio é o de tornar acessível á sociedade o conhecimento e a cultura de domínio da universidade, sejam eles originados de sua própria produção ou da sistematização do conhecimento universal disponível. Pretende-se promover a ambiência interdisciplinar das linguagens educativas relativas ao conhecimento nos diferentes níveis de ensino, pesquisa e extensão, buscando concretizar as metas propostas no Projeto de Desenvolvimento Institucional – PDI e Projeto Pedagógico Institucional – PPI. Esperamos que os simposiastas deste evento possam aproveitá-lo ao máximo, visto que o enorme crescimento da área da Educação e de suas possíveis Linguagens Educativas gera grandes discussões e expansão em direção a diferentes especialidades, recortando o campo disciplinar em interfaces tais como Educação, Mídia, Cultura e Tecnologia. Bons trabalhos! Profª Drª Marileide Esqueda Comissão Organizadora SUMÁRIO Desafios para a educação e inclusão digital pela tv pública. Alan César Belo Angeluci, Maria Teresa Miceli Kerbauy......................................... 7 Representações sociais de alunos com deficiência: a inclusão nas instituições de ensino superior na cidade de Bauru Aline Aparecida Fortunato, Marilene Cabello Di Flora............................................. 23 A educação do corpo através da mídia impressa destinada ao público adolescente Ana Carolina Biscalquini Talamoni........................................................................... 40 Expansão tecnológica e interações interculturais: algumas considerações do projeto teletandem brasil para a aprendizagem de línguas estrangeiras Ana Cristina Biondo Salomão................................................................................... 55 Funções executivas e percepto-motoras em crianças com baixo rendimento escolar Ana Paula Gasparotto Paleari, Maria de Lourdes Merighi Tabaquim...................... 75 Inclusão: o portador de deficiência na escola regular Barbara Amaral Martins............................................................................................ 91 Demandas focadas para assessoria em psicologia escolar Camila Pereira, Marcelo Mendes dos Santos, Ester Tereza Senger Petroni, José Rafael Mazzoni......................................................................................................... 92 Análise das tiras em quadrinhos O Ilusionista, de Adão Iturrusgarai Carolina Zumiani Navarro......................................................................................... 93 O acesso da criança de 6 anos no ensino fundamental Cintia Renata Pascolato, Marisa Aparecida Pereira Santos.................................... 94 Desenvolvimento e aplicação de objeto de aprendizagem sobre aquecimento global com alunos do ensino fundamental Clerison José De Souza Bueno, Rodrigo Batista Edamatsu, Richard dos Santos, Dariel de Carvalho....................................................................................... 106 O comunicador social e as mídias: cenários em construção Eliane Cintra Rodrigues Montresol, Thalita Maria Mancoso Mantovani E Souza, Ana Paula Saab De Brito, Fábio José De Souza..................................................... 107 Trabalhando frações com horas no Excel Ellen Cristina Ferreira, Sandra Fiorelli de Almeida Penteado Simeão..................... 122 Moda e estilo um resgate da vivênvia através da história da moda Elza Socorra Yamada Inoue..................................................................................... 123 Variáveis do impacto de uma instituição de ensino superior na comunidade: um estudo dos marcadores de qualidade Ester Teresa Senger Petroni, Marcelo Mendes dos Santos................................... 124 Educação ambiental na escola: semeando consciência Flávia Amadeu de Oliveira, Vanessa Jaqueline Thomazini, Maricê Thereza Correa Domingues Heubel, José Rafael Mazzoni................................................... 125 Uso do percurso gerativo de sentido como estratégia para a interpretação do conto de muito procurar Gabriela Zumiani Navarro....................................................................................... 135 . Escala de estressores trânsito (ESET): construção e estudo das qualidades psicométricas Hugo Ferrari Cardoso, Marcelo Mendes Dos Santos. Thelma Margarida Mendes Dos Santos............................................................................................................... 146 Representações midiáticas sobre a mulher brasileira no imaginário português Jéssica De Cássia Rossi.......................................................................................... 147 . Reflexões sobre os gêneros fotográficos em canudos 100 anos Joyce Guadagnucci.................................................................................................. 148 Pára papai, você vai matá-lo Julieta Maria Haical Haddad, Regina Célia Paganini Lourenço Furigo.................... 149 A arquetipia: e os percursos do olhar Júlio César Riccó Plácido Da Silva, Luiz Nelson O. Trentini.................................... 158 Desenvolvimento de um Chatterbot com interatividade ao avatar encapsulado no ambiente virtual second life usando a base de conhecimento em AIML como ferramenta para auxílio em EAD nas universidades Kelton Augusto Pontara da Costa, André Luiz Pilastri............................................. 172 Educação a distância e a formação continuada do professor para o processo de inclusão Leda Maria Borges da Cunha Rodrigues, Vera Lucia Fialho Capellini.................... 173 Reorientação na formação dos profissionais da saúde na universidade do sagrado coração e capacitação dos profissionais da rede básica, por meio da interação entre ensino e sistema de saúde municipal Leila Maria Vieira, Elza Socorra Yamada Inoue, Claudia de Almeida Prado Piccino Sgavioli, Rita Cristina Chaim, Sandra de Oliveira Saes, Eliane Maria Ravasi Stefano Simionato........................................................................................ 174 Concepção de professores sobre desempenho escolar e relações interpessoais de crianças em acolhimento institucional Leticia Mansano Barros, Juliana Cavalheri, Rinaldo Correr..................................... 176 Teorias semânticas: ferramentas para interpretação de textos Letícia Martins Ferreira............................................................................................. 193 A mediação e a interatividade no ensino da linguagem por meio de textos midiáticos Ligia Beatriz Carvalho Almeida................................................................................ 200 Brinquedoteca itinerante: formação de brinquedista educadores Livia Zagatti Pedro, Marcelo Mendes dos Santos, Ester Teresa Senger Petroni...................................................................................................................... 211 Definição de públicos em instituições privadas de ensino superior – IPES Maria Eugênia Porém, Ana Beatriz Assumpção, Dalva Aleixo Dias ....................... 212 Aspectos emocionais envolvidos na gravidez adolescente Marina Zulian Delázari, Silvana Nunes Garcia Bormio............................................ 213 . Abandono, entrega e institucionalização: alguns dos caminhos e descaminhos da infância no Brasil Mario Lazaro Camargo............................................................................................. 230 A relação homem e imagem: o olhar do antropólogo Mikael Corrêa dos Santos........................................................................................ 248 Representações sociais de idosos institucionalizados e não institucionalizados sobre o processo de envelhecimento: um estudo comparativo Natalia Roncada Rodrigues, Marilene Cabello Di Flora........................................... 259 Aplicabilidade dos mapas conceituais no ensino fundamental Neichelli Fabricio Langona, Vera Lúcia Messias Fialho Capellini............................ 276 Novas estratégias de comunicação da igreja católica na tentativa do diálogo inter-religioso e defesa da vida: a proposta da revista diocesana Paulo Vitor Giraldi Pires........................................................................................... 277 Afetividade, cognição e educação de jovens e adultos: a importância das relações subjetivas para professores e alunos Poliana da Silva Almeida Santos Camargo.............................................................. 293 O cinema e o ensino de valores: o filme Avatar e a educação antropológica Renato Valderramas, Vitor Pachioni Brumatti, Caroline Guimarães Martins Valderramas............................................................................................................. 307 Implementação de ambiente Wiki com professor do ensino fundamental Richard dos Santos, Clerison Jose De Souza Bueno, Dariel De Carvalho, Rodrigo Batista Edamatsu..................................................................... 322 Sinal verde: uma proposta de educação ambiental para o rádio Rodrigo Carvalho da Silva........................................................................................ 323 Construção de sentido e produção de discursos: a linguagem e subjetividade dos textos midiáticos Rodrigo Carvalho da Silva........................................................................................ 324 Poesia e pintura na obra de Mário Quintana Rosilene Frederico Rocha Bombini.......................................................................... 340 As tecnologias da informação e da comunicação presentes transversalmente no trabalho pedagógico com a infância Thaís Cristina Rodrigues Tezani, Marcia Cristina Argenti Perez............................. 341 Portabilidade e mobilidade na tv digital: atrativos para a hospitalidade social Thalita Maria Mancoso Mantovani e Souza, Maria Cristina Gobbi........................... 342 Análise preliminar dos itens da escala de reações do estresse no trânsito Thelma Margarida de Moraes dos Santos, Hugo Ferrari Cardoso, Marcelo Mendes dos Santos.................................................................................................. 354 Interatividade em ambiente virtual de aprendizagem: contribuições de uma experimentação Vanessa Matos dos Santos, Maria Teresa Miceli Kerbauy...................................... 355 Perfil e avaliação dos participantes de um curso de formação continuada em práticas educacionais inclusivas na modalidade à distância Vera Lucia Messias Fialho Capellini, Olga Maria Rolim Piazentin, Eliana Marques Zanata...................................................................................................................... 374 Alcoolismo na sociedade brasileira no início do século XX Zulemar Augusta Girotto Savian.............................................................................. 375 Blogs educativos voltados para o ensino médio: uma análise dos objetivos pedagógicos Aline Kelly Ferreira da Silva, Rosária Helena Ruiz Nakashima............................... 386 7 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura DESAFIOS PARA A EDUCAÇÃO E INCLUSÃO DIGITAL PELA TV PÚBLICA1 Alan César Belo Angeluci2 Maria Teresa Miceli Kerbauy3 RESUMO O processo de digitalização da televisão brasileira trouxe esperança a setores da sociedade interessados no desenvolvimento de uma rede de TV Pública no Brasil. Pela primeira vez, as condições são muito favoráveis: tecnicamente, o padrão digital amplia o espectro de canais disponíveis; em termos de políticas públicas, o Governo Federal tem destinado verbas orçamentárias milionárias para desenvolvimento de projetos. A criação da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) como gestora dos canais públicos propulsionou o debate do tema entre diversas entidades representativas nos diversos fóruns realizados no país. Autores como Barbosa Filho e Castro (2008) apontam que a TV Publica pode ser um importante espaço para experimentação de novos conteúdos e formatos na televisão brasileira, sobretudo no que tange aos projetos educativos e de inclusão digital. A partir de um levantamento preliminar feito com base no Projeto de Mapeamento das Emissoras Públicas Brasileiras realizado pela TV Brasil, o presente artigo busca apontar que um dos principais problemas enfrentados pela televisão pública brasileira reside em seu financiamento e que se torna urgente a criação de uma Política Nacional de Comunicação. Palavras-chave: TV Pública. TV Digital. Financiamento. Política Nacional de Comunicação. 1 INTRODUÇÃO O Brasil é um país com uma área de mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados e com 193 milhões de habitantes4. Em um país considerado “em desenvolvimento”, tais dimensões podem representar a existência de disparidades em vários setores. Na busca de colocar o Brasil no patamar de outros países 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Professor do Departamento de Comunicação Social da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Universidade Estadual Paulista (UNESP-Bauru). Mestre em Televisão Digital pela Unesp. 3 Doutora em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Brasil(1992). Professor Colaborador da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. 4 Em população total, de acordo com dados de 2009 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 8 desenvolvidos nos próximos dez anos, o Governo Federal prevê cinquenta ações prioritárias5 que devem ser desenvolvidas em curto, médio e longo prazo. De acordo com reportagem de José Carlos Mattedi publicada em 13 de novembro de 2006 pela Agência Brasil, no topo da lista, os dez itens que abrem as ações do atual e do próximo governo são: universalização da educação; combate à violência e à criminalidade; diminuição da desigualdade social; melhora no nível de emprego; melhora no Sistema Único de Saúde (SUS); investimentos em ciência e tecnologia; aumento das taxas de investimento em todos os setores econômicos e sociais; investimentos em infra-estrutura para melhorar o escoamento e infra-estrutura dos produtos nacionais Entre os projetos, é possível constatar que há uma preocupação com questões básicas que influenciam nos níveis de desenvolvimento social e econômico de um país. O investimento na Educação e Saúde, por exemplo, figuram entre as prioridades para aumentar a inclusão social no Brasil e melhorar os índices de qualidade de vida. Também os projetos de Ciência e Tecnologia (C&T) na área de inovação têm assumido cada vez mais papel de destaque nesse processo. Desde meados do século XX, C&T têm produzido transformações fundamentais nas relações humanas. Da combinação de conhecimento científico com desenvolvimento permanente de instrumentos e aplicações práticas, o homem tem experimentado a inserção das tecnologias nas práticas sociais e institucionais. Nos termos de Vizer (2008), vivemos uma sociedade “sociotécnica”, em que as relações sociais se fazem condicionadas e contextualizadas por mediações tecnológicas. O avanço da ciência e as pressões competitivas e sociais proporcionaram, nas últimas décadas, o desenvolvimento de uma “tecnocultura” um conjunto de inovações tecnológicas que, além da criação de novos setores industriais e de serviços, tem provocado uma reformulação quase que integral nos padrões de consumo e de comportamento da sociedade – e novas formas de gerar e transmitir conhecimentos. Essa “revolução informacional” que gerou, como definiu Castells (1999), uma “sociedade da 5 informação”, coloca as Tecnologias de Informação e O plano do Núcleo de Assuntos Estratégicos (NAE), órgão que assessora a Presidência da República, foi desenvolvido a partir de uma pesquisa realizada entre 2005 e 2006, junto a entidades da sociedade civil, universidades e poder público. 9 Comunicação (TIC) como elementos fundamentais para a gestão pública, privada e individual. Segundo Lastres e Ferraz (1999, p. 43), “a realidade virtual passa a ocupar espaço em atividades onde a presença física era prerrogativa de indivíduos qualificados e elementos decisivos de qualidade [...]”. Nesse sentido, por exemplo, a chegada da Internet no Brasil nos anos 90 tem alterado significativamente as relações políticas, econômicas e sociais. A realidade contemporânea compôs uma nova relação homem/plataformas tecnológicas, cérebro/informação, pois em sua liquidez6 transformou o espaço, desterritorializando-o. As redes sociais como Orkut, Facebook, Twitter e comunicadores instantâneos estão criando “novos espaços de sociabilidade”. Outro fenômeno importante no país está no número de telefones celulares em operação: quase 170 milhões de aparelhos7, grande parte deles pré- pagos. Essa “era de convergência midiática”, nos termos de Jenkins (2008), traz à tona a discussão do papel da Comunicação nesse processo de transformações tecnológicas, mercadológicas, culturais e sociais. O debate sobre a chegada do sistema de Televisão Digital no país surge nesse cenário. A TV é a grande vedete da comunicação por conta da sua penetração na sociedade e volume de investimentos. Mesmo com a chegada da internet, a maioria da população ainda se informa e busca entretenimento através da televisão, em muitos lugares a única fonte acessível. A carência de infraestrutura das cidades com poucas opções de lazer e segurança, tornou frequente o hábito de se consumir telenovelas, talkshows, programas esportivos e telejornais, já que o sinal é aberto e gratuito. A Televisão Digital possui um potencial inclusivo que não poderia ter sido explorado antes. Proporcionando a participação das audiências em diferentes níveis, por exemplo, a TV Digital informação, atingindo setores causa da sociedade analfabetos e deficientes visuais. Além disso, ferramenta impactos diretos na circulação da altamente pode excluídos, servir como como poderosa de educação a distância (EaD), entretenimento, jornalismo, governo eletrônico e novos serviços não disponíveis atualmente. A 6 criação do Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre No termo do sociólogo polonês Bauman (2001). De acordo com dados divulgados pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) em dezembro de 2009. 7 10 (SBTVD-T), pensado para desenvolver tecnologicamente o país a partir do pressuposto da inclusão social e digital, deu o primeiro passo. Em dezembro de 2003 o governo Lula, por meio do Ministério das Comunicações, editou o Decreto 4.901/03, através do qual optou pelo desenvolvimento de um sistema nacional voltado às características e necessidades do país. Esta política pública configurou o que viria a se tornar o Sistema Brasileiro de TV Digital (STVD) que em 2006 foi definido como um padrão nipo-brasileiro. Esse apresenta entre suas características o middleware Ginga, oferecendo interatividade, interoperabilidade e multiprogramação, entre outras possibilidades para a participação popular e a inclusão social. A partir de 2006, ano em que o presidente Lula assinou o Decreto 5.820/2006 que trata da opção brasileira pelo padrão nipo-brasileiro, a TV Digital passa a uma outra etapa, a da implantação em todo o país, iniciando pelas capitais e pela necessidade de desenvolver conteúdos e programação voltados para as novas possibilidades tecnológicas que pode oferecer. Baseado nesse mesmo decreto, o projeto nipo-brasileiro abriu as discussões para a necessidade da implantação de uma Lei de Comunicação Eletrônica de Massa, elaborando um novo marco regulatório para integrar diferentes áreas da comunicação em TV, assim como as mídias digitais e a convergência tecnológica. O Ministro das Comunicações Hélio Costa8 assumiu a pasta com a prioridade de fazer a transição da televisão aberta brasileira para a tecnologia Digital. A TV Digital no Brasil estreou em dezembro de 2007 e tem hoje cerca de 60 emissoras no país já transmitem programas com sinal digital de alta definição. O SBTVD-T foi concebido a partir do apoio financeiro do governo a projetos de pesquisa de 23 universidade e instituições e envolveu cerca de 1500 pesquisadores que juntos trabalharam na elaboração do projeto, desde a experimentação dos padrões existentes até a definição do middleware Ginga – que já recebeu prêmios e reconhecimento internacional pela qualidade. O padrão também tem aprovação e recomendação da União Internacional De Telecomunicações (UIT)9. 8 Hélio Calixto da Costa é jornalista, publicitário e tradutor. Começou a carreira como locutor de rádio e mais tarde tornou-se conhecido do público como repórter de televisão, especialmente na Rede Globo. Decidiu-se pela carreira política na época da Constituinte. Elegeu-se deputado federal pelo PMDB de Minas Gerais em 1986 e depois em 1998, e em 2002 foi eleito senador. Em julho de 2005 foi para o Ministério das Comunicações a convite do presidente Lula, que na época aumentava a participação do PMDB em seu governo. 9 A norma Ginga NCL-Lua (ITU-T H.761) foi aprovado na União Internacional de Telecomunicações (UIT), ligado à ONU, para a área de IP em maio de 2009. Em outubro do mesmo ano, o padrão 11 Atualmente, o Brasil tem se afirmado na vanguarda da implementação das novas tecnologias de radiodifusão dentro da América Latina, e o governo brasileiro está trabalhando para criar um sistema sul-americano de Televisão Digital. Tal sistema é estratégico para o país do ponto de vista de detenção, desenvolvimento e exportação de serviços e mão-de-obra especializada. Adicionalmente, o desenvolvimento de uma política de inovação tecnológica a longo prazo interligada ao estímulo de uma indústria de conteúdos digitais, baseado não somente na Televisão Digital, mas também na convergência tecnológica entre outras plataformas também está sendo visto como algo que deve ser colocado em prática pelo Governo. A criação dos Centros de Excelência em Produção de Conteúdos Digitais Interativos e Interoperáveis10 tanto no Brasil como na América Latina é um dos exemplos dessa política. A Televisão Digital, ao utilizar um processo de codificação de áudio e vídeo digital, também torna viável que mecanismos de compactação sejam utilizados de tal forma que seja possível incluir dados no mesmo canal do fluxo de áudio e vídeo principal. Quanto mais eficiente esse processo de compactação, mais dados de áudio, vídeo e texto podem ser adicionados a este mesmo canal. Entre outras, esses dados podem ser utilizados, por exemplo, para que sejam interpretados como aplicações e possibilitem aperfeiçoar a experiência de se assistir televisão. Uma das possibilidades é permitir que o telespectador controle o que deseja assistir através de aplicações interativas. A interatividade é vista como um dos “pontos fortes” do SBTVD-T, que segundo o Ministério das Comunicações, deverá estar disponível a população em até dois anos. A aposta do Governo está no desenvolvimento de aplicativos voltados para a saúde, educação, serviços governamentais e outras oportunidades de informação e entretenimento. O prazo para desligar o sistema analógico é 2016, sendo que em 2014 todo o território nacional já deverá estar coberto pelo sinal digital. As novas tecnologias digitais requerem também formação de novos profissionais preparados para pensar produtos e conteúdos para as diferentes áreas da Televisão Digital. Daí a importância da apropriação das TICs na formação de nipo-brasileiro de TV Digital, o ISDB-T, recebeu o aval oficial da UIT e passou a recomendar as normas brasileiras de radiodifusão digital como subsistemas ao padrão japonês 10 O projeto dos Centros de Excelência em Produção de Conteúdos Digitais Interativos e Interoperáveis foi aprovado em fevereiro de 2008 durante o Encontro Interministerial sobre a Sociedade da Informação para a América Latina e Caribe. 12 recursos humanos para essa nova indústria de conteúdos, que contemple o desenvolvimento de metodologias de forma transdisciplinar, e inclua a participação de jovens educadores habituados a uma cultura audiovisual e digital. O conceito de “indústria cultural”11 não oferece suporte para análise das novas dinâmicas, já que no contexto em que fora formulado não era possível imaginar, por exemplo, a interatividade e a convergência tecnológica, como recorda Castro (2008). 2 TV PÚBLICA BRASILEIRA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Martín-Barbero (2002) aponta para a necessidade de, inserir a compreensão do caráter público em um mapa atravessado por três eixos: o da atual reconstrução conceitual do caráter público; a reconstituição dos meios e das imagens no espaço de reconhecimento social, e as novas formas de existência e exercício da cidadania Para Rincón (2006), a televisão pública “deve ser significativa não para as massas (para isso existem as TVs pagas e comerciais), mas para as minorias”, devendo ser “experimental e inovadora em formatos, estilos, temáticas e estéticas”. A TV Pública, portanto, segue as lógicas do prazer e da diversão, porém em versões inteligentes e em horizontes transgressores, além de, em todos os programas, ter o dever de promover telespectadores melhores e cidadãos ativos para a democracia. No Brasil, a reflexão sobre a TV Pública ganhou intensidade a partir do debate sobre a criação da nova rede pública de TV, no 1º Fórum Nacional de TVs Públicas12, protagonizado pela Associação Brasileira de Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (ABEPEC), Comunitários (ABCCom), Associação Brasileira de Canais Associação Brasileira de Emissoras Universitárias (ABTU) e Associação Brasileira de Televisões e Rádios Legislativas (Astral). Os principais conceitos de TV Pública defendidos foram “uma televisão independente, democrática, apartidária e que busca a igualdade e a justiça social”. A missão da TV pública passa, então, pela expressão da diversidade, a universalização 11 A expressão “indústria cultural” foi adotada na primeira metade do século XX pelos pensadores Theodor Adorno e Max Horkheimer, da Escola de Frankfurt, que se referiam a produção cultural como mercadoria e guiada por classes dominantes. 12 Realizado em 11 de maio de 2007 e que resultou em um manifesto “pela TV Pública e independente” chamado “Carta de Brasília”. 13 de direitos como a educação e cultura, além de contemplar a produção regional e o cinema brasileiro, princípios, por exemplo, amplamente contemplados na “Carta de Brasília”. Nesse mesmo documento, a preocupação com a digitalização é clara, demonstrando a importância desse processo para a consolidação da TV Pública no país: [...] propõem em face do processo de migração digital: - Garantir a construção de uma infra-estrutura técnica, pública e única, que viabilize a integração das plataformas de serviços digitais por meio de um operador de rede; - A TV Pública considera que a multiprogramação é o modelo estratégico para bem realizar a sua missão; - A TV Pública deve ser promotora do processo de convergência digital, ampliando sua área de atuação com as novas tecnologias de informação e comunicação e promovendo a inclusão digital; - TV Pública deve se destacar pelo estímulo à produção de conteúdos digitais interativos e inovadores; [...] Para uma TV Pública se caracterizar pela “independência intelectual, política e administrativa”, ela deve ter a participação direta da sociedade. Por isso, é necessária a formação de um colegiado deliberativo, representativo da sociedade, que deve ficar encarregado pelas diretrizes de gestão, programação e a fiscalização. Para ter autonomia em relação ao governo, a televisão pública deve ter fontes múltiplas de financiamento. Além do orçamento, deve haver recursos que venha da prestação de serviços, da captação de recursos do setor privado por meio de patrocínios e a participação em fundos já existentes dentro do governo. Existem três modalidades de televisão no Brasil, a saber: a comercial, a estatal e a pública. O artigo 5º da Constituição Brasileira, por exemplo, prevê não só a existência como a complementaridade entre essas modalidades. A TV Estatal caracteriza-se por ser um canal explorado e controlado pelo Estado, através da função governamental. Já a TV Pública não deve se submeter ao poder político, seja ele de partidos, governos e poderes constituídos, mesmo que tenha grande parte de seu financiamento proveniente de receitas governamentais. Quanto à TV comercial, ela é bancada pela publicidade e tem sua lógica calcada na audiência. Nas três modalidades de TV, a origem de sua concessão provém do Estado, que regulamenta o espectro eletromagnético. Com cinqüenta anos de atraso em relação à Europa, a criação de uma TV 14 Pública no Brasil é o sonho de vários setores e entidades como o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). Sonho que teve início há várias décadas, quando Roquette Pinto, precursor da radiodifusão pública no país, conseguiu, em 1952, a concessão de um canal no Rio de Janeiro, “que deveria operar como uma pequena BBC” numa alusão à TV inglesa, considera por muitos o padrão por excelência de TV Pública. A TV Cultura, dessa forma, inaugurou no Brasil a primeira noção de campo público da televisão. Não existe no direito brasileiro a conceituação de TV Pública, salvo as distinções que aparecem nos artigos 220, 221 e 223 da Constituição Federal13. Mesmo a Televisão Educativa, que é o que existe de fato, tem configuração escassa e imprecisa. Seu diferencial está no tipo de programação ou conteúdo que oferece. Diversas modalidades constituem o perfil jurídico-institucional da TV Pública. Os modelos de televisão pública, em qualquer parte do mundo, não são estáticos ou imutáveis, nem podem ser porque tratam de matéria viva da sociedade, seus usos e costumes. É fundamental que haja entendimento comum dos valores estruturantes daquilo que constituiria a essência da televisão pública. No Brasil, o debate sobre a regulamentação das emissoras do campo público de televisão não é recente. A Lei 11.652, de 7 de abril de 2008, que criou a Empresa Brasileira de Comunicação, conhecida como TV Brasil, embora contenha parâmetros de definição dos princípios que devem reger uma televisão pública até então inéditos no âmbito jurídico brasileiro, apenas regulamenta a emissora federal operada pela União. As emissoras que operam no cabo, principalmente as universitárias e comunitárias, começaram a operar com a Lei 8.977, de janeiro de 1995, batizada de lei do cabo, porém restritas a uma pequena parcela da população que pode pagar pelos serviços das operadoras de meios físicos. Com a chegada do SBTVD-T a partir dos decretos de 2003 e 2006, o cenário é alterado, porém as emissoras públicas ainda carecem de um aparato legal que lhes dê legitimidade e agilidade para o cumprimento de sua missão14. 13 O artigo prevê a complementaridade dos sistemas estatal, público e privado da comunicação. O tema foi amplamente discutido em maio de 2009 durante o II Fórum Nacional das TVs Públicas. Além da regulamentação, foram debatidas questões sobre o financiamento (possibilidades e modalidades, além dos recursos orçamentários), a migração dos canais públicos do cabo para redes digitais abertas, o Operador Único de rede e multiprogramação, medição de performance das emissoras e novos modelos de produção, conteúdos multiplataforma e interatividade. 14 15 3 EDUCAÇÃO PELA TELEVISÃO A Educação figura entre as principais missões de uma emissora pública. O uso social da Televisão Digital tange à exploração das potencialidades da Televisão Digital a favor da Educação à Distância. Não são poucos os projetos nessa ótica desenvolvidos no país15. O uso de diferentes plataformas para atividades educativas não é novidade do Brasil. A prática pedagógica tem buscado campos de atuação diferentes da tradicional sala de aula e do ensino presencial. A Educação a Distância, por exemplo, remonta aos tempos do “Instituto Universal Brasileiro”, de 1941, e posteriormente aos projetos de rádio e TV (como o Telecurso 1º grau). Nos últimos anos a sociedade tem experimentado novas modalidades de educação pela web, por meios de estações de computador e multimídia – chats, teleconferências – até chegar aos Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA)16. Barbosa Filho e Castro (2008) lembram que Mario Kaplún e Paulo Freire17 já defendiam uma revisão na educação e contemplavam a apropriação das tecnologias existentes nos anos 60 e 70 do século XX no processo de ensinoaprendizagem de forma ativa. No Brasil, o Governo Federal passou a dar ênfase à EaD devido aos elevados índices de analfabetismo18 e analfabetismo funcional, e investiu no aperfeiçoamento de professores via televisão e na capacitação de professores pela web. Alguns exemplos de uso da educação interativa no ambiente da TV Digital são vistos em serviços disponibilizados por canais digitais de TV no Reino Unido, país já considerável no avanço da implantação da TV Digital (ANDREATA; MONTEZ, 2007, p. 88). Ou seja, vários programas televisivos podem ser desenvolvidos para auxiliar no ensino da população, além de disponibilizado em larga escala nas escolas e residências, permitindo acesso à informação educacional. Nesse sentido, fornecer educação pela TV, por exemplo, a populações 15 Alguns dos projetos mais notáveis foram realizados pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pelo Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD). 16 Dois exemplos notórios exemplos desses AVA no Brasil são o “Moodle” (http://moodle.org/) e “E- proinfo” (http://www.eproinfo.mec.gov.br/). 17 Mario Kaplún, na década de 70, defendia a educação permanente e utilizava os cassetesfórum como instrumentos de educação, comunicação e reflexão. Já Paulo Freire foi o teórico da “educação libertadora ou problematizadora” e da “dialogicidade”. 18 Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2005, a taxa de analfabetismo no Brasil é de 10,9%, o que significa 14,6 milhões de analfabetos no país. 16 que vivem em pontos distantes e excluídos do país significa uma revolução: “se a relação educação-comunicação for elaborada a partir de políticas públicas que privilegiem a inclusão digital, poderá disponibilizar uma ampla quantidade de informações a um número cada vez maior de pessoas” (CASTRO, 2008, p. 133). É preciso, porém, ponderar que talvez mais grave do que não possuir fontes de acesso à informação, seja não dispor de capacidade de aprendizado e conhecimento suficiente para fazer uso das tecnologias digitais, o que mostra a importância de se investir em métodos de alfabetização digital. “A necessidade de investir constantemente em inovação implica, necessariamente, promover processos que estimulem o aprendizado, a capacitação e a acumulação contínua do conhecimento” (LASTRES; ALBAGLI, 1999, p. 48). Por exemplo, o mapeamento de Competências em Informação (CI), desenvolvido pelo IFAP (Information for All Programme) da UNESCO19, propõe o estudo de indicadores que podem ser fundamentais para esse tipo de diagnóstico. Vale ressaltar, que a concepção de tecnologia como artefato descolado dos processos cognitivos acaba reproduzindo o mesmo modelo tradicional de educação e de comunicação. Como alerta Pretto, [...] não podemos correr o risco de desenvolver mecanismos para alfabetizar mecanicamente a população para o uso das tecnologias e, com isso, estarmos formando, num futuro bempróximo, um contingente de analfabetos, agora os analfabetos funcionais digitais, aqueles que serão meros operadores de máquinas, que aprendem a utilizar as tecnologias como simples instrumentos [...]. (CORREA, 2001, p. 49) 4 LEVANTAMENTO PRELIMINAR As emissoras públicas brasileiras foram mapeadas pela TV Brasil através do Projeto de Mapeamento de Emissoras Públicas. A elaboração de um mapa colaborativo pelo “Núcleo de Multimídia da TV Brasil” permitiu reunir informações básicas sobre as emissoras públicas brasileiras e disponibilizá-las na internet20. De acordo com esse levantamento, o país possui em torno de 25 emissoras públicas distribuídas por todo o território nacional. São elas: Aperipê TV, TV Aldeia Rio Branco, TV Antares, TV Brasil, TV Brasil Central, TV Ceará, TV 19 Que no Brasil vem sendo coordenado pelo Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT). 20 Através do site www.tvbrasil.org.br/tvspublicas/brasil. 17 Cultura – Belém, TV Cultura – Manaus, TV Cultura SC, TV Cultura São Paulo, TVE Bahia, TVE Maceió, TV Brasil Pantanal, TVE Paraná, TVE Vitória, TVE RS, TV Miramar, TV Palmas, TV Pernambuco, TVU João Pessoa, TV Universidade – Cuiabá, TV Universitária – Natal/RN, TV Universitária – Recife/PE, TV Universitária de Roraima e Rede Minas. Através dessa listagem, foram feitos contatos com profissionais das emissoras, através de ligação telefônica e e-mail, a fim de levantar preliminarmente as condições para a operação e execução de projetos educativos e de inclusão digital a partir da digitalização do sistema brasileiro de televisão. A dificuldade iniciou-se a partir dos sites disponibilizados: A TV Antares, de Piauí, não possui um site oficial e não é possível fazer contato através dos telefones informados, o que também ocorre com a TVE de Maceió. Na TV Cultura de Amazonas, em Manaus, os poucos funcionários utilizam seus emails pessoais para tratar de questões profissionais (pois não existe um domínio de servidor de internet para a emissora); o mesmo acontece com a TV Brasil Pantanal; algumas emissoras como a TVE de Vitória funcionam somente em algumas horas do dia. A principal característica, no geral, é o número extremamente reduzido de funcionários, como relata Aldenor da Silva Pimentel21, responsável pelo jornalismo da TV Universitária de Roraima/TV Macuxi: “A TV [...] existe desde 1990. Atualmente, mesmo com uma equipe reduzida (um jornalistaapresentador e quatro estagiárias repórteres e produtoras) a TV veicula diariamente um jornal noturno e produz matérias para outros dois programas da grade local”. As emissoras públicas melhor estruturadas são da TV Brasil e encontramse em Brasília/DF, São Paulo/SP e Rio de Janeiro/RJ, mas mesmo assim em condições não adequadas. A TV Brasil do Rio de Janeiro, por exemplo, no prédio situado na rua da Relação, possui estúdios de gravação precários e obsoletos, inclusive com pisos em desnível. Uma parte do prédio está sendo restaurada e já apresenta melhores condições físicas de funcionamento. Recentemente, grande parte da sede da TV Brasil em São Paulo ficou alagada por conta das fortes chuvas que caíram no período, trazendo prejuízos. A TV Cultura de São Paulo também possui uma boa estrutura para funcionamento, mas também 21 No dia 5 de fevereiro de 2010, em resposta a um questionário enviado por e-mail. 18 apresenta dificuldades. Jorge Seadi Júnior22, gerente de jornalismo da TVE do Rio Grande do Sul, revela outras dificuldades que engessam a gestão de uma emissora pública, dizendo que “há necessidade [de uma tv pública] ter as mesmas “armas” de trabalho das emissoras privadas”, referindo-se ao financiamento por verba publicitária que têm as emissoras privadas. Para ele, a concepção de contrato de trabalho nas emissoras públicas também interfere no desenvolvimento de projetos em TV Digital: a HDTV vai permitir que o telespectador interfira no que está sendo apresentado; haverá necessidade de um cuidado maior com o conteúdo e, para isto, é preciso profissionais de primeira linha; desta competição as tvs públicas estão proibidas de participar porque só podem contratar por concurso, o que leva muito tempo para ser aprovado e para ser realizado. As tvs públicas estão "amarradas" porque são reféns dos políticos de plantão. 5 OUTROS MODELOS POSSÍVEIS As emissoras públicas são parte importante da história regional de um povo. Em alguns locais, esteve à frente das emissoras privadas23. A experiência internacional mostra que as TVs públicas são viáveis e podem cumprir seu papel na oferta de fontes diversificadas de informação e entretenimento. A programação diferenciada, cultural, científica e informativa deve ser pautada, porém, por uma fonte de financiamento que difere da lógica da publicidade, praticada pelas emissoras públicas. E é neste grande nó que sobrevivem as emissoras públicas brasileiras. Podem oferecer programação diferenciada, cultural, científica e informativa, em formato que não combina com a programação da TV comercial, pautada pela lógica da publicidade como fonte de financiamento. O sucesso de outros casos pelo mundo, apesar de trajetórias diversas à brasileira, demonstra que existem modelos de gestão diferente dos praticados British 22 Broadcasting Company (BBC), pelas emissoras privadas. Na um conselho formado por 12 Em entrevista concedida por e-mail no dia 4 de fevereiro de 2010. A coordenadora da TV Cultura do Pará, Paloma Liv Né de Andrade Lima, relatou em entrevista concedida por e-mail no dia 28 de janeiro de 2010 que a emissora foi pioneira ao exibir o primeiro telejornal paraense em 15 de março de 1987, três meses depois de sua inauguração. Hoje a emissora exibe dois j o rnais, um programa de esportes e três boletins diários. 23 19 representantes da sociedade dirige as atividades da emissora, financiada por cada cidadão inglês que paga uma taxa anual de contribuição para a manutenção do sistema público. O financiamento da canadense CBC também segue os moldes da TV britânica. Na France Telévisións, a gestão é organizada por dois conselhos, o Superior do Audiovisual e o de Administração. Seu financiamento provém de verbas orçamentárias (70%) e o restante através de patrocínios, prestação de serviços e anúncios institucionais. Nas alemãs ARD e ZDF predomina o financiamento através de verbas federais (75%) com complemento de receitas próprias. A gestão de suas 16 emissoras fica por conta também de dois conselhos, o de Radiodifusão e de Administração. A Publica Broadcasting System (PBS) americana tem direção executiva de 11 membros e é presidida por um dos membros do Conselho Diretor, composto por 27 representantes das 350 emissoras associadas. Seu financiamento tem contribuição do Congresso. A RTP portuguesa e a TVE espanhola foram por muitos anos as únicas televisões de seus países e possuem modelo público de gestão, com financiamento misto: basicamente estatal, complementado por receitas próprias. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Dentro desse contexto de convergência e de qualidade digital, as discussões sobre a criação de uma Política Nacional de Comunicação tornam-se cada vez mais frequentes. O que deve mudar nos critérios de concessão de rádio, TV e de acesso à internet e banda larga? Quem pode ou não ser proprietário de um meio de comunicação e quais os direitos e deveres envolvidos? São temas amplos e complexos que geram conflitos de interesses nas áreas comunicação brasileiras e nos de telecomunicações. últimos anos A revolucionou das digitalização o setor mas empresas de das comunicações também trouxe problemas que demonstram a necessidade de novas regras para a comunicação no País. A questão ganhou grande destaque com a realização da CONFECOM, a primeira Conferência Nacional de Comunicação, realizada entre 14 e 17 de dezembro de 2009, em Brasília/DF, organizada pelo governo federal, através do 20 Ministério das Comunicações em conjunto com a Casa Civil e o Ministério da Cultura. Em todo o país, entre outubro e novembro de 2009, foram realizadas conferências regionais, reunindo propostas que foram debatidas em Brasília. Mais de 1.600 delegados de todo o país representando a sociedade civil e o poder público reuniram-se para propor ao governo federal as bases de um marco regulatório para o setor de comunicação no país. As ideias lançadas não podem ser impostas, mas têm chances de se tornarem regras para a serem seguidas pelos veículos de comunicação. O processo, porém, é longo e enquanto isso, as emissoras públicas brasileiras assistem o distanciamento cada vez mais presente entre seu exercício real e seu exercício ideal. ABSTRACT The digitalization of Brazilian television has brought hope to sectors of society interested in developing a public television network in Brazil. For the first time, the conditions are very favorable: Technically, the digital standard expands the spectrum of available channels, in terms of public policy, the federal government has designed millions of budget allocations for developing projects. The creation of the Brazilian Communication Company (EBC) as manager of public channels propelled the topic of debate among various entities representing the various forums throughout the country. Authors such as Barbosa Filho and Castro (2008) reported that Public TV can be an important platform for experimenting new formats and content on Brazilian television, particularly with respect to educational programs and digital inclusion. From a preliminary survey based on the Mapping Project of Brazilian Broadcasters held by TV Brazil, this article tries to point out that one of the main problems faced by the Brazilian public television is in its financing and that it is urgent to create a National Policy on Communication. Keywords: Public TV. Digital TV. Finance. National Policy on Communication. REFERÊNCIAS BARBOSA FILHO, A.; CASTRO, C. Comunicação digital: educação, tecnologia e novos comportamentos. São Paulo: Paulinas, 2008. BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 2001. CARMONA, B.; MARCUS, F. (Org.). O Desafio da TV Pública. Rio de Janeiro: TVE Brasil, 2003. 21 CASTELLS, M. Internet Galaxy: reflexions on the internet, business and society. Oxford Press, 2001. . A sociedade em rede. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999. JENKINS, H. Cultura da Convergência. São Paulo: Aleph, 2008. LA REVISTA DE LA SET. Ano XIX, nº 001. Ed. Embrasec, Abril 2009. LASTRES, H.; FERRAZ, J.C. Economia da informação do conhecimento e do aprendizado. In: LASTRES, H.; ALBAGLI, S. Informação e globalização na era do conhecimento. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1999. MARTÍN-BARBERO, J. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2003. MATTEDI, J. C. Governo prevê 50 ações para chegar a um país desenvolvido em 2022. 2006. Agência Brasil. Disponível em: <http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2006/11/13/materia.2006-1113.9407406198/>. Acesso em: 24 jan. 2010. MATTOS, S. A. S. História da Televisão Brasileira: u ma visão econômica, social e política. 2. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2002. MONTEZ, C. B.; ANDREATA, J. A. Ensino a distância no ambiente da televisão digital interativa. IN: Comunicação & Sociedade, São Bernardo do Campo, n. 48, ano 29. Setembro de 2007, p. 83-93. SILVA, M. O que é Interatividade. Boletim T écnic o do SENAC Disponível em: http://www.senac.br/informativo/bts/242/boltec242d.htm. Acesso em: 21 jan. 2010. TV BRASIL. Modelos de Gestão. TV Brasil .org. Disponível em: <http://www.tvbrasil.org.br/tvspublicas/modelosdegestao.asp>. Acesso em: 17 fev. 2010. TV BRASIL. Origens da TV Pública no Brasil. TV Brasil .org. Disponível em: <www.tvbrasil.org.br/tvspublicas>. Acesso em: 17 de fev. 2010. 22 TV BRASIL. Projeto de Mapeamento de Emissoras Públicas. TVBrasil. org. Disponível em:< www.tvbrasil.org.br/tvspublicas>. Acesso em 17 fev. 2010. UNESCO. Information for All Programme (IFAP). Towards Information Literacy Indicators. Information Society Division, Communication and Information Sector, UNESCO, Paris, 2008. VIZEU, A. Telejornalismo: das rotinas produtivas à audiência presumida. In: PEREIRA JUNIOR, A . E. V. ; PORCELLO, F. A. C.; MOTA, C. L. (Org.). Telejornalismo: a nova praça pública. Florianópolis: Editora Insular/Pos-Jor UFSC, 2006, v. 1, p. 19-40. 23 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA: A INCLUSÃO NAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR NA CIDADE DE BAURU1 Aline Aparecida Fortunato2 Marilene Cabello Di Flora3 RESUMO A inclusão da pessoa com deficiência é um tema bastante abordado na sociedade atual. É grande o número de leis, decretos e portarias que foram criados objetivando garantir os direitos à acessibilidade, inclusão acadêmica e social dessas pessoas. Assim, percebe-se que é crescente número de pessoas com deficiência ingressando no ensino superior, contudo, muitas vezes as Instituições de Ensino Superior (IES’s) não estão preparadas para recebê-los, ainda que as políticas de inclusão sejam dirigidas também a estas instituições. O presente estudo propôs conhecer a realidade das pessoas com deficiência dentro das IES’s, através das representações sociais de alunos com deficiência inseridos neste contexto. Foram entrevistados nove sujeitos, e para a coleta de dados foi utilizada a entrevista dirigida com questões abertas, sendo, a análise desses dados feita através da Técnica de Análise de Conteúdo (BARDIN, 1991). A partir dos resultados de pesquisa, pôde-se perceber que os sujeitos representam a si e sua situação como acadêmicos, através da normalidade, sendo pessoas que realizam atividades como as demais pessoas; também não querendo ser vistas como diferentes. Quanto ao relacionamento com as demais pessoas nas IES’s, também este foi representado como normal. No entanto, reconhecem que existe o preconceito, a estereotipia e as barreiras atitudinais. Na análise das demais questões, verificou-se que estes sujeitos não possuem uma interação normal com as demais pessoas, já que esta ainda é permeada por estigmas. Em relação a adequação das instituições, os sujeitos representam que estas se deram a partir da luta destes alunos, ou pela imposição das leis. As políticas e medidas que são tomadas pelo governo para a inclusão das pessoas com deficiência, foram representadas como deficitárias, não atendendo a suas necessidades, o que, como foi pontuado, se deve não por sua inexistência, e sim por seu descumprimento, e até por seu desconhecimento. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. Este estudo é resultado do projeto de pesquisa de Iniciação Científica do Programa de Pós-graduação em Pesquisa da Universidade Sagrado Coração, financiado pelo PIBIC/CNPq. 2 Aluna da Universidade Sagrado Coração. 3 Doutora em Comunicação e Poéticas Visuais pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil(2004). Professor titular da Universidade do Sagrado Coração. 24 Palavras-chave: Deficiência. Inclusão. Representações sociais. IES’s. 1 INTRODUÇÃO/ REVISÃO DE LITERATURA No mundo contemporâneo, não cabe mais falar em exclusão e discriminação das pessoas com deficiência. Há um movimento corrente em prol destes indivíduos em todos os âmbitos da sociedade. Isto vem ocorrendo principalmente de duas décadas para cá, com a criação de leis que legitimam os direitos destes cidadãos que possuem necessidades educacionais especiais, oferecendo a eles as mesmas oportunidades que são oferecidas as demais pessoas que não têm deficiência. Concomitantemente a isso, percebe-se que houve também a criação de uma política que pretende viabilizar a acessibilidade das pessoas com deficiência aos espaços públicos. Existe atualmente uma grande preocupação quanto à adequação das edificações públicas e do mobiliário às necessidades demandadas por elas. A consciência quanto às necessidades e os direitos das pessoas com deficiência teve início após a II Guerra Mundial, com o retorno e o aumento de indivíduos fisicamente debilitados, dessa forma, se instalou um campo fértil para a discussão dos direitos que garantissem a igualdade e a fraternidade entre as pessoas. Para tanto houve a aprovação de Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, na qual os direitos das pessoas com deficiência foram claramente definidos. Desde então integrar estes indivíduos na sociedade passou a ser um dos objetivos dos países. Com isso houve o desenvolvimento de leis, decretos e portarias que promovem a adequação de escolas, serviços públicos etc., também efetivam a quebra de barreiras arquitetônicas, e mais atualmente esta preocupação se dirige às instituições de ensino superior visto o grande número de pessoas com deficiência que concluem o ensino médio e ingressam no ensino superior (MACIEL, 2000; MAZZONI, 2001; CORRER, 2003; VALDÉS, 2005; ANDRADE, 2006). Foi a partir da década de 1990 com a Declaração de Salamanca (1994), a qual teve como objetivo de discussão a atenção aos alunos com necessidades educacionais especiais, que se reafirma o compromisso com a educação para todos reconhecendo-se a necessidade e urgência da educação das crianças, jovens e adultos com deficiência (ANDRADE, 2006). 25 Valdés (2005) apresenta o Censo Demográfico de 2000, realizado pelo IBGE, com relação às pessoas com deficiência, onde se constata que a população brasileira está composta por aproximadamente 169 milhões de habitantes, dentre os quais 24,5 milhões (14,5%) declaram ter algum tipo de deficiência. O levantamento de dados referentes à participação de alunos com deficiência ainda é muito precário, tanto do ponto de vista da regularidade, quanto da qualidade das informações. De acordo com o Censo Educacional realizado pelo MEC/INEP em 2003, de um total de 3.887.022 alunos, 5.078 possuem algum tipo de deficiência; 1.136.370 (29,2%) dos alunos, estão matriculados na rede pública de ensino, sendo que destes, 1.373 (27%) são alunos com deficiência; as instituições privadas de ensino superior correspondem a 2.750.625 (70,8%) alunos, dentre os quais 3.705 (73%) possuem deficiência. Nos últimos anos, percebe-se que há uma série de reformas legais que visam à inclusão e a acessibilidade da pessoa com deficiência. Thoma (2006), no entanto afirma que reformas legais não têm sido suficientes para garantir a acessibilidade universal aos bens e serviços disponíveis na sociedade. Já Valdés (2005), acredita que quanto à legislação o Brasil tem alcançado avanços consideráveis. Cita três documentos legais que exemplificam como nos últimos anos o governo brasileiro tem se ocupado com a garantia dos direitos da pessoa com deficiência na educação superior. Trata-se da portaria nº. 1.679 de 03 de dezembro de 1999, da Portaria nº. 3.284 de 07 de novembro de 2003 e o Decreto Presidencial 5.296 de 02 de dezembro de 2004. Percebe-se que a inclusão e acessibilidade da pessoa com deficiência nas instituições de ensino superior são garantidas por lei, entretanto são apontados por vários autores (AMARAL, 1994; CARVALHO; DALTRINI, 2002; VALDÉS, 2005; ANDRADE, 2006), fatores que impedem o cumprimento destas leis dificultando a acessibilidade e a inclusão da pessoa com deficiência. Primeiramente é apontada a dificuldade da pessoa com deficiência em ser aceita pelas pessoas que não têm deficiência, ou seja, os preconceitos e os estereótipos que configuram os tijolos da discriminação. O segundo fator apresentado é a falta de comunicação, que implica na dificuldade que a pessoa com deficiência tem de acessar o conteúdo educacional oferecido, e também a dificuldade de se comunicar com seus colegas e professores e, a respeito dos últimos, podem lhes faltar ainda preparo e informação 26 sobre os métodos de ensino e material adaptado. O terceiro fator é a dificuldade da pessoa com deficiência em se deslocar até a instituição de ensino superior. O quarto fator proposto seria a dificuldade de aprendizagem caracterizada pela limitação sensorial, exigindo assim, a adaptação de materiais, métodos e técnicas didáticas. O quinto fator seriam as barreiras arquitetônicas, que dificultam a acessibilidade. Os diferentes estudos apontados demonstram o quanto o tema da inclusão social tem despertado interesse da comunidade científica. Estes estudos indicam uma grande preocupação com o destino dos indivíduos que possuem necessidades especiais tendo em vista o resgate de sua cidadania. Embora muitos programas já tenham sido implementados pela sociedade brasileira, fica o alerta de Quintão (2005) que nos lembra que incluir as pessoas com deficiência implica em muito mais do que criar leis que os protejam. Talvez, as barreiras invisíveis sejam bem mais difíceis de serem eliminadas sendo que, neste aspecto, a melhor maneira de avaliar a situação é ouvir os sujeitos que a experienciam. Tendo em vista todas estas questões quanto à importância da viabilização da acessibilidade e da inclusão da pessoa com deficiência no ensino superior, resta saber como os universitários com deficiência do município de Bauru, representam seu cotidiano dentro das instituições de ensino superior no que se diz respeito a acessibilidade, adequação de materiais e métodos educacionais, inclusão e preconceito; será que estas medidas estão sendo suficientes? Dentro desta discussão se faz necessário a utilização de uma teoria onde possa ser avaliado o próprio discurso destas pessoas no referente a estas questões. Ajusta-se a esta necessidade, portanto, a Teoria das Representações Sociais (TRS) idealizada por Serge Moscovici e continuada por Denise Jodelet. A definição de representação social mais consensual entre os pesquisadores do campo é de Denise Jodelet (2002, p. 22 apud ARRUDA, 2002), a qual afirma que: “As representações elaborado sociais são uma forma de conhecimento socialmente e compartilhado com um objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade comum ao conjunto social”. De acordo com Bock (1995, p. 282) “As representações sociais permitem o conhecimento 27 concreto da consciência, pois são expressão dos seus conteúdos”. A representação social, portanto, não é uma cópia nem um reflexo, uma imagem fotográfica da realidade: é uma tradução, uma versão desta. Ela está em transformação como o objeto que tenta elaborar. É dinâmica, móvel. (ARRUDA, 2002). Percebe-se então a grande contribuição que as representações sociais acrescentam ao estudo e compreensão dos discursos dos indivíduos a respeito de um determinado objeto de estudo, fazendo com que se atinja um conhecimento mais profundo da realidade vivida por estes sujeitos, sob suas próprias representações, sua própria ótica. Dessa forma o presente trabalho propõe conhecer de modo mais profundo e efetivo, a realidade das pessoas com deficiência dentro das instituições de ensino superior através das próprias representações sociais das pessoas com deficiência inseridas neste contexto. A partir da realização desta investigação será possível identificar as representações que os alunos com deficiência fazem da situação vivida por eles no cotidiano das instituições de ensino superior no município de Bauru. 2 OBJETIVOS 2.1 OBJETIVO GERAL Identificar as representações que os alunos com deficiência fazem da situação vivida por eles dentro das instituições de ensino superior na cidade de Bauru. 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Delinear as representações que as pessoas com deficiência possuem sobre si e sua própria inclusão dentro das instituições de ensino superior. Identificar as representações dos alunos com deficiência em relação à instituição a qual estão inseridos. Caracterizar as representações que estes alunosfazem quanto ao seu relacionamento com as outras pessoas que não têm 28 deficiência, no interior da instituição de ensino superior. 3 METODOLOGIA A investigação em questão possui caráter descritivo e exploratório. De acordo Gonsalves (2001) a pesquisa descritiva tem como objetivo escrever as caquestãracterísticas de um objeto de estudo, dessa forma, ela não está interessada no porquê, nas fontes do fenômeno, e sim em apresentar as suas características. Já a pesquisa exploratória se caracteriza pelo desenvolvimento e esclarecimento de idéias, tendo como objetivo oferecer uma visão panorâmica, uma primeira aproximação de um fenômeno pouco explorado. Esse tipo de pesquisa, também pode ser denominado “pesquisa de base”, uma vez que oferece dados elementares que dão suporte para a realização de estudos mais aprofundados sobre o tema (GONSALVES, 2001). Como técnica para a coleta de dados foi utilizada a entrevista, que segundo Richardson (2008), é uma importante técnica que permite o desenvolvimento de uma estreita relação entre pessoas, elemento fundamental na pesquisa em ciências sociais. Essa técnica ainda, segundo J. Maisonneive e Margot-Duclot (1964 apud RICHARDSON, 2008), tem como objetivo obter informações do entrevistado, seja de fato que ele conhece, seja de seu comportamento, conhecer a opinião do entrevistado, explorar suas atividades e motivações. Objetivos bastante pertinentes a essa investigação, que justifica a utilização dessa técnica. Foram entrevistados nove participantes de quatro instituições de ensino superior, os quais forneceram dados para análise e a formulação dos resultados aqui apresentados. Para que fosse mantido o sigilo quanto a identificação dos alunos entrevistados, estes foram referidos como “S1”, “S2”, “S3”, “S4”, “S5”, “S6”, “S7”, “S8” e “S9”. Com esse mesmo objetivo, as instituições foram referidas como “IES X1”, “IES X2” e “IES X3” e “IES X4”. Como identificar já foi anteriormente exposto, essa pesquisa objetiva as representações sociais que os alunos com deficiência fazem da situação vivida por eles nas instituições de ensino superior. Para tanto, foi escolhido como referencial teórico, a Teoria das Representações Sociais. Torna-se necessário 29 a utilização de uma técnica para análise de dados que seja coerente com esse referencial teórico. Dessa forma foi escolhida a Análise de Conteúdo, que segundo Bardin (1991, p. 3): é um conjunto de técnicas de análise de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam inferir conhecimentos relativos as condições de produção/percepção (variáveis inferidas) dessas mensagens. De acordo com Ferreira (2006) a análise de conteúdo é utilizada quando se quer ir além dos significados, da leitura simples, do real. Sendo assim, sua utilização se torna extremamente pertinente a essa investigação. Depois de realizada a leitura do conjunto das respostas elaboradas pelos entrevistados, foram identificadas as categorias e subcategorias que comandaram as especificações dos temas. Após o estudo apurado dos mesmos, foram organizados quatro eixos temáticos que dirigiram e orientaram a análise e discussão dos resultados: representações sociais de si e de sua inclusão nas IES’s; representações sociais quanto a seu relacionamento com as outras pessoas não deficientes nas IES’s; representações sociais em relação às IES’s e representações sociais quanto à política de inclusão e as medidas adotadas pelo governo em prol das pessoas com deficiência. 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO A partir da análise dos dados obtidos nas entrevistas, pôde-se identificar que quanto à questão sobre a representação social de si próprio, os sujeitos destacaram características próprias de sua personalidade, apresentando seu próprio modo de ser, de se relacionar com as demais pessoas, o modo como se apresentam diante da vida, como enfrentam as dificuldades que lhes são impostas. Foi apontada também por alguns sujeitos a “normalidade”, e o desejo de não querer ser discriminado. Assim, percebe-se que os participantes não ressaltam a deficiência, nem se colocam como pessoas diferentes, ao contrário, a maioria nem chega a mencionar esse fato, referido apenas por S2 e S3, como sendo uma limitação que não os impede de realizar suas atividades normalmente. Com isso, fica expresso o desejo de não querer ser discriminado, visto como alguém 30 “deficiente”, e sim como uma pessoa “que tem uma deficiência”, ou seja, apesar de ter limitações para realizar determinadas atividades, é uma pessoa como outra qualquer, que possui também potenciais a serem desenvolvidos. Como acadêmicos, foi ressaltado pela maioria dos participantes, novamente a normalidade, ratificando as colocações feitas anteriormente. Na fala de S3, cabe destacar que esse anseio de querer ser tratado igualmente aos demais alunos faz com que esse sujeito, dentro de sua instituição, não tenha nenhum auxílio de recursos tecnológicos e até mesmo de acessibilidade. Os demais participantes, ao colocarem a percepção que têm de si próprios como acadêmicos, demonstraram satisfação por estarem cursando uma faculdade, enfatizando sua relação com as demais pessoas dentro das IES’s; foi expresso ainda o desejo de contribuir com a instituição, demonstrando, sua necessidade de se apresentar como uma pessoa ativa dentro dessa instituição, não sendo apenas um aluno comum; também foi citada a dedicação em relação ao estudo, a participação em sala de aula, e a luta pelo cumprimento das leis por alguns dos participantes. A partir disso, pode-se dizer que os sujeitos ao representarem a si e sua inclusão na IES, reconhecem suas limitações, no entanto, ressaltam sua “normalidade”, ou seja, sentem-se como os demais alunos que não têm deficiência, realizando as mesmas atividades que estes e querendo assim, ser tratados com igualdade. Os participantes demonstram ainda, estarem satisfeitos por cursar uma faculdade, que como pode ser visto em outros trechos das entrevistas, lhes agrada bastante. No entanto, algumas dificuldades ainda são encontradas dentro das IES’s, que impedem estes alunos de terem as mesmas condições de estudo como seus colegas que não têm deficiência. A percepção dos alunos com deficiência quanto a seu relacionamento com as demais pessoas que não têm deficiência dentro das IES's, é caracterizado como boa ou ótima, por alguns dos participantes. Já o relacionamento especificamente com os professores e funcionários, foi representado como uma relação de auxílio pela maior parte dos sujeitos, pois são as pessoas dentro da instituição que estabelecem maior contato com estes alunos. O participante S3 ressaltou neste aspecto a não adaptação dos professores às suas necessidades, e com isso, ele mesmo busca se adaptar com as 31 metodologias de ensino, ou seja, não exigindo nenhum material adaptado, ou método diferenciado, apenas ouvindo as aulas como os demais alunos. Essa falta de preparo dos professores para trabalharem com alunos com deficiência foi destacado também pelo participantes S7. No entanto, este sujeito de certa forma, é melhor atendido em suas necessidades educacionais, já que a tem acesso a recursos didáticos adaptados e a assessoria de um monitor. O relacionamento com os demais alunos, é representado de forma diferente, uma vez que foi destacado a questão do preconceito pelos participantes S2 e S4. Bem como também, foi ressaltado pelo participante S6 a falta de convivência que os alunos em geral têm com as pessoas com deficiência, o que traz também o não reconhecimento de seus potenciais e possibilidades. Com essas afirmações fica evidente que ainda há o receio dos demais alunos em estabelecer contato com os alunos que têm deficiência, sendo justificado até mesmo como coloca S6, pela falta de convívio que faz com que os estereótipos embutidos na imagem da pessoa com deficiência se sobrepunham ao reconhecimento de seus potenciais e possibilidades. Por outro lado, o participante S3, coloca a aceitação que recebe dos demais alunos. No entanto, essa aceitação, como é demonstrada com o decorrer da entrevista desse sujeito, não é legítima, uma vez que, seus colegas de sala, chegaram até mesmo a mudar as respostas de uma de suas provas, atitude que chega até mesmo a trazer certo espanto, quando se leva em consideração o ambiente no qual se desenvolveu esse estudo, ou seja o ambiente acadêmico universitário, no qual se espera que haja condutas éticas e atitudes responsáveis das pessoas que ali estão. O participante S5, quanto a essa questão do relacionamento com os demais alunos, ressalta outro fator conflitante, a idade, que no seu caso, tem maior relevância que a deficiência. No tocante ao preconceito, a maioria dos participantes, com exceção apenas de S1, reconhece que este ainda existe. O preconceito nestas falas é visto com normalidade, como sendo algo inerente ao ser humano, que até mesmo, sempre irá existir. Existe, portanto, o reconhecimento do preconceito, mas que é justificado não se tratando de um preconceito agressivo, segregativo, mas sim, um preconceito pela 32 falta de convivência com pessoas com deficiência. E assim, ocorre o não reconhecimento de seus potenciais e possibilidades pelas demais pessoas. A imagem da deficiência se sobrepõem a pessoa, limitando-os a ser apenas, “cegos”, “cadeirantes”, “deficientes”. Algumas vezes como aponta o participante S6, essa barreira da compreensão e reconhecimento de possibilidades, com a convivência, acaba sendo transposta, outras vezes conforme assinala S4, mesmo com a convivência, o preconceito permanece. Percebe-se que o modo como os participantes caracterizam sua relação com as demais pessoas e o preconceito existente ou não nestas relações, muitas vezes está relacionado com o modo que própria pessoa lida com a sua vida e com a sua deficiência. Houve por parte de alguns participantes a representação quanto a adaptação das instituições de ensino superior, como sendo um processo que está em desenvolvimento, e que ocorre em conjunto com os alunos com deficiência, sendo que estes são responsáveis por essas modificações, uma vez que quando atuantes, buscam o cumprimento das leis que os beneficiam para a inclusão não só nas instituições de ensino superior, bem como também, nos diversos âmbitos da sociedade. Dentro desse processo, o participante S6 refere-se aos recursos já existentes na instituição a qual frequenta. Recursos esses que, segundo evidenciam os participantes pertencentes a esta mesma instituição (IES X1), foram adquiridos a partir da luta dos alunos com deficiência para o cumprimento das leis que os dão esses direitos. Os participantes reconhecem que existe a adaptação de alguns recursos, e ainda como na instituição IES X1, há um núcleo com recursos que auxiliam os alunos com deficiência, oferecendo a eles atendimento diferenciado. Mas mesmo assim, S8, que pertence a mesma instituição, demonstra sua insatisfação, já que quando necessitou de um tripé que a auxiliaria nas aulas de fotografia, não foi atendida no seu pedido, da mesma forma, ocorreu quando em dias de chuva, solicitou ajuda para que seu acesso a sala de aula fosse mais fácil. Percebe-se que dentro das IES's da cidade de Bauru os recursos, principalmente os que dizem respeito a acessibilidade, não estão adequados já que possuem uma estrutura física que impede o aluno de ter uma locomoção adequada. 33 O participante S8 afirma que há despreparo e desconhecimento por parte dos funcionários das instituições para trabalharem com alunos que tenham deficiência, assim, ele mesmo tem que dar as orientações à pessoa que o atende de como ela deve proceder. Não há nas instituições, de acordo com os participantes, o treinamento desses funcionários para atenderem pessoas com deficiência, isso fica a critério do bom senso destes. A partir dessas falas, fica evidente que além de recursos tecnológicos, há também a necessidade da adaptação dos “recursos humanos”, ou seja, a adaptação de materiais e métodos educacionais e o treinamento de professores e funcionários, que promovam a inclusão da pessoa que tem deficiência dentro da sala de aula, permitindo que ela participe das aulas em nível de igualdade com os demais alunos, e não se limite apenas a ser um aluno passivo, que está ali somente para assistir às aulas. Dessa forma essas adaptações permitirão também que o aluno com deficiência possa usufruir de outro serviços oferecidos na instituição, como a alimentação, por exemplo. Existe também a necessidade da quebra das barreiras atitudinais, o que é pontuado também por S6, haja visto que esse fato é de extrema importância para a inclusão das pessoas com deficiência, pois implica no reconhecimento dos potenciais e possibilidades desses sujeitos, assim como também, destitui a pessoa que tem deficiência do estereótipo do incapacitado, que nada tem a oferecer para a sociedade, havendo o reconhecimento da pessoa com deficiência como sendo realmente uma “pessoa”, sem levar em consideração seu comprometimento. Ficam evidentes também, as limitações que a falta de acessibilidade impõe a pessoa com deficiência como no caso exemplificado acima por S5. Por causa de uma simples maçaneta, a pessoa é destituída de seu direito de ir e vir. Também é possível verificar através dessa fala, que as adequações muitas vezes não seguem o que é determinado na legislação, e o que parece estar adaptado, pode esconder uma armadilha para as pessoas que têm deficiência. Quanto às mudanças que poderiam ser realizadas dentro das instituições, a fim de favorecer os alunos com deficiência no processo de inclusão, a maior parte dos sujeitos menciona a aquisição de recursos tecnológicos, o favorecimento da acessibilidade e a adequação de materiais e métodos educacionais. Dessa forma, também foi enfatizada a necessidade de treinamento e 34 preparo, principalmente dos professores, para trabalharem com pessoas que têm deficiência. Foi também colocada a questão da adequação dos recursos existentes para a promoção de acessibilidade, e também a necessidade de haver menor burocracia dentro da instituição, afim de que os alunos possam ser melhor atendidos em sua solicitações, como no caso de S8. Esses recursos são de grande importância para a efetivação do processo de inclusão, pois não basta apenas o aluno estar inserido dentro de uma instituição, ele deve usufruir dos mesmos privilégios e gozar dos mesmos direitos que um aluno que não têm deficiência. Para tanto, há a necessidade de materiais que os auxiliem na minimização de suas limitações. A falta dessas adaptações para acessibilidade, falta de treinamento dos professores, falta de materiais e métodos educacionais adequados, são fatores que impedem a pessoa com deficiência de ter acesso igualitário ao ensino superior. Muitas destas adaptações não demandam grande investimento das instituições conforme, aponta S9, mas às vezes, apenas um pouco de bom senso e boa vontade; ou então, são recursos que como no caso do participante S4, não estão disponíveis a ele, pelo total descumprimento das leis. Foi ressaltada também a importância quanto à conscientização e o esclarecimento em relação à inclusão da pessoa com deficiência, sendo este, um possível caminho para que haja o reconhecimento dos potenciais e possibilidades das pessoas com deficiência, o que auxiliaria na desconstrução de estereótipos e estigmas acerca da pessoa com deficiência, constituindo um importante passo para quebra das barreiras atitudinais. O processo de inclusão dentro das IES’s, a partir das mudanças que deveriam estar ocorrendo para a efetiva inclusão dos alunos com deficiência, é representado pelos mesmos, através da falta de cumprimento das leis. Com a fala do participante S3, percebe- se que há a resistência por parte da instituição em acolher esses alunos, já que eles têm a consciência de que não possuem recursos os necessários para atender essa população adequadamente. O que se pode questionar aqui é também a falta de fiscalização existente, pois conforme regulamenta a portaria nº. 1.679/99 do MEC, é requisito para avaliação das instituições de ensino superior, que estas obedeçam as normas de acessibilidade determinadas em lei. No entanto, o que se vê, são muitas instituições 35 que não cumprem essa determinação e não são punidas. Por outro lado, S8 e S7, acreditam que as instituições estão se empenhando, buscando meios para favorecer a inclusão da pessoa que tem deficiência. Contudo, esse aluno, acaba não sendo incluído plenamente, já que ainda faltam a adaptação de alguns recursos, a informação quanto ao atendimento a pessoa com deficiência, o preparo dos professores, entre outros. As mudanças que ocorreram nas IES’s foram realizadas, de acordo com que S5 percebe, pela imposição das leis. Sendo que isso não é realizado pela consciência de inclusão, de cidadania, pois gera um custo a instituição. Entretanto, o participante S4 ressalta seu próprio empenho para o cumprimento das leis dentro da instituição a qual pertence; e é através desse empenho que a instituição se vê “obrigada” a se adaptar. Quanto às medidas tomadas pelo governo para a inclusão da pessoa com deficiência, são representadas pelos participantes como insuficientes, sendo que ainda faltam o preparo e o conhecimento quanto a esse processo. As medidas sendo caracterizadas como insuficientes e deficitárias, não atendem a todas necessidades demandadas pelas pessoas com deficiência. Mas o que ocorre muitas vezes é a falta de conhecimento, até mesmo por esses sujeitos, de seus direitos. Pois como é visto através de suas falas, os alunos da IES X1, são melhor atendidos em suas necessidades. Se houvesse maior divulgação e conhecimento dessas leis, certamente mais pessoas com deficiência seriam beneficiadas, e não haveria a necessidade das pessoas com deficiência buscarem seus direitos, pois haveria uma consciência comum da necessidade destes. Esse fato, ou seja, a falta de comprometimento da sociedade, e até mesmo das próprias pessoas com deficiência, que deveriam reivindicar seus direitos, é destacado pelo participante S4. No entanto, existe também a falta de investimentos para a inclusão é um problema apontado pelo participante S6. Assim, é iminente a necessidade de que haja investimento desde as séries iniciais de alfabetização, para que chegando ao ensino superior, os alunos com deficiência não se deparem com as barreiras existentes, principalmente as atitudinais, quando não há o conhecimento quanto ao potencial e as possibilidades das pessoas que têm deficiência. O participante S9 acredita que há a falta de investimento das instituições 36 públicas para a inclusão dos alunos com deficiência, contudo, aponta que a conscientização quanto a inclusão de pessoas que têm deficiência está crescendo, e que ainda falta alunos com deficiência dentro das instituições. Alguns participantes acreditam que há falta suporte do governo para que haja a inclusão, ou seja, um maior investimento em ações nas diversas áreas como saúde, transporte, trabalho, educação; podendo oferecer assim, um modelo a ser seguido, ou seja, que o govreno não somente impunha leis, mas também as cumpra. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Entende-se a partir desses resultados de pesquisa, que os sujeitos comungam de uma representação social sobre si e como acadêmicos, através da “normalidade”, ou seja, sendo pessoas que podem realizar todas atividades como as demais pessoas, apenas com uma pequena limitação, e assim, necessitam de recursos que os auxiliem na execução de determinadas tarefas. Dentro desse âmbito, também não querem ser vistas como diferentes, sendo que, muita vezes nem chegam a citar sua deficiência. Quanto ao relacionamento com as demais pessoas nas IES’s, esse também é representado como “normal”, e pela aceitação, no entanto, há o reconhecimento de que existe o preconceito, a estereotipia, as barreiras atitudinais, e também, no decorrer da análise das demais questões, verifica-se que estes sujeitos não possuem uma interação “normal” com as demais pessoas, já que, esta ainda é permeada por estigmas. Em relação a adequação das instituições, os sujeitos representam que estas se deram a partir da luta e empenho destes alunos, ou pela imposição das leis, não foram advindas de um processo de reconhecimento de suas necessidades e da consciência de igualdade de direitos, e como o participante S3, da instituição IES X2 coloca, às vezes elas ainda nem ocorrem. As políticas e medidas que são tomadas pelo governo para a inclusão das pessoas com deficiência, são representadas como deficitárias, não atendendo a suas necessidades, o que como foi pontuado, se deve não por sua inexistência, e sim por seu descumprimento, e às vezes, até por seu desconhecimento, ainda mesmo até pelas pessoas que têm deficiência. No entanto, os participantes reconhecem 37 também, que falta investimento do governo em ações que incentivem as demais instituições, como escolas, empresas, IES’s, a seguirem as leis que asseguram os direitos das pessoas com deficiência. Para tanto, cabe novamente apontar para a falta de fiscalização nestas instituições a fim de se verificar se os diretos das pessoas com deficiência que as frequentam, estão sendo assegurados, se há realmente um suporte adequado a sua inclusão nesta instituição. Pode-se ser percebido, portanto, que de um modo geral, as instituições estão procurando se adequar as leis para inclusão da pessoa com deficiência no ensino superior, contudo, há uma grande discrepância neste aspecto, já que percebemos que há instituições, como X1, que procuram oferecer acessibilidade, adequação de métodos e materiais pedagógicos – o que também se deve muito a luta dos próprios alunos com deficiência dessa instituição para que fossem cumpridas as leis determinadas pela constituição – mas que mesmo assim, falha em alguns aspectos, como na preparação dos professores e funcionários para o atendimento a esse aluno; assim como há também instituições que simplesmente tentam dificultar o ingresso de alunos com deficiência, como no caso da IES X2, por não oferecer uma adequação tanto estrutural, quanto metodológica para atender as necessidades dos alunos com deficiência. Dessa forma, constatamos que o processo de inclusão da pessoa com deficiência, é um longo processo, que demanda tempo, e às vezes até mesmo como apontam os participantes, boa vontade de quem deve promover essa inclusão. ABSTRACT The inclusion of the disabled person is a theme frequently reported in today's society. A large number of laws, decrees and orders that were created aiming at guaranteeing the rights of accessibility, including academic and social rehabilitation. Thus, it is noticed that an increasing number of disabled people entering higher education, however, often the Higher Education Institutions (HEI's) are not prepared to receive them, although the inclusion policies are also directed to those institutions . The present study was to discover the reality of people with disabilities within the HEI's, through the social representations of students with disabilities placed in this context. Nine subjects were interviewed, and data collection was used directed interview with open questions, and the analysis of the data furnished by the Technical Content Analysis (Bardin, 1991). From the results of research, it was noticed that the subjects represent themselves and their status as students, through the normal, being persons who carry out activities as other people, also not wanting to be seen as different. The relationship with others in HEI's, this 38 was also represented as normal. However, recognize that there is prejudice, stereotyping and attitudinal barriers. In the analysis of other issues, it was found that these subjects do not have a normal interaction with others, since this is still permeated by stigmas. Regarding the adequacy of the institutions, the subjects they represent themselves from the struggle of these students, or the imposition of laws. The policies and measures that are taken by the government for including disabled people, were shown to be deficient, not meeting their needs, which, as has been pointed out, should not by their absence, but by his failure, and even by ignorance Keywords: Disability. Inclusion. Social representations. HEI's. REFERÊNCIAS AMARAL, L. A. Pensando a integração. In.______. Pensar a diferença: deficiência. Brasília: CORD, 1994. p 35-70. ANDRADE, M. S. et al. Pessoas com deficiência rumo ao processo de inclusão no ensino superior. Revista Digital de Pesquisa CONQUER da Faculdade São Francisco de Barreiras, Barreiras, BA, v. 1, 17 dez. 2006. Disponível em: <http://www.fasb.edu.br/revista/index.php/conquer/article/view/27 >. Acesso em: 23 ago. 2007. ARRUDA, A. Teoria das representações sociais e teorias de gênero. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 117, 2002 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010015742002000300007&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 23 ago. 2009 BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Rio de Janeiro: Edições 70, 1991. BOCK, A. M. B. Eu caçador de mim: pensando a profissão do psicólogo. In: SPINK, M. J. P. (Org.). O conhecimento no cotidiano: as representações sociais na perspectiva da psicologia social. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1995. p. 280-291. CARVALHO, J. O. F.; DALTRINI, B. M. Educação a distância: uma forma de inclusão do deficiente visual à educação superior. In: CONFERENCIA INTERNACIONAL SOBRE EDUCACIÓN, FORMACIÓN, NUEVAS TECNOLOGIAS Y E-LEARNING EMPRESARIAL. Anais... Valência, Espanha: Agência de Educación y Formación Virtual, 2002. Disponível em: < http://www.virtualeduca.org/encuentros/valencia2002/actas2002/actas02/601.pdf >. Acesso em: 23 ago. 2009. FERREIRA, B. W. Análise de Conteúdo. Aletheia ULBRA, Canoas (RS), v. 11, p. 1320, 2006. Disponível em: <http://www.ulbra.br/psicologia/psi-dicas-art.htm> . Acesso 39 em: 23 ago. 2009. GONSALVES, E. P. Conversas sobre iniciação à pesquisa científica. 2. ed. Campinas: Alínea, 2001. MACIEL, M. R. C. Portadores de deficiência: a questão da inclusão social. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v.14, n.2, p.51-56, abr. / jun. 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010288392000000200008&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 23 ago. 2009. MAZZONI, A. A. et al. Aspectos que interferem na construção da acessibilidade em bibliotecas universitárias. Ciência da Informação, Brasília, v. 30, n. 2, 2001. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010019652001000200005&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 23 ago. 2009. MELO, M. T. Acesso Universal: respeito e cidadania. In: CONFERENCIA NACIONAL DOS DIREITOS DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA,1., 2006, Brasília. Resumos... Brasília: CONADE, 2006. p. 69-70. QUINTAO, D. T. R. Algumas reflexões sobre a pessoa portadora de deficiência e sua relação com o social. Psicologia e Sociedade, Porto Alegre, v. 17, n. 1, 2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010271822005000100011&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 23 ago. 2009. RICHARDSON, R. J. et al. Entrevista. In: 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 206-219 . Pesquisa Social: métodos e técnicas. THOMA, A. da S. A inclusão no Ensino Superior: ninguém foi preparado para trabalhar com esses alunos isso exige certamente uma política especial. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 29., 2006, Caxambu, MG. Resumos... Caxambu, MG: Associação Nacional em Pós-graduação e Pesquisa em Educação, 2006. Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/GT15-2552--Int.pdf> Acesso em: 23 ago. 2009. VALDÉS, M. T. M. (Coord.). A Integração das Pessoas com Deficiência na Educação Superior no Brasil. Caracas: IESALC/UNESCO, 2005, v. 1. 142 p. Disponível em: <http://sid.usal.es/idocs/F8/FDO12676/integracion_educacion_superior_brasil.pdf >. Acesso em: 12 ago. 2009 40 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura A EDUCAÇÃO DO CORPO ATRAVÉS DA MÍDIA IMPRESSA DESTINADA AO PÚBLICO ADOLESCENTE1 Ana Carolina Biscalquini Talamoni2 RESUMO O objetivo deste artigo é discutir as representações de corpo veiculadas numa revista destinada ao público adolescente, como parte dos resultados de uma pesquisa de mestrado em Educação para a Ciência, dedicada ao estudo destas representações junto a estudantes do ensino fundamental. Observa-se que múltiplos são os discursos articulados sobre o corpo, bem como as representações a eles subjacentes. Isto decorre da posição de centralidade que o corpo vem ocupando na cultura contemporânea e da ascendência da estética e da aparência nos processo de identificação e formulação das identidades. Na adolescência, as preocupações e a necessidade de informação acerca dos processos corporais são mais evidentes, tornando imperativo identificar as principais fontes de informação acessíveis a estes jovens e averiguar as representações veiculadas por elas. Em entrevistas realizadas junto a 29 jovens, foi constatado que as revistas para adolescentes são uma fonte de informação relevante. Sendo assim, procurou-se analisar o conteúdo de algumas edições da revista Todateen, apontada como a mais lida pelo público pesquisado, salientando as representações de corpo presentes nos diversos discursos por ela articulados. Observou-se como resultado da pesquisa, a existência de modelos específicos de beleza e saúde que devem ser perseguidos pelos jovens leitores. Estes modelos, ao embasarem-se pretensamente em conhecimentos científicos, acabam por concorrer com os conhecimentos construídos no âmbito escolar, mostrando-se mais influentes que estes últimos junto ao público pesquisado. Atentase, portanto, para a necessidade de uma revisão crítica da prática pedagógica dos professores do ensino fundamental, em especial dos professores de ciências, para que os mesmos tenham em vista as possibilidades de utilização destes recursos em sala de aula, seja para contribuir com a aprendizagem dos conhecimentos científicos relativos ao corpo ou ainda, para permitir a análise crítica destes conteúdos. Palavras-chave: Representações. Corpo. Adolescência. Educação. Mídia. 1 INTRODUÇÃO O corpo é objeto de estudo das ciências biológicas e humanas e, para além 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Psicóloga. Doutoranda do Programa de Pós Graduação em Educação para a Ciência (UNESP),campus Bauru. Apoio Capes. 41 de sua importância enquanto fonte (ou objeto) do conhecimento científico ocupa um "lugar singular" na constituição das identidades e das alteridades (D'ANDREA, 1996). Nesta condição, o corpo define-se como um território singular a partir do qual compreendemos o mundo e interagimos com ele; são os corpos docentes e discentes que se apresentam e constituem todo ambiente de aprendizagem - porque é o corpo, dado a perceber o mundo, que apreende a realidade e permite o pensar sobre ela (MERLEAU-PONTY, 1996). Em conseqüência disto, é sobre o corpo que as diversas formas de poder presentes nas sociedades irão investir (FOUCAULT, 1982). Desta constatação decorre sua importância e a posição de centralidade que o corpo progressivamente vem ocupando nas culturas ocidentais, bem como a preocupação recorrente de pesquisadores da educação, acerca das conseqüências deste investimento cultural sobre o corpo, e as possíveis implicações deste fenômeno, denominado de "corpolatria", na constituição das identidades e, portanto, na formação do cidadão. A "corpolatria" (CODO; SENNE, 1985) - termo cunhado justamente para designar este fenômeno, cuja origem remete à ascensão do sujeito individual (Eu) na modernidade - refere-se à preocupação exagerada que os indivíduos vêm nutrindo acerca de seus corpos, saúde e estética, fazendo surgir, a cada dia, novas práticas e intervenções que visam em última instância, a construção de um corpo (e de uma identidade) possível, dentro dos padrões culturais estabelecidos. Este fenômeno atinge todos os indivíduos, em todas as faixas etárias, através de discursos midiáticos, médicos, científicos, pedagógicos e de outras ordens, de modo que, cada vez mais as condições corporais dos indivíduos se confundem com o próprio indivíduo, influenciando a maneira como significam e vivem seus próprios corpos. Frente a isto, o objetivo deste texto é analisar o papel que a mídia desempenha na (re) produção de um conjunto de representações que visa apresentar à sociedade e, em especial ao público adolescente, o que seria o modelo corporal ideal e coletivamente enfatizado. Nesta rota, adotou-se como ponto de referência as propostas apresentadas por Wilton Garcia (2005) sobre a "alegoria espetacular" referente ao corpo e promovida pelos meios massivos de comunicação. Para a realização deste estudo, se entrevistou jovens adolescentes do sexo feminino e, ao se constatar a importância singular para estas leitoras das publicações que focam inclusive aspectos do corpo juvenil, buscou-se averiguar as representações 42 constantes na "revista teen" mais lida pelo grupo. Em continuidade, este artigo detém-se na análise de conteúdo (BARDIN, 1977) de algumas edições da revista Todateen, com o propósito de melhor entender o sentido imposto por uma publicação impressa ao corpo das adolescentes. 2 CORPOS "ADOLESCENTES" Com relação ao desenvolvimento da corporalidade dos adolescentes, Rappaport et al. (1981, p.6-17) apontam para o "drama" vivenciado por esta população específica que necessita, a cada dia, conformar-se com um corpo que se modifica; como o crescimento é rápido, e também desproporcional, o adolescente se sente (e é) desajeitado, pois ainda não domina bem seu corpo, não se adaptou a ele. Aliás, ele mal conquistou o domínio de seu corpo infantil quando o "perdeu" para o corpo adolescente, o que implica num sentimento de perplexidade "diante de um corpo que é seu, mas que lhe soa estranho". Desta forma, pode-se inferir que a tarefa primordial da adolescência, do ponto de vista psicológico, é o renunciar ao corpo de criança, que se modifica vertiginosamente alterando sua imagem corporal e a representação de si mesmo, aceitando-se e acostumando-se com seu corpo adulto. Neste sentido é possível observar que a busca da representação do próprio corpo é uma atividade característica desta fase; é preciso elaborar uma "nova imagem corporal" que vai se configurando de acordo com as mudanças ou modificações externas do corpo, o que acontece concomitantemente com a necessidade de reformulação da identidade. É na convivência com o grupo que esta nova identidade será construída, já que é no grupo que o adolescente busca a uniformidade, através de elementos ou marcas identitárias compartilhadas (muitas delas inscritas nos corpos) que lhe dão a sensação de segurança e estima pessoal, além da possibilidade de, a seguir, "diferenciar-se". Estas identificações são nutridas por diversos tipos de representações acerca do que sejam corpos "aceitáveis", "perfeitos", ou pelo menos, "saudáveis", sendo estas amplamente disseminadas pela teia midiática e reiteradas por discursos médicos de diversas ordens. Inúmeras são as implicações decorrentes da ascendência destes discursos na vida dos jovens, principalmente quando se trata de 43 representar o próprio corpo e o corpo do outro. Pensar acerca do corpo e atualizar estas concepções concomitantemente à necessidade de ser aceito dentro de grupos específicos faz com que o adolescente estabeleça relações específicas e particulares com seu corpo, o que é diretamente influenciado pelas condições em que se encontram este corpo. Assim, para obedecer aos padrões estéticos vigentes, e consequentemente, para ser aceito no grupo, o adolescente muitas vezes encontra, em formas mórbidas de manifestação deste desejo coletivo pelo corpo perfeito, saídas possíveis para um impasse que é característico desta fase específica do desenvolvimento biológico e psicológico do ser humano nas civilizações ocidentais, o que remete à concepção e existência de representações específicas a respeito do corpo. Das exigências corporais decorrentes desta "cultura do corpo", Bee (1997) atenta para a grande incidência de transtornos alimentares em jovens adolescentes, como a bulimia e a anorexia, que afetam principalmente indivíduos do sexo feminino, e cuja incidência relaciona-se com as exigências sociais para se manter uma magreza exagerada. 3 CORPO E CULTURA Segundo Meyer e Soares (2004) "vivemos um tempo em que o corpo é exaustivamente falado, invadido e ressignificado" não só pelas explorações científicas realizadas pelas mais diversas disciplinas das ciências, mas também pelo próprio sistema econômico que, em muitos dos seus segmentos, procuram vender a representação de "corpos bonitos e saudáveis", dando aos indivíduos a possibilidade de redefinirem seus próprios corpos. A correlação que se estabelece em nossa cultura entre o corpo e a identidade dos sujeitos pode ser considerada uma das causas (ou decorrências) dessa preocupação crescente para com as condições de beleza e saúde do corpo. Os discursos contemporâneos sobre o corpo, pautados por uma polifonia vigorosa, mas ao mesmo tempo confluente, são cada vez mais densos e nunca se teve tanta informação disponível auxiliando as pessoas na busca por um modelo corporal retratado como "ideal". O corpo que até meados do século passado era em muito silenciado e pouco se mostrava, passou a ser alvo de intensa atenção. Ao final da 44 modernidade, observa-se uma ampliação no rol de saberes e práticas relativas ao corpo, o que permite um controle e uma liberdade sem precedentes sobre este, desestabilizando profundamente nossas referências sobre o que o corpo é e sobre como ele pode ser conhecido e vivido. Esses saberes, que são cada vez mais democratizados suscitam uma nova lógica, na qual tendemos a pensar, viver e tratar do corpo como se este fosse um "projeto pessoal", ou seja, molda-se o corpo na tentativa de moldar-se uma identidade, tamanha é a importância e a centralidade do corpo na cultura contemporânea (MEYER; SOARES, 2004, p. 8-9). Esses "projetos corporais", segundo as autoras, situam-se e entrelaçam-se nas fronteiras entre a "autonomia e controle, prazer e sofrimento, libertação e subordinação, inclusão e exclusão" forçando os indivíduos a buscarem cada vez mais informações e recursos (inclusive tecnológicos) que lhes permitam "adquirir" o corpo perfeito. Rosa (2004) também aponta para o caráter apelativo do "corpo em boa forma", tão divulgado e cobrado pela sociedade, e que tem nos jovens uma ascendência muito forte. Lembra que esta liberdade discursiva acerca do corpo (bem como para se mostrar o corpo) é relativamente recente, e possui um caráter conservador que se perpetua à medida que traz novos signos de moralidade, que seriam os próprios padrões estéticos e as práticas corporais a eles relacionados, que se encontram presentes nestes discursos. Assim, se os discursos e os padrões estéticos possuem um caráter homogenizador e disciplinador dos corpos, estes mesmos corpos, em contrapartida, são cada vez mais fortalecidos enquanto instrumento de comunicação ou "espaço de resistência" ao caráter normativo que sobre eles se quer impor, através das mais diversas instâncias e instituições. Fala-se, pois, em termos foucaultianos, na fluência do biopoder que extrapola as falas da medicina e se expande para a estética, tendo como um de seus principais aliados os canais midiáticos. O corpo também pode ser considerado como instrumento para o estabelecimento de vínculos sociais, sendo que as maneiras dos jovens se vestirem, o uso de certos adereços, tatuagens e piercings, podem ser interpretados como "espaços de conversação", de diferenciação e singularidade (ROSA, 2004). O que a literatura indica, portanto, é que para discutir a questão das representações do corpo 45 ideal que interpelam jovens e adultos os levando a buscar uma formatação ou correção de seus corpos implica considerar a influência da mídia na disseminação e divulgação dessas representações. Hoff (2005) busca fazer esta análise através de campanhas publicitárias veiculadas no Brasil desde o início do século XX até os dias atuais. Nota que por decorrência dos avanços tecnológicos e da própria medicina na contenção e cura de diversas doenças, a preocupação que antes se centrava nas questões de saúde e doença são agora realocadas na questão da aparência, da estética. Os discursos que até então eram dirigidos ao corpo enfermo, agora remetem ao "corpo imperfeito", esteticamente. Ambas as preocupações - com a saúde e com a estética - encobrem um conflito, uma angústia humana, que se refere ao fato de que nosso corpo e, portanto, nossa vida, são finitos. Este poderia ser considerado por Hoff (2005) e Santos e Hoff (2006) como um dos motivos pelos quais se desenvolvem de maneira crescente, recursos e técnicas na área da medicina, cosmética e terapias alternativas, que, ao serem consumidos, possam garantir (ou pelo menos prometem) um estado prolongado de juventude, porque a juventude relaciona- se com a força e a energia, bases da vida humana. Para Hoff (2005), a mídia "reflete e divulga valores dos grupos dominantes" e se há um imperativo de corpo ideal a ser perseguido, e que é amplamente divulgado pela mídia, é porque este poderá ser conquistado através de determinados consumos. O corpo admitido pela mídia representa uma aspiração coletiva: o que a sociedade é ou gostaria de ser, de modo que ao mesmo tempo em que apresenta modelos corporais ou de conduta a serem seguidos, estes próprios modelos tem sua inspiração na vida coletiva e cotidiana. Este corpo representado, portanto, é mais uma idealização do que um corpo real, natural, de modo que "o corpo natural é desqualificado" (HOFF, 2005, p. 24). As técnicas de intervenção e transformação do mesmo transformam-se em objetos de consumo bastante acessíveis, como é o caso das cirurgias plásticas; o corpo natural imperfeito, que não corresponde ao corpo ideal da mídia, necessita de intervenções, a fim de promover a auto-satisfação, a auto-realização, a felicidade e o sucesso, de modo que os indivíduos associam a alteração da condição de seus corpos a um sentimento de satisfação e felicidade. 46 Ainda é Hoff (2005) que ressalta que estas transformações também estão associadas à idéia de suplício (daí a necessidade de auto-determinação), de superação (existe sempre algo a ser melhorado em nosso corpo) e de conversão ( do corpo natural ao corpo artificial). O corpo ideal da mídia é um ideal a ser perseguido. A mídia, enquanto presença constante na vida da maioria das pessoas, dentre elas as adolescentes entrevistadas, numa faixa etária entre 12 e 14 anos, não só participa do processo de ensinar acerca do corpo como tem o poder de "legitimar os conhecimentos". No que diz respeito ao corpo, este pode ser entendido como uma construção social e cultural, sobre o qual versam múltiplos discursos nos quais estão implícitas diversas "marcas" ou "símbolos" através dos quais os indivíduos poderão se identificar, se diferenciar, se qualificar, se agrupar, se ordenar, etc. Tudo aquilo que é veiculado contribui na formação de identidades, iniciando os indivíduos nos mais diversos mundos e pertenças, cada qual com seu respectivo rol de necessidades e consumos. Andrade (2004) analisa o formato, matérias e imagens veiculadas numa revista feminina dedicada às questões de saúde e boa forma, e observa que dentre os assuntos mais abordados estão receitas e dicas que visam instruir as mulheres, meninas ou adultas, ensinando técnicas corporais específicas para um melhor cuidado do corpo. O discurso prevalecente é o do corpo magro e saudável, da menina e da mulher bem disposta, ou melhor, disposta a qualquer sacrifício na obtenção de um corpo saudável. O valor da estética encontra-se sempre posterior ao da saúde, sendo uma "conseqüência natural", daí o fato de que estas representações tendem a naturalizar determinados padrões que, na verdade são culturais e subjacentes a determinados interesses econômicos ou de consumo. Para a autora, através destas revistas, as meninas aprendem desde cedo, através do discurso do corpo malhado e magro, que necessitam controlar seus impulsos, seus anseios, e em última instância, seus próprios corpos. Os produtos associados a determinadas imagens corporais ou modalidades esportivas são, para autora, "marcadores sociais", e esta relação entre determinados objetos e um estilo de vida ensinam para as jovens que é preciso consumir 47 determinadas coisas, ao se adotar determinados estilos de vida. Ainda nas análises da autora observa-se a crescente preocupação com o corpo magro, sendo que "a sombra da obesidade e a idéia de um corpo "disforme" parecem pesar tanto quanto a consciência daquela ou daquele que come" (ANDRADE, 2004, p. 112), o que poderia acarretar no aumento de casos de bulimia e anorexia em nossa sociedade, questões estas que necessitam ser refletidas. Como apontou Hoff (2005), também estão associados a estas representações corporais, aspectos ou qualidades subjetivas das mulheres sadias e magras. O autodisciplinamento e o autocontrole necessários para a manutenção de uma dieta são cada vez mais considerados como qualidades dos indivíduos, enquanto "a vergonha e a culpa estão postas em relação a ser gorda ou flácida, a não ter controle sobre o corpo, sobre a "boca", a não saber governar sua conduta, a não seguir uma dieta, a não perseverar na academia" (ANDRADE, 2004, p. 117-118). 4 AS REVISTAS PARA ADOLESCENTES Se os adolescentes de fato aprendem sobre seus corpos através do ensino formal, mas também através de outros meios, como os midiáticos, que constantemente abordam questões de saúde e estética, observa-se que é, em grande parte, por conta desses discursos veiculados pela mídia, que se proliferam as exigências acerca das condições de saúde e estética corporal, influenciando na construção e na manutenção das representações do corpo bem como nos conhecimentos a ele associados. Buscando investigar os principais meios de informação disponibilizados, e utilizados, por uma população específica de 29 jovens estudantes do ensino fundamental com faixa etária entre 12 e 14 anos, observou-se que as revistas para adolescentes se configuram em um importante recurso informativo na vida das alunas pesquisadas. Das 29 adolescentes entrevistadas, oito relataram ler, periodicamente, alguma revista teen, o que equivale a um número maior (o dobro) daquelas que citaram a televisão como principal meio de informação (que foram apenas quatro) e o quádruplo daquelas que têm acesso à Internet (no caso, apenas duas adolescentes relataram ter acesso à Internet, e utilizarem este recurso para aumentar seu 48 conhecimento). Buscando obter as representações de corpo presentes neste meio de comunicação específico, foram analisadas três edições da revista TodaTeen, publicação que figurou entre as mais lidas pelas adolescentes. Sua periodicidade é mensal, de modo que se buscou analisar publicações distantes uma das outras: fevereiro de 2006, outubro de 2006, e fevereiro de 2007. 5 SOBRE O FORMATO DA REVISTA A revista é dividida em 15 sessões e suas matérias jornalísticas, basicamente em cinco blocos . As sessões, que se repetem mensalmente, possuem "nomes", que mais parecem códigos, já que por eles não é possível, ao leitor "despreparado", prever os assuntos que serão abordados em cada uma delas, e que remetem à existência de signos que, ao serem compartilhados por um mesmo grupo, fortalecem o sentimento de pertença e de identidade comum (seja ela a identidade de "leitora da revista"): - Todagalera: espaço para o envio de recadinhos e e-mails para a redação da revista, amigos (as) ou "paqueras"; - Rapunzel: dicas de como cuidar do cabelo; - X-Tudo: sessão destinada a informações recentes acerca da vida de atores e músicos, novidades, etc; - Fique Linda: dicas de beleza (maquiagem, produtos de beleza, "banho de lua", e outros recursos ou práticas que visem melhorar a aparência em geral); - Entrevisteen: entrevista com artistas da mídia; - Miaau: foto de ídolos da música, cinema e televisão; - Top Teen: espaço destinado a textos, poesias e frases elaboradas e/ou enviadas pelas leitoras, e que podem ser recortados e utilizados/enviados a quem se queira; - Micos &Cia: aborda assuntos do dia-a-dia e situações constrangedoras pelas quais as adolescentes passam ou já passaram. Em algumas edições, artistas narram um "mico" pelo qual passaram. Também são lembrados alguns objetos ou comportamentos que fizeram "sucesso" no passado e que hoje em dia estão "fora de moda"; 49 - Nas estrelas: horóscopo do mês; - Toques: dicas de objetos e acessórios disponíveis no mercado, para enfeitar o quarto, material escolar, etc. - Moda in: editorial de moda; - Sobe o Som: dicas de Cds e novidades do "mundo musical"; -Pensando no futuro: aborda questões relativas ao estudo, cursos no exterior, orientação vocacional, etc.; - Altos Papos: sessão de perguntas e respostas; as leitoras enviam suas perguntas, que são respondidas pela redação, por algum especialista ou por algum artista; - Papo com a Teena: geralmente é a última página da revista, e nesta sessão, tem histórias de fundo moral, algum pensamento ou reflexão. Nota-se que das 15 sessões, apenas quatro irão tratar de questões específicas relativas ao cuidado com o corpo (sejam elas: Rapunzel, Fique Linda, Moda In, Altos Papos); no entanto, todas as sessões, ao abordarem entrevistas ou apresentarem sessões de fotos com artistas da mídia, acabam por apresentar também modelos, padrões corporais, comportamentais e atitudinais a serem "seguidos"ou pelo menos, valorizados. Sobre estas quatro sessões, percebeu-se que as três primeiras (Rapunzel, Fique Linda e Moda In) se relacionam com a questão estética e sempre dão dicas de como deixar o cabelo mais bonito, mais liso, como se maquiar realçando determinadas partes do rosto, apresentando tratamentos alternativos de beleza (como o "banho de lua"), indicando também outros produtos cosméticos para auto-bronzear, cuidar das unhas, evitar estrias, receitas de sucos revitalizantes, etc., além de apresentar as roupas da moda, sempre com o cuidado de "indicar" quais as peças que valorizam os diversos "tipos" de corpos. Já na quarta sessão, "Altos Papos", ficou mais evidente as curiosidades e as angústias destas adolescentes acerca de suas vivências corporais, da sexualidade e do relacionamento com os garotos. A maioria das perguntas se refere a como fazer para conquistar o menino da escola, qual o risco da camisinha estourar durante a relação sexual, a angústia por ser a única da turma que ainda não beijou (ou que ainda não teve relações sexuais), traição das amigas ou do namorado, duvidas sobre o beijo ou sobre o melhor momento para a primeira relação sexual. Nas três revistas analisadas, não foi possível observar nenhuma resposta elaborada por um especialista nesta sessão específica, e as perguntas que parecem se relacionar à 50 necessidade de um maior conhecimento acerca do corpo e aquelas que se referem à sexualidade. Quanto às matérias jornalísticas, estas se subdividem sempre em cinco blocos sendo que para a presente pesquisa foram de interesse aquelas que, de alguma forma remetiam à questão do corpo ou da aparência. - Amor: Neste bloco são apresentadas matérias relacionadas à paquera e namoro. Nas revistadas analisadas, as matérias deste bloco variaram em seis assuntos ("paquera", "rivalidade entre amigas", "beijo", "conquista", "romance", "amor") tendo uma prevalência do assunto "conquista". - Especial: Neste bloco são agrupadas matérias jornalísticas diversas. Das 15 matérias analisadas, três falavam sobre a questão da auto-estima, uma sobre a bulimia e a anorexia, uma sobre a prática de esportes; as demais tratam de variedades, entrevistas e curiosidades. Destas cinco matérias específicas, apenas três mostraram-se de maior interesse para a pesquisa (uma sobre auto-estima, a matéria sobre transtornos alimentares e a matéria sobre a prática de esportes), sendo que em todas elas percebe-se o intuito daquele que escreve em estabelecer uma certa empatia com as adolescentes, demonstrando compreensão acerca das angústias e sentimentos por elas vivenciados. Assim, essas matérias buscam sempre alertar para o caráter "transitório" da adolescência e para a variação pessoal no que diz respeito ao desenvolvimento físico (que nem sempre é ruim, podendo favorecer a aparência em geral). Na matéria sobre auto-estima, são apresentados motivos (ou conselhos) para que a garota se sinta mais feliz e valorizada, aconselhando as adolescentes a não associarem beleza com magreza e a sempre valorizarem "seus pontos fortes"; a procurarem um especialista, caso estejam com dúvidas acerca das mudanças corporais, a sentirem-se bonitas (já que são jovens) e para isso, "não ter preguiça": se arrumar, se maquiar, cuidar da alimentação ("você é o que você come"), fazer esportes, etc. As adolescentes são aconselhadas a aceitarem seus corpos e seu jeito de ser, já que este pode ser, inclusive, "uma maneira de descobrir o que mudar". A questão da aceitação do corpo também está presente na matéria sobre a bulimia e a anorexia. A matéria se inicia, solicitando que as leitoras olhem as fotos das modelos da revista, e atentam para o fato de que todas elas foram tratadas via 51 computação gráfica, apresentando a idéia de que não existem corpos perfeitos. Logo em seguida, há uma breve explicação acerca do que caracteriza cada um destes transtornos e suas conseqüências para o corpo. Com menos de uma página, a matéria termina atentando as leitoras, para que "fiquem longe destas doenças", o que reitera a correlação, já indicada pela bibliografia (HOFF, 2005; ANDRADE, 2004), entre traços de caráter e condições corporais, ou seja, existe, nesta instrução, a idéia implícita de que, desenvolver transtornos alimentares (assim como ser magra, ou gorda) é uma escolha ou opção pessoal (responsabilização do indivíduo). Ao lado, a foto de uma atriz (cuja beleza encontra-se dentro dos padrões), que é também adolescente, e que interpreta uma garota com distúrbios alimentares na televisão. A terceira matéria tem o intuito de motivar as leitoras a praticarem algum tipo de exercício, pois "faz bem para o corpo, ajuda no desenvolvimento e contribui com a forma física", ou seja, a idéia de que "faz bem para a saúde" fica implícita ao "faz bem para o corpo" e fazer bem para o corpo é contribuir com a forma física de modo que beleza e saúde são termos quase equivalentes. As leitoras são instruídas a escolher um esporte que seja prazeroso, que respeitem seus limites e busquem sempre a ajuda de um profissional. Ocupando duas páginas inteiras, a matéria possui diversas fotos. A maior é de uma modelo, trajada com roupas de esportes, numa bicicleta. A parte inferior das duas páginas é dedicada a fotos de artigos esportivos e roupas específicas para as várias modalidades esportivas, com marca e preço. A apresentação (e consumo) de produtos relativos à prática esportiva pode ser considerada como uma possibilidade, uma forma de inserção das jovens ao "mundo dos esportes", a uma identidade esportiva e a um grupo específico, como sugeriu Rosa (2004). - Moda: Este bloco consiste na apresentação de um editorial de moda e em dicas sobre como se vestir, para valorizar o "que se tem" ou "disfarçar" imperfeições corporais (como ser baixa demais, ou acima do peso). - Beleza: São abordados "truques" de beleza, dicas para ficar em forma para o verão (como não comer "mais do que deve", beber muita água, fazer exercícios, usar filtro solar, cuidar das unhas e dos cabelos), medidas para evitar a celulite (manter-se no peso, fazer exercícios, evitar bebida, cigarro, refrigerantes, doces, frituras e muito sal na comida, beber muita água, "desestressar" ou procurar um dermatologista) informações sobre a depilação. Basicamente estas matérias têm por objetivo 52 "apontar" uma série de condições corporais inadequadas ou incompatíveis com o padrão de beleza atual, propondo uma série de práticas e recursos que visam corrigir estas imperfeições. Ao longo dos textos, não se observam muitas fotos que explicitem este padrão, mas a prevalência de um discurso para diferentes meninas, com os mais diversos problemas: "se você tem celulite, se sua franja está rebelde, se você está com uma espinha: o que você deve fazer é...". - Testes: Dos 13 (treze) testes apresentados nas três edições analisadas, três são sobre garotos, romance e paquera; um para descobrir "qual o seu tipo de perfume" e nove relacionam-se com a questão da identidade (Descubra: qual é seu estilo de agir; como você conquista os meninos; que tipo de menino atrai seu coração; qual bicho de estimação é a sua cara; o que tem a ver com você; qual o seu ritmo; você é "fera" na paquera?; quem é você no seu grupo; "superteste" de carnaval), questão esta bastante pontual às leitoras da revista. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Através da análise de três edições de TodaTeen observou-se a predominância de representações que pontificam que o corpo, em seu formato "natural", está condenado a apresentar algum grau de imperfeição estética e que, portanto, pode e deve ser melhorado, reparado ou, ao menos, ser objeto de sutis intervenções que disfarcem ou amenizem os traços considerados negativos para quem o observa, sob o risco de, se assim não o fizer, a adolescente ser reprovada pelo grupo social no qual está inserida e, dentro deste, especialmente pelo sexo oposto. Tais "ensinamentos" são ministrados através de discursos ambíguos, subliminares, que ao mesmo tempo em que incitam à aceitação do próprio corpo e admitem o caráter utópico, ideal do corpo perfeito (discursos estes que, ao começo de cada matéria jornalística podem visar o estabelecimento de um vínculo com o leitor, ou ainda, de uma identificação do leitor para com aquele que lhe fala) salientam, supervalorizam as questões estéticas, correlacionando-as com questões de saúde e caráter, ou seja, salientam o "auto- disciplinamento" e a força de vontade como pré-requisitos para uma melhoria das condições corporais. Estas representações, presentes em TodaTeen não se mostram originais, reproduzindo o 53 teor das orientações constantes em praticamente todas as publicações destinadas ao público juvenil. Em conjunto, as "revistas teen" dão sentido a uma pedagogia que, ao normatizar o corpo através de sua "espetacularização", apresentam- se como um dos dispositivos comprometidos com a formatação social dos indivíduos. Neste encaminhamento, as alterações representacionais fomentadas pela mídia impressa cooperariam para a construção de um conhecimento significativo sobre o corpo, buscando viabilizar alterações de hábitos e atitudes, sob a promessa de que novos posicionamentos em relação ao corpo resultam em formas mais eficazes e promissoras de reconhecimento e triunfo social. Ao mesmo tempo, as mesmas propostas e promessas guardam uma face oculta: incentivar as jovens leitoras a se tornarem ávidas consumidoras de produtos e serviços centrados no corpo e na aparência corporal, inclusive das próprias revistas. REFERÊNCIAS ANDRADE, S. S. Mídia, corpo e educação: a ditadura do corpo perfeito. In: MEYER , D. E.; SOARES, R. F. R. (Org.). Corpo, Gênero e Sexualidade. Porto Alegre: Mediação, 2004. p. 107-120. BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; Martins Fontes, 1977. BEE, H. O ciclo vital. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. CODO, W.; SENNE, W. O que é corpo (latria). São Paulo: Brasiliense, 1985. D'ANDREA, F. Desenvolvimento da personalidade: enfoque psicodinâmico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996. FOUCAULT, M Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Graal, 1982. GARCIA, W. Corpo, mídia e representação: estudos contemporâneos. São Paulo: Thomson, 2005. HOFF, T. O corpo imaginado na publicidade. Cadernos de Pesquisa - ESPM - Escola Superior de Propaganda e Marketing, São Paulo, n. 1, jun., p. 9-64, 2005. 54 MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1996. MEYER , D. E. ; SOARES, R. F. R. Corpo, Gênero e Sexualidade nas práticas escolares: início de reflexão. In: ______ ;______. (Org.). Corpo, Gênero e Sexualidade. Porto Alegre: Mediação, 2004, p. 5-16. RAPPAPORT, C. R. Teorias do desenvolvimento: a idade escolar e a adolescência. São Paulo: EPU, 1981. REVISTA TODATEEN. Bauru: Alto Astral, v. 11, n.123, fev. 2006. REVISTA TODATEEN. Bauru: Alto Astral, v. 11, n.131, out. 2006. REVISTA TODATEEN. Bauru: Alto Astral, v.12, n.135, fev. 2007. ROSA, G. O corpo feito cenário. In: MEYER , D.; SOARES, R. F. R. (Org.). Corpo, Gênero e Sexualidade. Porto Alegre: Mediação, 2004. p. 17-30. SANTOS, L. L.; HOFF, T. Da cronobiologia aos neurocosméticos: o advento do corpomídia no discurso publicitário da beleza. In: Reunião da Compós,15., 2006, Bauru. Anais... Bauru, jun. 2006. versão digital. 55 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura EXPANSÃO TECNOLÓGICA E INTERAÇÕES INTERCULTURAIS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES DO PROJETO TELETANDEM BRASIL PARA A APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS1 Ana Cristina Biondo Salomão2 RESUMO A expansão tecnológica, advinda das novas ferramentas de comunicação da Internet, nos fornece a possibilidade de contato com pessoas de diferentes países e culturas de maneira rápida e em uma escala que antigamente nos parecia impraticável. Tal possibilidade altera sensivelmente nossas relações sociais e a maneira como vemos e interpretamos o mundo em que vivemos, uma vez que o acesso a outros povos e culturas traz a oportunidade de vivenciarmos interações interculturais que seriam dificultadas sem grande deslocamento geográfico. Os impactos trazidos geram questionamentos de ordem sociocultural que se refletem em questões a serem discutidas no âmbito do ensino de línguas. Este artigo relata um pouco da experiência de interação intercultural no “Projeto Teletandem Brasil: línguas estrangeiras para todos”, um projeto de pesquisa educacional na área de ensino de línguas estrangeiras à distância da UNESP, campus de São José do Rio Preto e Assis, que tem o objetivo de colocar alunos universitários brasileiros (interagentes brasileiros) em contato com alunos universitários estrangeiros (interagentes estrangeiros) para aprenderem as línguas um do outro por meio dos recursos de escrita, áudio e vídeo de programas computacionais de mensagens instantâneas (como o MSN Messenger, o Skype, o ooVoo, entre outros), sendo estes supervisionados por alunos de pósgraduação, doutorandos e mestrandos (mediadores). Palavras-chave: Ensino de línguas. Novas tecnologias. Teletandem. Interação intercultural. 1 INTRODUÇÃO As novas ferramentas tecnológicas ligadas ao computador e à Internet vêm surgindo a cada dia e se aperfeiçoando com grande rapidez, agora principalmente relacionadas à possibilidade de comunicação síncrona com recursos 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. Este artigo está vinculado ao projeto de pesquisa temático FAPESP “Teletandem Brasil: línguas estrangeiras para todos”, processo 20006/03204-2, e ao auxílio à pesquisa FAPESP “A cultura e o ensino de língua estrangeira: perspectivas para a formação continuada no projeto Teletandem Brasil ”, processo 2009/15071-5. 2 Mestrado em Estudos Lingüísticos pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil(2008). Trabalha no Teletandem news . 56 de vídeo e voz, o que tende a trazer também para as relações de ensino e aprendizagem novas possibilidades de interação oral com falantes da língua alvo. Recursos de comunicação síncrona por meio de chat e assíncrona por e-mail ganharam bastante espaço no ensino de línguas estrangeiras nos últimos anos, tendo sido utilizados de maneira sistemática ou não-sistemática dentro da sala de aula. Eles contribuíram também para o surgimento de propostas de ensino e aprendizagem colaborativos, envolvendo um par de aprendizes ou professor e aprendiz, em relação de colaboração para aprendizagem à distância, como é o caso do projeto Teletandem Brasil. O projeto “Teletandem Brasil – Línguas Estrangeiras para todos” é uma parceria de unidades da UNESP (Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho), campus de São José do Rio Preto, de Assis, com os departamentos de Língua Portuguesa de várias instituições superiores internacionais, que traz em seu bojo uma agenda educacional que abrange as áreas de ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras assistidos por computadores e de desenvolvimento de professores para este meio de aprendizagem virtual, proporcionando aos alunos o contato com línguas e culturas estrangeiras, além do estabelecimento de parcerias, amizades e trocas de informações culturais entre ambas as partes. O projeto se iniciou em 2006 com as seguintes línguas: português, espanhol, inglês, italiano e francês. A modalidade de ensino e aprendizagem utilizada pelos pares de alunos estrangeiros é a modalidade de tandem, um modo colaborativo de aprender, no qual duas pessoas que falam línguas diferentes se reúnem para mutuamente ensinar e aprender um a língua do outro. Neste artigo, apresentamos o projeto teletandem, retomando os conceitos da aprendizagem colaborativa de línguas, assim como as origens da aprendizagem em tandem. Trazemos, ainda, alguns dos resultados das pesquisas conduzidas até o presente momento. 2 A APRENDIZAGEM COLABORATIVA Desde meados dos anos 80, os estudos na área de ensino e aprendizagem de línguas têm mostrado uma nova perspectiva de ensino centrado no aluno e não mais na figura do professor, e o desenvolvimento de atividades que promovam a interação e negociação de significados, bases do ensino colaborativo (CRANDALL, 57 2000). Segundo Figueiredo (2006, p.17), vários estudos e pesquisas têm sido feitos sobre a aprendizagem de línguas colaborativa, tais como Benado e Testut (1991), Nunan (1992), Nyikos e Hashimoto (1997), e seus próprios (FIGUEIREDO, 2001, 2002, 2003), que constataram que “a interação não ajuda apenas os alunos menos experientes; ela leva também os mais experientes a descobrir novas formas de aprender”. Quanto aprendizagem aos benefícios da aprendizagem colaborativa para a de línguas, Crandall (2000) afirma que ela desenvolve aspectos afetivos positivos, tais como redução da ansiedade, aumento de motivação, facilitação do desenvolvimento de atitudes positivas frente à aprendizagem em geral, o fomento de auto-estima, assim como apoio a distintos estilos de aprendizagem. Figueiredo (2006), basendo-se em Tinzmann et al. (1990), High (1993), Aoki maximizar (1999) a produção significativas, promover aprendizes e ao Gaith (2002), lingüística do maior assevera ainda aprendiz, por negociação de que meio significado ela de por tende a interações parte dos tentarem comunicar-se e entender-se mutuamente, além de ajudar a diminuir a ansiedade dos aprendizes de expressarem-se na língua alvo e favorecer o compartilhamento de conhecimento ao invés de transmissão. Para Kohonen (1992), o trabalho colaborativo deve incentivar a interdependência positiva entre os aprendizes, para que trabalhem juntos para o beneficio mútuo. O autor baseia-se em Johnson e Johnson (1987, 1989), Johnson et al. (1990) e Brandt (1987) para explicitar cinco fatores necessários para o sucesso de uma empreitada colaborativa na aprendizagem: interdependência positiva – trabalho em conjunto e preocupação com a aprendizagem do outro; contribuição ativa e resultados individuais e conjuntos; interação verbal face-a-face em abundância; habilidades sociais para lidar com a comunicação e o conflito; e reflexão em grupo, para avaliar periodicamente o que foi aprendido, o quão bem eles estão trabalhando juntos e como podem melhorar. Os fatores explicitados por Kohonen (op.cit.) refletem os princípios e procedimentos tandem), da aprendizagem uma modalidade de colaborativa em regime de tandem ensino e aprendizagem de línguas, (in- praticada principalmente na Europa desde 1960, que envolve pares de falantes nativos de 58 diferentes línguas trabalhando de forma colaborativa para aprenderem a língua um do outro (CZIKO; PARK, 2003), que será explicitada a seguir. 3 A APRENDIZAGEM COLABORATIVA EM REGIME DE TANDEM Tandem é nome dado àquelas bicicletas que possuem dois bancos e dois conjuntos de pedais, na qual os dois usuários de tal veículo devem trabalhar em conjunto para que consigam atingir o objetivo de fazê-la andar. No caso do ensino e aprendizagem, essa relação se torna também colaborativa, exigindo trabalho em conjunto, uma vez que cada um dos parceiros torna-se aprendiz da língua estrangeira do outro e tutor (professor, guia) de sua própria língua. Originalmente, segundo Vassallo e Telles (2006), a concepção de aprendizagem in- tandem surgiu na Alemanha nos anos 60 e baseou-se na promoção de parcerias entre aprendizes de que falavam idiomas diferentes, línguas estrangeiras, visando a aprendizagem da língua uns dos outros. Os autores explicam que foi somente na década de 1970, na Espanha, que o nome Tandem passou a ser usado da maneira como é feito hoje para denominar esse modo de aprendizagem de línguas, e a sistematização de seus princípios ocorreu realmente durante os anos de 1990. Segundo Panichi (2002) citando Brammerts (1996) do ponto de vista teórico, os princípios fundamentais que subjazem a parceria dos aprendizes em regime de tandem são: o princípio da igualdade (ou bilingüismo), da reciprocidade e da autonomia. O princípio da igualdade estabelece que as sessões de tandem devem ser compostas de duas partes, e cada participante da parceria deve comprometerse a usar a língua estrangeira, da qual ele é aprendiz, e sua língua materna, mas nunca em uma mesma sessão. Segundo Vassallo e Telles (2006), as línguas não podem ser misturadas, e, por isso, os autores chamam este princípio de separação das línguas. Deste modo, cada um dos aprendizes deve beneficiar-se da parceria de maneira igual, por meio da garantia da mesma duração de tempo para a prática das duas línguas, assim como da oportunidade de aprendizagem e exploração de ambas as culturas envolvidas, o que caracteriza também a reciprocidade envolvida na parceria. Esse princípio está ligado à contribuição ativa e aos resultados individuais e conjuntos que devem ser 59 obtidos dentro de uma relação de aprendizagem colaborativa de sucesso, mencionados por Kohonen (1992). Os princípios da autonomia e da reciprocidade juntos estabelecem que cada aluno será responsável por seu próprio processo de aprendizagem e pela aprendizagem do outro, e ambos devem trabalhar em conjunto para delimitarem seus objetivos e escolherem quais serão os melhores métodos para alcançá-los – a interdependência positiva de Kohonen (op.cit). Little (2003) afirma que os princípios da reciprocidade e da autonomia no tandem só fazem sentido se existirem conjuntamente, uma vez que o propósito da parceria não será alcançado a não ser que ambos os parceiros se comprometam com sua própria aprendizagem e com a aprendizagem do outro. Para o autor, a autonomia deriva de uma dinâmica complexa entre a interação social e a metacognição. Schwienhorst (1998) afirma que o princípio da autonomia ajuda o aprendiz a refinar sua percepção dos processos de aprendizagem de língua, ajudando-o a planejar, monitorar e avaliar sua aprendizagem. Assim, por se tratar de um processo recíproco de ensino colaborativo, ele deverá também observar o processo de aprendizagem de seu parceiro. Encontramos em Souza (2006) a visão bastante esclarecedora de Brammerts (1996), sobre princípio da reciprocidade e sua relação com o ensino colaborativo: Para Brammerts (1996), o princípio da reciprocidade delineia um conjunto de atitudes que devem ser esperadas dos participantes de uma parceria em tandem. O autor menciona a disposição ao apoio mútuo e à dependência recíproca no processo de aprendizagem das duas línguas; o interesse no sucesso do parceiro na aprendizagem da língua materna do participante; e o investimento de tempo e esforço em ações que tenham como objetivo a ajuda efetiva ao parceiro, para que o sucesso na aprendizagem seja alcançado. O princípio da reciprocidade é uma explicitação da dimensão essencialmente colaborativa da aprendizagem em tandem (SOUZA, 2006, p. 258). Vemos, desse modo, que a aprendizagem em tandem caracteriza-se pelo fato de ser, simultaneamente, uma experiência de aprendizagem fundamentalmente colaborativa (SOUZA, 2006). Vassallo e afirmam que uma autônoma, mas Telles (2006) das peculiaridades da aprendizagem em tandem é sua forte associação com as dimensões individual e social da aprendizagem de uma língua 60 estrangeira. 4 MODALIDADES DE TANDEM No que tange às modalidades do tandem, inicialmente, ele surgiu como tandem face-a-face, realizado de modo presencial, com os parceiros se reunindo em um mesmo espaço físico para realizarem suas atividades de ensino e aprendizagem. Com o surgimento dos avanços tecnológicos da comunicação eletrônica (telefone, e-mail, mensagem de voz, e chats da internet), uma nova modalidade foi desenvolvida, o e- tandem (ou tandem a distância), permitindo que os pares se comuniquem através de espaços físicos e geográficos diferentes para realizarem as atividades de ensino e aprendizagem. Vassallo e Telles (2006) afirmam que no Brasil o tandem foi escassamente praticado em sua modalidade face-a-face, devido a dificuldades de encontros entre falantes nativos de diferentes línguas e de mobilidade por diferentes países, como ocorre na Europa, onde o Tandem surgiu e se tornou bastante popular, especialmente em contextos acadêmicos. Os autores afirmam, entretanto, que a expansão da Internet e do uso de emails para a comunicação entre as pessoas trouxeram popularidade ao regime de tandem para ensino de línguas mediado por computador no país e que os avanços tecnológicos da comunicação síncrona abriram novas possibilidades de interação para sessões de tandem a distância: Esta forma de tandem (a distância) se tornou mais conhecida no Brasil também nos últimos anos (De Oliveira, 2003; De Carvalho, 2004; Souza, 2003; Souza, 2004; Marques & Zahumensky, 2005), mas ela está restrita ao meio escrito; ela exclui a complexidade da oralidade e não pode desenvolver a forma mais natural, complexa, útil e comum de interação – comunicação áudio-visual. Hoje em dia, entretanto, novas tecnologias estão gerando acesso e possibilidades de sessões de tandem que lembram as características comunicativas de seu irmão mais velho, o original tandem face-a-face (VASSALLO; TELLES, 2006, p. 109). Vassallo e Telles (2006) afirmam que o currículo do tandem emerge das necessidades e envolvimento dos parceiros. Segundo os autores, o contexto de aprendizagem em tandem oferece oportunidade para a socialização e a individualização, uma vez que é baseado em uma autonomia que é entendida 61 como a responsabilidade pela tomada de decisões, não isoladamente, mas ‘com’ e ‘em relação ao outro’ (parceiro de tandem). Os autores também asseveram que tal contexto traz à tona questões sobre o compartilhamento e o controle dos papéis dentro da relação dos parceiros, o que traz implicações sobre quem detém o poder do conhecimento. Eles acreditam que a inversão de papéis entre os parceiros (aluno da língua estrangeira e professor de sua língua nativa - ou de uma língua em que seja proficiente) pode gerar uma simetria global, que é proveniente da neutralização causada na assimetria existente geralmente entre esses papéis uma vez que ambos os parceiros farão os dois durante uma sessão de tandem: Por um lado, esta troca de papéis pode diminuir as conseqüências negativas da assimetria entre o falante mais proficiente e o menos proficiente; uma assimetria que pode induzir sentimentos de inferioridade, dinâmicas de poder, medo de errar, timidez (Hehrfurt, 1992: 212; RostRoth, 1991:36). Por outro lado, essa troca de papéis pode funcionar como mantenedora dos aspectos positivos desta assimetria, tais como apoio cognitivo e afetivo ao aprendiz oferecido pelo falante porficiente, dentro da suposta zona de desenvolvimento proximal (Vygotsky, 1978). O filtro afetivo do aprendiz, em termos Krashenianos (1985), poderia ter menor probabilidade de subir dentro deste contexto, devido à cumplicidade induzida pelo equilíbrio dos papéis (VASSALLO; TELLES, 2006, p. 98). Para os autores, se confirmada por meio de resultados empIricos, essa simetria global pode ser um dos elementos mais originais do tandem, distinguindo-o até mesmo de outras modalidades de aprendizagem colaborativa. Outra caracterIstica importante da parceria em tandem para Vassallo e Telles (op.cit) é o potencial para promover interaçào intercultural prazerosa, uma vez que tal forma de interaçào geralmente envolve a participaçào espontânea. Pelo fato de ser um contexto de troca interpessoal e intercultural, naturalmente emergem curiosidades e envolvimento entre os parceiros, e, como em qualquer forma de interaçào, pode haver sentimentos e emoçöes prazerosos, como o senso de humor, mas também nào se pode descartar sentimentos negativos como irritaçào, raiva e tensào. Segundo os autores, os sentimentos e sensaçöes decorrentes das interaçöes podem afetar a aprendizagem em Tandem e mais pesquisas ainda precisam ser conduzidas enfocando tal assunto. O quadro seguinte sintetiza as principais diferenciaçöes entre uma conversa informal, ou bate-papo, e uma interaçào em tandem, segundo Vassallo e Telles (op.cit): 62 CONVERSAS INFORMAIS INTERAÇÕES EM TANDEM > > ocasional > geralmente nào pré-planejada em relaçào a estruturaçào > nào ha comprometimento encontros regulares > pode haver um planejamento, como uso de tarefas, ou divisào da sessào em partes especIficas > compromissos com os encontros > geralmente sem propósitos linguIsticos > preocupaçào com o conteido > as interaçöes apresentam objetivos culturais e linguIsticos > preocupaçào com conteido, forma e uso > geralmente nào ha feedback > ha feedback linguIstico e cultural constante linguIstico > o objetivo geralmente é o sucesso > o objetivo é o desenvolvimento da da interaçào competência linguIstico-comunicativa e cultural dos participantes Quadro 1: Diferenças entre conversas informais e interaçöes em tandem Em relaçào a preocupaçào com conteido, forma e uso de uma interaçào em tandem, os autores alertam para a dificuldade de se desempenhar tal tarefa, uma vez que quando interagimos com outras pessoas estamos mais focados naquilo que a pessoa diz e nào em como ela diz. No tandem, os parceiros devem prestar atençào a todos esses nIveis uma vez que sua intençào dentro da relaçào é ensinar e aprender colaborativamente, e nào apenas conversar. No que tange a afirmaçào de que tandem nào é auto-estudo, os autores afirmam que conceitos errôneos de autonomia podem levar a concepçào de aprendizagem em tandem como algo individual. No entanto, a ênfase do tandem é na aprendizagem colaborativa, na qual os aprendizes agem como em uma equipe e as açöes de um estào interligadas as do outro, e Telles (2006), alguns estudos chamam de o que, segundo Vassallo interdependência colaborativa (DEUTSCH, 1949, 1962) ou interdependência positiva (JOHNSON et al., 1991; JOHNSON; JOHNSON, 1998b). Os autores trazem os elementos necessarios para a interdependência positiva segundo Johnson e Johnson (1998a), a saber: substitutabilidade – as açöes de uma pessoa substituem as açöes de outra; catexia – concentraçào de todas as energias mentais sobre uma conteido, uma inducibilidade – sequência abertura de para representaçào pensamentos influências; bem precisa, ou encadeamento e seus de um atos; efeitos: provimento e 63 recebimento de ajuda e assistência, troca de recursos e informaçöes, provimento e recebimento de feedback em trabalhos conjuntos, aumento de esforços, influência mitua sobre o raciocInio e o comportamento do outro. Tais caracterIsticas, segundo os autores, podem ser encontradas em contextos de aprendizagem em tandem, mas nào em situaçöes de auto-estudo. As razöes dos autores para diferenciar uma sessào de tandem de uma aula particular se centram nos seguintes aspectos, sintetizados no quadro a seguir: AULA PARTICULAR TANDEM > assimetria das interaçöes – professor x > troca de papéis aluno > pagamento dos serviços do professor > troca de conhecimentos > conteúdo e conhecimento pedagógico estão associados a figura do professor > ambos detêm conteúdo e conhecimento para compartilhar Quadro 2: Diferenças entre aula particular e tandem No que tange ainda as modalidades de tandem, no entanto em relaçào ao contexto em que ocorre, ele pode ainda ser feito de maneira independente ou atrelado a alguma instituiçào. Deste modo, pode haver, segundo Vassallo (2006): o tandem institucional, realizado dentro de instituiçöes como estabelecimentos de ensino médio ou elementar, escolas de idiomas, universidades, que o reconhecem e o promovem; o tandem semi- institucional, institucional somente para um dos dois participantes; e o tandem não institucional, desenvolvido fora de uma instituiçào, pelos dois participantes. Panichi (2002) nomeia o tandem com vInculos institucionais de tandem formal, e aquele nào vinculado, de tandem informal. No caso do tandem institucional ou formal, a literatura na area prevê algum tipo de assistência pedagógica por parte de um professor aconselhador, que sera responsavel pelo esquema pratico e teórico no qual o processo se desenvolvera. Trataremos mais detalhadamente este assunto na seçào seguinte. 5 SESSÕES DE ACONSELHAMENTO NO TANDEM Autores como Little (2003), Brammerts, Calvert e Kleppin (2003), Stickler 64 (2003) apontam para a necessidade de sessöes de aconselhamento para participantes de uma parceria em tandem de aprendizagem colaborativa. A razào para isso, segundo os autores, é que apesar da motivaçào do aprendiz em realizar este tipo de trabalho, ele pode nào conseguir explorar totalmente o potencial que o contexto oferece. Deste modo, sào propostas sessöes de aconselhamento individual, feitas por uma pessoa cuja especialidade seja ensino e aprendizagem de lInguas (BRAMMERTS; CALVERT; KLEPPIN, 2003; STICKLER, 2003); sessöes de aconselhamento em pares (HELMLING, 2003), nas quais os próprios participantes aconselham outros participantes, de diferentes parcerias, e uso de diarios semiestruturados que fomentem a autonomia (WALKER, 2003). Por serem as que mais nos interessam no contexto da pesquisa, trataremos mais detalhadamente as propostas de aconselhamento individual. Estas, segundo os autores que as propöem, visam a individualizaçào, uma caracterIstica da aprendizagem em regime de tandem, e devem incentivar os alunos a usar suas próprias habilidades para aprender de maneira independente, a refletir sobre seus processos de aprendizagem, decidindo seus objetivos e continuamente revisando-os, e a avaliar seu progresso na aprendizagem (BRAMMERTS; CALVERT; KLEPPIN, 2003; STICKLER, 2003). Brammerts, Calvert e Kleppin (2003) afirmam que o aconselhamento é necessario uma vez que, apesar de capazes de perceber os fatores que devem utilizar para tomar decisöes, como objetivos, habitos, oportunidades, preferências, muitos aprendizes provavelmente nào estào conscientes sobre eles conjuntamente, o que dificulta uma visào geral da interaçào de tais fatores. Os autores afirmam ainda que nem sempre é facil para estes aprendizes traduzir suas decisöes em açöes, e fazem uma proposta de aconselhamento que se assemelha em alguns pontos a uma proposta reflexiva de supervisào, principalmente no que tange a busca pela autonomia do aprendiz. Segundo tal proposta, o aconselhador deve se colocar como um parceiro de discussào, para quem o aprendiz possa apresentar suas decisöes e com quem ele se comprometa a agir baseando-se nestas. Ele deve formular perguntas que possam elicitar questöes e fatores pessoais do aprendiz relevantes para sua tomada de decisöes, tanto a respeito de seus pressupostos quanto em 65 relaçào a mudanças ja ocorridas dentro da pratica, ajudando-o a fazer conexöes por meio da introduçào de seu conhecimento de especialista e experiências, sem, entretanto, direcionar a pratica do aprendiz. Os autores propöem, ainda, que o dialogo estabelecido entre aconselhador e aprendiz siga uma abordagem humanista, cujas caracterIsticas sào: aceitaçào incondicional e estima positiva para com o aprendiz, empatia, autenticidade, congruência e transparência. Entretanto, eles afirmam que, para que as sessöes sejam conduzidas de modo a trazer a tona os pressupostos trazidos no texto, deve haver treinamento do aconselhador. A proposta dos autores mescla treinamento e reflexào tanto para os aconselhadores quanto para os aprendizes, e é composta de três estagios, os quais devem ser seguidos durante o aconselhamento: 1 – esclarecimento de desejos e objetivos (o que envolve a analise de experiências anteriores de aprendizagem e do nIvel de proficiência na lIngua alvo), 2 – esclarecimento de abordagens de aprendizagem especIficas (fornecimento de embasamento teórico que possa informar as decisöes dos aprendizes em relaçào a ensino e a aprendizagem), 3 – identificaçào dos próximos passos e preparaçào para auto-avaliaçào (tomada de decisöes e avaliaçào dos procedimentos usados, que devem ocorrer na sessào seguinte). A proposta de Stickler (2003) envolve também aspectos ligados ao aconselhamento que leve o aprendiz a autonomia, por meio da exploraçào e da reflexào. Ela traz uma lista de sugestöes sobre o que o aconselhador deve ou nào fazer, geralmente voltadas a comportamentos nào direcionadores, e sim exploratórios das atitudes e açöes do aprendiz, afirmando, ao final, em uma visào mais pragmatica, que tais habilidades só serào compreendidas e aperfeiçoadas pelo aconselhador na pratica. A autora afirma, ainda, que aspectos de ordem psicológica devem ser compreendidos como muito importantes no estabelecimento da relaçào entre aconselhador e aprendiz, entre os quais estào: a busca de um lugar tranquilo e sem interrupçöes, que possam fazer com que o aprendiz se sinta confortavel e bem-vindo, a reserva de tempo, pelas mesmas razöes do item anterior, e o provimento de materiais de apoio, como fichas de atividades, recursos da Internet, livros, entre outros, que possam ajudar o aprendiz a organizar sua aprendizagem fora das sessöes de tandem. Por causa de todas as caracterIsticas aqui explicitadas, o tandem nos 66 parece um contexto que traz elementos relevantes para o campo de ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras. Para os professores, ele oferece a possibilidade de colocar seus estudantes em contato natural com um falante proficiente ou nativo da lIngua estrangeira, com metas pessoais e diretas de interaçöes, assim como a oportunidade de implementar temas pedagógicos desafiadores, tais como a aprendizagem colaborativa e a autonomia do aprendiz em um contexto de uso efetivo da lIngua. Para os pesquisadores de LinguIstica Aplicada, trata-se de um novo contexto para a observaçào da aquisiçào de segunda lIngua, bem como a oportunidade de estudar aprendizes num contexto natural, criativo e comunicativo (VASSALLO; TELLES, 2006). Vejamos a seguir a proposta de tandem a distância configurada no projeto Teletandem. 6 O TELETANDEM A modalidade de Teletandem, proposta por Vassallo e Telles (2006) e Telles e Vassallo (2006), adotada no projeto Teletandem Brasil: línguas estrangeiras para todos, no qual esta pesquisa se encontra inserida, sugere que os parceiros de tandem façam uso do aspecto oral (falar e ouvir) e do aspecto escrito (escrever e ler), por meio de chats e conferências em audio e vIdeo, utilizandose de comunicadores eletrônicos sIncronos – aplicativos encontrados na Internet que disponibilizam recursos que permitem que o usuario interaja com outra pessoa, por meio do computador, em tempo real – ja explicitados anteriormente. Telles e Vassallo (2006) contam que a idéia dessa nova modalidade de tandem surgiu quando, após algum tempo praticando tandem face-a-face no Brasil, Vassallo teve que voltar para a Italia, e assim ambos tiveram que buscar novas formas para estabelecer comunicaçào. A princIpio, optaram pelo e-tandem, via email. Entretanto, sentiam falta da interaçào oral, visto que este meio somente possibilitava a produçào escrita e a leitura. Sua busca os levou as ferramentas de comunicaçào instantânea na Internet, como o MSN Messenger, ou em sua versào mais atual o Windows Live Messenger. Os autores afirmam que ao testarem essa ferramenta para a aprendizagem em tandem entre si e com amigos, notaram que os resultados foram divertidos, praticos, e, acima de tudo, de baixo custo. Assim, surgiu o projeto Teletandem Brasil: Línguas estrangeiras 67 para todos, com o intuito de investigar as ramificaçöes do modo de aprendizagem que estavam experimentando e seus possIveis resultados para a educaçào. Segundo Telles e Vassallo (2006), o Teletandem possui as mesmas caracterIsticas e princIpios da aprendizagem em regime de tandem, ja detalhadas na seçào anterior, a nào ser pela diferença que o tandem face-a-face é restrito a pessoas que se encontram no mesmo local geografico e o e-tandem esta confinado as habilidades de leitura e escrita, enquanto que o Teletandem conjuga as quatro habilidades, falar, escutar, ler e escrever, sem que as pessoas estejam necessariamente no mesmo local. Em sua busca por uma definiçào do que seja o Teletandem, Telles e Vassallo (2006, p. 193-194) colocam os seguintes princIpios que o caracterizam: 1 – Teletandem é uma nova modalidade de aprendizagem de lInguas estrangeiras em regime de tandem a distância mediada por computador que faz uso da comunicaçào oral e escrita espontâneas, assim como da leitura e das imagens dos participantes por uma webcam. 2 – Os procedimentos do Teletandem sào feitos com base na concordância mitua e compartilhada dos princIpios da autonomia e reciprocidade. 3 – Os participantes de Teletandem estào interessados em estudar a lIngua do parceiro de forma relativamente autônoma (o termo é usado, segundo os autores, uma vez que eles podem usufruir da ajuda de um professor mais experiente, o mediador, se quiserem ou precisarem). 4 – Os participantes de Teletandem sào falantes (razoavelmente) competentes das respectivas lInguas. Eles podem ou nào ser falantes nativos da lIngua alvo. Eles nào sào professores profissionais. 5 – O ensino e a aprendizagem no Teletandem sào processos que se dào por meio do desenvolvimento de sessöes regulares e com fins didaticos em conversaçöes de audio e vIdeo a distância. 6 – Estas conversaçöes livres sào seguidas de uma reflexào compartilhada, que pode focar em conteido, cultura, forma, léxico e o processo da interaçào de Teletandem em si. Pode haver também a realizaçào de tarefa, em forma de leitura e escrita, enviadas por e-mail. Segundo os autores, é essa sexta caracterIstica, por seu enfoque em uma reflexào sobre a lIngua, o ensinar e o aprender, que diferencia o Teletandem de um bate-papo informal. Os princIpios da autonomia e reciprocidade, ja revisados na seçào em que se tratou da aprendizagem em regime de tandem, também fazem parte dos princIpios norteadores da relaçào dentro do Teletandem. 6.1 INTERAÇÃO E MEDIAÇÃO NO TELETANDEM Baseando-se em suas experiências pessoais como praticantes de Teletandem, Telles e Vassallo (2006) também propuseram algumas diretrizes para 68 uma sessào de Teletandem, denominada dentro do projeto de ‘interaçào’. Tais diretrizes aconselham que: a sessào seja composta de duas horas, uma para cada lIngua (feitas no mesmo dia, ou em dias separados), sendo cada hora composta das seguintes fases: >conversaçào sobre um ou varios assuntos (cerca de 30 minutos): os parceiros falam sobre algo que seja de interesse comum, e o participante 1 (falante nativo ou proficiente) presta atençào no que seu parceiro diz e em ‘como’ ele diz, tomando notas acerca daquilo que é dito, como possIveis desvios de gramatica, impropriedades lexicais, de uso e de pronincia que ele sinta que comprometem a comunicaçào e que necessitam ser trabalhados com o seu parceiro; > feedback linguIstico (cerca de 20 minutos): este é o momento da sessào no qual o participante 1 usara as anotaçöes feitas durante a interaçào nos primeiros trinta minutos com atividades de ensino e aprendizagem, nào por meio de longas explicaçöes gramaticais, mas sendo objetivo e focando nos aspectos por ele levantados, de preferência; > reflexào compartilhada na sessào (aproximadamente 10 minutos): o participante 1 pode nesta parte perguntar ao parceiro-aluno como ele se sentiu ao falar a lIngua-alvo, atentando aos sentimentos de seu parceiro e suas dificuldades. Após o parceiro-aluno (participante 2) ter expressado seu ponto de vista acerca de seu desempenho durante a conversaçào, o parceiro-professor (participante 1) pode fazer breves comentarios sobre o mesmo, buscando ser encorajador, ressaltando os pontos positivos e esforços do parceiro. Os autores chamam a atençào para que se evite comparaçöes entre os desempenhos de ambos, para que nào se gere uma competitividade, algo que nào deve existir em uma modalidade de aprendizagem colaborativa como o Teletandem. Para eles, a oportunidade de compartilhar reflexöes sobre a sessào é um momento importante no qual se podem rever acordos comuns e construir uma identidade de equipe, no sentido de que os parceiros possam falar sobre como desejam que sua história de aprendizagem em tandem se desenrole. Em relação a ferramenta utilizada para estabelecer a comunicaçào entre os parceiros, os autores afirmam que a princIpio propuseram o MSN Messenger ou Windows Live Messenger, ja referido na seçào anterior, devido aos recursos oferecidos por ele: conferências por audio e vIdeo, chat, envio de arquivos (por meio de uploads e downloads feitos dentro do próprio programa), quadro de comunicaçöes (uma espécie de lousa compartilhada, que se abre para ambos os parceiros, na qual podem escrever ou desenhar). Trazemos, a seguir, na figura 1, retirada de Telles e Vassallo (2006), a tela do MSN em uma interaçào de Teletandem. Á esquerda, os dois parceiros utilizam-se dos recursos de audio, vIdeo e chat, simultaneamente, enquanto que, a direita, eles fazem uso audio e vIdeo e do quadro de comunicaçöes. 69 Figura 1 - Tela do MSN Messenger durante uma interaçào de Teletandem (retirada de Telles e Vassallo, 2006, p.198). Os autores afirmam que o Teletandem nào precisa ser necessariamente praticado no MSN comunicaçào Messenger, citando também outras ferramentas de instantânea existentes na Internet, ja citadas na seçào anterior, mas que, no entanto, o projeto foi inicialmente proposto fazendo uso de tal aplicativo devido aos recursos que ele apresenta. O projeto Teletandem Brasil: línguas estrangeiras para todos surgiu, segundo Telles e Vassallo (2006), das reflexöes dos autores sobre suas experiências de aprendizagem nesta modalidade e das pesquisas conduzidas por ambos sobre elas: Enquanto progredIamos em nossa reflexào conjunta, percebIamos que um Teletandem entre dois linguistas aplicados seria bastante diferente de um entre professores de lInguas pré-serviço e ainda mais diferente entre dois estudantes que viessem de outras areas do conhecimento. A necessidade de apoio e/ou mediaçào de um professor de lInguas estrangeiras para o iltimo grupo de estudantes estava, entào, clara para nós. Portanto, pensamos que um projeto de pesquisa coerente e abrangente deveria contemplar, pelo menos, três dimensöes, no que concerne ensino e aprendizagem dentro do Teletandem: (a) a dimensào do papel das novas ferramentas tecnológicas no processo de ensino e aprendizagem (o papel do Windows Live Messenger como ferramenta pedagógica); (b) a dimensào da aprendizagem em Teletandem e (c) a dimensào do ensino, aconselhamento e/ou mediaçào no processo do Teletandem (TELLES; VASSALLO, 2006, p. 203-204). Assim, o projeto Teletandem Brasil tem o objetivo de colocar alunos universitarios brasileiros (interagentes brasileiros) em contato com alunos universitarios estrangeiros (interagentes estrangeiros) para aprenderem as lInguas um do outro, por meio dos recursos de audio e vIdeo do programa computacional MSN Messenger, como dito anteriormente, sendo estes supervisionados por 70 alunos de pós-graduaçào – mestrado e doutorado – da UNESP e pelos professores das universidades estrangeiras conveniadas (mediadores). A funçào dos mediadores sera estudada durante o decorrer do projeto, sendo, em particular, o enfoque desta pesquisa. Tal figura dentro da relaçào de Teletandem foi sugerida devido as propostas de aconselhamento dentro do regime de ensino e aprendizagem de tandem, ja revisadas anteriormente. A originalidade e as peculiaridades do contexto de Teletandem, segundo Telles e Vassallo (op.cit), fazem com que seja difIcil concebê-lo da mesma maneira que os processos de aprendizagem em salas de aula tradicionais, como podemos ver no seguinte excerto: No projeto Teletandem Brasil, o ensino é concebido como uma mediaçào e um suporte da atividade. Conforme o projeto evoluir, seus princIpios e praticas ainda devem ser definidos de acordo com suas bases teóricas. Esperamos que a pesquisa sobre a mediaçào dentro do contexto de Teletandem aumentara nosso conhecimento sobre autonomia na aprendizagem e aprofundara nosso entendimento desse conceito (TELLES; VASSALLO, 2006, p. 204). Dessa forma, o projeto pesquisa formas alternativas de suporte pedagógico aos praticantes de Teletandem, e, para tal, estào envolvidos os departamentos de Língua Portuguesa das universidades estrangeiras conveniadas e a equipe de pesquisadores formada pelos coordenadores do projeto Teletandem, doutorandos e mestrandos da UNESP. Acreditamos que o ambiente virtual de ensino e aprendizagem colaborativo estudado no projeto, por sua inovaçào, podera trazer a tona diferentes nuances existentes dentro da formaçào do professor de lInguas, ajudando-nos a compreender aspectos da interaçào entre supervisor e aluno-professor, assim como da relaçào entre componentes teóricos e praticos existentes em tal formaçào. No contexto do projeto, a pesquisa tem três objetivos: (1) verificar o uso do aplicativo MSN Messenger como instrumento pedagógico para o ensino de lInguas in- tandem a distância; (2) verificar as caracterIsticas linguIsticas, culturais e pedagógicas da interaçào entre os pares de aprendizes; e (3) verificar o papel do professor-mediador em um contexto em ensino e aprendizagem de lInguas estrangeiras, como o teletandem mediado pelo MSN Messenger. Dentre os resultados ja encontrados, destacamos as seguintes asserçöes levantadas nas pesquisas (TELLES, 2008): 71 1- No contexto Teletandem, uma multiplicidade de crenças dos interagentes, originadas em diferentes contextos culturais e educacionais, interagem, sào construIdas ou mesmo reconstruIdas. 2- A diversidade de crenças, muito evidente na interaçào a dois, pode ser geradora de conflitos e ter reflexos negativos no processo de ensino e aprendizagem. 3- O mediador exerce um papel fundamental para promover a conscientizaçào e a reflexào dos interagentes sobre as crenças que emergem nas interaçöes. 4 - As crenças se movimentam ao longo do processo de ensino e aprendizagem, ou seja, crenças de inIcio convergentes, podem tornar-se divergentes, sendo o oposto também verdadeiro. 5 - As mediaçöes sào vistas positivamente pelos alunos-professores. Eles sentem-se seguros de ter alguém com quem conversar e discutir suas dividas e dificuldades. 6 - A atmosfera criada pelos mediadores e alunos-professores é descontraIda, amigavel e de colaboraçào. 7 - Os mediadores regularmente fazem uso de estratégias de mediaçào nào diretivas e alternativas. Estratégias (auto)exploratórias e colaborativas também sào empregadas. 8 - Os alunos-professores têm a oportunidade de experienciar sua profissào pela primeira vez com o apoio do mediador, que acompanha seu trabalho, o faz refletir e esta pronto para ajuda-lo em suas necessidades. 9 - A teoria introduzida pelo mediador a partir das necessidades pedagógicas do aluno-professor é relevante e significativa para ele. 10 - Os mediadores preparam suas sessöes de mediaçào com base nas interaçöes dos alunos- professores (visionamentos) e em seus diarios. Eles analisam a pratica do aluno-professor, selecionam pontos para discussào e, em alguns casos, sugerem leitura de textos teóricos. 11 - Os alunos-professores e os mediadores encaram um grande desafio ensinando, aprendendo e mediando a distância. 12 - Os participantes (alunos-professores) encontraram dificuldades para ensinar sua lIngua màe como lIngua estrangeira dentro desse novo contexto de ensino. 13 - Os princIpios do teletandem sào colocados em pratica ao longo do processo. 14 - O interagente estrangeiro é indiretamente mediado pelo mediador brasileiro. 15 - A pratica de mediaçào promove a reflexào e o desenvolvimento do mestrando ou doutorando que ocupa a funçào de mediador. 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS A modalidade de ensino e aprendizagem colaborativos em regime de Teletandem tem se mostrado bastante propIcia para a aprendizagem de lInguas estrangeiras, uma vez que os aprendizes de lIngua estrangeira têm a experiência de aprender uma lIngua estrangeira e ensinar sua própria lIngua nativa, o que os provê a oportunidade de olhar para a lIngua estrangeira pelo viés de sua própria língua, assim como voltar os olhos para sua própria lIngua pelo viés da lIngua estrangeira. Parece-nos que a aprendizagem de lInguas nesta modalidade esta diretamente 72 relacionada com a aprendizagem de cultura, o que pode propiciar a reflexào sobre temas culturais e gerar uma possIvel conscientizaçào da diferença do outro. Além disso, esta modalidade tem se mostrado um fértil campo para professores em formaçào inicial terem sua primeira pratica de ensino reflexiva (durante as interaçöes e as sessöes de mediaçào e ao escreverem diarios após as interaçöes e sessöes de mediaçào). Outro importante fator tem sido a descoberta e implementaçào de diferentes usos de recursos tecnológicos para a aprendizagem e para o ensino feitas pelos próprios interagentes com ou sem a ajuda de seus mediadores. Alguns dos desafios a serem enfrentados no projeto nos próximos anos serào o de conseguir um aumento na participaçào das instituiçöes estrangeiras, tanto no que tange ao envio de seus alunos para a pratica de teletandem quanto em relaçào a participaçào de pesquisadores dessas instituiçöes no projeto, apoiando e supervisionando os alunos participantes. ABSTRACT The technological advances, stemmed from the new communication tools in the Internet, provide us with the possibility of having contact with people from different countries and cultural backgrounds in a fast way and in large scale, which seemed impracticable in the past. Such possibility alters our social relations and the way that we see and interpret the world around us, once the access to different peoples and cultures brings along the opportunity for intercultural interactions that would be considered difficult without great geographical dislodging. The impacts of this generate sociocultural questions that are reflected in issues to be debated in the field of language teaching. This article reports the experience of intercultural interaction in the “Project Teletandem Brazil: foreign languages for all”, a research project in the area of language learning and teaching from UNESP, campus of São José do Rio Preto and Assis, which aims at establishing contact between Brazilian undergraduate students (Brazilian partner) and foreign undergraduate students (foreign partner) to learn and teach each other their languages through instant messengers (such as the MSN, Skype, ooVoo, among others), being supervised by graduate students (mediators). Keywords: Language teaching. New technologies. Teletandem. Intercultural interactions. REFERÊNCIAS BRAMMERTS, H. Autonomous language learning in tandem. In: LEWIS, T.; WALKER, L. (Ed.). Autonomous Language Learning In-Tandem. Sheffield, UK: Academy Electronic Publications, 2003. p. 27-36. 73 ______; CALVERT, M. Learning by communicating in tandem. In: LEWIS, T.; W A L K E R , L . ( E d . ) . Autonomous Language Learning In-Tandem. Sheffield, UK: Academy Electronic Publicationsp, 2003. p. 45-60. ______;______; KLEPPIN, K. Aims and approaches in individual learner counseling. LEWIS, T.; WALKER, L. (Ed.). Autonomous Language Learning InTandem. Sheffield, UK: Academy Electronic Publications, 2003. p. 123-130. CRANDALL, J. J. El aprendizaje cooperativo de idiomas y los factores afectivos. In: ARNOLD, J. (Ed.). La dimensión afectiva en el aprendizaje de idiomas. trad. Alejandro Valero. Edición española. Madrid: CUP, 2000. p.243-260. CZIKO, G. A.; PARK, S. Internet audio communication for second language learning: a comparative review of six programs. Language Learning & Technology, v. 7, n.1, p.15-27, 2003. FIGUEIREDO, F.J.Q. A aprendizagem colaborativa: algumas considerações conceituais e terminológicas. In: . A aprendizagem colaborativa de línguas. Goiânia: Editora UFG, 2006. p.11-45. HELMLING, B. Group work with peers: pairs advise pairs. In: LEWIS, T.; WALKER, L. (Ed.). Autonomous language learning in tandem. Sheffield, UK: Academy Electronic Publications, 2003. p.145-155. KOHONEN, V. Experiential language learning: second language learning as cooperative learner education.In: NUNAN, D. (Ed.). Collaborative language learning and teaching. Glasgow: CUP, 1992. p.14-40. LEWIS, T.The case for Tandem Learning. In: LEWIS, T.; WALKER, L. (Ed.). Autonomous Language Learning In-Tandem. Sheffield, UK: Academy Electronic Publications, 2003. p. 13-26. LITTLE, D. Tandem language learning and learner autonomy. In: LEWIS, T.;. WALKER, L. (Ed.). Autonomous Language Learning In-Tandem. Sheffield, UK: Academy Electronic Publications, 2003. p. 37-44. PANICHI, L. Tandem learning and language awareness. Materials from the ALA Tandem workshop, 2002. 74 SOUZA, R. A. Telecolaboraçào na aprendizagem de lInguas estrangeiras: um estudo sobre o regime de tandem. In: FIGUEIREDO, F. J. Q. A aprendizagem colaborativa de línguas. Goiânia: Editora UFG, 2006. p. 255-276. STICKLER, U. Student-centred counselling for tandem advising. I n: L EW I S , T . ; . W A L K E R , L. (Ed.). Autonomous language learning in tandem. Sheffield, UK: Academy Electronic Publications, 2003. p.115-122. SCHWIENHORST, K. Matching pedagogy and technology: tandem learning and learner autonomy in online virtual language environments. In: SOETAERT, R.; VAN BELLE, G. (Ed.). Language teaching on-line. Ghent: University of Ghent, 1998. p.115-127, TELLES, J. A.; VASSALLO, M. L. Foreign language learning in-tandem: Teletandem as an alternative proposal in CALLT. The ESPecialist, v.27, n. 2, p. 189212, 2006. TELLES, J.A. Projeto tematico: Teletandem Brasil: LInguas estrangeiras para todos. Relatório cientIfico de pesquisador principal relativo ao perIodo 30/04/200729/04/2008, 2008. Disponível em:<http://www.teletandembrasil.org/page.asp?Page=25>. Acesso em: 24 jun. 2009. VASSALLO, M. L.; TELLES, J. A. Foreign language learning in-tandem: Theoretical principles and research perspectives. The ESPecialist, v.27, n.1, p. 83118, 2006. WALKER, L. The role of the tandem learner diary in supporting and developing learner autonomy.In: LEWIS, T.; WALKER, L. (Ed.). Autonomous language learning in tandem. Sheffield, UK: Academy Electronic Publications, 2003. p.131-144. 75 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura FUNÇÕES EXECUTIVAS E PERCEPTO-MOTORAS EM CRIANÇAS COM BAIXO RENDIMENTO ESCOLAR1 Ana Paula Gasparotto Paleari2 Maria de Lourdes Merighi Tabaquim3 RESUMO A avaliação das funções mentais superiores no desenvolvimento infantil constitui um importante instrumento no processo diagnóstico clínico e escolar. O fracasso acadêmico pode estar relacionado às disfunções executivas e percepto-motoras, de áreas corticais pré-frontais e suas interconexões, sendo estas responsáveis pelo planejamento, organização, atenção seletiva e controle inibitório do comportamento e aprendizagem. O presente estudo teve como objetivo avaliar as funções neuropsicológicas de crianças com baixo rendimento escolar. Participaram 12 crianças de ambos os sexos, na faixa etária de 7 a 10 anos e 9 meses de idade, da 1ª a 4ª série do ensino fundamental. Os instrumentos utilizados foram o Teste Wisconsin de Classificação de Cartas, Teste Matrizes Progressivas, Teste da Figura Humana, Protocolo de Aprendizagem para o professor e Ficha de Identificação da criança. Os resultados demonstraram escores mentais na faixa média, embora com recursos limitados para tarefas de flexibilidade cognitiva e agilidade no raciocínio. Em 50% dos sujeitos houve classificação média para resultados percepto - motores. A capacidade de raciocínio abstrato e a domínio mental para modificar estratégias cognitivas em resposta a contingências ambientais mutáveis mostraram-se limitados. Na análise perseverativa 84% dos sujeitos tiveram níveis prejudicados de desempenho nas tarefas executivas. A atenção e concentração, imprescindíveis para a aprendizagem, encontraram-se diminuídas em 50% dos sujeitos. O estudo concluiu que as funções neuropsicológicas relacionadas ao domínio executivo e perceto-motor, defasadas em níveis significativos, são sugestivos da interrelação com o baixo desempenho escolar, uma vez que tais funções mentais são imprescindíveis para a aprendizagem. Palavras–chave: Distúrbio de aprendizagem. Funções executivas. Fracasso escolar. 1 INTRODUÇÃO 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Especialização em Neuropsicologia aplicada a Neurologia Infantil pela Universidade Estadual de Campinas, Brasil (2010). Conciliadora/Mediadora do Fórum - Jaú/SP , Brasil. 3 Doutorado em Ciências Médicas pela Universidade Estadual de Campinas, Brasil(2002). Professor Doutor da Faculdade de Odontologia de Bauru / Universidade de São Paulo , Brasil. 76 Lidar com o desafiadora, na insucesso escolar qual requer cada constitui-se vez mais uma tarefa pesquisas em complexa e áreas que possibilitem compreender sua diversidade, proporcionando respostas e elaboração de planos de ação adequados às dificuldades de aprendizagem da criança. Nos últimos anos têm sido intensivas as pesquisas e estudos sobre as dificuldades acadêmicas da criança em fase escolar, buscando maior compreensão dos processos estruturais e funcionais envolvidos no desempenho escolar. A cobrança freqüente da sociedade contemporânea, de um desempenho pautado em um ideal imaginário de perfeição, recai sobre o exercício escolar da criança, a qual nem desconhecidas, sempre é bem sucedida, tão desconhecidas que o aluno muitas vezes é taxado de por razões preguiçoso, desatento, “burro” – como dizem alguns professores. Essa complexa situação de cobrança, atrelada ao baixo rendimento escolar da criança, a diferencia dos demais colegas, resultando em aspectos emocionais negativos. Sentimentos de baixa auto-estima, déficits em habilidades sociais, problemas de comportamento, são alguns deles. A identificação dos níveis de funcionamento neuropsicológico executivo poderá promover melhores respostas adaptativas para o aluno e contribuir no avanço dos estudos da área, na medida em que busca compreender e propor ações efetivas na minimização do impacto que a criança vivencia com as dificuldades na aprendizagem acadêmica.Estudos indicam a incidência cada vez maior da ident ificação dos distúrbios de aprendizagem, apontando para a necessidade de alternativas que possam minimizar tal situação que acomete não só a vida escolar da criança, mas acaba por obstruir habilidades pessoais para um bom desempenho nas tarefas diárias (LIMA; TABAQUIM; CIASCA, 2010 ; RODRIGUES; SALGADO, 2010). Os métodos utilizados freqüentemente no ensino da leitura e escrita, não atendem àquelas necessidades que apresentam transtorno na aprendizagem. Desta forma, intensificar estudos na área da saúde e educação, assim como, possibilitar maior preparo dos professores e demais educadores domínio sobre as para maior adversidades vivenciadas, através de metodologias adequadas e recursos eficazes, poderão representar estratégias promotoras de 77 competências e desempenhos melhorados dos alunos. Frente a essas considerações iniciais, preparar a criança para o melhor aproveitamento de suas competências cognitivas implica em criar espaços aprendizagem onde ela possa ter percepção, memória mecanismos de experiências multifatoriais, motoras, de e linguagem.É fundamental que possa desenvolver atencionais, selecionando estímulos e reduzindo a interferência causada por distratores. Comportamentos que permitam a criança interagir no mundo de maneira intencional envolve a formulação de um plano de ação, que se baseia em experiências prévias e demandas do ambiente atual. Essas ações precisam ser flexíveis e adaptativas (por vezes, monitoradas) nas várias etapas de execução, para proporcionar o controle e a regulação do processamento da informação ao cérebro (LIMA; TABAQUIM; CIASCA, 2010; GAZZANIGA; MANGUN, 1998). As funções executivas planejamento, envolvem organização, uma série atenção de selet iva competências, e o tais como, controle inibitório (PENNINGTON, 1997; MACHADO, 2006). Estas faculdades mentais guiarão a cognição do sujeito e algumas delas estando em defasagem na sua aquisição e/ou desenvolvimento, o processo de aprendizagem se dificultará. A Neuropsicologia é uma ciência interdisciplinar do conhecimento que estuda as relações entre o cérebro e o comportamento, investigando o papel dos sistemas cerebrais individuais em formas complexas de atividade mental, em condições normais e patológicas. Portanto, o cérebro é o órgão da atividade mental (LURIA, 1981). As funções executivas são definidas como um conjunto de operações mentais que permitem ao indivíduo iniciar e desenvolver uma atividade com objetivo final determinado através de comportamentos independentes, autônomos e autoorganizados de maneira biologicamente adaptativa (CYPEL, 2006). Para que isso aconteça não basta que os domínios módulos independentes, mas o intento de curto, médio CIASCA, 2010; necessárias cognitivos estejam presentes é indispensável que sejam integrados com e longo prazos do indivíduo (LIMA; TABAQUIM; SOUZA, 2008). Para alcançar esses domínios, habilidades, como destacando-se habilidades de fazem-se planejamento e organização, atenção seletiva e controle inibitório (PENNINGTON, 1997). Outro 78 autor ainda acrescenta como fundamental a atenção sustentada, a fluência e a flexibilidade do pensamento (CYPEL, 2006). Esses processos são extremamente importantes para o processamento cognitivo e de fundamental conhecimento para a compreensão dos mecanismos que regem as formas mais complexas do comportamento humano. É o devido funcionamento das funções executivas que conferem autonomia ao indivíduo. Se elas falham, perde-se a autonomia, o sujeito fica como comumente dito “passivo”, “dócil” e “indiferente” (SOUZA, 2008). As funções executivas têm repercussões decisivas no aprendizado como um todo e organizam as capacidades perceptivas, mnésticas e práxicas com o objetivo de pontuar um objetivo específico; definir o início ou não deste; planejamento das etapas do processo; monitorar essas etapas comparando com o modelo proposto; modificar algo se necessário; dar seqüência ou interromper a proposta inicial; avaliar o resultado final comparando com o objetivo inicial (CYPEL, 2010). Quando se utiliza a avaliação neuropsicológica para investigar as funções executivas e afetivas, o que se busca é análise do funcionamento cerebral, ou seja, o “como” e o “por que” o paciente opera ineficientemente. Dessa maneira, torna-se necessário reconhecer também os recursos preservados do indivíduo para adoção de estratégias funcionais, capazes de favorecer melhor adaptação em níveis, tanto da aprendizagem quanto do autoconceito. O objetivo é capacitar e expandir as habilidades da criança comportamento final, que é a competência em para a obtenção do áreas multifatoriais (LIMA; TABAQUIM; CIASCA, 2010). O presente estudo propôs avaliar as funções neuropsicológicas em crianças com baixo rendimento escolar, caracterizando as funções executivas e percepto motoras, fundamentais ao rendimento acadêmico. 2. OBJETIVOS 2.1. GERAL Avaliar as funções neuropsicológicas de crianças com baixo rendimento escolar. 2.2. ESPECÍFICOS 79 Caracterizar as funções executivas e percepto-motoras. Comparar as funções neuropsicológicas, executivas e grafo-percepto-motoras. Identificar fatores de prejuízo no rendimento escolar e correlacionar aos achados neuropsicológicos. 3 METODOLOGIA 3.1 SUJEITOS Fizeram parte deste estudo 12 crianças de ambos os sexos, na faixa etária de7 a 10 anos e 9 meses de idade, da 1ª a 4ª série do ensino fundamental público, com exceção de uma criança em escola particular, e de nível sócio-cultural médio-baixo. 3.2. LOCAL O local que possibilitou a realização deste projeto foi Associação Casa da Criança de Jaú/SP, uma creche de fins filantrópicos, fundada em 28.03.1928, que visa o atendimento de crianças de 8 meses a 12 anos de idade da comunidade jauense. Situada na Rua Botelho de Miranda, 64, Vila Hilst, Jaú – SP, tem como presidente Marilda Rosseto Migliorini e vice-presidente, Claudinei Migliorini. O período de funcionamento é integral, uma vez que o Maternal, Jardim I e II desfrutam desta integralidade, tendo suas aulas escolares na Creche mesmo. Os demais, ou ficam no período da manhã, ou no da tarde, dependendo do horário escolar. Atualmente a Creche oferece seu usufruto a mais de 200 crianças. 3.3 INSTRUMENTOS Teste Wisconsin de Classificação de Cartas (WCST) (MIGUEL, 2005); Manual de Teste Matrizes Progressivas (RAVEN, 1997); Teste da Figura Humana (WECHSLER, 2003) ; Protocolo de aprendizagem do professor (TABAQUIM, 2002); Ficha de identificação da criança constando de perguntas estruturadas para a mãe responder a respeito de sua vida gestacional, condições de nasciment o e 80 desenvolvimento da criança até os 2 primeiros anos de vida da criança. 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO Os dados obtidos possibilitaram ser categorizados em resultados percentuais, apresentados em tabelas e gráficos, por sujeito e instrumento de avaliação empregado. Foram considerados os achados quanto aos desempenhos em diferentes provas e os dados quantitativos, submetidos à análise descritiva, permitindo o estudo das variáveis significantes qualitativas aos objetivos propostos. Inicialmente, foi caracterizada Posteriormente, foram elaboradas a as população tabelas participante descritivas do das estudo. variáveis observadas, analisadas e comparadas em relação ao grau de desempenho, tendo sempre como referência a classificação proposta por cada instrumento empregado. Tal critério visou demonstrar se havia ou não defasagem em determinada área cortical. Em seguida, através da comparação dos resultados obtidos no conjunto dos instrumentos, buscou-se fatores associados às dificuldades de ordem neuropsicológica, mediante a análise e correlação das variáveis independentes. I – Caracterização da população estudada As características dos sujeitos apresentadas na Tabela 1 foram baseadas na Ficha de Identificação (ANEXO 6) e nos prontuários da instituição educacional. Tabela 1 – Caracterização da população estudada Sujeitos S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9 S10 S11 S12 Sexo M F F F M F F M F M F M Idade 10 anos e 2 m. 8 anos e 6 m. 7 anos e 7 m. 9 anos e 4 m. 8 anos e 10 m. 8 anos e 11 m. 10 anos e 9 m. 7 anos e 11 m. 9 anos e 9 m. 7 anos e 4 m. 8 anos e 1 m. 10 anos e 2 m. Escolaridade 2º ano 2º ano 2º ano 3º ano 3º ano 4º ano 4º ano 1º ano 3º ano 1º ano 2º ano 3º ano Dos sujeitos participantes do estudo, 42% (5) pertenciam ao sexo masculino e 81 58% (7) ao feminino. A média de idade foi 8 anos e 8 meses e 50% (6) freqüentavam o 3ª e 4ª anos do ensino fundamental. Segundo relatos maternos: 25% das mães dos sujeitos foram agredidas fisicamente durante a gravidez; fizeram uso de cigarro durante a gestação; relatos de pais alcoolistas; crianças sempre muito agitadas e nervosas e mães que já tiveram pelo menos 1 aborto espontâneo; 33,33% dos sujeitos foram rejeitados durante a gravidez por pelo menos alguns meses e relatos de mães terem passado bastante nervoso durante a gravidez 8,33% das mães fizeram uso de álcool durante a gravidez; engravidaram com mais de 45 anos; crianças que apresentam algum distúrbio do sono; mães que provocaram pelo menos 1 aborto; mães são analfabetas e mães que fizeram uso de cocaína durante a gestação; 16,66% das crianças fizeram uso de medicamentos neurológicos; relatos de mães que tiveram pressão arterial alta durante a gestação; crianças que apresentaram convulsões até 2 anos e meio de idade; sujeitos tiveram pneumonia com meses de idade e relatos de mães sobre ter achado o desenvolvimento de seus filhos mais lentos em relação às demais crianças. De acordo com a literatura (LURIA, 1981), uma lesão cerebral não leva à perda direta de uma condição mental particular, mas a uma reorganização do funcionamento das partes intactas do cérebro. Assim, a função perturbada pode ser desempenhada de outras maneiras. Frente ao relato das mães do presente estudo sobre o uso de drogas na gestação, considera-se o risco de prejuízos no desenvolvimento cognitivo, porém, com a possibilidade de rearranjos neurológicos capazes de minimizar o impacto da história. O uso de medicamentos neurológicos na população estudada sugere necessidade de intervenções específicas nessa área do desenvolvimento. Segundo observações escolares de acordo com professores dos sujeitos em estudo: 25% dos sujeitos são repetentes deste ano; 8,33% relatos de irritação, nervosismo e teimosia; 82 16,66% dos sujeitos mostram-se agitados, distraídos e agressivos fisicamente em sala de aula; 33,33% relatos de indisciplina. Todos os sujeitos nasceram a termo e todos freqüentam ou freqüentaram reforço e psicopedagoga. Problemas de julgamento, planejamento e estratégia, associados ao histórico de vida e relato identificado do professor, podem ser decorrentes de disfunções executivas, causadas por lesões e/ou alterações no córtex pré-frontal, que repercutem na vida do sujeito durante toda a vida (CYPEL, 2006; BARKLEY, 2001). II – Análise dos resultados quanto aos instrumentos empregados Para avaliar o nível mental, o estudo empregou o Teste das Matrizes Progressivas Raven Infantil, cujos resultados são apresentados na Tabela 2. O percentil mediano teve variação entre 26 e 74 pontos. Acima de 74 foi considerado acima da média esperada para a idade. Sujeitos 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Σ Pontos 23 14 21 22 5 deficiente 20 11 deficiente 12 14 5 deficiente 19 25 15.9 Percentil 80 25 80 60 1 Categoria Classificação II Acima da Média IV Abaixo da Média II Acima da Média III+ Intelectualmente Médio V Intelectualmente 50 5 III+ V Intelectualmente Médio Intelectualmente 10 10 1 IV IV V Abaixo da Média Abaixo da média Intelectualmente 20 60 IV III+ Abaixo da média Intelectualmente Médio 33.5 Constatou-se uma média de 15.9 pontos e de percentil 33.5, o que representou média grupal na categoria IV e classificação no quartil médio inferior. 83 Este dado representa nível mental com recursos limitados para tarefas onde exige flexibilidade cognitiva e agilidade no raciocínio. No entanto, encontra-se na faixa média, o que possibilitaria desempenhos satisfatórios na aprendizagem. As funções executivas envolvem uma série de competências, tais como, planejamento, organização, atenção seletiva e o controle inibitório. Essas faculdades mentais guiarão a cognição do sujeito e alguma delas estando em defasagem na sua aquisição e/ou desenvolvimento, a atividade desenvolvida poderá apresentar-se prejudicada (PENNINGTON, 1997; LURIA,1981). Dessa maneira, o alto índice da baixa classificação desses sujeitos nessa prova, indica alguma defasagem nas competências que regem as funções executivas. Para a avaliação dos aspectos percepto-motores, empregou-se o desenho da figura humana, temporal visando obter informações sobre a organização espaço- e relacionada ao domínio motor do esquema corporal. Foi constatado que 50% dos sujeitos apresentaram classificação média para os resultados percepto-motores; 16,66% na categoria muito superior, a mesma percentagem teve classificação abaixo da média e também o mesmo percentual tiveram escores acima da média. O controle da motricidade envolve áreas de uma rede cortiço-subcortical, que buscam o ajustamento contínuo para o controle e execução do movimento e da resposta motora em níveis superiores (CYPEL, 2010). Embora a metade do grupo estudado tenha apresentado desempenhos na média esperada para a idade, 16,66% mostraram prejuízos nesse domínio, o que pode ser considerada a ineficiência práxica de tarefas envolvendo a organização, orientação e coordenação motora. Para a avaliação das habilidades executivas, empregou-se o Teste Wisconsin, visando avaliar a capacidade de raciocínio abstrato e a flexibilidade mental para modificar estratégias cognitivas em resposta a contingências ambientais mutáveis. A tabela 1 representa os resultados obtidos dos 12 sujeitos. 84 Tabela 4 – Representação dos resultados obtidos com o Wisconsin. Sujeitos S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9 S10 S11 S12 Σ PA 82,02 44,53 60,93 57,03 46,87 57,81 73,43 66,40 42,96 18,75 66,40 36,71 54,48% PE 17,97 55,46 39,09 42,96 53,12 42,12 26,50 33,59 57,03 65,62 33,59 63,28 44,19% PEP 25 32,39 20 30,90 25 22,22 8,82 13,95 27,39 45,23 25,58 49,38 27,15% CC 6 2 4 5 3 5 5 3 2 0 5 1 3,41 EC 1 0 8 2 3 1 5 0 17 2 3 3,5 FC 8 21 18 18 12 16 19 24 22 10 15 24 17,25 Legenda: PA: percentual de acertos; PE: percentual de erros; PEP: percentual de erros perseverativos; CC: Numero de categorias completadas; EC: ensaios para completar a primeira categoria; FC: fracasso em manter o contexto. Para Porcentual de Acertos, o S1 obteve o escore maior com 82,02% e o S10 o mais baixo com 18,75%. Considerando um percentual de corte para categorização de domínio na prova, somente 16% dos sujeitos (2) tiveram escores com acertos em mais de 70%. Isto representa que 84% dos sujeitos atingiram níveis prejudicados de desempenho nas tarefas executivas. Esta prova demonstra variação da capacidade de elaboração de estratégias, bem como a flexibilidade para mudanças e busca de solução para o problema, o que requer atenção e concentração. Assim, funções defasadas representam prejuízo num aspecto específico da cognição, resultando em prejuízos na aprendizagem. Aqueles que apresentaram escores mais elevados representam competências que podem manifestar melhor desempenho no raciocínio abstrato, como a matemática, habilidade nas funções de atenção e concentração e flexibilidade mental nas diferentes atividades acadêmicas. Para alcançar os domínios cognitivos, são necessárias habilidades de planejamento e organização, atenção seletiva e controle inibitório (PENNINGTON, 1997). É fundamental também a atenção sustentada, a fluência e flexibilidade do pensamento (CYPEL, 2010). No presente estudo,essas habilidades mostraram-se defasadas, evidenciando disfunções integrativas de áreas executivas, necessárias para a integridade do funcionamento cognitivo (SOUZA, 2008). 85 Considerando que, quanto menor o percentual de erros, maior é o desempenho do sujeito na prova, o Gráfico 3 apresenta os percentuais de erros dos sujeitos do estudo. Constatou- se que 42% dos sujeitos tiveram respostas em 50% das tentativas na prova. O S1 foi quem obteve melhor desempenho e o S10 o mais prejudicado. Em Percentual de erros, comparativamente ao PA, os sujeitos com percentual elevado de acertos, tiveram percentual de erros menores, o que denota domínio de estratégias e modificação de escolhas frente as contingências. A atenção e concentração, imprescindíveis para a aprendizagem, encontram-se diminuídas em, pelo menos, 50% em 5 sujeitos deste estudo. A memória permite a codificação, classificação, armazenamento e evocação de eventos já acontecidos (CYPEL, 2010). Neste estudo, aproximadamente 50% significativas condições de memória, elemento organização do pensamento. No dos sujeitos apresentaram básico para o aprendizado e entanto, ele representa um dos fatores fundamentais para a aprendizagem, necessitando da integração de áreas conjugadas, tais como a da linguagem e de estruturas percepto-motoras. Os Erros Perseverativos indicam a permanência do sujeito na mesma estratégia. Não obrigatoriamente os sujeitos que apresentaram maior numero de erros são aqueles que obtiveram maior resultado de erros perseverativos, apesar de apresentarem maiores chances para que isso acontecesse. Na aprendizagem, esse escore sugere a insistência com que o sujeito permanece na mesma estratégia de raciocínio para realizar determinada tarefa ou assimilar novos conteúdos. Apesar de não ter tido a menor porcentagem de erros, o S7 foi o que menos apresentou tal escore, o que significa que mesmo errando, muda mais rapidamente de estratégias frente as contingências. Já o S10 foi o que obteve maior percentil e o maior escore de erros. Nas Categorias Completadas, são seis categorias seqüencialmente a que o sujeito deve completar, por cor, forma, número e novamente por cor, forma e número. Aqueles que conseguiram completar mais categorias não são necessariamente os que obtiveram maior percentual de acertos, já que, para que a categoria seja completada, os acertos têm que ser seqüenciais. Sujeitos que mudam de estratégias enquanto estão acertando, significa que, ao longo do caminho, perdem seu raciocínio, por não manterem atenção suficiente e memória 86 adequada. A função atencional intervém em todas as etapas para a realização dos objetivos determinados e recebe influencias multifatoriais e o sistema inibitório e um mecanismo da função atencional que permite a exclusão dos estímulos que não interessam ao objetivo final (CYPEL, 2010). Sendo assim, percebe-se a precariedade dessa função em 50% dos sujeitos, aproximadamente. No nosso estudo, o S10 não obteve sucesso em nenhuma categoria; já o S1 conseguiu completar as seis categorias, antes mesmo que todas as tentativas tivessem sido apresentadas a ele. Este dado sugere o domínio da função executiva. Para Ensaios para completar a primeira categoria, mesmo o S3 tendo conseguido completar 4 categorias, obteve 8 fracassos para completar a primeira categoria, já o S9 obteve 17 fracassos e completou somente 2 categorias. O fracasso significa as tentativas do sujeito até conseguir acertar a primeira resposta, a qual nem sempre permanece ou não permanece 10 consecutivas, como no caso do S10. O Número de fracasso em manter o contexto significa as vezes que o sujeito fracassou na tentativa de se manter acertando. Normalmente esses erros se apresentam nas tentativas de mudanças de estratégias quando os 10 acertos de uma categoria são realizados, mas como nem todos acertam consecutivamente esses 10, então também apresentam fracassos, entre outros, poucos acertos. O S8 mesmo não tendo um percentil alto de erros, fracassou bastante em manter o contexto, demonstrando a numa estratégia pela possibilidade de não dificuldade em permanecer apresentar um nível de atenção suficiente. O S12 também apresentou alto índice nesse escore, porém já é um sujeito que apresentou bastantes erros e somente 1 categoria completada. O sujeito que apresentou menos fracasso foi o S1, o mesmo que completou as 6 categorias e obteve menos erros. Além da atenção, a memória de curto prazo é um dos quesitos no processamento da informação (GOMEZ-JIMENEZ; TERAN, 1999), é ela que permite o sujeito registrar por um período curto de tempo qual estratégia utilizou pra acertar e continuar mantendo-a nesse caso em questão. Portanto, observou-se defasagem da memória e atenção nesses sujeitos que fracassaram em manter o contexto. Na avaliação escolar sobre a aprendizagem, através do Inventário Escolar 87 aplicado aos professores, foram considerados: a) Aquisições básicas da aprendizagem: O sujeito mais prejudicado nas aquisições básicas da aprendizagem, segundo o parecer recebido da escola, foi o S8; o S6 foi o que apresentou nível de aquisição otimizado em 100% dos aspectos avaliados pelo seu professor. De acordo com a literatura, os processos mentais são permeados pelas unidades funcionais, que realizam suas funções por meio de um processo combinado (LURIA, 1981). Com exceção da categoria Retenção de Conteúdos, nas demais, houve domínio na maioria dos sujeitos, o que indicou, segundo o parecer do professor, bom aproveitamento escolar, implicando que, em contexto acadêmico os sujeitos apresentam respostas satisfatórias e recursos relacionados ao funcionamento das unidades funcionais do sistema nervoso. b) Aquisições Básicas da Habilidade Numérica: Somente o S1 apresentou sempre o domínio nesta área e S9 não apresentou nenhum. 25% dos sujeitos “apresentam sempre” habilidades em numeral e quantidade, e 8,33% em operações aritméticas e problemas. Segundo análise dos professores, 50% dos sujeitos “apresentam frequentemente” habilidades em numeral, 41,66% em quantidade, 25% em operações aritméticas e 16,66% em problemas. 25% “apresenta ocasionalmente” habilidades em quantidade e 41,66% em operações aritméticas e problemas. 25% “não apresenta” habilidades em numeral e operações aritméticas, 8,33% em quantidade, e 33,33% em problemas. c) Aquisições Básicas para Leitura e Escrita: Para a habilidade da escrita e leitura, o S6 apresenta todos os domínios; já o S8 e S10 apresentam domínios limitados. O mecanismo da memória operacional é essencial para a compreensão e interpretação de uma leitura, já que ao ler, o sujeito evoca memórias das imagens das palavras já conhecidas (CYPEL, 2010). Relacionando a literatura com os resultados obtidos, compreende-se o baixo desempenho principalmente de S8 e S10 quanto ao domínio das aquisições básicas para leitura. Embora o professor tenha manifestado satisfatoriamente a retenção de conteúdos, estes dados evidenciam limitações neuropsicológicas, o que sugere a baixa expectativa 88 escolar com relação ao aproveitamento do aluno. d) Quanto ao comportamento do aluno: O comportamento humano é regulado por funções cognitivas como percepção, memória e pensamento, assim como, pelas funções executivas (LIMA; TABAQUIM; CIASCA, 2010). Devido ao seu funcionamento que conferem autonomia ao indivíduo (SOUZA, 2008), os relatos de professores mostraram resultados significativos quanto a comportamentos apresentados pela criança em sala de aula, ratificando a subjetividade sobre o desempenho escolar. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo permitiu as seguintes conclusões: Habilidades como planejamento, estratégia, organização, memória, atenção seletiva e controle inibitório são imprescindíveis para o desempenho acadêmico; os sujeitos do estudo com queixas escolares mostraram índices prejudicados em tarefas envolvendo funções executivas e percepto-motoras. A história de vida com intercorrências representou alta significância na compreensão dos déficits neuropsicológicos apresentados pelos sujeitos do estudo. As funções grafo-percepto-motoras rebaixadas, identificadas por traços pouco precisos e pouco controlados, desorganização e irregularidades no movimento, falta de ritmo na construção gráfica, comprometimento na globalidade do conjunto do desenho, sugeriram correlações com dificuldades de ordem práxica e com a falta de integração do sistema visuo-motor. ABSTRACT Evaluation of higher mental functions in child development is an important tool in the clinical and school. The academic failure may be related to executive dysfunction and perceptual- motor areas of prefrontal cortical and their interconnections, which are responsible for planning, organization, selective attention and inhibitory control of behavior and learning. This study aimed to evaluate the neuropsychological functions of children with poor academic performance. Participants were 12 children of both sexes, aged 7 to 10 years and 9 months of age, from 1st to 4th grade of elementary school. The instruments used were the Wisconsin Card Sorting Test, Progressive Matrices Test, Human Figure, Protocol Learning for the teacher and Identification Card of the child. The results showed 89 mental scores in the middle range, although with limited resources for tasks of cognitive flexibility and agility in reasoning. In 50% of the subjects was the average rating for perceptual-motor outcome. The ability of abstract reasoning and mental control to change cognitive strategies in response to changing environmental contingencies proved limited. In the analysis perseverative 84% of subjects had impaired levels of performance in executive tasks. Attention and concentration are essential for learning, were decreased by 50% of subjects. The study concluded that the neuropsychological functions related to the field executive and perceptualmotor, lagged at significant levels, are suggestive of interrelations with poor academic achievement, such as mental functions are essential for learning. Keywords: Learning disabilities. Executive functions. School failure. REFERENCIAS BARKLEY, R. A. The executive functions and self-regulation: an evolutionary neuropsychological perspective. Neuropsychologia Review, v. 11, p. 1-29, 2001. Disponível em http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/11392560. Acesso em: 10 jan. 2010. CYPEL, S. O papel das funções executivas nos transtornos de aprendizagem. In: ROTTA, N. T., OHLWEILER, L. e RIESGO, R. S. Transtornos da aprendizagem, abordagem neurobiológica e multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed, 2006. GAZZANIGA, M. S.; IVRY, R. B.; MANGUN, G. R. Cognitive Neurocience : The biology of the mind. London: W. W. Norton & Company, 1998. GOMEZ-JIMENEZ, A. e TERAN, S. J. The association between sleep apnea and the risk of traffic accidents. Cooperative Group Burgos-Santander. N Engl J Med. v.340, n.11, p. 847-851, 1999. LIMA, R. F.; TABAQUIM, M. L. M.; CIASCA, S. M. Sistema Atencional e Funções Executivas na Infância. In: CIASCA, S. M., RODRIGUES, S. D.; SALGADO, C. A. TDAH: transtorno do déficit de atenção e hiperatividade. Rio de Janeiro: Revinter, 2010. LURIA, A. R. Fundamentos de Neuropsicologia. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos; São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1981. MACHADO, A. B. M. Neuroanatomia Funcional. 2. ed. São Paulo: Editora Atheneu, 90 2006. p. 270 – 271. MIGUEL, F. K. Teste Wisconsin de Classificação de Cartas. Aval. psicol., v.4, n.2, p.203-204, nov. 2005. PENNINGTON, B.F. Diagnóstico de distúrbios de aprendizagem: um referencial neuropsicológico. São Paulo: Pioneira, 1997. RAVEN, J. C. Manual de Teste Matrizes Progressivas. Rio de Janeiro: C.E.P.A., 1997. RODRIGUES, S. D.; SALGADO, C. A. Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade nas Crianças Pré-Escolares. In: CIASCA, S. M., RODRIGUES, S. D., SALGADO, C. A. TDAH: transtorno do déficit de atenção e hiperatividade. Rio de Janeiro: Revinter, 2010. SOUZA, R. O. et al. Cognição e Funções Executivas. In: LENT, R. Neurociência da Mente e do Comportamento. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. TABAQUIM, M. L. M. Avaliação Neuropsicológica: estudo comparatativo de crianças com paralisia cerebral hemiparética e distúrbios de aprendizagem. 2 0 0 2 . Tese (Doutorado) - FCM/Unicamp, Campinas, 2002. WECHSLER, S. M. O Desenho da Figura Humana: avaliação do desenvolvimento cognitivo de crianças brasileiras. 3. ed. Campinas: Editora da PUCCampinas, 2003. 91 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura INCLUSÃO: O PORTADOR DE DEFICIÊNCIA NA ESCOLA REGULAR1. Barbara Amaral Martins2 RESUMO Analisando a história da educação escolar, notamos que o ensino formal sempre foi um privilégio de poucos. Segundo Beyer (2006), mesmo quando a Europa institui a obrigatoriedade do ensino, a educação das crianças do povo é limitada, destinando-se a elas uma formação mínima. E publicações do MEC (2007) revelam que no Brasil, apesar dos esforços realizados para aumentar o acesso à educação de qualidade, persistem as desigualdades e grupos sociais são excluídos, segregados ou recebem educação de qualidade inferior, entre estes grupos encontram-se as pessoas com deficiência, que passaram a ser vistos como detentores de direitos somente no século XX e com a nova Constituição de 1988, começaram a frenquentar a rede regular de ensino, fato que se deve principalmente, a pressões internacionais. Entre as normas e acordos, a Declaração de Salamanca (1994) merece destaque, pois abandona o paradigma de integração e abre espaço para a educação inclusiva. A partir daí surge um novo propósito à educação, o de aceitar e atender as necessidades de todo e qualquer cidadão. Contudo, Góes e Laplane (2007) sustentam que apesar do sistema escolar brasileiro alinhar-se com a legislação internacional e com as posturas mais avançadas em relação aos direitos sociais, existem limitações relacionadas à realidade educacional brasileira, caracterizada por classes superlotadas, instalações físicas inadequadas e formação docente insuficiente o que impede que as políticas inclusivas possam ser concretizadas. "Essas condições de existência do nosso sistema educacional levam a questionar a própria ideia de inclusão como política que, simplesmente, insira alunos nos contextos escolares existentes." (LAPLANE, 2007, p. 18). Concluímos assim que todas as crianças têm direito a uma educação de qualidade, que respeite as diferenças e atenda as necessidades individuais. Entretanto, para que a educação possa ser considerada inclusiva, além de aceitar e valorizar a diversidade, as escolas precisam estar preparadas para recebê-la. Palavas–chave: Educação. Diversidade. Inclusão. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluna da Universidade Sagrado Coração. 92 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura DEMANDAS FOCADAS PARA ASSESSORIA EM PSICOLOGIA ESCOLAR1. Camila Pereira2, Marcelo Mendes dos Santos3, Ester Tereza Senger Petroni4, José Rafael Mazzoni5 RESUMO Estudos sistematizados presentes na literatura nacional e estrangeira na área dos serviços de assessoria prestados pela Psicologia Escolar têm apontado para a necessidade de investigar e intervir em uma demanda focada: os universitários. Entre as temáticas colocadas em estudo pode-se localizar a aprendizagem como figura e motivação, estratégicas, processos cognitivos e metacognitivos, hábitos e condições de estudo, compreensão leitora e escrita como fundo, sendo estas altamente associadas a empenho, desempenho, integração e sucesso acadêmico. Nesse sentido, esta pesquisa originária de um programa de atividades extensionistas, versa sobre estratégias e condições de estudo em universitários. Objetivou-se identificar de que forma os sujeitos estudavam bem como facilitar a construção de estratégias eficazes. Trata-se de uma investigação de cunho qualitativo, com o delineamento de pesquisa-ação e que utilizou a etnografia como método. Os participantes foram quatro estudantes, do sexo feminino, matriculadas em cursos de graduação em uma instituição de ensino superior confessional e católica. Recorreu-se a observação participante como instrumento, mediante a transcrição das situações vivenciadas no diário de campo do pesquisador. A coleta de informações ocorreu no primeiro semestre de 2010 em três momentos: o primeiro de acolhida da demanda para o serviço, a segunda de identificação das condições de estudo e a terceira de construção de estratégias eficazes. Os dados foram examinados a luz da análise categorial temática e sem efeito de generalização. Os resultados indicaram que a identificação de estratégias cognitivas, metacognitivas e motivacionais facilitaram o desempenho bem como a orientação quanto às condições pessoais e temporais para o estudo como preditores do sucesso acadêmico. Finalmente com a consecução dos objetivos desta investigação, possibilitou gerar recursos para as participantes aperfeiçoar a realização de atividades acadêmicas, reorientou a identidade do serviço de Psicologia Escolar para uma demanda da comunidade e avançou na compreensão de processos eficazes de aprendizagem universitária. Palavras-chave: Universitários. Estratégias. Condições de estudo. Psicologia escolar. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Psicóloga formada pela Universidade Sagrado Coração - Bauru/SP. 3 Professor Integral da Universidade Sagrado Coração – USC, Bauru/São Paulo/Brasil. Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas/São Paulo/Brasil. 4 Mestre em Educação Escolar pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil (2007). Professora e Supervisora na Graduação da Universidade do Sagrado Coração. 5 Mestre em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba, Brasil (2001). Professor Titular da Universidade Sagrado Coração. 93 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura ANÁLISE DAS TIRAS EM QUADRINHOS ITURRUSGARAI 1. Carolina Zumiani Navarro2 O ILUSIONISTA, DE ADÃO RESUMO Histórias e tiras em quadrinhos são elementos culturais muito consumidos nas sociedades modernas, difundidos, principalmente, pela publicação massiva em jornais e revistas. Atualmente, este gênero aborda grande variedade de temáticas, conquistando públicos e interesses diversos. Tendo em vista a popularidade deste meio, entendemos que as tiras e histórias em quadrinhos publicadas em jornais são elementos ideais para a aplicação da análise do discurso. Partindo desta premissa, escolhemos as tiras infantis do ilustrador brasileiro Adão Iturrusgarai para exercitar a análise semiótica baseada na teoria da significação de Algidar Julien Greimas. Palavras-chave: História em quadrinhos. Semiótica verbovisual. Análise do discurso. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluna da Universidade Sagrado Coração - Bauru – SP. 94 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura O ACESSO DA CRIANÇA DE 6 ANOS NO ENSINO FUNDAMENTAL1 Cintia Renata Pascolato2 Marisa Aparecida Pereira Santos3 RESUMO O estudo é resultado de um projeto da graduação feito no curso de Pedagogia da Universidade do Sagrado Coração disciplina Métodos e Técnicas da Pesquisa Pedagógica, período 2008-2009. O objetivo foi investigar se a prática do docente na série inicial do Ensino Fundamental integra metodologias socializadoras e afetivas para acolher a criança de 6 anos de idade. A compreensão do problema investigado foi fundamentada pelo estudo da Lei Federal 11.114/05 e a Deliberação 73/08, que estabelecem o direito da matricula, no Ensino Fundamental, à criança com 6 anos de idade. A pesquisa aconteceu em 90 dias durante quatro horas semanais, de observação, em três escolas públicas estaduais, em Bauru,com professores da primeira série do Ensino Fundamental sendo o foco as salas com a presença dos alunos com 6 anos de idade somada com a aplicação de questionário com questões fechadas,de múltipla escolha e abertas, focando a descrição das experiências relativos a sua prática docente com crianças protegidas pela legislação. As análises sobre a teorias sobre adaptação escolar, postura do professor e aprendizagem com o cultivo da afetividade demonstram relevância do tema que está sendo investigado para despertar à reflexão sobre o ideário de autores que enfocam teorias da ciência da Sociologia e Psicologia da Educação. Wallon (1949), Piaget (1971- 1993), Vygotsky(l988), subsidiaram a hipótese de a docência vincular a afetividade com a adaptação da criança na escola.Os teóricoTassoni (2000,2002), Almeida(2003), Becker(2003), Faria(2007), Sacristán(2001) Morin(2001), Contreras(2002) e Pimenta(2007) ajudaram a compreensão do conhecimento sobre o movimento e as contradições e interação que existem entre professor e aluno.Contribuíram para reflexão sobre quais as representações e imagens os docentes apresentam no trabalho com as crianças de 6 anos de idade? Sobre como são avaliadas as políticas públicas (Lei 11.114/05) e a forma escola respaldar a aprendizagem, considerando o perfil de 6 anos de idade. Palavras-chave: Prática docente. Socialização Afetividade Reflexão. 1 INTRODUÇÃO 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Graduada em pedagogia pela Universidade Sagrado Coração. 3 Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo, Brasil (2004). Professor titular da Universidade do Sagrado Coração. 95 Em 2005, no Brasil, com o objetivo de democratizar o ensino e melhorar a trajetória de aprendizagem na escola pública, os legisladores foram estimulados a promulgar a Lei 11.114/05, que torna obrigatório a matrícula no Ensino Fundamental, de crianças a partir de 6 anos de idade. Ao assegurar a matrícula a partir dos seis anos de idade como direito no Sistema Nacional de Educação surge como necessidade o acompanhamento da prática docente sob aspectos metodológicos.Essa perspectiva define a pesquisa na formação do professor como um valor de relevância no sentido de contribui com dado e analises relativas a adaptação do ambiente escolar e a postura do professor para possibilitar a ação-reflexão-ação no processo de ensino e aprendizagem. Nas argumentações que incorporam o corpo da Lei 11.114/05 há considerações no sentido do cuidado para o processo por ela estabelecido não se constituir apenas um ato administrativo e sim em ganho na aprendizagem do aluno. Porém a estrutura de funcionamento da escola pública de Ensino Fundamental apresenta homogeneidade quanto às suas instalações físicas, aos materiais disponíveis, ao número de crianças por professor e, sobretudo, quanto à organização do espaço e do tempo. Sendo assim, como assegurar a adaptação dessa criança na escola? A percepção do problema é decorrente das experiências vivenciadas pela pesquisadora durante a atuação como professora eventual e nos estágios supervionado e como do curso o despertar para reflexão como necessidade, tendo como base o ideário de autores que enfocam teorias que são trabalhadas na ciência da Sociologia e Psicologia da Educação, dentre elas os autores clássicos Wallon, Piaget, Vygotsky, que firmam haver relações entre o desenvolvimento infantil e os saberes da docência .O objeto de estudo surgiu como conseqüência da inquietação da pesquisadora sobre como é cobrado, pela criança de 6 anos, a afetividade com a professora no processo de sua adaptação na escola. A relação de afetividade entre a criança e o professor no sentido de mobilizar o desenvolvimento dos avanços cognitivos para aprendizagem, mediante estudos de Morin (2001), ocorre num clima afetuoso que acentuam situações que contribuem para definição do personalismo na criança. Para Wallon (1949), a criança desenvolve a construção da consciência de si mediante as interações 96 sociais, reorientando o interesse pelas pessoas durante o período de 3 a 6 anos de idade. Assim, a relação que existe entre a emoção no desenvolvimento humano e a interferência do meio estabelecido pelo professor pode ser um perigo ou um avanço no processo de aprendizagem da criança. Tassoni (2000) define como fundamental a presença física do professor na aproximação com a criança de 6 anos, como relevante para sua aprendizagem, a exigência de estrutura e organização escolar adequada para acolhê-la e estimular o suas relações primárias que garantam o seu modo de agir com padrões de comportamento e normas de conduta sociais. A coleta de dados projetada para ser feito com professores nas escolas públicas reuniu argumentos, concepções, pensamentos, procedimentos e conhecimentos para por em discussão as perspectiva de haver interação social e a mesma ser entendida como fator fundamental no processo de aprendizagem da criança na escola. Para Almeida (2003), a escola desempenha um papel expressivo no desenvolvimento sócio-afetivo da criança, favorece as interações e permite à criança estabelecer relações com parceiros da mesma idade e com o adulto. Embora a base da vinculação afetiva seja iniciada na família, numa relação entre a criança e o adulto, mediante os vínculos afetivos que ocorrem na escola há fortes perspectiva de ser aspecto fundamental na aprendizagem da criança a interação social ela com o docente. As teorias de Vygotsky (1988) concebem haver entre o professor e a criança possibilidades de ser vinculado pressupostos fundamentais que nos leva a compreendem o conhecimento admitido não apenas como um todo harmonioso no psicológico, pedagógico e sociológico, mas sim, no movimento e nas contradições que são inerentes a interação entre professor e aluno para haver a aprendizagem.. Porém, na prática pedagógica do professor do Ensino Fundamental, há ambigüidade na prática docente de comportamentos estimuladores na relação de interação, por exemplo: na sala de aula o professor fala e o aluno escuta; o professor dita e o aluno copia; o professor decide o que fazer e o aluno faz; o professor ensina e o aluno aprende. Como entender a possibilidades de interação com resultados positivos com a criança de 6 anos, neste modelo? Mas por que o professor age assim? 97 Para Becker (1993) o professor acredita no mito da transferência do conhecimento: o que ele sabe, não importa o nível de abstração ou de formalização, pode ser transferido ou transmitido para o aluno. E, que isso é constatado desde as primeiras séries iniciais do Ensino Fundamental, o pressuposto definido consiste em acreditar na possibilidade de que tudo que o aluno tem a fazer é submeter-se à fala do professor: ficar em silêncio, prestar atenção, ficar quieto e repetir, tantas vezes quantas for necessário, escrevendo, lendo, até aderir em sua mente o que o professor deu. Dessa forma, descobrir quais as representações e imagens que tem as professoras sobre como trabalhar com as crianças de 6 anos de idade e analisá-las a luz das teorias contemporâneas relativas às condições da escola, sua estrutura e organização consistiu nas contribuições deste trabalho. Como as teorias são configuradas em significados ao campo educacional brasileiro pelo Mistério de Educação e Cultura, Conselhos Federal e Estadual de Educação. A referências para pensar na efetivação do direito social da criança de 6 anos de idade no Ensino Fundamental (Lei 11.114/05),na escola, acontece dependendo do processo que se efetiva a partir dos professores e suas posturas em relação em ter a afetividade como fundamento para adaptação da criança no ambiente. Assim, segundo Sacristán (200l), a implantação das políticas públicas, considerando no contexto o que se reporta a Lei 11.114/05 há aspectos de dedicação às necessidades da criança, porém respaldadas por ações centradas em aprendizagens essenciais e básicas, com métodos atrativos que favoreçam bases de uma educação permanente. Os procedimentos investidos, nesta pesquisa, que deu origem a este artigo caracterizam-se com o aspecto qualitativo. Abordou, num prazo de 90 dias (4 hs/ semanais), um processo de observação da prática docente em três escolas públicas estaduais com professores da primeira série do Ensino Fundamental de salas que tem na sua composição crianças com 6 anos de idade. As anotações estão registrado em um diário de bordo elaborado pela pesquisadora. A metodologia aplicada para coleta de dados também inseriu a aplicação de questionários que foram respondidos pelos professores. 2 PERFIL DAS CRIANÇAS COM 6 ANOS DE IDADE 98 Para Faria (2007) as crianças aos seis anos, ao ingressarem no Ensino Fundamental encontram–se em pleno desenvolvimento físico e motor, construindo sua corporeidade e seus movimentos e formando sua identidade. Ao mesmo tempo em que aprendem sobre o mundo se inserindo na cultura e construindo sua autonomia, sua independência, conquistando fortemente relações com os seus laços afetivos e sociais. Apresenta com perfil de ter capacidade para interagir, assimilar e produzir nos trabalhos educativos, através das ações lúdicas , na convivência com seus amigos em sala de aula e na escola o cultivar da socialização para adaptação ao novo meio. Para Piaget (1973), aos 6 anos, a criança se encontra operacional e apresenta, dentre suas características, a no período précapacidade de interiorizar esquemas de ação construídos no estágio anterior sensório-motor (0 a 2 anos), quando começa a função semiótica. No período pré-operacional a criança apresenta uma revolução sensorial e motora,descentralização das ações em relação ao próprio corpo com objeto e associação das ações dos objetos em conseqüência das coordenações de seus movimentos. A criança é vista como egocêntrica, porque é centrada em si e não consegue colocar-se abstratamente no lugar do outro; age por simulação com percepção global sem discriminar detalhes e deixar-se levar pela aparência sem relacionar fatos. Sua capacidade de representar é vista como simbólica. Ela faz uso de símbolos mentais por meio de imagens ou de palavras que Piaget (1982) denomina como função semiótica, que consiste na evolução das condutas para representar algo por meio de um significado. A criança, no pré-operacional, apresenta a capacidade de imitar diante do modelo e condições de continuar a fazer o gesto na ausência do mesmo, por repetição, não envolvendo a representação do pensamento. Existe a conduta do jogo simbólico, conhecido por jogo de ficção. A criança faz de conta, finge ou até mesmo atribui certas atitudes ao seu brinquedo. Entre o jogo simbólico e a imagem mental a criança utiliza o desenho como função semiótica. 3 A SOCIALIZAÇÃO DA AÇÃO E A LEI 11.114/05 99 A socialização da ação redunde na Lei 11.114/05 sobre apossibilidade de acontecer por intervenção da prática pedagógica na concepção da legislação a potencialidade de vir acontecer ocorre quando o docente, no trabalho educativo, desenvolve a função social da educação de programar formas articuladas de agir e integrar a criança no ambiente do Ensino Fundamental. Aos 6 anos, de acordo Faria (2007) as funções mentais, como memória, percepção e imaginação, e a função simbólica ainda se encontram em construção. O pensamento verbal e as múltiplas linguagens estão se estruturando. Com tais especificidades, esta criança precisa brincar interagir com adultos e outras crianças, explorar e experimentar os objetos do mundo físico social, vivenciar situações possibilitando novos desafios para sua imaginação, imitar e repetir ações por livre iniciativa e, sobretudo, ainda precisa de cuidados básicos de afetividade e de aconchego. Entretanto, a estrutura e o funcionamento da escola pública de Ensino Fundamental têm uma organização de espaço e tempo que exigem do docente a superação de limites para conseguir explorar da criança fatores relacionados ao estágio pré-operacional, desenvolvimento da afetividade e interação social da criança de 6 anos com a prática pedagógica do professor. Faria (2007) chama atenção ao fato de que a criança, aos poucos, à medida que avançam no processo de construção da inteligência e de inserção na cultura, demandam tarefas mais complexas vão sendo capazes de desenvolver capacidades construídas pelas crianças amadurecem rapidamente ao ingressar no Ensino Fundamental que completaram 6 anos, mas como resultado de um processo no qual os aspectos biológicos e os fatores culturais interagem gradativamente, no tempo e nos espaços sociais em que elas convivem. A intervenção da prática pedagógica, as vivências escolares mediadas pela relação do exercício docente e do oficio discente merecem estudos mais aprofundados no cotidiano vivido nas escolas de Ensino Fundamental. Nos sistemas escolares, ou seja, nas políticas públicas, conforme Perronoud, (1995) há uma distância significativa entre o discurso modernista influenciado pelas ciências da educação e de novas pedagogias e as preocupações dos docentes. Para ele, raros são os que se opõem a uma pedagogia diferenciada, entretanto as políticas são lançadas, sem mexer na estrutura escolar, sem transformar os hábitos, sem exigir novas qualificações docentes. Assim, a 100 inserção na escola pública das crianças que se encontram nas condições da Lei 11.114/05, à luz de Contreras, (2002) não deve servir só para registro quantitativo de crianças no Ensino Fundamental, mas sim, como indicadores de fatores, mudanças que modifiquem angustias e despreparo dos docentes. A importância do conhecimento para Contreras (2002) está no seu valor para pensar sobre o conhecimento cotidiano, para problematizar a experiência vivida. Não representa apenas a assimilação de idéias para que possam ser reproduzidas ou reconstituídas ainda que significativamente, mas que possam ajudar a reformular compreensões subjetivas de vida e possibilidade de tornar a escola um ambiente favorável à aprendizagem. Os saberes da docência a prática educativa somam aos pressupostos as reflexões feitas por autores brasileiros que trabalham junto aos cursos de formação de professores, Pimenta (2007) para definir a respeito da prática pedagógica do professor um perfil capaz de enfrentar o desafio imposto pela Lei 11.114/05. 4 A INTERAÇÃO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA COM A CRIANÇA DE 6 ANOS DE IDADE A Lei 11.114/05 traz em suas argumentações o fazer pensar relacionado com a possibilidade dos docentes envolverem na sua prática a afetividade. A determinação da matricula, segundo a legislação, vincula a oferta de recursos didáticos pedagógicos e espaço físico com o fazer com que as crianças sejam consideradas como seres que pensam complexamente e ludicamente, e que assim aprendem. O desafio do trabalho pedagógico no articulado a uma metodologia no qual Ensino considere Fundamental estar as características das crianças e sua cultura e assim, estimular a autonomia e o conhecimento. As possibilidades de avaliar as políticas públicas, implantadas pela Lei 11.114/05, com a justificativa de democratizar o ensino e melhorar a trajetória de aprendizagem da criança na escola pública; o de apontar o perfil docente quanto estarem ou não capacitados para criarem e desenvolverem a socialização das crianças de seis anos no Ensino Fundamental e de aprofundamento professores. das discussões no âmbito dos promover cursos material para de formação de 101 A análise dos dados feita à luz da fundamentação teórica desde o momento dos primeiros procedimentos que consistiram a busca de escolas e professores que se enquadrassem na proposta do projeto de pesquisa e a seguir no período de observação das práticas. Após a aplicação do pré-teste, uma amostragem de com professores, o questionário foi reformulado e aplicado definitivamente com os professores. 5 RESULTADOS No diário de bordo há registrado que evidenciam a necessidade da realização de um trabalho que amenizasse as relações professor x aluno x aluno. A partir das relações interpessoais e intrapessoais, onde as questões sócioafetivas das crianças com 6 anos de idade, devem estabelecer uma relação de carinho e afeto, mostrando-lhes que o mais importante para uma boa convivência seria traçar laços de respeito. No questionário formulado com categorias de questões fechadas na forma de múltipla, escolha, e/ou opção de sim ou não e questões abertas, justificando as respostas, os professores responderam sobre suas experiências relativos a sua prática docente com crianças protegidas pela legislação evidência claramente nas respostas dos professores a percepção de dois problemas fundamentais sendo um deles é como priorizar o trabalho envolvendo a afetividade diante da estrutura organizacional da escola pública, diante do ambiente físico de forma a reorganizá-lo para uma melhor integração dessas crianças com a pratica pedagógica. O respeito e a sensibilização para a questão pedem formação específica e continuada articuladas a troca de experiências vivenciadas pelos mesmos de modo que alternativas sejam reveladas beneficiando a uma melhor adaptação da criança de seis anos ao freqüentar o ensino fundamental. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS O estudo da pesquisa fortaleceu no Curso de Pedagogia o processo de debate com os professores e futuros pedagogos s sobre o desenvolvimento e a 102 aprendizagem das crianças de seis anos de idade ingressantes no ensino fundamental, mas sem perder de vista as necessidades evidentes no perfil da criança com essa idade. A singularidade presente infância, como o brincar como um modo de ser e estar no mundo; as diversas expressões e o desenvolvimento da criança na escola; as crianças de seis anos e as áreas do conhecimento e como também a prática pedagógica constituíram eixos de questionamento e reflexão na trajetórias feita pela pesquisadora. Porém nem todas as respostas foram encontradas. Dessa foram. Este estudo deixa como proposta a demandam necessária para o aprofundamento na investigação de como trabalhar com o professor da rede pública de São Paulo as relações de afetividade relação fundamental para socialização e adaptação da mesma na escola . A pesquisa constata que Segundo a Resolução da Secretaria de Educação nº 2.318, de 29 de dezembro de 2009 sobre a organização curricular e o regime escolar do ensino fundamental e do ensino médio, nas unidades escolares da Rede Estadual de Ensino, mais especificamente no Título III, Capítulo I, Seção II, que trata da Matrícula Inicial, foi estabelecido que crianças que completarem seis anos de idade após o mês de início do ano letivo, não teriam direito de ingressar no ensino fundamental, conforme redação do art. 35, a saber: Art. 35. A criança que completar 6 (seis) anos de idade, após o mês de início do ano letivo, não terá direito de ingressar no ensino fundamental. Porém, atualmente existe uma Medida Provisória que defende que o que deve nortear o acesso ao ensino fundamental é sim a capacidade, a aptidão da criança, e não o fato de ter ela completado seis anos até o mês de início do ano letivo. Tal capacidade pode ser aferida por documento hábil, que comprove a capacidade de frequentar o primeiro ano do ensino fundamental sem prejuízo de sua saúde física/mental bem como de uma boa alfabetização, aprendizagem, laudo tais psicológico como certidão e/ou laudo de conclusão da pré- pedagógico. Entretanto, o cumprimento da Lei nº. 11.114/05, nas escolas vai além de um ato normativo, implica um novo olhar para o Ensino Fundamental por parte de todos os interessados, de forma a garantir a ampliação dessa etapa escolar, e com qualidade, para atender o preceito constitucional de atendimento à criança como prioridade absoluta, uma vez que a pesquisa demonstrou um despreparo para 103 exercer com êxito o que propõe a legislação. A proposta apresentada pela Lei esclarece sobre a importância de procurar fazer os alunos encontrarem seu equilíbrio pessoal e suas possibilidades de crescimento intelectual, mediante técnicas pedagógicas. Procurar-se fazer com que cada um tome consciência de suas orientações afetivas concretas, na esperança de que, de bem consigo mesmo, possa conviver de forma harmoniosa com seus semelhantes. Conclui pelos estudos feitos que o convívio afetivo para adaptação na escola, desde o inicio no Ensino Fundamental ,é a melhor experiência que o aluno pode viver quando o professor consegue estabelecer o diálogo como a arte que deve ser ensinada e cultivada. REFERÊNCIAS ALMEIDA, R. S. A emoção na sala de aula. 3. ed. Campinas: Papirus, 2003. BARROS, C. S. G. Pontos de Psicologia Geral. 7. ed. São Paulo: Atica, 1990. . Psicologia e construtivismo. São Paulo: Atica, 1996. BRASIL. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional. 20 de dezembro de 1996. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br>. Acesso em: 17 set. 2008. . Ministério da Educação Básica. Ensino Fundamental de Nove Anos: Orientação para a inclusão da criança de seis anos de idade. 2 ed. Brasília, DF, 2007. . Parecer n° 1041/05. O Estado de São Paulo. 12 dez. de 2005. Disponível em: <http://www.abrelivros.org.br/abrelivros/textos.asp?id=1517>. Acesso em: 25 fev. 2008. . Processo n° 34.404, 34.427 e 34.441, aprovado em: 29 out. de 2005. Disponível em: <http://www.cee.mg.gov.br/parecer1041.2005.htm>. Acesso em: 29 fev. 2008. MATO GROSSO DO SUL. Ministério Público. MP garante matrícula no ensino 104 fundamental a crianças que ainda farão 6 anos. MP em notícia. Jan. 2010. Disponível em: http://www.mp.ms.gov.br/portal/principal/noticias.php?pg=1&id=5839 acesso em:11 fev. 2010. BECKER.F. Da ação à operação: o caminho da aprendizagem: J. Piaget e P. Freire. Porto Alegre: EST: Palmarica: Educação e Realidade, 1993. . Docência e Conhecimento. Caxias do Sul, UCS, 26 abril 2000. Palestra proferida na Universidade de Caxias do Sul, durante a realização do Seminário de Atualização Didático-Pedagógica. . Educação e a construção do conhecimento. Porto Alegre: Artes Médicas, 2001 CONTRERAS, J. Autonomia de professores. Valenzuela. São Paulo: Cortez, 2002. 296 FARIA,V. L. B. A criança de seis anos no Ensino Fundamental. Alfabetização e letramento.projeto.ed.Scipione.2007 Disponível em: <http://wwwscipione.com.br/letramento/artigos.asp?id_artig o=1. Acesso em 13 jul. 2009. MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 3.ed. São Paulo: Cortez, 2001. et al. OLIVEIRA, M. K. A Pensar a educação: contribuições de Vygotsky. In: Piaget-Vygotsky: novas contribuições para o debate. 6. ed. São Paulo: Atica, 2002. 51-68p. PIAGET, J. A epistemologia genética. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002. ; INHELDER, B. A Psicologia da criança. São Paulo: Difel, 1982. . Para onde vai a educação? Rio de Janeiro: Olympio – Unesco, 1973. .O juízo moral na criança; 2. ed.São Paulo: Summus, 1994. PIMENTA, S. G. Formação de professores: identidade e saberes da docência In: 105 ______. (Coord.). Saberes pedagógicos e atividade docente. São Paulo: Cortez, 2007. p. 15-34. SACRISTÁN ,G. J. A educação que temos, a educação que queremos. In: IMBERNÓN, F. (Org.). A educação no século XXI: os desafios do futuro imediato. Porto Alegre: Artimed, 2001. p. 37-63. TASSONI, E. C. M. Afetividade e produção escrita: a mediação do professor em sala de aula . 2000. Dissertação (Mestrado) - Unicamp, Campinas. . A afetividade em sala de aula: condições de ensino e a mediação do professor. In: AZZI, R. G.; SADALLA, A M. F. A. (Org.). Psicologia e formação docente: desafios e conversas. São Paulo: Casa do psicólogo, 2002. VYGOTSKY, L. L. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Icone, 1988. WALLON, H. As origens do caráter na criança. São Paulo: Nova Alexandria, 1995. 106 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura DESENVOLVIMENTO E APLICAÇÃO DE OBJETO DE APRENDIZAGEM SOBRE AQUECIMENTO GLOBAL COM ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL1. Clerison José De Souza Bueno2, Rodrigo Batista Edamatsu3, Richard dos Santos4, Dariel de Carvalho5 RESUMO Este Estudo teve como objetivo desenvolver e aplicar um objeto de aprendizagem com o tema aquecimento global em alunos do Ensino Fundamental. A aplicação foi realizada para verificar a eficácia do uso do recurso no processo de aprendizagem dos alunos durante a aula de ciências. A pesquisa foi realizada em uma Escola pública da cidade de Cabrália Paulista no Estado de São Paulo, que conta com uma sala de informática composta por 10 computadores. Para atender o objetivo proposto, após a criação do objeto de aprendizagem, foram aplicadas duas avaliações de múltipla escolha, uma inicial e outra final, para mensurar o nível de conhecimento dos 27 alunos de 6ª série do ensino fundamental. A primeira avaliação foi aplicada em sala de aula, em seguida os alunos interagiram com o objeto de aprendizagem na sala de informática e ao término regressaram á sala e realizaram a última avaliação. Os resultados foram tabulados e analisados e em seguida foi realizada uma comparação com o intuito de verificar quais as variações apresentadas pelos alunos após a interação com o objeto de aprendizagem. Sendo assim, podemos verificar que o recurso desenvolvido foi eficaz em algum grau no processo de ensino/aprendizagem. Os alunos apresentaram uma média de acerto de 39,3% na avaliação inicial e 60,7% de erros. Após a aplicação do objeto de aprendizagem a média de acertos aumentou 2,9%, ou seja, a média foi de 42,2%, contra 57,8% de erros. Com isso, visualizou-se o desempenho dos alunos na realização das duas atividades, nas quais houve uma pequena melhora no aprendizado dos alunos. Verificou-se que o recurso em questão possui potencialidades e fragilidades e apesar do resultado modesto, a ferramenta mostrouse positiva e com possibilidade de realização de novos estudos para apontar incrementos que podem possibilitar possíveis melhorias nos índices de aprendizado dos alunos. Palavras-chave: Objeto de aprendizagem. Ensino/aprendizagem. Aquecimento global. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluno do Curso de Ciência da Computação da Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. 3 Aluno do Curso de Ciência da Computação da Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. 4 Aluno do Curso de Ciência da Computação da Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. 5 Graduado em Informática pela FATEC-Jahu. Mestre em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Doutorando em Educação pela Universidade Estadual Paulista – UNESP/Marília. 107 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura O COMUNICADOR SOCIAL E AS MÍDIAS: CENÁRIOS EM CONSTRUÇÃO1 Eliane Cintra Rodrigues Montresol2 Thalita Maria Mancoso Mantovani E Souza3 Ana Paula Saab De Brito4 Fábio José De Souza5 RESUMO As exigências do mundo globalizado revelam um período de profundas transformações em inúmeras áreas do conhecimento, sendo que a maioria delas são provocadas ou proporcionadas pelos avanços tecnológicos, que continuamente interferem na maneira de viver e agir do indivíduo. Os avanços tecnológicos, especialmente em face do advento da Internet, fizeram com que surgissem novas formas de comunicação, criando espaço para um novo profissional, que deixou de ser apenas Jornalista, Publicitário ou Relações Públicas para tornar-se Comunicador Social multimídia, um profissional capaz de compreender e interagir neste novo cenário de forma singular, deixando de lado os estereótipos que ao longo dos anos separou as áreas da comunicação social. Este estudo se propôs, portanto, a abordar algumas das mudanças que os avanços tecnológicos possibilitaram na área da comunicação e aos profissionais que integram este segmento. As pesquisas exploratória e bibliográfica, amparadas por referências nacionais e internacionais, permitiram subsidiar as questões teóricas, possibilitando uma revisão crítica densa, gerando análises e reflexões sobre os múltiplos desafios da Comunicação e do Comunicador Social face às novas mídias. Ser um Comunicador Social é fazer parte de um universo ainda em expansão, ter habilidade para analisar e interpretar temas, planejar e executar tarefas relacionadas à comunicação, ter conhecimento amplo em várias áreas, com a contribuição séria e ética para a sociedade. Assim, as novas arenas da comunicação exigem que os Comunicadores Sociais sejam ainda mais 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Televisão Digital: Informação e Conhecimento da FAAC/UNESP.Especialista em Marketing e Propaganda pelo Centro de Pós-Graduação Toledo Araçatuba.Bacharel em Publicidade e Propaganda pela Universidade Paulista. Docente do Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium de Araçatuba. 3 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Televisão Digital: Informação e Conhecimento da FAAC/UNESP. Especialista em Planejamento e Gestão da Hospitalidade em Turismo pela Integrale/FECAP. Bacharel em Turismo pela USC. 4 Mestre em Comunicação Social pela Universidade Paulista.Bacharel em Comunicação Social Habilitação em Jornalismo pela FAAC/UNESP. Docente do Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium de Araçatuba. 5 Mestre em Direito Constitucional pela ITE. Especialista em Direito pela ITE. Especialista em Formação de Educadores em Turismo pela USC. Docente dos Cursos de Graduação e PósGraduação da USC. Advogado. 108 interados e envolvidos com o cliente e com o próprio mundo em que vivem, além de envolverem novas posturas de trabalho para um mercado em que não existe mais espaço para profissionais específicos, limitados em sua formação. O que se espera é ser um profissional multimídia capaz de transitar pelo campo da Comunicação com competência, ética, observação das implicações jurídicas existentes, especialmente com respeito aos consumidores, sociedade, empresas, colaboradores, clientes e fornecedores. Palavras-chave: Comunicação. Comunicador Social. Mídias. Tecnologia. 1 INTRODUÇÃO As exigências do mundo globalizado revelam um período de profundas transformações em inúmeras áreas do conhecimento, sendo que a maioria delas são provocadas ou proporcionadas pelos avanços tecnológicos, que continuamente interferem na maneira de viver e agir do indivíduo. Há cerca de duas décadas, a sociedade vem sofrendo transformações tecnológicas profundas em todos os níveis da comunicação, com conseqüências sociais e econômicas incontornáveis, ao ponto de se falar já não mais de uma sociedade industrial, ditada pelas revoluções que determinaram o progresso do Ocidente, mas uma Sociedade da Informação, marcada por uma terceira revolução industrial, onde as telecomunicações conquistam papel de relevância como o petróleo do século XXI (CASTELLS, 2007). A comunicação humana, que já atravessou três "mediamorfoses", com o surgimento da fala e da escrita, agora experimenta a linguagem digital. A fala resolveu os problemas de comunicação, permitiu a formação de grupos sociais e desenvolveu formas de difusão oral de informação. A escrita permitiu o registro do oral, a possibilidade de documentar fatos, a impressão mecânica e o desenvolvimento dos mass media. Por último, a linguagem digital permite hoje a comunicação entre máquinas, mediando a comunicação entre os seres humanos. Deixa de ser importante a distinção humana entre texto, imagem ou som, uma vez que na linguagem digital tudo se transforma em bits (NEGROPONTE, 1995). As estruturas de informação e comunicação (EIC) não representam apenas uma transformação de cunho tecnológico, mas estão na base da mutação que o capitalismo sofre a partir dos anos 70. 109 As EIC dão sustentação ao que hoje conhecemos como capitalismo pósfordista. Elas conectam o mundo e dão forma ao que Castells chama de sociedade em rede. Por elas passam os fluxos de imagens, sons, de riqueza e de poder e são elas também que dinamizam os fluxos de informação e conhecimento, o que leva muitos estudiosos a defender que as mesmas provocam a emergência de um novo modelo de sociedade, a Sociedade da Informação. A geração, o processamento e a transmissão da informação tornam-se as fontes fundamentais de produtividade e poder, o que significa que, ao invés de uma Sociedade da Informação, as EIC geraram uma Sociedade Informacional, na qual a informação é o produto do processo produtivo (CASTELLS, 2007). Através de uma das mais importantes EIC hoje, a Internet, vivemos a experiência ímpar de um ciberespaçotempo, que nos coloca novas maneiras de fazer, de ser e viver no mundo pós-moderno. Por isso, é comum dizer que o entrelaçamento articulado de redes globais e locais de EIC está provocando uma revolução em todas as esferas da atividade humana. Se de um lado as facilidades incontáveis deste novo mundo seduzem, de outro, num mundo globalizado, a vulnerabilidade destas estruturas transforma-as num desafio global, gerando novas inseguranças nas relações dos indivíduos no ciberespaçotempo e em termos de Estados, novos riscos estratégicos. No que tange aos aspectos econômicos, de um lado, EIC integradas, seguras e eficazes são hoje a base para a performance da empresa pósmoderna, garantido-lhe produtividade, lucratividade e uma boa indicação de competitividade; de outro lado, materializam (como no aspecto político) a chamada "rede global de interação" entre os agentes econômicos, configurando-se assim a globalização sob seu aspecto econômico. Neste mundo, a mão-de-obra deve adquirir um novo perfil, com alto nível de instrução. O processo de produção, que no fordismo estava calcado num processo de trabalho material, cede lugar a um processo onde estão envolvidas a reflexividade e a auto- reflexividade, ou seja, as EIC exigem um trabalhador capaz de programar e decidir seqüências inteiras de trabalho. Troca-se o apertador de parafusos de ontem pelo programador de hoje. É neste contexto que surge a importância de um processo educacional 110 renovado, que esteja efetivamente preocupado e voltado para a formação de indivíduos competentes, técnica, social e politicamente, o que possibilitará o exercício da nova cidadania por um número cada vez maior de pessoas com a sua dignidade valorizada. Isto quer dizer que, na pós-modernidade, as oportunidades de vida dependem do acesso e do lugar que os indivíduos ocupam no "modo de informação", ao contrário da modernidade fordista em que as oportunidades estavam relacionadas ao lugar no "modo de produção". A Socidade da Informação fez surgir um novo paradigma comunicacional, marcado pela passagem do mass para o self-media, caminhando hoje para o multimídia, ou mídia multimodal, segundo Lévy (1999), em que os meios já não se sobrepõem ou coexistem, mas se fundem num único meio integrado, o computador pessoal, que procura responder aos interesses da sociedade em geral, e de cada usuário em particular, num regime de interatividade. Sobre novas e velhas mídias, Lima (2001, p. 28) questiona: “[...] será que a nova mídia se ajusta à definição de comunicação de massa?”.Vejamos: Mídia de massa, historicamente, significa produtos de informação e entretenimento centralmente produzidos e padronizados, distribuídos a grandes públicos através de canais distintos. Os novos desafiantes eletrônicos modificam todas essas condições. Muitas vezes, seus produtos não se originam de uma fonte central. Além disso, a nova mídia em geral fornece serviços especializados a vários pequenos segmentos de público. Entretanto, sua inovação mais importante é a distribuição de produtos de voz, vídeo e impressos num canal eletrônico comum, muitas vezes em formatos interativos bidirecionais que dão aos consumidores maior controle sobre os serviços que recebem, sobre quando obtê- los e sob que forma (DIZARD JUNIOR, 2000, p. 23). Em 1964, ao analisar os argumentos de defesa e acusação dos mass media na obra Apocalípticos e Integrados, Umberto Eco já atestava que a única solução possível para o rompimento do modelo capitalista da indústria cultural seria uma negação total do mesmo. A época era outra, mas as tecnologias da informação já se desenvolviam secretamente no Vale do Silício, região da Califórnia, nos Estado Unidos. A popularização da Internet só veio a ocorrer somente na última década do século passado, entrando de forma avassaladora no cotidiano das pessoas e provocando a chamada revolução digital. 111 O fenômeno tem como principal característica o acesso a um fluxo de informações que o pensamento humano não é capaz de acompanhar provocando até por isso certa inquietação, ou a angústia da pós-modernidade. Transformam-se as experiências humanas, surgem novas relações que não mais se determinam por um sistema piramidal, mas sim por uma continua, simultânea e infinita interação de redes articulando-se dentro e fora do espaço virtual. Lévy (1999) define a cibercultura como o “universal sem totalidade”. Ou seja, o que ele explica é que a web envolve uma pluralidade infinita, um fluxo de informações tão grande onde todos são emissores e receptores, que ao debater convertem o espaço virtual em praça pública, local onde todos os incluídos on line têm voz. A construção dos discursos feita por meio de listas de discussão, fóruns e etc. fazem com que a construção do sentido seja elaborada de forma conjunta, por meio da relação dos nós, pontos da rede, que se comunicam e trocam experiências utilizando a tecnologia. Por tudo isso, não há uma totalidade, uma hierarquia estabelecida por um poder absoluto, mas sim uma heterogeneidade de informações onde não há um discurso predominante (LÉVY, 1999). Os avanços tecnológicos, especialmente em face do advento da Internet, fizeram com que surgissem novas formas de comunicação, criando espaço para um novo profissional, que deixou de ser apenas Jornalista, Publicitário ou Relações Públicas para tornar-se Comunicador Social multimídia, um profissional capaz de compreender e interagir neste novo cenário de forma singular, deixando de lado os estereótipos que ao longo dos anos separou as áreas da comunicação social. Na Sociedade da Informação, a rapidez e o dinamismo tomaram conta de todos os espaços e não é mais possível – ou aceito pelo mercado – que o profissional seja capacitado apenas em uma área, até mesmo porque com a globalização, a informação circula livremente, sendo que não existem desculpas para este não estar atualizado. O mercado de trabalho visa profissionais comprometidos, qualificados, com habilidades e competências, capazes de pensar e definir ações de trabalho completas, propor alternativas novas, solucionar e evitar problemas, para atenderem os seus clientes, as empresas, os parceiros sempre com coerência, ética 112 e responsabilidade. A sociedade, diante de sua evolução, passou a determinar que os profissionais atuem em sintonia com a tecnologia, notadamente dos que atuam na área da comunicação, com conhecimentos ampliados transversalmente para uma comunicação integrada, ou seja, o Jornalista deverá entender de marketing; o Publicitário aprendendo sobre eventos para dar vida às ações de marketing com entretenimento; o Relações Públicas tornando-se peça chave na produção de eventos publicitários e jornalísticos com ações de merchandising. Segundo Castells (2007, p. 67): “[...] vivemos um desses raros intervalos na história. Um intervalo cuja característica é a transformação de nossa cultura material pelos mecanismos de um novo paradigma tecnológico que se organiza em torno da tecnologia da informação”. Pode-se inferir que a mudança não é apenas na área da comunicação, mas sim em todos os aspectos da vida humana, desde a maneira de como o indivíduo recebe e processa a informação, as formas de atuação profissional, de relacionamento e comportamento humano. Castells (2007, p. 40) expressa ainda que as redes interativas estão criando novas formas e canais de comunicação que moldam a vida e ao mesmo tempo, são moldadas por ela. Analisando as novas gerações, percebe-se quão verdadeira é a afirmação do autor. A chamada geração dos nascidos digitais tem comportamentos completamente diferentes de gerações anteriores. São mais ativos, ocupam seu tempo com várias atividades, buscam outros conhecimentos fora da escola, se comunicam via e-mail, SMS, MSN, sites de relacionamento, telefone móvel, entre outros. Vivem como se não sobrevivessem sem todos estes recursos tecnológicos. De acordo com Gracioso (2008, p. 73), em 2007 o IBOPE divulgou que já existem no Brasil 36 milhões de pessoas acima de 15 anos com acesso à Internet, sendo que desse total, 20 milhões a acessam em seus lares, com 22 horas mensais de permanência na rede. Embora as gerações mais jovens utilizem com maior frequência e intensidade os meios digitais, eles não estão sozinhos. Aos poucos, a tecnologia envolve também gerações que já deixaram o mercado de trabalho e aproveitam o 113 tempo livre de aposentados para desvendar o novo e mergulhar no mundo digital. 2 OBJETIVOS 2.1 OBJETIVO GERAL Abordar algumas das mudanças que os avanços tecnológicos possibilitaram à área da comunicação e aos profissionais que integram este segmento, além das questões sociais e econômicas que envolvem este processo. 3 METODOLOGIA Foram utilizadas as pesquisas exploratória e bibliográfica, amparadas por referências nacionais e internacionais, que permitiram subsidiar as questões teóricas, possibilitando uma revisão crítica densa, gerando análises e reflexões sobre os múltiplos desafios da Comunicação (enquanto área do conhecimento) e do Comunicador Social face às novas mídias. Os materiais encontram-se disponíveis em bibliotecas, além de serem parte do acervo dos autores. 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 O PAPEL DO COMUNICADOR SOCIAL Acredita-se ser impossível falar em Comunicador Social sem antes definir o que se entende por Comunicação. Do Latim Comunicare, a comunicação é o processo de tornar comum algo (mensagem) para alguém (receptor). Em todas as etapas de desenvolvimento da história do homem e das comunidades, havia (e ainda há) a presença efetiva da comunicação. Bordenave (1982) já dizia que a comunicação serve para que as pessoas se relacionem entre si, compartilhando idéias, conhecimentos, informações e sentimentos. Conforme Perosanz (2006, p. 22): 114 [...] el termino genérico Comunicación puede utilizarse para referirse a cosas tan diferentes como la elaboración de noticias (em diferentes suportes o formatos), la creación de productos de entretenimiento mediático (desde uma serie de ficción hasta um videojuego o uma película de animación), el diseño de págins web em Internet o la elaboración de campañas publicitárias tanto de caráter comercial como de servicio público. Esta amplitud del término se justifica porque em todos esos ejemplos está implícita la definición que se plantea unas líneas más arriba: la comunicación como um proceso de emisión y recepción de mesajes. Se podría añadir, em todo caso, que la comunicación también implica um proceso de interación com mesajes, cualquiera que fuera su naturaleza, función y objetivo. Para o autor, comunicação é, então, um processo de emissão e recepção de mensagens, que envolve também o processo de interação, independente de sua natureza ou objetivo. No entanto, a comunicação é um pouco mais que isso. É um processo de troca entre emissor e receptor, uma forma de construir com o outro um entendimento sobre algo. Pode-se dizer que a comunicação conduz à informação, indicando caminhos e possibilidades ao receptor da mensagem. Sendo assim, o papel do Comunicador Social é amplo. Ser um Comunicador Social é fazer parte de um universo em expansão, ter habilidade imagens, planejar e executar para analisar e interpretar temas, tarefas relacionadas ao desenvolvimento da comunicação, ter conhecimento amplo em várias áreas e estar ciente de sua contribuição séria e ética para a sociedade. Segundo Polistchuk e Trinta (2003, p. 23): [...] o profissional de Comunicação Social que desejamos dará provas de flexibilidade, evidenciando possuir disposição inata para detectar, identificar e resolver problemas surgidos em seu trabalho diário – um domínio de atividades em que o desenvolvimento tecnológico ocasiona rápidas transformações tanto no que se refere a práticas já conhecidas, quando no que tange a novos cenários socioculturais que se vêm desenhando. Os autores afirmam que a Comunicação Social é uma atividade constante e infindável, através da qual é possível compor, manter e transformar espaços socioculturais. É também interação generalizada, promovida pela organização da sociedade e permanentemente atualizada pelas relações que, em todos os níveis, neta têm lugar. A Comunicação é fator básico e convivência e elemento determinante das formas que a sociedade humana adquire 115 (POLISTCHUK; TRINTA, 2003, p. 67). O Comunicador Social desempenha atividades muito além das funções básicas de Jornalista, Publicitário ou Relações Públicas. Espera-se que o Comunicador Social esteja em sintonia com os estudos, de forma inter e multidisciplinar.Independente da Habilitação escolhida, inicialmente, o Comunicador Social deverá estar convicto que o seu trabalho, ou seja, a Comunicação, pode interferir em todos os aspectos da vida dos seres humanos. Por isso, os Comunicadores Sociais devem estar atentos às orientações das várias instituições que representam as áreas de Jornalismo, Publicidade e Propaganda e de Relações Públicas, tais como: Associação Brasileira de Agências de Publicidade (ABAP); Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT); Associação Associação dos Profissionais de Marketing Promocional (AMPRO); de Propaganda (APP); Associação Nacional de Editores de Revistas (ANER), Associação Nacional de Jornais (ANJ); Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), Conselho Executivo das Normas- Padrão (CENP); Federação Nacional das Agências de Propaganda (FENAPRO); Conselho Federal de Profissionais de Relações Públicas (CONFERP); Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (CONAR), entre outros. Há a necessidade dos Comunicadores Sociais se preocuparem com a ética, justiça, moral e valores, independentemente do público a ser atingido. Lopes (2003, p. 62) leciona que a ética é importante, pois: É dever, entre os deveres, divulgar a verdade. Quem assim procede, normalmente, tem êxito definitivo. O outro, o oposto, é fogo fátuo. Não é concorrente. Acende e apaga como o vagalume e só tem êxito na escuridão da noite. O profissional ético tem qualidade e seu progresso é duradouro. É lembrado. Ele é marca famosa. Não se pode deixar de mencionar aqui que, além da ética, o ordenamento jurídico brasileiro deverá pautar as atividades de todos os profissionais, independente da área de atuação. No Brasil, a Constituição Federal de 1988 traz o Capítulo V dedicado à Comunicação Social, com a previsão do “zelo sobre a mensagem que se presta, por meio de linguagem, para a formação da consciência, do conhecimento e da cultura do povo brasileiro, como também do acesso aos meios 116 de divulgação da informação” (BITELLI, 2004, p. 240). Para os Comunicadores Sociais, respeitar e obedecer a legislação vigente, especialmente a nossa Constituição Federal, é uma necessidade, pois, destes profissionais é exigida uma postura com a responsabilidade de promover sempre a verdade, a justiça e, sobretudo, de proteger a dignidade da pessoa humana e seus valores éticos e morais. 4.2 O COMUNICADOR SOCIAL E AS MÍDIAS Para Thompson (2002), a mídia não interfere nas relações humanas porque há uma certa filtragem individual das informações, ou seja, o indivíduo recebe e processa a informação de acordo com seu universo de conhecimento. Ele sugere que os meios vão pautando as relações sociais, mas que não determinam as relações. Embora o receptor acredite naquilo que vê na televisão, por exemplo, e leve isso para seu cotidiano, como forma de legitimar o conteúdo da mensagem, o autor afirma que a mídia atua como formadora de opinião, nas esferas cultural, social, política, econômica e ambiental. Diz ainda que, “[...] se levarmos a mídia a sério, descobriremos a profunda influência que ela exerce na formação do pensamento político e social” (THOMPSON, 2002, p. 14). Thompson (2002) acredita que os meios de comunicação interferem até mesmo quando o indivíduo não concorda com o que assiste ou ouve, porque isso o faz pensar, raciocinar para em seguida, emitir sua opinião. Pode-se dizer que os já consagrados meios de comunicação continuam presentes na vida e nos lares dos cidadãos, levando informação e entretenimento a custos relativamente baixos. É o caso da televisão, conforme corrobora Lopes (2004, p. 133): Está na TV o principal referencial cultural de milhões de pessoas. A exclusão de outras possibilidades e a diminuição de acesso às ações culturais tradicionais ou à vivência social em torno da TV são fatos insofismáveis, os quais atravessam o tecido social criando um novo paradigma de autor-reconhecimento e de identificação. A TV é, sem dúvida, o principal veículo formador dos mais recentes contratos de comunicação que conhecemos em nossa época. Já o rádio é difusor de informação e conhecimento e carrega consigo 117 características especiais, tais como linguagem oral, mobilidade, imediatismo, instantaneidade, fácil penetração, entre outros. Apesar da Internet, do telefone móvel e de todas as formas de comunicação que a tecnologia possibilitou, a TV, o rádio, os jornais impressos e as revistas continuam cumprindo seu papel, como há muito tempo o fazem. É possível e é necessário que as mídias tradicionais continuem ganhando novos contornos e sejam modificadas para atender as necessidades e os desejos da Sociedade da Informação (por exemplo, com a transformação da TV analógica pela TV Digital), uma vez que ainda, infelizmente, não são todos os brasileiros com acesso às tecnologias e aos novos meios, classificados por Gracioso (2008) como novas arenas da comunicação. A Internet vem rompendo paradigmas em diversos aspectos da vida moderna, principalmente por introduzir princípios de descentralização e acesso livre à informação, como o software livre, Linux, ou o copyleft, ausência de direitos autorais para fins não comerciais com a citação da fonte. Esses novos conceitos influenciam diretamente, por exemplo, na atividade jornalística já que com o surgimento da Internet não somente muitos produzem material jornalístico sem nem ter freqüentado universidade, mas principalmente por descartar a função de mediador do profissional de comunicação. Os relatos dos blogs algumas vezes já “furaram” os grandes jornais, assim como seus sites, estabelecendo uma forma de trabalho voluntário em relação à distribuição e troca de informações. O que se percebe é o surgimento de uma rede de solidariedade em que o homem pós-moderno sente um desejo de identificação com o todo, de se ver refletido e narrado no que é veiculado pela mídia. Contudo, as formatações do jornalismo tradicional não se aplicam a esse leitor, que está interessando em originalidade e identificação. O ciberespaco permite uma libertação do pólo da emissão, onde cada um pode colocar suas idéias, opiniões e informações sem passar por um centro editor como no caso dos mass medias. Sendo cada indivíduo um ponto inicial e final, ou um nó da rede, sua autonomia e opções de escolha têm provocado no mínimo uma reflexão sobre o fazer jornalístico. Algumas das corporações midiáticas insistem em trazer para a Internet o 118 modelo tradicional jornalístico e sua retórica da imparcialidade. O surgimento dos blogs e o alto grau de personalização da maioria dessas narrativas aproximam o leitor do autor, rompendo com a barreira da impessoalidade imposta pela técnica jornalística. Todavia, além da liberação dos pólos de emissão, a Internet torna-se responsável também pela independência dos meios assim como de seus leitores. Mais que isso, questiona as formas de intermediação da mídia ao possibilitar o livre acesso a uma pluralidade de informações sem que haja necessariamente um filtro. Por um lado, esse fator provoca o excesso de informações de qualidade questionável, por outro liberta os leitores ferramentas de manipulação da mídia corporativa e das de seus interesses mercadológicos. De certa forma, segrega de um lado os grupos que atuam utilizando a premissa do copyleft e que constroem seus projetos e manejam as informações utilizando inteligência coletiva e de outro os que ainda possuem interesses individualistas de status e lucro. Como afirma Gracioso (2008, p. 40-41): “[...] não existe revolução de mídia, mas uma evolução natural e constante, mais acelerada nos últimos cinco anos. As necessidades e motivações básicas dos homens por sua vez são constantes, são analógicas”. Sem dúvida alguma, é preciso existir a convergência entre as diversas mídias. Castro (2008, p. 53) nos apresenta uma ampla visão sobre a convergência tecnológica, conforme segue: A convergência diz respeito a uma mudança tecnológica profunda que deverá transformar a relação do modelo de negócios no campo da comunicação [...]. Trata-se de uma convergência também na produção e oferta de conteúdos digitais, na criação de novos formatos audiovisuais para uso conjunto ou em diferentes plataformas digitais. Será necessário que as mídias se planejem, se reiventem e passem a considerar como um importante caminho sem volta, a convergência entre televisão, Internet, celular, entre outros. Weinberger (2007, p. 217) defende que: “Aprendemos a enxergar além das reduções e estereótipos de cada área. No mundo em miscelânea, cada idéia é discutida, portanto, nenhuma idéia permanece simples por muito tempo”. 119 Por outro lado, as novas mídias envolvem todas as novas formas de comunicação com o mercado, incluindo aqui eventos, feiras e patrocínios culturais. O que até bem pouco tempo era definido pela Agência de Propaganda, a partir da análise do briefing, pesquisa e muitas reuniões da equipe de criação com o cliente, hoje é definido, muitas vezes, pelo próprio cliente. “As idéias centrais de novas campanhas têm origem muitas vezes fora das agências, através da utilização, pelo cliente, das novas arenas da comunicação que nada tem a ver com a mídia tradicional” (GRACIOSO, 2008, p. 86). Entretanto, as novas mídias ou as novas arenas da comunicação, exigem que os Comunicadores Sociais sejam ainda mais interados e envolvidos com o universo do cliente e com o próprio mundo em que vivem. Fica claro que as novas mídias envolvem novas posturas de trabalho para um mercado em formação, em que não existe mais espaço para profissionais específicos, limitados em sua formação, conforme assentado anteriormente. Assim, é neste contexto que visualizamos o Comunicador Social, agora com olhar multiprofissional, inter e transdisciplinar, vivendo e experimentando o momento de convergência tecnológica. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Enxergamos a comunicação como um cenário em constante construção. Um campo que, aos poucos, está sendo definido, planejado, reformulado, construído para renascer diferente. As tecnologias digitais proporcionam sensíveis alterações nas formas de produção e transmissão da mercado no gerenciamento e funcionamento das empresas de de trabalho, informação, na atuação dos profissionais no comunicação como um todo. Agora, o receptor é também produtor de conteúdo, a informação é veiculada no segundo seguinte aos acontecimentos e, tanto os profissionais quanto as empresas precisam estar sempre em busca de novas formas de atuação no mercado, utilizando as tecnologias disponíveis. Embora o cenário esteja sendo edificado, enumerar todos os novos meios de comunicação é tarefa quase impossível, sendo que Gracioso (2008, p. 120 71) aborda que são sete as grandes arenas da comunicação: a propaganda tradicional; o varejo como centro de difusão da marca; o mundo da moda e do entretenimento; grandes eventos promocionais; o mundo do esporte; a Internet – varejo digital; o telemarketing e outras formas de venda direta. Acredita-se que todas essas mudanças permitem ao Comunicador Social tornar-se o profissional multimídia consignado neste estudo, capaz de transitar pelo campo da Comunicação com competência, ética, observação das implicações jurídicas existentes, especialmente com respeito aos consumidores, sociedade, empresas, colaboradores, clientes e fornecedores, fortalecendo a confiabilidade entre estas relações existentes. ABSTRACT The demands of the globalized world reveal a period of dramatic change in many areas of knowledge, most of them are caused or offered by technological advances that continually interfere in the way of living and acting of the person. Technological advances, especially with the Internet, have led to new forms of communication, creating space for a new professional, which is no longer just a Journalist, Advertising Executive or Public Relations to become Social media Communicator, a professional can to understand and interact in this new scene in a unique way, leaving the stereotypes that over the years separated the areas of media. This study approach some of the changes that technological advances have enabled the area of communication and the professionals who work in this segment. The exploratory research and literature, supported by national and international references, allowed to subsidize the theoretical issues, providing a critical and dense review, generating reviews and reflections on the multiple challenges of Communication and Social Communicator with regard to new media. Being a Social Communicator is part of a universe expanding, have the ability to analyze and interpret issues, plan and execute tasks related to communication, have extensive knowledge in various areas, with serious and ethical contribution to society. So, the new communication require Social Communicators are even more interest and involvement with the client and the world we live in, and new positions at the work for a market where there isn’t more space for specific professional, limited in their training. What is expected to be a multimedia professional capable of moving the field of communication with competence, ethics, observing the legal implications, especially with respect to consumers, society, businesses, employees, customers and suppliers. Keywords: Communication. Social Communicator. Media. Technology. REFERÊNCIAS BITELLI, M. A. S. O direito da comunicação e da comunicação social. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. 121 BORDENAVE, J. E. D. O que é comunicação. São Paulo: Brasiliense, 1982. CASTELLS, M. A sociedade em Rede: a era da informação: economia, sociedade e cultura. 10. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007. v. 1. CASTRO, C. TV digital: da indústria de conteúdos à busca de novos paradigmas. In: BARBOSA FILHO, A.; CASTRO, C. Comunicação digital: educação, tecnologia e novos comportamentos.São Paulo: Paulinas, 2008. p. 43-60. DIZARD JUNIOR, W. A nova mídia: a comunicação de massa na era da informação. 2. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. GRACIOSO, F. (Org.). As novas arenas da comunicação com o mercado. São Paulo: Atlas, 2008. LÉVY, P. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. Rio de Janeiro: Editora 34, 1993. . Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999. LOPES, A. P. Ética na propaganda. São Paulo: Atlas, 2003. LOPES, L. C. O culto às mídias: interpretação, cultura e contratos. São Carlos: EdUFSCar, 2004. NEGROPONTE, N. Vida digital. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. PEROSANZ, J. J. I. Métodos cuantitativos de investigación em comunicación. Barcelona: Bosch, 2006. POLISTCHUK, I., TRINTA, A. R. Teorias da comunicação: o pensamento e a prática da Comunicação Social. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003. THOMPSON, J. B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. WEINBERGER, D. A nova desordem digital. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. 122 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura TRABALHANDO FRAÇÕES COM HORAS NO EXCEL1. Ellen Cristina Ferreira2, Sandra Fiorelli de Almeida Penteado Simeão3 RESUMO Muitas são as possibilidades de tornar o ensino da Matemática mais atraente e prazeroso para alunos e Professores. Uma delas é a utilização da informática nas aulas de Matemática. Dessa maneira, com o intuito de colaborar com os educadores matemáticos, utilizou-se o software Excel, como uma metodologia diferenciada na elaboração de uma atividade envolvendo as relações entre as Horas para estudo do conteúdo Números Racionais, no 6º ano do Ensino Fundamental. A atividade é composta por uma tabela onde são relacionados os minutos que são frações das Horas. Trata-se de um método diferenciado de tratar este conteúdo, que levará o aluno ao entendimento do conceito e à construção de sua aprendizagem. O aluno é orientado a construir uma tabela com quatro colunas: Hora, Representação, Fração e Leitura. A coluna Hora deverá ser preenchida com os minutos informados pelo professor (ex: 15 minutos). Todas as outras colunas serão preenchidas pelo aluno com fórmulas, determinadas por ele mesmo. Assim, na coluna Representação, aparecerá a fração correspondente ao minuto indicado (ex: ¼); na coluna Fração, o resultado da divisão do numerador pelo denominador (ex: 0,25) e na coluna Leitura, a escrita por extenso da fração (ex: um quarto). Ao lado da tabela, haverá o desenho de um relógio analógico para as visualizações das partes fracionárias. A tecnologia não tem, em si mesma, o poder de produzir mudanças nas realidades educativas, mas a informática educativa propõe seu uso com intencionalidade pedagógica, sendo muito mais que recurso dentro do processo de aprendizagem. O desafio dos professores é introduzir a tecnologia no ensino de Matemática, de maneira que isso venha contribuir com o desenvolvimento intelectual e social do aluno. O uso de uma componente tão presente no dia-a-dia como a Hora aliado à planilha eletrônica, possibilita ao aluno aprender sobre frações, enfatiza a interatividade, a observação, a análise e a formalização das conclusões, permitindo a assimilação do conceito pretendido, e construindo, portanto, sua aprendizagem. Palavras-chave: Informática e matemática. Prática educativa. Frações. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluna do nono semestre do curso de Matemática da Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. 3 Doutorado em Agronomia (Energia na Agricultura) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil (2007). Professora Assistente da Universidade Sagrado Coração. 123 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura MODA E ESTILO UM RESGATE DA VIVÊNCIA ATRAVÉS DA HISTÓRIA DA MODA1. Elza Socorra Yamada Inoue2 RESUMO O universo da moda é tido por muitos como algo volátil; o culto ao supérfluo e a hipervalorização do fútil e do transitório. Nesta linha de raciocínio, a discussão a respeito da moda fica apenas no âmbito dos designers, estilistas, top modelos e dragues queens. Acreditamos que há outra abordagem possível, que trata a moda como espelho da sociedade que a produz, uma abordagem sociológica e antropológica do fenômeno. É interessante notarmos como a moda opera por ciclos, ora adotando um novo estilo, por vezes considerado radical, ora buscando no passado, tendências que possam ser atualizadas ao contexto vigente. O traje feminino aumentou de volume graças a inúmeras anáguas que, por seu peso, dificultava a movimentação a partir do Século XVI. A partir dessa época, surge a invenção do crinolina, armação à base de anéis metálicos flexíveis que substituía com vantagem os saiotes. O envelhecimento é uma fase natural da vida. Pode ser cheio de alegria, bem estar, saúde, energia, amor e solidariedade ou ao contrário ser triste, com doenças, solidão e marginalização. O envelhecimento é um processo normal e pode ser vivido intensamente como qualquer outra época de nossa vida. O contingente de idosos em 2030 vai representar 40% da população na Alemanha, do Japão e da Itália, este, inclusive, o único país no mundo a ter mais pessoas acima de 65 anos do que com menos de 15. A UATI (Universidade Aberta a Terceira Idade) da Universidade do Sagrado Coração tem o objetivo de contribuir para a melhoria de vida e envelhecer saudável das pessoas acima de 50 anos, através de oportunidades de reciclagem cultural, acadêmica, reintegração na sociedade e reestruturação psicológica, que promovem o fortalecimento da cidadania e do envelhecer saudável. A disciplina oferecida baseou-se na moda abrangendo a busca e o conhecimento. Propôs-se uma atividade com o tema "Sob o Império da Crinolina". O assunto despertou interesse e foi confeccionado um vestido e "saiote a moda crinolina". Observou-se uma intensa participação do grupo havendo motivação para o término do trabalho, que foi exposto no setor vivência da Universidade. Palavras – chave: Envelhecimento saudável. Moda. Terceira Idade. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Graduação em Administração pela Universidade do Sagrado Coração, Brasil(2002) Professor Titular da Universidade do Sagrado Coração. 124 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura VARIÁVEIS DO IMPACTO DE UMA INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR NA COMUNIDADE: UM ESTUDO DOS MARCADORES DE QUALIDADE1. Ester Teresa Senger Petroni2, Marcelo Mendes dos Santos3 RESUMO Entre os fazeres pertinentes a Universidade na qualidade de agência formadora de cidadãos e profissionais existem as atividades exercidas na comunidade local e com demanda focada. Intituladas de extensão, não devem estar desvinculadas da produção de conhecimento, para tanto, esta pesquisa está vinculada a um projeto intitulado “Jovem: a USC ao seu lado na escolha profissional”. Nesse sentido o objeto de estudo é o impacto de uma instituição de ensino superior, localizada em uma cidade do centro-oeste paulista, de cunho confessional e comunitária. O objetivo consiste em identificar as variáveis de impacto da universidade na comunidade sob o prisma dos marcadores de qualidade. Participaram desta investigação 110 adolescentes, de ambos os sexos e regularmente matriculados em unidades escolares das redes públicas e particular de Bauru e Região. O instrumento utilizado foi um formulário auto-preenchido com três campos (dados de identificação, primeira opção de curso ou carreira e marcadores de qualidade da instituição). A coleta de dados de forma coletiva e mediante a assinatura de termo de livre consentimento esclarecido. Os procedimentos utilizados foram divididos em etapas: formalização da pesquisa e palestra informativa, coleta de dados e análise (abordagem quantitativa, sob a perspectiva da estatística descritiva e com o suporte do Pacote SPSS for Windows). Por meio da análise dos resultados, foi possível identificar as variáveis de impacto como marcadores de qualidade agrupadas: conceito da instituição/curso e representação social na comunidade. Pode-se assim concluir que para obter valor de uso a premissa do Jovem e a USC juntos na escolha profissional, torna-se necessário considerar os marcadores de qualidade como um dos pontos norteadores para as práticas de acessibilidade de adolescentes e jovens a esta instituição. Outra questão são os estudos dos Serviços de Psicologia Escolar Educacional sob a ótica a mobilização vocacional e processos de decisão/carreira. Palavras-chave: Variáveis. Impacto. Marcadores de qualidade. Extensão. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Mestre em Educação Escolar pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil (2007). Professora e Supervisora na Graduação da Universidade do Sagrado Coração. 3 Professor Integral da Universidade Sagrado Coração – USC, Bauru/São Paulo/Brasil. Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas/São Paulo/Brasil. 125 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ESCOLA: SEMEANDO CONSCIÊNCIA1 Flávia Amadeu de Oliveira2 Vanessa Jaqueline Thomazini3 Maricê Thereza Correa Domingues Heubel 4 José Rafael Mazzoni5 RESUMO A educação ambiental tem por finalidade a disseminação do conhecimento sobre o meio ambiente, a fim de auxiliar na sua preservação e na utilização sustentável de seus recursos. As ações humanas criam uma necessidade de difundir informações sobre as conseqüências das degradações ambientais, suas causas e medidas que minimizem seus efeitos e, a escola é um espaço social de suma importância para a construção do conhecimento a respeito das questões ambientais. Portanto, o presente trabalho teve como objetivo sensibilizar os alunos sobre as ações antrópicas e os impactos ambientais causados e ainda, envolve-los a participar ativamente de ações para preservação do ambiente levando conhecimento teórico e prático na utilização dos recursos que o meio nos fornece, e de como manter esses recursos sempre ativos. O trabalho foi desenvolvido no Colégio Máximo Tia Zi (Agudos, SP), com as turmas do 5°, 6° e 7° anos do Ensino Fundamental. Durante o seu desenvolvimento foram realizadas aulas expositivas e dialogadas com o auxilio de projetor de multimídia e lousa interativa, atividades em campo, palestra, atividades extraclasse e exposição. Os alunos tiveram um caderno de EA onde realizavam as atividades propostas e colocavam suas opiniões a respeito das questões ambientais. Diante disso, os alunos se mostraram interessados em aprender os conteúdos relacionados ao meio em que vivem, fazendo questionamentos e expondo opiniões. A realização do projeto foi de grande importância para os alunos, pois, no decorrer das atividades, compreenderam o quão importante é cuidar do ambiente em que vivem. Palavras-chave: Educação Ambiental. Escola. Meio Ambiente. Preservação. 1 INTRODUÇÃO 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluna da Universidade Sagrado Coração. 3 Aluna da Universidade Sagrado Coração. 4 Doutora em Ciências Biológicas (Genética) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil(2000). Professor adjunto da Universidade do Sagrado Coração. 5 Mestre em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba, Brasil(2001). Professor Titular da Universidade Sagrado Coração. 126 O problema ambiental é mundial. Por muitos anos a sociedade se preocupou em obter vantagens dos recursos naturais, explorar suas reservas, destinar o lixo em lugares inapropriados comprometendo os sistemas ecológicos e vivendo o oposto do conceito de sustentabilidade. Nesse sentido, reflexão sobre as práticas comunitárias, em um contexto marcado pela deterioração ambiental constante, envolve uma necessária articulação com a educação ambiental (JACOBI, 2003). Há muito tempo, o homem necessitava da natureza para sua sobrevivência, seja ela na forma sustentável, através de recursos como caça, defesa, fornecendo uma condição necessária para o suprimento da própria vida, ou de forma exploratória. Atualmente, os seres humanos tentam restabelecer regras que foram básicas para o surgimento das civilizações (OLIVEIRA, 2000). O autor acima disserta que mesmos nos tempos dos primórdios, eram estabelecidos regras de condutas em relação ao ambiente para uma melhor sobrevivência, ou mesmo uma melhor organização na distribuição dos recursos da natureza. Hoje, a distribuição de riqueza, o acesso aos recursos acumulados e aos bens socialmente produzidos são fatores profundamente comprometedores da organização social, das regras de relações e condutas do indivíduo no grupo, como contraposição ao mau uso dos recursos ambientais. Portanto, somos desafiados a procurar mecanismos em que possamos nos tornar indivíduos conscientes e participativos na proteção do meio ambiente do qual fazemos parte (PADUA; TABANEZ, 1998). O panorama da sociedade contemporânea ainda é alarmante, tendo em vista as ações de deterioração ambiental, considerando a urbanização predatória uma contribuição para um aumento dos problemas ambientais nas cidades, acarretando grandes impactos sobre a população (JACOBI, 1998 apud JACOBI, 2003). Nesse sentido, a educação ambiental (EA), um ramo da educação voltado para questões ambientais, poderá contribuir para a mudança de práticas sociais. Assim, os indivíduos, mais próximos de sua realidade, observam o ambiente em que vivem, podendo adquirir conhecimentos e habilidades a fim de uma mudança em sua forma de pensar e agir visando a resolução de problemas ambientais presentes e futuros e, uma melhor qualidade de vida (UNESCO, 1987 apud ADAMS, 2005). Segundo Nardelli e Griffith (2003, p. 242), “a transformação ambiental não é simplesmente estrutural. Envolve também uma mudança de valores, que irá 127 guiar as futuras estratégias”. Uma rede de interações entre a consciência humana, os sistemas sociais e o meio natural é fundamental para percepção de que o meio ambiente não está limitado apenas aos ecossistemas biofísicos visando assim, a sustentabilidade (PUSHER,1997). Jacobi (2003, p. 191) relata que “a preocupação com o desenvolvimento sustentável representa a possibilidade de garantir mudanças sociopolíticas que não comprometam os sistemas ecológicos e sociais que sustentam as comunidades”. As cidades necessitam de políticas ambientais eficazes uma vez que a população urbana cresce a passos largos, acarretando em intensos impactos por conta das ações humanas, como produção de sedimentos, a contaminação das águas por escoamento de esgotos ou lançamento de lixo, comprometendo assim, a sua qualidade (RIBEIRO FILHO; SANTOS, 2008). Contudo, as escolas podem contribuir para mudanças de comportamento e a formação do cidadão, onde informações e práticas educacionais são responsáveis pelos processos de construção e resgate da cidadania dos alunos, levando-os a refletirem sobre suas ações e a compreender qual é o seu papel na sociedade (RIBES, 2000 apud PIRES; BROMBERGER, 2007). Para a ONG Independente Apromac (2009), o aluno continuará seu processo de socialização na escola, onde a vida escolar e as práticas educativas são essenciais para a aprendizagem de comportamentos ambientalmente corretos, auxiliando na formação de cidadãos responsáveis. Nesse sentido, a escola tem por incumbência proporcionar meios para a efetivação da compreensão sobre a temática ambiental, como os fenômenos naturais, as ações humanas e efeitos para consigo, para com os animais e o ambiente em que vivem. Porém, a participação do aluno é fundamental para a efetivação de mudanças de hábitos construtivos, tornando o ambiente mais saudável e contribuindo para uma sociedade mais justa. A educação ambiental está relacionada com as decisões, as éticas, os conceitos de valores para obter um melhor desenvolvimento das habilidades e atitudes em relação ao meio em se vive, sendo o meio cultural, o espaço biofísico e interrelação entre os seres vivos (SATO, 2002). Para isso, o processo de educação ambiental procura estar relacionado nos currículos escolares para um desenvolvimento prático pedagógico ambientalizado (VIEIRA, 2008). 128 Desta forma, o autor acima relata que a perspectiva educativa sobre a educação ambiental deve estar relacionada em todos os parâmetros curriculares, ou seja, envolvendo todas as disciplinas escolares, não como disciplina específica, mas por meio da análise de temas, enfocando as relações entre a humanidade, o meio natural e as relações sociais, de maneira interdisciplinar, conforme preconiza o Plano Nacional de Educação Ambiental - Lei 9795/99. Jacobi (2003, p. 196) cita: a relação entre meio ambiente e educação para a cidadania assume um papel cada vez mais desafiador, demandando a emergência de novos saberes para apreender processos sociais que se complexificam e riscos ambientais que se intensificam. O mesmo enfatiza que o desafio de uma educação ambiental crítica e inovadorade forma a transcender as políticas ambientais e os programas educativos relacionados somente à conscientização, pois estes fazem parte de uma realidade contraditória e geradora de desigualdades. A educação ambiental deve transpor a teoria e partir para a ação voltada para a transformação social. Portanto, vemos a educação como um processo de transformação, transmissão de valores sócio-culturais e um espaço social de suma importância para a construção do conhecimento a respeito das questões ambientais. Diante disso, trabalhamos a conscientização ambiental e envolvemos os alunos para participarem ativamente de ações que auxiliam na preservação do ambiente em que vivem e, conseqüentemente melhorar sua qualidade de vida. 2 OBJETIVOS 2.1 OBJETIVO GERAL O Projeto promoveu o conhecimento sobre educação ambiental no Colégio Máximo Tia Zi (Agudos, SP), com as turmas do 5°, 6° e 7° anos do Ensino Fundamental, por meio do exercício da cidadania na disciplina de Programas de Cidadania da Universidade do Sagrado Coração (Bauru, SP). 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS 129 Envolver os alunos do Ensino Fundamental na preservação do ambiente em que vivem, a partir da educação ambiental; Possibilitar a reflexão em relação as questões ligadas ao meio ambiente; Aplicar estratégias dinâmicas de aprendizagem (atividades), referentes aos temas ambientais abordados. 3 METODOLOGIA O projeto de Educação Ambiental foi desenvolvido na escola de unidade privada da cidade de Agudos (SP), Colégio Máximo Tia Zi. Trabalhamos com informações, orientações, e desenvolvemos métodos para modificar opiniões e hábitos dos alunos, tendo em vista uma melhor qualidade de vida não só para os educandos, mas também, no local de socialização e convivência gerando saúde ambiental na escola, além de ações que possam chegar às suas casas, à comunidade. O trabalho foi desenvolvido com os alunos do Ensino Fundamental (2º ciclo), com enfoque nos principais problemas gerados aos impactos ambientais como: recursos naturais, população, poluição atmosférica, efeito estufa, aquecimento global e lixo (separação e reciclagem). Como forma de avaliar a aprendizagem dos alunos, adotamos um caderno de educação ambiental, onde anotavam o que julgavam importante, redigiam opiniões apresentavam soluções e participavam de suas atividades como questionários, resumos e resenhas críticas. Além disso, algumas avaliações foram realizadas oralmente, de forma dialógica, durante a participação em sala de aula e na execução das atividades. Segundo Dias (1993), a aprendizagem se torna mais significativa se a atividade estiver adaptada concretamente às situações vivenciadas pelo aluno e professor. Com expressar as aulas expositivas e dialogadas, os alunos puderam seus conhecimentos oralmente, na escrita, em forma de dinâmicas 130 (com lousa interativa e gincanas), seminários, estudos de campo (Usina de Reciclagem e Jardim Botânico), e tarefas em grupos, além de exporem suas opiniões no blog ambiental. O Projeto trabalhou assuntos que geraram atividade intelectual, reflexiva e crítica, favorecendo uma melhor compreensão do aluno. 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO Durante o desenvolvimento do projeto, cada atividade realizada foi importante para uma aprendizagem mais efetiva dos alunos ao ponto de mudarem suas opiniões e hábitos para comportamentos ambientalmente corretos. Em relação às atividades realizadas, trabalhamos de forma diversificada sempre explorando as ferramentas oferecidas e correlacionando os temas com o cotidiano do aluno. Nos estudos de campo, tanto na Usina de Reciclagem de Lençóis Paulista (SP), quanto no Jardim Botânico Municipal de Bauru (SP), os alunos demonstraram interesse pelos assuntos, relacionando suas experiências em casa e na escola. Também, na gincana realizada, os alunos puderam mostrar seus conhecimentos sobre poluição, energia, preservação e apresentar soluções para situações-problema apresentadas a eles. Sobre o blog ambiental, os alunos postavam suas redações e comentavam os textos dos seus colegas, estimulando o interesse pelo assunto e favorecendo a construção de opinião crítica. Um dos grupos redigiu uma redação sobre a importância da educação ambiental dizendo: “Ela é muito importante, pois se as pessoas estiverem conscientes sobre os problemas ambientais, ou seja, educados ambientalmente, não irão poluir o meio ambiente, estragar a natureza, jogar lixo em rios e não irão desmatar as florestas, poluir o ar...” (G.A., G.P., J.P., Y.). Além disso, atividades como a produção de cartazes, a realização de uma exposição sobre os animais do cerrado e peças de anatomia evidenciando o surgimento de doenças causadas pelos impactos ambientais antrópicos e realização de palestra sobre ecologia, foram importantes para o processo ensinoaprendizagem do aluno. As atividades desenvolvidas contribuíram para a continuação da busca pelo saber e para ensinar a partir do conhecimento que cada aluno construiu, levando informações, educação e atitude para as suas casas. 131 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS As ferramentas educativas que dispomos, sejam elas tradicionais ou inovadoras, podem colaborar para minimizar os problemas ambientais. Isto destaca a importância da Educação em várias áreas. Como estudantes universitários, sentimos a necessidade de discutir questões ambientais com alunos do ensino fundamental, com a finalidade de promover mudanças de hábitos, para torná-los ambientalmente corretos. As atividades propostas, a partir do Projeto na disciplina de Programas de Cidadania, contribuíram na relação professor-aluno, onde ambos puderam trabalhar de forma dinâmica e trocar de saberes. Foi notório o interesse dos alunos em aprender, principalmente de forma dialogada e interativa. Portanto, foram atividades importantes para o crescimento pessoal de cada aluno, possibilitando desenvolver conteúdos ligados a realidade de cada um, contribuindo assim para uma mudança de opinião, atitudes e comportamentos. Os alunos nos surpreenderam em cada encontro, pois a participação intensiva e dinâmica nos proporcionou a visão da importância de uma educação participativa para a aprendizagem. ABSTRACT The aim of environment education is the spreading of knowledge on environment; purpose to help its preservation and maintainable of the resources. The human action needs to create information about the environment degradation consequence, cause and measure to minimize the effects and the school is a very important social space to knowledge construction of environment questions. Therefore, the aim of this work was to sensitize the student on human action and the environment impact cause and still, to involve the student to participate actively of the actions for environment preservation carrying theorist and experienced knowledge in the utilization of the resource who the environment to provide us, and how maintain they active resource. The work was development in the Maximum College Tia Zi (Agudos, SP), with a basic education group. During their development they had expositive and dialogued lessons with multimedia projector and interactive slate, practice activity, conversation, practice class activity and exposition. The students had an environment education class note where they realize representative activities and put their opinion about their relation on environment questions. After that, the students show more interest in learn more about ambience, doing and expose opinions. The project was very important for students, they could understand the great importance of environment care. 132 Keywords: Environment education. School. Environment. Preservation. REFERÊNCIAS ADAMS. B. G. O que é educação ambiental? 2005. Projeto Apoema- Educação Ambiental. Disponível em: <http://www.apoema.com.br/definicoes.htm>. Acesso em: 12 jun. 2009. DIAS, G. F. Educação ambiental: princípios e práticas. 2. ed. Gaia: São Paulo, 1993. JACOBI, P. et al. (Org.). Educação, meio ambiente e cidadania: reflexões e experiências. São Paulo: SMA, 1998. JACOBI, P. Educação Ambiental, cidadania e sustentabilidade. Cadernos de Pesquisa, n. 118, p. 189-205, 2003. OLIVEIRA, M. E. Educação ambiental uma possível abordagem. 2. ed. Brasília, DF: Ibama, 2000. ONG INDEPENDENTE APROMAC: Associação de proteção ao meio ambiente de Cianorte.Projeto de educação ambiental parque cinturão verde de Cianorte. Disponível em: <http://www.apromac.org.br/ea005.htm>. Acesso em: 10 jun. 2009. PÁDUA, S. M.; TABANEZ, M. F. (Org.). Educação ambiental: caminhos trilhados no Brasil. São Paulo: Ipê, 1998. PIRES, G. A. P.; BROMBERGER, T. M. S. A educação ambiental e o trabalho de cidadania com adolescentes. Rev. Ambiente & Educação, v. 12, 2007. PURSER, R. E. From global management to global appreciation: a transformative epistemology for aperspectival worlds. Organization & Environment, v. 10, n. 4, p. 361- 383, 1997. RIBEIRO FILHO, F.G.; SANTOS, L. P. A questão da coleta seletiva de resíduos sólidos para o município de Teresina-PI. In: SIMPGEO/SP,1., Rio Claro, 2008. Anais... Rio Claro, 2008. 133 RIBES, E. L. Escola e meio ambiente: um intercâmbio produtivo. In: LAMPERT, E. Educação brasileira: desafios e perspectivas para o século XXI. Porto Alegre: Sulina, 2000. SATO, M. Educação Ambiental. São Carlos: Rima, 2002. UNESCO-UNEP. International strategy for action in the field of environmental education and training for the 1990s. Paris: UNESCO e Nairobi, 1987. VIEIRA, S. R. A educação ambiental e o currículo escolar. Rev. Espaço Acadêmico, n. 87, 2008. Disponível em:<http://www.espacoacademico.com.br/083/83vieira.htm>. Acesso em: 11 jun. 2009. APÊNDICE Figura 1 – Colégio Maximo Tia Zi. Figura 3 – Confecção de cartazes. Figura 2 – Visita à Usina de Reciclagem. Figura 4 – Atividade na lousa Interativa. 134 Figura 5 - Visita ao Jardim Botânico Figura 6 – Encerramento. AGRADECIMENTOS Somos gratas a todos os que participaram direta ou indiretamente, auxiliandonos na execução desse projeto, dentre os quais destacamos: Às crianças que com sua luz, imaginação, entusiasmo e doçura conseguem transformar-nos em cidadãos melhores. Ao Colégio Máximo Tia Zi (Agudos, SP), sua direção, professores e funcionários pela acolhida, pelo cuidado e interesse em projetos educacionais que auxiliam na aprendizagem de seus alunos. Ao Prof. Ms. José Rafael Mazzoni pela brilhante orientação, onde pudemos aprender a importância de exercer a cidadania. A Profa. Dra. Maricê Thereza C. D. Heubel, pelo apoio incondicional aos seus alunos, incentivando-nos em nossos projetos. Seu dinamismo e motivação são contagiantes e nos impulsiona para o saber. 135 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura USO DO PERCURSO GERATIVO DE SENTIDO COMO ESTRATÉGIA PARA A INTERPRETAÇÃO DO CONTO DE MUITO PROCURAR1 Gabriela Zumiani Navarro2 No intuito de analisar o conto infantojuvenil De Muito Procurar, da reconhecida escritora ítalo-brasileira Marina Colasanti, utilizou-se o Percurso Gerativo de Sentido, teoria do lexicólogo lituano Algirdas Julien Greimas como metodologia para a interpretação da narrativa. O texto foi destrinchado e analisado nos níveis fundamental, narrativo e discursivo, resultando na compreensão de que o conto é uma metáfora das transformações por que passam os homens ao se relacionar. Julgou-se fundamental a utilização do Percurso Gerativo de Sentido como instrumentação para a compreensão da obra da autora Marina Colasanti e acreditase que, para se obter melhor resultado, o estudo merece ter continuidade. Palavras-chave: Análise do discurso. Percurso gerativo de sentido. Literatura infantojuvenil. 1 INTRODUÇÃO A escritora e artista plástica Marina Colasanti, nascida no ano de 1937 em Asmara, colônia italiana localizada na Eritreia, foi criada na Itália e radicou-se no Brasil em 1948. Aqui, Colasanti estudou Belas Artes, atuou como publicitária, apresentadora de TV, jornalista, tradutora – traduziu importantes obras da literatura italiana para o português – e produziu diversas obras literárias, sendo autora de 33 livros que abrangem ensaios, contos e obras infantis e infantojuvenis. De reconhecimento nacional e internacional, Colasanti foi premiada em diversas ocasiões em concursos de grande porte como no ano de 1994, em que ganhou dois prêmios Jabuti, oferecido pela Câmara Brasileira do Livro e considerado a maior premiação literária do Brasil, com os livros “Rota de colisão” e “Ana Z, aonde 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Bacharel em Biblioteconomia pela Universidade Estadual Paulista. Cursando Letras na Universidade do Sagrado Coração. 136 vai você?”. Além disso, foi novamente agraciada com o prêmio, em 1997, pelo livro “Eu sei mas não devia” (COLASANTI, 2005, p. 221-222) . O conto que será analisado neste trabalho é parte integrante do livro “23 histórias de um viajante”, publicado no ano de 2005. De temática significativa, pois a autora demonstra em seu livro o duplo olhar desenvolvido pelas inúmeras viagens realizadas, em que se reconhece como parte integrante da realidade, mas é, ao mesmo tempo, alheia ao que a circunda, Colasanti traz a história de um jovem príncipe que, assolado pelo medo, cerca-se de altas muralhas e passa a vida isolado com sua pequena corte, até o dia em que recebe a visita de um cavaleiro viajante que necessita atravessar as terras do monarca para chegar ao seu destino. Ao final do jantar em companhia do viajante, o príncipe lhe pede que conte histórias ouvidas e presenciadas em suas andanças, em que é prontamente atendido. Realizado com a aventura ouvida, o príncipe resolve acompanhar o viajante até a fronteira mais distante, de forma a desfrutar de suas histórias. Dentre todas as histórias contadas, destaca-se o 14ª conto, intitulado “De muito procurar”, pela beleza da narrativa e pelo desenrolar dos fatos, inesperados e impactantes. Sucinta, a autora soube escolher os gestos reveladores das personalidades e da ação, num jogo de mostra e esconde, de minúcias e mistério. Por essas características escolheu-se o conto para ser esmiuçado utilizando-se da aplicação do Percurso Gerativo de Sentido, teoria do lexicólogo lituano Algirdas Julien Greimas. 2 PERCURSO GERATIVO DE SENTIDO Segundo Fiorin (1999), Greimas acreditava que a significação constituía o problema central das ciências humanas e, diante dessa constatação, buscou construir uma semântica que não se interessasse pela veridicção dos enunciados, mas sim pelos efeitos de sentido de verdade com os quais um discurso se apresentava. Para tanto julgava que a semântica deveria ser gerativa, sintagmática e geral. Ela é geral porque é está presente em qualquer tipo de texto, independentemente da linguagem em que se manifesta (FIORIN, 2008, p.16). É sintagmática porque estuda a produção e a interpretação dos textos buscando detectar as diferenças produtoras de sentido nos mesmos (FIORIN, 1999). E, finalmente, é gerativa “[...] porque concebe o processo de produção do texto como 137 um percurso gerativo, que vai do mais simples e abstrato ao mais complexo e concreto, num processo de enriquecimento semântico.” (FIORIN, 1999). A partir dessas noções, Greimas pôde descrever o percurso gerativo de sentido, que se constitui de uma sucessão de patamares que mostram como se produz e interpreta o sentido, indo do mais simples ao mais complexo (FIORIN, 2008, p. 20). Esses patamares são estruturados em três níveis, sendo eles o profundo (ou fundamental), narrativo e discursivo, possuindo, cada um, componentes sintáxicos e semânticos (FIORIN, 2008, p. 20) que, na teoria do discurso, contrapõem-se um ao outro. Assim, a sintaxe seria a responsável por determinar um conjunto de regras que estruturam o conteúdo no discurso, produzindo determinados sentidos conforme a combinatória dos elementos (FIORIN, 2008, p. 20-21), enquanto que “a semântica discursiva abarca os conteúdos que são investidos nos moldes sintáticos abstratos.” (FIORIN, 2006, p. 18). As diferenças entre elas residem principalmente no fato de a sintaxe discursiva ter maior autonomia em relação às formações sociais e representar o campo da manipulação consciente, enquanto que a semântica discursiva depende mais diretamente de fatores sociais e constitui o campo da determinação ideológica do discurso, sendo predominantemente inconsciente (FIORIN, 2006, p.18-19). Para aprofundar a compreensão do percurso gerativo de sentido, iremos descrever seus níveis: Nível fundamental: representa o início da instância do percurso gerativo e engloba as categorias semânticas que ordenam, de forma mais geral, os diversos conteúdos do texto. Essas categorias são os elementos mais simples e abstratos responsáveis pela ordenação do texto, porém sua compreensão é fundamental para se analisar as especificidades de alguns textos, como os que possuem sua sintaxe fundamentada pela presença de termos complexos ou neutros. No entanto, estabelecer a categoria da base do texto não é o objetivo último da análise textual, que deve remontar aos níveis mais concretos e complexos do percurso gerativo de sentido (FIORIN, 1999). Porém, neste nível é importante que analisemos qualificações semânticas que os elementos semânticos recebem na narrativa, adquirindo traços positivos ou negativos, ou mais precisamente, tornando-se eufóricos ou disfóricos, pois esse é um dado fundamental para a análise no nível narrativo. Nível narrativo: é segundo patamar do discurso, porém convém não confundir narratividade com narração, uma vez que aquela é componente de todos os textos e 138 essa se relaciona a uma determinada classe de textos (FIORIN, 2008, p. 27). Assim, mesmo que não seja uma narração o texto possui narratividade, que pode ser entendida como “[...] uma transformação situada entre dois estados sucessivos e diferentes. Isso significa que ocorre uma narrativa mínima, quando se tem um estado inicial, uma transformação e um estado final.” (FIORIN, 2008, p. 27-28). No estudo da sintaxe narrativa há dois tipos de enunciados elementares: os primeiros são enunciados de estado, que estabelecem relações de junção (conjunção ou disjunção) e os segundos são enunciados de fazer, que mostram as transformações de um estado ao outro (FIORIN, 2008, p. 28). Como existem dois tipos de enunciados de estado, existem também dois modos de narrativas mínimas, uma de privação, em que o estado inicial é conjunto e finaliza disjunto, e a outra de liquidação, em que o estado inicial é disjunto e o final, conjunto (FIORIN, 2008, p. 28-29). Porém, os textos não constituem narrativas mínimas, mas são narrativas complexas, apresentando uma série de enunciados, de estado e de fazer, organizados hierarquicamente. Por isso, os textos articulam-se numa sequência canônica de quatro fases, que tendem a aparecer sequencialmente, ainda que nem sempre ocorram rigorosamente em ordem, uma vez que existem inúmeras possibilidades de construção de um texto, e que muitas vezes algumas etapas acabam ocultas, ficando implícitas, ou inexistam, pelo fato de a narrativa não se realizar completamente (FIORIN, 2008, p. 32-33). Na etapa de manipulação “[...] um sujeito age sobre outro para levá-lo a querer e/ou dever fazer alguma coisa”. (FIORIN, 2008, p. 28), gerando um contrato entre as funções sintáxicas de “destinador-manipulador” e “destinatário-manipulado”, mesmo que, ao final, a manipulação não se consolide – já que o que importa é o esforço em completar a manipulação (TATIT, 2002, p. 191). Nesta fase é fundamental verificar como se dá a articulação dos verbos, uma vez que eles constituem a dinâmica modal do texto e definem a relação do sujeito com seus objetos e com outros sujeitos (TATIT, 2002, p.191). Para compreender melhor a noção da modalidade dos verbos é preciso ter ciência que para manipular um sujeito deve-se interferir na sua competência modal (TATIT, 2002, p. 191). Existem diversos tipos de manipulação, mas tratar-se-ão aqui dos mais comuns, tendo como exemplo o caso de uma mãe que tenta fazer o filho fazer a lição de casa: 139 Segundo Tatit (2002, p. 191), no caso da sedução, o sujeito sabe fazer querer fazer, como aparece em “Hoje vou ajudá-lo com sua tarefa porque sei que está atribulado.” Por sua vez, na tentação o sujeito pode fazer querer fazer, como se nota em “Se você fizer a tarefa poderá jogar videogame depois.” (TATIT, 2002, p. 191). Já no caso da provocação, o sujeito sabe fazer dever fazer, como em “Sei que você não é capaz de resolver toda sua tarefa porque é preguiçoso demais.” (TATIT, 2002, p. 191-192). Enquanto que na intimidação, o sujeito pode fazer dever fazer, ao fazer uma ameaça, como “Se você não fizer a tarefa não sairá com suas amigas.” (TATIT, 2002, p. 192). Destaca-se, porém, que há mais chance da manipulação funcionar se ocorrer dentro do mesmo quadro axiológico, ou seja, se as personagens compartilharem os mesmos valores (TATIT, 2002, p. 192). Na etapa da competência, o sujeito que fará a ação transformadora central da narrativa será dotado de um saber e/ou poder fazer para que a ação se concretize efetivamente na etapa da performance (FIORIN, 2008, p. 30 - 31). Derradeiramente, tem-se a etapa da sanção, em que se constata que a performance se realizou e, consequentemente, reconhece-se o valor do sujeito que operou a transformação central (FIORIN, 2008, p. 31). Nesta etapa serão distribuídos os prêmios e castigos e, a partir do confronto entre o que é “verdade” e o que “parece ser”, ocorrerá o julgamento da ação, independentemente do que tenha ocorrido. Assim, cada texto construirá sua coerência interna, de acordo com os contratos assumidos pelos sujeitos da ação do texto (TATIT, 2002, p. 196). Nível discursivo: o terceiro nível, “[...] é aquele em que se revestem as estruturas narrativas abstratas.” (FIORIN, 1999), de forma a lhes dar concretude. Pode-se exemplificar esse patamar da seguinte maneira: na estrutura narrativa um sujeito A, que estava em conjunção com o objeto dinheiro e entra em disjunção com ele, sua concretização poderia ser como perda, caso o operador da disjunção tenha sido o próprio sujeito A, ou como roubo, no caso do operador da disjunção ter sido um outro sujeito. Esse é o primeiro nível de concretização de uma estrutura narrativa e pode ser sucedido por uma nova concretização. Neste segundo caso, o roubo pode ter sido efetivado com a ameaça da vítima por uma arma de brinquedo ou por uma arma verdadeira. Têm-se assim os dois níveis de concretização das estruturas narrativas, sendo o primeiro temático, por ser composto predominantemente de 140 temas (termos abstratos3), e o segundo figurativo, por ser composto 4 predominantemente de figuras (termos concretos ). Assim, todos os textos têm sua estrutura narrativa tematizada, que pode, ou não, ser figurativizada (FIORIN, 2008, p. 90). As diferenças entre os textos temáticos e figurativos aparecem também no seu emprego, uma vez que se usam os textos temáticos para explicar o mundo, como no caso das dissertações, e os textos figurativos para criar simulacros do mundo, como nas descrições e narrações (FIORIN, 1999). Porém convém não esquecer que nenhum texto é exclusivamente temático ou figurativo, mas apenas adota majoritariamente um dos traços (FIORIN, 2006, p. 24). Segundo Fiorin (2008, p. 96) para se compreender um texto figurativo é fundamental depreender os temas que subjazem às figuras, só que isso não ocorre com a análise das figuras isoladamente. Só se localizam os temas a partir das relações estabelecidas entre as figuras, que se chamam percursos figurativos, uma vez que “[...] as figuras estabelecem entre si relações, formam uma rede. Aliás, devemos ter sempre presente que texto quer dizer tecido.” (FIORIN, 2008, p. 97). O mesmo acontece com os temas, que constituem percursos temáticos e podem ser figurativizados de diferentes maneiras - desde que o texto mantenha sua coerência interna (FIORIN, 2008, p. 104). Já que, para Fiorin (2008, p. 106), não é pertinente analisar isoladamente figuras ou temas, deve-se então recorrer à análise dos encadeamentos dos percursos figurativos e/ou temáticos. Neste caso entram em questão as diferentes leituras de um texto, que estão inscritas no próprio texto e não resultam, como acreditam alguns, da subjetividade do leitor, mas sim das organizações semânticas que se entrecruzam e superpõem no texto (FIORIN, 1999). Assim, é importante saber que “O que dá coerência semântica ao texto e faz dele uma unidade é a reiteração, a redundância, a repetição, a recorrência de traços semânticos ao longo do discurso.” (FIORIN, 2008, p. 112), fenômeno que a semiótica chama isotopia e que é capaz de determinar um dado plano de leitura, como no exemplo apresentado por Tatit (2002, p. 194-195), em que algumas ações irão definir o papel temático das personagens, que são compostas por figuras. Dessa forma o tema “vadio” pode ser 3 Os termos abstratos remetem a elementos não-presentes no mundo natural, mas que atuam como categorias ordenadoras dos fatos observáveis, como, por exemplo: amor, lealdade, alegria (FIORIN, 2006, p. 24) 4 Os termos concretos remetem a elementos do mundo natural e aqueles construídos, como, por exemplo, mulher, casa, mesa (FIORIN, 2008, p. 91). 141 representado pelas figuras “beber”, “cantar”, “olhar as mulheres”, “ficar nos bares”, que constituem uma isotopia figurativa, ou seja, as figuras utilizadas cedem parte de sua significação em prol de uma categoria mais ampla, em que convergem para o mesmo sentido. Já no caso da isotopia temática, ela é composta pelo conjunto de diversas isotopias figurativas. Tendo compreendido a aplicação do percurso gerativo de sentido, e antes de partir para a análise do conto selecionado, deve-se apenas ressaltar que o percurso [...] não é uma camisa de força, em que se devem enfiar todos os textos, mas um modelo de análise e de previsibilidade, que, ao mesmo tempo, expõe generalizações sócio-históricas (invariantes) e especificidades de cada texto (variantes). (FIORIN, 1999). 3 ANÁLISE DOS DADOS No conto De muito procurar temos a história de um homem que passava a vida olhando para baixo, à procura de objetos que os outros perdiam. Ele era um homem insignificante na sociedade e só era notado quando as pessoas precisavam dele. Aos poucos, no entanto, sua fama de descobridor de objetos perdidos se espalhou pela cidade e ele recebeu a visita de uma mulher que lhe pediu ajuda para encontrar o juízo que perdera. Como não sabia concretamente o que procurar, o homem começou a levar a mulher em suas andanças. Ainda era outono quando a busca teve início. Paulatinamente, a mulher que nunca olhava para baixo passou a levar o homem para lugares cada vez mais desconhecidos e rurais, em que ele se distraía e brincava, ao mesmo tempo em que se envolvia com o barulho dos sapatos da mulher. Foi quando, finalmente, chegou a primavera, o homem colheu a primeira violeta da estação para presentear a mulher e levantou a cabeça para entregá-la. Nesse momento, o homem descobriu que acabara de perder o juízo. Tem-se no nível fundamental a principal oposição do texto que permitirá a dedução das transformações entre as qualificações semânticas das principais categorias do texto. Essa oposição baseia-se nos valores de juízo e não juízo, atribuídos, respectivamente, aos personagens homem e mulher. Neste nível, notamos que o texto que se inicia eufórico, pois o personagem tem uma característica positiva (juízo), e finaliza disfórico, pois ao final da narrativa passa a estar em disjunção com o juízo. Graças a essa qualificação, o texto terá uma 142 estrutura narrativa mínima de privação. Para visualizarmos esse processo, iremos dissecar a história nas etapas da sequência canônica, no nível narrativo: Na fase de manipulação temos a mulher que pede ajuda ao homem para ajudá-la a encontrar o juízo perdido, utilizando-se da sedução. No entanto, para encontrá-lo, o homem precisa da mulher, que é quem lhe orientará em sua busca e representará a etapa da competência. Neste conto, a etapa da manipulação retornará após a fase da competência, pois, ainda que de forma inconsciente, a mulher prolonga a sedução do homem ao levá-lo a lugares desconhecidos e oferecer a ele novas experiências. A performance se concretiza no momento em que o homem colhe a primeira violeta da primavera e a entrega a mulher, ainda que a flor não fosse o que procuravam. Nesse momento o homem se dá conta de que havia, também, perdido o juízo, que é a sanção da narrativa. Não se pode, no entanto, analisar a narração apenas pelos níveis fundamental e narrativo, pois através dos dados colhidos seria possível fazer uma análise equivocada do texto, como notamos no caso de se interpretar o texto por sua estrutura mínima, de privação, que requer um final disfórico. Ainda que estruturalmente se apresente como disfórico, através da análise profunda dos temas subjacentes às figuras, notamos que o conto tem um final eufórico, ao relacioná-lo com os valores iniciais vinculados às isotopias do homem à procura (através das expressões cabeça baixa, atenção, ancorá-lo, silencioso, discreto, desapercebido, via longe) e aos valores finais da mulher sem juízo (presente nas expressões não estava afeita a abaixar a cabeça, os passos dela já não batiam ao seu lado, taquetaque dos saltos, cabeça para o alto). 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Podemos interpretar a história como sendo uma metáfora das transformações que sofremos ao nos relacionarmos. O homem, antes solitário, rígido e inserido numa rotina medíocre, passa a conviver com o diferente e a experimentar novas vivências, através da companhia de uma mulher livre. A liberdade surge, então, como um importante valor para a vida, que deveria ser vivida com mais leveza. 143 Nota-se que o emprego do Percurso Gerativo de Sentido auxiliou no processo de interpretação do conto De muito procurar, fornecendo o embasamento teórico para a realização de uma análise profunda e crítica que nos permitiu questionar os valores sociais e a relativizá-los, pois notamos que, contrariando o senso comum, perder o juízo nem sempre é prejudicial, assim como mantê-lo ao extremo pode ser limitante. Para concluir, sugere-se que a pesquisa tenha continuidade e englobe os demais contos do livro, já que o conto é parte integrante de uma coletânea, de forma a encontrar os temas que compõem as figurações da temática histórias de viajante e a “fechar” a história que entremeia os contos. USE OF GENERATIVE COURSE OF MEANING AS A STRATEGY FOR THE INTERPRETATION OF DE TANTO PROCURAR To investigate the tale young literature much searching, the renowned ItalianBrazilian writer Marina Colasanti, we used the Generative Course of meaning, theory made by lexicographer Lithuanian Algirdas Julien Greimas and methodology for the interpretation of the narrative. The text was sprawled and analyzed at the elementary, discursive and narrative, resulting in the realization that the story is a metaphor for the changes experienced by men to relate to. It was deemed essential to use the Generative Course fo Meaning as instrumentantation for understanding the work of the author Marina Colasanti and it is believed that in order to obtain better results, the study deservers to be continued. Keywords: Discourse analysis. Generative Course of Meaning. Young literature. REFERÊNCIAS COLASANTI, Marina. 23 histórias de um viajante. São Paulo: Global, 2005. FONSECA, André Azevedo da. Letras femininas: Marina Colasanti fala sobre literatura, vida, amor e feminismo. Disponível em: <http://azevedodafonseca.sites.uol.com.br/0514col1.html>. Acesso em: 04 dez. 2009 FIORIN, José Luiz. Elementos de análise do discurso. 14. ed. São Paulo: Contexto, 2008. 126 p. 144 ______. Linguagem e ideologia. 8. ed. São Paulo: Ática, 2006. 87 p. (Série Princípios, 137) ______. Sendas e veredas da semiótica narrativa e discursiva. Delta: Documentação de Estudos em Lingüística Teórica e Aplicada, São Paulo, v. 15, n. 1, p. 1-20, fev./jul. 1999. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010244501999000100009&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt>. Acesso em: 25 set. 2006. TATIT, Luiz. Abordagem do texto. In: FIORIN, J. L. (Org.). Introdução à lingüística: objetos teóricos. São Paulo: Contexto, 2002. p. 187-209. ANEXO A COLASANTI, Marina. De muito procurar. In: ______. 23 histórias de um viajante. São Paulo: Global, 2005. p.131-135. Aquele homem caminhava sempre de cabeça baixa. Por tristeza, não. Por atenção. Era um homem à procura. À procura de tudo o que os outros deixassem cair inadvertidamente, uma moeda, uma conta de colar, um botão de madrepérola, uma chave, a fivela de um sapato, um brinco frouxo, um anel largo demais. Recolhia, e ia pondo nos bolsos. Tão fundos e pesados, que pareciam ancorá-lo a terra. Tão inchados, que davam contornos de gordo à sua magra silhueta. Silencioso e discreto, sem nunca encarar quem quer que fosse, os olhos sempre voltados para o chão, o homem passava pelas ruas despercebido, como se invisível. Cruzasse duas ou três vezes diante da padaria, não se lembraria o padeiro de tê-lo visto, nem lhe endereçaria a palavra. Sequer ladravam os cães, quando se aproximava das casas. Mas aquele homem que não era visto, via longe. Entre as pedras do calçamento, as rodas das carroças, os cascos dos cavalos e os pés das pessoas que passavam indiferentes, ele era capaz de catar dois elos de uma correntinha partida, sorrindo secreto como se tivesse colhido uma fruta. À noite, no cômodo que era toda a sua moradia, revirava os bolsos sobre a mesa e, debruçado sobre seu tesouro espalhado, colhia com a ponta dos dedos uma ou outra mínima coisa, para que à luz da vela ganhasse brilho e vida. Com isso, faziase companhia. E a cabeça só se punha pra trás quando, afinal, a deitava no travesseiro. Estava justamente deitando-se, na noite em que bateram à porta. Acendeu a vela. Era um moço. Teria por acaso encontrado a sua chave? Perguntou. Morava sozinho, não podia voltar pra casa sem ela. Eu... esquivou-se o homem. O senhor, sim, insistiu o moço acrescentando que ele próprio já havia vasculhado as ruas inutilmente. Mas quem disse... resmungou o homem, segurando a porta com o pé para impedir a entrada do outro. 145 Foi a velha da esquina que se faz de cega, insistiu o jovem sem empurrar, diz que o senhor enxerga por dois. O homem abriu a porta. Entraram. Chaves havia muitas sobre a mesa. Mas não era nenhuma daquelas. O homem então meteu as mãos nos bolsos, remexeu, tirou uma pedrinha vermelha, um prego, três chaves. Eram parecidas, o moço levou as três, devolveria as duas que não fossem suas. Passados dias bateram à porta. O homem abriu, pensando fosse o moço. Era uma senhora. Um moço me disse... começou ela. Havia perdido o botão de prata da gola e o moço lhe havia garantido que o homem saberia encontrá-lo. Devolveu as duas chaves do outro. Saiu levando seu botão na palma da mão. Bateram à porta várias vezes nos dias que se seguiram. Pouco a pouco espalhavase a fama do homem. Pouco a pouco esvaziava-se a mesa dos seus haveres. Soprava um vento quente, giravam folhas no ar, naquele fim de tarde, nem bem outono, em que a mulher veio. Não bateu à porta, encontrou-a aberta. Na soleira, o homem rastreava as juntas dos paralelepípedos. Seu olhar esbarrou na ponta delicada do sapato, na barra da saia. E manteve-se baixo. Perdi o juízo, murmurou ela com voz abafada, por favor, me ajude. Assim, pela primeira vez, o homem passou a procurar alguma coisa que não sabia como fosse. E para reconhecê-la, caso desse com ela, levava consigo a mulher. Saíam com a primeira luz. Ele trancando a porta, ela já a esperá-lo na rua. E sem levantar a cabeça – não fosse passar inadvertidamente pelo juízo perdido – o homem começava a percorrer rua após rua. Mas a mulher não estava afeita a abaixar a cabeça. E andando, o homem percebia de repente que os passos dela já não batiam ao seu lado, que seu som se afastava em outra direção. Então parava, e sem erguer o olhar, deixava-se guiar pelo taquetaque dos saltos, até encontrar à frente a ponta delicada dos sapatos e recomeçar, junto deles, a busca. Taque-taque hoje, taque-taque amanhã, aquela estranha dupla começou a percorrer caminhos que o homem nunca havia trilhado. Quem procura objetos perdidos vai pelas ruas mais movimentadas, onde as pessoas se esbarram, onde a pressa leva à distração, ruas onde vozes, rinchar de rodas, bater de pés, relinchos e chamados se fundem e ondeiam. Mas a mulher que andava com a cabeça para o alto ia onde pudesse ver árvores e pássaros e largos pedaços de céu, onde houvesse panos estendidos no varal. Aos poucos, mudavam os sons, chegavam ao homem latidos, cacarejar de galinhas. O olhar que tudo sabia achar não parecia mais tão atento. O que procurar afinal entre fios de grama senão formigas e besouros? Os bolsos pendiam vazios. O homem distraía-se. Um caracol, uma poça d´água prendiam sua atenção, e o vento lhe fazia cócegas. Metia o pé na pegada achada na lama, como se brincasse. Taque-taque, conduziam-nos os pés pequenos, dia após dia. Taque-taque, crescia aquele som no coração do homem. Achei! Exclamou afinal. E a mulher sobressaltou-se. Achei! Repetiu ele triunfante. Mas não era o que haviam combinado procurar. Na grama, colhida agora entre dois dedos, o homem havia encontrado a primeira violeta da primavera. E quando levantou a cabeça e endireitou o corpo para oferecê-la a ela, o homem soube que ele também acabava de perder o juízo. 146 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura ESCALA DE ESTRESSORES TRÂNSITO (ESET): CONSTRUÇÃO E ESTUDO DAS QUALIDADES PSICOMÉTRICAS1. Hugo Ferrari Cardoso2, Marcelo Mendes Dos Santos3. Thelma Margarida Mendes Dos Santos4 RESUMO O contexto do trânsito têm se tornado uma grande preocupação da população em geral e da ciência, pois é sabido que nesse meio existem estressores, considerados como fatores desencadeantes de comportamentos externalizantes no condutor e que perpassa tanto pelas condições da via, do veículo, do ambiente e condutor. A partir dessas idéias apresentadas a presente pesquisa teve como objetivos construir e buscar evidências de validade e precisão de uma medida psicológica. Participaram deste estudo 461 sujeitos, entre 18-80 anos, de ambos os sexos, provenientes de 41 municípios do interior do estado de São Paulo. O instrumento utilizado foi a Escala de Estressores do Trânsito (ESET), com 72 itens, do tipo Likert e 5 pontos.A coleta de dados ocorreu de modo individual e mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Os procedimentos para análise dos dados foram: análise fatorial exploratória e teste de fidedignidade (Alfa de Cronbach). No processo de análise dos dados percebeu-se que o conjunto de itens construído era passível de fatorabilidade, pois apresentou índice de KaiserMeyer-Olkim adequado. Os resultados alcançados após análise fatorial permitiram evidenciar validade de construto dos 72 itens construídos na versão original sendo que permaneceram 37, explicando 62,17% da variância do construto, com as cargas fatoriais acima de 0,40 e confiabilidade de 0,96. A ESET ficou com os seguintes fatores: Veículo (%&%=0,96), composto por 19 itens; Condutor (%&%=0,87), por sete itens; Vias (%&%=0,80), por sete itens; Ambiente (%&%=0,83), por quatro itens. Discute-se a importância da construção de um instrumento psicológico que avalie os estressores no trânsito, uma vez que há carência na literatura nacional. A consecução dos objetivos propostos abriu possibilidade para a continuidade dos estudos utilizando a ESET, visando outras evidências de validade, normatização e futuramente o envio para a avaliação do Conselho Federal de Psicologia para aprovação com fins de comercialização. Palavras-chave: Avaliação psicológica. Construção de instrumento psicológico. Estresse. Psicologia do trânsito. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Professor convidado do curso de Especialização em Psicologia do Trânsito da Universidade Sagrado Coração - USC, Bauru/SP/Brasil. Mestre em Avaliação Psicológica pela Universidade São Francisco – Itatiba/São Paulo/Brasil. 3 Professor Integral da Universidade Sagrado Coração – USC, Bauru/São Paulo/Brasil. Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas/São Paulo/Brasil. 4 Professora Integral da Universidade Sagrado Coração – USC, Bauru/São Paulo/Brasil. Mestre em Avaliação Psicológica pela Universidade São Francisco – Itatiba/São Paulo/Brasil. 147 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura REPRESENTAÇÕES MIDIÁTICAS SOBRE A MULHER IMAGINÁRIO PORTUGUÊS1. Jéssica De Cássia Rossi2 BRASILEIRA NO RESUMO As principais representações sobre a mulher brasileira no imaginário português se sustentam, inicialmente, nas referências do período colonial do Brasil. A colonização lusitana foi predominantemente de homens que se aproveitaram da mulher indígena e negra para satisfazer suas necessidades sexuais. A grande presença de mulheres "tropicais", associadas ao sexo e à nudez no período colonial pelos portugueses, relaciona o Brasil como um lugar voltado para a satisfação do prazer. Essa herança colonial permanece viva nos relatos históricos sobre as relações entre os dois países e são reforçadas na atualidade pela mídia por meio da tropicalização como uma característica brasileira. Ocorre a comercialização do local, da História, da paisagem, das performances culturais e mesmo da corporalidade dos brasileiros por meio de um processo de marketing que explora a especificidade do país. A venda desse tipo de conceito sobre o Brasil traz muitos prejuízos às mulheres imigrantes brasileiras em Portugal. Atualmente, a presença de imigrantes brasileiros no país é considerável, em torno de 70 mil. Acreditamos que as pessoas podem utilizar tais representações veiculadas pela mídia para forma suas idéias em relação à mulher brasileira. Isso pode exercer significativa influencia no imaginário português e nas relações sociais, como a discriminação existente em relação às mulheres imigrantes brasileiras que são associadas à prostituição e a clandestinidade. Por isso, nosso trabalho identifica algumas representações midiáticas sobre a mulher brasileira que influenciam o imaginário português. Utilizamos as Teorias do Jornalismo para refletirmos sobre a forma como ocorre a produção de sentido por meio de um estudo de caso sobre o tema em questão. As principais considerações levantadas sobre o tema servem de subsídios que sustentam a pesquisa de mestrado em andamento sobre como as notícias do jornal Expresso de Portugal (des)constroem as representações da mulher brasileira no imaginário português. Palavras-chave: Mulher brasileira. Representações midiáticas. Imaginário português. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Professora Bolsista do Curso de Relações Públicas da UNESP/FAAC – Bauru Mestranda em Comunicação Midiática da UNESP/FAAC – Bauru, com bolsa de pesquisa financiada pela FAPESP. Graduação em Relações Públicas na UNESP/FAAC – Bauru. 148 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura REFLEXÕES SOBRE OS GÊNEROS FOTOGRÁFICOS EM CANUDOS 100 ANOS1. Joyce Guadagnucci2 RESUMO Em julho de 1839, Louis-Jacques Mandé Daguerre vendia ao governo francês, em troca de uma pensão vitalícia, seu invento, o daguerriótipo. Era o primeiro processo fotográfico realmente reconhecido pelos órgãos públicos. Porém, a partir do daguerriótipo não era possível fazer cópias, as imagens eram únicas. Mais de 100 anos se passaram e aquilo que se conseguia após uma série de procedimentos, hoje se consegue em apenas alguns segundos. As câmeras digitais estão em todos os lugares, em todas as mãos, o que poderia até ser considerado um fator positivo, mas o excesso nunca foi uma vantagem. Imagens circulam abundantemente, protótipos de fotógrafos disparam suas máquinas aleatoriamente, sem distinção, nem objetivo, qualquer coisa pode ser clicada, aliás, tudo vira qualquer coisa neste universo. Diante deste quadro, é que este trabalho se configura. Como é possível recuperarmos nossa visão num universo onde a proliferação desmedida de imagens nos joga para a escuridão? Para alcançar tal reflexão esta pesquisa se debruçou sobre duas práticas fotográficas já muito consagradas; as práticas do fotojornalismo, aqui entendida como a atividade daquele que realiza as fotografias que acompanham as notícias dos jornais diários; e do fotodocumentarismo, atividade voltada para o aprofundamento de temas intemporais. Tais atividades foram discutidas a partir da análise das fotografias do livro Canudos 100 anos, de Evandro Teixeira. O referencial teórico perpassou principalmente por Dubois (1999;2000), Kossoy (2002), Flusser (2002), Sousa (2000; 2004), Freund (1995), Alvarenga (1994). O que se buscou com esta pesquisa não foi corroborar as classificações já consagradas das práticas, mas tomá-las com estranhamento a fim de se ver além delas. Ver as fotografias no que elas têm de singular, em seu potencial de representação e de como pode ser explorado por um fotógrafo, seja ele fotojornalista, artista, amador, ou mesmo por um educador. Discutindo as classificações, se discutem os propósitos, os meios pelos quais as fotografias são veiculadas, os usos que delas são feitos e outras formas que podem advir desses, questões cadentes no universo da educação. Palavras-chave: Fotojornalismo. Fotodocumentarismo. Educação. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Formada em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo; Mestranda na Faculdade de Educação da Unicamp (Grupo de Pesquisa: OLHO); professora do curso de Jornalismo da Universidade Sagrado Coração. 149 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura PÁRA PAPAI, VOCÊ VAI MATÁ-LO1 Julieta Maria Haical Haddad2 Regina Célia Paganini Lourenço Furigo3 RESUMO Possessão, termo primitivo trazido de volta por Jung para explicar a perda de controle vivenciada pelo ego, momentaneamente ou não, diante das forças inconscientes. Tais manifestações ocorrem mediante interferência dos chamados complexos que enfraquecem o ego e usurpam seu comando consciente. Apresentaremos uma vida que traz em si as marcas da tortura e a inconsciência de um complexo autônomo pior que o próprio torturador. Uma sombra forte, raivosa, agressiva, expondo em turbilhões de ira o medo de um garoto que foi impossibilitado de se defender. Uma autonomia que expressa sua força quando um homem que foi machucado, olhando-se no espelho, vê o rosto do pai torturador, e nos momentos em que perde o controle a agressividade é externalizada sem noções de limites, chegando ao extremo de se querer negar suas conseqüências e até perder a memória. O medo que embrutece. No corpo um coração que grita pelo amor que não viveu e pela atrocidade que foi capaz. Quanto um pai pode ferir seu filho? Quanto um homem pode conter em si do próprio pai? Quanto disso seu coração é capaz de suportar antes de sucumbir? Nosso objetivo ao trabalhar com um paciente de psicossomática cardíaco é que as marcas deixadas por um pai cruel e pela própria crueldade possam se tornar a semente redentora. Almejamos que o coração encontre um espaço confiável para expressar sua verdade, suas dores e sua culpa diante da aceitação empática do outro, sem que a corrente sanguínea precise romper e invadir para se fazer ouvir. Um lugar onde a emoção possa simbolizar sem o uso do corpo. Por meio do diálogo e de re- contar a própria história, o paciente tem sido capaz de compreender, aos poucos, que fortes sofrimentos podem nos acompanhar por toda a vida e provocar coisa muito pior se tentarmos simplesmente ignorá-los. Palavras-chave: Complexo paterno. Violência. Problemas cardíacos. Sombra. 1 INTRODUÇÃO / REVISÃO DE LITERATURA 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Graduação em Desenho Industrial pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil (2003). 3 Doutora em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Brasil(2006). Professora Assistente da Universidade do Sagrado Coração. 150 A psicossomática vê a doença como uma manifestação do desequilíbrio psíquico, ou seja, como conseqüência da unilateralidade consciente. A doença não ocorre por acaso e na medida em que demonstra a perda do equilíbrio também informa sobre aquilo que precisa ser melhorado e assim tem um propósito útil ao desenvolvimento do organismo como um todo. Deve-se observar os sintomas e, de acordo com Dethlefsen (2002, p.73), [...] poderemos interrogar cada sintoma em profundidade para averiguar qual o seu propósito e qual a informação que possui, e ficaremos então a saber quais os passos a tomar em cada momento. [...] Sempre se encontrarão condições funcionais mas, precisamente por essa razão, sempre se encontra um significado essencial [...] Em nosso entender, cada sintoma tem o seu significado e não admitimos exceções. Não é intenção da psicossomática negar a existência do orgânico, do biológico e nem mesmo da predisposição hereditária. Apenas não se considera o homem como sendo dual, dividido em corpo e mente, este é visto como uma unidade interdependente de relações estabelecidas interior e exteriormente. Dahlke (1992) afirma que se o sintoma for entendido e desta maneira liberado de suas características negativas acaba por ser um auxiliar ao crescimento da pessoa guiando-a pelos “temas carenciais”, ou seja, por tudo aquilo que foi desprezado em sua personalidade e que precisa de atenção. Assim, os sintomas deixam de ser vistos como inimigos, se tornam a orientação necessária para um desenvolvimento coerente da pessoa em sua vida. Para Jung (2000) os sintomas são uma forma indireta de certos conteúdos alcançarem a consciência, e para esclarecer a ligação destes com as manifestações dos processos psíquicos inconscientes, diz: Os conteúdos sintomáticos são, em parte, verdadeiramente simbólicos e são representantes indiretos de estados ou processos inconscientes cuja natureza só pode ser deduzida imperfeitamente e só pode tornar-se consciente a partir dos conteúdos que aparecem na consciência. (JUNG, 2000, p.114). Nossa intenção diante de tais informações é compreender um paciente idoso, com problemas cardíacos e um histórico de vida muito violento. Diante de dois acidentes cardiovasculares, o paciente perdeu o acesso à diversas memórias recentes e mantém apenas e intensamente as antigas. Tentamos reconstruir um pouco do que foi perdido, percebendo a possibilidade de que o 151 esquecimento faça parte de uma recusa do paciente diante de seus atos e desta forma o defenda de um confronto moral consigo mesmo. Mas, isso não o tem protegido de grandes torturas fisiológicas e depressivas. O relato desse caso tem como objetivo demonstrar que não se deve apoiar intenções do trabalho terapêutico que se restrinjam em localizar as causas e sim em manter um foco teleológico diante das interferências manifestas pelo inconsciente na vida das pessoas, mesmo que a idade pareça avançada para tal jornada, chamada de individuação. 2 APRESENTAÇÃO DO CASO 2.1 IDENTIDADE Paciente do sexo masculino, 70 anos, advogado aposentado, divorciado, pai de três filhos, com uma filha falecida. Filho de J.P. e L.S.P., também falecidos. Veio para esta clinica escola com a seguinte queixa, preenchida por ele mesmo: “Primeira Síndrome do Pânico em 1957. Tratamento em São Paulo e em Bauru. Por anos passou bem. Médico o alertou que depois dos 45 anos a depressão poderia voltar e voltou no final de 1996 após Síndrome do Pânico. Procurou tratamento eficaz em Bauru por causa da depressão mas foi sem sucesso. Internou-se na Clínica Américo Bairral sem sucesso. Está necessitando de socorro psicológico. Em janeiro de 2005 foi operado da próstata. No mês de fevereiro do mesmo ano teve ataque cardíaco (4 safenas). Em junho de 2006 agrediu sua filha de 33 anos (pela única vez). Não se lembra desse fato.” Tem um conturbado histórico de vida com a presença marcante de um pai extremamente cruel, que surrava os filhos e a esposa com violência e mantinha um clima de total instabilidade psicológica dentro de casa. Se lembra de um dia em que o vizinho entrou na casa para impedir seu pai de matar seu irmão porque o estava surrando. Seu irmão tinha 5 anos e ele 4. Aprendeu a lutar para se defender das agressões do pai e acabou por ferilo com um soco na testa e este desmaiou. Fugiu pra morar e trabalhar em São Paulo. O pai foi buscá-lo e insistiu para que ele estudasse. Sentiu-se privilegiado em relação aos irmãos que não estudaram e acreditou ser amado pelo 152 pai. Sua mãe não deixou que se casasse com a mulher que amava por ela ser negra e disse que isso irritaria muito seu pai. Ele se casou com outra moça, tiveram três filhos. Disse ter cuidado deles quando eram pequenos porque a esposa dava aulas em cidades vizinhas. Esta engravidou da filha mais nova quando ele pensava em se separar. Ninguém na família percebeu quando ele adoeceu. Disse que desmaiou em frente de casa quando teve a primeira isquemia cerebral e ninguém o levou ao médico. Teve uma briga com a filha mais velha, aquela com quem mais se entendia. Tempo depois essa filha faleceu de embolia pulmonar ocasionada por um tombo em que machucou a perna e o problema não foi percebido pelo médico que a atendeu. Relata que sempre teve muitos sonhos horríveis com o pai e que um dia enxergou o rosto dele enquanto se olhava no espelho. O paciente acredita que fez alguma coisa errada porque um dia bebeu um gole de uísque que servia para o cunhado e este não quis e deve ter tido alguma reação com os remédios que tomava já que quando acordou todos tinham ido embora e ele estava sozinho. Lembra de ter ido para a clinica para internação dirigindo. Começou seus relatos alegando nunca ter bebido na vida e hoje já se refere ao fato de ter largado de beber quando começou a tomar remédios. Diz que quando voltou da clínica não o aceitaram mais em casa. Sua esposa o avisou pelo telefone que não era para voltar pois ninguém o queira mais em sua casa. Desde então estão separados, mas não divorciados. Ele vai até a casa visitar o neto, filho da filha que faleceu, mas sua ex-esposa não o deixa entrar e nem levar o neto para passear. Sua filha mais nova não fala mais com ele e não diz porque, apenas falou que ele nunca fez mal a ela, mas fez para outras pessoas. Seu filho hoje mora em São Paulo e é o único que fala com ele, diz que ele sempre foi bom pai. O paciente tenta reconstruir a vida, mas algo o incomoda nessa situação. Ressente-se por nunca terem percebido que ele estava doente e por não considerarem isso hoje. Gostaria que alguém lhe dissesse o que foi que ele fez para que pudesse pedir perdão. Se sente injustiçado e abandonado. Diante de tudo isso, levantou-se a hipótese de que o paciente sofreu uma 153 possessão do complexo da sombra, ou seja, os aspectos rejeitados de sua personalidade que foram reprimidos, por sua inconsciência ganharam força e assimilaram o ego. Temos assim “uma modificação momentânea da 4 personalidade” . Falando sobre a sombra, Jung diz: Muitas vezes é trágico ver como uma pessoa estraga de modo evidente a própria vida e a dos outros, e como é incapaz de perceber até que ponto essa tragédia parte dela e é alimentada progressivamente por ela mesma. Não é a sua consciência que o faz, pois ela lamenta e amaldiçoa o mundo desleal que dela se afasta cada vez mais. Pelo contrário, é um fator inconsciente que trama as ilusões que encobrem o mundo e o próprio sujeito. Na realidade, o objetivo desta trama é um casulo em que o individuo acabará por se envolver. (JUNG,1982, p.8). Para tanto planejou-se trabalhar com intervenção verbal, psicoterapia de apoio, com a intenção de possibilitar o fortalecimento do ego do paciente, dando-lhe condições de reconhecer e se relacionar com seus aspectos sombrios. Possibilitando que suporte as lembranças dos fatos e estas não mais precisem se manifestar em seu coração. De acordo com Hillman (1999) “os complexos são nossa base de pecado, nosso karma, que, se abandonado, é cumprido em outro lugar.” E diz ainda que cada complexo se manifesta em um sintoma e a função de um órgão é capaz de nos trazer consciência quando seu funcionamento é alterado. Fazendo uma leitura analítica do coração, Ramos (1990) cita que o comportamento de luta e de fuga, ligados a raiva e o medo relacionam-se aos sistemas cardíacos. Quando o medo impede a ação pode causar estresse no organismo. No caso da criança assustada, recebendo amor e carinho seu batimento cardíaco retorna ao ritmo normal, do contrário é possível que desde já começa a manifestação de uma alteração por causa de uma dificuldade, como no caso do paciente, de encontrar um ponto de superação ao amor e ódio das lembranças da infância e dos pais. E completa, “cada batimento cardíaco lembra a nossa fragilidade e sensibilidade e nos liga a padrões básicos da condição humana.” 3 RESULTADOS 4 JUNG, Carl Gustav. A Natureza da Psique. 5.ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2000, p.33. 154 Foram realizadas 22 sessões de 1 hora cada uma com 5 faltas justificadas, totalizando 17 sessões. Em decorrência dos atendimentos notou-se que o paciente começou a se relacionar com outras pessoas, fez novos amigos, iniciou participação em projetos da terceira idade tal como curso de computação e coral, modificou seu comportamento na sala de espera que no início atraia a atenção de todos e agora chega a passar despercebido, além de estar sendo capaz de revelar à terapeuta e a si mesmo um pouco mais do que fez durante a vida, entrando em contato com feridas que se empenhou em esquecer. Para Jung (2000, p.83) “Sua consciência simplesmente se retirou dos conteúdos que lhe eram penosos, e estes, entregues a si mesmos, só podiam alcançar a consciência indiretamente sob a forma de sintomas”. 4 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS As novas relações interpessoais do paciente sugerem um maior contato com o próprio coração que nas palavras de Ramos (1990) “é por excelência, em nossa cultura, órgão de ligação, sede da emoção amorosa e expressão da totalidade”. Através deste contato, e do ambiente terapêutico que considera a idade e as condições fisiológicas do paciente, este tem sido capaz de expressar verbalmente suas dores. É a relação com o outro que possibilita um maior contato com a sombra, este ocorre por meio da projeção e de sua respectiva aceitação e integração. De efeito contrário é quando os complexos “privam a pessoa da vida; e depois de terem “devorado o homem, engolem também a vida do ambiente.”5 Na visão de Sanford (1981) a ligação amorosa entre os pais e os filhos é fundamental na resolução do problema da sombra. É desta ligação que se origina as bases da vida moral e “em algumas crianças essa ligação nunca ocorre” assim a barreira emocional que protege do complexo da sombra pode se constituir de material muito frágil e “pode levar ao desenvolvimento de personalidades 5 FRANZ, Marie-Louise V. Reflexos da Alma. 1.ed. São Paulo: Editora Cultrix/Pensamento, 1997, p.118 155 criminosas ou sociopáticas.” Entendemos a possibilidade de que o paciente tenha realmente feito algo que além de agredir sua família foi tão forte e repulsivo que agrediu a ele mesmo e por isso foi esquecido. Sua tentativa de reconstrução da memória perdida se liga diretamente às manifestações do coração. Cada novo passo, cada nova lembrança parece feri-lo profundamente demonstrando o quanto estranho e separado se tornou seu complexo da sombra. Devemos tomar cuidado com tais manifestações e é Jung quem nos atenta para isso ao se referir às resistências manifestas pelo paciente através da angústia relacionada aos conteúdos inconscientes: Tais resistências tem sua razão de ser e justificam-se profundamente, por isso, não podem em hipótese alguma, ser tratadas de modo rude ou então não serem levadas em consideração como mecanismos de defesa de importância vital contra a prepotência dos conteúdos com os quais está sendo difícil lidar. Via de regra podemos considerar que a debilidade do ponto de vista consciente é proporcional à força da resistência. (JUNG, 1999, p.54) E ainda nos deixa uma valiosa orientação sobre como o apoio da atitude consciente tem um elevado valor terapêutico e muitas vezes é suficiente na obtenção de bons resultados. Acreditamos que a cada re-contar de sua história, conforme suas dificuldades são compreendidas pelo analista, este é capaz de trazer à lembrança novos fatos. Jacoby (1995) afirma que “sentir o paciente e se relacionar com ele em sua alteridade específica deve, certamente, ser o dom decisivo do analista”. Acreditamos que a postura do analista não é a de um juiz que deve julgar, absolver ou condenar o paciente e sim de ser capazes de percorrer sua trilha conjuntamente, e para isso é preciso paciência e respeito pela sua individualidade. Como já foi dito antes, o foco de tal jornada não deve ficar restrito às causas e sim ser uma busca pela finalidade das manifestações sintomáticas. Nas palavras de Von Franz (1997),“o demoníaco seria o criativo em statu nascendi, ainda não realizado pelo ego.” Assim, acreditamos que há um potencial de busca pela totalidade nos sintomas cardíacos do paciente, há uma intenção de integração psíquica por intermédio do amor que levará a uma conexão com o Si-Mesmo através da acolhida terapêutica. Trazer à consciência o significado simbólico dos sintomas cardíacos 156 manifestos detém a possibilidade de encontrar um caminho. Para Ramos (1990, p.130) “a expressividade do coração, mesmo quando doentia, pode ser uma tentativa de conduzir o ego ao seu centro, corrigindo ou compensando uma atitude unilateral”. Nas palavras de Hillman (1999) “aquilo que nos fere pode também nos criar, dar-nos paternidade. Nossas feridas são pais e mães de nossos destinos”. Assim, é o coração do paciente que tem sido o guia do processo, suas emoções, seus afetos, ilusões e desilusões contadas e re-contadas em constantes reconstruções. REFERÊNCIAS DAHLKE, R. A doença como linguagem da alma: os sintomas como oportunidades de desenvolvimento. São Paulo: Editora Cultrix,1992. DEUHLEFSEN, T; DAHLKE, R. A doença como caminho. 5 .ed. São Paulo: Editora Cultrix, 2002. FRANZ, M. L. V. Reflexos da alma. 1. ed. São Paulo: Editora Cultrix/Pensamento, 1997. HILLMAN, J. O Livro do Puer. 1. ed. São Paulo: Editora Paulus, 1999. JACOBY, M. O encontro analítico. 1. ed. São Paulo: Editora Cultrix, 1995. JUNG, C. G. Ab-reaçao, análise dos sonhos, transferência. 4. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1999. JUNG, C. G. Aion, estudos sobre o simbolismo do si-mesmo. 1. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1982. JUNG, C. G. A natureza da psique. 5. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2000. LIMA, A. P. O pai e a psique.1. ed. São Paulo: Paulus, 2002. 157 RAMOS, D. A psique do coração: uma leitura analítica do seu simbolismo. São Paulo: Editora Cultrix, 1990. SANFORD, J. A. Mal: o lado sombrio da realidade. 3. ed. São Paulo: Paulus, 1988. 158 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura A ARQUETIPIA: E OS PERCURSOS DO OLHAR1 Júlio César Riccó Plácido Da Silva2 Luiz Nelson O. Trentini3 RESUMO Este estudo refere-se às principais formas de se fazer uma análise fotográfica, utilizando como base teórica os arquétipos, a Gestalt e a semiótica. Utilizou-se das três teorias de forma unificada para a análise de imagens que tem linguagem própria para a veiculação na mídia publicitária, desenvolvendo assim uma pesquisa a partir da percepção do olhar humano. Podendo contribuir para uma melhor compreensão das imagens fotográficas, bem como para futuras análises imagéticas, mesclando as diversas teorias. Palavras-chave: Fotografia. Semiótica. Gestalt. Arquétipos. Linguagem. 1 INTRODUÇÃO Muitos meios de massa que se utilizam de imagens fotográficas, com ênfase no âmbito publicitário, não identificam a melhor forma de veiculação das imagens arquetípicas, em suas principais dimensões como a funcional, conceitual e a mais importante, a emocional, que pressupõe a melhor ligação entre o produto ou serviço e o consumidor. Por isso analisou-se a interface sígnica, que pressupõe a mensagem arquetípica como produto social e psicológico. Outro fator que influencia essa ligação, mas que não será aqui analisado, é a articulação que a imagem tem com as palavras, tornando um modo de orientar e restringir a escolha do leitor, contribuindo para outra leitura visual. As leituras de imagens fotográficas utilizadas na publicidade são constituídas pelos arquétipos Jungianos. Foram utilizados os seguintes suportes teóricos: a Lógica de Peirce e as 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Mestrando em Artes Visuais – Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista – São Paulo – SP. 3 Professor Mestre do Curso de Publicidade e Propaganda da Universidade do Sagrado Coração – Bauru – SP. 159 leis da Gestalt. O estudo se focará nessa abordagem e na busca de novos elementos de leitura dessas imagens arquétipas. Este é um artigo gerado de forma resumida a partir de um trabalho de conclusão de curso com o seguinte titulo “Linguagem fotográfica: A arquetipia utilizada na Publicidade” (RICCÒ, 2006). Na pesquisa realizada, inicialmente foram apresentados os conceitos dos vinte arquétipos analisados e a delimitação teórica das leis da Gestalt e da semiótica de Charles Peirce. Para tanto, foi abordado o caráter universal da semiose explicitada nas relações entre a cosmologia de Peirce e o inconsciente coletivo de Jung. Contudo, a proposta do trabalho foi a leitura dos arquétipos, que podem ir além da troca de uma mensagem codificada pelo enunciador e decodificada pelo enunciatário, através da mediação fotográfica. 2 SITUAÇÃO DO PROBLEMA Percebe-se que muitos meios de massa que se utilizam de imagens fotográficas, com ênfase no âmbito publicitário, não identificam a melhor forma de veiculação das imagens arquetípicas, em suas principais dimensões como a funcional, conceitual e a mais importante, a emocional, que pressupõe a melhor ligação entre o produto ou serviço e o consumidor. 3 OBJETIVOS Analisar a arquetipia delimitada pela linguagem fotográfica através das teorias da Gestalt e da semiótica peirceana, que colaboram para a interpretação adequada das imagens fotográficas utilizadas na publicidade. Definir imagens fotográficas através dos arquétipos para análise e estudo, estabelecer critérios dentro das teorias escolhidas e identificar dentro da teoria dos arquétipos aqueles que tornam a imagem adequada ao uso publicitário. 4 JUSTIFICATIVA Ao estudar a análise da arquetipia fotográfica percebe-se que alguns critérios devem ser definidos na interação de várias teorias, para a melhor exploração dos 160 elementos que compõem a fotografia. Os profissionais da comunicação podem melhorar a análise e a construção de imagens por meio dos arquétipos que identifiquem melhor sua utilização na promoção de produtos e serviços abordados pela fotografia. O presente estudo justifica-se pela sua importância quanto à leitura imagética, que pode auxiliar os publicitários e profissionais da área na construção e reformulação de conceitos para a promoção de produtos e serviços. Obtendose, assim, melhores resultados na exposição dos produtos e serviços na mídia. 5 METODOLOGIA Nessa pesquisa utilizou-se o método dedutivo sintético para o estudo em questão. Primeiramente, foi realizado um levantamento sobre a linguagem fotográfica e sua contextualização, seu avanço com o advento das câmeras digitais. Foram utilizadas três teorias como base para a análise de imagens. As imagens utilizadas nesta pesquisa foram capturadas ao longo da investigação com a câmera digital Cânon Rebel XT de 8 megapixel, com objetivas 75x300 mm e 17x70mm com um fator de corte 1.6. Optou-se por analisar imagens em preto e branco devido à sua proximidade com a realidade por não ser uma linguagem natural. 6 A PRODUÇÃO FOTOGRÁFICA COMO UM ATO ICÔNICO Existem três elementos essenciais para a realização do ato fotográfico: o assunto, o fotógrafo e a tecnologia. Tais elementos deliberam entre si diversas situações onde emerge a realidade intrínseca no papel revelado. A imagem é produzida por um ato icônico, na busca da representação do objeto enquadrado como produto de uma técnica e de uma ação. Nessa ação pode-se notar que determinados fotógrafos produzem imagens em qualquer tempo e são considerados importantes, enquanto outros produzem apenas imagens de pouca importância. A partir dessa constatação, pode-se arrematar que para que o ato fotográfico importante aconteça é imprescindível o conteúdo cultural do fotógrafo ao 161 identificar o melhor ângulo, a luz ideal e a composição mais expressiva, pois o faz de acordo com sua sensibilidade e criatividade, próprias de cada artista. Dessa maneira, é delineada a trajetória da fotografia como capacidade de expressão de uma idéia. Houve uma intenção para que ela existisse e o fotógrafo registra um tema. Em decorrência dessa intenção se deu origem à materialização da fotografia, o seu conteúdo se manteve, ficou congelado naquele instante da ação fotográfica. Para Kossoy (2004), essa trajetória fotográfica está dividida em três estágios: o primeiro é a intenção para que ela existisse, o segundo é o ato do registro, o terceiro estágio identifica-se como o que leva a foto depois de sua materialização em um papel fotográfico. Toda fotografia deve ser produzida com uma finalidade, ela deve conter uma mensagem endereçada ao observador adequado. Mesmo sendo um meio de expressão individual, Kossoy (2004), afirma que a fotografia não é apenas um registro de expressão factual. Com essa assertiva, o autor contrapõe o lado da expressão correlacionada ao produtor (fotógrafo) que está inserindo no tempo do determinado registro fotográfico, como forma de expressão da realidade desse tempo em uma fração de espaço. Nesse sentido, Humberto (2000) identifica claramente esse momento como uma diferença entre o olhar e fotografar, pois toda fotografia está ligada a utilização dos percursos dos olhos, associados a da cabeça e do andar, o que permite ver para cima e para baixo, para frente e para os lados. Assim, emerge uma grande quantidade de informações que combinadas geram julgamentos e um grande acúmulo residual na memória social. Esse resultado do agir fotográfico decorre, basicamente, de um ato de escolha, de uma decisão criada e analisada inteiramente em âmbito do universo pessoal e do domínio dos meios, embora esses possam provocar imprevistos que determinam a escolha do indivíduo ao objeto fotografável. Esse fato pode criar em si novas expectativas, podendo se dizer que o ato fotográfico é um hábito visual seletivo, no qual podem haver imprevistos. Para Merleau-Ponty (1996), a mensagem dada pelas mídias, considerando-se que a fotografia também é mídia, seria o encontro entre fronteiras perceptivas, onde o homem – um ser da natureza – constrói sua própria consciência, 162 embora não compartilhe da formação da consciência do outro. Dessa maneira, um indivíduo percebe a existência do outro pela sua condição de ser cultural, como o outro. Assim, é na cultura que a consciência individual percebe que está inserida no mundo dos objetos culturais que foram produzidos por outras consciências. Portanto, todo objeto que o homem constrói traz o cógnito da função ou do motivo criador daquele outro homem que elaborou o objeto. A percepção do mundo determina o direcionamento das consciências e, nessa direção de choque de consciências, aparecem nos meandros limítrofes onde ocorrem as trocas de sentido. Assim, pela mediação do sujeito perceptivo acontece essa troca de sentido por meio do ato comunicacional, que a percepção, tal como ele a vive, desmente tudo o que ele diz da percepção em geral. (MERLEAU-PONTY, 1996) 7 OS PERCURSOS DO OLHAR PELA ARQUETIPIA Todos os seres humanos reagem de maneira semelhante quanto à recepção das imagens fotográficas veiculadas pela mídia através da publicidade. As emoções provocadas que podem mudar comportamentos de fato têm muito mais a ver com a condição humana do que com as diferenças que caracterizam um dado grupo ou classe social. Somente o que é capaz de cativar cada humano a partir dos mitos que movem a todos pode tornar uma peça ou campanha publicitária eficiente, uma vez que elas buscam o que cada ser humano traz consigo desde a primordialidade semi- racional. Os mitos atuam como sonhos de um pensamento coletivo e seus desejos nascem no inconsciente coletivo de cada sociedade, pois a presença do mito é necessidade fundamental para a sobrevivência do ser humano. De alguma maneira, esses arquétipos sempre encontram uma forma de se expressar. Portanto, os mitos nada mais são do que uma forma de expressão dos arquétipos, compreendendo tudo o que é comum aos homens de todas as épocas, uma vez que os discursos dos arquétipos falam dos valores que fazem parte da essência da natureza humana. econômicos e sociais Todos os aspectos psicológicos, culturais, que construíram o comportamento dos indivíduos de determinado segmento social reagem de maneira semelhante, por consumidores de variada gama de produtos e serviços, com exemplo, tendências aos 163 impulsos de compra. Entende-se que os arquétipos funcionam como um indicador (índice), ligando o conteúdo imagético de dada peça publicitária à determinadas necessidades do público consumidor. Por isso a publicidade e o marketing, no decorrer da sua história, vêm pesquisando a viabilização dos arquétipos utilizados como parte das variadas técnicas de persuasão em suas mensagens. A partir das relações fotografia publicitária simbólicas provocam esses impressões, arquétipos comovem, encontrados incomodam, na enfim, imprimem no espírito humano, sentimentos ligados a alguma situação vivida pela diversidade dos grupos sociais. Esse fato vem determinar que durante toda a vida de determinado segmento social, seus indivíduos têm consumido imagens fotográficas veiculadas em anúncios de revistas, de jornais e da televisão (onde a imagem também é construída através da luz), sempre ligadas a algum arquétipo ou simulacro. Portanto, a presença da representação arquetípica nesse arsenal imagético concede maior poder à comunicação dos acontecimentos, à produção de sentidos, sejam eles quais forem: desde um fato recente até fatos ocorridos nos primórdios da presença humana na Terra. A arquetipia é utilizada pela publicidade como meio de vincular as marcas dos produtos e embasamento serviços junto aos indivíduos consumidores, com na memória coletiva. A cultura da imagem vem reforçar cada representação arquetípica utilizada na publicidade como um recurso indicial para a vinculação de necessidade do presente a situações ou fatos culturais do passado, assim, a utilização dessas imagens e impulsos representam o contato com as realidades transcendentes do homem. Isso pode resultar no desejo de cada homem ser o mais perfeito, possuir mais harmonia, estar em paz e ser possuidor da perfeição de seus pensamentos, sendo que a aceitação desses arquétipos projeta em si a idealidade do ser real. A representação de cada arquétipo na publicitária pressupõe a realização da fotografia felicidade, aparentemente enganosa, pessoal e do grupo social. Entretanto, deve-se apreender que tal transcendência em busca da felicidade é de natureza geral encerrada no inconsciente coletivo de todos os indivíduos do planeta. Cada arquétipo desempenha uma função específica na associação que ele representa e que motiva o consumidor em direção da compra de produtos e 164 serviços. Desta forma, a fotografia publicitária é elaborada em sua essência por meio de representações arquetípicas que sejam capazes de satisfazer as necessidades que disparam o desejo de consumo de dado grupo social consumidor. Contudo, a publicidade utiliza a fotografia como forma de construção de marcas, produtos e serviços desenvolvidos através das dimensões, funcional, conceitual e emocional (MARTINS, 1992). Nesse caso, a imagem é empreendida pela diversidade arquetípica utilizada na argumentação da publicidade como fator elucidativo na atividade arquétipas fragilizam comercial, uma vez que tais lembranças os consumidores favorecendo a venda de produtos e serviços. A publicidade exerce papel importante para alavancar a venda de produtos e serviços e, conseqüentemente gerar riquezas e crescimento econômico das nações. Cada arquétipo induz o cérebro humano por meio de percepções visuais e tendências que expressam os desejos de uma alma coletiva. Contudo, os arquétipos seriam as imagens, experiências, intuições e todos os processos ligados às memórias pessoais e coletivas, à história da humanidade através de figuras ou místicas que é reconhecida como parte da cultura. Assim, como os elementos mágicos e religiosos fazem parte da fantasia arquétipos são imagens que impulsionam e expectativa coletivas, os e representam o contato com as realidades transcendentes do ser. Tal fato cria imagens ou visões que correspondem a alguns aspectos da situação consciente e que se originam através de constantes repetições de uma mesma experiência, durante muitas gerações em toda a humanidade, esquemas mentais e representativos universais, arquétipos ligados à experiência comum a todo ser humano. (JOLY, 1996). Entretanto, a leitura da imagem é universal e revela confusão e desconhecimentos. Assim, os arquétipos são determinados não do ponto de vista do conteúdo, mas da forma, o que faz obrigatoriamente pensar nos traços dos significantes que também não podem ser definidos pelo conteúdo. De acordo com Jung (2000), os arquétipos não são difundidos somente pela tradição, idioma ou migração, mas podem reaparecer a qualquer hora, em qualquer lugar, e sem influências externas. Um arquétipo é um modelo universal ou predisposição para caracterizar pensamentos sentimentos, uma tendência não aprendida para experimentar coisas. ou 165 Pode-se concluir que o arquétipo, em si, é um elemento vazio, não se trata de imagem empírica, mas uma possibilidade da forma de representação. Como já analisado, não se pode entender os arquétipos como impregnações incessantes, mas também do modo como se comportam, nas repetições das mesmas experiências. Todas as vezes que o arquétipo aparece em sonho, na fantasia ou na vida, ele traz uma influência específica ou uma força que lhe confere um efeito numinoso e fascinante ou impele a ação. (JUNG, 2000). Foi realizado um estudo teórico da definição dos vinte arquétipos utilizados na fotografia publicitária como fator essencial de convencimento do grupo social a quem é destinado, a saber: Sensibilidade; Sentimento tribal; O lúdico; O guerreiro; Cenas do cotidiano; O racional; Auto-estima; O Espírito Rebelde; O íntimo; Equilíbrio Estético; A busca do Inconsciente; A expressão; A expansão; Fluxo de Energia; Raiz; Socializando; A Grande Meta; Sentimento cósmico; O idealismo; e a Exaltação dos Sentidos. A teoria da Gestalt também foi utilizada na análise das figuras escolhidas para estudo dos arquétipos emocionais. 8 LEIS DA GESTALT A presente concepção de leitura visual foi fundamentada na Escola Gestalt, no campo da percepção psicológica da forma, através de conhecimento teóricoconceitual para a compreensão do objeto. A Gestalt é uma Escola de Psicologia Experimental, fundada por volta de 1910 pelos pesquisadores Max Wertheimer (1880-1943), Wolfgang Kohler (1877-1977) e Kurt Koffka (1886-1941), da Universidade de Frankfurt. Segundo a Gestalt, a arte se funda no princípio da pregnância da forma: fatores de equilíbrio, clareza e harmonia visual, como necessidades essenciais para o ser humano e, assim, indispensáveis na obra de arte, do design, na arquitetura e qualquer outra manifestação visual. As imagens foram analisadas segundo os seguintes itens estabelecidos: Unidade, Segregação, Unificação, Fechamento, Continuidade, Proximidade, Semelhança, e Pregnância da forma. 9 O INSTRUMENTO DE ANÁLISE IMAGÉTICA 166 A era da imagem trouxe mudanças na maneira da percepção e cognição dos discursos fotográficos. Paralelamente a isso, a semiótica, da linha norte-americana de Charles S. Peirce, como meio de análise desses signos imagéticos complexos pôde desvelar como toda imagem fotográfica é um objeto, é um signo sem deixar de ser objeto, já que ela está virtualmente repleta de interpretantes. Até mesmo o discurso verbal passou a ganhar proporções de objeto, pois a primeira apreensão da palavra também é imagética, tanto visual, como a oral. Assim, a pesquisa pode levar ao investigador alguns preceitos semióticos da comunicação artística como discursos-objetos a serem interpretados por uma mente que se predisponha a fazêlo. Através do signo triádico e do processo de semiose pode ser mostrado que o processo cinestésico existente nesses discursos, tais como os arquétipos textura, cores, formas etc., passam sensações pregnantes, antes mesmo da simbologia desses mesmos formantes das mensagens. Peirce trata da ação dos signos como um meio de produzir o novo signo, estabelecendo uma dúvida sobre os hábitos adquiridos. Assim se dá o processo de criação, já que a mente humana trabalha com os perceptos que afetam os sentidos do homem e que interiormente recebem as combinatórias sígnicas que não são as mesmas existentes no mundo da realidade. Eis aí o princípio da arte presente no discurso da publicidade, quando o novo signo se institui, provocando estranhamentos e produzindo um novo modo de pensar. Dessa maneira, os discursos imagéticos da fotografia podem mostrar como o fotógrafo de publicidade pode servir-se do princípio da criatividade como instigação da dúvida sobre a crença, a fim de produzir o novo signo. Essa análise, portanto, permitirá ao investigador entender o processo da ação sígnica, ou da semiose, sobre os arquétipos a fim de referendar ou negar a mensagem dada através das arquetipias, aqui representadas pelas vinte fotografias. O olhar crítico, de caráter investigativo que interroga e interage com a imagem fotográfica cria realidades que estão além dela, para tanto a inferência silenciosa do observador é essencial para a percepção da dialogicidade entre os signos que interagem e geram sentido na fotografia. Esses signos constituem a poética e a representação da cena fotográfica em dado momento. Em um primeiro olhar, percebe- se o diagrama das formas, a cromaticidade das luzes, da cena fotográfica. Em uma observação seguinte, nota-se a sensibilidade do 167 receptor. É o choque do observador com a obra, é a relação entre dois, é a instalação da dúvida. Em um terceiro momento, a interpretação é racionalizada, através da busca pelo sentido, que se encontra em outra cena, na direção do vôo da ave, por exemplo, assim, é iniciada a instauração da dúvida, para a conseqüente apresentação do signo novo. Na análise de imagens é necessária a identificação dos principais elementos que a compõem, assim, para a identificação dos arquétipos representados nas vinte fotografias foram utilizadas a semiótica de Peirce e a Gestalt. Para elaborar a análise a partir da percepção e do conteúdo da mente humana deve-se fazer a interação entre os signos interpretantes que compõem a mensagem fotográfica. 10 CONHECIMENTO COMPARTILHADO Todo discurso é construído a partir do princípio do conhecimento compartilhado. O enunciador espera que seu enunciatário tenha uma competência capaz de decodificar os símbolos dados no texto. Desse modo, o enunciado imagético é construído para o leitor ideal, ou público-alvo, que tenha competência de leitura da mensagem. Portanto, leituras individuais e subjetivas não devem ser consideradas em relação à análise científica do texto imagético. Pensa-se aqui em leitura de consenso entre sujeitos possuidores de registros de certos conceitos, de modo que o enunciador construa esse processo comunicativo como uma espécie de informação nova a partir de conhecimentos anteriores, ou os conhecimentos que o enunciador tenha certeza que possam ser compartilhados com seu enunciatário. Dessa maneira é complementada a semiose dialógica entre sujeitos idealizados: o enunciador e o enunciatário, co-partícipes de dado texto imagético. 11 A ANÁLISE DO CORPUS Buscou-se, para a contextualização empírica, fazer a relação de imagens publicitárias com as respectivas análises retóricas de suas figuras de linguagem. Trata-se de um corpus selecionado tendo como objetivo demonstrar a idéia de que a publicidade moderna produz discursos persuasivos servindo-se das imagens arquetípicas, como nos discursos verbais de modo sincrético. Como a era moderna do vídeo e da televisão privilegiou e fez despontar a importância da imagem, o 168 marketing e a publicidade também as utilizam para comunicar com mais contundência. Eis os vinte arquétipos selecionados que encerram em análise. As vinte imagens foram decompostas em planos e sua análise se inicia no plano de fundo e se desenvolve até o primeiro plano, sempre em nível simbólico (terceiridade), de forma semelhante à análise do discurso, pois este também pertence à esfera simbólica, em terceiridade. No presente artigo será apresentado, como exemplo do trabalho desenvolvido, o tema “Raiz” (Figura 1). Figura 1 - Raiz Tudo o que dá origem e princípio a uma vivência é capaz de criar uma ligação das raízes emocionais que se interagem a uma realidade. Fazendo com que a cada reencontro com essas raízes aconteça a emoção de reconhecer e ser reconhecido por algo ou alguém, que carrega força motriz e representa a raiz construtiva da transformação e da capacidade de cuidado consigo e com o outro. 12 ANÁLISE IMAGÉTICA Plano de fundo: do lado esquerdo da velha casa aparece um paredão que pode limitar qualquer tipo de expansão. Primeiro plano: mostra que do lado direito existe uma árvore de médio porte enraizada, com uma porção em frente à velha construção. Portanto, pelo estado da velha casa e pela presença do paredão ao lado, e de parte da árvore em sua fachada, pode-se interpretar uma situação de enraizamento que dá origem a uma vivência capaz de criar ligação das raízes emocionais que interagem à dada realidade. Para a Gestalt, a imagem segrega-se em unidades principais: o paredão como pano de fundo e a casa em primeiro plano, e a casa pode se segregar em 169 outras unidades, como janela, porta, banco e a árvore. Assim, a segregação carrega força motriz, a raiz construtiva da transformação e da capacidade. Dessa maneira, a lei da segregação confirma o interpretante lógico de Peirce: o princípio de dada vivência capaz de unir raízes emocionais que interagem no mundo real. 13 CONSIDERAÇÕES FINAIS A pesquisa demonstrou que a análise fotográfica é a principal chave para sua boa utilização em diferentes meios de comunicação. Assim toda fotografia publicitária utilizada em meios de comunicação, sejam eles quais forem, devem ser analisadas de forma coerente em sua leitura visual, tendo como fundamento as teorias que embasam sua comunicabilidade. 14 AGRADECIMENTOS Agradeço ao professor Ms. Luiz Nelson O. Trentini pela orientação na pesquisa realizada e à Professora Elisangela Cristina Sorano pela correção e tradução. ABSTRACT This study is about the main forms of making a photografic analysis, using as theoretical base the archetips, the gestalt and the semiotics. The three theories was used together to analyse the images that has in it´s language the propagation in the media advertising executive, developing a research from the perception o the human look. Coulding contribuit for best understanding of photografic images, as well as for future imagetics analyses, casting the diverse theories. Palavras-chave: Photography. Semiotics. Gestalt. Archetips. Language. REFERÊNCIAS ARNHEIM, Rudolf. Arte e percepção visual: uma psicologia da visão criadora. São Paulo: Livraria Pioneira Editora, 1994. AUMONT, Jacques. A imagem. São Paulo: Papirus, 1993. 170 DUBOIS, Philippe. O ato fotográfico e outros ensaios. São Paulo: Papirus, 1993. GOMES FILHO, João. Gestalt do Objeto: sistema de leitura visual da forma. São Paulo: Escrituras Editora, 2004. GURAN, Milton. Linguagem fotográfica e informação. Rio de Janeiro: Editora Gama Filho, 1999. HUMBERTO, Luis . Fotografia, a poética do banal. São Paulo: Editora Universidade de Brasília, 2000. JOLY, Martine. Introdução à analise da imagem. Campinas: Papirus, 1996. JUNG, Carl Gustav. Collected works of C. G. Jung. New Jersey: Princeton University, 2000. JUNG, Carl Gustav. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Petrópolis-RJ: Vozes, 2000. KOSSOY, Boris. Fotografia & História. São Paulo: Ateliê Editorial, 2004. LENT, Roberto. Cem bilhões de neurônios: conceitos fundamentais de neurociências. São Paulo: Atheneu, 2001. MACHADO, Arlindo. A ilusão especular: introdução à fotografia. São Paulo: Brasiliense, 1984. 162 p. (Primeiros Vôos, 25). MARTINS, José S. O poder da imagem: o uso estratégico da imagem criando valor subjetivo para a marca. São Paulo: Makron Books, 1992. MAUAD, Ana M. Na mira do olhar: um exercício de análise da fotografia nas revistas ilustradas cariocas, na primeira metade do século XX. Anais do Museu Paulista, São Paulo: v. 1, n. 13, p. 133-176, 2005. MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1996. 171 PEIRCE, Charles S. Semiótica e filosofia. São Paulo: Ed. Cultrix, 1972. SANTAELLA, Lúcia. Comunicação e semiótica. São Paulo: Hacker, 2004. 172 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura DESENVOLVIMENTO DE UM CHATTERBOT COM INTERATIVIDADE AO AVATAR ENCAPSULADO NO AMBIENTE VIRTUAL SECOND LIFE USANDO A BASE DE CONHECIMENTO EM AIML COMO FERRAMENTA PARA AUXÍLIO EM EAD NAS UNIVERSIDADES1. Kelton Augusto Pontara da Costa2, André Luiz Pilastri3 RESUMO Os mundos virtuais tridimensionais são realidades alternativas onde os intervenientes interagem entre si e sobre elementos presentes nessas realidades. Chatterbots são sistemas que têm o objetivo de interagir como usuários em linguagem natural. A inclusão de interatividade possui um papel fundamental, no intuito de melhorar o desempenho desses sistemas, explorando e influenciando o comportamento do usuário principalmente nas universidades. Neste trabalho é apresentado um Avatar que contém um Chatterbot com interatividade. Este Avatar tem por objetivo em responder perguntas, conversando com os usuários, levando um ser humano a pensar que está conversando com outra pessoa. A tecnologia envolvida na criação do Chatterbot do Avatar foi a linguagem AIML, pois traz o conceito de intencionalidade dos diálogos, que poderá ser aplicado na área acadêmica e focado para interatividade on-line no Ensino a Distância. Palavras-chave: Ensino a Distância. Interatividade. Diálogo. Universidades. Tecnologia. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Professor Doutor do Curso de C. da Computação da Universidade do Sagrado Coração Bauru – SP. 3 Mestrando em Ciência da Computação pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP. Graduação em Ciência da Computação pela Universidade do Sagrado Coração. 173 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E A FORMAÇÃO CONTINUADA DO PROFESSOR PARA O PROCESSO DE INCLUSÃO1. Leda Maria Borges da Cunha Rodrigues2, Vera Lucia Fialho Capellini3 RESUMO O presente trabalho teve como principal objetivo levantar dados em relação a utilização da educação a distância para formação continuada de professores, no ambiente TelEduc. A literatura consultada embasou o conteúdo da pesquisa para coleta de dados sobre: a modalidade de educação a distância; o ambiente TelEduc, as ferramentas e a utilização deste ambiente de aprendizagem; a formatação utilizada no curso; e, os pressupostos metodológicos. A coleta de dados foi realizada por questionário semi-estruturado. Participaram da pesquisa 182 alunos do Curso a distância: Práticas de Educação Especial e Inclusiva na área da Deficiência Mental, realizado em parceria com algumas prefeituras de todo o Brasil e o MEC, perfazendo 62% dos alunos concluintes do curso. Dos participantes, 99% eram do sexo feminino, 76% tinham idade entre 31 e 50 anos e 87% atuam como professor na rede municipal ou estadual. O resultado mostrou que 96% dos participantes consideram que a modalidade de educação a distância atende a formação continuada de professores para o processo de inclusão e relataram que o conteúdo do curso contribuiu para iniciar o trabalho e o processo de inclusão da pessoa com deficiência intelectual. São considerados pontos positivos na modalidade de Educação a Distância: a flexibilidade de horário e atendimento a grande número de alunos em diferentes áreas geográficas. Mas, para o sucesso desta modalidade é necessária formação adequada dos formadores/tutores para utilizarem das novas ferramentas no processo ensino aprendizagem. Na oferta de um curso nesta modalidade é imprescindível que os participantes tenham a sensação de serem assistidos a todo o momento, e que sempre poderão contar com o formador e/ou tutor, sendo de suma importância a construção da comunidade virtual, efetivando a educação a distância e formação de qualidade. Palavras-chave: Educação a distância. Formação de professores. Inclusão 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Especialização em Práticas em Educação Especial e Inclusiva pela Universidade Paulista Julio de Mesquita Filho, Brasil(2008). Coordenadora de Informática da Associação de Pais e Amigos de Excepcionais – Bauru. 3 Doutora em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos, Brasil(2004). RDIDP da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. 174 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura REORIENTAÇÃO NA FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE NA UNIVERSIDADE DO SAGRADO CORAÇÃO E CAPACITAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA REDE BÁSICA, POR MEIO DA INTERAÇÃO ENTRE ENSINO E SISTEMA DE SAÚDE MUNICIPAL1. Leila Maria Vieira2, Elza Socorra Yamada Inoue3, Claudia de Almeida Prado Piccino Sgavioli4, Rita Cristina Chaim5, Sandra de Oliveira Saes6, Eliane Maria Ravasi Stefano Simionato7 RESUMO O presente estudo teve como proposta a reorientação da formação dos profissionais dos cursos do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Sagrado Coração, Bauru, SP. Para tanto foram reorganizadas as matrizes curriculares dos cursos de Biologia, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Nutrição, Odontologia e Terapia Ocupacional com o objetivo de ampliar a visão do profissional graduado para a percepção da dinâmica entre saúde e doença e capacitá-lo para realizar planejamento e ações preocupados em transformar esta visão. A partir da nova proposta os profissionais aqui formados estarão qualificados para atender e integrarse aos serviços do SUS, comprometendo-se com a consolidação deste sistema de saúde. Os cursos comprometem-se com uma formação dinâmica, interdisciplinar e articulada durante todos os anos, possibilitando ao estudante a prática nos diferentes cenários de promoção da saúde e prevenção e reabilitação das doenças. Para consolidar tal proposta buscou-se incrementar a integração entre IES e Secretaria da Saúde do Município, proporcionando aos docentes e discentes a participação em todos os programas e instâncias dos serviços prestados. Em contrapartida, os profissionais da rede municipal contam com serviço de capacitação e orientação, voltados às necessidades do município; além de um canal direto esclarecimentos de dúvidas, o qual oferece tutoria. Para os usuários, além da melhoria dos serviços prestados, foi proposto estratégias e materiais educativos (nas diferentes opções midiáticas), os quais foram desenvolvidos pela IES e aplicados pelos discentes, devidamente supervisionados e em conjunto com os servidores. Outra estratégia proposta é que os usuários tenham acesso a um canal aberto de informações, o qual será viabilizado por meio da informatização das UBS(s) e 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Professor Doutor do Curso de Enfermagem da Universidade Sagrado Coração - Bauru – SP. Mestre em Pediatria pela Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (UNESP). Diretora do Centro de Ciências da saúde. 3 Graduação em Administração pela Universidade Sagrado Coração, Brasil (2002).Professor Titular da Universidade do Sagrado Coração. 4 Doutorado em Dentistica pela Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de Sao Paulo, Brasil (2006). Professor titular da Universidade Sagrado Coração. 5 Doutorado em Fisiopatologia em Clínica Médica pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil (2003). Professor titular da Universidade Sagrado Coração. 6 Doutorado em Programa de Pós-Graduação em Pediatria pela Faculdade de Medicina de Botucatu, Brasil(2003). Professor Adjunto da Universidade Sagrado Coração. 7 Doutorado em Quimica Analitica (Arar.) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil (2005). Assistente II da Universidade Sagrado Coração. 175 capacitação dos servidores. Espera-se com esta proposta atingir positivamente todas as instâncias envolvidas no sistema de saúde, ou seja, docentes da área da saúde, profissionais em formação, profissionais atuantes no sistema público de saúde e os usuários. Palavras-chave: Educação para saúde. Matrizes curriculares. Teleassistência. 176 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura CONCEPÇÃO DE PROFESSORES SOBRE DESEMPENHO ESCOLAR E RELAÇÕES INTERPESSOAIS DE CRIANÇAS EM ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL1 Leticia Mansano Barros2 Juliana Cavalheri3 Rinaldo Correr4 RESUMO Neste estudo, buscou-se caracterizar a concepção de professores sobre crianças em acolhimento institucional, acerca do desempenho em atividades escolares formais e, sobre as relações interpessoais no ambiente escolar. Foi utilizado um Questionário – Roteiro de Observação do aluno. As questões formuladas envolvem as concepções sobre a criança abrigada, o desempenho escolar e as relações interpessoais. O método utilizado foi o descritivo, tendo como abordagem a pesquisa qualitativa. Os participantes foram nove professoras de instituições escolares Estadual, Municipal e Conveniada. Em sua maioria, as crianças abrigadas cursam o jardim I e a segunda série do ensino fundamental, e encontram-se abrigadas em média ha 12 meses em um abrigo para crianças no município de Bauru, interior do Estado de São Paulo. Este artigo apresenta os resultados parciais desta investigação. Destacam-se os relatos trazidos pelas professoras no questionário, sobre o comportamento das crianças e aprendizado nos momentos de transição: no lar provisório; com a visita de seus pais biológicos na instituição; com aproximação de uma família substituta ou reintegração na de origem. Os resultados indicam que, segundo a concepção das professoras participantes: a) a sociabilidade da criança em acolhimento institucional tem sido prejudicada; b) o rendimento escolar em língua portuguesa e em matemática aproxima-se da média apresentada pelo grupo; c) as crianças têm criatividade e realizam bem as atividades propostas; d) em relação a postura das crianças, havia dificuldades de sentar-se corretamente durante a adaptação escolar, fato bastante comum nas crianças de igual idade. Diante das informações coletadas, conclui-se, a partir dos resultados, que os professores apresentam uma percepção ambivalente acerca da participação escolar das crianças: ora identificam aspectos de normalidade, especialmente no que se refere ao desempenho das atividade acadêmicas, ora constatam uma dificuldade no campo da afetividade, verificada a partir das relações interpessoais. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. Este estudo é resultado parcial de projeto de pesquisa de Iniciação Científica do Programa de Pós-graduação em Pesquisa da Universidade Sagrado Coração, financiado pelo Fundo de Amparo à Pesquisa (FAP/USC) 2 Graduanda no quinto ano do curso de Psicologia da Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. 3 Graduanda no quinto ano do curso de Psicologia da Universidade Sagrado Coração - Bauru – SP. 4 Doutorado em Psicologia pela Universidade de São Paulo, Brasil (2007). Professor Assistente da Universidade do Sagrado Coração. 177 Palavras-chave: Crianças em acolhimento Desempenho escolar. Professores. institucional. Ambiente escolar. 1 INTRODUÇÃO/ REVISÃO DE LITERATURA Por meio deste artigo, que se caracteriza por ser uma apresentação dos resultados parciais de um projeto de pesquisa em andamento, nos propusemos a discutir a respeito da concepção de professores sobre crianças em acolhimento institucional, acerca do desempenho em atividades escolares formais e, sobre as relações interpessoais no ambiente escolar. Segundo Mascarenhas e Dupas (2001), Souza Filho e Alencar (2003) poucos são os trabalhos que tratam o acolhimento institucional, e menos ainda aqueles que consideram a experiência vivenciada pela criança, o sofrimento da chegada à instituição e separação de familiares, a vivencia dos conflitos e da rotina, e a experiência de ter que conviver com o que e com quem não escolheu e eventualmente não se adapta. Estas questões se tornam relevantes, tendo em vista as proporções de menores abandonados atingidas em nosso país, seja pelo grande número de instituições, ou pelas conseqüências para o contexto sociocultural. O abrigamento ratifica o fracasso do microssistema familiar que se trata de um contexto marcado, geralmente por abusos físicos, sexuais, negligência, ausência parental, psicopatologia parental, alcoolismo e/ou comportamento violento dos pais (MARTINEZ, 2007). Crianças que receberam maus tratos têm um impacto negativo sobre o seu desenvolvimento, que permanece em todo o curso de suas vidas. Maus tratos que ocorrem nos primeiros cinco anos de vida podem ser especialmente prejudiciais, dada à vulnerabilidade dessas crianças e com o fato de que, os primeiros anos de vida, são caracterizados por especialistas como um crescimento mais rápido e qualitativo do que nos anos subseqüentes (TOTH; CICCHETTI, 2004). Brazelton e Greenspan (2002 apud CAVALCANTE et al., 2009) consideram que a infância representa um período especialmente favorável ao desenvolvimento de certas propriedades humanas; quando a criança é submetida a situações de privação material e emocional severas, geradas ou não pela pobreza, esse potencial de desenvolvimento pode não se realizar de maneira 178 saudável e adequada, o que implica riscos ao processo de estruturação personalidade, à construção da sociabilidade e ao da amadurecimento psicológico. Segundo Cavalcante et al. (2009), é possível afirmar que, a partir do momento em que as crianças deram entrada na instituição, passaram a experimentar uma sobrecarga emocional que não pode ser minimizada, em função de duas situações consideradas muito estressantes: a privação da convivência com seus cuidadores primários e a adaptação às regras que regem a vida institucional, pois, o acolhimento institucional exige a adaptação a novos contextos e papéis, o que pode ser vivenciado pela criança como uma sobrecarga emocional. Shore (1997 apud GARDINAL; MARTURANO, 2007) demonstra que os cuidados precoces têm um impacto decisivo e duradouro no modo como as crianças se desenvolvem no seu potencial de aprendizagem e na sua capacidade de regular as emoções. Portanto, os cuidados recebidos na instituição acolhedora influem no modo como essas crianças se comportarão em sala de aula, e no modo como estes vivenciarão os aprendizados e obstáculos. O desempenho escolar da criança deve ser analisado, considerando-se não apenas suas características pessoais, mas também seu ambiente familiar e seu ambiente escolar, pois tais fatores interagem entre si podendo ora facilitar, ora prejudicar o aluno, suas potencialidades e habilidades (SANTOS; GRAMINHA, 2005). A criança que sofre qualquer tipo de maus tratos ou negligência tem seu desenvolvimento global prejudicado. Os efeitos negativos podem ser observados no funcionamento cognitivo e emocional, e na vida escolar e social da criança. O declínio no desempenho escolar da criança é uma seqüela que vem sendo demonstrada tanto em pesquisas feitas no exterior, como no Brasil (PEREIRA; WILLIAMS, 2008). A situação de acolhimento desenvolvimento da criança; ao apresenta outras interferências no entrar em uma instituição acolhedora, as crianças vivenciam conflitos, desconforto e fragilidade ao se depararem com o novo e a separação da família. Porém, pelo fato de muitas delas estarem em situação de negligência e abandono, não exerciam o direito de estarem matriculadas em uma instituição de ensino, a escola. Dessa maneira, para muitas 179 crianças abrigadas, freqüentar os bancos escolares, é um direito antes negligenciado. Andrade et al. (2005) discorre sobre a importância dos primeiros vínculos, bem como os cuidados e estímulos necessários ao crescimento e desenvolvimento, estes fornecidos na primeira infância através da família. O desenvolvimento cognitivo está relacionado com a dinâmica familiar; a família que é mediadora entre a criança e a sociedade possibilita a sua socialização, elemento essencial para o desenvolvimento. Destaca-se também o estímulo doméstico, quanto melhor a qualidade da estimulação ambiental disponível para a criança, melhor o seu desempenho cognitivo. As relações com os companheiros no contexto da educação infantil, segundo Gardinal e Marturano (2007), implicam comportamentos apontados como anti-sociais. O significado estaria associado à uma seqüência temporal de rejeição, seguida de uma não participação das atividades, o que por sua vez afeta diretamente o desempenho escolar. Coolaham, Fantuzzo, Mendez e McDermott (2000 apud GARDINAL; MARTURANO, 2007) verificaram que comportamentos interativos positivos nas brincadeiras estavam associados com o envolvimento ativo nas atividades de aprendizagem; as crianças mais engajadas nas atividades apresentam níveis mais altos de atenção e persistência, enquanto que os comportamentos desfavoráveis foram associados com uma dificuldade de interação, incluindo resistência em aceitar ajuda de professores. Este estudo se justifica por trabalhar preventivamente com as dificuldades vivenciadas por crianças em acolhimento institucional, pois déficits cognitivos e um ambiente inadequado para a criança, podem funcionar como mecanismos de exclusão social, ampliando ainda mais os limites e reduzindo as oportunidades de aprendizagem. Ainda, as experiências que se processam na infância têm um peso diferenciado no ciclo vital humano e apontam em que direção pode caminhar o desenvolvimento, o que aumenta a importância de pesquisas que tomem como objeto de estudo os contextos de desenvolvimento da criança desde o início da vida. 2 OBJETIVOS 2.1 OBJETIVO GERAL 180 Caracterizar a concepção de professores sobre crianças em acolhimento institucional, acerca do desempenho em atividades escolares formais e, sobre as relações interpessoais no ambiente escolar. 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Descrever como é o desempenho das crianças em acolhimento institucional nas atividades escolares, de acordo com a observação dos professores. - Identificar a concepção dos professores acerca dos relacionamentos interpessoais entre crianças em acolhimento institucional e as demais, no espaço escolar. - Analisar as informações obtidas a partir da literatura recente sobre a temática proposta. 3 METODOLOGIA Esta pesquisa foi realizada com professoras que tinham em sua sala de aula crianças em acolhimento institucional, perfazendo um total de 9 professoras de instituições escolares, nas quais as crianças estão matriculadas por conta da situação de acolhimento (TABELA 1). TABELA 1 - Instituições Escolares pertencentes aos participantes Instituição escolar Nº de professoras Nº de crianças bi d Estadual 1 1 Estadual 1 3 Municipal 3 5 Municipal 1 1 Municipal 1 1 Municipal 1 1 Conveniada 1 1 Fonte: Elaborada pela autora As crianças acolhidas estão cursando, em sua maioria, o jardim I e a segunda série do ensino fundamental, e encontram-se abrigadas em média a 12 meses, pertencentes a um abrigo para crianças no município de Bauru, interior do Estado de São Paulo. As crianças estão acolhidas segundo as normas do Poder Judiciário e do Conselho Tutelar para a reinserção da criança à sociedade. Os critérios utilizados para a inclusão dos participantes foram: concordarem com a pesquisa e terem em sala de aula, alunos em situação de acolhimento 181 institucional. O método de pesquisa utilizado é o descritivo e tem como características: observar, registrar, analisar, descrever e correlacionar fatos ou fenômenos sem manipulá-los, procurando descobrir com precisão a freqüência em que um fenômeno ocorre e sua relação com outros fatores. Optou-se pela qualitativa, que, conforme Gunther pesquisa (2006) busca entender um fenômeno específico em profundidade; de acordo com esse tipo de pesquisa, todas as variáveis são importantes, e o foco da análise se orienta por valores, crenças, opiniões, atitudes e percepções dos participantes. O instrumento usado foi um Questionário – Roteiro de observação do aluno elaborado pela pesquisadora, a partir da revisão de literatura e da definição dos objetivos propostos, como meio para obter as informações necessárias para este estudo. Para analisar as respostas das professoras do Questionário – Roteiro de observação do aluno; foram decompostos os tópicos pré-existentes e avaliados cada um separadamente. Em seguida, os itens dos questionários foram comparados e, depois, discutidos. Foram divididos em: dados de identificação; comportamento; hábitos de organização; rendimento escolar (língua portuguesa e matemática); parecer da professora sobre o aluno; e por último, observações que as professoras fariam sobre as crianças. Ainda, foram utilizadas as letras do alfabeto para denominar e especificar cada professora. Seus respectivos alunos recebem as mesmas letras que suas professoras, porém, lhes foram atribuídos números para diferenciar aquelas professoras que lecionam para mais de uma criança em acolhimento institucional (TABELA 2). TABELA 2 - Dados de identificação dos participantes. 182 Criança A1 B1 C1 D1 E1 F1 F2 G1 G2 H1 I1 I2 I3 Idade 6 anos 11 anos 5 anos 4 anos 3 anos 3 anos 5 anos 6 anos 5 anos 5 anos 8 anos 9 anos 7 anos Fonte: Elaborada pela autora Série 2º ano 1ª série 5º ano 4ª série Jardim II Jardim I Mini maternal Jardim I Jardim I Jardim II Jardim II Jardim I 2º ano 1ª série 2º ano 1ª série 2º ano 1ª série Professora A B C D E F F G G H I I I 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO Das nove professoras participantes que responderam sobre o relacionamento da criança acolhida institucionalmente com as demais crianças e pessoas de sua convivência, foi freqüentemente observado em seus relatos que as mesmas são carentes5 e pedem muito por atenção. Durante o momento em que foi recolhido o questionário, ao entrar em contato com as professoras, observou-se em suas falas muitas manifestações de emoção e envolvimento afetivo. Uma das professoras participantes (C) se emocionou (ficou com os olhos lacrimejados) ao falar do carinho, em especial, que sente por sua aluna acolhida institucionalmente e que lhe comovia muito quando esta pedia para que a professora a adotasse. Apesar da carência percebida pelos professores, a maioria dessas crianças não consegue se relacionar positivamente com seus colegas e pessoas de sua convivência. Das treze crianças, oito não possuem boa sociabilidade, já que, na resposta de suas professoras foram encontradas respostas negativas, significativas, em algumas das seguintes questões: Cumprimenta pessoas? Faz elogios? Expressa carinho? Presta ajuda ao professor e colegas? Como é seu relacionamento com seus colegas, é querido por eles? Tem relações positivas com seus colegas demonstrando capacidade de se preocupar com eles? Expressa frustração de desagrado de forma adequada, sem prejudicar as pessoas? Expressa os direitos e necessidades de forma apropriada? Participa em atividades de grupo? Interage de forma não verbal com pessoas de sua convivência, por meio 5 As professoras utilizam a palavra “carente” de forma recorrente como sinônimo de intensas necessidades em relação à afeto, carinho e contato físico. 183 de sorrisos, e/ou gestos? Segundo, Bowlby (1989 apud DALBEM; DELL'AGLIO, 2005) a criança constrói um modelo representacional interno de si mesma, dependendo de como foi cuidada. Mais tarde, em sua vida, esse modelo internalizado permite à criança, quando o sentimento é de segurança em relação aos cuidadores, acreditar em si própria, tornar-se independente e explorar sua liberdade. Desse modo, cada indivíduo forma um "projeto" interno a partir das primeiras experiências com as figuras de apego. A imagem interna, instaurada com os cuidadores primários, é considerada a base para todos os relacionamentos íntimos futuros. Sua influência aparece já nas primeiras interações com outras pessoas, aflora as figuras de apego, e se expressa nos padrões de apego e de vinculação que o indivíduo apresentará em suas interações interpessoais significativas. A literatura mostra que a criança que possui apego inseguro devido à ausência de uma figura significativa em sua vida desenvolve medo intenso de perder a pessoa ou objeto com o Segundo apud ROTONDARO, Levinzon (2000 qual está se relacionando 2002) há, no nas momento. crianças abrigadas, dificuldades sérias nas relações de objeto, resultando em muita sensibilidade frente a situações de separação e um medo exacerbado de serem abandonadas. Podemos inferir, que essas crianças devem ter ficado expostas a intensas cargas de ansiedade provenientes de situações como a separação da mãe, que deixa “marcas” em seu desenvolvimento. O medo de novas perdas das pessoas de quem dependem ou a quem estão ligadas parece acompanhar a criança como uma cicatriz dolorosa e pronta para se abrir a qualquer momento. Nesse sentido, segundo Bowlby (1990),Freud e Burlingham (1958 apud BARROS; FIAMENGHI JUNIOR, 2007) um comportamento de evitação por parte de uma criança a uma pessoa que lhe ofereça afeto seria considerado adaptativo, pois impediria o sentimento de rejeição ou negligência novamente, trazendo o perigo das crianças apresentarem comportamentos anti-sociais na adolescência e idade adulta. Em relação à criatividade, as professoras deveriam responder se as crianças as quais estas lecionam possuem novas idéias e soluções originais. A professora A1 e G1, não responderam a respeito da criatividade de suas alunas institucionalmente acolhidas. Das onze professoras restantes quatro responderam que as crianças não possuem criatividade, sendo que a professora H, relatou ainda 184 que “H1 apenas faz o que lhe é pedido”. Das sete crianças que possuem criatividade, uma delas, I2, segundo informações da professora I, não demonstra suas idéias por ser uma criança tímida e fechada; enquanto a criança I3 é criativa, mas usa sua criatividade para destruir e/ou furtar materiais, de seus colegas e da escola. Como foi dito, sete crianças possui “capacidade de criar”, ou “criatividade”; esta é a habilidade de resolver problemas de modo peculiar, de desorganizar a realidade e depois organizá-la de outra forma; capacidade de se expandir, produzir e sonhar. Para Piaget (1993 apud SOUZA FILHO; ALENCAR, 2003) as influências do meio e da hereditariedade são recíprocas no desenvolvimento humano, inclusive para o desenvolvimento da criatividade. Assim, além daquilo que foi passado através da hereditariedade, às condições da instituição fazem diferença no desenvolvimento cognitivo da criança em acolhimento institucional. Ainda, Rutter (1980 apud SOUZA FILHO; ALENCAR, 2003) afirma que, os efeitos residuais das experiências precoces no comportamento posterior do indivíduo tendem a ser suavizados por causa de mudanças maturacionais que acontecem principalmente na primeira infância e também por causa dos efeitos benéficos de experiências positivas vividas posteriormente. Logo, no caso das crianças acolhidas institucionalmente, o novo ambiente da criança, a instituição, deve proporcionar: boa alimentação, melhor qualidade das relações sociais, presença de cuidadoras a positivamente, atendimento quais as crianças poderão se vincular médico/odontológico/psicológico, entre outros, parecendo agir no sentido de diminuir e/ou suprimir os possíveis efeitos estressores do ambiente em que viviam anteriormente, favorecendo assim, o desenvolvimento da criatividade da criança e cognitivo como um todo. Sobre o fato de I3 usar sua criatividade para destruir e/ou furtar objetos, pode-se dizer que, como as crianças que vivem acolhidas institucionalmente, de maneira geral, tiveram situações estressantes e desfavoráveis, originou a necessidade de mecanismos de defesa específicos para lidarem com o sentimento de abandono e desproteção. Assim, segundo Levinzon (2000 apud ROTONDARO, 2002), para lidar com este sentimento, as crianças podem desenvolver comportamentos personalidade do tipo “falso self”. anti-sociais ou desenvolver estruturas de 185 Sobre a habilidade de aprendizagem das crianças em situação de acolhimento institucional, dez das treze crianças encontram-se satisfatórias. Dessa forma, estas possuem um bom traçado, executam perfeitamente as atividades escolares propostas por suas professoras e possuem boa memória visual. I1, no inicio, teve muita dificuldade na coordenação motora, porém, segundo sua professora, “agora está ótima”. As três demais crianças não possuem de modo satisfatório a habilidade de aprendizagem. B1, segundo sua professora B, tem boa memória visual e apresenta bom traçado (tanto na escrita, como também nos desenhos), mas, “a execução de seus trabalhos escolares fica comprometida, pois a aluna faz tudo muito rápido, sem se concentrar. Como suas atividades são diferenciadas, ela deseja trabalhar o que os demais trabalham; por exemplo, no momento de leitura individual (lista de palavras, fichas) ela se irrita. Quer ler tudo rápido e questiona sobre a atividade dos outros (atividade de Xerox, lousa e livros)”. Sobre H1, a professora H escreveu que este possui boa memória visual, porém, “não possui o traçado muito firme e não há muitas formas em seu desenho. Não escreve seu nome, sente alguma dificuldade em ser alfabetizado e ainda, não mostra muito interesse em aprender”. Ao relatar sobre a execução de seus trabalhos escolares, a professora H escreveu que “este faz tudo rápido, pois tem pressa em acabar”. Ainda, da mesma forma que B1 e H1, I3 possui boa memória visual, porém segundo a professora I, “ainda tem dificuldade no traçado; mas quando iniciei o trabalho com ele apenas rabiscava e não conseguia cobrir uma linha. É muito difícil conseguir que ele execute as atividades”. Em relação ao rendimento das crianças em situação de acolhimento institucional em língua sete não portuguesa, foi observado que, das treze crianças, possuem dificuldades. Dessas, há as crianças D1, F2, e G2, que estando na educação infantil, é esperado alfabetizadas e que assim, estejam que iniciando estas não estejam o desenvolvimento da linguagem oral e escrita. Ainda, estas possuem boa expressão verbal. E1 apresenta desenvolvimento da linguagem oral e escrita de acordo com sua faixa etária, porém, quanto a sua expressão verbal, apresenta dificuldades, pois, sua professora relata que ele “não se expressa verbalmente”. Segundo o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998), crianças de três anos – idade da criança E1 – utiliza linguagem oral para conversar, comunicar- 186 se, relatar suas vivências e expressar desejos, vontades, necessidades, sentimentos, nas diversas situações de interação presentes no cotidiano. C1, sendo da Educação Infantil, apresenta o desenvolvimento da sua linguagem oral e escrita de acordo com sua faixa etária, porém, segundo sua professora, ao se expressar verbalmente, esta “possui uma boa linguagem e é de fácil compreensão, mas, seleciona as pessoas para manter diálogo”. Sobre as crianças I1 e I2, observa-se que estas apresentam o desenvolvimento da linguagem oral e escrita de acordo com sua faixa etária. Apesar dessas crianças não estarem na sua série escolar referente à faixa etária, não é possível afirmar que estas possuem dificuldades e foram assim retidas, pois, não se conhece o histórico escolar destas crianças. Das crianças restantes, seis apresentam alguma dificuldade na língua portuguesa. Há A1, que está no Ensino Fundamental e que apresenta o desenvolvimento da linguagem oral de acordo com a sua faixa etária; porém segundo professora A esta possui dificuldades na escrita. Ela está no nível silábico com valor sonoro. Neste nível, segundo Ferreiro e Teberosky (1998) a criança passa a registrar uma letra para cada compreendendo o valor sonoro convencional das letras. emissão sonora, Assim, neste nível a criança: já supõe que a escrita representa a fala; tenta fonetizar a escrita e dar valor sonoro às letras; pensa que a menor unidade da língua seja a sílaba; supõe que para cada silaba oral corresponde uma letra; e, em frases pode escrever uma letra para cada palavra. Entre as crianças que possuem dificuldade, há também B1 e I3 que estão no nível silábico com valor sonoro, assim como A1. No caso de B1, a criança se expressa muito bem verbalmente, porém, apresenta dificuldades em sua linguagem oral e escrita. Sua professora relata que “a aluna apenas reconhece vogais e algumas letras do alfabeto” e que “somente possui seqüência de idéias oralmente”. Por B1 estar no 5º ano 4ª série, tendo 11 anos de idade, esta não está na série escolar referente à sua faixa etária, por ter muitas dificuldades de aprendizagem. Enquanto, I3, segundo sua professora, “tem dificuldade no traçado e apenas conhece vogais e domina algumas sílabas simples”. Dessa forma, este apresenta dificuldades na linguagem escrita e também na linguagem oral. Ainda, sobre a sua expressão verbal, é relevante relatar que este, às vezes, infantiliza a fala; por exemplo: “vochê” ao invés de “você”. 187 F1, esta se desenvolvendo satisfatoriamente na linguagem escrita e oral, de acordo com sua faixa etária, porém, quanto à expressão verbal, apresenta dificuldades, pois fala de maneira errada; exemplo: “prefessora” ou invés de “professora”. Enquanto que, G1, possui segundo sua professora “muitas dificuldades na escrita”; ainda, a professora relata que sua linguagem oral é boa e que ele “não fala errado, mas fala muito pouco e baixo”. Por último, há H1 que segundo sua professora “não escreve seu nome e sente alguma dificuldade em ser alfabetizado”, ainda este “sente dificuldade em realizar atividade de escrita, mesmo que simples”. Em relação ao rendimento escolar na matemática das crianças em situação de acolhimento institucional, foi verificado que, das treze crianças, três não possui um bom desempenho, havendo dificuldade no raciocínio lógico matemático; enquanto nove das crianças restantes possuem rendimento favorável. Ainda, das treze crianças, uma delas, a criança E1, não possui informações, pois a professora E não respondeu a respeito de seu rendimento escolar na matemática. Sobre as três crianças que não possuem bom desempenho, pode-se dizer que, B1, de acordo com sua faixa etária (11 anos), não se encontra no ano escolar referente à sua idade e apresenta dificuldades no raciocínio lógico matemático. Esta deveria estar segundo Bock, Furtado e Teixeira (2005), iniciando o período das operações formais, o qual ocorre à passagem concreto para o pensamento formal, abstrato, ou do pensamento seja, realizando as operações no plano das idéias, sem necessitar de manipulação ou referencias concretas. Porém, esta resolve operações somente com material concreto e apenas com o auxilio da professora; esta relata que “B1 não tem autonomia para resolvê-los sozinha”. Ainda, a mesma conhece seqüência numérica oral e escrita, somente até 19, não adquiriu conceitos básicos como: forma, posição e quantidade, e compreende apenas alguns valores das moedas, não sabendo utilizála. A respeito da criança G1, sendo esta pertencente à Educação infantil (Jardim II), ela poderia ter adquirido pelo menos os conceitos básicos: cor, tamanho, forma, posição e quantidade; ainda, esta criança apresenta dificuldade de raciocínio lógico matemático. De acordo com o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998), nesta faixa etária – de quatro a seis anos – durante as 188 aulas aprofundam-se os conteúdos indicados para as crianças de zero a três anos, dando-se crescente atenção à construção de conceitos e procedimentos especificamente matemáticos. Dentre os conteúdos há: números, grandezas, espaço e formas. Assim, a criança G1 poderia identificar posição de objetos ou número numa série, comunicar quantidades, identificar cor e tamanho, e ter noção de formas geométricas, ou apenas, alguns desses conceitos descritos. Enquanto, a criança I3, de acordo com sua faixa (7 anos), apresenta dificuldades no raciocínio lógico matemático, pois, escreve apenas números de 0 à 9, sem seqüência numérica e com números espelhados. Segundo Bock, Furtado e Teixeira (2005), em nível de pensamento, a criança no período das operações concretas conseguiria seqüenciar idéias, números ou eventos. Sobre as nove crianças que possuem rendimento escolar matemático favorável, pode-se dizer que, dentre elas, C1, apesar da indicação dada pela professora desta possuir raciocínio matemático lento, está dentro dos padrões esperados para sua faixa etária, sendo a criança pertencente à Educação Infantil. Esta possui 5 anos e está no jardim II, assim, com esta idade, espera-se que a criança adquira alguns desses conteúdos: identifique posição de objetos ou número numa série, comunique quantidades, identifique cor e tamanho, e possua noção de formas geométricas. Dessa forma, esta criança domina todos estes conceitos básicos. A respeito das crianças D1, F1, e F2, pode-se dizer que, apesar dessas possuírem dificuldade de raciocínio lógico matemático, sendo estas pertencentes à Educação Infantil (estando no Jardim I), suas dificuldades são irrelevantes, pois, estão de acordo com sua faixa etária. Em relação à I1 e I2, pode-se dizer que, de acordo com a faixa etária dessas crianças (8 e 9 anos), estas apresentam bom desempenho na matemática, pois, segundo Bock, Furtado e Teixeira (2005), se encontram no período das operações concretas, onde as operações são realizadas através de objetos concretos presentes ou já experienciados. Assim, não pode ser esperado que estas realizem operações sem o material concreto. Apesar dessas crianças, I1 e I2, não estarem na série escolar referente à sua faixa etária, não é possível afirmar que estas possuem dificuldades e foram assim retidas, pois, não se conhece o histórico escolar destas crianças. 189 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A família é considerada, de maneira geral, o primeiro e o principal contexto de desenvolvimento da criança, justamente porque tem obrigações e responsabilidades bem específicas ao longo da trajetória de socialização e da estimulação da aprendizagem escolar da criança (DELFINO et al., 2005). No caso da criança acolhida institucionalmente, nessas circunstâncias de privação dos laços parentais, o lar provisório deve promover o bem-estar físico e emocional da criança, assim como, promover um ambiente que a estimule e a faça desenvolver cognitivamente. As dificuldades no rendimento escolar de algumas das crianças em situação de acolhimento institucional podem ser justificadas, assim, pela inserção tardia das mesmas em instituições escolares. A negligência dos pais e/ou cuidadores na área da educação acaba por prejudicar a carreira educacional das crianças, seja por menor nível de acompanhamento intelectual, ou insucesso escolar. No contexto da instituição de acolhimento, é freqüente a alteração do estado de humor das crianças, variando em estados de euforia e inquietude à melancolia. Tais estados são relacionados com o momento na qual a criança vem ultrapassando dentro da instituição de acolhimento. Estas características foram significativamente percebidas pela professora de E1, que relata que “desde quando seus pais começaram a visitá-lo na instituição que o acolhe, este quase não fala mais, não se interage com as pessoas de sua convivência escolar, voltou a usar fraldas e a dormir na escola, regredindo bastante”. Dessa forma, relaciona-se o bom rendimento escolar, assim como a sociabilidade, das crianças que se encontram em situação de acolhimento institucional com o momento de vida de cada criança. Portanto, é relevante mencionar que quando uma criança esta em aproximação com a família, ou é encaminhada para a adoção seu estado de humor se altera, mostrando-se mais alegre, sociável e criativa. Contrapondo, quando uma criança vivencia dentro da instituição um período longo e difícil, a mesma apresenta humor depressivo, o que resulta em um mau rendimento escolar. Este fato é exemplificado pelos relatos das professoras através do questionário utilizado no presente projeto. Além da professora E que relata sobre a mudança significativa de 190 comportamento de E1 após a visita de seus pais, há outras professoras, como a A, C, F, H e I que discorrem no questionário sobre dificuldades de aprendizagem corroboradas com momentos estressantes vivenciados com a família de origem e também na instituição que acolhe as crianças. Assim situação como a literatura de acolhimento já demonstrou, muitas das crianças em institucional provém de famílias de baixa renda, vivendo em até mesmo situações miseráveis, nas quais não demonstram hábitos e posturas adequadas, como o de se sentarem a mesa para comerem ou realizarem tarefas; ou ainda de não utilizarem banheiros para satisfazer suas necessidades. Desse modo, ao estudar os questionários, pesquisadora e colaboradora notaram uma relação entre os hábitos apresentados pelas crianças, ainda quando pertenciam suas famílias de origem, e os hábitos apresentados na escola, uma vez que algumas delas, estavam freqüentando a escola pela primeira vez. Com freqüência as crianças relatavam que dormiam e sentavam no chão, ou que não havia banheiros em suas casas, sendo relacionado com os comportamentos de sentar de joelho na cadeira – A1; debruçar-se sobre a mesa e sentar de perna aberta – B1; e sentar-se no chão – D1. Há relação entre comportamento/ ensino o e cotidiano na aprendizagem instituição das de crianças acolhimento em e o acolhimento institucional. Aquelas que enfrentaram bem e elaboraram melhor a inserção na instituição de acolhimento e seus acontecimentos diários, apresentam desenvolvimento escolar e interpessoal satisfatório, estando dispostas a enfrentar os acontecimentos estressantes de suas vidas; já aquelas que não ou pouco elaboraram suas situações de vidas, acabam por se fecharem em seus mundos, muitas vezes de modo entristecedor, resultando em relações sociais somente com aquelas crianças que tem em seu histórico de vida situações de acolhimento institucional, ou situações semelhantes, como negligência, abuso, pobreza e abandono; não esperando nada para si, nem relações favoráveis com as demais pessoas ou aprendizagem escolar satisfatória. ABSTRACT In this study, we sought to characterize the design of teachers on children 191 sheltered, about the performance in formal school activities, and on interpersonal relations in the school environment. We used a questionnaire - Roadmap Observation of the student. The questions raised involve the conception of the child sheltered, school performance and interpersonal relationships. The method used was descriptive, based approach to qualitative research. Participants were nine teachers of educational institutions State, Municipal and Covenants. Most of the children sheltered are students at the garden I and the second grade of elementary school, and are housed on average 12 months in a shelter for children in Bauru, interior of Sao Paulo. This article presents the partial results of this investigation. They include the reports brought by the teachers in the questionnaire on children's behavior and learning in times of transition: the transitional home, with a visit from their biological parents in the institution, to the nearest one foster family or reintegration into the home. The results indicate that, on the principle of participating teachers: a) the sociability of the child shelter been hampered b) academic achievement in English and mathematics is approaching the average presented by the group, c) children have creativity and perform the proposed activities and d) for the position of children, had difficulties to sit correctly at school adjustment, actually quite common in children of the same age. Based on the information collected, it is concluded from the results, teachers have an ambivalent perception about the participation of school children: now identify aspects of normality, especially as regards the performance of academic activity, sometimes note a difficulty in field of affectivity, recorded from interpersonal relations. Keywords: Children sheltered. School environment. School performance. Teachers. REFERÊNCIAS ANDRADE, S.A. et al . Ambiente familiar e desenvolvimento cognitivo infantil: uma abordagem epidemiológica. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v.39, n.4, 2005. BARROS, R.C.; FIAMENGHI JR., G.A.. Interações afetivas de crianças abrigadas: um estudo etnográfico. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v.12, n.5, out. 2007. BOCK, A.M.B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M.L.T. Psicologias: uma introdução ao estudo de psicologia. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. BRASIL. Ministério da Educação/Desporto. Secretaria de Educ. Fundamental. Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil. v.3, Brasília: MEC/SEF, 1998. CAVALCANTE, L. I. C. et al. Processos de saúde e doença entre crianças institucionalizadas: uma visão ecológica. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v.14, n.2, abr. 2009. DALBEM, J. X.; DELL'AGLIO, D. D. Teoria do apego: bases conceituais e desenvolvimento dos modelos internos de funcionamento. Arq. bras. psicol., v.57, 192 n.1, p.12-24, jun. 2005. DELFINO, V. et al. A identificação da violência doméstica e da negligência por pais de camada média e popular. Texto contexto - enferm., Florianópolis, v.14, n. spe, 2005. FERREIRO, E.; TEBEROSKY, A. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998. GARDINAL, E. C.;MARTURANO, E. M. Meninos e meninas na educação infantil: associação entre comportamento e desempenho. Psicol. estud., Maringá, v.12, n.3, dez. 2007. GUNTHER, H. Pesquisa qualitativa versus pesquisa quantitativa: esta é a questão?. Psic.: Teor. e Pesq., Brasília, v.22, n.2, ago. 2006. MARTINEZ, A. Psicologia escolar e compromisso social: novos discursos, novas práticas. 2. ed. Campinas: Editora Alínea, 2007. MASCARENHAS, S. H.; DUPAS, G. Conhecendo a experiência de crianças institucionalizadas. Rev. esc. enferm. USP, São Paulo, v.35, n.4, dic. 2001. PEREIRA, P. C.; WILLIAMS, L. C. A. A concepção de educadores sobre violência doméstica e desempenho escolar. Psicol. esc. Educ, v.12, n.1, p.139-152, jun. 2008. ROTONDARO, D. P. Os desafios constantes de uma psicóloga no abrigo. Psicol. cienc. prof. sep., v.22, n.3, p. 8-13, 2002. SANTOS, P. L.; GRAMINHA, S. S. V. Estudo comparativo das características do ambiente familiar de crianças com alto e baixo rendimento acadêmico. Paideia, Ribeirão Preto, v.15, p. 217-226, 2005. SOUSA FILHO, P. G.; ALENCAR, E. M. L. S. Habilidades de pensamento criativo em crianças institucionalizadas e não institucionalizadas. Estud. psicol. (Campinas), Campinas, v.20, n. 3, dez. 2003. TOTH, S.L.; CICCHETTI, D. Child maltreatment and its impact on psychosocial child development. In: TREMBLAY, R. E.; BARR, R. G.; PETERS, R. D. V. (Ed.). Encyclopedia on Early Childhood Development. Montreal, Quebec: Centre of Excellence for Early Childhood Development, 2004. p.1-8. Disponível em: <http://www.child-encyclopedia.com/documents/Toth-CicchettiANGxp.pdf>. Acesso em: 4 maio 2009. 193 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura TEORIAS TEXTOS1 SEMÂNTICAS: FERRAMENTAS PARA INTERPRETAÇÃO DE Letícia Martins Ferreira2 RESUMO Através da análise da música “Canto Áspero” de Francisco Rogério Vidal e Silva, este trabalho visa comentar e discorrer sobre a descrição semântica de B. Pottier, o percurso gerativo de sentido de Greimas e o quadrado semiótico de Greimas e Rastier como ferramentas uteis para a análise e interpretação de textos. Palavras-chave: Quadrado Semiótico. Percurso gerativo do sentido. Paradigmático. Sintagmático. 1 INTRODUÇÃO Neste artigo faremos a análise da música “Canto Áspero” de Francisco Rogério Vidal e Silva. A canção é o relato de um observador que via a destruição da natureza e alertava para um final catastrófico, caso não fossem tomadas medidas para evitar a enorme agressão que o ambiente sofria. O Compositor, Francisco Rogério Vidal e Silva, natural de Ubajara, CE, que veio ainda bebê com sua família para Torrinha, SP. Iniciou o aprendizado de música com seu pai, Juarez Vidal e Silva e continuou a estudar sozinho ao longo do tempo. É engenheiro agrônomo formado pela ESALQ em 1982, foi secretário de agricultura e abastecimento de Piracicaba, vereador de 1989 a 2002, Presidente da Câmara de 2001 a 2002 e é secretário de defesa do meio ambiente desde de novembro de 2005. Participou de diversos festivais de amadores de música, com a música “Canto Áspero” conquistou o 3º lugar no II Festival de Música Ecológica do SESCPiracicaba em 1982. No ano anterior havia alcançado o 1º lugar com a música 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluna da Universidade Sagrado Coração. 194 serpente de Prata que fala sobre o rio de Piracicaba. Rogério Vidal, sempre se preocupou com questões ambientais e destaca que o Brasil é, ainda hoje, o 3º maior emissor de gases de efeito estufa do planeta( atrás somente dos EUA e China). 2 DESENVOLVIMENTO Começaremos a análise da música “Canto Áspero” sob a descrição semântica de Pottier. Para isto, é necessário esclarecer alguns conceitos. Edward Lopes em Fundamentos da linguística contemporânea afirma que pelo estudo de Pottier se vê que os conteúdos de uma língua natural se deixam captar dentro de um processo generalizador segundo qual cada traço do conteúdo (Sema = traço mínimo entra na constituição de uma palavra) é reunido em um conjunto (Semema/semantema no texto), ligando-se a esse conjunto a outros, formando um campo associativo, que no texto é o virtuema (possibilidades abertas a serem preenchidas por cada contexto-ocorrência em particular, ao nível da parole), dominados por uma mesma base comum. Assim para entender a teoria de Pottier destacamos : • Sema-traço mínimo pertinente no plano de conteúdo. • Semema/semantema(texto)- conjunto de semas. • Virtuema- Possibilidades abertas a serem preenchidas no contextoocorrência. • Classema- categoria que permite reunir as palavras em classe semântico funcional, ou seja, que as define. Conforme podemos dizer que uma palavra não se define isoladamente, porém por meio de relações com outras palavras. Segundo Pottier estas se estabelecem por meio de quatro relações fundamentais: 1. Relação de oposição ( )- Termos que se excluem mutuamente no plano paradigmático . 2. Relação de inclusão (C) – entre um termo mais geral e inclusivo e os demais termos de um paradigma. 3. Relação de participação (E)- Quando um termo é sema de outro. 4. Relação de associação (~)- entre um signo e outro que ele se prende por vínculos psicológicos, sociais,afetivos, morais... 195 Então podemos afirmar que ao aplicarmos estas relações em termos de um texto encontraremos o seu significado naquele contexto. Em um segundo momento aplicaremos o percurso gerativo de sentido de Greimas e o quadrado semiótico de Greimas e Rastier, também na música “Canto Áspero”. Para Greimas as línguas naturais são feitas de oposições. A apreensão das significações de real são feitas através de afirmações de descontinuidade, ou seja , entendemos o sentido de um sema ao compararmos com o significado que não é. Greimas e Rastier descrevem o estatuto lógico que define a estrutura profunda das línguas naturais da seguinte maneira: • Eixo semântico (S) representa a substância do conteúdo, articula-se, ao nível da forma de conteúdo, em dois semas contrários, S1 e S2. Eixo horizontal- estabelece uma relação hierárquica hiponímica: S1 e S2 são as partes constituinte de S, que por sua vez os totaliza. • Eixo Semântico(S)- Sema neutro- é o eixo que marca a relação entre significação e o eixo que marca a relação entre a significação e não significação. Portanto temos dois eixos: S e S. S é o eixo complexo, subsoma S1 e S2. O seu contrário S é o eixo neutro que subsoma S1 e S2. Para Greimas exitem dois esquemas de contradição-/S1/+/S1/ e /S2/+/S2/ -e duas dêxis de implicação – S1 – S2 (dêxis 1) e S2- S1. Desta maneira podemos afirmar: - Partindo dos Semas S1 e S2, para o todo, S = Relação hiponímica. -Partindo do todo S, para os sema S1 e S2 = Relação Hiperonímica. -Partindo de um sema (S1 ou S2) para o sema contrario (S2 ou S1),pertencentes à categoria S= Relação antonímica. Quanto o percurso gerativo de sentido é fundamental para a teoria semiótica, pois prevê a geração de sentido através do nível semi-narrativo,ou seja, geral e abstrato, que se específica e se concretiza na instância da enunciação do nível discursivo. O percurso gerativo do sentido se divide em 3 etapas . A 1ª etapa é denominada nível fundamental, e é então que surge a significação como uma oposição semântica mínima; onde no nível profundo, o sentido se articula na relação entre os semas insaturados no quadrado semiótico. É conceptual e lógica. De 196 caráter paradigmático, constrói-se o inventário de categorias sêmicas na investigação de valores morais, políticos, religiosos, sociais ... A 2ª etapa é o nível narrativo, onde se organiza a narrativa do ponto de vista de um sujeito. De Caráter sintagmátco é a busca permanente de valores (Conquista psicológica, material, espiritual, Social e sua atualização). Os Sujeitos desenvolvem programas narrativos na busca do objeto-valor, a fim de definir sua competência no nível do ser e do fazer. A competência é definida pela aquisição de habilidades para realizar um programa narrativo. A 3ª etapa chamamos de nível discursivo em que a narrativa é assumida pelo sujeito da enunciação. Assim temos os temas/figuras. Um percurso narrativo pode ser convertido( Na discurssivização) num percurso temático e numa etapa ulterior, num percurso figurativo. CANTO ASPERO Música de Franscisco Rogério Vidal e Silva Sou uma ave que gorjeia, solitária e feia sobre um fio,que busca com seu canto, acordar a quem dormiu. Do sono dos incautos e nem viu o claustro que se construiu. Pro homem que nem viu a cor do bosque que sumiu, nem viu a cor do rio que se afogou na lama, daquilo que se chama civilização. Sim sou ave feia e solitária que incomoda com seu canto áspero. O rítmico canto que vem das fábricas: Que fazem fumaça, Que fazem fuligem, Que causam desgraça, E causam vertigem. Que suprema ironia, ainda fazem piuí , pra anunciar o fim do dia. Sou sim, solitária e feia ave, que qual nave extraterrena pousa sobre as mãos geladas de quem ainda ousa levantar a voz, para alertar o óbvio. E como OVINI, voou os céus em voo livre, ver se lá de cima vejo um verde, antes que seja tarde; Ver se vejo um rio antes que venha a sede; Ver se vejo um bicho antes que venha o fogo; Ver se vejo a luz antes que venham as trevas; Ver se vejo um homem antes que seja o fim Análise da Música Canto Áspero Greimas Percurso gerativo de sentido: • Nível Narrativo: 197 S1- Ave S2 – Homem OV1 – Alertar sobre a necessidade de preservar o meio ambiente OV2- Lucro, conforto tecnológico Inicialmente temos o S1 em disjunção com o OV1, mas o S2 está em conjunção com o OV2. S1 entra em conjunção com a manipulação por provocação e intimidação causada pela devastação ambiental, em seguida entra em conjunção com OM (dever)- Necessita anuncias a catástrofe que se aproxima; OM (poder)tem autonomia de fazer; OM(querer)- A ave quer anunciar ; OM (Saber) –através de seu canto. S1 entra em conjunção com OV1, pois seu canto incomoda, ela se faz ouvir. Portanto para a ave a sanção é eufórica. Por sua vez S2 entra em conjunção com OV2, pois se não mudar a sua atitude será o seu fim, portanto sanção disfórica. • Nível Fundamental: Preservação da natureza x exploração da natureza Vida x Morte Natureza x Civilização Lucro x sustentabilidade • Nível Discursivo: O homem depende da natureza. A civilização destrói a natureza. O homem precisa aprender a consumir de forma sustentável. O modo de consumo predatório leva o homem ao fim. Em relação à ave: S1∩OV1 198 Em Relação ao homem S2UOV2 O Quadrado Semiótico Greimas e Rastier Natureza Ave Homem Alerta Fim Consumo predatório Sustentabilidade Reflexão 3 CONSIDERAÇÃOES FINAIS A busca de sentido de um texto pode ser feita através de diversas ferramentas. Grandes nomes como Pottier, Greimas , Rastier entre outros foram eficazes em suas teorias quanto ao significado e significação das palavras em um texto, ou contexto. Saber ler não é simplesmente o ato de decodificar palavras, mas saber compreender o sentido dentro de um contexto maior, mais amplo. Assim concluímos 199 que saber interpretar textos é fundamental para o processo de aprendizagem, bem como para o trabalho e vida. ABSTRACT Throughout the analysis of the song “Canto Áspero” by Franscisco Rogério Vidal e Silva this academic paper aim to comment and write about the semantic description of Pottier, the theory of the generative trajectory of meaning by Greimas and the semiotic Square by Greimas and Rastier as useful tools for text interpretation and analysis. Key words: Semiotic Square. The generative trajectory of meaning. Paradigmatic. Syntagmatic. REFERÊNCIAS LOPES, Edward. Fundamentos da lingüística contemporânea. São Paulo: Cultrix, 1979. SA, Lea Silvia Braga Castro. Texto prévio 12: a descrição Semântica de Pottier. Bauru – SP, 2009. ______. Texto prévio 13: semântica estrutura de Greimas. Bauru – SP, 2009. 200 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura A MEDIAÇÃO E A INTERATIVIDADE NO ENSINO DA LINGUAGEM POR MEIO DE TEXTOS MIDIÁTICOS1 Ligia Beatriz Carvalho Almeida2 RESUMO Amparado nas reflexões de pesquisadores da relação existente entre a sociedade, a linguagem e a educação escolar como: Bakthin, Vygostski, Foucault, Scardamalia e Bereiter, Miller e Góes delineia-se um construto teórico reunindo argumentos para a apropriação das linguagens midiáticas no ensino da língua portuguesa nos ambientes escolares. A justificativa reside no coeficiente dialógico e interativo que as mesmas oferecem. Diferencia-se as várias formas da utilização das tecnologias na educação, que implicam tanto no uso instrumental quanto no uso linguístico. São elas: a) educação às mídias (ou mídia-educação) que se centra no ensino e aprendizagem sobre a atuação dos meios de comunicação na sociedade; b) o uso instrumental das tecnologias na educação, conhecido como mídia educativa (ou tecnologia educacional); c) o uso da tecnologia para ensinar a distância, denominado de EaD. O que se explora neste texto é a potencialidade existente na primeira das formas mencionadas que subsidia atividades de produção e avaliação de textos comunicativos em ambientes escolares. Inicia-se apontando o papel da linguagem como forma de mediação social que solicita o domínio de códigos complexos para sua apropriação, competência esta que cabe a escola desenvolver nos alunos. A importância da interação para a aprendizagem significativa da linguagem é destacada. Tal interação é facilmente obtida por meio da veiculação de discursos nos meios de comunicação como o rádio e a internet, disponíveis na maior parte das escolas brasileiras. Palavras-chave: Linguagem. Mídia. Educação. Escola. 1 INTRODUÇÃO O ser humano é eminentemente social. Sua subjetividade é moldada pela sociedade na qual está inserido. Ao nascer, a criança mergulha em uma cultura com padrões pré-estabelecidos. Norteada por um sistema de significados já consolidado, sua língua pátria já está pré-determinada, bem como os padrões de comportamento 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Radialista pela USP; mestre em Comunicação pela Unesp/Bauru e doutoranda em Educação pela Unesp/Marília. Professora dos cursos de Comunicação Social da Universidade Sagrado Coração (USC), Bauru-SP. 201 aos quais terá que se adaptar e que incluem formas de se expressar, brincadeiras permitidas, hábitos alimentares. Até mesmo a classe social que sua família ocupa será fator determinante na organização de sua concepção de mundo. Esses valores são, na maior parte do tempo, transmitidos à criança pela palavra. Por isso afirma-se que é a palavra que permite a constituição do sujeito na e por meio da linguagem. O entendimento da linguagem permite a compreensão do mundo. Na medida em que o domínio da linguagem pela criança avança, aumenta o vocabulário que utiliza e a sua capacidade de expressão usando estruturas mais complexas. Aprende a dominar primeiro a linguagem oral e corporal e depois, com o desenvolvimento da capacidade de abstração, os códigos simbólicos utilizados na linguagem escrita. Esse percurso ocorre em paralelo à ampliação de seu universo de relações sociais e dialógicas. Em casa há a família e, em uma tela chamada de TV, o mundo globalizado. A próxima etapa a insere na comunidade escolar e em instituições sociais ligadas à religião e às atividades comunitárias, comerciais, de entretenimento, entre outras. A exposição às mensagens mediadas se intensifica. Família, escola, amigos, televisão, livros, cinema, rádio, internet, placas de outdoor, revistas, jornais e outras mídias externas, internas e alternativas passam, vagarosamente, a integrar e determinar temas do seu universo dialógico. Vygotski (1998) ressalta que as funções psíquicas superiores constroem-se primeiro no nível interpsíquico, em que o indivíduo alimenta-se com informações fornecidas pela sociedade e só depois no intrapsíquico, quando consolida seu repertório individual. Tais funções são, então, construídas ao longo da história social do homem, em sua relação com a cultura, tendo como resultado a apropriação de certos conhecimentos, valores e conceitos que não existiam a priori, mas que foram apreendidos por meio das práticas sociais, tais como a capacidade de uso da linguagem, da abstração, do raciocínio lógico, memória, planejamento, entre outras. As funções psíquicas superiores advêm de processos voluntários, ações conscientes, mecanismos intencionais e dependem de processos de aprendizagem. Em Bakhtin (1990) encontra-se uma expressiva fundamentação sobre a base social da língua e a influência e relação recíprocas possíveis entre indivíduo e sociedade. De acordo com o autor, a língua opera como elemento estruturante da relação social 202 e determinante das subjetividades individuais. Ele, no entanto, ressalta a necessidade de se ter mais do que a competência da leitura. Mostra ser imperativo o desenvolvimento da consciência sobre a produção ideológica da humanidade no campo das ciências, das artes, entre outros, para que avanços sociais ocorram e enfatiza que tal possibilidade está condicionada à libertação da “mentalidade resignada e submissa” que impera na arena do “eu” (BAKHTIN,1990, p.116-120). Dessa forma, em sua visão, é vital que o “pensamento interior” seja expresso pela enunciação, forçando-o a um “compromisso social”, uma das etapas da formação da consciência. As considerações de Bakhtin (1990, p. 120-121) permitem concluir ser a atuação dos indivíduos no eixo da produção de enunciados, essencial. Ele afirma que “somente o diálogo com os sistemas ideológicos socialmente estabelecidos [...] confere responsabilidade e criatividade aos falantes gerando enunciações mais móveis e sensíveis que as ideologias constituídas e permite revisões parciais, ou totais, dos sistemas ideológicos” Tecendo considerações da autoria em sua relação com a alfabetização, na atualidade ser alfabetizado significa ter a capacidade de ler, escrever e interpretar uma ampla variedade de mensagens, como textos impressos, notícias, filmes, videogames e textos informáticos. Essa condição é essencial para que se usufrua da liberdade de expressão e do direito ao acesso à informação. Preconiza-se que somente cidadãos alfabetizados poderão garantir o estabelecimento e a manutenção da democracia. Dado que as funções psíquicas superiores referem-se a processos voluntários, ações conscientes, mecanismos intencionais e dependem de processos de aprendizagem, tanto a leitura quanto a produção de textos devem ser objetos de ensino e avaliação de desempenho escolar, visando à formação do cidadão e ao avanço social. Diante desse cenário apresentam-se argumentos a favor da apropriação das linguagens midiáticas no ensino da língua portuguesa nos ambientes escolares, graças ao coeficiente dialógico e interativo que as mesmas oferecem. 2 LINGUAGEM E MEDIAÇÃO 203 Assume-se aqui como mediação aquela existente entre o sujeito e a realidade, que deriva da capacidade de abstração e do uso do simbolismo, não limitando o conceito à mediação que se dá pelo uso dos meios de comunicação impressos e eletrônicos na transmissão de mensagens entre emissores e receptores - a comunicação mediada. O que nos torna diferentes dos animais é o ato de dar nome, de operar conceitos de forma simbólica. O nome é um símbolo atribuído a objetos do mundo natural e às entidades abstratas que habitam nosso pensamento. O nome é portador de um conceito que deriva da consciência que se adquire do mesmo. A consciência sobre o objeto está sujeita a filtros interpsíquicos que agem sobre o indivíduo. Os filtros culturais atuam, consciente e inconscientemente e o sujeito conhecerá o objeto segundo as referências que possui de estereótipos ideológicos, identificando, portanto, o objeto a partir de um conceito dado socialmente. Seu conhecimento será mediado pela cultura, construída pela humanidade pré-existente a ele, o que evidencia que enquanto sujeito do conhecimento o homem não tem acesso direto aos objetos, mas acesso mediado. A linguagem é uma forma de mediação. Não possui por referente objetos em sua realidade física, mas o conceito destes que derivam da ideologia e da práxis. Os indivíduos, mergulhados, porém, em um mecanismo ideológico, podem ter a percepção de que a realidade física é tal qual sua manifestação mental, tendo dificuldade em distinguir a realidade exterior da realidade conceitual. A mediação acarreta equívocos na construção de conceitos e na comunicação entre sujeitos, instituições e culturas. Quanto mais distanciados estiverem os indivíduos da realidade da qual trata a linguagem, maior a imprecisão dos conceitos construídos e maior a dificuldade para compreender seu sentido. Particularmente complexa é a relação do sujeito com o simbolismo presente nas mensagens midiáticas, já que estas se submetem a diferentes esferas de mediação: da cultura, da linguagem e dos meios impressos e eletrônicos. Mantêm-se distanciadas dos sujeitos, falando de realidades que podem ter lugar em seu Município, Estado, País, Continente, em qualquer ponto do mundo globalizado, ou estarem, como na rede mundial de computadores, desterritorializadas. 3 A IMPORTÂNCIA DA INTERAÇÃO NO ENSINO DA LINGUAGEM 204 Tendo superado o paradigma meramente normativo e reprodutivo, o ensino da linguagem privilegia, contemporaneamente, o desenvolvimento da competência dialógica, interativa. O processo de interlocução supõe uma relação dialógica, que implica sujeitos em interação, em atos de comunicação, tanto face a face quanto distanciados no tempo e no espaço. Deve então, a escola, que tem a missão de alfabetizar, se dedicar a criar condições para que crianças e jovens desenvolvam a competência da leitura e da comunicação oral e escrita, além da imagética e informática. Tornandoos aptos a lerem, escreverem e interpretarem uma ampla variedade de mensagens, presentes em sua realidade. A interação e o diálogo pressupõem a existência de um interlocutor real e a comunicação só se dá havendo o interesse do diálogo. Por isso, atingir os objetivos da educação para o uso da linguagem solicita que as crianças sejam confrontadas com necessidades comunicativas verdadeiras, envolvendo o uso de diferentes gêneros linguísticos. Observa-se nas escolas um esforço para que o ensino não se limite à produção de redações destinadas apenas à avaliação do professor. Os alunos são incentivados a trocarem cartas, escreverem bilhetes, criarem jornais, pequenos livros, enviarem e-mails e, com menor frequência, a produzirem programas radiofônicos e audiovisuais, que são veiculados no interior das escolas e na rede mundial de computadores. Cada tipo de gênero textual impõe o domínio de níveis sofisticados de manipulação de códigos linguísticos. O texto escrito demanda a capacidade de abstração e, por supor uma situação de comunicação distanciada, requer precisão de linguagem, coesão e coerência. Conforme esclarece Miller (2003) o autor tem de ajustar o seu dizer a um determinado interlocutor, às finalidades e intenções que caracterizam esse dizer e, deve adotar uma estratégia de conjunto, realizando o necessário encadeamento entre os diferentes planos de construção textual, compreendendo que sua construção será tecida pelo interlocutor, aos poucos, pela inter-relação de diferentes níveis lingüísticos: a lingüística do texto, da frase e da palavra. O emprego da linguagem midiática inicia-se no código escrito e requer o saber-fazer descrito no parágrafo anterior. Para veiculação em jornais, livros, 205 celulares e internet ele pode ser utilizado sozinho, ou combinado com diferentes tipos de ilustrações ou fotografias. Já na elaboração de mensagens audiovisuais, destinadas à veiculação em rádios, televisão, cinema, internet e celulares, entre outros suportes, a produção da mensagem também se inicia com a elaboração de um texto impresso - o roteiro – contudo, a partir dele são agregados elementos da linguagem oral, corporal, sonora e imagética, esta última tanto estática quanto em movimento. Os recursos disponíveis na internet 2.0, somados à popularização do acesso à tecnologia, fazem da rede mundial de computadores uma forte aliada do professor para o estímulo à comunicação interativa. As mensagens são trocadas instantaneamente e o meio dá suporte à utilização dos diversos códigos e gêneros linguísticos. Os computadores, por sua vez, permitem a elaboração de mensagens audiovisuais, a formatação de jornais, revistas, publicidade, de forma cada vez mais simples. Uma mensagem produzida em um computador pessoal, presente nas escolas, pode ser encaminhada para os veículos de comunicação social - redações de jornais, emissoras de rádio e televisão - para ser veiculada, sem que se dependa, necessariamente, dos profissionais que trabalham em tais veículos para produzi-la, haja vista os vídeos domésticos que, com freqüência, são veiculados pelas emissoras de televisão. Isso faz com que seja explorado o potencial interativo desses veículos. Oportuniza o cumprimento da legislação que os caracterizam como serviço público e, por outro lado, transforma as escolas em centro de produção de notícias, aumentando as chances de disseminarem o conhecimento que produzem. Os cidadãos têm o direito à comunicação e expressão assegurado pela Constituição brasileira. Existe uma esfera pública de comunicação na qual devem trafegar assuntos de interesse da opinião pública. A gestão desse espaço é de responsabilidade do Estado, porém sua exploração é cedida a pessoas jurídicas. Nele atuam os veículos de comunicação social, jornais, emissoras de rádio e televisão e deve haver uma cultura de co-responsabilidade entre o Estado e a população pela qualidade da informação que nele trafega. Dessa forma, a escola, enquanto um microcosmo social, com reconhecida importância social, tem direito a usar esse espaço, como também deve ocorrer com diversos outros segmentos e instituições sociais. 206 A escola, quando oferece às crianças e jovens a possibilidade de desenvolverem a competência de se expressar por meio dos veículos de comunicação social, exerce duplo papel, o de desenvolver nas crianças a competência de se tornarem leitoras e produtoras de textos e o de praticarem a cidadania, atitude que irá se reproduzir em outras instâncias em que atuarem. Para analisar o potencial existente na prática da autoria e produção de textos, considerando o papel da escola como formadora de cidadãos para o exercício da cidadania, propõe-se que se contraponham as seguintes premissas: a) as considerações de Bakhtin sobre a possibilidade de revisões dos sistemas ideológicos ocorrerem por meio da intercessão dialógica de sujeitos (1990); b) as referências históricas da utilização da instituição escola como aparato ideológico do Estado na manutenção do status quo. É fácil concluir que está ao alcance da escola a possibilidade da transformação da qualidade de vida dos cidadãos e que o ensino da linguagem é importante para isso, porém, um viés político interfere na questão. 4 APRENDENDO A PRODUZIR DISCURSOS É na instância da enunciação que se determinam os discursos que colaborarão para a tessitura do tecido social. Conforme afirma Foucault (2005) nela se determina a posse do discurso e se aplicam os interditos aos mesmos. É nessa instância, ainda, que se insere a intencionalidade das mensagens. A criança e o jovem só poderão compreender totalmente os meandros do discurso ao serem inseridos na instância da enunciação, atuando como produtores de textos, tendo interlocutores reais a quem tenham que convencer, ou expor suas ideias. Todavia, para se formar produtores de textos experientes há um percurso a trilhar. O aluno deve ter a capacidade de realizar atividades metalinguísticas, nas quais ele será capaz de refletir e falar sobre a produção da linguagem, conhecendo o seu funcionamento e sua forma de transmissão. Para chegar a este ponto, o ensino da linguagem na escola deve ter percorrido duas etapas, envolvidas na produção de textos. Nelas são praticadas atividades linguísticas, aquelas de produção do texto em si e as epilinguísticas, em que o foco se dá na seleção dos recursos linguísticos que comporão a mensagem. Para chegar à análise 207 metalingüística o aluno deve ter adquirido o pré-requisito do uso lingüístico e da análise epilinguística. “É preciso que esteja garantida a base sobre a qual possam ser construídas tais sistematizações” (MILLER, 2003, p. 17). A base teórica para essa afirmação vem de dois postulados vygotskianos: o da existência e da necessidade de estímulo à zona de desenvolvimento proximal nas crianças e jovens e no fato de que as funções psíquicas superiores constroem-se primeiro no nível interpsíquico, pelo contato social, e só depois no intrapsíquico, individualmente. 5 AS TIC´S E A LINGUAGEM NA ESCOLA Aborda-se, ao longo deste texto, o uso da tecnologia e da linguagem midiática na escola, o qual está amparado em instrumentos legais. A Secretaria de Estado da Educação de São Paulo declara a necessidade de inserção nas escolas afirmando: De que maneira cada objeto cultural se relaciona com outros objetos culturais? Como uma mesma idéia, um mesmo sentimento, uma mesma informação são tratados pelas diferentes linguagens? Aqui nos interessam, por exemplo, as novas tecnologias de informação, o hipertexto, os CD-ROM e as páginas da internet, mas também outras expressões artísticas, como a pintura, a escultura, a fotografia etc. (SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, 2009, p. 33) Convém, no entanto, diferenciar três abordagens que envolvem a apropriação das tecnologias no ambiente escolar: a) o que se chama de educação às mídias (ou mídia-educação) que se centra no ensino e aprendizagem sobre a atuação dos meios de comunicação na sociedade; b) o uso instrumental das tecnologias na educação, conhecido como mídia educativa (ou tecnologia educacional); c) o uso da tecnologia para ensinar a distância, denominado de EaD. É a primeira abordagem que envolve diretamente a exploração do uso dialógico e interativo da linguagem com vistas ao desenvolvimento da cidadania. É pertinente educar para as mídias e essa atividade, apesar de possibilitar ações inter e multidisciplinares, está mais próxima dos conteúdos sob responsabilidade do professor de linguagens e códigos. Tal prática é ainda incipiente no Brasil, mas já é 208 possível de ser observada em diversas instituições escolares. Metodologias de ensino e métodos de avaliação estão em desenvolvimento. Os jovens se apropriam rapidamente das linguagens audiovisuais e informáticas. Produzem e veiculam espontaneamente textos usando redes sociais na internet, como os blogs, youtube, orkut, mas precisam de orientação para que não se transformem em meros reprodutores dos conteúdos e da estética vigentes nas mensagens veiculadas com interesses comerciais. Essa orientação deve ser oferecida no ambiente escolar. Tal fato ocorre também nos estágios iniciais de produção do texto escrito pela criança na escola. Scardamalia e Bereiter (apud GÓES, 1987) afirmam que “os autores iniciantes tem a capacidade de apenas relatar um conhecimento, mas o experiente transforma-o”. A esse respeito vale citar pesquisa elaborada por Góes (1993, p. 106-115), sobre a capacidade de a criança revisar seu próprio texto para detectar e resolver falhas existentes. A intenção é levar a criança a adotar uma atitude reflexiva e colocar-se no lugar do receptor. Nela, as crianças tinham que rever enunciados com problemas de referencialidade, incompletude e obscuridade. A atitude espontânea das crianças era a de adicionar informação. Ampliavam os textos, outras vezes completavam com palavras que estavam faltando, poucas vezes optavam por reescrevê-lo. A criança apenas refletia parcialmente sobre o enunciado que havia produzido. A pesquisadora demonstrou que com a intervenção de pessoas mais experientes ela era capaz de avançar, produzindo textos mais coerentes e significativos. Caminho semelhante pode ser percorrido pelo professor de lingua portuguesa, levando as crianças e jovens a refletirem sobre os textos que venham a produzir usando as linguagens midiáticas e levá-los a identificar o caráter dialógico e ideológico de tais textos. O foco do professor com a atividade deve ser sempre no desenvolvimento da capacidade cognitiva dos alunos e nunca na aparência estética dos enunciados. É comum os professores se deslumbrarem com a capacidade das crianças de produzirem um texto audiovisual e se esquecerem de analisar seu conteúdo e o seu sentido na vida da criança. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 209 Em relação ao ensino da leitura e da produção de textos é preciso considerar que o essencial é o desenvolvimento da criança, da sua capacidade de se constituir como sujeito pensante e autor. Em nossas sociedades, o poder de existir passa pelo poder da escrita. A escrita é, portanto, uma prática linguística e social e não uma prática privada, que tem por finalidade fomentar o diálogo. O domínio do uso da linguagem advém da sua apropriação reflexiva, que permite a expansão do sentido. Entretanto, é uma ferramenta de socialização e por mais que, neste texto, se tenha dado ênfase ao diálogo e a interação, obriga o professor ao ensino da norma, que tem que ser compartilhada por autores e leitores. Contudo, o maior desafio para o professor que queira incentivar seus alunos ao uso da linguagem midiática, reside em levá-los a entender a potencialidade do uso político desses suportes de comunicação social no atendimento de necessidades coletivas. Estimulando a percepção de que as estratégias de uso coletivo da linguagem podem ajudá-los a obter melhoria na qualidade de vida da sua comunidade. Está posto um desafio gigante, principalmente quando se observa a forte tendência impregnada na sociedade brasileira para o individualismo e que coloca as crianças em concorrência desde a mais tenra idade. ABSTRACT Based on the thought of researchers of the relationship that stands between the society, language and school education as Bakthin, Vygostski, Foucault, Scardamalia & Bereiter, Miller and Goes, it is presented a theoretical construct, gathering arguments for the appropriation of media language in the teaching of language at school . The justification lies in the dialogic and interactive coefficient it offers. The diverse forms of use of the technology in the education are presented: media education, educational technology and its use applied to distance learning. It is outlined that what interests is not the instrumental use of the technology but the linguistic one when it comes to production and evaluation of communicative texts in school. It is underlined the role language plays as a form of social mediation which requires the manipulation of complex coding, competence that the school should develop in students. The importance of interaction for meaningful learning of language is highlighted, this interaction is easily obtained through the broadcast of speeches in media such as radio and the internet, available in most brazilian schools. Keywords: Language. Media. Education. School. REFERÊNCIAS 210 BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da linguagem. 5. ed. São Paulo: Hucitec, 1990. FOUCAULT, M. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 2005. GÓES, M. C. R. de. A criança e a escrita: explorando a dimensão reflexiva do ato de escrever. In: SMOLKA, A. L. B. e GÓES, M. C. R. de (Org.). A linguagem e o outro no espaço escolar: Vygotsky e a construção do conhecimento. Campinas: Papirus, 1993, p. 101-119. MILLER, S. Sem reflexão não há solução: o desenvolvimento do aluno como autor autônomo de textos escritos. In: MORTATTI, M. do R. Atuação de professores: propostas para ação reflexiva no ensino fundamental. 1.ed. Araraquara: JM, 2003. p. 9-22. SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO. Proposta curricular do Estado de São Paulo. Disponível em: <http://www.rededosaber.sp.gov.br/contents/SIGSCURSO/sigsc/upload/br/site_25/File/ PropostaCurricularGeral_Internet_md.pdf>. Acesso em: 21 jun. 2009. VIGOTSKII, L. S. Aprendizagem e desenvolvimento intelectual na idade escolar. In: ______., LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 4.ed. São Paulo: Ícone, 1988. p.103-118. _____. A pré-história do desenvolvimento da linguagem escrita. In: Obras escogidas. 2.ed. Madrid: Visor, 2000, v. III, p. 183-206. 211 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura BRINQUEDOTECA ITINERANTE: FORMAÇÃO DE BRINQUEDISTA 1 2 EDUCADORES . Livia Zagatti Pedro , Marcelo Mendes dos Santos3, Ester Teresa Senger Petroni4 RESUMO A educação infantil apresenta-se como um local privilegiado de socialização e, portanto, um amplo espaço de desenvolvimento de sentimentos, afetos, aprendizado e emoções. É nela que o brincar se intensifica favorecendo o desenvolvimento de habilidades sociais, cognitivas, emocionais e lingüísticas, em sua diversidade de modalidades. O brincar fundamenta grande parte da aprendizagem das crianças e é de fundamental importância que os educadores compreendam seu papel e valorizeo como metodologia de ensino, uma vez que é este o meio pelo qual ela cresce e se desenvolve. Este trabalho teve como objetivo sensibilizar a equipe educativa sobre aspectos referentes ao brincar, capacitando-a com esta nova modalidade de ensino. O trabalho foi realizado em uma Instituição Infantil e contou com a participação de 3 professoras e 2 estagiárias de Pedagogia. A realização dos encontros com as educadoras ocorreu semanalmente e teve duração de 1 hora. O projeto passou por três momentos: 1)Houve a sensibilização dos professores e da instituição para a abertura do projeto; 2) Ocorreram encontros para discussões sobre a Teoria do Construtivismo de Jean Piaget, com a exposição de um painel do Desenvolvimento Infantil; 3) Enfatizou-se a prática do educador na educação infantil, ressaltando aspectos sobre o brincar, sua importância, prática na escola e nas salas de aula, importância da família no contexto das brincadeiras. Os resultados parciais apontam para o maior interesse das professoras quanto ao brincar, houve mobilização da instituição em busca de novas atividades práticas, valorização do brincar como metodologia de ensino, compreensão das fases do desenvolvimento infantil de forma amplificada, além da possibilidade oferecida ao profissional para que enfrente as diversas situações que ocorrem no seu local de trabalho. A realização deste projeto possibilitou o entendimento da prática do Psicólogo Escolar, ressaltando seu papel significativo no processo educativo, bem como sua atuação diferenciada neste contexto. Palavras-chave: Educação infantil. Aprendizagem. Brincar. Metodologia. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluna do Curso de Psicologia da Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. 3 Professor Integral da Universidade Sagrado Coração – USC, Bauru/São Paulo/Brasil. Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas/São Paulo/Brasil. 4 Mestre em Educação Escolar pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil (2007). Professora e Supervisora na Graduação da Universidade do Sagrado Coração. 212 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura DEFINIÇÃO DE PÚBLICOS EM INSTITUIÇÕES PRIVADAS DE ENSINO SUPERIOR – IPES1. Maria Eugênia Porém2, Ana Beatriz Assumpção3, Dalva Aleixo Dias4 RESUMO Desde meados do século XX reflexões sobre Ensino Superior vêm produzindo inúmeras discussões em torno de seus desafios, destinos, funções e missões.Uma questão que vem se revelando importante no âmbito da gestão universitária é de como as instituições privadas de ensino superior, poderão obter vantagens competitivas em um cenário marcado pela competição e grande oferta de cursos. Porquanto é imperativo para melhorar o desempenho da gestão universitária, procedimentos administrativos mais flexíveis, que sejam capazes de alinhar os diferentes conteúdos, promover o entendimento, propor ações que respondam às demandas, mapeando os interesses, perfis e expectativas, comprometendo-se em atender aos públicos que impactam ou são impactados por suas ações. Este artigo trata da importância que a definição dos públicos de relacionamento exerce no âmbito das instituições privadas do ensino superior. Parte do pressuposto que as IPES estão vivenciando um novo momento em sua gestão e que a interação com seus públicos de relacionamento é essencial para a sua perenidade, pois o sucesso e insucesso de suas atividades dependerão também das estratégias que escolherem para se comunicar com cada um deles. Para efeito deste estudo, optou-se pela pesquisa bibliográfica como forma de constituir um arcabouço teórico que sustentasse uma pesquisa exploratória e descritiva. Para concretizar a investigação sobre o tema, foi realizado um estudo de caso de uma IPES situada na cidade de Bauru-SP. Foi aplicada entrevista semi-estruturada junto a coordenadora do departamento de comunicação em marketing da IPES cujos resultados podem contribuir para promover uma reflexão mais aprofundada sobre o assunto. Na análise da IPES observada, percebeu-se que, apesar da importância dada aos processos comunicativos, ainda se encontra muita dificuldade em definir com clareza quais são seus públicos de relacionamento. Assim, este trabalho propõe um estudo preliminar sobre a identificação, definição e análise dos públicos da IPES pesquisada sistematizado em um quadro referência. Palavras-chave: Ensino superior. Instituição particular de ensino superior. Comunicação. Públicos. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Professora dos cursos de Comunicação Social e Administração - FIB.Doutoranda em Educação pela Universidade Estadual Paulista - UNESP/Araraquara e Mestre em Comunicação pela Universidade Estadual Paulista - UNESP/Bauru.Especialista em Marketing, comunicação e negócios pela Universidade de Marília. 3 4 Mestrado em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo, Brasil (1995) Professor Assistente da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. 213 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura ASPECTOS EMOCIONAIS ENVOLVIDOS NA GRAVIDEZ ADOLESCENTE1 Marina Zulian Delázari2 Silvana Nunes Garcia Bormio3 RESUMO A gravidez, independentemente da fase da vida da mulher em que ocorra, desperta na gestante sentimentos específicos. Com este estudo, os autores objetivaram caracterizar as questões emocionais específicas que repercutem durante a gravidez na adolescência, identificando medos e ansiedades de grávidas adolescentes e de grávidas adultas e comparando-os. Os sujeitos da pesquisa foram dois grupos compostos por grávidas, sendo um de 7 grávidas adolescentes e o outro de 7 grávidas adultas. Até o presente momento, 3 integrantes de cada um dos grupos de grávidas participaram de uma entrevista semi-estruturada com a pesquisadora e realizaram o teste projetivo Desenho- Estória. Os resultados parciais deste estudo foram realizados a partir da análise qualitativa dos dados destas 6 gestantes que participaram da pesquisa, sendo que estes dados foram, anteriormente, analisados e interpretados de acordo com a teoria psicanalítica. O pressuposto teórico escolhido para a elaboração desta investigação foi a psicanálise por sua significativa contribuição para o estudo das fases do desenvolvimento humano e dos conteúdos inconscientes a elas relacionados. A importância deste estudo refere-se à discussão acerca das emoções, mais precisamente sobre os medos e as ansiedades, que afloram no decorrer da gravidez na adolescência. Ao final, este estudo contribuirá para incitar novas buscas e questionamentos sobre este tema, colaborando para que haja uma ampliação do conhecimento visando atingir uma intervenção mais adequada no atendimento psicológico às gestantes adolescentes. Palavras-chave: Adolescência. Gravidez. Medo. Ansiedade. 1 INTRODUÇÃO/REVISÃO DE LITERATURA A adolescência caracteriza-se por ser uma fase crítica do desenvolvimento 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. Este estudo é o resultado parcial de um projeto de pesquisa de Iniciação Científica do Programa de Pós- graduação em Pesquisa da Universidade Sagrado Coração, financiado pelo Fundo de Amparo à Pesquisa (FAP/USC) 2 Aluna do Curso de Psicologia da Universidade Sagrado Coração. 3 Doutora em Ginecologia, Obstetrícia e Mastologia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil(2008). Professora Assistente da Universidade Sagrado Coração. 214 humano. Dados indicam que um quarto da população mundial é constituído por adolescentes. Neste contexto, torna-se imperativo conhecer o adolescente a partir de suas crises, sua relação com os pais, sua sexualidade, a gravidez e os sentimentos conscientes e inconscientes por ela aflorados, para que seja possível identificar as angústias e temores desencadeados pela gestação prematura a fim de ampliar o horizonte de conhecimentos acerca do assunto. Um período de ambivalente, doloroso, caracterizado por fricções com o meio familiar e o ambiente circundante é como Aberastury (1990) descreve a adolescência. Em meio a estes conflitos, Erikson (1970 apud TRINDADE; BRUNS, 1996) considera como principal acontecimento no período da adolescência a formação da identidade, em que o adolescente elaboração das passa por um processo de experiências vividas, sendo influenciado por diversos aspectos profissionais, ideológicos, religiosos, sociais e sexuais. A formação da identidade não depende somente do aspecto social, as mudanças corporais e as suas repercussões psíquicas são influentes. A modificação corporal sofrida pelo adolescente produz ansiedade, porque o obriga a modificar seu vínculo com os pais da infância. Tais modificações corporais trazem consigo modificações psicológicas que levam o adolescente a estabelecer uma nova relação com os pais e o mundo. É neste sentido que a adolescência constitui a etapa decisiva de um processo de desprendimento. atravessa três Para Aberastury (1990), este processo momentos fundamentais, sendo que o primeiro é o nascimento, o segundo surge ao final do primeiro ano e o terceiro aparece na adolescência. Quando ele é alcançado, o adolescente inicia seus relacionamentos afetivos e, com eles, a sexualidade. O grau de informação sexual existente entre os jovens é pouco frente às suas reais necessidades. A atividade sexual na adolescência tem se iniciado de maneira cada vez mais precoce e trazido consequências imediatas como o aumento de doenças sexualmente transmissíveis e gravidez (SANT’ANA, 2004). A gestação é considerada uma situação de crise previsível, sendo caracterizada por temores e ansiedades específicas. Quando incide na adolescência, também compreendida como situação de crise previsível, tem-se, nas palavras de Sant’Ana (2004), um quadro de “crise dentro da crise”, acarretando consequências à gestante adolescente. 215 Tachibana et al. (2006) esclarecem que, conforme a teoria psicanalítica, a questão do desejo em ter um filho faz-se inerente a toda e qualquer gestação. O desejo corresponde unicamente à esfera inconsciente, enquanto a demanda seria uma vontade pertencente à esfera consciente. Há, então, uma complexidade da motivação inconsciente quanto à gestação, que muitas vezes culmina nas chamadas gravidezes não planejadas. Assim, podemos perceber que esta gravidez é frequentemente desejada, porém não planejada. Entendendo a gravidez na adolescência dessa forma, espera-se que haja uma assistência adequada às mesmas. Entretanto, não é o que se pode observar. Santos e Schor (2003) declaram que há estudos que associam a gravidez na adolescência à assistência pré- natal deficiente, à maior incidência de patologias durante e após a gestação, ao maior risco de morbimortalidade para o concepto e maior risco social. Além das questões biológicas e obstétricas, é preciso considerar também o fato de que o desenvolvimento psicológico da mãe é alterado. Sant’Ana (2004) ressalta que essas meninas estariam imersas na problemática social e econômica de sua condição de adolescente. Os problemas mais graves ocorrem em relação ao psiquismo, pois, se tanto a gestação quanto a adolescência são consideradas situações de crises previsíveis, quando elas ocorrem concomitantemente, podem causar depressão e sentimentos variados. A despeito de uma gravidez não planejada em geral trazer sentimentos de rejeição, a reação inicial não se cristaliza para sempre, sendo que uma atitude inicial de reje ição pode dar lugar a uma atitude de aceitação e vice-versa (TACHIBANA et al. 2006). Neste âmbito, também é relevante a contribuição dos estudos de Freitas e Botega (2002) e Santos e Schor (2003). Ambos atentam para o fato de que as mães adolescentes podem ter tanto sentimentos negativos quanto positivos em relação à gestação. Há aquelas que manifestam ansiedade, depressão, estresse, ideação suicida, além de terem sentimentos de culpa, medo e perda consequentes à maternidade. Por outro lado, há adolescentes que se sentem felizes por estarem grávidas. A ansiedade presente na gestação é uma manifestação que merece atenção especial. Soifer (1980) alega existirem, na gravidez desejada e aceita pela mãe e/ou o meio que a rodeia, movimentos específicos de incremento da ansiedade. 216 Estes incrementos podem ser agrupados por períodos, que serão apresentados, aqui, de maneira concisa. Por volta do segundo mês de gestação, começam a aparecer as náuseas e os vômitos, sintomas que coincidem com a ansiedade determinada pela incerteza da existência ou não da gravidez. As ansiedades do segundo e terceiro mês se referem à formação da placenta (SOIFER, 1980). A ansiedade dominante de toda a gravidez irrompe ante a percepção dos movimentos fetais, aos três meses e meio, aproximadamente. Soifer (1980) a caracteriza como fantasias ansiedade incestuosas e culpa, porque reativa, no inconsciente, as e masturbatórias infantis. No quinto mês, estas fantasias tornam-se mais intensas e aparece o temor à morte. A instalação franca dos movimentos, a partir do sexto mês, acompanha uma percepção maior das contrações uterinas fisiológicas da gravidez, que produzem um novo acesso de ansiedade, em que se renovam as fantasias. A versão interna, que leva a criança a colocar-se de cabeça para baixo, pode iniciar- se a partir da metade do sétimo mês. A percepção desses movimentos provoca uma intensa crise de ansiedade, totalmente inconsciente, que se traduz em diversas manifestações psíquicas e somáticas (SOIFER, 1980). Com o início do nono mês de gestação, surgem várias modificações fisiológicas. Essas modificações acentuam as ansiedades, que vão se exacerbando com a proximidade do parto. Com o estudo de Soifer (1980), pudemos perceber que crises de ansiedades e temores são inerentes a todas as gestações. Nesta pesquisa, nos propusemos a investigar sobre as questões da gravidez na adolescência enfocando ansiedades e medos inerentes à gestação prematura de acordo com a abordagem psicanalítica. A psicanálise enquanto instrumento de investigação, caracteriza-se pelo método interpretativo, que busca o significado oculto daquilo que é manifesto por meio de ações e palavras ou pelas produções imaginárias, como os sonhos, os delírios, as asso ciações livres, os atos falhos (BOCK et al., 2002). Atualmente, a psicanálise tem sido um instrumento importante para a análise e compreensão de fenômenos sociais relevantes, o que nos motivou a usá-la como teoria e método na elaboração de nosso trabalho. Vivemos um momento no qual a incidência de gestações prematuras, no 217 Brasil, é elevada e a gravidez na adolescência pode ser considerada um problema médico-social, entretanto, a sociedade contemporânea não está preparada para lidar com esta questão. De certo, a gravidez prematura envolve questões emocionais mais complexas do que a gravidez adulta. Tomando por base a teoria psicanalítica, é sobre estas questões que nos propusemos a investigar e discutir neste trabalho, mais precisamente sobre os medos e as ansiedades que afloram no decorrer da gravidez na adolescência. 2 OBJETIVOS 2.1 OBJETIVO GERAL - Investigar as questões emocionais específicas que surgem durante a gravidez na adolescência. 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Identificar os medos e as ansiedades de grávidas que não são adolescentes; - Identificar os medos e as ansiedades de grávidas adolescentes; - Comparar os medos e as ansiedades dos dois grupos de grávidas. 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA Esta investigação teve como participantes sete adolescentes grávidas com idade entre treze e dezessete anos e sete adultas grávidas com idade acima de vinte e três anos, as quais foram abordadas aleatoriamente em uma Unidade Básica de Saúde, de uma cidade do interior do estado de São Paulo e, se em idade apropriada, foram convidadas a participar da pesquisa. Após serem selecionadas as participantes, e acordado o local para a obtenção dos dados, foi lido às mesmas o termo de consentimento, o qual foi assinado pelas participantes maiores de 23 anos que estavam de acordo e pelo(a) responsável pelas participantes menores de 17 anos, que também estavam de acordo. Primeiramente, realizou-se uma entrevista semi-estruturada que foi gravada, segundo consentimento das mesmas, e transcrita na íntegra. 218 Num segundo momento, após as entrevistas, as participantes realizaram o teste do Desenho-Estória, que é uma técnica de investigação da personalidade que emprega desenhos associados a estórias. Esta técnica foi introduzida por Trinca (1976) em 1972, para se prestar à exploração da dinâmica inconsciente da personalidade e tem sua fundamentação baseada nas teorias e práticas da psicanálise, das técnicas projetivas e da entrevista clínica. Nosso objetivo na utilização da entrevista foi o de extrair dados que nos permitiram formular hipóteses sobre a vida emocional das gestantes dos dois grupo s e também avaliar com maior precisão os dados obtidos através da técnica do Desenho-Estória. No presente estudo, solicitamos às gestantes dos dois grupos que fizessem um desenho com o título: “Esta mulher vai ter um bebê”. Imediatamente após desenhar solicitamos a cada gestante que elaborasse uma estória a partir do desenho. Quando foi solicitado pelas gestantes, a estória foi escrita pela pesquisadora. Concluída a fase de contar estória, passou-se ao inquérito, a partir do qual puderam ser solicitados quaisquer esclarecimentos necessários à compreensão e interpretação do material, produzido tanto no desenho quanto na estória. A avaliação do teste compreendeu duas partes: análise e interpretação. A análise se deu através da livre inspeção do material e consiste em levantamento e extração de informações significativas. Essa forma de avaliação sustenta-se numa análise global, isto é, numa análise do conjunto de produções, onde desenhos, estórias e inquérito fazem parte de uma unidade. Nele o psicólogo usa um referencial de análise introjetado, que é resultante de sua experiência e de seus conhecimentos em psicologia. A interpretação elementos significativos é o processo de composição e integração dos em um conjunto. Nosso referencial de análise e interpretação foi a teoria psicanalítica. Posteriormente, os conteúdos obtidos foram analisados qualitativamente e os dados do grupo de grávidas adolescentes foram comparados com os dados do outro grupo de grávidas para que fosse possível verificar se existiram diferenças quanto aos medos e as ansiedades presentes nos dois grupos de grávidas. 4 GRAVIDEZ, MEDO E ANSIDEDADE – UM ENFOQUE NA ADOLESCÊNCIA 219 A gravidez, independentemente da fase da vida da mulher em que ocorra, seja na vida adulta, seja na adolescência, desperta na gestante sentimentos específicos, incluindo medos e ansiedades. Soifer (1984) em seu estudo sobre ansiedades específicas da gravidez, discorre a respeito da gravidez desejada e aceita pela mãe e/ou pelo meio que a rodeia. Devemos lembrar, contudo, que nem todas as gestações são planejadas ou aceitas pelas mães, principalmente quando a grávida está na adolescência. Este artigo se caracteriza por apresentar os resultados parciais de uma investigação que está em andamento. Por este motivo, iniciaremos a apresentação dos resultados a partir da análise qualitativa dos dados de 6 das 14 gestantes que participaram da pesquisa, sendo que estes dados foram analisados e interpretados de acordo com a teoria psicanalítica. Serão apresentados inicialmente os conteúdos de 3 participantes adultas. Em seguida, os conteúdos de 3 participantes adolescentes, que são o foco principal deste estudo. Por fim, será realizada uma comparação dos dados de ambos os grupos. De forma geral, tomada de consciência as gestantes adultas apresentaram defesas contra a de seus sentimentos ambivalentes em relação à gestação, reprimindo os sentimentos negativos. Isto foi possível observar visto que, na entrevista, elas evidenciaram apenas os aspectos positivos da gestação. Entretanto, quando foi solicitada a realização do Desenho-Estória, todas apresentaram resistência na execução da tarefa, perguntando se o desenho era necessário e dizendo que não sabiam ou não gostavam de desenhar. Segal (1975) nos ajuda a compreender o uso de defesas por parte das gestantes, explicando que o sofrimento, muitas vezes, só pode ser superado pelas defesas maníacas, as quais protegem o ego do desespero total. A autora complementa que essa experiência depende do fato de o ego ter alcançado uma nova relação com a realidade sendo que, no caso das gestantes deste trabalho, elas estavam assumindo um novo papel, o de ser mãe. Posteriormente, através da análise dos Desenhos-Estórias destas participantes, foi possível tanto confirmar a presença de sentimentos positivos como amor, paixão, harmonia, sensibilidade e felicidade, sentimentos negativos desencadeados pela gestação quanto observar os nestas mulheres, 220 seus medos e ansiedades. Soifer (1984) esclarece que toda gravidez produz uma situação de maior ou menor conflito entre uma tendência maternal e outra de rejeição (desejo e contradesejo). A referida análise evidenciou a presença, nas grávidas, de conflito emocional e fuga da realidade, ou seja, fuga de sua nova condição no mundo, a de mãe. Maldonado (1991) explica do processo normal a gravidez como uma transição que faz parte de desenvolvimento, assim, envolvendo reestruturação e reajustamento em várias dimensões. Dessa forma, a maternidade faz com que a mulher passe a se olhar e a ser vista sob um novo ângulo, entendem Zugaib e Sancovski (1994). Por isso, foi possível notar nas participantes um movimento de “voltar-se para si mesmas”, sendo a gravidez o centro de sua atenção, havendo identificação das grávidas com os bebês, além de uma atitude de introversão e passividade por parte das gestantes. As grávidas adultas expressaram, através dos desenhos, sentimentos de agressão, destruição e ódio, o que pode tanto representar seus sentimentos inconscientes pelo bebê, quanto aqueles que a gestante fantasia que o bebê tenha por ela. As fantasias em relação ao bebê e a si mesma como mãe, frequentemente, expressam o temor de que a própria hostilidade, componente da ambivalência, destrua o feto, afirma Maldonado (1991). Junto a esse temor, está o medo à responsabilidade assumida. Esse medo se une à noção de dar vida que, levando em consideração o processo genético, significa haver cedido parte da própria vida. Ademais, a ansiedade decorrente de estar cedendo a própria vida se condensa com o medo de morrer no parto (SOIFER, 1984). Outros notórios medos apresentados pelas grávidas adultas incluem temor sexual e temor de castração. Podemos perceber, através da análise e interpretação dos dados, que estes temores geram ansiedade e culpa. De acordo com Soifer (1984), essa ansiedade se caracteriza por ser ansiedade culposa por se experimentar uma união tão íntima e pessoal, a dois, exclusiva, em que ninguém mais pode interferir. A autora esclarece que é ansiedade e culpa porque reativa no inconsciente as fantasias incestuosas e masturbatórias infantis. Assim, finalizamos a apresentação da análise dos dados das participantes adultas. Iniciaremos, então, a apresentação dos dados das participantes 221 adolescentes. As grávidas especialmente adolescentes, durante a entrevista, verbalizaram os aspectos negativos inerentes à gestação, sendo os positivos pouco mencionados. Através da análise e interpretação do Desenho-Estória, foi possível confirmar os sentimentos negativos verbalizados e observar a presença de sentimentos positivos que, provavelmente, são pouco percebidos de forma consciente por estas adolescentes. Amor, paixão, harmonia e sensibilidade foram alguns dos sentimentos expressados por meio do desenho. Durante a entrevista, a despeito dos sentimentos positivos, estas participantes se restringiram a dizer que estavam felizes, ou que não sabiam explicar como se sentiam, ou ainda reconheciam seus sentimentos ambivalentes informando estarem felizes e tristes ao mesmo tempo. É possível que os sentimentos positivos tenham sido menos verbalizados devido à dificuldade destas gestantes em aceitar internamente a gravidez, não sendo capazes de nutrir ou perceber muitos sentimentos positivos a respeito da mesma. A repressão ou o não reconhecimento destes sentimentos positivos podem ter sido originados da culpa e do medo destas adolescentes que, portanto, não se permitem sentir prazer com a gravidez. Lourenço (1998) esclarece que, para a adolescente, descobrir que está grávida pode ser um momento extremamente desorganizador e vivido com grande sofrimento. Acrescentam-se a isto sentimentos de pecado e culpa, exigindo ajustamentos psicológicos individuais e familiares difíceis de serem elaborados e aceitos. Zugaib e Sancovski (1994) acrescentam que à percepção inicial da gravidez, especialmente após sua confirmação, vem somarem-se sentimentos frequentemente antagônicos e contraditórios. Alegria e satisfação podem alternarse com momentos de dúvida, insegurança e mesmo rejeição. Através do discurso das gestantes ado lescentes, foi possível perceber a mencionada alternância. A introversão também foi uma das características apresentadas por estas gestantes. A despeito dependência de companheiro e a de um movimento figuras afetivamente introversivo, significativas, existe uma principalmente maior o mãe (ZUGAIB; SANCOVSKI, 1994). Tal fato pôde ser notado na entrevista deste estudo, quando uma das gestantes adolescentes referiu grande satisfação por receber maiores cuidados por parte de sua mãe durante a gestação. 222 De acordo com Zugaib e Sancovski (1994), essa dinâmica associa-se, intrinsecamente, à elaboração do novo papel a ser desempenhado pela mulher como mãe, revivendo o seu “ser criança”, “ser filha”, ser alguém em crescimento. Neste mesmo apresentaram contexto, pudemos perceber que as participantes insegurança emocional, passividade, imaturidade psíquica e regressão na maturidade afetiva. Todo este processo de transformação vivido pela adolescente grávida desencadeia resistência em aceitar a gestação, dado este apresentado pelas participantes desta pesquisa. Maldonado (1991) ressalta que há sempre uma oscilação entre desejar e não desejar o filho. A autora esclarece que a gravidez implica na perspectiva de grandes mudanças, tanto interpessoais quanto intrapsíquicas, o que envolve perdas e ganhos e justifica a existência de sentimentos opostos entre si, os quais geram ansiedade. As adolescentes gestantes também apresentaram conflito em relação ao eu, o que está relacionado à perda da identidade e à necessidade de construção de uma nova identidade. Erikson (1971 apud TRINDADE; BRUNS, 1996) postulava que o principal acontecimento, no período da adolescência, seria a formação da identidade, em que o adolescente passaria por um processo de elaboração das experiências vividas. Dessa forma, o processo de formação da identidade da gestante adolescente fica bastante conturbado, visto que é necessária uma adaptação para a aquisição de um papel inesperado, o de mãe, durante este período conflituoso do desenvolvimento que é a adolescência, o que acaba por gerar intensa ansiedade. O conflito vivenciado pelas adolescentes gestantes em relação ao eu também está fundamentado na maneira como sentem as alterações do esquema corporal desencadeadas pela gravidez. Segundo Maldonado (1991), a forma como a mulher sente estas transformações está intimamente relacionada com as alterações da sexualidade e que sempre há a preocupação de não voltar à “forma antiga”. Esta preocupação pode ter um significado simbólico mais profundo, ou seja, o medo de ficar modificada como pessoa pela experiência da maternidade, de não mais recuperar sua identidade antiga e transformar-se numa outra pessoa, com mais perdas do que ganhos. Foram apresentados pelas participantes sentimentos de medo, desespero, angústia, além de temores relacionados à sexualidade, como temor de castração 223 e a decorrente necessidade de controlar os impulsos sexuais e corporais acrescidos do sentimento de culpa. O tabu da sexualidade está na base destes sentimentos, sendo fonte de grande ansiedade e reativando conflitos de fases anteriores. Aberastury (1990) esclarece que o adolescente deve renunciar ao incesto, revivendo uma frustração inicial ligada à iniciação do complexo de Édipo. Aqueles que não aceitam o conflito do complexo de Édipo inicial, ao ter um filho, não o viverão como próprio, senão como pertencente a seus pais. A reação emocional da gestante adolescente será influenciada pela das pessoas que lhe são próximas (ZUGAIB; SANCOVSKI, 1994). Dessa forma, a dificuldade de encontrar apoio na família, ou o medo de que não o encontre e seja rejeitada, aumentam a angústia e a ansiedade da adolescente gestante. As jovens encontram-se, então, em uma situação difícil, tendo que enfrentar pressões psicológicas somadas aos transtornos de ter que abandonar seus planos, como estudar, para cuidar do bebê, o que lhes acarreta intenso sofrimento psíquico. As gestantes adolescentes demonstraram-se tristes, frustradas e insatisfeitas diante do fato de terem que abandonar os estudos e de permanecerem dependentes de seus pais. Passaram a ter falta de confiança nos contatos sociais e na produtividade, tornando -se desesperançosas em relação ao futuro, ficando com a sensação de que tudo está perdido. A adolescente pode até adoecer, como no caso de uma das participantes que informou ter adoecido ao saber da gravidez, não querendo comer e nem levantar da cama. Nas palavras dela, teve a “sensação de que tudo tinha ido por água abaixo”. Na base das doenças do psiquismo, podemos entender que estão a raiva, o ódio, os sentimentos de agressão, destruição e vazio apresentados pelas participantes desta pesquisa. Diante do sofrimento psíquico e da ansiedade dele decorrente, que são refletidos através destes sentimentos, as grávidas adolescentes reprimem sua agressividade fugindo da realidade com o desejo de não tomar conhecimento dos problemas e uma das formas de fazê-lo é recorrendo à doença. Clerget (2004) enfatiza que quando o sofrimento não tem palavras para se verbalizar, as vias da doença são tomadas por empréstimo. Neste contexto, a impossibilidade de ver o bebê dentro da barriga aumenta a ansiedade referente ao seu desenvolvimento. Este fato pôde ser 224 concretamente observado dentre as participantes deste estudo, sendo que a transparência esteve presente no desenho de uma das adolescentes, possibilitando visualizar o bebê no interior da barriga da grávida desenhada. Maldonado (1991) ressalta que o medo de ter um filho deformado, pode expressar o medo de que os próprios sentimentos de hostilidade e rejeição, que fazem parte da ambivalência e são vivenciados como maus e destruidores, possam ter prejudicado irremediavelmente o feto gerado dentro de si. O sentimento de vazio apresentado por estas participantes está relacionado à vivência persecutória da placentação e ao risco de aborto. Soifer (1984) explica que os processos de nidação e absorção de substâncias alimentícias na corrente circulatória materna, com as mudanças psicológicas que determinam, são percebidos e vivenciados de forma persecutória pelo inconsciente da mulher. A autora ressalta que o conteúdo dessa vivência persecutória é a sensação terrorífica de ser devorada e esvaziada por um monstro (o aborto), que simboliza o filho. Dessa forma, podemos entender que a percepção inconsciente do processo de placentação reativa as fantasias persecutórias de roubo e esvaziamento. Tendo sido estas gestantes adolescentes as ansiedades desta e pesquisa, os medos apresentados estabeleceremos, a seguir, pelas uma comparação entre os dois grupos de grávidas. 5 COMPARAÇÃO DOS DADOS Embora haja diversas características comuns entre ambos os grupos de participantes, a gestação na adolescência apresenta certas peculiaridades. Zugaib e Sancovski (1994) nos dão subsídios para compreender estas diferenças explicando que, embora a gravidez da mulher madura possa trazer problemas de ordem física e emocional, nesta fase da vida ela geralmente dispõe de recursos internos e externos para lidar melhor com a situação. Já na adolescência, a gravidez ocorre num momento em que a jovem enfrenta os conflitos passagem do mundo infantil para o adulto, ressalta o autor. Uma das principais diferenças entre os dois grupos de grávidas diz respeito ao fato das gestantes adultas apresentarem defesas contra a tomada de consciência de seus sentimentos ambivalentes em relação à gestação, reprimindo 225 seus sentimentos negativos, enquanto as adolescentes, por outro lado, verbalizaram especialmente os aspectos negativos inerentes à gestação, sendo os positivos pouco mencionados. Sentimentos positivos como amor, paixão, harmonia, sensibilidade e felicidade puderam ser observados nos dois grupos, porém não foram destacados na entrevista pelas adolescentes, sendo possível observá-los através da análise do Desenho-Estória. As gestantes adultas apresentaram conflito emocional e fuga da realidade, o que requer a mobilização de mecanismos adaptativos do ego e desencadeia medo e tensão frente às mudanças. Também esteve presente entre estas participantes um movimento de “voltar-se para si mesmas”, denotando uma identificação das grávidas com os bebês e uma atitude de introversão e passividade, culminando em retraimento e energia reduzida. Sentimentos de agressão, destruição e ódio puderam ser observados através dos desenhos. Eles, frequentemente, expressam o temor de que a própria hostilidade destrua o feto. Também apresentaram o temor ao filho em si, que se caracteriza por ser a base de uma das ansiedades comuns a todas as gestantes, de acordo com Soifer (1984). Junto a este temor, está o medo à responsabilidade assumida. Tal medo gera a ansiedade relacionada à sensação de estar cedendo a própria vida e se condensa com o medo de morrer no parto. A presença de temor sexual e temor de castração também foi notória, os quais geram ansiedade e culpa. Nas adolescentes, foi possível observar que a gravidez desencadeou sentimentos de medo, pecado e culpa. Elas também se mostraram conscientes de seus sentimentos ambivalentes, explicando terem ficado felizes e tristes, o que desencadeia forte ansiedade. Apresentaram também introversão, insegurança emocional, passividade, imaturidade psíquica e regressão na maturidade afetiva, além de conflito em relação ao eu. Estes sentimentos têm por base o medo frente às profundas mudanças necessárias para a assunção do papel de mãe e geram ansiedade. O conflito em relação ao eu apresentado pelas adolescentes, possivelmente, envolve a preocupação de não voltar à “forma antiga”, que tem relação com o medo de ficar modificada como pessoa pela experiência maternidade, de não mais recuperar sua identidade antiga e transformar-se numa outra pessoa, com 226 mais perdas do que ganhos. Foi possível identificar dentre as adolescentes sentimentos de medo, desespero, angústia, além de temores relacionados à sexualidade, que também estiveram presentes dentre as participantes adultas, como temor de castração e a decorrentes necessidade de controlar impulsos sexuais e corporais acrescidos do sentimento de culpa. Uma das particularidades apresentadas pelas gestantes adolescentes se refere ao medo de não encontrar apoio na família, o que aumentam sua angústia e ansiedade. Neste mesmo sentido, apresentam-se tristes, frustradas e insatisfeitas diante do fato de terem que deixar os estudos e de permanecerem dependentes de seus pais.Tornaram-se desesperançosas em relação ao futuro. Apresentaram sentimentos de agressão, destruição, raiva, ódio e vazio, além de fuga da realidade e desejo de não tomar conhecimentos dos problemas, recorrendo, por vezes, à doença, sendo esta mais uma particularidade presente no grupo de adolescentes. Os sentimentos agressivos manifestados podem ter relação com o medo de ter um filho deformado, que pode expressar o medo de que os próprios sentimentos de hostilidade e rejeição, que fazem parte da ambivalência, possam ter prejudicado irremediavelmente o feto gerado dentro de si. A vivência persecutória da placentação e o risco de aborto desencadearam nestas adolescentes o sentimento de vazio. A percepção inconsciente do processo de placentação reativa as fantasias persecutórias de roubo e esvaziamento e gera ansiedade. 6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Diante dos resultados parciais e da comparação estabelecida, pudemos identificar algumas particularidades em relação aos medos e ansiedades presentes na gravidez na adolescência. Foi possível perceber também que diversas são as características comuns entre os dois grupos de gestantes, visto que ambos estão passando por um processo de intensas modificações e adaptações para a aquisição de um novo papel, o de ser mãe. Mesmo os resultados sendo, ainda, parciais, pudemos notar que as 227 diferenças entre os medos e as ansiedades estão relacionados aos recursos tanto internos quanto externos que as gestantes possuem para se adaptarem à sua nova condição. Contrariamente às gestantes adultas, as adolescentes enfatizaram os aspectos negativos relacionados à gestação, recorrendo, por vezes, à doença para manifestá-los. As adolescentes apresentam maiores dificuldades de adaptação, possivelmente, devido à sua dependência em relação aos seus pais e à necessidade de abandonar, mesmo que temporariamente, seus planos como o estudo, além de estarem atravessando uma fase do desenvolvimento caracterizada pela necessidade de diversas reestruturações. Esta situação desencadeia medos, como o de não obter o apoio da família e ser rejeitada, dando origem a ansiedades e à sensação de que tudo está perdido. Os dados evidenciados neste estudo, ao final, poderão contribuir para uma atuação mais eficaz dor profissionais da área da saúde, visto que possibilitarão a compreensão de algumas particularidades emocionais da gestação na adolescência. ABSTRACT Pregnancy, at whatever stage of woman's life it occurs, arouses specific feelings on the pregnants. With this study, the authors aimed to characterize the specific emotional questions that rebound during the pregnancy in adolescence, identifying fears and anxieties of pregnant adolescents and pregnant adults and comparing them. The subjects were two groups consisting of pregnant women, one with 7 pregnant adolescents and the other with 7 pregnant adults. Till tha moment, 3 members of each group of pregnant women participated in a semi-structured interview with the researcher and performed the projective test called “Drawing and Story”. The partial results of this study were made from the qualitative analysis of these 6 pregnant women’s data who participated in the research, and these data were previously analyzed and interpreted according to psychoanalytic theory. The theoretical assumption chosen for the preparation of this research was the Psychoanalysis for its significant contribution to the study of the human development stages and unconscious contents related to them. The importance of this study refers to the discussion of emotions, more precisely about fears and anxieties that arise in the course of pregnancy in adolescence. Finally, this study will contribute encourage further searches and inquiries about this subject, helping to allow an expansion of knowledge in order to achieve the most adequate psychological care to the pregnant adolescents. Keywords: Adolescence. Pregnancy. Fear. Anxiety. 228 REFERÊNCIAS ABERASTURY, A. Adolescência. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990. p. 15-32. BOCK, A. M. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. de L. T. Psicologias: introdução ao estudo de psicologia. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. CLERGET, S. A sexualidade em crise. In: Rio de Janeiro: Rocco, 2004. p. 236-254. . Adolescência: a crise necessária. DESSER, N. A. Adolescência: sexualidade e culpa. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1993. FREITAS, G. V. S. de; BOTEGA, N. J. Gravidez na adolescência: prevalência de depressão, ansiedade e ideação suicida. Rev. Assoc. Med. Bras., São Paulo, v. 48, n. 3, p.245-249, 2002.Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010442302002000300039&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 8 mar. 2008. LOURENÇO, M. M. de C. Textos e contextos da gravidez na adolescência: a adolescente, a família e a escola. 3. ed. Lisboa: Fim de século, 1998. MALDONADO, M. T. P. Psicologia da gravidez: parto e puerpério. 12. ed. Petrópolis: Vozes, 1991. SANT’ANA, M. J. C. Gravidez: um enfoque atual. In: WEINBERG, Cybelle (Org.). Geração delivery: adolescer no mundo atual. São Paulo: Sá editora, 2004. p. 61-72. SANTOS, S. R. dos; SCHOR, N. Vivências da maternidade na adolescência precoce. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 37, n.1, p.15-23, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S003489102003000100005&Ing=pt&nrm=iso>.Acesso em: 12 mar. 2008. SEGAL, H. Introdução à obra de Melanie Klein. Rio de Janeiro: Imago, 1975. SOIFER, R. Ansiedades específicas da gravidez. In: . Psicologia da gravidez, parto e puerpério. 3. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1984. p.21-49. TACHIBANA, M.; SANTOS, L. P.; DUARTE, C. A. M. O conflito entre o consciente e 229 o inconsciente na gravidez não planejada. Psychê, São Paulo, v.10, n.19, p.149-167, 2006. TRINCA, W. Investigação clínica da personalidade. Belo Horizonte: Interlivros, 1976. TRINDADE, E. ; BRUNS. M. A. T. Era isso o que eu queria?: um estudo da maternidade e da paternidade na adolescência. Revista Brasileira de Sexualidade Humana, SBRASH, São Paulo, v.7, n.2, p.167-186, 1996. ZUGAIB, M.; SANCOVSKI, M. O pré-natal. 2. ed. São Paulo: Atheneu, 1994. 230 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura ABANDONO, ENTREGA E INSTITUCIONALIZAÇÃO: ALGUNS DOS CAMINHOS E DESCAMINHOS DA INFÂNCIA NO BRASIL1 Mario Lazaro Camargo2 RESUMO A criança que chega à escola e é acolhida diariamente por um grupo de profissionais da educação (professores, diretores, coordenadores e demais colaboradores) traz consigo experiências altamente significativas para o bem ou mau sucedido processo de desenvolvimento e aprendizagem que vivenciarão. À luz da história da infância no Brasil e na Europa (ARIÈS, 1978; MARCÍLIO, 1998; DEL PRIORE, 2002; RININI; RIZINI, 2004), de teóricos da Psicologia Social e Institucional (FOUCAULT, 1987; MOTTA, 2001; MOTTA, 2006; GOFFMAN, 2008) e da Psicanálise (WINNICOTT, 1987; MERISSE et al., 1997; WINNICOTT, 2008), discutimos neste artigo teórico três acontecimentos experenciais que marcam de forma fundante o processo de constituição da pessoa humana e que podem se configurar como freio ou acelerador em seu caminhar rumo ao desenvolvimento e aprendizagem: o abandono, a institucionalização e a adoção. Nosso objetivo, para além da simples discussão desses temas, nitidamente marginalizados no processo de formação acadêmica dos novos e futuros educadores brasileiros, já que pouco ou nada disso é tomado como objeto de estudo nos currículos dos cursos de formação de professores, centra-se na vontade de contribuir para o exercício de uma reflexão que possa informar e conscientizar os educadores, de modo que se interessem em evitar que, por meio deles mesmos, os mitos, os medos e as falsas expectativas que recaem sobre crianças e adolescentes com histórias de abandonado, institucionalização e adoção, continuem sendo motivo de discriminação e preconceito no universo da educação e, quiçá, na sociedade como um todo. Nossas considerações finais demonstram, com base na teoria psicanalítica winnicottiana que, não obstante ao fato de trazerem consigo tais experiências, crianças e adolescentes podem, se inseridos num ambiente relacional suficientemente bom, atingirem níveis muito satisfatórios de desenvolvimento integral e qualidade de vida. Palavras-chave: Infância. Abandono. Institucionalização. Adoção. 1 INTRODUÇÃO 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Doutor em Psicologia pela Universidade de São Paulo, Brasil(2010). Professor Horista da Universidade Sagrado Coração. 231 Dentre as incontáveis experiências possíveis de serem vivenciadas por crianças e adolescentes antes e durante o período de seu processo formativo e inserção no ambiente escolar, tais como, a contração de infecções e patologias orgânicas (incluindo-se as de etiologia genética/hereditária), hospitalização, acidentes domésticos ou de trânsito, transtornos psicológicos variando desde os níveis mais leves a moderados e graves, separação dos pais, morte de um dos pais, dependência química intra-familiar, nascimento de irmãos e perda do status de centralidade em relaç ão à atenção dos pais, mudanças de residência e cidade, desemprego dos pais, etc., estão também os acontecimentos que aqui iremos abordar e que consideramos dignos de especial atenção: o abandono, a entrega para adoção e a institucionalização. Mas de que abandono estamos falando? Como ele é visto social, jurídica e psicologicamente? Como a “prática do abandono” se diferencia da “prática da entrega” que uma mãe ou um pai realizam ao encaminhar seu filho para uma instituição ou para a adoção? O que de fato queremos dizer quando falamos do “processo de institucionalização” da criança? Para conhecer um pouco mais sobre os caminhos e descaminhos da infância no Brasil e para responder estas questões, contribuindo para a formação de uma consciência e de um olhar mais crítico de tantos educadores que cotidianamente se deparam com crianças e adolescentes marcados por estas experiências é que este artigo teórico foi redigido. Assim, queremos por em discussão esta temática, principalmente entre os educadores, para torná-la mais acessível em termos de compreensão, e, sobretudo, para que estes, possam se tornar uma agentes vez melhor informados e conscientes, de transformação da atual cultura de adoção no Brasil, ainda muito marcada por mitos, medos e falsas expectativas em torno das crianças e adolescentes que trazem consigo histórias de abandono, institucionalização e adoção. 2 ABANDONO: DA CRIMINALIZAÇÃO DO ATO À COMPREENSÃO DO GESTO As práticas do abandono de crianças, sua institucionalização em ambientes públicos ou privados e/ou a colocação das mesmas em famílias substitutas, em especial por meio da adoção (ou em regime de guarda e tutela) são, além de 232 historicamente presentes em nossa sociedade, práticas interdependentes, ou seja, as duas últimas não existiriam se não fosse pela existência da primeira, tanto no Brasil quanto em vários outros países do mundo (ARIÈS, 1978; MARCÍLIO, 1998; MOTTA, 2001; DEL PRIORE, 2002; CAMARGO, 2005; CAMARGO, 2006). Assim, não registraríamos a presença e a necessidade do exercício de reflexões, de elaboração e construção de políticas públicas e de diferentes práticas, umas lícitas outras ilícitas (como a adoção à brasileira e o tráfico de menores, por exemplo), em torno da temática “adoção e institucionalização” se não tivéssemos como fenômeno real, o abandono de crianças. Segundo Nascimento (2007, p. 70) “a exposição de bebês, recém-nascidos ou não, nas ruas ou em lugares ermos, portas de igrejas ou casas, fazia parte de uma prática costumeira, presente no Brasil desde os tempos coloniais”. Tais práticas de encaminhamento das crianças, especialmente daquelas desprovidas de família e, por isso mesmo, desprovidas também de recursos sócio-econômicos, foram sistematicamente registradas por Marcílio (1998) e vários outros autores (RIZZINI; RIZZINI, 2004; BORRIONE; CHAVES, 2004). Já Ariès (1978) o fez em relação ao ocorrido na Europa, destacando-se em sua obra e narrativa históricosocial as políticas e dispositivos de conservação da criança em sua família de origem, o processo de construção das instituições asilares, como os hospícios para menores, as instituições militares para meninos, os conventos e lavanderias para meninas, além da roda dos enjeitados, que também funcionou por muitos anos no Brasil com o nome de Casa dos Expostos. O vigente Código Penal (BRASIL, 1940) disciplina em seus Artigos 133 e 134 o crime de abandono de incapaz e define as penalidades de detenção e reclusão para seus autores. Eis, na íntegra, a transcrição dos referidos artigos. Art. 133 - Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono: Pena — detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos. §1o Se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave: Pena: — reclusão,de 1(um) a 5 (cinco) anos. § 2o Se resulta a morte: Pena: — reclusão de 4 (quatro) a 12(doze) anos. § 3o As penas cominadas neste artigo aumentam-se de um terço: I — se o abandono ocorre em lugar ermo; II — se o agente é ascendente ou descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima; III — se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos (inciso introduzido pela Lei n° 10.161, de 1/10/2003). 233 Art. 134 - Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria: Pena - detenção, de seis meses a dois anos. § 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena - detenção, de um a três anos. § 2º Se resulta a morte: Pena - detenção, de dois a seis anos. Com a apresentação destes artigos de nosso Código Penal (BRASIL, 1940) podemos previamente concluir que mediante tal prática, pouco está sendo feito a não ser tentar punir os genitores promotores do abandono e institucionalizar a criança por meio de medidas, em sua maioria de responsabilidade dos Conselhos Tutelares e das Varas da Infância e Juventude, objetivando uma posterior colocação da mesma em família substituta (por meio da guarda, da tutela ou da adoção). Segundo Motta (2001) a definição jurídica do abandono de menores (ou crianças e adolescentes, como a eles se refere o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990) está vinculada ao chamado exercício do pátrio poder – hoje “poder familiar” – e a guarda, atos de responsabilidade dos genitores ou de outros que se tornam juridicamente obrigados a fazê-lo na ausência destes. Contudo, tal definição, e assim fundamentada, dá margem a uma compreensão limitante do conceito de abandono que, portanto, se vê carente de ampliação e de profundidade, para que possa ser melhor compreendida. Rodrigues (1993 apud MOTTA, 2001) discute o conceito de abandono e o apresenta como sendo um ato marcado mais pelo descaso intencional com a criação, educação e moralidade do filho do que simplesmente por deixá-lo desprovido de assistência material ou fora do abrigo do lar, o que considerando a realidade sócio- econômica de muitas famílias brasileiras, não é uma livre escolha, mas uma condição imposta pela miséria e falta de oportunidades sociais, culturais, políticas e econômicas. Conforme vemos em Motta (2001, p. 40), de acordo com nosso Código Civil, também são consideradas abandonadas as crianças que vivam em companhia de pai, mãe ou tutor ou pessoa que se entregue à prática de atos contrários à moral e aos bons costumes ou as crianças que, devido a crueldade, negligência ou exploração dos pais, tutor ou encarregado de sua guarda sejam: vítimas de maustratos físicos habituais ou castigos imoderados; privadas habitualmente dos alimentos ou dos cuidados indispensáveis à saúde; empregadas em ocupações proibidas ou manifestamente contrárias à moral e os bons costumes, ou que lhes ponham em risco a vida ou a saúde; excitadas habitualmente para a gatunice, mendicidade ou libertinagem; e assim por diante. 234 O termo abandono é, na maioria das vezes, empregado para designar o ato, não livre dos julgamentos morais da maioria da população motivada pelo senso comum, de desistência em relação aos cuidados do filho, praticados pela mãe, pelo pai, ou por ambos intencionalmente. Mas e quanto às mães e pais biológicos que entregam seus filhos para as instituições cuidadoras ou para a adoção? Podemos a eles aplicar o mesmo conceito e as mesmas sanções previstas em nossos códigos Civil e Penal? Se, por um lado, o uso do termo abandono e sua comprovação jurídica, pautada nos atos de investigação quase sempre policial ou jornalística, culminam com a criminalização e julgamento de seu autor (pai, mãe ou outro adulto responsável pela criança em questão), por outro, sua utilização estigmatiza a criança que passa a ser “o abandonado” ou “a abandonada”, isso quando não lhe aplicam estes outros adjetivos historicamente registrados: “rejeitado”, “enjeitado”, “exposto”, “renegado”, “jogado”, “bastardo”, “ilegítimo”, etc. Concordamos com Motta (2001, p. 43) que a, utilização do termo abandono alimenta o imaginário social com relação aos procedimentos adotados por quem se separa de seu filho e é moralmente tendenciosa, uma vez que arrasta consigo a imagem da criança sendo colocada em risco ou prejudicada de alguma maneira. Esta é a imagem que a criança acaba formando de si mesma. Acreditamos que ela não deixará de ser ‘abandonada’ só porque tem a informação sobre os fatos concretos da separação de sua mãe, embora o conhecimento das circunstâncias que levaram sua mãe a separar-se dela talvez possa auxiliar na reorganização de sua vida mental, na reparação da autoestima danificada e na reconquista de seu amor próprio. Nossa cultura e moral, imbuídas dos valores cristalizados pelo mito do amor materno, que coloca a mãe como aquela que deve amar incondicionalmente seu rebento e por ele tudo fazer a fim de que nasça, cresça e seja feliz (BADINTER, 1985), são taxativas em relação à mãe que abandona seu filho, muito embora pouco se preocupe em questionar sobre a responsabilidade e o paradeiro do pai dessa mesma criança. As mães que abandonam seus filhos são consideradas culpadas, desnaturadas, dignas do repúdio social, condenadas à reclusão e sujeitas à punição e agressão física até por outras mulheres/mães que com elas compartilham a cela da penitenciária. São poucos os que querem e ousam “penetrar no mundo sombrio de suas almas para desvendar seus segredos, para apurar suas dores e até compreender seu desespero, sua loucura e até mesmo sua 235 ‘maldade’” (MOTTA, 2006, p. 16). As mães que abandonam seus filhos não se fazem presentes nos resultados de pesquisas sociais e científicas, pois a elas não são permitidas, nem tampouco possíveis, formas repúdio, condenação de visibilidade que não representem risco de e aprisionamento. Sabemos de sua existência pela existência de suas crianças abandonadas. Sem poder aparecer, não recebem assistência nenhuma (nem médica, nem psicológica, nem social e, muito provavelmente, nem familiar) e certamente padecem pelas duras penas que a vida e o ato do abandono lhes imputa. Culpabilizadas moralmente, marginalizadas, discriminadas e rejeitadas socialmente, sozinhas e marcadas pela consciência da existência dos filhos tidos mas não criados, é bem provável que essas mulheres vivam tão abandonadas quanto aqueles que no abandono geraram. 3 ENTREGA: UM PARADOXAL ATO DE AMOR Diferente do abandono é o ato da entrega da criança para uma instituição cuidadora e/ou para adoção em família substituta. A entrega se dá de duas diferentes formas que aqui queremos distinguir. Na primeira delas, os genitores, ou em especial e na maioria das vezes, a mãe, é obrigada a, antes de praticar o aborto, o infanticídio ou o abandono, entregar seu filho para uma instituição ou para uma família substituta que a adotará, guardará ou tutelará até que a mesma seja emancipada ou atinja a maioridade, e isso ela faz por intermédio, orientação e supervisão da Lei. Este processo que pode ser acompanhado inicialmente por um Conselho Tutelar é normalmente concluído pela força da intervenção de um juiz da Vara da Infância e Juventude da comarca (cidade) onde residem genitores e criança em questão, que decide pela destituição do poder familiar da mãe, do pai ou de ambos, mediante um comprovado e julgado desrespeito às normas e promoção de risco ao desenvolvimento, à saúde ou à vida da criança, tais quais constam em nosso Código Civil (BRASIL, 1995), a saber: Art. 1.635 -Extingue-se o poder familiar: I - pela morte dos pais ou do filho; II - pela emancipação, nos termos do art. 5o, parágrafo único; III - pela maioridade; IV - pela adoção; V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638. Art. 1.638 - Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I castigar imoderadamente o filho; II - deixar o filho em abandono; III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente. 236 Nestas circunstâncias de destituição do poder familiar, o termo “entrega” pode ter seu sentido questionado, pois ocorre muitas vezes à revelia dos desejos dos genitores da criança, ou seja, o poder familiar pode ser destituído sem que haja o desejo, da mãe ou do pai, de que a criança seja entregue para a instituição cuidadora ou para uma família substituta, e isto por força da Lei, como dito anteriormente. O que ocorre nesse caso é uma entrega forçada, obrigatória e pautada, juridicamente, no princípio da defesa da vida da criança, direito lhe assegurado por diferentes documentos internacionais e nacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948), a Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988) e o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), entre outros. A segunda forma de entrega é aquela provida de consciência e intencionalidade por parte dos genitores que, uma vez certos de que por si não serão capazes de prover os recursos necessários ao desenvolvimento saudável da criança, optam por entregá-la a outro que, por encontrar-se em melhores condições – sociais, culturais, psicológicas e econômicas – o poderá fazer. Este caso difere-se do anterior porque provido de oportunidade e espaço para o exercício do discernimento e escolha dos genitores. A mãe, o pai ou ambos, optam pela entrega do filho. Escolhem fazê-lo em benefício do mesmo, ainda que isso também venha a ocorrer à revelia de seus desejos. Está presente neste ato de entrega o que intitulamos paradoxal ato de amor, pois o mesmo princípio que rege as legislações, nacionais e internacionais, em favor da proteção da vida da criança e do adolescente, se faz também presente na consciência dos genitores (mãe, pai ou ambos). O ato de entrega do filho certamente ocorre num momento de crise, onde se presentificam dificuldades advindas de diferentes dimensões para os genitores da criança e, considerando os elementos realidade geopolítica, especialmente enfrentadas pela de nossa cultura e mulher/mãe, muitas vezes sozinha, ou como já mencionamos anteriormente, igualmente abandonada. Buscando dirigir seu olhar para essas mulheres, Motta (2006, p. 24) observa que, muitas mulheres que entregam seu filho nas Varas de Infância e Juventude o fazem no mesmo dia em que saem da maternidade, ainda sob os efeitos das dores dos procedimentos adotados no parto e em pleno estado puerperal. Sabe-se que este é um momento em que a mulher tem seu estado emocional alterado por fatores os mais variados, desde os hormonais 237 até os de dinâmica e significação mais complexas. Esta decisão pela entrega que se dá o quanto antes, ou seja, logo após o parto (este processo recebe o nome de adoção intuitu personae) ligada ao fato de que a mãe teme, não obstante às reflexões e conclusões já realizadas em torno da escolha pela entrega do filho, não ser capaz de verdadeiramente entregar seu rebento depois de o ter amamentado e/ou por um certo tempo com ele convivido. A mãe sabe, paradoxalmente, que se por um lado seu gesto de entrega está marcado pela presença de um importante e significativo afeto pelo filho – o qual chama de amor – e sabe também que, dadas as condições em que se encontra, amá-lo, de fato, significa entregá-lo, uma vez que de tal gesto poderá depender sua saúde, seu desenvolvimento e sua vida. Esta divisão entre o ficar e o entregar, entre o desejo de maternagem e sua impossibilidade, é causadora, quase irremediável e irreparavelmente, de sofrimento e dor, tanto que Motta (2001) o compara ao luto pela perda do filho em caso de morte. [...] não há evidências que justifiquem a pressuposição de que a difícil experiência de entregar um filho em adoção se dilua com o tempo até extinguir- se, pois o que se verifica é que a tristeza e o remorso freqüentemente se fazem presentes, quando tudo parece estar concluído. A separação entre a mãe e a criança parece estar acompanhada de um luto sem fim. [...] Há mulheres que desenvolvem problemas de relacionamento com o futuro parceiro ou com os demais filhos, seja por sentimentos de culpa, seja pelo receio de serem rejeitadas pelo parceiro caso este venha a conhecer a verdade. Pautam, assim, seu relacionamento num segredo e numa ansiedade que fatalmente gerarão conseqüências danosas para todos os envolvidos (MOTTA, 2006, p. 25). Esperamos que por meio destas breves linhas se tenha tornado possível a diferenciação entre os termos e atos intitulados abandono e entrega, de modo que aqui possamos, através de tal diferenciação, libertarmo-nos dos preconceitos e das práticas estigmatizadoras que normalmente fazemos – enquanto sociedade – pesadamente cair sobre as mães que entregam seus filhos. Entendemos a entrega como um paradoxal ato de amor, no sentido de que também consideramos difícil e certamente gerador de conflitos, sobretudo do ponto de vista psicológico, pô-la em prática. As mães que entregam seus filhos para adoção estão abrindo mão de seu exercício de maternidade em função do bem estar de seus rebentos e com isso, agindo profilaticamente, uma vez que não virão a fazer parte, engrossando as estatísticas, do grupo de mulheres e famílias que 238 promovem situações como a negligência, a violência, o abuso e o próprio abandono. Há certamente, no ato da entrega uma ação protetiva, um ato amoroso, cuidadoso e, porque não dizer, corajoso. A discussão sobre a questão do abandono e da entrega de crianças nos faz desejar ampliar nosso foco e buscar uma inserção mais profunda no universo experencial daquele ou daquela que abandona e entrega – os genitores – de modo que se torne possível conhecer melhor suas fragilidades, motivações e condições de vida, pois como afirma Motta (2006, p. 21), há “crianças que são institucionalizadas”, abandonadas ou entregues, “porque suas mães não têm qualquer apoio e orientação para lidar com as pressões externas e internas sofridas. Essas crianças são a prova viva de que cuidar da mãe significa cuidar da criança”. 4 INSTITUCIONALIZAÇÃO: OS MUROS QUE DEVERIAM PROTEGER Ao falarmos de institucionalização estaremos nos referindo ao período de tempo equivalente à permanência de uma criança ou adolescente numa instituição, primordialmente, aquelas histórica e contemporaneamente denominadas “Asilo dos expostos”, “Lar dos desamparados”, “Asilo de menores”, “Patronato”, “Internato”, “Lar do menor”, “Casa da criança”, “Orfanato”, “Abrigo”, etc., e que independente da categoria em que se inscrevem, ou seja, se públicas ou privadas, funcionam como o lugar de morada, nem sempre provisório, da criança ou adolescente que por motivos certamente sérios e comprometedores de sua saúde, segurança e vida, tiveram que se ver alijadas do direito à convivência familiar (nuclear ou extensa) e dos cuidados de seus genitores. Para não fazermos aqui uma “história das instituições”, já que não é esta nossa intenção e objetivo de pesquisa, mas para contextualizar histórica e socialmente seu processo de construção idearia, instalação concreta e aprimoramento constante, trazemos as contribuições de Borrione e Chaves (2004, p. 19) para quem, as instituições de proteção à infância surgiram em decorrência de um conjunto de fatores: (1) o surgimento do sentimento de infância e a concepção da infância como um período particular do desenvolvimento da criança, sendo esta um indivíduo (concepção do indivíduo-criança) que possui direitos e necessita de cuidados especiais e proteção dos adultos para sua formação (ARIÈS, 1978); (2) a tentativa de evitar o infanticídio e o aborto, já que o abandono decorria essencialmente de questões financeiras 239 e/ou morais (pobreza e/ou ilegitimidade da criança filha de mães solteiras); (3) o desconforto social e religioso, numa sociedade católica, ao contato com crianças perambulando sozinhas pela cidade ou com os corpos expostos nas ruas, sujeitas às intempéries da natureza e aos ataques dos animais (MARCÍLIO, 1998); (4) a preocupação em evitar a marginalização, a prostituição e a criminalidade das crianças abandonadas (MARCÍLIO, 1996); e, posteriormente, (5) a necessidade de educar, corrigir, disciplinar e controlar as crianças pobres e desamparadas para que se tornassem cidadãos úteis à sociedade. A importância de discutirmos a questão da institucionalização se dá pelo fato de sê- la um dos destinos da criança em situação de abandono e/ou desprovida dos cuidados maternos ou paternos, muito embora possam também existir outros motivos que as fazem chegar ao abrigo. Um levantamento feito por Silva (2004) revela que os motivos de ingresso de crianças e adolescentes em abrigos no Brasil, segundo a freqüência são: 24,2% por carência de recursos materiais da família ou responsável (pobreza); 18,9% por causa do abandono dos pais ou responsáveis; 11,7% foram vítimas de violência doméstica (maus-tratos físicos e/ou psicológicos); 11,4% são filhos ou tutelados por pais ou responsáveis dependentes químicos ou alcoolistas; 7% foram recolhidos das ruas, onde viviam; 5,2% pela orfandade (morte dos pais ou responsáveis); e 21,6% por outros motivos não categorizados. Assim, com exceção das crianças imediatamente postas em famílias substitutas, a maioria daquelas entregues à adoção ou abandonadas, encontram na instituição o seu endereço provisório ou permanente. Mas o que significa essa experiência de permanência na instituição? Quais as ressonâncias desse processo de institucionalização na constituição da subjetividade da criança? Querendo responder a estas questões, olharemos para os seguintes aspectos: o jurídico e o psicológico. Muito embora a história da institucionalização da (RIZZINI; RIZZINI, 2004) infância brasileira registre casos de períodos extremamente longos de permanência intra- muros, do ponto de vista jurídico e contemporaneamente falando, a instituição tem – ou deveria ter – um caráter provisório. São essas as duas características básicas da instituição hoje intitulada “abrigo”: a missão de proteger e a provisoriedade (BRASIL, 1990). A instituição, idealmente constituída pelo seu caráter de provisoriedade e pela missão de proteção da criança e do adolescente, representa um espaço de convivência diferente daquele possível de se verificar ocorrendo no seio familiar. 240 Segundo Goffman (2008) uma instituição se define como o lugar de morada e de realização de atividades (laborais, educativas/disciplinadoras ou de cuidados com a saúde) de um certo número de pessoas que levam uma vida fechada e formalmente administrada, possuindo situações de vida semelhantes e separados da sociedade mais ampla por um período pensarmos uma no modo criança ou de vida adolescente de tempo indeterminado. não institucionalizado, veremos, Assim, se por exemplo, dormindo, brincando, aprendendo e convivendo com pessoas e ambientes diferentes, tanto por sua localização quanto por seu caráter e regime de gestão ou cultura organizacional; os veremos também experimentando, a cada mudança de ambiente, um novo conjunto de regras a serem seguidas, uma nova autoridade a ser respeitada e, portanto, um rol de possibilidades e novidades que contribuirão para a construção de conhecimentos e experiências adversas, embora possamos também dizer que algumas serão positivas e outras negativas em seu processo de constituição enquanto sujeito. Diferentemente da inserção em família (de origem ou adotiva) é o que a criança ou adolescente vivencia no interior de uma instituição, onde seu dormir, brincar, aprender e convivência ocorrem dentro de um mesmo espaço, limitado por muros e por regras que acabam, conforme nos ensina Goffman (2008), representando uma ruptura entre o modo natural e o modo institucionalizado de viver. Com isso, e por meio de um regime disciplinar (FOUCAULT, 1987, p. 118), característico e definidor da instituição, se obtém a docilização do corpo infantil e púbere, ou seja, “um corpo que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que pode ser transformado e aperfeiçoado” . As chamadas instituições totais, fortemente marcadas pela presença e atuação, sempre aprimorável, dos regimes disciplinares, responsáveis, enquanto dispositivos político-ideológicos, pelo cuidado tornam-se daqueles que, por um motivo ou outro, fogem à norma instituída e representam risco à estabilidade social (status quo). Seu fundamental papel consiste em normatizar, normalizar e docilizar os corpos (dos abandonados, pobres, doentes, deficientes, viciados, prostituídos, criminosos, etc.) por meio da vigilância, do controle, do exame e da punição (FOUCAULT, 1987) e podem ser assim categorizadas: 241 em primeiro lugar, há instituições criadas para cuidar de pessoas que, segundo se pensa, são incapazes e inofensivas; nesse caso estão as casas para cegos, velhos, órfãos e indigentes. Em segundo lugar, há locais estabelecidos para cuidar de pessoas consideradas incapazes de cuidar de si mesmas e que são também uma ameaça à comunidade, embora de maneira não intencional; sanatórios para tuberculosos, hospitais para doentes mentais e leprosários. Um terceiro tipo de instituição total é organizado para proteger a comunidade contra perigos intencionais, e o bem estar das pessoas assim isoladas não constitui o problema imediato: cadeias, penitenciárias, campos de prisioneiros de guerra, campos de concentração. Em quarto lugar, há instituições estabelecidas com a intenção de realizar de modo adequado alguma tarefa de trabalho, e que se justificam apenas através de tais fundamentos instrumentais: quartéis, navios, escolas internas, campos de trabalho, colônias e grandes mansões (do ponto de vista dos que vivem nas moradias de empregados). Finalmente, há os estabelecimentos destinados a servir de refúgio do mundo, embora muitas vezes sirvam também como locais de instrução para os religiosos; entre exemplos de tais instituições, é possível citar abadias, mosteiros, conventos e outros claustros (GOFFMAN, 2008, p. 16-17). Considerando o fato de que existem estas situações envolvendo contextos de inserção da criança e do adolescente no Brasil ou ainda variações das mesmas: � instituições que atuam de forma exemplar e elogiável na busca pelo cumprimento de sua missão com o cuidado da infância brasileira; � instituições por vezes dignas de críticas e até mesmo sujeitas, como parte ré, em processos criminais, acusadas de negligenciar e maltratar seus “protegidos” dadas as condições diversas de sua estrutura e gestão; � famílias bem estruturadas e, por isso mesmo, fomentadoras de um processo de desenvolvimento humano que transcorre de forma positiva para a criança ou adolescente; � famílias de estrutura comprometida, muitas vezes agressora, negligente e carente do ponto de vista social, cultural e econômico, que comprometem o saudável desenvolvimento físico, intelectual e psicológico da criança ou adolescente; � a permanência, total ou parcialmente desprovida de abrigo institucional e familiar, nas ruas e praças das cidades, em geral de médio e grande porte, onde a condição de vulnerabilidade é extrema e, portanto, altamente comprometedora para o saudável desenvolvimento da criança ou adolescente; Preconiza o ECA: 242 Art. 19 - Toda criança e adolescente tem direito de ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes (BRASIL, 1990, p. 12). Está claro, portanto, que a legislação brasileira elege a família como sendo o lugar privilegiado de permanência da criança, objetivando seu mais saudável processo de desenvolvimento. A família de origem (biológica-nuclear) não podendo demandar tais cuidados, deve delegar os mesmos a uma família substituta (biológica-extensa ou família adotiva) ou a uma instituição (abrigo) que, por sua vez, deve cumprir o papel de proteção da criança ou adolescente em questão durante esse hiato de tempo entre sua saída da família de origem para sua colocação em outra (substituta), pois, ainda que a instituição possa garantir à criança ou adolescente o abrigo, a alimentação, os cuidados com a saúde de que precisa, os papéis sociais ali vivenciados se dividem claramente entre abrigados e funcionários; há, portanto, os que mandam e os que devem obediência, os “tios” e as “tias”, ou os “senhores” e as “senhoras” e, na maioria das vezes, a convivência e as trocas estabelecidas entre os abrigados prevalecem dentro de um universo ou masculino ou feminino, já que muitas instituições só atendem a um dos gêneros. Em decorrência de tais limites, impostos pela dinâmica institucional que não personaliza nem individualiza atenção, afeto e cuidado, mas que, pelo contrário, tende a generalizar e padronizar ações corretivas/disciplinadoras por meio de regras e convenções previamente estabelecidas, distorções podem ser geradas no processo de desenvolvimento psíquico da criança e do adolescente, comprometendo sua sociabilidade, sexualidade, comunicação e construção de identidade e subjetividade (MERISSE et al., 1997; CECIF, 2002; CECIF, 2004; WINNICOTT, 2008). Cada um dos inúmeros riscos ao bom desenvolvimento psicológico, intelectual, social e físico da criança e adolescente abrigados está, direta e interdependentemente, relacionado com o período de tempo equivalente a sua permanência na instituição, ou seja, quanto mais tempo de institucionalização, mais risco ao desenvolvimento da criança e adolescente e quanto mais rápido se der o processo de colocação em família substituta, e esta família, por seu turno, sendo positivamente acolhedora, mais chances de um saudável desenvolvimento ele ou ela terá (WINNICOTT, 1987). Eis, pois, a mais importante justificativa 243 para o caráter de provisoriedade do processo de institucionalização, uma vez que caso assim não seja, os mesmos muros da instituição que deveriam proteger, podem se transformar em potencializadores do estigma que já recai pesadamente sobre os ombros das crianças e adolescentes sem família; o que resultaria num duplo abandono: o primeiro pela família de origem (biológica) e o segundo pela sociedade, considerando os efeitos discriminatórios e excludentes que o estigma produz. Consideremos importante salientar que por estigma entendemos o mesmo que Goffman (1988), ou seja, o indivíduo por ele vitimado (o estigmatizado) formula para si um conjunto de crenças semelhante àquelas possíveis de se verificar presentes no imaginário das pessoas que ele mesmo aprendeu a considerar como “normais”. Contudo, dado o rol de percepções que é capaz de construir acerca de sua inserção nos grupos sociais, acerca de sua identidade, verifica que, sendo ora francamente excluído, ora subliminarmente indesejado, “seus sentimentos mais profundos sobre o que ele é podem confundir a sua sensação de ser uma ‘pessoa normal’, um ser humano como qualquer outro, uma criatura, portanto, que merece um destino agradável e uma oportunidade legítima” (GOFFMAN, 1988, p. 16-17). Assim, o portador do estigma, seja ele uma criança ou adolescente adotado ou abandonado, seja ele um deficiente (físico, perceptual ou dependente intelectual) químico, ou ainda um negro (afrodescendente), um um homossexual, uma prostituta, um ex-presidiário, etc., percebe que independente do que os “normais” admitam, estes se julgam normais justamente pela existência e pela possibilidade do contraponto com os que são considerados “anormais” – os estigmatizados – e, por isso, não estão interessados em conviver com os mesmos de forma igual. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Com o seminal conceito de “ambiente suficientemente bom” e sua teoria sobre o “processo de maturação” da criança, Winnicott (1987) demonstra que a mesma, ao passar pelas fases de dependência absoluta, dependência relativa e rumo à independência, tem seu processo facilitado ou bloqueado por um ambiente que lhe oferece, ou não, condições de realização do potencial inato para o desenvolvimento que já possui. 244 O bebê, ou a criança, não é, portanto, uma obra prima da mãe e do pai, do professor ou da escola, tal qual o artista pode afirmar que o é uma de suas pinturas ou esculturas; em seu processo de maturação, ele, por si, vai se esculpindo e se pintando para atingir uma forma e um movimento de tons e cores que não é determinado pelos pais ou demais participantes de seu contexto de inserção, mas fruto da relação: criança-ambiente. Mãe e pai, professores e escola, são os iniciadores e podem também ser os facilitadores de um processo de desenvolvimento que resulta da oportunização de um primeiro ambiente que é interno à mãe (útero; processo gestacional), que depois passa a ser externo à mãe (o seu colo; a amamentação; a preocupação materna primária) e, ainda posteriormente, um lar que pode vir a ser suficientemente bom. Os pais, cuidadores e educadores, conforme afirma Winnicott (1983) tornam-se dependentes das tendências hereditárias presentes na criança que tiveram e deixam de ser protagonistas de seu processo maturacional, podendo fazer apenas esta participação e dar apenas esta contribuição: prover um ambiente facilitador que não bloqueie o processo de maturação. Os pais, cuidadores e educadores são, portanto, os protetores do vir-a-ser da criança. Mesmo as crianças observadas e atendidas por Winnicott no período da evacuação inglesa, por conta da segunda guerra mundial, e, portando vivendo situações de perda e separação dos pais biológicos, quando acolhidas em boas instituições e/ou por famílias suficientemente boas, tiveram seu bom desenvolvimento assegurado (WINNICOTT, 2008). Assim, podemos pensar que nossas crianças e adolescentes, com ou sem a experiência do abandono, da institucionalização e da adoção, têm um potencial de desenvolvimento que pode ser facilitado por um ambiente, primeiro familiar e depois escolar, marcado pela presença de uma boa acolhida (que Winnicott chamou de holding), de segurança, de conforto e de incentivo ao amadurecimento, porque livres de preconceitos, de juízos falsos, de influencias dos estigmas que, na maioria das vezes se produz ou se reproduz através das falas, gestos e comportamentos dos adultos: muitas vezes pais e educadores. REFERÊNCIAS ARIÈS, P. História social da criança e da família. 2. ed. Rio de Janeiro: 245 Guanabara Koogan, 1978. BADINTER, E. Um amor conquistado: o mito do amor materno . Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. BORRIONE, R.; CHAVES, A. M. Análise documental e contexto de desenvolvimento: estatutos de uma instituição de proteção à infância de Salvador, Bahia. Estud. psicol. (Campinas), Campinas, v. 21, n. 2, ago. 2004. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1998. . Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código civil. Organização dos textos , notas remissivas e índices por Juarez de Oliveira. 46. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. BRASIL. Lei n. 2.849, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del2848.htm>. Acesso em: 1 ago. 2009. . Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e dá outras providências. In: VIEIRA, J. L. Estatuto da Criança e do Adolescente. 3. ed. Bauru: EDIPRO, 1998. (Série Legislação) CAMARGO, M. L. Adoção tardia: representações sociais de famílias adotivas e postulantes à adoção (mitos, medos e expectativas). 2005. 268 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Campus de Assis. . Adoção tardia: mitos, medos e expectativas. Bauru: Edusc, 2006. CECIF. 101 perguntas e respostas sobre abandono e institucionalização. São Paulo: CECIF, 2002. .Dialogando com abrigos. São Paulo: CECIF, 2004. DEL PRIORE, M. (Org.). História das Crianças no Brasil. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2002. 246 FOUCAULT, M. Vigiar e punir: história da violência na s prisões. 25. ed. Petrópolis: vozes, 1987. GOFFMAN, E. Manicômios, prisões e conventos. 8. ed. São Paulo: Pespectiva, 2008. . Estigma: notas sobre a manipula ção da identidade deteriorada. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988. JUSTO, J. S. A institucionalização vivida pela criança de orfanato. In: MERISSE, A. et al. Lugares da Infância: reflexões sobre a história da criança na fábrica, creche e orfanato. São Paulo: Arte & Ciência, 1997, p. 71-92. MARCÍLIO, M. L. História social da criança abandonada. São Paulo: Hucitec, 1998. ___________. Marginalidade,pobreza e abandono de crianças no Brasil:séculos XVIII e XIX. Revista de Ciencias Historicas, Universidade Portucalense, v. XI, 1996, p. 163-173. MOTTA, M. A. P. Mães abandonadas: a entrega de um filho e m adoção. São Paulo: Cortez, 2001. . As mães que abandonam e as mães abandonadas. In: SCHETTINI FILHO, L.; SCHETTINI, S. S. M. Adoção: os vários lados dessa história. Recife: Bagaço, 2006. p. 15– 45. NASCIMENTO, A. C. Frutos da castidade e da lascívia: as crianças abandonadas no Recife (1789-1832). Estudos Feministas, Florianópolis, v. 15, n.1, p. 67-83, jan./abr. 2007. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948). Disponível em: <http://www.onubrasil.org.br/documentos_direitoshumanos.php>. Acesso em: 10 jul. 2009. RIZZINI, I.; RIZZINI, I. A institucionalização de crianças no Brasil: percurso histórico e desafios do presente. Rio de Janeiro: Loyola, 2004. RIZZINI, I. Pequenos trabalhadores do Brasil. In: DEL PRIORE, M. (Org.). História das Crianças no Brasil. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2002. p. 347-375. 247 SILVA, E. R. A. (Coord.). O direito à convivência familiar e comunitária: os abrigos para crianças e adolescentes no Brasil. Brasília: IPEA/CONANDA, 2004. WINNICOTT, D. W. A criança e o seu mundo. 6. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1982. . O ambiente e os processos de maturação: estudos sobre a teoria do desenvolvimento emocional. Porto Alegre: Artes Médicas, 1983. . Privação e delinqüência. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008. (Coleção Psicologia e pedagogia) 248 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura A RELAÇÃO HOMEM E IMAGEM: O OLHAR DO ANTROPOLÓGO1 Mikael Corrêa dos Santos2 RESUMO Todo homem dotado de visão, é capaz de perceber imagens e relacionar-se com o mundo à sua volta através delas. Esta afirmação, a princípio, óbvia, toma outra dimensão ao analisarmos o tema mais profundamente. Serão necessárias, como ponto de partida, algumas questões que determinarão o rumo desta trajetória: O que entendemos por imagem? Todos os homens dotados de visão as percebem da mesma maneira? Valendo-se de alguns pensadores dedicados ao tema, este artigo visa refletir tais questões, a fim de melhor compreender a complexa relação entre homem e imagem Palavras chave: Imagem. Olhar. Antropologia Visual. Filosofia. 1 INTRODUÇÃO Não há informação que nos chegue sem antes passar pelos órgãos dos sentidos, percebemos o mundo a nossa volta a partir de estímulos sensoriais que nos afetam a todo o momento. Dentre eles, a capacidade da visão caracteriza-se por ser o sentido mais acionado por nós humanos. A maioria dos estímulos que recebemos durante toda nossa vida, nos vem por imagens, “o homem de hoje é um ser predominantemente visual. Alguns chegam à exatidão do número: oitenta por cento dos estímulos seriam visuais.” (BOSI, 1988, p. 65) Há de se refletir, portanto, como os estímulos visuais - as imagens - chegam até nós e como se dá este processo chamado percepção visual. Para entendermos este processo, é preciso antes romper com algumas “meias verdades” que nos chegam, uma delas é: “Enxergamos com os olhos.” 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluno do curso de Especialização em Antropologia da Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. Bacharel em Comunicação Social com Habilitação em Publicidade e Propaganda pela Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. 249 Os olhos são um dos instrumentos da visão. Entretanto deve-se logo acrescentar que são apenas um dos instrumentos, e, sem dúvida, não o mais complexo. A visão é, de fato, um processo que emprega diversos órgãos especializados. Numa primeira aproximação pode-se dizer que a visão resulta de três operações distintas (e sucessivas): operações ópticas, químicas e nervosas. (AUMONT, 1993, p. 18) Resumidamente, podemos dizer que os instrumentos responsáveis pela visão humana operam da seguinte maneira: Os raios emitidos por uma fonte de luz chegam até uma superfície e quando refletidos, são convergidos para o interior dos nossos olhos por uma espécie de lente chamada córnea. A partir daí atravessam uma abertura determinada pela íris chamada pupila, e enfim atravessam o cristalino. Ao atravessá-lo, encontram uma membrana no fundo do olho denominada retina, onde estão localizados inúmeros receptores de luz, os chamados bastonetes e cones. Cada um destes receptores retinianos está ligado a uma célula nervosa, ligada por sua vez, à outra célula nervosa, através de sinapses. Juntas estas células constituem as fibras do nervo óptico. Estas fibras, ligadas em rede, saem em direção à parte posterior do cérebro, até chegarem ao córtex estriado. (AUMONT, 1993). De fato processo há inúmeros de captação das processos imagens, físicos, porém químicos não e podemos biológicos entender no a percepção visual de maneira Cartesiana, dividindo cada parte e estudando-as de maneira isolada. Quando falamos de imagens e percepção visual, não podemos, em hipótese alguma, desconsiderar o sujeito que olha, aquele que irá direcionar sua visão a algo em busca de informações, e consequentemente extrair significações. Alfredo Bosi, num estudo linguístico, propõe uma diferenciação entre os termos “olho” e “olhar”: Se em português os dois termos aparentemente se casam, em outras línguas a distinção se faz clara ajudando o pensamento a manter as diferenças. Em espanhol: ojo é o órgão; mas o ato de olhar é murada. Em francês: oeil é o olho; mas o ato é regard/regarder. Em inglês: Eye não está em look. Em italiano, uma coisa é o occhio e outra é o sguardo. Creio que essa marcada diversidade em tantas línguas não se deva creditar ao mero acaso: trata-se de uma percepção, inscrita no corpo dos idiomas, pela qual se distingue o órgão receptor externo, a que chamamos “olho”, e o movimento interno que se põe em busca de informações e de significações, e que é propriamente o “olhar” (BOSI, 1988, p. 66) 250 Nesta diferenciação entre “olho” e “olhar”, percebemos que o “olho”, enquanto órgão da visão, é comum em várias espécies animais, porém o “olhar” é próprio do ser humano, afinal este não se limita somente em receber estímulos visuais, ele o faz com intencionalidade. De todos os seres dotados de visão, “é apenas o homem quem fabrica, reconhece e atribui sentidos às imagens.” (NOVAES, 2008) 2 OBJETIVOS Pretende-se, a partir do estudo da relação estabelecida entre homem e imagem, levantar parâmetros que possibilitem ao antropólogo ou demais pesquisadores sociais, o entendimento das possíveis verdades que as imagens nos proporcionam e dos diferentes olhares em culturas diversas existentes. 3 METODOLOGIA O caminho utilizado para melhor compreensão do tema proposto foi a pesquisa bibliográfica de caráter qualitativo exploratório, visando avaliar frente aos materiais publicados, como livros, artigos de periódicos e material disponibilizado na Internet, as principais questões levantadas, desde os présocráticos até aos pesquisadores atuais, sobre o olhar e as relações entre homem e imagem. 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO Imagens criadas pelo homem são tão antigas quanto a própria humanidade. Pinturas rupestres encontradas em diversos sítios arqueológicos - como as mãos em negativo sobre a rocha no interior de uma gruta, descobertas na cidade de Vilhonneur, na França, e que podem chegar a 25 mil anos - são vestígios de que as imagens nos acompanham desde pelo menos o período Paleolítico. (NOVAES, 2008). Muitos estudos são realizados em torno destas imagens, a fim de desvendar quais seriam as finalidades dessa produção. Teriam elas objetivos “mágicos”, ou 251 seriam mera representação do mundo que viviam? Para entendermos essa questão específica, é preciso compreender que todas imagens produzidas pelo homem, nunca são produzidas de maneira gratuita, ou seja, desde sempre, as imagens foram fabricadas para determinados usos e finalidades, sejam eles individuais ou coletivos. (AUMONT, 1993, p. 78). Na tentativa de responder quais são as funções das imagens, Jaques Aumont, afirma que elas são as mesmas que todas as produções humanas, ou seja, ambas visavam estabelecer uma relação com o mundo. São três os principais modos desta relação: a) O Modo simbólico: Inicialmente as imagens estavam intimamente ligadas às divindades, ao religioso, à magia. As imagens simbólicas eram capazes de dar acesso ao sagrado, pela manifestação de uma presença divina. Podem ser de natureza representativa (Zeus, Buda ou Cristo), como também de origem puramente simbólica (a cruz cristã, a suástica hindu). Os símbolos ainda não são muito presentes em nosso cotidiano, e são necessariamente ligados somente aos motivos religiosos. Para Charles Sanders Peirce (1972), reconhecido como pai da semiótica e da teoria dos signos, os símbolos se distinguem de todos os outros signos pelo seu caráter convencional, são como “regras” admitidas e adotadas pela sociedade que está inserido, “se associa a objetos graças a convenções especiais, [...] o símbolo é o signo que se transforma em signo porque como tal é entendido.” (PEIRCE, 1972, p. 28) b) O modo epistêmico: São imagens que trazem informações visuais sobre o mundo; é relativo ao conhecimento (epistêmico). Essa função foi bastante desenvolvida no início da era moderna, através de gêneros “documentários” como a paisagem e o retrato. Pode ser de caráter científico ou não. Ex: Cartografia, infográficos de livros científicos ou mesmo ilustrações do Evangelho. c) O modo estético: Neste modo, a imagem tem a função de oferecer sensações (aisthésis) específicas ao espectador (empatia, estranhamento, admiração, imaginação...). Essa função da imagem é quase indissociável atualmente da noção de arte, a ponto de se confundirem. (AUMONT, 1993, p. 80). Retornando ao exemplo citado, quanto às funções das imagens gravadas nas cavernas no período paleolítico, podemos dizer que apesar de várias teses existentes, que variam de acordo com a época em que foram estudadas e as 252 correntes adotadas, elas perseguiam funções que iam além do modo estético. Elas não apresentam objetivos de decoração ou ornamentação, pois há inúmeras imagens que se sobrepõem, apesar da enorme disponibilidade de espaço (NOVAES, 2008). Além disso, as imagens eram gravadas no fundo das cavernas pré-históricas distantes da entrada utilizada para moradia. Estas cavernas eram verdadeiros labirintos naturais de galerias subterrâneas. Onde as imagens eram executadas não penetravam sequer um raio de luz solar, necessitando de uma tocha para iluminar o trabalho. (OSTROWER, 1988) A hipótese mais aceita atualmente é que a função destas imagens está relacionada ao modo simbólico, no sentido de perseguir objetivos ligados a “magia”. Fayga Ostrower em seu artigo “A construção do olhar” explana: [...] a figuração não abrange todos os animais existentes, e sim unicamente os de caça. Este é mais um dado que reforça a hipótese da magia ter sido a motivação original, e sempre renovada em sua necessidade, para produzir os desenhos. Através das imagens, os homens poderiam dominar e possuir os animais. De fato, muitas vezes vemos a silhueta da mão humana posta literalmente em cima da figura do animal – tomando posse dele, numa ação mágica. (OSTROWER, 1988, p. 169) Dentre os mais diversos estudos que abordam a análise das imagens, suas funções e sua relação com o homem, é preciso destacar antes, que os Présocráticos já discutiam sobre o tema num âmbito filosófico acerca da questão: Qual tipo de verdade que as imagens podem nos proporcionar? Neste sentido, a teoria do olhar e das imagens, pode coincidir com a própria teoria do conhecimento ou Epistemologia. Relembramos aqui, que o “olhar” é um processo que vai além da capacidade da visão, ou capacidade específica de um órgão do nosso corpo, o “olho”, é pois, um fenômeno intimamente relacionado à atividade intelectual e aos sentimentos humanos. Alfredo Bosi (1988) relembra que os gregos e os romanos helenizados pensaram em duas dimensões axiais do olhar: “O olhar ativo” e o “olhar receptivo”, sendo estas as duas dimensões opostas que o pensamento antigo se constituiu. O “olhar ativo” foi representado principalmente por Platão, enquanto a noção de “olhar receptivo” foi defendida entre outros, por Epícuro e Lucrécio. Iniciaremos por Platão, que em A República, na tentativa de conceber uma 253 polis ideal, propõe uma rígida divisão entre os artesãos, guerreiros e os guardiões das leis. Estes últimos deveriam ser detentores do conhecimento, ou seja, filósofos. Deveriam antes de tudo, buscar conhecer a verdade e guiar suas ações baseando-se nela para alcançar a justiça. Neste percurso, Platão desenvolverá uma detalhada teoria do conhecimento, que se baseará na diferenciação das formas inteligíveis - ideias; espírito - em relação às formas sensíveis - as coisas e os seres; corpo. (ENTLER, 2009) Um dos relatos ilustrativos desta diferenciação entre o “mundo das ideias”e o “mundo dos sentidos”, está presente no Mito da caverna. Em tal obra Platão alerta que os homens presos dentro de suas cavernas nada vêem que não sejam apenas sombras – imagens – e que estas nada são além de meras ilusões, e portanto, não contribuem para a busca da verdade, ao contrário, nos distanciam dela. Propõe que a vida filosófica abandone a práxis simplesmente mundana e utilitária, e instaure uma práxis contemplativa, sendo este o único caminho para o êxito da busca da verdade. (BORNHEIM, 1988) É preciso salientar que o termo “sombras” utilizado por Platão no referido mito, mesmo estando diretamente ligado à percepção visual, relacionado ao mundo das imagens, é antes uma alusão à todos os estímulos sensoriais, repletos de ilusões e incertezas, segundo ele. [...] A realidade sensível jamais pode produzir um saber porque as coisas sensíveis são ao mesmo tempo dissemelhantes, muitas e múltiplas nelas mesmas. Aquele que se deixa seduzir apenas pelos sentidos deve assumir os riscos da incerteza ou perder-se naquilo que vê. Os sentidos, como as paixões, perturbam a alma, e, sem temperança, conduzem ao vício e à loucura. O homem que contempla é absorvido pelo que contempla. Por essa razão, Platão nos convida a desconfiar da percepção, das pulsões e dos caprichos do corpo. A estabilidade e harmonia estão no mundo supra- sensível, nas idéias transcendentes e separadas do sensível, imutáveis, genéricas. (NOVAES, 1988, p.10) Se Platão apoiava-se no mundo das ideias (alma), para encontrar a verdade das coisas, e para tal deveria ser feita uma renúncia ao mundo sensível, a tradição nascida com Demócrito, Epicuro e Lucrécio defendia o oposto, para eles a verdade somente se apresentaria aos sentidos (corpo). Através do “olhar receptivo” deram origem ao que seria mais tarde conhecida como Teoria perceptiva. A matéria que nos toca, portadora da verdade, nos chegam através de 254 átomos luminosos que se desprendem da superfície dos seres, a eles dá-se o nome de simulacros (eidola, em grego), podendo ser entendido como imagem ou aparência visível. A respeito dos simulacros Lucrécio define no poema De rerum natura (1 a.C): De todos os objetos existe o que nós chamamos de simulacros: espécies de membranas leves destacadas da superfície dos corpos, e que volteiam em todos os sentidos pelos ares. E tanto na vigília como no sonho são as mesmas imagens cuja aparição vem lançar o terror em nossos espíritos. (LUCRÉCIO apud BOSI, 1988, p.67). Se anteriormente as correntes que optavam pelo “olhar ativo”, afirmavam que o conhecimento estava no âmbito do supra-sensível, e desta maneira o homem deveria desprender-se do mundo material para alcançá-lo, a teoria perceptiva vem de encontro ao resgate do mundo material e de certa forma acusa as teorias de Platão de renunciar a vida, em nome de um mundo demasiadamente metafísico. Na defesa do “olhar passivo”, Lucrécio afirma: Os olhos recebem passivamente. Com prazer ou estejam abertos, verdadeiras sarabandas de nuvens de átomos luminosos que se ofertam, vertiginosos, aos sentidos do homem. E o deslumbrante pode ter um nome: conhecimento. 1988, p.67) desprazer, contanto que figuras, formas, cores, em danças e volteios efeito desse encontro (LUCRÉCIO apud BOSI, Segundo esta teoria, a verdade nos é objetivamente ofertada pela natureza das coisas, se existem falsas interpretações elas são causadas pelo juízo e não pelos simulacros. “Os olhos não podem conhecer as leis da natureza; por isso, não queiras atribuir à vista o erro do espírito”.(LUCRÉCIO apud BOSI, 1988). Se o pensamento antigo caracterizou-se pela divisão rígida entre: corpo x alma; razão x sensação; olhar ativo x olhar passivo; racionalismo x empirismo; sujeito x objeto, na metade do século XIX surge uma mudança radical nesta forma de pensar o mundo, houve uma proposta inédita de união entre os conceitos até então dualistas e excludentes, à esta corrente filosófica deu-se o nome de Fenomenologia, sendo Edmund Husserl, Martin Heidegger, Jean-Paul Sartre e Maurice Merleau-Ponty seus principais representantes. Este último, no trecho de sua obra O visível e o invisível, numa 255 critica ao Racionalismo aponta: “Definir o espírito com o outro lado do corpo – não temos idéia de um espírito que não estivesse de par com um corpo, que não se estabelecesse sobre esse solo” (MERLEAU-PONTY, 1971, p.81) Lévi-Strauss, contemporâneo de Merleau-Ponty, em Mito e significado, faz critica ao fato da ciência ter virado as costas ao mundo dos sentidos: “real seria o mundo das propriedades matemáticas que só podem ser descobertas pelo intelecto e que estão em contradição total com o mundo dos sentidos” (LÉVISTRAUSS, 1989, p.18). Da mesma maneira que não podemos entender o processo da visão como órgãos do corpo humano trabalhando isoladamente, pois é antes de tudo uma rede de órgãos trabalhando conjuntamente em prol de um organismo complexo chamado homem, este está inserido por sua vez num “organismo” maior chamado sociedade, o homem – ser visual – é também um ser coletivo por natureza. Desse modo já não somos “sujeitos” abordando o mundo como um “objeto”, há um outro tipo de relação: tocamos o mundo na mesma medida em que somos tocados por ele, criando a “imagem coextensividades, simultaneidades, de um mundo feito de coexistências, parentescos, implicações mútuas, afinidades, imbricações...”(ENTLER, 2009) Marilena Chauí aponta ainda que: Nosso corpo, "sensível exemplar" porque sensível para si porque se sente ao sentir que sente. Corpo cognoscente e reflexivo, móvel, movido e movente, mas também se movente; tangível, tangido e tangente, mas também se tangente; ouvível, ouvido e ouvinte, mas também se ouvinte; visível e visto, mas também vidente que se vê a si mesmo vendo. Somos parte do mundo, contamos nele e para ele nosso parentesco carnal com ele que nos faz ver.. (CHAUÍ, 1988, p. 59). A Fenomenologia dá origem neste sentido à um “novo olhar”, que difere existencialmente do olhar físico-matemático de Galileu, Descartes e Newton criticado por Lévi-Strauss. Esse “novo olhar”, será educado à reconhecer as forças e estados internos, tanto do sujeito que se revela, quanto do outro com o qual se relaciona. A percepção deste outro, depende da leitura dos fenômenos expressivos dos quais olhar é o mais repleto de significações. (BOSI, 1988). 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A antropologia cultural, assim como a antropologia visual que dela é 256 proveniente, apodera-se do olhar Fenomenológico para reconhecer o outro não mais como objeto, mas como sujeito sensível. O olhar que procura o sujeito deve ser antes um olhar que procura entender o olhar desse sujeito. Somente assim o antropólogo poderá despir-se de seus preconceitos e etnocentrismos. Caso que exemplifica este processo, é a obra de Clifford Geertz: Negara – o estado Teatro no Século XIX, no qual o autor ao analisar a sociedade Balinesa do século XIX, profundamente “simbólica”be repleta de cerimônias ritualísticas, consegue entendê-la a partir do momento que começa ver aquela cultura com o olhar do sujeito nela inserido: A limitação da análise interpretativa na maior parte da antropologia contemporânea ao aspecto supostamente mais "simbólico" da cultura é mero preconceito, nascido da noção, também presenteada pelo século XIX, de que o "simbólico" se opõe ao "real"como o extravagante ao sóbrio, o figurativo ao literal, o obscuro ao simples, o estético ao prático, o místico ao mundano e o decorativo ao substancial. Para se analisarem as expressões do Estado-teatro. para aprendê-las como teoria, este preconceito tem de ser posto de lado, juntamente com o seu aliado que diz que a dramaturgia do poder é exterior ao seu funcionamento. O real é tão imaginado como o imaginário. (GEERTZ, 1991, p. 170). O que Geertz acusa, é a postura etnocentrista do olhar que vê na cultura alheia, a força das imagens ou do “simbólico” como algo irreal, repleto de inverdades e desconhecimento. Como em todos os aspectos de uma cultura, a análise das imagens nunca pode ser entendida como algo fechado, completo e único. Não existe, portanto, uma única verdade. Se diante de um mesmo fenômeno, os sujeitos o percebem de maneiras diversas, é porque se a visão é universal, o olhar deve ser entendido como cultural. Aceitar e compreender a diversidade de olhares é talvez a melhor maneira de compreender o mundo que vivemos. ABSTRACT Every man with vision is able to perceive images and interact with the world around them through them. This statement, at first, obviously, takes on another dimension when analyzing the issue more deeply. Required as a starting point, some questions that will determine the course of history: What do we mean by image? All men with vision to realize the same way? Taking advantage of some thinkers on the subject, this article aims to reflect these issues in order to better understand the complex relationship between man and image 257 Keywords: Image. Look. Visual Anthropology. Philosophy REFERÊNCIAS AUMONT, Jacques. A imagem. Campinas: Papirus, 1993. BORNHEIM, Gerd A. As metamorfoses do Olhar. In: NOVAES, Adauto. O olhar. São Paulo: Cia. das Letras, 1988. BOSI, Alfredo. Fenomenologia do Olhar. In: NOVAES, Adauto. O olhar. São Paulo: Cia. das Letras, 1988. CHAUÍ, Marilena. Janela da alma, espelho do mundo. In: NOVAES, Adauto. O olhar. São Paulo: Cia. das Letras, 1988. ENTLER, Ronaldo. Site da disciplina de Análise da Imagem 1. Faculdade de Comunicação – FAAP. Disponível em: <http://www.iconica.com.br/imagem/> Acesso em: 12 out. 2009. GEERTZ, Clifford. Negara: o Estado Teatro no Século XIX. Lisboa: Difel, 1991 LÉVI-STRAUSS, Claude. Mito e significado. Lisboa: Editorial Presença, 1989. LUCRÉCIO. De rerum natura. In: BOSI, Alfredo. Fenomenologia do Olhar. In: NOVAES, Adauto. O olhar. São Paulo: Cia. das Letras, 1988. MERLEAU-PONTY, Maurice. O visível e o invisível. São Paulo: Perspectiva, 1971. NOVAES, Adauto. Fenomenologia do Olhar. In: NOVAES, Adauto. O olhar. São Paulo: Cia. das Letras, 1988. NOVAES, Sylvia Caiuby. Imagem, magia e imaginação: desafios ao texto antropológico. Mana, Rio de Janeiro, v.14, n.2, 2008. OSTROWER, Fayga. A construção do olhar. In: NOVAES, Adauto. O olhar. São Paulo: Cia. das Letras, 1988. 258 PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica e Filosofia. Trad. de Octanny Silveira da Mota e Leônidas Hegenberg. São Paulo: Cultrix, 1972. PLATÃO. Alegoria da Caverna. In: JEANNIÈRE, Abel. Platão (versão comentada). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1995. 259 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE IDOSOS INSTITUCIONALIZADOS E NÃO INSTITUCIONALIZADOS SOBRE O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO: UM ESTUDO COMPARATIVO1 Natalia Roncada Rodrigues2 Marilene Cabello Di Flora3 RESUMO O envelhecimento é um processo comum aos indivíduos, que ocorre de maneira diferenciada e individual, pois questões sociais, pessoais, físicas, ambientais, familiares e financeiras estão interconectadas a ele. Assim, permanece o questionamento sobre a possibilidade de existirem diferentes formas de representar o envelhecimento e a relação entre condições sociais e representações dos idosos sobre a velhice. Este estudo objetivou identificar a relação entre condições sociais e representações sociais de idosos institucionalizados e de não institucionalizados sobre o envelhecimento e suas intercorrências. Os participantes são 10 idosos asilados e 10 de uma Universidade Aberta à Terceira Idade (UATI/USC) com 60 anos ou mais. Até o momento, foram entrevistados cinco asilados e cinco da UATI/USC, pois a pesquisa encontra-se em andamento. Utilizou- se a entrevista semi-estruturada, para coleta de dados, e a técnica de Análise de Conteúdo. Resultados parciais indicam que idosos institucionalizados têm como representação social de si seu histórico de vida, questões familiares e profissionais, condição atual de institucionalizado, cuidados de caráter curativo na saúde física e preocupação com a psicológica; os não institucionalizados apontam características pessoais e de personalidade, aspectos familiares, sociais e profissionais e cuidados preventivos de saúde. Para os institucionalizados o envelhecimento é natural e individual necessitando de cuidados, estágio final da vida, período de mudanças com perda de motivação e ausência de projetos e expectativas de futuro; os não institucionalizados representam-no como natural, incluindo permanecerem ativos, saudáveis e felizes e terem projetos e expectativas. O asilo é representado pelos institucionalizados como ambiente bom que proporciona condições mínimas necessárias; a UATI/USC, pelos não institucionalizados, ambiente de oportunidades, convívio social, aprendizagem, alegria e melhoria de vida. Quanto à relação com pessoas da instituição, os institucionalizados julgam o convívio social importante, mas vivem certo isolamento; os não institucionalizados apontam sua 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. Este estudo são os resultados parciais de pesquisa de Iniciação Científica do Programa de Pós-graduação em Pesquisa da Universidade Sagrado Coração (USC; Bauru/SP), financiado pelo PIBIC/CNPq/2009/2010. 2 Aluna do Curso de Psicologia da Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP. 3 Profª Drª. do Curso de Psicologia da Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP.*Drª em Comunicação e Poéticas Visuais pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), Campus de Bauru. 260 relação com pessoas da UATI/USC como importante e satisfatória. Palavras-chave: Representações Sociais. Idosos. Instituições asilares. UATI. 1 INTRODUÇÃO O envelhecimento humano representa um processo e uma etapa da vida que, embora maneira seja uniforme, comum a todos os indivíduos, não ocorre de mas diferenciada e individual (DUARTE; SANTOS, 2004; FREIRE, 2000). Isso é decorrente de variáveis mentais, comportamentais e sociais da vida do indivíduo e de como este a organizou, das circunstâncias históricas e culturais em que vive ou já viveu, da ocorrência de doenças durante o processo do envelhecimento e da interação entre fatores genéticos e ambientais (FREIRE, 2000). A velhice pode ainda ser entendida como uma fase do desenvolvimento humano muito importante e que merece atenção e dedicação de estudiosos do assunto, da família, da sociedade e principalmente do Estado por meio de planejamento e operacionalização de políticas públicas, tornando-se, uma temática recente no âmbito da Psicologia e Psicologia Social (ARAÚJO, COUTINHO; SANTOS, 2006). Segundo Freire (2000), envelhecer de forma bem sucedida pode ser visto a partir de diversos aspectos: boa qualidade de vida, boa nutrição, cuidados básicos com a saúde, direitos e deveres do cidadão idoso, atividades físicas, saúde mental e participação social. É visto também como uma competência adaptativa, uma capacidade generalizada para responder com flexibilidade aos desafios resultantes do corpo, da mente e do ambiente. Esta capacidade adaptativa é considerada multidimensional, já que envolve aspectos emocional (estratégias e habilidades em lidar com fatores estressores), cognitivo (capacidade de resolver problemas) e comportamental (desempenho e competência social). Tomasini e Alves (2007) defendem a idéia de que o envelhecimento bem sucedido pode ser compreendido através do paradigma do modelo de otimização seletiva com compensação. Baltes e Cartensen (2000 apud TOMASINI; ALVES, 2007) trazem que este modelo especifica três processos que atuam como facilitadores no controle das perdas ocorridas na velhice: seleção, ativa ou 261 passiva, interna ou externa, intencional ou automática e que pode implicar em evitar um domínio ou significar uma restrição em tarefas e objetivos; otimização, que se refere ao enriquecimento ou aumento dos recursos e alcance do funcionamento em domínios da vida; compensação, que é operativa quando existem mudanças associadas à pessoa ou ambiente, e que pode envolver comportamentos existentes, aquisição de novas habilidades ou construções de novos significados. A solidão é algo que ocorre, também, com certa frequência nesse período da vida e uma das maneiras de evitá-la é manter-se socialmente ativo. Ribeiro et al. (2006) afirmam que a participação social do idoso envolve movimento físico e mental, como caminhadas e ginásticas, e proporciona prevenção e promoção da saúde. Para Duarte e Santos (2004), a convivência entre os idosos permite uma troca viva de experiências e facilita a compreensão empática entre eles. Conforme afirmam Veras e Caldas (2004), os idosos se apresentam potencialmente sob risco, não apenas porque envelheceram, mas em virtude do próprio processo do envelhecer que os torna vulneráveis à incapacidade decorrente de condições adversas do meio físico, social ou de questões afetivas. A boa interconectada qualidade de vida do idoso está, então, intimamente a questões de bons relacionamentos interpessoais e sociais, proporcionando a este um bom convívio social. Dessa forma, a família caracterizase como um fator de apoio ao idoso, ou seja, auxilia-o no processo do envelhecimento e proporciona-lhe cuidados e boa saúde. Assim, para Ribeiro et al., [...] alguns fatores para a adequação de uma boa qualidade de vida e bem -estar do idoso estão relacionados com a moradia e a família. É no seio da família que podemos participar de um ambiente onde há possibilidade de identificação, pela construção de nossa individualidade em companheirismo, respeito e dignidade (RIBEIRO et al., 2006, p. 9) A família representa um aspecto significativo à pessoa idosa quando proporciona um suporte adequado, o qual pode ser evidenciado quando a família oferece cuidados afetivos, quando contribui para a promoção do bem estar e auxilia no monitoramento da saúde. O abandono, geralmente, é vivenciado quando o idoso sente falta dos filhos e perde sua função social mais reconhecida, o cuidar do outro (DUARTE; SANTOS, 2004). 262 No fim da década de 1980, o movimento de valorização do idoso se intensificou em decorrência de análises demográficas sobre o envelhecimento populacional (VERAS; CALDAS, 2004). O idoso perdeu seu valor social devido ao avanço do capitalismo, o qual o transformou em algo descartável, dentro de um sistema que singulariza a capacidade produtiva em detrimento de outras dimensões do homem (BEAUVOIR, 1970; HADDAD,1986; BOSI, 1987 apud VERAS; CALDAS, 2004). No entanto, Duarte e Santos (2004) afirmam que, no Brasil, atualmente, o quadro demográfico e as condições do envelhecer são marcados pelo processo de reconfiguração da pirâmide demográfica e aumento da população idosa, resultados de conquistas tecnológicas e científicas na área da saúde, que prolonga a vida e proporciona melhores condições de saúde. O aumento da expectativa de vida está fazendo com que as relações familiares encontrem relacionamentos desafios antes desconhecidos no âmbito dos (DUARTE; SANTOS, 2004). Este aumento da expectativa de vida está fazendo com que surja um novo fenômeno na atualidade, a crise do modelo social de família nuclear. Este fenômeno consiste em uma nova configuração de família, ou seja, em um mesmo lar convivem apenas pais e filhos, o que levou a um afastamento do idoso. Em decorrência disso, o número de idosos em instituições asilares vem aumentando (RIBEIRO et al., 2006). O termo “asilo”, para Bartholo (2003 apud RIBEIRO et al., 2006), é tradicionalmente usado no sentido de abrigo e recolhimento, geralmente mantido pelo poder público ou grupos religiosos. Assim, as Instituições de Longa Permanência (ILP’s), para Araújo, Coutinho e Santos (2006), desempenham um papel importante na sociedade, já que oferecem aos idosos que não possuem familiares um espaço de construção de novas relações e trocas afetivas. No entanto, Ribeiro et al. (2006) afirmam que os asilos públicos, em sua maioria, não garantem o bem-estar e uma boa qualidade de vida aos idosos. Em asilos privados, onde o custo é muito elevado (variando entre R$ 1500,00 a R$ 2000,00 por mês), também há déficits, pois os idosos são individualizados. Freire e Tavares (2005) afirmam que é importante para os profissionais da área da saúde que lidam com a população idosa, estarem atentos às respostas desta população, as quais ressaltam que envelhecer numa Casa Lar nem sempre é sinônimo de perda, mas uma etapa de vida em que é possível desfrutar com alegria e bem estar. No entanto afirmam que o idoso que vive asilado muitas vezes é 263 privado de suas relações sociais, podendo associar- se a essa exclusão social marcas ou sequelas de doenças crônicas não transmissíveis, o que hoje são os principais motivos de internação do idoso, inclusive nas ILP’s. A partir desse ponto é que os Grupos de Convivência (GC’s) e as Universidades da Terceira Idade (UTI’s) se fazem importantes no processo do envelhecer, pois são ambientes que, se bem estruturados, proporcionam relações sociais e interpessoais e trocas de experiências fazendo com que o idoso se sinta estimado. Idosos que vivem em ILP’s vivenciam o processo de envelhecimento em uma espécie de confinamento sócio-afetivo devido às caracterizações da institucionalização da velhice. Já os idosos que se integram em GC’s, participam de atividades que envolvem aspectos sócio-afetivos, valorização do exercício da cidadania e elucidação voltados à promoção da saúde (ARAÚJO; COUTINHO; SANTOS, 2006). As pessoas idosas desejam e podem permanecer ativas e independentes se lhes for dado o apoio de que necessitam. Durante esse processo são capazes de aprender e a universidade se apresenta como um suporte de auxílio para que elas aprendam a lidar com ganhos e perdas que vivem nesta fase (VERAS; CALDAS, 2004; JUNQUEIRA, 1998). Segundo Veras e Camargo (1995 apud VERAS; CALDAS, 2004), dentre as instituições públicas que assistem aos idosos, a universidade é a mais bem equipada e capacitada, respondendo assim, às atuais necessidades dos idosos, já que proporciona a estes assistência, atividades culturais e de lazer, constituindo-se em um campo de pesquisa em várias áreas do conhecimento. Além disso, as universidades colaboram para a formação de profissionais de alta qualificação e alavanca a produção de conhecimento sobre o envelhecimento. Para Junqueira (1998), as UTI’s surgem como um meio de auxiliar o aluno idoso na descoberta de seus potenciais e na (re)elaboração do seu projeto de vida. A partir das idéias citadas acima, permanecem questões como: “existem formas diferenciadas de representar o processo de envelhecimento?”; “as condições sociais de vida dos idosos determinam a representação destes sobre a velhice?” Araújo, Coutinho e Santos (2006) afirmam, a partir de uma pesquisa realizada, que idosos institucionalizados objetivam suas representações sociais 264 da velhice. Para Sá (1995), Representação social envolve um conceito trabalhado na área Psicologia Social, tendo como principal representante o psicólogo social francês Serge Moscovici. Tal teoria não se restringe apenas em simples opiniões sobre assuntos e atitudes isoladas em relação aos objetos sociais nele envolvidos, sendo, então, pensamentos que se constituem em um ambiente onde se desenvolve a vida cotidiana, tratando de uma compreensão alcançada por indivíduos que pensam de forma semelhante, que demonstram não ter pensado sozinhos, mas juntos sobre um mesmo assunto. Assim, para Araújo, Coutinho e Santos (2006), os próprios idosos buscam dar um significado a si e ao processo do desenvolvimento humano pelo qual estão passando. Neste estudo, ficou evidente que as representações sociais da velhice referem-se ao binômio velhice-doença, atribuindo-se então à velhice características negativas. Já em um estudo feito por Freire e Tavares (2005), também com uma população de idosos institucionalizados, ficou evidente que, embora estes apresentem uma história de vida cercada por limitações e sofrimentos, voltam sua satisfação à superação das dificuldades e obstáculos impostos mais do que a ausência destes. Permanece a ideia de que a sociedade, na qual vivemos e que apresenta diversos paradigmas sobre a maneira de cuidar do idoso e sobre sua boa qualidade de vida, não está preparada para acolher indivíduos que envelheceram, já que há uma intensa precariedade no que se refere à assistência voltada para essas pessoas. Nesse sentido, é possível dizer que a própria família nem sempre se encontra preparada e estruturada para cuidar de seus idosos. Dessa forma, se nem mesmo a sociedade está preparando seus filhos para o cuidado com os velhos que um dia virão a ser, seria necessário então que a qualidade do cuidado prestado por instituições, asilos e UTI’s, se tornasse capaz de oferecer essa assistência da melhor maneira possível (DUARTE; SANTOS, 2004), levando em consideração, também, a maneira como esses idosos pensam e objetivam sua própria velhice, ou seja, as representações sociais que possuem sobre seu próprio processo de envelhecer. O envelhecimento humano envolve diversos aspectos importantes e que não podem ser deixados de lado quando se busca estudar o idoso, como, boa qualidade de vida, boas condições de saúde física e mental, o contexto em que o idoso está inserido, fatores socioeconômicos que o norteiam, suas habilidades e limitações que são características da idade, relações sociais e interpessoais que 265 o mantém na sociedade, dentre outros. Nesse sentido, muitas pesquisas que atualmente vêm sendo desenvolvidas no campo da gerontologia direcionam-se a questionamentos de como o idoso vive esse período de sua vida e se é possível vivê-lo com qualidade. No entanto, ainda apresenta-se restrito o conhecimento acerca das representações sociais dos idosos sobre o próprio processo do envelhecimento, principalmente no que diz respeito a estudos comparativos que envolvam tanto a população de idosos institucionalizados quanto a de idosos não institucionalizados. Além disso, evidencia-se que há possibilidade de haver fatores dicotômicos em relação a como os idosos que se apresentam engajados na sociedade e idosos institucionalizados, que de certa forma encontram-se ‘abandonados’ em asilos, lidam e representam essa etapa da vida pela qual estão passando e se comportam diante dela, sendo isso passível, então, de maiores investigações sobre a relação entre as condições de vida e as representações sociais. 2 OBJETIVOS 2.1 OBJETIVO GERAL Identificar a relação entre as condições sociais e as representações sociais de idosos institucionalizados e de idosos não-institucionalizados sobre o envelhecimento e suas intercorrências. 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Caracterizar as representações sociais de idosos institucionalizados e idosos não- institucionalizados sobre si e sobre o seu processo de envelhecimento. Apontar as representações sociais de idosos sobre a instituição na qual vivem (asilo) ou frequentam (UATI/USC). Identificar a relação do idoso com outras pessoas da instituição onde vive (asilo) ou que frequenta (UATI/USC). 3 METODOLOGIA 266 A pesquisa como um todo envolverá 10 idosos acima de 60 anos, que vivem em uma Instituição de Longa Permanência/Asilo São Vicente de Paula do município de Ibitinga/SP, e 10 idosos, também acima de 60 anos, que frequentam a UATI/USC no município de Bauru/SP. No entanto, até o presente momento o número de participantes da pesquisa se restringe a cinco idosos da Instituição de Longa Permanência/Asilo São Vicente de Paula e cinco idosos da UATI/USC, sendo que a coleta de dados com a outra parcela dos idosos ainda está sendo realizada. Essa parcela da amostra total da pesquisa forneceu dados de análise importantes, que já indicam o perfil da população pesquisada. A técnica utilizada para coletar os dados foi a da entrevista, a qual, segundo Richardson uma (2008), é um modo de comunicação que transmite determinada informação entre o emissor e o receptor, permitindo que uma estreita relação se desenvolva entre eles. Para esse autor, a entrevista é tida como um elemento fundamental na pesquisa em ciências sociais. Dessa forma, foi utilizada a entrevista semi-estruturada, consistindo em questões abertas para que os participantes pudessem responder aos questionamentos de maneira livre. As entrevistas foram gravadas com a permissão dos participantes para que o acesso ao conteúdo relatado fosse de maior fidedignidade. Após autorização de diretores e coordenadores das instituições, foi realizada a seleção dos idosos entrevistados em ambas as instituições. Tal seleção ocorreu a partir de uma solicitação da pesquisadora aos diretores das duas instituições para que estes selecionassem pessoal apto para participar da pesquisa. Em seguida, foi feito contato com os idosos, a fim de apresentar a proposta do trabalho, solicitando assim a sua participação. Para a discussão dos dados, foi selecionada a Teoria das Representações Sociais como referencial teórico, sendo necessário, portanto, uma técnica de análise de dados que fosse compatível ao delineamento escolhido, ou seja, a técnica da Análise de Conteúdo, a qual, segundo Bardin (1977, p. 38) consiste em um “conjunto de técnicas de análise das comunicações, procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição que utiliza do conteúdo das mensagens.” Para Richardson (2008), existem diversas técnicas de análise de conteúdo e entre elas, a análise por categoria, que se baseia na decodificação de um texto em diversos elementos, que são classificados formando grupos analógicos. Na presente pesquisa, foi utilizada a análise temática. Após a 267 realização da coleta parcial dos dados, o material foi transcrito e analisado de maneira qualitativa a partir do uso da técnica da Análise de Conteúdo já apresentada anteriormente. 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES Na construção das representações sociais de si mesmo, a maior parte dos idosos institucionalizados aponta questões familiares e profissionais e como condição atual, a institucionalização. Aponta também seu histórico de vida e questões de saúde. Uma entrevistada indicou ainda a perspectiva de estar no fim da vida; e outro se referiu à religiosidade e espiritualidade com focos na saúde, apontando ainda algumas características pessoais e de personalidade. Dos idosos institucionalizados entrevistados, três apresentaram certa dificuldade em levantar a representação social de si mesmo, o que pode indicar uma limitação na sua percepção quanto ao seu próprio histórico de vida, características, qualidades e defeitos pessoais. Quanto aos idosos não institucionalizados e que frequentam a UATI/USC, observou-se a descrição de características pessoais e de personalidade pela maior parte deles, assim como a descrição de aspectos familiares. Ainda sobre as representações sociais de si, ambos os grupos demonstraram ser formados por pessoas preocupadas com a saúde. O grupo dos institucionalizados indicou como cuidados com a saúde física, medicação diária e rigorosa e cuidados médicos quando necessário, sendo que apenas um entrevistado relatou dispensar poucos cuidados. Somente uma entrevistada se referiu a cuidados com a alimentação. Dessa forma, a maior parte dos idosos institucionalizados dispensa cuidados de caráter curativo com sua saúde física, somando ainda somente a essa última entrevistada cuidados de caráter preventivo. Em relação à saúde psicológica, a maioria dispensa cuidados, no entanto, isso se restringe a falas de se preocupar com a saúde psicológica, estar lúcido e ter boa memória. Por outro lado, os idosos não institucionalizados apresentaram preocupação e cuidados tanto preventivos quanto curativos em relação à saúde. Os cuidados preventivos foram abordados por todos os idosos, sendo que os mesmos citaram acompanhamento médico periódico e de prevenção, cuidados com 268 a alimentação e prática de atividade física. Já os curativos foram indicados por apenas dois idosos como uso contínuo e correto de medicação. Isso indica que os não institucionalizados estão mais atentos aos cuidados preventivos do que curativos, o que difere da representação dos idosos institucionalizados sobre a saúde. Em relação à saúde psicológica, os não institucionalizados apresentam cuidados de caráter preventivo e curativo, assim como na saúde física. Os cuidados apontados indicam busca pessoal e manutenção de um equilíbrio emocional, exercício de atividades manuais, passeios, leitura, música, conviver com outras pessoas, ter um bom relacionamento interpessoal e frequentar a UATI/USC. Uma pessoa citou fazer tratamento homeopático, referenciando-o como principal cuidado dispensado à manutenção da sua saúde psicológica. Apenas uma entrevistada apontou ter poucos cuidados com a sua saúde psicológica, justificando pouco controle emocional, mas um desejo de mudanças pessoais. Quanto à representação social sobre seu processo de envelhecimento, a maioria dos institucionalizados se referiu a este, de um modo geral, como um processo natural da vida, período que dispensa cuidados, principalmente de saúde, e momento de mudanças na vida do ser humano. Dois entrevistados citaram a importância da religiosidade e espiritualidade nesse momento da vida. Foi observada também a referência ao envelhecimento como um processo individual, como o estágio final da vida e como um período em que há perda de motivação para viver e executar atividades. O envelhecimento é visto por um idoso como positivo e bom. Entretanto, outro afirmou que o envelhecimento pode ser visto como algo negativo, além de demonstrar uma preferência pelo não envelhecer. Foi apontado também a desvalorização do idoso pela família e o medo da morte. As representações dos não institucionalizados quanto ao seu processo de envelhecimento se constituem, no geral, em torno da ideia de ser um processo natural, no qual há oportunidades de permanecer ativo e possibilidades de envelhecer de forma saudável e feliz. Foi apontada a questão da longevidade, sendo o envelhecimento um período da vida que, atualmente, vem recebendo importante valorização social. No entanto, um entrevistado apontou que as diversas oportunidades oferecidas atualmente ao idoso se restringem a pequena parcela da população, devido à questão da classe social. Sobre o envelhecimento, de um modo geral, foi observado que este é um fenômeno que causa medo, um processo difícil da vida do sujeito, mas que, ao mesmo tempo, 269 pode ser bom, e um período em que é necessária a garantia dos direitos do idoso. Nesse sentido, foi abordado também que o idoso, muitas vezes, é tido como “um peso” para a família e que o envelhecimento saúde, envolve questões de debilidade física, limitações pessoais e culturais e a importância da presença da religiosidade e espiritualidade. Nesse sentido é que Freire (2000) aponta que para que o idoso envelheça de maneira bem sucedida é necessário que aproveite suas reservas do desenvolvimento, as quais podem ser ativadas através da aprendizagem, exercícios e treinamento. Isso pode ser feito através da capacidade de compensar declínios decorrentes do processo pelo qual está passando, como por exemplo, as perdas de memória que podem ser compensadas pelo uso de técnicas de memorização. Em relação subcategoria da aos projetos e representação do expectativas de futuro, uma envelhecimento, grande parte dos institucionalizados afirma quase não ter mais projetos e nem expectativas de futuro e que esperam somente a morte e que esta aconteça de forma tranquila, o que se relaciona à ideia de finalidade da vida apresentada acima. Entretanto, aponta como expectativas sair do asilo e ter sua própria casa. Dois idosos afirmaram não ter mais projetos de futuro, mas um deles tem como expectativa saúde, coragem e poder continuar vivendo, e o outro, poder expor um dia seu artesanato. Para Freire e Tavares (2005), o idoso institucionalizado constitui, quase sempre, um grupo privado de seus projetos, já que se encontra afastado da família, da própria casa, dos seus amigos e das relações nas quais sua história de vida foi construída. Os idosos não institucionalizados compreendem o envelhecimento como um período em que há possibilidade de desenvolver projetos e ter expectativas de futuro. Por projeto foi apontado continuar frequentando a UATI/USC, viajar, passear, divertir-se e participar de atividades. Uma entrevistada abordou o desejo de continuar trabalhando e o desejo de tornar-se membro integrante da Pastoral do Idoso. Outro entrevistado revelou o desejo de continuar escrevendo livros, publicar seus três livros já escritos, estudar filosofia e aprofundar-se espiritualmente. Sobre as expectativas de futuro, abordaram representações bastante diversas, como melhoria de vida, continuar aprendendo e vivendo, ter uma morte tranquila, não preocupar a família com questões de saúde, receber acolhimento e cuidados por parte dos filhos. Uma entrevistada focou suas expectativas na valorização do 270 idoso e esperar maior valorização deste nas escolas e nas universidades e o surgimento de novas oportunidades ao idoso e que estas abranjam uma parcela maior da população. Quanto aos sentimentos de felicidade e tristeza, outra subcategoria da representação do envelhecimento, observou-se que ambos apareceram nas falas dos idosos asilados ao se referirem aos familiares, indicando como felicidade as visitas da família e o amor das filhas. Assim, como tristeza, foi indicada a ausência e o desprezo dos filhos. Foram observados ainda quanto à felicidade: convívio social e amizades dentro do asilo, ter onde morar, ter saúde, viver e receber algum dinheiro do filho. No entanto, um idoso apontou ausência felicidade, tendo somente alegria em ver outras pessoas felizes. de Ainda referente à tristeza, foi observado: morte, não poder realizar algo que deseja, isolamento social, isolamento frente aos outros idosos asilados, desentendimentos entre os asilados, não poder frequentar sua religião fora do asilo e nem ter posse da sua aposentadoria. A solidão é algo evidente nas suas falas dos idosos institucionalizados. Para Capitanini (2000), a solidão na velhice é vista como um estado emocional que envolve isolamento, tristeza, apatia, insatisfação. Tudo isso é provocado pela ausência de contatos e relacionamentos importantes, agradáveis e significativos, ou seja, o que causa tal estado emocional não é o fato de o idoso estar sozinho fisicamente, mas o de estar privado de um ou vários relacionamentos que gostaria de ter. Os não institucionalizados também foram questionados sobre felicidade e tristeza e de que forma esses sentimentos se fazem presentes nas suas vidas. Ao falarem de felicidade, levantaram: questões familiares, convívio social, ser ativo, ser solidário e ver solidariedade nos outros, frequentar a UATI/USC, possibilidade de aprendizagem, respeito e amor pelo ser humano, surgimento de movimentos e instituições que visam ajudar o outro e o trabalho de algumas escolas quanto à educação ambiental. Sobre a tristeza: doença, desemprego, miséria material e espiritual, pouca atividade religiosa, morte, desvalorização e exploração do ser humano, atitudes de políticos desonestos, imediatismo das pessoas, violência, vandalismo, falta de educação das pessoas e desrespeito à natureza. Falando ainda das representações sobre o envelhecimento, coube 271 questionar aos idosos institucionalizados sobre os programas/grupos de convívio social para idosos, e aos idosos não institucionalizados sobre as instituições asilares. Sobre os programas/grupos de convívio social, todos os asilados apontaram nunca ter frequentado. Três idosos disseram já ter ouvido sobre tais programas/grupos e acreditam que são importantes, pois é um espaço que proporciona diversão, atividades e passeios aos idosos que os frequentam. Um idoso relatou que, apesar de nunca ter frequentado, tem vontade de conhecer. Dois idosos disseram ter contato com o grupo da terceira idade da cidade, o qual vai, algumas vezes ao ano, até o asilo promover festas e bailes. Em relação às instituições asilares, todos os idosos não institucionalizados apontaram estas instituições como importantes e necessárias para a nossa sociedade, sendo ainda que a maioria dos entrevistados acredita que tais instituições têm como papel fundamental acolher o indivíduo idoso que, muitas vezes, é desprezado pela família. Alguns entrevistados indicaram que os asilos são necessários no sentido de acolher o idoso que não pode ser cuidado pela família devido à falta de recursos financeiros e psicológicos da família e do próprio idoso. Em outros relatos, foi observado que o asilo tem como compromisso cuidar da saúde e proporcionar lazer e condições mínimas ao idoso que ali vive, sendo que, nesse sentido, foram apontadas também a existência de instituições boas e ruins e a falta de calor humano ao asilado. Foi observada ainda a ideia de comodidade, de abandono e de descaso por parte de algumas famílias e a negligência do governo quanto ao repasse de verbas às instituições. Os idosos foram questionados sobre sua relação com a instituição na qual vive ou frequenta, buscando-se identificar a representação que eles têm a cerca de tais instituições. Todos os idosos institucionalizados apontaram para um alto nível de satisfação em relação à instituição na qual vivem, ou seja, o asilo. Alguns entrevistados afirmaram gostar de morar no asilo, sendo que uma, em especial, apontou isso justificando não ter onde morar, e outro declarou ser melhor morar no asilo do que morar na rua. Quanto ao que a instituição proporciona aos idosos foram citados medicamentos, alimentação, vestimentas e uma rotina diária que se restringe a atividades básicas, sendo apontada também a falta de atividades de lazer. Três entrevistados disseram ter incluso na sua rotina diária um bom convívio social com os outros idosos que vivem no asilo, o que indica que o asilo pode ser um espaço que proporciona uma interação social positiva aos idosos; 272 no entanto, para alguns há isolamento social. A percepção dos idosos quanto à assistência recebida por parte dos funcionários e voluntários é satisfatória. Os idosos que frequentam a UATI/USC apontaram de forma unânime alto nível de satisfação. O cotidiano nesta instituição foi avaliado pelos adjetivos: maravilhoso, agradável, prazeroso, ótimo, uma delícia e bom. A UATI/USC é representada como um ambiente que proporciona diversas oportunidades ao idoso: aprendizagem, felicidade e melhoria de vida na saúde física e na função cognitiva de memória. A UATI/USC é vista também como um espaço de interação e convívio social com outros idosos e com os estagiários/professores, indicando existir trocas de experiências entre gerações. Para alguns entrevistados, o nível de abrangência da instituição ainda é baixo, pois as atividades se restringem à pequena parcela da população idosa, sendo a instituição pouco divulgada. Falando a respeito da representação social da instituição, coube investigar a relação do idoso com as outras pessoas com as quais convivem no seu diaa-dia. Os idosos institucionalizados apresentaram unanimidade quanto à importância do convívio social no período do envelhecimento, e os não institucionalizados além de importante julgam-no como fundamental. Somente um sujeito da UATI/USC indicou que, apesar do convívio ser importante à pessoa idosa, em alguns casos, torna-se limitado devido ao desenvolvimento urbano, uso excessivo do aparelho de televisão e isolamento natural do idoso. Assim, segundo Capitanini (2000), os relacionamentos sociais são fatores importantes para o bem estar físico e mental na velhice, tendo então os amigos, os parentes e os vizinhos uma importante participação na prevenção da solidão e do isolamento. De um modo geral, o nível de relacionamento interpessoal dos idosos institucionalizados é visto como satisfatório tanto com os outros asilados quanto com as pessoas que trabalham no asilo e os voluntários. A maioria apontou uma relação satisfatória com outros asilados, sendo que duas relataram isolamento. Dessa forma, pôde ser observado que, com os jovens, os idosos institucionalizados mantêm um bom relacionamento, principalmente com visitantes, e somente uma idosa apontou ter ainda um relacionamento satisfatório com familiares jovens. O nível de relacionamento dos idosos com a coordenação da UATI/USC e com os professores/estagiários foi abordado, de forma unânime, como 273 satisfatório, assim como também o relacionamento com outros idosos que frequentam a instituição, e com pessoas jovens. Entretanto, apenas uma entrevistada apresentou certa dificuldade em se relacionar com outros idosos e uma outra entrevistada apontou tal dificuldade com relação aos jovens. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados parciais da pesquisa puderam indicar que a representação social de idosos questões institucionalizados sobre si envolve seu histórico de vida, familiares e profissionais e sua atual condição de vida, a institucionalização. Grande parte dos idosos não institucionalizados apresenta cuidados de caráter curativo dispensados à saúde física e somente uma preocupação com a saúde psicológica, sem dispensar a esta muitos cuidados. Já os idosos não institucionalizados representam a si mesmos a partir de características pessoais e de personalidade, aspectos familiares, sociais e profissionais e têm cuidados tanto com a saúde física quanto psicológica. Nesse sentido, a representação social sobre si difere em alguns pontos nos dois grupos de idosos no que se refere à percepção que têm de si próprios e aos cuidados com a saúde. O envelhecimento é representado pelos idosos asilados como um processo natural e individual, mas que necessita de cuidados, principalmente de saúde. É visto também como o estágio final da vida e como um período de mudanças em que há perda de motivação e ausência de projetos e expectativas de futuro. Os idosos que frequentam a UATI/USC veem o envelhecimento também como natural, incluindo a possibilidade de permanecerem ativos, envelhecerem saudavelmente e felizes e terem projetos e expectativas de futuro. A instituição onde os idosos vivem é representada por eles como um ambiente bom e que proporciona condições mínimas necessárias, mas que a rotina diária se restringe a atividades básicas (alimentação e higiene pessoal), o que demonstra precariedade quanto a atividades de lazer. Já a UATI/USC é vista como um ambiente que proporciona oportunidades: convívio social, aprendizagem, alegria e melhoria de vida e na saúde. A representação da relação com outras pessoas da instituição indica que os idosos institucionalizados julgam importante o convívio social no envelhecimento, 274 mas que no cotidiano vivem o isolamento. Contrário a isso, o não institucionalizado aponta, além da importância do convívio social, uma relação satisfatória com pessoas da UATI/USC. Enfim, os dados parciais semelhanças, mas também social do idoso sobre deste algumas estudo discrepâncias indicam quanto que à há algumas representação o envelhecimento e os fatores que nele estão interconectados. Isso pode ocorrer devido às diferentes condições sociais de vida dos idosos, a proximidade ou distância da família e características psicológicas particulares de cada idoso. REFERÊNCIAS ARAÚJO, L. F. de; COUTINHO, M. da P. de L.; SANTOS, M. de F. de S. O idoso nas instituições gerontológicas: um estudo na perspectiva das representações sociais. Psicol. Soc., Porto Alegre, v. 18, n. 2, p. 89-98, 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-7182200600020001 &lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 2 mar. 2008. BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Rio de Janeiro: Edições 70, 1977. CAPITANINI, M. E. S. Solidão na Velhice: realidade ou mito? In: NERI, A. L.; FREIRE, S. A. (Org.). E por falar em velhice. 3. ed. Campinas: Papirus, 2000. p. 2131. DUARTE, C. V.; SANTOS, M. A. dos. “E Agora... de Quem Cuidarei?”: o Cuidar na Percepção de Idosas Institucionalizadas e não Institucionalizadas. Psicologia: ciência e profissão/Conselho Federal de Psicologia, Brasília, v. 24, n.1, p. 2-13. 2004. FREIRE, S. A. Envelhecimento bem-sucedido e bem-estar psicológico. In: NERI, A. L.; FREIRE, S. A. (Org.). E por falar em velhice. 3. ed. Campinas: Papirus, 2000. p. 21-31. FREIRE JUNIOR, R. C.; TAVARES, M. de F. L. A saúde sob o olhar do idoso institucionalizado: conhecendo e valorizando sua opinião. Interface, Botucatu, v. 9, n. 16, p. 147-58, 2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext& pid=S1414-32832005000100012&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 2 mar. 2008. 275 JUNQUEIRA, E. D. S. Velho. E, por que não? 6. ed. Bauru: EDUSC, 1998. p. 3985. RIBEIRO et al. Idosos e Família: asilo ou casa. O portal dos psicólogos, 2006, p. 113. Disponível em: < http://www.psicologia.com.pt/artigos/textos/A0281.pdf>. Acesso em: 7 maio 2008. RICHARDSON, R. J. Pesquisa Social: métodos e técnicas. 3. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2008. SÁ, P. C. Representações Sociais: o conceito e o estado atual da teoria. In: SPINK, M. J. P. (Org.). O conhecimento no cotidiano: as representações sociais na perspectiva da psicologia social. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1995. p. 19-43. TOMASINI, S. L. V.; ALVES, S. Envelhecimento bem-sucedido e o ambiente das instituições de longa permanência. RBCEH, Passo Fundo, v. 4, n. 1, p. 88- 102, jan./jun. 2007. Disponível em: <www.upf.br/seer/index.php/rbceh/article/viewPDFInterStitial/119/94 >. Acesso em: 02 mar 2008. VERAS, R.P.; CALDAS, C.P. Promovendo a saúde e a cidadania do idoso: o movimento das universidades da terceira idade. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v.9, n. 2, p. 423-432, abr./jun. 2004. 276 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura APLICABILIDADE DOS MAPAS CONCEITUAIS NO ENSINO FUNDAMENTAL1. Neichelli Fabricio Langona2, Vera Lúcia Messias Fialho Capellini3 RESUMO O presente trabalho tem como principal objetivo avaliar a concepção dos professores da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental sobre a utilização dos mapas conceituais como forma de organizar, avaliar e facilitar a aprendizagem dos alunos, bem como verificar quantos os utilizam em sua prática de ensino.Essa ferramenta, elaborada e difundida por Joseph Novak na década de 70 é de fundamental importância para a organização de elementos necessários à aprendizagem, pois possibilita ao aluno articular idéias e associar novas informações a conhecimentos estudados anteriormente permitindo ao professor utiliza-lo também como um importante instrumento na avaliação da aprendizagem Para a realização do estudo, será feita uma pesquisa de campo com aplicação de questionário nos professores das escolas municipais do município de Bauru com perguntas fechadas de múltiplas escolha para levantar informações acerca do conhecimento dos professores sobre o assunto. Caso ocorra algum questionário com reposta positiva sobre a utilização deste recurso, utilizar-se-á uma entrevista, e caso seja permitido será realizado o acompanhamento de um bimestre para observar, descrever e avaliar a metodologia adotada na realização do trabalho pelo professor. Para embasar a pesquisa serão consultados autores como David Ausubel, propulsor da teoria da aprendizagem significativa, Joseph Novak já mencionado anteriormente como difusor dos benefícios e estudos acerca dos mapas conceituais e estudiosos da área como Moreira (2006), Penã (2006), Faria (1995) entre outros, além de teses, dissertações e artigos que já foram publicados sobre este tema. Este estudo se divide em três etapas. A primeira fase vem se desenvolvendo com o levantamento do referencial teórico, a partir da escolha do tema central: Contribuições Didáticas dos Mapas Conceituais para Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental. A 2ª etapa consistirá na aplicação do questionário e a 3ª etapa acontecerá mediante a tabulação dos dados da etapa anterior, a partir da qual se concluirá se existe neste município algum professor faz uso dos mapas conceituais em suas aulas. Com essas informações o trabalho poderá tomar outra proporção tornando-se um estudo de caso para aprofundar a pesquisa levando em conta a observação das aulas ministradas com o objetivo de avaliar a aplicabilidade dos mapas conceituais nos anos iniciais do ensino fundamental. Palavras-chave: 1 Contribuições didáticas. Professores. Mapas Conceituais. Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluna do curso de Pedagogia Na UNESP de Bauru. 3 Doutora em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos, Brasil (2004). Professora do Departamento de Educação e do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Aprendizagem da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. 277 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura NOVAS ESTRATÉGIAS DE COMUNICAÇÃO DA IGREJA CATÓLICA NA TENTATIVA DO DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO E DEFESA DA VIDA: A PROPOSTA DA REVISTA DIOCESANA1 Paulo Vitor Giraldi Pires2 RESUMO A comunicação religiosa tem sido importante para a Igreja prosseguir com seu objetivo de levar a palavra de Cristo aos seus fiéis. Um dos grandes desafios que a Igreja Católica Apostólica Romana possui com o Povo de Deus e Comunidade de homens e mulheres, cuja vida e missão é proclamar o evangelho, é a sua prática comunicacional. Como Instituição milenar e instância produtora de sentidos num universo simbólico cada vez mais competitivo e num mundo cada vez mais pluralista e secularizado, provocado pela dificuldade moderna em dar sentido à vida, a Instituição necessita de uma comunicação mais eficiente, mais presente, que nasça no interior da comunidade e que contribua para que esta cumpra seu papel social e sua razão de ser, na promoção do diálogo interreligioso. A Igreja reconheceu a necessidade e a importância dos meios de comunicação para evangelizar. O inimigo, como assim era considerada a nova tecnologia da informação, passa agora a ser aliada da instituição católica, por necessidade de propagar a fé. É fato que a comunicação sempre foi ferramenta imprescindível na disseminação do Evangelho, da boa nova e da missão social, do diálogo e do serviço em favor dos afastados da Igreja e dos excluídos. Pela ação de seus missionários, levou a mensagem cristã e da cultura ocidental para o mundo. E foi a partir de documentos e assembleias que discussões e propostas foram pautadas a respeito da comunicação no seio da Igreja Católica e desta com a sociedade em geral. A execução de novos produtos de comunicação social na Igreja, e especificadamente na Diocese de Bauru nos meios sociais, tão defendida pela Igreja exige, no entanto, a competência profissional a exemplo desta pesquisa, abertura a temáticas e fontes mais ousadas e o exercício do diálogo mais efetivo, ainda que isso implique num certo confronto. A Revista Diocesana é um desafio lançado para a Igreja Católica de Bauru e para os que desejam fazer comunicação diferenciada, evangelizadora e, sobretudo, profissional. Palavras-Chave: Diocesana. Igreja Católica. Revista. Comunicação Religiosa. 1 INTRODUÇÃO 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Graduado em Comunicação Social, com Hab. em Jornalismo pela Universidade Sagrado Coração Bauru – SP. Aluno Especial do Programa de Pós-Graduação em Comunicação (2010), nível mestrado, da FAAC UNESP-Bauru/SP. 278 É certa e notável a expansão pentecostal em áreas pastorais onde a opção pelos pobres foi excluída do planejamento pastoral da Igreja Católica. Vale salientar também que um dos fatores para o significativo desenvolvimento das Igrejas pentecostais e neopentecostais é o calor peculiar em humano que sempre foi suas práticas religiosas, em especial, as comunicativas. Falar para todos os povos consiste a missão da Igreja. Nesse sentido, a produção de uma revista que identifique as necessidades da comunidade e possa ser o canal de aproximação entre a diocese e a comunidade se faz necessária. Essa imensa vontade de renovar conceitos e de fazer valer a proposta de Cristo através da comunicação é revelada em assembléias episcopais e documentos como o Concílio Vaticano II (de outubro de 1962 a dezembro de 1965), o decreto InterMirífica, o 2º dos 16 documentos publicados pelo Vaticano II e aprovado em quatro de dezembro de 1963, e a Instrução Pastoral Communio et Progressio (1971), assim como a Conferências Episcopais da América Latina, de Medelín (1968), Puebla (1979) e Santo Domingo (1992), além da chamada Teologia da Libertação, nascida na América Latina na década de 1960, mas inicialmente inspirada pelo Concílio Vaticano II e nas encíclicas subsequentes Mater et Magistra (1961) e Pacem in Terris (1963). Em sua última Instrução Pastoral Aetatis Novae (1992) sobre a comunicação, João Paulo II relembra que a partir dos documentos Inter Mirifica e Communio et Progressio apareceu, as expressões como "sociedade da informação", "cultura da mídia de massa", e "geração de mídia". E afirma que hoje, muito mais que os homens e as mulheres sabem e pensam sobre a vida é condicionada pelos meios de comunicação, em grande medida, da experiência humana em si é uma experiência de mídia. Para ele já era visível a evolução notável no domínio da tecnologia de comunicação. “A utilização de novos meios de comunicação dá origem ao que alguns falam de ‘novas linguagens’ e deu origem as novas possibilidades para a missão da Igreja” (AETATIS NOVAE, 1992, n. 2). E é pensando esse contexto e a partir das orientações da Igreja sobre a comunicação que a Diocese 3 de Bauru busca disseminar a boa nova cristã em 3 Diocese é uma unidade territorial, formada por um conjuto de paróquias administrada por um bispo. 279 seu território pastoral. Portanto, a importância do presente trabalho está no fato de poder contribuir para o crescimento do processo comunicativo da Diocese, especificamente nos conteúdos informativos, através de uma revista, tratados pela sua importância como meio mais simples e mais barato, de grande aceitação pelos membros das comunidades, com capacidade de contribuir para a realização da proposta cristã e firmar as relações entre as pastorais, dasparóquias entre si, da relação entre as paróquias e a Diocese e, indiretamente, as relações entre os cristãos. A presente pesquisa teve por finalidade o desenvolvimento de uma revista informativa para a diocese de Bauru, com edições bimestrais, com o intuito de agregar a comunicação já existente entre a diocese e a comunidade local. Assim, foram levantados dados acerca da realidade comunicacional da Igreja Católica de Bauru, mais especificamente da diocese. A opção em produzir uma revista informativa deve-se ao fato de constatarmos, inicialmente, que a prática comunicacional da Igreja Católica de Bauru, hoje, fortemente marcada pelo uso dos meios de comunicação internos, como boletins, murais, informativos, internet, rádio, como canal de propagação da fé, papel que mesmo realizado de forma indireta, é assumido pela diocese. Nosso projeto pretende ampliar a comunicação da Igreja com a comunidade local, favorecendo maior pluralidade de informação a partir do conteúdo que será proposto pela revista. A ideia central é partir dos acontecimentos internos da Igreja (notícias) e ampliar o diálogo com os fatos que ocorrem simultaneamente fora dela. A Revista Diocesana será uma forma de aproximar a diocese da comunidade por meio da revista. Para tanto, buscamos a colaboração de padres, leigos, professores, profissionais da saúde, da educação e representantes da comunidade local, para produção dos conteúdos da revista, como proposta de ampliar o diálogo interno e externo da Igreja, qualificando ainda mais o processo de comunicação atual da diocese. A orientação e abordagem dialógica da comunicação permeiam os documentos sobre a doutrina católica, em particular a partir do Concílio Vaticano II, quando a Igreja publicou o Decreto Inter Mirifica, promulgado pelo Papa Paulo VI em 04 dezembro de 1963. Sobre a Importância dos meios de comunicação social, afirma esse documento: 280 Entre as maravilhosas invenções da técnica que, principalmente nos nossos dias, o engenho humano extraiu, com a ajuda de Deus, das coisas criadas, a santa Igreja acolhe e fomenta aquelas que dizem respeito, antes de mais, ao espírito humano e abriram novos caminhos para comunicar facilmente notícias, ideias e ordens. (INTER MIRIFICA, 1963, p. 146). A Igreja como cita o documento no trecho acima, reconhece os meios de comunicações como algo bom, “maravilhoso”, que precisa ser utilizado para comunicar valores, propor novos diálogos com a comunidade, buscando acima de tudo o respeito à vida. É pela comunicação que a Igreja conseguirá chegar a mais pessoas, para anunciar a Palavra de Deus, levar as notícias da sociedade e formar opiniões. Mas para que isso aconteça, vale destacar o que diz o capítulo I do Inter Mirifica a respeito da questão da informação ou obtenção e divulgação das notícias: É evidente que tal informação, em virtude do progresso atual da sociedade humana e dos vínculos mais estreitos entre os seus membros, resulta muito útil e, na maioria das vezes, necessária, pois a comunicação pública e oportuna de notícias sobre acontecimentos e coisas facilita aos homens um conhecimento mais amplo e contínuo dos fatos, de tal modo que pode contribuir eficazmente para o bem comum e maior progresso de toda a sociedade humana. (INTER MIRIFICA, 1963, p. 5). As mudanças do mundo contemporâneo, principalmente no campo da comunicação, obrigaram, pois, a Igreja a refletir sobre sua relação com a sociedade, as novas tecnologias e, principalmente, sobre o papel da imprensa. Dias (2001, p. 52) conclui que, após o Concílio Vaticano II, no que tange à prática da comunicação, “vai crescendo aos poucos, a mentalidade participativa, embora a produção literária, teológica ou pastoral ainda continue bastante centralizada nas mãos dos clérigos”. Percebe-se que a maior preocupação pós-concílio é assegurar a presença de diversas formas de apostolado dentro dos meios de comunicação, especialmente os meios impressos, como é citado no capítulo II do mesmo Inter Mirifica, intitulado Iniciativas dos católicos: Há que fomentar, antes de mais, a boa imprensa. Porém, para imbuir plenamente de espírito cristão os leitores, deve criar-se e difundir-se uma imprensa genuinamente católica que - sob o estímulo e a dependência direta quer da autoridade eclesiástica quer de homens católicos - editada com a intenção de formar, afirmar e promover uma opinião pública em consonância com o direito natural e com a 281 doutrina e princípios católicos, ao mesmo tempo em que divulga e desenvolve adequadamente os acontecimentos relacionados com a vida da Igreja. Devem advertir-se os fiéis da necessidade de ler e difundir a imprensa católica para conseguir um critério cristão sobre todos os acontecimentos. (INTER MIRIFICA, 1963, p. 178). As dificuldades encontradas pela Igreja na atuação e utilização dos meios massivos, como a nova imprensa mercadológica, rádio e televisão levou a II Conferência Episcopal Latino-Americana (CELAM) realizada em Puebla, no México, em 1989, a buscar novas orientações, e “não poupou esforços de articular e buscar maior clareza nos rumos a serem tomados pela instituição no que tange à sua presença nos meios de comunicação” (Dias, 2001, p. bispos demonstraram um encantamento diante das novas 53). Os tecnologias de comunicação e uma compreensão ingênua, a ponte de acreditar que a tecnologia poderia resolver os problemas da ação evangélica, principalmente no resgate de fiéis que se afastavam da Igreja. A novidade parecia desconhecida por grande parte do episcopado da Igreja, uma vez que tinham conhecimento da potência que os meios de comunicação social, como rádio, TV e jornal ocupavam na sociedade, mas de certa forma, não admitiam essa realidade. A Instrução Pastoral Communio et Progressio é fruto da uma nova reflexão da Igreja Católica acerca da importância dos meios de comunicação a serviço da fé. Considerado o documento mais importante da Comissão Pontifícia para os Meios de Comunicação Social, de 23 de maio de 1971, a instituição apresenta uma visão mais ampla sobre o tema que o decreto Inter Mirifica. “A Communio et Progressio é considerada a Magna Carta da comunicação cristã, caracterizada por uma aproximação mais positiva entre a comunicação e a Igreja, aproximação profissional e concreta" (DARIVA, 2003, p.82). Uma das orientações da Instrução Pastoral Communio et Progressio é que Igreja esteja informando e ouvindo atentamente a opinião pública, dentro e fora da Igreja, e procurando um diálogo contínuo com o mundo contemporâneo, participando, assim, na resolução dos problemas do homem de hoje. Esta visão da Igreja coincide com o pensamento de Paternostro (1999, p.19) para quem “a comunicação torna possível a interação e, ao mesmo tempo, propicia a convivência entre os homens já que a interação de um indivíduo está relacionada, de forma intrínseca, ao seu acesso à informação”. Por outro lado, a Igreja afirma, por meio do item 42 da Communio et Progressio (1962) que: 282 o direito à informação tem de ser limitado sempre que outros direitos se lhe opuserem. Por exemplo: o direito da verdade, que protege o bom nome dos indivíduos e da sociedade; o direito que têm os indivíduos e famílias a que a sua vida privada seja respeitada; o direito ao segredo, se as necessidades, o dever profissional ou o bem comum, o exigem. Informar, quando está em causa o bem comum, exige sempre prudência e discernimento. O papel do Jornalismo consiste em noticiar aquilo que julga de interesse público. A notícia é uma representação da realidade através dos acontecimentos do dia-a-dia do mundo. É nesta perspectiva que a proposta de produzir um volume da revista Diocesana é aliar o trabalho jornalístico ao da comunicação interna e externa da Igreja Católica de Bauru. 2 OBJETIVOS Objetivo Geral: Produzir um exemplar da Revista Diocesana sob o ponto de vista de critérios da competência comunicacional jornalística e a luz das Instruções Pastorais da Igreja Católica na tentativa de oferecer um novo produto comunicacional. Objetivos Específicos: Aprimorar o processo dialógico entre a comunidade católica, aqui representada pelos fiéis, com a comunidade externa – sociedade, favorecendo maior pluralidade de informação a partir dos acontecimentos internos da Igreja (notícias), ampliando o diálogo com os fatos que ocorrem simultaneamente fora dela. Contribuir para o crescimento do processo comunicativo da Diocese, especificamente nos conteúdos informativos, através de uma revista. Firmar as relações entre as pastorais, das paróquias entre si, da relação entre as paróquias e a Diocese e, indiretamente, as relações entre os cristãos e a comunidade local. 3 MATERIAIS E MÉTODOS 283 A Revista Diocesana traz uma proposta inovadora no que diz respeito ao conteúdo, linguagem, designer gráfico a serem abordados em suas edições. Seguindo a proposta da revista de atender um público misto, sua linha editorial é muito moderna e trouxe uma proposta gráfica atual, objetiva e de fácil acesso aos leitores. O projeto gráfico a Revista Diocesana foi desenvolvido pelo design gráfico, Eduardo Viver, da Joarte – Gráfica e Editora, de Bauru. A ideia inicial da capa foi uma criação do publicitário Marcelo Graziani, que elaborou o primeiro esboço e também sugeriu que o nome da revista fosse Diocesana. Em uma reunião, o publicitário, sugeriu que dar destaque a palavra Dio, que do grego, significa Deus. Por isso, na capa da Revista Diocesana, e palavra Dio foi escrita na cor branca em fundo vermelho, além de ser enquadrada, para dar destaque, assim ser uma marca, o logo da revista. O nome da revista foi escrito em maiúscula para abusar um pouco do nome, já que a palavra Diocesana se refere a um conjunto de comunidades, de pessoas. Apresentando fontes já conhecidas como: Arial Narrow (Diocesana), Garamond (Diocesana), Palatino Linotype (Diocesana) e Impact (Diocesana). A tipografia Palatino Linotype é a fonte que foi mais usada nos textos da primeira versão da Revista Diocesana. É uma versão da família do Palatino, que incorpora prorrogado latim, grego, cirílico caracteres, bem como sinais de moeda, subscritos e sobrescritos, e frações. A família inclui romano e itálico no texto e pesos em negrito. A Palatino tem proporções maiores e é considerada muito mais fácil de ler. E também usamos nesse projeto os tipos da família Garamond. A fonte foi escolhida por ser uma das fontes mais antigas ainda em uso. A Garamond divide com a Times New Roman o posto de fonte serifada mais popular do mundo (sendo o tipo serifado mais utilizado na França, seu país de origem). A serifa apresenta pequenos traços e prolongamentos que ocorrem no fim das hastes das letras que deixam o texto com uma arte visível. Apesar da serifa, tem uma aparência moderna. Por isso foi escolhida para ser usada principalmente em títulos e chamadas. Quanto à diagramação da revista Diocesana, foram pensados toques de modernidade, abuso nas figuras, textos curtos com matérias objetivas, além dos boxes que facilitam o entendimento do assunto trabalhado na matéria e dinamizam a leitura. Uma novidade é o Tome nota que vem justamente para 284 iniciar o bate-papo com o leitor ou para encerrar a conversa, oferecendo um pequeno texto que complemente o assunto em discussão. O uso de fotografias ajudou a ilustrar uma revista dinâmica e atrativa. Logo na capa, trabalhamos com a foto cheia de duas crianças sorrindo, justamente para explorar bem os aspectos e detalhes da imagem que traz uma mensagem que remete ao tema principal: felicidade. Como mostrada nos estilos de fonte acima, a chamada da matéria principal veio em fonte grande e na sequência o olho que também ganhou destaque. Utilizamos chamadas de capa, algumas vieram com foto ou imagem, ou apenas texto, justamente valorizar os principais assuntos que a edição traz, como forma de aguçar a curiosidade do leitor para as matérias. A escolha dos assuntos da pautas partiu da condição básica que norteia o trabalho jornalístico, o fator “interesse-público”, ou seja, que possam oferecer algo para quem for ter acesso à produção. Por outro lado, Medina (1995, p.37) diz que para haver um diálogo possível nas produções jornalísticas, “a escolha das fontes de informação terá de se enriquecer através da pluralidade de vozes e, ao mesmo tempo, da qualificação humanizadora dos entrevistados”. Na Revista Diocesana buscamos selecionar assuntos que pudessem contribuir para a formação do público-leitor. Como dissemos anteriormente, a linha editorial da revista buscou diretrizes a partir da Instrução Pastoral Aetatis Novae (1992) e para a escolha das pautas critérios/valores formulados a partir do pensamento eclesial católico acerca da comunicação social, principalmente no que diz respeito ao uso da televisão coerente com alguns dos principais valores doutrinais da Igreja Católica, tendo como documento-base a Instrução Pastoral Communio et Progressio (1962). O documento apresenta orientações para todos os meios de comunicação. Assim, buscamos selecionar aquelas orientações/valores doutrinais que mais se aproximam dos objetivos da produção deste trabalho. 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES O objeto principal desta pesquisa foi criação de um modelo da revista Diocesana que abordou temáticas do dia-a-dia da Igreja e da comunidade local, seu cotidiano, padrões e visões. Buscou dar amplitude ao trabalho realizado 285 pelo Pastoral da Comunicação (PASCOM) que já desenvolve e abastece diversas ferramentas importantes de comunicação na Diocese de Bauru como o Informativo On-line, o jornal da diocese, programa de rádio e site 4 . O projeto de uma revista impressa levou em conta a abordagem mais específica dos assuntos presentes na vida da comunidade, do que ela desenvolve, sua integração com projetos e realizações, enfocando assuntos diversificados de acordo com cada temática que envolve a vida da Igreja Católica de Bauru. A demanda e a criação de uma revista bimestral é uma proposta que visa parceria com PASCOM e conta com o auxílio da equipe de colaboradores como padres da diocese, professores universitários, profissionais da saúde, coordenadores de pastorais e leigos. Entre as propostas da Revista Diocesana está a de propiciar ao público-leitor reflexões sobre a vida em comunidade e o relacionamento com a fé. Na Idade Contemporânea, surge o modo de pensar dialético, privilegiando a dimensão histórica da existência humana e atribuindo maior dinamicidade à consciência. Porém, embora seja dada maior ênfase ao conhecimento sensível, este permanece, para uma grande parte dos filósofos, sendo considerado inferior ao conhecimento racional. Nesse mesmo período, deparamo-nos com um grupo de pensadores que, insatisfeitos com as formas de conhecimento estabelecidas, resolvem criar uma nova metodologia para o conhecimento, tanto no âmbito da Ciência como no da Filosofia. Surge então, segundo Severino (1992), a Fenomenologia, tendo como intuito chegar às coisas mesmas, descrevendo os fenômenos tais quais eles são experienciados pela consciência e onde sujeito e objeto se interrelacionam no processo de conhecimento. O conhecimento do mundo, mesmo em termos científicos, se dá a partir da própria experiência do sujeito. A Instrução Pastoral Aetatis Novae deixa claro ao dizer que o papel da comunicação não deve se limitar apenas e transmitir notícias da Igreja, uma vez que estaria persistindo em um diálogo fechado, sem que haja progresso no que diz respeito ao anúncio da Palavra de Deus a todos os povos e nações. O Papa diz que “a mídia pode ser usada para anunciar o Evangelho ou para reduzir ao silêncio nos corações humanos. Como a mídia cada vez mais interligada com o 4 Disponível em: http://www.bispadobauru.org.br 286 cotidiano das pessoas, eles influenciam o modo como as pessoas entendem o significado da própria vida” (item 8). Pensando a partir da orientação apostólica que a revista Diocesana definiu suas editorias, visando abranger o maior número de leitores interessados. Há uma preocupação com a vida em sociedade, uma vez que o temas abordados também fazem parte do cotidiano dos fiéis e não só com a vida religiosa, um exemplo é o espaço Comunidade em Foco, que trará reportagens sobre os projetos sociais da cidade de Bauru. Definimos o que será trabalhado dentro das principais editorias da revista Diocesana: no Ser Igreja, seção dedicada aos assuntos da Igreja, como sacramentos, doutrinas, documentos da Instituição e tempos litúrgicos. Pretendeu-se em cada edição, abordar temas de interesse da comunidade religiosa, com uma linguagem explicativa, que possibilite um maior entendimento da vida da Igreja. Sabemos que há muitas dúvidas sobre as celebrações, ritos. Então esse espaço foi pensado para trabalhar esses assuntos em forma de artigo de maneira didática. No Ser Família, trabalhamos com matérias sobre a vida em família, buscando tratar de temas importantes para o bom convívio familiar, como economia doméstica, relacionamento, conflitos. Sempre mostrando a realidade de um personagem e contextualizando com orientações de profissionais, oferecendo assim caminhos e apontados soluções. Ao criarmos o Espaço Livre, pensamos em deixar uma seção aberta para discutir assuntos educação, variados saúde que não encaixe nas editorias fixas, como pública, transporte, segurança. É um espaço livre, como o próprio nome sugere, aberto para debater em forma de artigos, entrevistas, assuntos que mereçam destaque e reflexão na comunidade. A seção Comunidade em Foco será destinada para mostrar os projetos sociais de nossa cidade, onde a Igreja também atua através da Pastoral da Educação, Pastoral da Pessoa Idosa e outras. Uma oportunidade de conhecer os trabalhos desenvolvidos por leigos, voluntários e profissionais. Evangelizar os jovens também é uma das propostas da Revista Diocesana. O espaço Ser Jovem interesse jovens, comportamento, estudos, além de exaltar a importância da dos irá trabalhar matérias com assuntos voltados ao religião para a juventude. Na seção Em Debate, sempre traremos a participação de um profissional para discutir através de artigo assuntos relacionados à defesa da vida, como forma de refletir temas atuais relacionados à existência humana. Com 287 Maria é um espaço reservado para tratar de temas marianos, como mariologia e a vida de Maria, a mulher escolhida para ser a Mãe de Deus, sempre escrito por um padre ou representante da Igreja Católica que tenha domínio sobre o assunto. No espaço Bem-Viver e Saúde serão desenvolvidas matérias voltadas ao esclarecimento de assuntos relacionados à saúde, possibilitando ao leitor maior entendimento dos termos médicos, como sintomas da doença, tratamento e prevenção. Também criamos a seção Dicas, um espaço que oferecerá dicas rápidas e simples relacionadas a saúde, beleza, higiene. Uma novidade da revista Diocesana é a Culinária dos Santos, que diferente de oferecer apenas receitas, trará um pouco da história de um santo da Igreja Católica e comidas típicas da região onde ele viveu. Por fim, o espaço Nossa Diocese fará um resumo dos principais acontecimentos da diocese de Bauru, e na Agenda Diocesana, serão destacados os eventos que irão acontecer na diocese durante os próximos dois meses, com data, horário, local e um resumo do evento. Portanto, a informativa Revista Diocesana foi desenvolvida para ser revista que trabalha os acontecimentos da Igreja local e notícias da comunidade, pautando-se nos valores cristãos, na ética profissional e no respeito a vida. Em cada edição será abordado um tema central e outros assuntos diversos nas seções, nos âmbitos cultural, pedagógico, religioso e antropológico. Representar uma Instituição Católica, neste caso a Diocese de Bauru, deve-se obediência as normas e orientações que a Igreja local exigirá para a produção da revista Diocesana, na pessoa do bispo Dom Caetano Ferrari (OFM). Por outro lado, nosso trabalho se pautou nas Instruções Pastorais sobre comunicação, que em sua maioria pede para que os veículos midiáticos respeitem a vida acima de tudo. A partir da Instrução Pastoral Aetatis Novae (1992), estabelecemos cinco diretrizes que vão nortear a linha editorial da revista Diocesana, são elas: 1 Obediência à Igreja, 2 - Comunicar a verdade, 3 - Promover o Diálogo, 4 Promoção de Valores, 5 - Direito à Informação. A partir dessas diretrizes retiradas do documento citado acima, vamos buscar pautar nossas produções para a Revista Diocesana para que se torne um produto além das qualidades de produções jornalísticas, mas como orientações da Igreja Católica, já que este projeto tem como objetivo principal ser um instrumento de informação e 288 evangelização. Como dissemos anteriormente, a linha editorial da revista buscou diretrizes a partir da Instrução Pastoral Aetatis Novae (1992) e para a escolha das pautas critérios/valores formulados a partir do acerca da comunicação pensamento eclesial católico social, principalmente no que diz respeito ao uso da televisão coerente com alguns dos principais valores doutrinais Católica, Pastoral Communio et tendo como documento-base a Instrução da Igreja Progressio (1962). O documento apresenta orientações para todos os meios de comunicação. Assim, buscamos selecionar aquelas orientações/valores doutrinais que mais se aproximam dos objetivos da produção deste trabalho, a saber: Valorização da vida, Pluralismo (de versões e fontes) e diálogo e Atualidade. À luz dos critérios da competência comunicacional/jornalística em fusão às orientações/valores doutrinais da Igreja e os critérios de produção de revista, foram desenvolvidas na primeira edição da Revista Diocesana as seguintes produções: 289 Seção PALAVRA DO BISPO Assunto Caridade e missão Editoria Artigo Colaborador Dom Caetano Ferrari Variados Cartas Padres e Leigos VOZ DO POVO SER IGREJA Defesa da vida e Artigo cultura de morte O segredo da felicidade Matéria Pe. Luiz Antonio Lopes Ricci Paulo Giraldi ESPECIAL Economia doméstica exige disciplina e SER FAMÍLIA organização ESPAÇO LIVRE Um olhar sobre a educação COMUNIDADE Em cena, com os EM FOCO olhos do coração Universitários que SER JOVEM fazem a diferença A importância da EM DEBATE espiritualidade COM MARIA Mariologia e SAÚDE mariolatria BEM-VIVER Seu cérebro em perigo Arroz e feijão faz bem Como se DICAS alimentar bem fora de casa Saiba como CULINÁRIA dormir melhor DOS SANTOS Delicioso Pavê NOSSA de cappuccino DIOCESE Geral/Diocese AGENDA Matéria Luís Henrique Marques Entrevista Ângela Furquim Matéria Karina Catto e Bruna Dias Matéria Paulo Giraldi Artigo Artigo Ana Beatriz Goulart Pe. Milton Carraschi Matéria Matéria Paulo Giraldi Tiago Rodela e Paulo Giraldi Artigos Joyce de Antoni e Ticiana Alves de Mira Marcelo Graziani Receita Notícias Aline Mendes Notícias Quadro 3 – Conteúdo da Revista Diocesana Fonte: Revista Diocesana, 2009. Adaptado pelo autor. Pastoral da Comunicação Nas matérias, utilizamos como recursos gráficos e ilustrações, boxes para curiosidades e pequenas entrevistas também foram utilizadas, visando uma linguagem de revista, com textos objetivos e de fácil leitura. Os assuntos abordados em cada seção foram discutidos previamente e analisado dentro da proposta editorial sob o ponto de vista de critérios da competência jornalística na elaboração dos conteúdos e formato e à luz das Instruções Pastorais para a comunicação social, nos critérios/valores. A revista tem 12 seções fixas. Para a matéria especial reservamos um espaço de duas páginas, para as matérias 290 pequenas e artigos, uma página. O projeto de arte e diagramação consistiu na busca de um visual atrativo e dinâmico, que facilita-se a leitura dos conteúdos, assim como as cores e imagens. A revista tem 16 páginas internas e com a capa e contracapa somam 20 páginas. Para a publicidade será reservado o espaço da contracapa da revista e à medida que foram sendo firmados parcerias de patrocínios, se discutirá a criação de novos espaços e o aumento de páginas. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Intensificar a presença da Igreja no mundo da comunicação é certamente uma das prioridades da comunidade católica no mundo todo, como vem se mostrando após o Concílio Vaticano II em suas principais Instruções Pastorais como a Communio et Progressio, Inter- Mirifica e Aetatis Novae, sobre a comunicação social. Na realização deste trabalho, que trata de uma revista para a Diocese de Bauru, procurou-se valorizar o contato com a comunidade, favorecendo maior pluralidade de informação a partir dos conteúdos produzidos e temáticas abordadas, a partir da colaboração de padres, leigos, professores, profissionais da saúde, da educação e representantes da comunidade local, que favoreceu o diálogo interno e externo da Igreja, oferecendo uma nova proposta na qualidade no processo de comunicação atual da diocese. O projeto da revista Diocesana em sua na proposta, conteúdo, formato e produções que, iniciou na discussão da pautas até o processo de criação da arte, confirmaram a discussão da necessidade de profissionais de comunicação para o desenvolvido de produtos religiosos de qualidade, como o caso dessa revista, na Igreja Católica. Diferente do que se pensa, não é possível fazer comunicação na Igreja sem que haja profissionais da comunicação à frente do trabalho, esta pesquisa é prova concreta dessa afirmação. No entanto, alguns obstáculos foram encontrados ao longo do caminho. Entre eles, a falta de materiais específicos para a produção de uma revista segmentada. A definição dos assuntos que iriam compor o primeiro exemplar da revista, também exigiram discussões e análises. A dúvida do que abordar e do que não abordar. A proposta inicial de uma edição temática acabou sendo repensada pelo tempo disponível para produção e contato restrito com os 291 colaboradores. Por isso, decidiu-se então por trabalhar com uma matéria especial e os demais assuntos como artigos e as matérias poderiam ser diversificados, assim a partir dos textos enviados pelos colaboradores, organizamos a linha editorial da revista, sob o ponto de vista de critérios da competência jornalística na elaboração dos conteúdos e formato e à luz das Instruções Pastorais para a comunicação social. Por outro lado, os pontos positivos podem ser vistos como a relação que se desenvolve com a comunidade, mostrando a carência de um produto como a Revista Diocesana, que traz conteúdos diversos, além de trazer reflexões sobre a realidade externa e interna da comunidade católica de Bauru. A Igreja quer, na prática, continuar utilizando os meios para a divulgação da fé. Por outro lado, a postura da mídia generalista em relação à comunicação religiosa precisa mudar por parte de padres, bispos e líderes. Sendo assim, assumir uma produção e a legitimação da existência da mídia institucional, caso da Igreja Católica, é considerado uma tarefa Pastoral Communio et Progressio, que importante reafirma para a Instrução a necessidade de usar, quanto possível, os meios de comunicação social para apresentar a mensagem cristã, de um modo mais interessante e eficaz, encarnando-a no estilo próprio de cada um destes meios. Ainda sim, a Instrução Pastoral é clara ao dizer que a Igreja precisa estar aberto para dialogar com o mundo, com todas as raças e culturas; só assim continuará sendo a “boa nova”, o que traduziríamos em “boa notícia”. A Revista Diocesana traz temas relativos à cidadania como valor humano, social e cristão. Além de traçar o perfil editorial em valores, as pautas contribuem como construção da imagem comprometida jornalismo com católico, a da Católica na sociedade “verdade”, características da comunicação inspiradas Igreja principalmente, brasileira, e do na Commnuio et Progressio e Aetatis Novae. A execução de novos produtos de comunicação social na Igreja, e especificadamente na Diocese de Bauru nos meios sociais, tão defendida pela Igreja exige, no entanto, a competência profissional a exemplo desta pesquisa, abertura a temáticas e fontes mais ousadas e o exercício do diálogo mais efetivo, ainda que isso implique num certo confronto. A Revista Diocesana é um desafio lançado para a Igreja Católica de Bauru e para os que desejam fazer 292 comunicação diferenciada, evangelizadora e, sobretudo, profissional. REFERÊNCIA DECRETO INTER MIRIFICA. Concílio Vaticano II. In: Compêndio do Vaticano II. Petrópolis: Vozes, 1972. DIAS, Arlindo Pereira. Domingão do Cristão: estratégias de comunicação da Igreja Católica. São Paulo: Salesiana, 2001. INSTRUÇÃO PASTORAL COMMUNIO ET PROGRESSIO. Encíclica sobre os meios de comunicação social. São Paulo: Paulinas, 1971 INSTRUÇÃO PASTORAL AETATIS NOVAE. Encíclica sobre os meios de comunicação social. São Paulo: Paulinas, 1992 MEDINA, Cremilda. Notícia: um produto à venda. São Paulo: Summus, 1988. PATERNOSTRO, Vera Íris. O Texto na TV: manual de telejornalismo. Rio de Janeiro: Campus, 1999. PESSINATTI, Nivaldo Luiz. Políticas de comunicação da Igreja Católica no Brasil. São Paulo/ Petrópolis: Unisal/ Vozes, 1999. PUNTEL, Joana. A Igreja e a democratização da comunicação. São Paulo: Paulinas, 1994. SCALZO, Marília. Jornalismo de Revista. São Paulo: Contexto, 2004. (Coleção Comunicação) ZANLOCCHI, Terezinha Santarosa. Trilhas da Cristandade. Bauru: Edusc, 1997. 293 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura AFETIVIDADE, COGNIÇÃO E EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: A IMPORTÂNCIA DAS RELAÇÕES SUBJETIVAS PARA PROFESSORES E ALUNOS1 Poliana da Silva Almeida Santos Camargo2 RESUMO Muito ainda precisa ser investigado no que diz respeito às percepções e perspectivas dos professores que ministram aulas na Educação de Jovens e Adultos - EJA. Essa investigação seria extremamente profícua, no sentido de conhecer essa realidade por intermédio dos professores e como eles foram preparados para assumir essa profissão. Por meio dos conteúdos expressos nas falas dos alunos da EJA entrevistados, percebemos que para eles, os professores têm contribuído de forma significativa para uma transformação qualitativa de suas realidades. (CAMARGO, 2005). Outro campo para novas descobertas seriam os cursos de formação de professores que têm disciplinas específicas para a formação de professores da EJA, investigar como essa preparação está ocorrendo, para compreender também como esses conhecimentos se desdobram nas salas de aula. Segundo o INEP / MEC (2006) o número de matrículas na EJA no Ensino Presencial chega a 4.861.390 e no Ensino Semi-Presencial a 754.901, totalizando 5.616.291 alunos, mas ainda muitos jovens e adultos não têm acesso à escola. Diante desse contexto, o papel do professor que atua na EJA se torna essencial no sentido de tentar driblar as dificuldades e desempenhar um trabalho satisfatório para esses alunos jovens e adultos que pela primeira vez freqüentam os bancos escolares ou para aqueles que vêm dar continuidade ao seu processo de escolarização. Em nossa pesquisa de mestrado (CAMARGO, 2005) foi possível identificar e analisar as percepções dos alunos jovens e adultos sobre o processo de ensino-aprendizagem. Dentre os resultados obtidos, o elemento que se destacou foi a questão da afetividade, principalmente na relação professor- aluno. Podemos inferir que há necessidade, por parte de educadores e pesquisadores, de se conscientizarem e refletirem, não somente sobre o ensino dos conteúdos escolares, mas também sobre a importância dos aspectos afetivos na vida escolar dos alunos jovens e adultos, como ocorre a construção do afeto nessa realidade e o quanto essa relação é importante para o ensino e aprendizagem eficientes. Palavras-chave: Afetividade. Cognição. Educação de jovens e adultos. Relação professor - aluno 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Mestrado em Educação pela Universidade Estadual de Campinas, Brasil(2005). Professora Universitária da Universidade Sagrado Coração. 294 1 INTRODUÇÃO Autores como Fernandes (1991), Dantas (1992), Snyders (1993), Freire (1994), Codo e Gazotti (1999) entre outros, vêm afirmando que o afeto é indispensável na atividade de ensinar, compreendendo que as relações entre o ensinar e o aprender são motivadas pelos desejos, pelas paixões e que é possível identificar possibilidades afetivas favoráveis que facilitem a aprendizagem. A afetividade (o afeto) torna-se elemento importante para a garantia do envolvimento do professor e dos alunos na tentativa de oportunizar um ensino e aprendizagens eficientes no desenvolvimento de uma ambiente agradável em sala de aula, na aquisição e socialização de conhecimentos e elevação de auto-estima. Segundo Maturana (1995) o ser humano se constitui na articulação entre o emocional e o racional: nuestros argumentos racionales [ ...] y todas nuestras acciones tienen un fundamento emocional, y creemos que tal condición sería una limitación a nuestro ser racional. Pero el fundamento emocional de lo racional no es una limitación. Al contrario es su condición de posibilidad (MATURANA, 1995 apud TASSONI, 2000, p. 8). Ele destaca ainda que a partir da definição de que o homem é um animal racional, há uma extrema valorização da razão em detrimento às emoções. Razão e emoção estão em contínua articulação promovendo a constituição do ser humano. Al declararnos seres racionales vivimos una cultura que desvaloriza las emociones, y no vemos el entrelazamiento cotidiano entre razón y emoción que constituye nuestro vivir humano, y no nos damos cuenta de que todo sistema racional tiene un fundamento emocional (MATURANA, 1995 apud TASSONI, 2000, p. 8). Seria interessante investigar essas relações entre razão e emoção principalmente no contexto da EJA. Como os professores trabalham com estes dois elementos em sala de aula? Será que valorizam mais a razão, desvalorizando a emoção, ou vice versa? Ou conseguem desenvolver um trabalho pedagógico equilibrado entre estas duas vertentes? 295 2 AFETIVIDADE E O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM Outro importante autor que se dedicou aos estudos sobre a origem do homem como um ser emocional foi Henri Wallon, destacando a importância da proximidade do outro para o desenvolvimento humano. A emoção é o primeiro e mais importante elo entre os indivíduos, tem papel essencial na formação psíquica, como amálgama entre o orgânico e o social (WALLON, 1978). Segundo Wallon (1978) é por meio da afetividade que o indivíduo conhece o mundo simbólico, dando origem às funções cognitivas, oportunizando seu desenvolvimento e o conhecimento do mundo objetivo é realizado de maneira sensível e reflexiva. Dantas (1992, p. 85-86) afirma que, para Wallon, a atividade emocional é que, realiza a transição entre o estado orgânico do ser e a sua etapa cognitiva, racional, que só pode ser atingida através da mediação cultural, isto é, social. A consciência afetiva é a forma pela qual o psiquismo emerge da vida orgânica: corresponde à sua primeira manifestação. Pelo vínculo imediato que se instaura com o ambiente social, ela garante o acesso ao universo simbólico da cultura, elaborado e acumulado pelos homens ao longo de sua história. Dessa forma é ela que permitirá a tomada de posse dos instrumentos com os quais trabalha a atividade cognitiva. Neste sentido, ela lhe dá origem. Wallon (1978) destaca os conceitos de alternância e preponderância funcionais, referindo-se à predominância que se alterna entre afetividade e cognição em diferentes fases do desenvolvimento. Outro autor que se debruçou sobre esse tema foi Vygotsky, baseando-se nos estudos de James, Lange, Van Der Veer, Valsiner, Cannon e Bühler sobre as mudanças fisiológicas e reações orgânicas que acompanham as emoções e as relações dos processos psíquicos e emoção. Ao elaborar seus estudos sobre pensamento, linguagem e interações sociais, destaca a deficiência da psicologia em separar os estudos sobre afeto e cognição “uma vez que esta apresenta o processo de pensamento como um fluxo autônomo de pensamentos que pensam a si próprios, dissociados da plenitude da vida, das necessidades e dos interesses pessoais, das inclinações e dos impulsos daquele que pensa” (VYGOTSKY, 1998a, p. 9). Vygotsky chamou a atenção sobre as experiências emocionais primitivas e superiores que diferenciam crianças e adultos, pois os adultos têm uma vida 296 emocional mais refinada do que as crianças. Destacou ainda, algumas idéias de Freud sobre as etapas de desenvolvimento das emoções para dar força às suas teorias sobre a evolução dos processos emocionais. Vygotsky (1998b) se apoiando nas idéias de Freud afirma que “as emoções só podem ser compreendidas no contexto de toda a dinâmica da vida humana. É só aí que ganham sentido e significado” (p. 96). Defende que as emoções não se extinguem, mas evoluem para o universo simbólico, entrelaçando-se com os processos cognitivos. A psicanálise é uma teoria que tem desenvolvido a temática da afetividade, abordando os conceitos de transferência positiva ou negativa e contratransferência. Sentimentos de experiências vividas pelos alunos anteriormente são transferidos para o professor (transferência) e este reage a esses sentimentos que o aluno transfere (contratransferência). Piaget (1983, p. 226-227) estudou profundamente o desenvolvimento da inteligência no decorrer do crescimento do homem e também fez referência às relações do sentir afirmando que, o sentimento dirige a conduta ao atribuir um valor aos seus fins [...]. A afetividade é caracterizada por suas composições energéticas, com cargas distribuídas sobre um objeto ou um outro (cathexis) segundo as ligações positivas ou negativas. O que caracteriza, pelo contrário, o aspecto cognitivo das condutas é a sua estrutura. Para Cunha (1992) a relação professor-aluno não é permeada somente pelos aspectos afetivos, virtudes e valores do professor com relação ao aluno, mas pela intensidade desses elementos também na forma como o professor se relaciona com a disciplina e as habilidades de ensino que desenvolve. Leite e Tassoni (2002) dão cinco sugestões de possíveis decisões que podem ser assumidas pelo professor no planejamento e desenvolvimento de curso que, conseqüentemente, terão implicações afetivas, interferindo seu na relação aluno-objeto a ser conhecido. São elas: para onde ir – a escolha dos objetivos de ensino; de onde partir – o aluno como referência; como caminhar – a organização dos conteúdos; como ensinar – a escolha dos procedimentos e atividades de ensino e; como avaliar – uma decisão contra ou a favor do aluno? A escolha dos objetivos de ensino está intimamente relacionada com os valores, crenças e concepções de quem toma essa decisão e eles devem ter 297 relação com a vida e com as práticas sociais dos alunos, estabelecendo vínculos afetivos entre eles e os objetos. Planejar o ensino utilizando como base o conhecimento que o aluno já tem sobre o objeto, aumenta as chances de desenvolvimento de uma aprendizagem significativa e oportuniza o sucesso do aluno na apropriação desse conhecimento, havendo uma seqüência dos conteúdos ensinados de forma a evitar o desgaste das relações entre o aluno e o objeto a ser conhecido. Os procedimentos de ensino devem ser coerentes com os objetivos propostos e serem motivadoras, incluindo instruções claras, intervenções adequadas e feedback por parte do professor. O aprendizagem precisam ser entendidos como ensino e a elementos interdependentes. A avaliação deve ser planejada e desenvolvida como um mecanismo a favor do aluno e do processo de apreensão de conhecimentos (LEITE; TASSONI, 2002). Martinelli (2001) destaca também a importância de se investigar as relações entre cognição e afeto, sucesso e fracasso escolar e dificuldades de aprendizagem. A autora aponta em seu estudo que um bom desempenho afetivo é importante, mas não suficiente ao profundo desenvolvimento de crianças e jovens. O processo de escolarização deve ser iniciado sem causar nos alunos sentimentos de angústia e insegurança pela necessidade de cumprir tantas exigências feitas pelos pais e professores. Situações de fracasso podem impulsionar um “desconforto e sentimento de desvalorização” que, se não extintos, podem ocasionar “problemas de adaptação de conduta, além de afetar de maneira intensa a confiança e o valor atribuído a si mesmo”. O professor é elemento essencial no processo de análise das dificuldades de aprendizagem que afetam a vida pessoal e escolar do aluno. “O sucesso e o bem-estar estão cada vez mais relacionados a uma maior integração dos aspectos sociais, emocionais e afetivos” (MARTINELLI, 2001, p. 115-116). Segundo Dantas (1992, p. 88) a afetividade é possível de ser descrita “como potencialmente anárquica e explosiva, imprescindível, e por isso assustadora. Está aí a razão pela qual é tão raramente enfrentada pela reflexão pedagógica”. Essa perspectiva está se alterando ao longo dos anos. Atualmente, pesquisadores e professores descobrem que a afetividade é elemento importante para o desenrolar de um processo de ensino-aprendizagem saudável e eficiente, que promova ao professor a reflexão contínua sobre suas práticas e relações em sala de aula, o estabelecimento de vínculos positivos entre os alunos e 298 os conteúdos escolares. Por isso não se cansam de investigar as relações entre afetividade e cognição em diferentes contextos, dentre eles Arantes (2003) e Leite (2006). No entanto, muito ainda precisa ser descoberto nesse complexo entrelaçamento, principalmente na EJA. Almeida (2005, p. 108) também destaca as diferenças entre afetividade em crianças e adultos e a significância entre o entrelaçamento entre cognição e afetividade e que, o desenvolvimento da inteligência implica necessariamente uma evolução da afetividade. Essa parceria na evolução é conseguida mediante a reciprocidade que existe entre ambas no início da vida. Assim, sobre movimentos pendulares as evoluções afetivas e intelectuais são fielmente comungadas. Desse modo, podemos perceber que, assim como a inteligência, a afetividade também evolui. Dantas (1992), ao tematizar as relações entre afetividade e inteligência, afirma: “ela [a afetividade] incorpora de fato as construções da inteligência,e, por conseguinte, tende a se racionalizar. As formas adultas de afetividade, por essa razão, podem diferir enormemente das suas formas infantis” (p.90) . Como é importante entender essas dimensões em vários níveis de ensino e principalmente na EJA onde sentimentos, emoções e aprendizagens são mais complexos, por se tratarem de jovens, adultos e idosos. 3 EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: RELAÇÕES ENTRE COGNIÇÃO E AFETIVIDADE Após a realização de uma revisão de literatura acerca do tema afetividade e relação professor-aluno constatamos que vem crescendo o número de pesquisas que abordam este assunto. Investigar a significância da afetividade na relação professor-aluno e como esse elemento influencia na construção do ensino e da aprendizagem na EJA é objetivo deste estudo e, por isso, evidenciamos alguns estudos sobre as relações entre afetividade e processo de ensino-aprendizagem. Com relação às pesquisas desenvolvidas no contexto da educação de jovens e adultos – EJA, somente 14 estudos foram localizados que contemplam esse tema. Autores como Silva (2003), Coelho (2005) e Falabelo (2005) pesquisaram as relações entre ensino, afeto e cognição nos contextos de aquisição das habilidades de leitura e escrita nos contextos de ensino regular e 299 especial. Silva (2003) realizou uma pesquisa com alunos jovens e adultos para investigar as relações entre as dificuldades cognitivas e afetivas vinculadas à leitura, à formação do leitor e aos diversos níveis de compreensão do texto pelo adulto. Concluiu que a leitura contribui para o desenvolvimento da auto-estima e da personalidade, destacando ainda o papel que a afetividade desempenha na formação do hábito de leitura. Coelho (2005) investigou o processo de apropriação da escrita de uma pessoa adulta, com autismo e retardo mental severo, analisando seus desenhos e produções escritas, durante 5 anos. Os resultados apontaram como é importante a afetividade nesse processo, destacando a relação professor-aluna. O acesso ao mundo da escrita é um instrumento cultural importante que possibilita uma maior participação social. Já Falabelo (2005) se preocupou em pesquisar como a afetividade e a cognição se relacionam e se afetam em situações de leitura e escrita ocorridas em dinâmicas de interação nas classes da EJA, com alunos e professores. O autor conclui que o afeto está presente em todas as ações humanas, que o afeto e cognição são dimensões da vida psíquica do ser humano que não podem ser dissociadas. A afetividade e a área de conhecimento da matemática, foram objetos dos estudos de Fernandes (2004a), Melo (2004) e Fonseca (2008). Esses autores entrevistaram alunos e professores com a finalidade de identificar como as emoções, os sentimentos e as histórias de vida podem influenciar o ensino e o aprendizado da matemática. Os resultados demonstraram que as relações entre os elementos afetivos favorecem positivamente o ensinar e o aprender da matemática, tornando-os mais agradáveis e significativos. Autores como Costa (2005), Abreu (2006), Carlucci (2008) e Teixeira (2008) estudaram as relações afetivas e cognitivas entre alunos de classes do ensino fundamental e do ensino médio da EJA. Os resultados dessas pesquisas corroboram a importância da indissociabilidade entre cognição e afetividade. No entanto, Cardoso (2007) se preocupou em analisar quais são as razões ou motivos concretos e simbólicos que levam alguns alunos a desistirem do processo de alfabetização e porque outros repetem por várias vezes. Foram identificados “os sentidos da desistência: dificuldades na aprendizagem por não compreender os conteúdos; exposição do não saber, trazendo à tona os sentimentos vergonha, humilhação, constrangimento por não saberem ler e de 300 escrever em idade matura; trabalho/cansaço e doenças”. Alguns alunos que permanecem nos bancos escolares “tem sentimentos de desadaptação” e outros aceitam as falhas e omissões das instituições de ensino. Silva (2005) e Moura (2006) investigaram como os componentes afetivos interferem na formação, na prática pedagógica e na formação continuada de professores que ministram aula na EJA. Ambos concluíram a importância da vida afetiva na constituição da subjetividade desses professores, favorecendo atuações positivas profissionais e pessoais. No entanto, Lins (2008) estudou as concepções sobre inclusão ofertadas na formação de professores e como elas são constituídas/reproduzidas nas classes da EJA. Por meio “das falas dos professores, procurou-se analisar como construíram representações oriundas da vivência, da experiência a respeito de sua própria formação sobre o processo de inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais, assim como a humanização do ser humano.”Os resultados demonstraram deficiências na formação dos docentes e que são necessários outros passos para uma formação adequada e humanizada. Foram assim, identificados 14 trabalhos de pesquisa que tratam dos temas afetividade, relação professor-aluno e processo pedagógico na Educação de Jovens e Adultos – EJA. Participaram desses estudos professores e alunos de escolas particulares e públicas. Podemos inferir, nos baseando nos resultados dessas pesquisas aqui citadas, que o desenvolvimento de um ambiente afetivo influencia de forma qualitativa na construção do conhecimento e do ensino. Por meio desta revisão de literatura foi possível averiguar que são poucas as pesquisas que relacionam afetividade e cognição na EJA. Partindo desta constatação, e por desejar contribuir para uma inserção do tema “afetividade” nas reflexões e operacionalizações da atuação do professor da EJA, entendendo-a como elemento fundamental na relação professor- aluno e facilitadora do processo ensinoaprendizagem dos jovens e adultos, é que constatamos a necessidade de novos estudos que tenham como objetivo investigar o conhecimento dos professores e dos alunos sobre essas dimensões, identificar e analisar as relações entre afetividade, cognição e contribuir para a produção de conhecimentos para essa modalidade de ensino. REFERÊNCIAS 301 ABREU, Márcia Kelma de Alencar. A alfabetização de adultos e o movimento da identidade pessoal: a leitura do mundo e a leitura de si na transformação de identidade. 2006. 177 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2006. ALMEIDA, Ana Rita Silva. A emoção na sala de aula. 5. ed. Campinas: Papirus, 2005. ARANTES, Valéria Amorim (Org.). Afetividade na escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus, 2003. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: informação e documentação: referências – elaboração. Rio de Janeiro, 2002. . NBR 10520: apresentação e documentação – trabalhos acadêmicos – apresentação. Rio de Janeiro, 2002. ALMEIDA, José Luiz Vieira de. A questão pedagógica da educação popular: uma análise da prática educativa da educação popular no Brasil – período: décadas de sessenta a oitenta. 1998. 144 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1998. BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Parecer CEB n. 11/2000. Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos. Disponível em: <http://www.mec.gov.br>. Acesso em: jun. 2000. CAMARGO, Poliana S. A. Santos Camargo. Percepções de alunos jovens e adultos sobre o processo de ensino-aprendizagem. 2005. 119 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2005. CARDOSO, Cícera Romana. Tramas do impedimento: os sentidos da desistência entre alfabetizandos da EJA. 2007. 105 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2007. CARLUCCI, Ana Paula. A relação trabalho-escola na narrativa de jovens: um estudo sobre significados e posicionamentos na transição para a vida adulta. 2008. 179 f. Dissertação (Mestrado em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde) – 302 Universidade de Brasília, Distrito Federal, 2008. CODO, Wanderley; GAZZOTI, Andréa A. Trabalho e afetividade. In: CODO, Wanderley. Educação: carinho e trabalho. Petrópolis; Brasília: Vozes; CNTE, 1999. COELHO, Roberta. O processo de apropriação da escrita de uma pessoa com autismo e deficiência mental severa: estudo de caso. 2005. 105 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Centro Universitário Moura Lacerda, Ribeirão Preto, 2005. COSTA, Maria Betânia Gondim da. Subjetividade e aprendizagem na educação de jovens e adultos. 2005. 130 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Universidade Católica de Goiás, Goiânia, 2005. CUNHA, Maria Isabel. A relação professor-aluno. Repensando a didática. Campinas: Papirus, 1992. . O bom professor e sua prática.15. ed. Campinas: Papirus, 2003. DANTAS, Heloysa; LA TAILLE, Ives de; OLIVEIRA, Marta Kohl de. Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992. FALABELO, Raimundo Nonato de Oliveira. A indissociável inter-relação afetividade e cognição nos processos de leitura e escrita na educação de jovens e adultos. 2005. 203 f. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade Metodista de Piracicaba, Piracicaba, 2005. FERNANDES, Ademilson Aparecido Tenório. Quem tem medo de matemática? Sentimentos envolvidos no processo ensino-aprendizagem de matemática por alunos da suplência. 2004. 168 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2004. FERNANDES, Dorgival Gonçalves. Alfabetização de jovens e adultos: pontos críticos e desafios. 2.e d. Porto Alegre: Mediação, 2004b. FONSECA, Maria do Socorro Alencar. As relações afetivas nas aulas de matemática na EJA mediadas pelo quadro de escrever. 2008. 95 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Pará. 2008. 303 FREIRE, Madalena. O sentido dramático da aprendizagem. Petrópolis: Vozes, 1994. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 11. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1999. . Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 6.ed. São Paulo: Paz e Terra, 1999. . Política e educação. 3. ed. São Paulo: Cortez, 997. GADOTTI, Moacir; ROMÃO, José E. Educação de jovens e adultos: teoria, prática e proposta. 4.ed. São Paulo: Cortez; Instituto Paulo Freire, 2001. HADDAD, Sérgio; PIERRO, Maria Clara Di. Escolarização de jovens e adultos. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, n. 14, p. 108-130, maio/jun./jul./ago. 2000. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa nacional por amostra de domicílios 1998/2003. Disponível em <http://www.ibge.gov.br> Acesso em: 12 jan. 2006. INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA / MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Sinopse estatística da educação básica: Censo escolar 2006. Brasília: INEP / MEC, 2006. LEITE, Sérgio Antônio da Silva (Org.). Afetividade e práticas pedagógicas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2006. LEITE, Sérgio Antônio Silva; TASSONI, Elvira Cristina Martins. A afetividade em sala de aula: as condições de ensino e a mediação do professor. In: AZZI, Roberta Gurgel; SADALLA, Ana Maria Falcão de. (Org.). Psicologia e formação docente: desafios e conversas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002, p. 113-141. LIMA, Valdenice Souza. As necessidades de letramento na visão de jovens e adultos não ou pouco escolarizados, de formandos de magistério e de alfabetizadores de Macapá. 2001. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas,2001. 304 LINS, Vanira Maria Laranjeiras. Formação docente na educação de jovens e adultos: processos de inclusão/exclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais em uma perspectiva de humanização. 2008. 230f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2008. MARTINELLI, Selma de Cássia. Os aspectos afetivos das dificuldades de aprendizagem. In: SISTO, Fermino Fernandes et al. Dificuldades de aprendizagem no contexto psicopedagógico. Petrópolis: Vozes, 2001, p. 99-121. MATURANA, Humberto. Emociones y lenguaje en educacion y politica. Chile: Dólmen Ediciones, 1995. MELO, Maria José Medeiros Dantas de. Do contar de cabeça à cabeça para o contar: histórias de vida, representações e saberes matemáticos na educação de jovens e adultos. 2004. 235 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2004. MOURA, Maria da Glória Carvalho. Teorizando a prática: construindo a teoría, um diálogo com a incerteza: desafíos para o profesor da educação de jovens e adultos. 2006. 111 f. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2006. PEREIRA, Gilson de Almeida. Limites e afetividade: a representação do professor e sua prática pedagógica no cotidiano escolar. 2002. 193 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2002. PIAGET, Jean. A epistemologia genética: sabedoria e ilusões da filosofia: problemas da psicologia genética. São Paulo: Abril Cultural, 1983. PINTO, Álvaro Vieira. Sete lições sobre educação de adultos. 12. ed. São Paulo: Cortez, 2001. RICHARDSON, Roberto Jarry et al. Pesquisa social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas, 1989. p. 173-198. SALTINI, Cláudio João Paulo. Afetividade e inteligência: a emoção na educação. 4.ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. 305 SILVA, Danilson Alves da. Literatura e educação: como o aluno adulto descobre a literatura? 2003. 147 f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003. SILVA, Lucas Pereira da. A afetividade como mediação no processo de constituição dos alfabetizadores de jovens e adultos. 2005. 130 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal de Alagoas, Maceió, 2005. SNYDERS, Georges. Alunos felizes. São Paulo: Paz e Terra, 1993. SOARES, Leôncio (Org.). Aprendendo com a diferença: estudos e pesquisas em educação de jovens e adultos. Belo Horizonte: Autêntica, 2003. TEIXEIRA, Marta. Interação social e tomada de consciência a partir do desenho de adultos. 2008. 289 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2008. TELES, Letícia de Lourdes Curado. Constituição de professoras(es) em educação de jovens e adultos numa escola pública do Distrito Federal: completude na incompletude? Ou incompletude na completude? 2003. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade de Brasília, Brasília, 2003. TOLEDO, Paulo de Tarso Gasparelli de. O processo de formação de professores(as) para a educação de jovens e adultos no curso de estudos adicionais do Instituto de Educação do Rio de Janeiro. 1998. 108 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro, 1998. VIANNA, Adriana Beatriz Botto Alves. O papel do coordenador pedagógico na formação continuada de professores em serviço na educação de jovens e adultos. 2001. 110 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2001. VYGOTSKY, Lev Semenovitch. Pensamento e linguagem. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998a. . O desenvolvimento psicológico na infância. São Paulo: Martins Fontes, 1998b. WALLON, Henri. A evolução psicológica da criança. Lisboa: Edições 70, 1968. 306 . As origens do caráter na criança. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1971. . Do acto ao pensamento. Lisboa: Moraes Editores, 1978. . As origens do pensamento na criança. São Paulo: Editora Manole, 1989. 307 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura O CINEMA E O ENSINO DE VALORES : O FILME AVATAR E A EDUCAÇÃO ANTROPOLÓGICA1 Renato Valderramas2 Vitor Pachioni Brumatti3 Caroline Guimarães Martins Valderramas4 RESUMO O presente artigo tem por finalidade discutir o uso de filmes de grande bilheteria – também conhecidos como blockbusters – na educação de jovens. Através de uma análise pontual de alguns momentos do filme Avatar de James Cameron, propõe-se uma reflexão crítica dos valores discutidos durante a narrativa da obra. A proposta se fundamenta no interesse dos discentes por tais filmes e na oportunidade que esse interesse abre aos docentes para a discussão sobre temas como: etnocentrismo, racismo, mitologia, transculturação, entre outros temas. Aprofundando a discussão a respeito das temáticas desenvolvidas em plataformas mais próximas aos discentes, como no caso o cinema, torna-se possível contextualizar esses valores relacionando-os com acontecimentos e fatos contemporâneos e sua ligação com teorias estudadas ao longo das disciplinas dos seus respectivos cursos. Essa análise comparativa permite identificar a aplicação dessas teorias, bem como compreender suas causas e principalmente suas consequências ao delimitarmos o foco de estudo dentro do tripé proposto como temática desse debate unindo educação, cultura e mídia. Palavras-chave: Cinema. Avatar. Discussão. Valores. 1 INTRODUÇÃO Os meios de comunicação, na maioria das vezes, são vistos como instrumentos de um processo educativo negativo, que insere pouco ou quase 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Graduação em Desenho Industrial - Hab. em Programação Visual pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil(1998). Docente da Universidade do Sagrado Coração. 3 Mestrando em Comunicação pela Universidade Estadual Paulista - Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação. Especialista em Antropologia. Graduado em Comunicação Social - Hab. Publicidade e Propaganda. Atualmente é docente e coordenador da Agência Experimental de Publicidade e Propaganda da Universidade Sagrado Coração. 4 Mestre em Pedagogia da Motricidade Humana pela Universidade Estadual Paulista (UNESP - Rio Claro) - Especialista em Educação Escolar pela FECAP/Integrale - Bauru. Graduada em Educação Física pela Universidade Estadual Paulista (UNESP - Bauru). Integrante do Grupo de estudos NEPEF (UNESP - Rio Claro). 308 nenhum valor social e moral em relação aos seus usuários e espectadores. Isso se deve, em parte, pela grande discussão da indústria cultural promovida Adorno e Horkheimer (1985) durante seus estudos na Escola de Frankfurt, onde o processo de produção cultural ligado aos veículos de comunicação de massa foi hostilizado e responsabilizado por uma produção de baixa qualidade. Em diversos momentos os estudiosos da Escola de Frankfurt tratam a popularização e possível democratização da cultura, como um agente de alienação popular. Diferentemente, os estudiosos da Escola de Chicago (WOLF, 2005) defendem que o processo de comunicação ligado a utilização dos veículos de comunicação de massa podem proporcionar um grande salto cultural para a população que anteriormente não tinha acesso ao conteúdo chamado cultural. Dentro dessa perspectiva encontramos o cinema como um dos mais antigos e principais agentes de propagação cultural presente em nossa sociedade. Com seu surgimento no final do século XIX e amplamente divulgado e difundido durante o século XX sendo tratado como sétima arte5 o cinema é responsável atualmente por grande parte das tendências em linguagens e formatos audiovisuais em todo o mundo. Juntamente a isso estão alocados os valores culturais desenvolvidos dentro das temáticas dos filmes. Por isso a análise de filmes que provocam grande debate faz-se de grande importância, pois são filmes como o longa-metragem Avatar que criam novos momentos dentro da indústria cinematográfica. Essa análise possibilita levantar e debater como os valores sociais e antropológicos que estão sendo tratado, o que está sendo valorizado, o que tem seu valor diminuído e principalmente qual a função educativa aplicada na forma de conduzir esses fatores. 2 SITUAÇÃO-PROBLEMA Acredita-se que haja uma reincidente crítica por parte do mundo acadêmico, em relação aos caracterizados como blockbusters filmes 6 hollywoodianos – especialmente os – no que tange ao conteúdo educacional. Na maioria das vezes, tais obras cinematográficas são apreciadas a uma luz intransigente, enquadradas como obras que possuem uma produção rica, mas que 5 O termo sétima arte foi dado por Riccioto Canudo no Manifesto das Sete Artes, em 1911. Tradução literal: bomba (tipo Arrasa-quarteirão). No caso da indústria cinematográfica é utilizado como sinônimo para grande sucesso de cinema 6 309 transmitem um conteúdo pobre. Não perdendo a objetividade desta análise e buscando sempre evidenciar os elementos arquetípicos da construção narrativa, propõe-se uma análise do filme Avatar de James Cameron sob a ótica da aproximação do público para com a discussão de certos valores evidenciados em diversos momentos pontuais durante o desenvolvimento do filme, tais como: choque cultural, valores sociais, relações inter- pessoais, relacionamento o ser e o meio ambiente e o processo de transformação cultural em que o ser está constantemente submetido. Com isso pretende-se analisar a utilização do cinema no processo de aprendizagem de fatores antropológicos e sociais presentes em nossa sociedade. 3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Ao realizar uma análise sobre as temáticas propostas para esse trabalho alguns autores e suas obras surgem com extrema relevância dentro que relacione: educação, cultura e mídia. Sendo assim as discussões decorrem principalmente dentro dos embates epistemológicos das obras de Pierre Lévy (2005), trabalhando as questões do processo cognitivo e sua relação entre o eu e o meio em que se encontra inserido. Analisando os aspectos ilustrados na produção cinematográfica em questão e a sociedade contemporânea. Estão muito presente também os pensamentos de Joseph Campbell (1990) em sua excelente obra: “O poder do mito”, desenvolvida em parceria com Bill Moyers, realizada alguns anos antes em um formato de documentário e posteriormente transcrito para o formato impresso. Nessa obra diversos aspectos surgem como pontos válidos de análise e comparação com a obra cinematográfica, entre eles analisados principalmente a necessidade do surgimento do mito ou herói, no formato do predestinado em busca de grandes realizações ou mensagens a serem compreendidas posteriormente. Outro ponto importante é a aceitação social em que os indivíduos são constantemente submetidos e que está presente de maneira muito significativa no filme. Com isso podemos presenciar dois fatores que se relacionam e constituem boa parte dos aspectos sócio-culturais dos grupos sociais analisados. Para uma contextualização entre essas ideias faz-se necessário a utilização de autores e obras que complementem o pensamento e demonstrem a ligação das temáticas em questão, como por exemplo, Marshall 310 Mcluhan (1969), Ray Kurzweil (2007), Darcy Ribeiro (1995), que em seus estudos e análises contribuem para o desenvolvimento da relação entre os temas e possibilitam a análise posterior. 4 JUSTIFICATIVA O presente tema se justifica pela aproximação do objeto analisado – uma obra cinematográfica de ficção científica concorrendo a diversos Oscars7 em 2010 – com o grande público, em especial com estudantes do ensino fundamental, médio e ingressos do ensino superior. O interesse instigado pela mídia, à divulgação massiva do filme e o sucesso de bilheteria seriam justificativas mais que exemplares a se propor uma discussão teórica mais profunda de pontos importantes abordados pela narrativa da obra, em especial os pontos que costuram os valores individuais e coletivos das personagens. 5 OBJETIVOS 5.1 OBJETIVO GERAL Sugerir a apreciação de filmes como ferramenta de observação crítica da realidade e de discussão de valores no ambiente educacional, pontuando a existênciade temáticas menos superficiais e mais subjetivas na narrativa cinematográfica. Propõe-se a complementaridade e/ou aprofundamento a respeito dos temas dos pontos supracitados – com a discussão junto aos alunos a partir de textos acadêmicos que possam ser utilizados para o melhor entendimento do assunto. 5.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Recortar, dentro do decorrer da obra, algumas situações-chave para o apontamento de problemas de valores éticos, morais e até mesmo espirituais de forma a suscitar a importância de uma leitura mais profunda das obras 7 Formalmente Academy Awards (Prêmios da Academia) é o nome pelo qual são popularmente conhecidos os prêmios da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos da América, fundada em Los Angeles, na Califórnia, em 11 de maio de 1927. 311 cinematográficas em si, podendo criar uma consciência apreciativa mais crítica por parte do receptor. 6 METODOLOGIA Foi desenvolvida uma pesquisa bibliográfica exploratória, analisando e comparando os autores relevantes às temáticas desenvolvidas e posteriormente foi aplicada uma análise qualitativa em imagens extraídas do longa-metragem Avatar (AVATAR, 2009) que retratam momentos-chave relacionados aos temas educação, mídia e cultural, dentro da análise antropológica. A escolha das imagens foi realizada em um processo de amostragem por conveniência e a análise foi embasada na pesquisa bibliográfica exploratória. 7 RESULTADOS E DISCUSSÃO 7.1 A TRANSFERÊNCIA DO CORPO Figura 1 - O eu e sua auto-imagem no plano real. (AVATAR, 2009) No início do filme, o personagem principal tem sua mente transportada voluntariamente para um corpo biologicamente projetado pelos humanos. Uma vez conectado – através de uma câmara, e diversos equipamentos que possibilitem essa conexão –, o personagem assume sua forma alienígena enquanto o corpo oficial, humano, repousa conectado aos aparelhos. Esse momento é apresentado na obra como um evento bastante corriqueiro para os cientistas do projeto, uma vez que estes já estavam habituados a tal transferência; mas esse mesmo momento gera uma grande exaltação por parte do personagem que é paraplégico, em seu 312 corpo humano, e pode se estivesse controlando locomover naturalmente, como Na'vi, como se um personagem em um jogo. Muito se estuda nas ciências da comunicação sobre os meios como extensão do homem (MCLUHAN, 1969), sobre o jogo e sua função social: "Os jogos são modelos dramáticos de nossas vidas psicológicas, e servem para liberar tensões particulares. São formas artísticas populares e coletivas, que obedecem a regras estritas". Para os mais jovens – ou para os adultos mais atentos à evolução da científica – a transferência corpórea já não é mais assunto tão distante visto que já existem tecnologias atuais que transferem os movimentos do corpo do jogador para dentro da tela do aparelho de televisão (Nintendo Wii8). Para os pensadores mais otimistas (KURZWEIL, 2007) em aproximadamente 90 anos no futuro será difícil separarmos o humano da máquina, tanto em relação ao corpo, quanto em relação ao pensamento. O que fica mais claro, em relação a este trecho do filme, Figura 1, é o aspecto da transferência; a ilusão do um, mente e corpo humanos de Jake Sully (personagem principal do filme Avatar), para dois, mente de Jake Sully humana no corpo biologicamente construído de seu Avatar, do caminhar constante que sua mente realiza durante o decorrer do filme pelos dois corpos e que acaba levando-o a constantes avaliações de seus conceitos e, principalmente de seus pré-conceitos humanos em relação à cultura na qual ele virá a se integrar ao longo do filme. 7.2 TRANSCULTURAÇÃO E DOMINAÇÃO Figura 2 - Um humano no corpo de um Na'vi, por sua vez vestido de humano. (AVATAR, 2009) 8 Console de videogame doméstico produzido pela empresa Nintendo, que proporciona como grande diferencial a interação e jogabilidade entre usuário e console. 313 Figura 3 - A dominação de um povo sobre o outro. (AVATAR, 2009) Quando em contato com povos, ou indivíduos de outras culturas, o homem tende a observar os hábitos e valores do outro e avaliá-los a partir de seu próprio repertório (Figura 2). Essa avaliação é normalmente preconceituosa, chegando mesmo a ser danosa, em especial quando um grupo considera-se superior a outro. O contato inicial com o povo Na'vi – até esse momento não retratado na obra, mas mencionado por uma de suas personagens – deixa uma primeira impressão de se tratar de um povo menos evoluído, primitivo e pouco disposto ao diálogo, uma vez que os humanos tentaram estabelecer um contato pacífico para com eles, oferecendo-lhes tecnologia, habitação e outros elementos culturais muito pertinentes à cultura humana, mas completamente insignificantes a cultura Na'vi, que os repeliu completamente. Essa visão etnocêntrica gera a base do discurso do General Miles Quaritch – personagem que tem como principal missão garantir a segurança da expedição e remover os Na'vi do clã Omaticaya da árvore de onde vivem – que não vê problema algum em usar a força bélica para sua expulsão (Figura 3). Se refizermos um percurso histórico, encontramos traços de situações semelhantes que aconteceram entre habitantes de nosso próprio planeta, como o massacre do povo Azteca por Hernán Cortez, por exemplo, onde o explorador europeu detinha – em grande grau de superioridade – a primazia bélica. Ao se refletirmos sobre essa passagem, observa-se que existem, dentro do grupo das personagens humanas, aquelas que repudiam a civilização Na'vi, aquelas que a defendem a todo custo, e a personagem central que por estar inicialmente inserida numa situação cultural, acaba passando – com a convivência junto ao povo Na'vi – por um processo de transculturação, ou seja, assimila elementos da cultura do outro por passar por um processo de 314 aproximação diferenciado, não mais observando a nova cultura como externa ao seu meio, mas inserindo-se no meio em que vive o outro, passando assim a ter um contato muito próximo dos elementos sociais, históricos e ambientais que formam e forjam essa cultura, não apenas entendendo-a, mas principalmente vivendo imerso nela. 7.3 O MOMENTO DA PREDESTINAÇÃO Figura 4 - O escolhido revela-se. (AVATAR, 2009) Nossa sociedade está constantemente em busca de heróis, seres capazes de transcender as limitações humanas e realizar grandes feitos dentro do contexto em que estão inseridos. O cinema busca através de suas histórias utilizar constantemente dessa ferramenta como ponto central dos roteiros. Não são poucos os casos de utilização do herói como ponto central de uma narrativa. Temos por exemplo o personagem Neo interpretador pelo ator Keanu Reeves no filme Matrix (MATRIX,1999), bem como personagens mais estereotipados como heróis ou super-heróis, como, por exemplo no filme Superman (SUPERMAN, 1978), onde o personagem principal dispõe de poderes supra-humanos que o possibilita a realização de ações impossíveis a seres humanos comuns. De acordo com Campbell (1990) a existência do escolhido, ou ser capaz de grandes realizações dentro dos grupos sociais é algo constante porque faz parte do processo de construção de mitos ao qual a sociedade atribui ensina valores a partir da criação e desenvolvimento explicações e de personagens, histórias e enredos. Ainda de acordo com Campbell (1990), esse heróis, ou mitos, estão 315 inseridos em um contexto social onde é preciso romper obstáculos, superar barreiras impostas com a finalidade de alcançar o que aparentemente se mostra intangível. No filme Avatar podemos analisar, Figura 4, o momento onde o personagem Jake Sully, mostra diferente e especial dentro de dois contextos, o dos humanos onde ele vivencia uma experiência tida como impossível pelos especialistas daquela sociedade se inserindo de maneira intensa no grupo social dos Na'vis e outro contexto relacionado ao próprio povo Na'vi, que presencia através da personagem Neytiri, o personagem Jake Sully ser cercado por centenas de sementes da vida, entendidas como sagradas pelos Na'vi. Esse fato transformou o ponto de vista de Neyriti em relação à Jake Sully a ponto de ele ser levado para dentro do povo Na'vi e ter a possibilidade de conhecer a cultura, seus hábitos, costumes e principalmente seus valores. 7.4 A LEGITIMAÇÃO SOCIAL Figura 5 - Os Na'vis aceitam um Humano-Na'vi como parte de seu grupo. (AVATAR, 2009) Uma vez dentro do povo Na'vi não bastava apenas estar junto a eles, era necessário, ser um deles. Por isso Jake Sully passa há vivenciar o dia a dia, bem como as experiências do grupo. Além do que o próprio grupo passa a também vivenciar a presença do novo integrante, visto agora como um possível escolhido, inserido dentro da sociedade, fato que até então não vivenciado por ambas as partes. Segundo Campbell (1990) essa processo é comum na relação escolhido e/ou herói e suas sociedade e grupo social. Os escolhidos têm uma missão a ser exercida dentro de cada grupo, missão essa que pode ser materializada em uma grande conquista, um ato bravura, ou ainda um 316 ensinamento a ser seguido. Para atingir esse processo todo grupo social estipula seus ritos ou rituais de passagem que demonstram segundo suas crenças, a capacidade do indivíduo em fazer parte daquele grupo, no sentido de realizar as tarefas necessárias a sua função dentro da hierarquia social, como também participar da cultura em que está assumindo a partir daquele momento. Na figura 5, vemos o momento em que Jake Sully é recebido na tribo dos Na'vis após conseguir cumprir as tarefas necessárias para se tornar um guerreiro do grupo, dessa forma ele é submetido a um ritual de aceitação, onde todos os indivíduos pertencentes à aquela sociedade passam a enxergá-lo como um deles, inclusive é possível notar que ele já está vestido como um Na'vi, a partir desse momento ele passa a ser chamado Jakesully. A partir desse momento todo o grupo o trata como um integrante e observá-lo a fim de identificar nele a presença ou pré- destinação do escolhido nele, sendo esse o processo de legitimação social (CAMPBELL, 1990). 7.5 A INTELIGÊNCIA COLETIVA Figura 6 - Conhecimento e sabedoria, os maiores bens de um povo, quando compartilhados. (AVATAR, 2009) Um ponto muito interessante presente na sociedade Na'vi do filme Avatar é a relação dos integrantes da comunidade com o conhecimento e a sabedoria. Os Na'vis buscam uma preservação do saber através da multiplicação e contemplação do mesmo. Eles vivem em uma dualidade onde o conhecimento é ao mesmo tempo sagrado e pertencente a todos. É muito interessante observar e comparar essa relação com a nossa sociedade atual. Alguns povos nativos ou também chamados primitivos também desenvolviam a mesma relação com o 317 saber, como Ribeiro (1995) trata em seu livro O povo brasileiro, relatando diversas experiências com comunidades indígenas por todo o Brasil. Onde a sabedoria deveria ser tratada ao mesmo tempo como algo a ser alcançado, incluindo a busca do sagrado, ao mesmo tempo ele precisa ser compartilhado para assim perpetuar e transpassar as gerações. Analisando a realidade contemporânea, encontramos uma relação muito mais complexa, o conhecimento em nossa sociedade ainda tem um poder muito forte, mas ele constantemente busca identificar-se e dividir-se muito bem para poder determinar o que, como e quando deve ser estudado e analisado, além disso, busca-se sim uma universalização desse saber, ou seja, que ele torne-se aplicável em diversas sociedades e grupos sociais ao mesmo tempo. Com isso o conhecimento e a sabedoria chamada popular deram lugar a ferramentas que formatam e tornam acessíveis o conhecimento em situações, regiões ou mesmo sociedades diferentes. Como resultado disso, vemos um distanciamento entre a sociedade e o conhecimento, buscando por vezes a valorização e reduzindo o processo de disseminação do mesmo. Para isso busca-se a criação ferramentas capazes de tornar essa disseminação mais rápida de e efetivamente acessível a diferentes níveis e setores da sociedade e dos grupos sociais. Analisando a relação que acontece no longa-metragem Avatar vemos claramente a aplicação dos conceitos de Lévy (1995) desenvolvidos em sua obra As tecnologias da inteligência, quando ele cunha o termo "ecologia cognitiva" que ele explica da seguinte forma: As coletividades cognitivas se auto-organizam, se mantém e se transformam através do envolvimento permanente dos indivíduos que as compõem. Mas estas coletividades não são constituídas apenas por seres humanos. Nós vimos que as técnicas de comunicação e de processamento das representações também desempenham, nelas, um papel igualmente essencial. É preciso ainda ampliar as coletividades cognitivas às outras técnicas, e mesmo a todos os elementos do universo físico que as ações humanas implicam. (LÉVY, 1995:144) Dessa forma vemos que Lévy (1995) que o conhecimento não está ou é restrito apenas ao ser humano, o eu não é inteligente sozinho, mas pertence a algo muito maior, uma rede complexa de inter-relações, onde o ser e o meio (ou rede) relacionam-se de modo a compartilhar o que aprendem e o que podem ensinar, e assim completar-se (figura 6), ou como o autor trata o processo 318 cognitivo. 7.6 A TRANSFERÊNCIA DA MENTE Figura 8 - O fim e o início encontram-se. (AVATAR, 2009) Já acostumados, durante o decorrer do filme, às contínuas viagens da mente de Jake Sully entre seus corpos (humano e Na'vi) o ato da transferência da mente entre dois corpos passa a ser muito transparente ao espectador. Havíamos passado – já faz alguns anos – pela frenética viagem mental de Matrix, onde a mente da personagem Neo viaja entre seu corpo humano e sua forma digital dentro do computador. No cinema o tema da transferência é bastante comum e chega a ser corriqueiro, mas o tema circunda a nossa realidade. Pesquisadores da Universidade de Karolinska (Suécia) fazem experimentos em que um ser humano usa óculos que lhe dá a visão de um corpo inanimado de um manequim. Quando o corpo deste manequim é ameaçado por uma faca, por exemplo, o ser humano entra em estado de estresse, pois o cérebro pensa se tratar de seu próprio corpo9. Obviamente que há uma distância muito grande entre a pesquisa supracitada e a situação apresentada pelo filme, mas o importante neste caso é pensar o posicionamento do personagem que teve sua mente transferida para o corpo em caráter temporário no início da obra e que o fará de forma definitiva – utilizando de recursos naturais do próprio planeta de Pandora – já no final da obra. Em que momento da obra ele deixa de ser humano para tornas-se um Na'vi? Apenas durante a transferência final? Se observarmos que um ser humano com as condições atmosféricas 9 www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=realidade-virtual-cria-ilusao-de-trocade-corpo&id=. Acessado em 17 de fevereiro de 2010. 319 peculiares de Pandora não conseguiria sobreviver àquele ambiente sem aparelhos de extensão de suas capacidades (filtros de oxigênio, por exemplo) ou que, por sua mobilidade limitada, a personagem teria problemas de locomoção em um ambiente não adaptado, enfim, se levarmos a conformação física como o primeiro grau de distinção humano- Na'vi, concluímos que a personagem de Jake Sully nunca faria parte do clã dos nativos. Entretanto, se levarmos em conta a experiência da aproximação cultural apreendida pelo intelecto da personagem durante a trajetória da obra, sua vivência junto ao grupo social e sua plena integração ao ambiente, podemos afirmar que Jake se torna um autêntico Na'vi muito antes da transferência final, uma vez que ocorre o processo de aproximação e assimilação cultural durante toda a obra. Outro filme que apresenta um processo de transculturação bastante intenso é Dança com Lobos (DANÇA COM LOBOS, 1990) onde o personagem John Dubar (Kevin Costner) passa a viver em terras habitadas por índios Sioux. Absorvendo os costumes, a língua e interagindo com o ambiente nativo, chegam mesmo a dizer – na língua Sioux – a outros homens brancos, que o encontram no final do filme, que seu nome era «Dança com Lobos» – nome que lhe foi atribuído pelos nativos. Observando tais momentos, podemos encarar mais criticamente e questionar certos pré-conceitos como a diferença entre raças, idades, sexos, religiões etc. sob uma ótica cultural – mais inclusiva e menos segregadora. 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS Propor uma apreciação mais séria a obras cinematográficas originalmente construídas para fins de entretenimento tem suas vantagens. O convite a assistir a um filme, em especial se este for uma referência de bilheteria, ou estiver dentro do repertório midiático do grupo de alunos com quem se trabalha é, no mínimo, recebido com curiosidade por parte deste grupo. A aproximação aspectos por de temas tidos como indigestos pelos discentes, sob certos falta de interesse, pode ser transformada em motivo de surpresa e, porque não, de apreciação sobre novos olhares. A associação do conteúdo narrativo dos filmes a textos mais densos que discutam o tema mais profundamente pode ser a chave para uma porta que permita ao docente adentrar 320 ao espaço da curiosidade do discente e iniciar um trabalho de conexão entre os temas necessários à construção de valores do aluno e ao conteúdo das mídias como o cinema, por exemplo, transformando este aluno em um espectador que apreenderá mais a respeito do conteúdo de filmes que verá no futuro. A investigação de alguns pontos em que o assunto possa suscitar a geração de discussões para com os discentes foi o intuito do presente artigo – observando apenas o filme Avatar. A fruição necessária para refazer este percurso em outras obras, não é complexa. Basta apenas que o docente dialogue um pouco mais com o universo midiático e cultural do aluno e passe a vê-lo, não mais como o outro, mas como um integrante de uma civilização que, por vir de um tempo diferente – o futuro – tem uma cultura midiática e uma vivência em comunicação não de menor qualidade, mas bastante diferente. REFERÊNCIAS ADORNO, T. W., HORKHEIMER M. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 1985. AVATAR. Direção: James Cameron. Produção: James Cameron e Jon Landau. Roteiro: James Cameron. EUA: Twentieth Century-Fox Film Corporation, Lightstorm Entertainment, Giant Studios, 2009. Digital Video. CAMPBELL, Joseph; MOYERS Bill. O Poder do Mito. São Paulo: Palas Athena, 1990. DANÇA COM LOBOS. Direção: Kevin Costner. Produção: Kevin Costner e Jim Wilson. Roteiro: Michael Blake. EUA: Orion Pictures, 1990. 1 DVD. KURZWEIL, Ray. A era das máquinas espirituais. São Paulo: Aleph, 2007 LÉVY, Pierre. As Tecnologias da Inteligência: o futuro do pensamento na era da informática, tradução. Carlos Irineu da Costa. 2. ed., Rio de Janeiro: Editora 34, 1995. MATRIX. Direção: Andy Wachowski, Larry Wachowski. Produção: Joel Silver. Roteiro: Andy Wachowski, Larry Wachowski. EUA: Village Roadshow Productions, 1999. 1 DVD. 321 MCLUHAN, Marshal. Os meios de comunicação como extensões do homem. São Paulo: Cultrix, 1969. REALIDADE virtual cria ilusão de troca de corpo. Inovação Tecnológica, 2008. Disponível em: <www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo= realidadevirtual-cria-ilusao-de-troca-de-corpo&id>. Acesso em: 17 fev. 2010. RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995 SUPERMAN. Direção: Richard Donner. Produção: Alexander Salkind e Pierre Spengler. Roteiro: Mario Puzo, David Newman, Leslie Newman e Robert Benton. EUA: Alexander Salkind e Pierre Spengler, 1978. 1 DVD. WOLF, Mauro. Teorias das Comunicações de Massa. São Paulo: Martins Fontes, 2005. 322 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura IMPLEMENTAÇÃO DE AMBIENTE WIKI COM PROFESSOR DO ENSINO FUNDAMENTAL1. Richard dos Santos2, Clerison Jose De Souza Bueno3, Dariel De Carvalho4 Rodrigo Batista Edamatsu5 RESUMO Este estudo tem por objetivo narrar a experiência da implementação de um ambiente de aprendizagem wiki com professor de ensino regular, bem como a análise de sua aplicação em atividades voltadas à aprendizagem colaborativa dos alunos de 4º, 5º, 7º, 8º e 9º ano de ensino fundamental. Sabendo que o wiki é um recurso da web 2.0 que facilita o desenvolvimento de diversas atividades que se voltam às práticas de colaboração entre os indivíduos e que muitos educadores do ensino regular ainda apresentam dificuldades em explorar de maneira eficaz as ferramentas tecnológicas que se aplicam ao contexto educacional, vislumbrou-se a oportunidade de promover práticas pedagógicas com o profissional atuante com alunos do ensino fundamental. Para isso foi aplicado um questionário com 25 professores e selecionado um professor que mais se destacou pelo uso mais intenso da tecnologia. O segundo momento da pesquisa constituiu-se de 06 horas de capacitação deste participante na ferramenta Wikispaces, onde aprendeu a criar um wiki e foi incentivado a utilizá-lo posteriormente com os alunos da escola que atua, durante 8 semanas. Os resultados mostraram que a utilização do ambiente wiki fornece inúmeras estratégias de trabalho para o docente, aproximando-o da tecnologia com maior intensidade. Foi verificado que as interações dos alunos acabam sempre sendo direcionadas para a produção colaborativa. Para fundamentar esta experiência recorre-se a autores como Bittencourt (2004), Grassi (2004), Coutinho (2009), Cunningham (2006), Fino (2004), Maçada (1998), Ramalho (2006), Vygotsky (1987), entre outros. Ao final do trabalho, foi constatado o crescente entusiasmo dos alunos a cada nova proposta de atividade, motivados pela exploração de recursos como apresentações, fóruns de discussão, filmes, documentos de textos e fotos e outras mídias dentro de um único ambiente. Constatou-se ainda, que o professor ficou mais próximo de ferramentas tecnológicas, ganhando autonomia e segurança no desenrolar de suas aulas. Palavras – 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluno do Curso de Ciência da Computação - Licenciatura da Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. 3 Aluno do Curso de Ciência da Computação - Licenciatura da Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. 4 Graduado em Informática pela FATEC-Jahu.Mestre em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar Doutorando em Educação pela Universidade Estadual Paulista – UNESP/Marília. 5 Aluno do Curso de Ciência da Computação - Licenciatura da Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. 323 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura SINAL VERDE: UMA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA O RÁDIO1. Rodrigo Carvalho da Silva2 RESUMO O trabalho refere-se a uma proposta de se utilizar os meios de comunicação, neste caso o rádio, como ferramenta para a educação não-formal. Para tanto foi idealizada uma produção radiofônica voltada para a educação ambiental. Ao final da produção, obteve-se um programa de rádio chamado \"Sinal Verde\", de formato híbrido, que mescla finalidades educativas, culturais, informativas e de entretenimento. Esses gêneros foram combinados de diferentes formas; com quadros definidos em um gênero específico ou com a mistura de gêneros em um mesmo quadro. O programa piloto foi gravado com 20 minutos e 31 segundos e consolidou-se com a criação de 5 quadros distintos. O primeiro corresponde a um pequeno boletim informativo sobre questões ambientais; o segundo conta com a participação de um professor de biologia respondendo a perguntas do público sobre meio ambiente; o terceiro é uma radionovela baseada em situações corriqueiras vividas por uma família e sempre relacionadas com a problemática ambiental; o quarto é uma entrevista, sempre com algum profissional ligado a atividades de lazer em contato com a natureza e, o quinto e último quadro do programa trata-se da apresentação de uma música com letra direcionada à preocupação ecológica. O programa foi construído, sobretudo, com o objetivo de propagar idéias sobre conservação e sustentabilidade da natureza, promover a discussão dos problemas ambientais e estimular a participação do público em atividades que beneficiem o meio ambiente. A possibilidade de educação ambiental através de um meio de comunicação é de grande importância uma vez que pode despertar a consciência humana em relação à preservação da natureza. A intenção é que este projeto proporcione a inserção da problemática ambiental no dia-a-dia de jovens em um debate permanente de reflexão, prática e participação. Com a educação de jovens em relação ao meio ambiente espera-se renovar e recriar uma sociedade ambientalmente correta. Palavras-chave: Comunicação. Rádio. Educação. Meio ambiente. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluno da Faculdades Integradas de Bauru – FIB. 324 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura CONSTRUÇÃO DE SENTIDO E PRODUÇÃO DE DISCURSOS: A LINGUAGEM E SUBJETIVIDADE DOS TEXTOS MIDIÁTICOS1 Rodrigo Carvalho da Silva2 RESUMO O trabalho refere-se a uma proposta de se reconhecer como a mídia (revista) analisada se posiciona em relação ao cenário político e econômico atual, em âmbito nacional e mundial, e entender como esse posicionamento direciona a produção de seus conteúdos e sentidos, disseminando de forma subjetiva o posicionamento individual de determinados grupos. Pretende-se analisar a escolha dos temas e a construção de discursos, em relação à transmissão subjetiva de posições ideológicas particulares. Este estudo se faz importante pela possibilidade de se revelar, através da observação empírica, os direcionamentos presentes na mídia analisada e entender através da análise dos elementos linguísticos e conteúdos dos textos como esses discursos são intencionalmente ou não construídos. O estudo dos discursos da mídia possui alta relevância, pois é capaz de provocar mudanças no pensamento individual e coletivo. Como objetos desta pesquisa foram selecionados textos vinculados em uma das principais revistas semanais brasileiras: a revista Época. Através de percepções nas características desses textos foram estudadas as formas como eles são produzidos e consumidos. Para esse estudo, foram observadas marcas que indiquem quais tipos de discursos foram escolhidos e elaborados na produção dos sentidos. Essa análise ocorre de forma descritiva. Através da análise descritiva dos dados coletados foi possível elaborar uma análise interpretativa, que expressa uma interpretação do pesquisador (particular e subjetiva de acordo com a proposta do estudo) em relação ao sentido que os diferentes elementos observados produzem nos textos. Essa análise foi construída através de ligações lógicas e identificação de particularidades, fazendo generalizações e confrontando os resultados obtidos com o referencial teórico. O objetivo é chegar a uma interpretação satisfatória do que está sendo observado e, com isso, poder utilizar esta pesquisa como um modelo para a compreensão da maneira como ocorre a produção de sentido e a construção de discursos na mídia em geral. Palavras-chave: Mídia. Discurso. Comunicação. Subjetividade. 1 INTRODUÇÃO 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluno da Universidade Estadual Paulista. 325 A proposta deste trabalho é reconhecer como a mídia se posiciona em relação ao cenário político e econômico atual e entender como esse posicionamento direciona a produção de seus conteúdos e sentidos. Como objeto (corpus) desta pesquisa foram selecionados e analisados textos vinculados em uma das principais revistas semanais brasileiras: a revista Época. Como amostra foi analisado 1 exemplar da revista, publicado na primeira semana do mês de junho de 2009: Época (edição nº576 de 1º de junho de 2009). A revista em questão aborda temas relacionados ao cotidiano da sociedade brasileira e também mundial. A revista Época é publicada desde 1998 e sua circulação média é estimada em 420 mil exemplares por publicação. 2 JUSTIFICATIVA Este estudo justifica-se pela possibilidade de se revelar, através da observação empírica, os discursos presentes na mídia analisada e entender através da análise dos textos (elementos linguísticos e conteúdos) como esses discursos são intencionalmente ou não construídos. O estudo dos discursos da mídia possui alta relevância, pois é capaz de provocar mudanças no pensamento individual e coletivo. 3 OBJETIVOS 3.1 OBJETIVO GERAL O trabalho pretende investigar a tendência da mídia analisada em abordar diversos temas através de abordagens enunciativas direcionadas ao contexto político e econômico atual. 3.2 OBJETIVO(S) ESPECÍFICO(S) O presente trabalho tem como objetivo reconhecer como a revista analisada se posiciona em relação ao cenário político e econômico atual e ainda analisar como esse cenário interfere na escolha de seus conteúdos e na construção de seus discursos, disseminando de forma subjetiva o posicionamento individual de determinados grupos. 4 CONTEXTO POLÍTICO E ECONÔMICO ATUAL 326 Os principais acontecimentos políticos e um breve histórico da atual situação econômica nacional e mundial (afetada pela crise) foram observados, descritos e considerados para a realização desta pesquisa. 4.1 ÂMBITO NACIONAL Aos poucos, a economia brasileira demonstra indícios de superação da crise (ao menos essa é a premissa existente no discurso do governo e também em boa parte das mídias brasileiras). Porém, todos esses indícios ainda não são suficientes para definir uma exata dimensão de como a crise econômica mundial afetou ou ainda afeta o Brasil. Por um lado há o discurso positivista do governo (muitas vezes comprado pela mídia brasileira) que define que a crise foi apenas uma pequena turbulência (“uma marolinha” – como definiu o próprio presidente Lula em discurso público) e que já está no fim, tendo causado apenas algumas mudanças de estratégias na economia do país. Por outro, há grupos políticos (talvez contrários ao governo) que consideram que os reflexos da crise ainda serão sentidos e que esse será um momento muito difícil para o país. O governo Lula está chegando ao fim, já que as eleições para um novo presidente acontecem em 2010 e a possibilidade de um terceiro mandato já foi descartada com a pré-candidatura de Dilma Roussef (atual chefe da Casa Civil) para o PT, sob a perspectiva de dar continuidade aos propósitos e trabalhos do atual governo. É importante ressaltar que Lula permaneceu oito anos no poder. Com certeza tudo isso reflete na construção dos discursos das mídias e, sobretudo, é um fator determinante na escolha de conteúdos a serem abordados. De um modo geral, diversos temas acabam sendo tratados sobre o viés político e econômico. 4.2 ÂMBITO MUNDIAL A desordem econômica mundial incitada pela crise bancária nos Estados Unidos e Europa afeta o mundo inteiro em diferentes níveis. 327 Apesar do discurso antiamericano de muitos países da América Latina, atualmente e por influência da crise mundial, muitos governos latino-americanos, assim como o Brasil, acabaram tendo que firmar alianças com os Estados Unidos, com o objetivo de aquecer a economia americana e por consequência aquecer também a economia de seus próprios países, já que os EUA são o país que mais consome produtos e serviços no mundo. Hoje vemos uma América Latina que, aos poucos, cresce economicamente. Esse crescimento foi arriscado pela crise, mas mesmo assim, muitos países da América do Sul apresentam grande influência no contexto político e econômico mundial. Mas o mundo continua com o “olhar” direcionado para os Estados Unidos. Toda e qualquer tentativa de superar os impasses atuais terão de, obrigatoriamente, levar em conta os movimentos dos agentes econômicos no país norte-americano. A presidência dos Estados Unidos passa por um novo governo. Tendo assumido como presidente no início de 2009, Barack Obama começa a mostrar as ações de seu trabalho, ainda mais levando em consideração que Obama assumiu a presidência em um contexto de crise. Fora isso, a eleição de Obama se constitui em um fato histórico por representar uma reconciliação dos Estados Unidos com seu passado de conflitos étnicos e sociais. Tudo indica que uma nova ordem econômica internacional se estabelecerá nos próximos anos. 5 REFERENCIAL TEÓRICO 5.1 ABORDAGENS ENUNCIATIVAS E SUBJETIVIDADE DA LINGUAGEM: SUAS MARCAS NO DISCURSO De acordo com Benveniste (1988), a enunciação é o ato de colocar a língua em funcionamento por um ato individual de utilização. A língua é o aparelho formal da enunciação, no qual se estabelece uma relação entre o enunciador e seu enunciado. Essa relação não se limita a uma simples codificação e decodificação mecânica entre emissor e receptor, pois se trata de um processo comunicativo no qual é possível destacar a existência implícita de pressuposições, ambiguidades e indeterminações que influenciam na produção dos sentidos e significações. Um mesmo termo pode ser entendido através de duas formas de análise: uma que restringe o seu significado ao nível de compreensão, referindo-se a colocação do 328 termo na frase, e outra que relaciona o uso e significado do termo ao nível interpretativo, referindo-se à produção de sentido em relação ao conteúdo do enunciado. O emprego do mesmo termo nos dois níveis de análise resulta em ambiguidade. (CERVONI, 1989). Segundo Cervoni (1989), para precisar as condições de verdade de uma frase é necessário nomear o locutor e o alocutário (utilizadores) através dos quais a frase pode se tornar enunciado. Também se deve levar em consideração o tempo e o lugar em que o enunciado é produzido, além do que pretende o locutor ao enunciar a frase. As frases têm a previsão de realizar determinados tipos de atos de acordo coma as pressuposições que um enunciador faz em relação a seu co-enunciador. Essa pressuposição corresponde aos atos de linguagem, expressos através da escolha de determinadas formas verbais. Os enunciados são compostos de escolhas linguísticas que orientam a mensagem para pontos de vista específicos do enunciador. O locutor escolhe também um modo de apresentação para expor o seu próprio discurso. O discurso pode ser definido como uma linguagem usada para representar práticas sociais a partir de pontos de vistas. Assim, para cada relação e situação social é possível fazer uso de um tipo de discurso, considerando os objetivos pretendidos. (FAIRCLOUGH, 1995). Toda produção da linguagem desprende-se de alguém, é dirigida a outro alguém e sempre se refere a algum assunto, tempo e espaço. Em discursos subjetivos sempre há a presença de elementos linguísticos como adjetivos, metáforas e ironias. A subjetividade se manifesta por modalidades, dêiticos, conotações e pressupostos, além disso, o estudo da pessoa e do tempo conduz à subjetividade da linguagem. Dessa forma, o autor pode encobrir-se através de construções linguísticas mais neutras, expondo seu discurso de forma implícita. Isso depende da atitude pessoal do enunciador diante ao seu referente. (BENVENISTE, 1988). Todo enunciado é modalizado através de modalidades que indicam o tipo de ato que a enunciação pretende realizar. De acordo com a tipologia de Antoine Culioli (1976), as modalidades podem ser classificadas da seguinte maneira: - Modalidade 1: Essa modalidade pode ocorrer através da asserção (validação do conteúdo através da afirmação ou negação), da interrogação (o enunciador interroga 329 o co-enunciador), da injunção (o enunciador recorre a súplica, ao pedido ou a sugestão para expor a sua enunciação), ou através da hipótese (o enunciador coloca a hipótese de maneira absoluta ou então emitindo uma hipótese positiva). - Modalidade 2: A modalidade epistêmica refere-se a incerteza do enunciador em relação à validação da relação predicativa. Oscila entre provável e improvável. - Modalidade 3: Chamada de apreciativa essa modalidade corresponde a análise do caráter do conteúdo da relação predicativa (bom, ruim, feliz, infeliz etc). Revela o julgamento do enunciador sobre a relação sujeito-predicado. - Modalidade 4: Intersubjetiva ou radical refere-se a relações entre sujeitos (sujeito enunciador e sujeito enunciado e sujeito enunciador e co-enunciador). Os dêiticos são termos que designam os elementos constitutivos de toda a enunciação dentro do enunciado, sendo eles: o locutor, o alocutário, o lugar e o tempo da enunciação. A esses termos não é possível atribuir um significado exato sem ter o conhecimento das pessoas e do tempo que compõem a enunciação. (CERVONI, 1989). Nos mais diversos textos se encontram termos, tais como “assim”, “portanto”, “desse modo”, que são inseridos para determinar ao leitor que uma construção está sendo operada. A linguagem é o que possibilita a comunicação, seja ela falada, escrita, visual ou através de sinais (gestos). Sempre que um indivíduo precisa se comunicar com alguém ele faz uso de algum tipo de linguagem. Ela apresenta componentes que permitem ao indivíduo transmitir exatamente o que se quer. Através dos mecanismos da linguagem um locutor provoca em seu interlocutor um comportamento correspondente com a mensagem transmitida. A linguagem é um fenômeno natural que ocorre através do processo: estímulo e reação. Muitas vezes, ela pode representar o papel de discurso, uma vez que o discurso é o resultado da linguagem posta em ação. Através da linguagem o homem se constitui como sujeito. Nós somos o que pensamos e falamos. A partir deste contexto, surge a subjetividade da linguagem. (BENVENISTE, 1988). A compreensão de um texto pode ser alcançada através da união de considerações em relação ao contexto em que ele foi enunciado e da interpretação dos elementos existentes no próprio texto que conferem significado ao discurso. Todo enunciado é produzido por um sujeito enunciador (aquele que constrói o 330 discurso). Já o co-enunciador é responsável por desconstruir o enunciado de acordo com suas próprias percepções. A subjetividade é dada no contexto. Um exemplo é quando se refere a algum indivíduo utilizando-se elementos linguísticos que exprimem valores de julgamento ou qualificações. É o caso dos valores axiológicos que geralmente são adjetivos, substantivos ou expressões com caráter avaliativo ou afetivo. Segundo Kerbrat-Orecchioni (1980), existem dois tipos de formulações de discurso. Um chamado de objetivo, que exclui a existência de um enunciador individual, e outro, chamado de subjetivo no qual o enunciador é explicitado e implicitamente avalia a enunciação (utilização de dêiticos e adjetivos afetivoaxiológicos). Em um discurso os valores axiológicos podem ser observados a partir de escolhas lexicais, das escolhas da posição sintática e nas entonações da voz. Toda unidade léxica é composta de subjetividade, uma vez que, palavras são símbolos. (KERBRAT-ORECCHIONI, 1980). Um enunciador emprega termos axiológicos imaginando que o co-enunciador tenha repertório para compreender esses valores, porém quando isso não ocorre, é possível que ocorram interpretações ambíguas em relação a um mesmo enunciado. 5.2 A CONSTRUÇÃO DO SENTIDO NA MÍDIA – DISCURSO JORNALÍSTICO X DISCURSO POLÍTICO O discurso jornalístico tem caráter assertivo e constatativo. Com isso, segue a falsa premissa de que difunde apenas o que já é fato. (GOMES, 2000). O jornalismo é supostamente realizado através de princípios como a objetividade e a impessoalidade, que na prática, são impossíveis de serem alcançados, pois mesmo inconsciente, um jornalista prima seu texto através de um repertório, ideologias e experiências particulares. Qualquer notícia tem o veículo ou o jornalista como porta-voz. Se não há imparcialidade, se as notícias dadas significam na medida dos interesses políticos momentaneamente em jogo e se é inevitável que cada jornal interprete numa direção, então, como saber o que aconteceu? Ou, “como é que se pode chegar à verdade?” [...] pensar em tais questões é pensar também no modo de ler que um pesquisador precisa engendrar para trabalhar com os sentidos 331 produzidos pelo discurso jornalístico. Dito de outra maneira, o discurso jornalístico produz leituras do mundo [...]. (MARIANI, 1999, p.103). Segundo Fairclough (1997), em alguns textos (principalmente os da mídia) é fácil identificar a que tipo de viés o discurso é essencialmente direcionado como, por exemplo, textos com caráter político, econômico, ideológico ou cultural. Porém, há outros textos que mesclam diferentes tipos de discurso e, por isso, são mais difíceis de serem analisados. Em um só texto é possível encontrar ideias e características de diferentes discursos, produzindo assim diversas formas de sentido. Um discurso que pareça ser político pode na verdade se tratar de uma mera conversa informal e amigável, ou vice e versa. Para Fowler (1994), a personalização é uma tendência também presente no discurso midiático. O ato de relacionar um acontecimento a um indivíduo específico ou a um grupo de pessoas transforma o caso em uma espécie de história noticiosa que desperta maior interesse do grande público, acostumado culturalmente a se identificar com narrativas e personagens. O que ocorre é a fusão indireta do estilo jornalístico com o literário. “Trazer uma pessoa para mídia”, apresentando ele para a sociedade, com características facilmente aceitas pelo público, serve para atribuir credibilidade aos conteúdos midiáticos. Essa representação de comportamentos previsíveis intensifica os estereótipos sociais. Um jornalista produz o seu texto de acordo com a idéia que ele faz de seu público e pensando na maneira como irá recebê-lo. Assim, alguns indivíduos, integrantes de seu público, se identificam totalmente ou parcialmente com os personagens (enunciadores) de seu texto e com isso se tornam co-emissores de seu discurso. (PINTO, 1999). São pelo menos dois os movimentos que, interrelacionados, se somam na organização e funcionamento do discurso jornalístico: o relato dos acontecimentos tanto resulta da produção de leituras singulares [...] como implica a possibilidade de organizar, direcionar e agendar a leitura do público [...]. (MARIANI, 1999, p. 111). Para Fausto Neto (2003), em relação à política o discurso da mídia é composto por estratégias enunciativas com poder de influenciar a opinião pública em relação à imagem de um candidato, construir cenários e até mesmo conduzir os resultados de uma eleição. 332 O discurso político somente pode ser difundido e se “fazer ouvir” através dos discursos da mídia. Assim, o discurso midiático faz o discurso político existir. Sem a mídia, a política não poderia “se fazer pública”. 6 METODOLOGIA A pesquisa se divide em dois tipos de análise: descritiva e interpretativa. Na análise descritiva foi realizada uma pesquisa bibliográfica sobre abordagens enunciativas, análise do discurso, estudos semânticos e produção de sentido na mídia. Ao mesmo tempo também foi realizada uma pesquisa-qualitativa descritiva. A partir dos dados coletados, foram empregados os seguintes métodos e técnicas: MÉTODOS - Fenomenológico – Através da descrição direta da análise. A realidade é construída socialmente e entendida da forma como cada indivíduo a interpreta e a comunica. As considerações apresentadas neste trabalho traduzem um olhar parcial e subjetivo do pesquisador sobre a mídia analisada. TÉCNICAS: Documentação indireta - Levantamento de dados (marcas textuais e estratégias discursivas) nos textos publicados na revista e também levantamento de dados (conceitos) nas referências bibliográficas que puderam embasar a análise proposta por este trabalho. Observação - Essa observação se deu através de um olhar reflexivo e crítico sobre as marcações linguísticas encontradas, de forma explícita ou implícita, nos textos. Análise de conteúdo – Classificação dos elementos de cada texto em categorias pré-estabelecidas com base nas teorias estudadas. Através da análise descritiva foi possível elaborar uma análise interpretativa dos diferentes conteúdos presentes em cada texto e ainda o apontamento da relatividade presente nos textos midiáticos, através da conexão entre discurso, subjetividade e contexto. 7 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 7.1 ANÁLISE DESCRITIVA - DESCRIÇÃO DOS ELEMENTOS TEXTUAIS (MARCAS LINGUÍSTICAS) E ANÁLISE DE CONTEÚDO REVISTA ÉPOCA – EDIÇÃO Nº576 – EDITORA GLOBO – 1º DE JUNHO DE 2009 Nº DA PÁGINA DA REVISTA: 48-50 TÍTULO DO TEXTO: “A tendência é a vitória de Dilma” 333 TIPO DE TEXTO: Entrevista AUTORES: Guilherme Evelin e Ricardo Mendonça Entrevista com o ex-deputado José Dirceu sobre a sucessão da presidência brasileira. O próprio tema da entrevista exemplifica a preocupação da mídia em abordar o contexto político brasileiro atual, em específico o momento pré-eleitoral e o apontamento de possíveis candidatos. A entrevista ainda aborda a crise econômica mundial. Já no título e na linha fina a mídia se utiliza da opinião do entrevistado para apresentar a tendência do país continuar sendo governado pelo mesmo partido, prevendo não somente a candidatura, mas também a vitória de Dilma Rousseff. Essa abordagem representa a construção do discurso através de especulações e fortes indícios de predictibilidade. Título: “A tendência é a vitória da Dilma”. (modalidade epistêmica em meio a asserção). A mídia prevê a vitória de Dilma utilizando-se de uma declaração do entrevistado, para credenciar a ele as responsabilidades por essa previsão. Linha fina: O ex deputado diz que a chefe da Casa Civil é favorita em 2010 porque o país não quer mudar de rumo. (asserção - o entrevistado justifica sua previsão). Antes de iniciar as perguntas e respostas segue um texto narrando o que fazia o entrevistado no momento em que concede a entrevista: “Ao receber ÉPOCA, fazia três coisas ao mesmo tempo. Estava grudado no noticiário da TV sobre o câncer da ministra Dilma Rousseff, despachava com assessores assuntos de seu blog e se preparava para uma reunião ...”. Essa narrativa revela o posicionamento da revista em ressaltar que apesar do entrevistado estar sem mandato há quase quatro anos, o mesmo continua atento ao contexto político brasileiro e assim possui credibilidade para expor sua opinião sobre os temas discutidos. É o que revela trechos da própria narrativa referindo a José Dirceu: “Atento aos bastidores de Brasília, procura mostrar entusiasmo com a candidatura de Dilma à Presidência, para qual, diz ele, não há alternativas”. Uma das perguntas relaciona a crise econômica com a nova candidatura: “A crise econômica não atrapalha a candidatura da Dilma?” Como resposta, ao invés de responder objetivamente se a crise pode influenciar na vitória de Dilma, o entrevistado, demonstra ser aliado ao governo atual (PT), respondendo que a crise 334 já está acabando e cita informações de crescimento econômico no país. “Nós estamos saindo da crise...”. Quando questionado novamente em relação à doença de Dilma o entrevistado responde assertivamente: “Não. O PT não piscou. Fez o certo. A Dilma é candidata. Não vejo nenhuma razão em mudar os planos por causa de um câncer...”. Após outra pergunta a revista insisti e apresenta outra questão relacionada a doença de Dilma. Que tipo de impacto a doença de Dilma poderá ter no eleitorado? Essa questão apresenta uma modalidade epistêmica com alto teor de predictibilidade, prevendo que a doença terá impacto nas urnas, talvez até mesmo positivo. Ao receber a pergunta negativa: “Por que o presidente não consegue convencer os próprios aliados?”, apresentada com base em diversas declarações de Lula que ele mesmo não quer o terceiro mandato, mas seus parlamentares continuam a insistir no assunto, José Dirceu responde de forma positiva. O entrevistado ainda declara: “A maioria dos eleitores não condena o terceiro mandato, porque o terceiro mandato, se aprovado pelo Congresso, não será inconstitucional...”, deixando a entender, que a hipótese de um terceiro mandato ainda não foi totalmente descartada. No fim da resposta o entrevistado revela de forma subjetiva que se o terceiro mandato não acontecer será por pura estratégia: “O problema é outro: nós não devemos fazer isso”. Mediante a essa declaração a revista questiona e o entrevistado foge dizendo que o terceiro mandato não interessa para o país e para a democracia, sem revelar os reais motivos que o terceiro mandato de Lula não interessa para o partido (PT). 7.2 ANÁLISE INTERPRETATIVA Levando em consideração a análise descritiva dos elementos textuais que caracterizam o posicionamento político e econômico da mídia em estudo, pretendese agora, através de uma análise interpretativa, entender como essa produção de sentido está relacionada com as práticas sociais. A comunicação pode ser entendida como o processo social de sentido. Ela é realizada através dos discursos, da subjetividade e do contexto em que é aplicada. Nesse sentido, a mídia tem o poder de abrir espaço para posições concordantes com seus interesses e, ao mesmo tempo, silenciar outros posicionamentos 335 divergentes com suas ideologias. Outra abordagem bastante utilizada é a especulação, quando os jornalistas - especialistas na formação da opinião pública agem como “agenciadores de apostas”, transmitindo interesses e convicções particulares ao leitor. Dentro da parte de política é comum observar matérias sobre acusações, conflitos, e negociações diplomáticas. Já na parte de economia, atualmente são comuns textos relacionados à crise financeira mundial e seus reflexos. De acordo com o contexto político atual, o enquadramento da temática política, em âmbito nacional, se dá através da cobertura de previsões em relação aos possíveis candidatos a presidência do Brasil nas eleições de 2010. A pré-candidatura de Dilma Roussef está sendo articulada pelo ex-ministro José Dirceu (tema explorado com destaque pela revista, já que José Dirceu aparece na seção de entrevista). A vida pessoal da pré-candidata também é um tema bastante explorado, inclusive especulando se isso poderia atrapalhar ou ajudar sua vitória nas urnas. Durante a entrevista duas questões foram reservadas e direcionadas para a doença que Dilma. A prática dos veículos de comunicação de evidenciar as referências individuais, através de estereótipos e da exploração de detalhes pessoais, inclusive de imagens, faz com que o público se reconheça e se inspire nos modelos de personagens apresentados, ou que o público rejeite o personagem e mantenha uma visão negativa sobre ele. Porém, essa especificidade midiática é ilusória, uma vez que o mundo apresentado pelo discurso da mídia, na verdade é um conjunto de padrões pré-estabelecidos com base em interesses particulares e convenções sociais implantadas talvez pelo capitalismo, e que em nada representam a verdadeira singularidade social. (FOWLER, 1994). Em períodos não eleitorais é comum que esse enquadramento seja feito através de notícias que ressaltem as intenções e ações de indivíduos ou grupos políticos que pretendem ostentar ou se manter no poder. Neste momento são apresentadas ao leitor (que também é eleitor) as diferentes propostas dos candidatos com o objetivo de que este possa “escolher” qual é o mais apropriado. Nesta fase, a mídia tende a fornecer informações sobre os candidatos para direcionar a escolha do eleitor. Mas, será que é mesmo o eleitor quem escolhe? Ou essa escolha seria feita pela mídia através do direcionamento de seu discurso? 336 Em âmbito mundial, a cobertura política é enquadrada através do início do governo de Barack Obama e o reflexo de suas ações para o mundo, sobretudo para a América Latina e em especial para o Brasil. Conflitos diplomáticos também são explorados. Na temática econômica, assim como em âmbito nacional, é visível a influência da crise econômica na seleção de conteúdos e nos enquadramentos escolhidos. 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS Todo fenômeno social é constituído por ato, retorno, atividades, significados, participação, relação e situações. Considerando a relação entre jornalista e leitor, que foram tratados nesta análise como enunciador e co-enunicador, a atividade é exatamente a ação (atitude) do jornalista em redigir o seu discurso (ou seria o jornalista que redige o discurso do veículo e não dele propriamente?). Já o ato consiste na decisão/ação do leitor em ler o texto. O significado pode surgir na troca de idéias (mesmo que a distância) entre jornalista que dissemina seu discurso e o leitor que o interpreta de maneira particular. A participação é a adaptação dos sujeitos ao processo geral que se desenvolve. O jornalista escreve - nesse contexto ele tem o poder de escrever o que quer e o que pensa, ou então, o que o veículo quer e deseja. Já o leitor lê - assim ele tem o poder de interpretar da forma como pensa, ou da forma como foi induzido e ensinado a pensar ao longo dos anos sendo manipulado pelos meios de comunicação. A relação é o relacionamento intrínseco entre jornalista e leitor. Já a situação é o grupo de leitores e jornalistas inseridos em um contexto histórico, político e socioeconômico já pré- estabelecidos pelas práticas e relações sociais, sobre as quais se busca produzir sentidos, significados e interpretações. Porém, quando pensamos nos sentidos que a construção do discurso da mídia produz na mentalidade dos leitores é preciso levar em conta que de acordo com o tipo de público atingido as mensagens provocam reações e pensamentos diferentes. Essa ocorrência é determinada pela capacidade crítica de cada grupo de leitores. Diversas categorias de público são ideologicamente independentes e demonstram capacidade de reinterpretar o conteúdo das mensagens. Nessa linha de raciocínio, acredito que a mídia, ao produzir seu discurso, tem em mente qual o tipo 337 de leitor (público-alvo) irá atingir de forma que suas posições ideológicas sejam “compradas”. Arrisco em dizer que este tipo de público ao comprar uma revista, compra na verdade o posicionamento daquela mídia em específico. Um público crítico, antes de concordar com as mensagens transmitidas por uma única revista, procura opiniões diferentes em outras revistas e até em outros veículos, para assim poder compará-las e formular seu próprio posicionamento. Esta análise limita-se em interpretar o discurso da mídia pesquisada (Revista Época), sem a preocupação de definir para ela um posicionamento político e econômico único e sem a pretensão de provocar mudanças no processo de construção de seu discurso. A intenção é exemplificar através desta análise subjetiva como os discursos da mídia são construídos e, dessa forma, estimular o pensamento crítico em relação à leitura de textos midiáticos. Em um plano geral, as mídias jornalísticas podem superar o papel negativo que normalmente desempenham na democracia através de uma cobertura política e econômica com maior responsabilidade social. Os próprios meios de comunicação possuem um grande potencial para incentivar mudanças de paradigmas e motivar o pensamento crítico na população, como a participação política. Isso poderia acontecer através de interações entre os meios de comunicação e a sociedade. Democracia é a participação popular. Com a análise dos textos foi possível observar que a revista Época, na parte de política possui matérias sobre acusações, conflitos, e negociações políticas. Já na parte de economia são comuns textos relacionados à crise financeira mundial e seus reflexos. Para a realização de uma pesquisa mais aprofundada e que pudesse definir com maior embasamento de dados o tipo de discurso (posicionamento editorial em relação ao contexto político e econômico atual) da Revista ÉPOCA seria necessário a realização deste estudo em um prazo estendido e em um número maior de edições da revista, comparando os discursos de cada uma, a fim de encontrar posicionamentos permanentes ou repetitivos. Tomando como base essa única amostra analisada foi possível observar que a revista possui enfoques que direcionam a opinião do leitor sobre os temas abordados. 338 ABSTRACT The aim of this work is to find out how media of magazine is placed in the political and economic scenery in the national and international scope, and understand how these placements directs the production of its contents and senses scattering in a subjective way the positioning of the individual from specific groups. The intention is to analyze the choice of the contents and the construction of the speeches related to the subjective transmission of specific ideological classifications. The study of media speech brings high relevance to it because it is able to cause changes in the way of thinking of the individual and collective audience. As objects of this research, textual productions have been checked and selected from one of the main Brazilian magazines, Época. Through perception on the characteristics of its writings, it’s been possible to study the way they are produced and consumed. For this particular research, it’s been pointed some clues that indicates which types of speeches were chosen and worked in the productions of the senses. This analysis occurs in a descriptive way. Through the descriptive analyses of the collected data, it was possible to elaborate interpretative analyses that express the peculiar and subjective interpretation of the researcher (according to the proposals of the study) in relation to the sense that the different elements observed work in the texts. These analyses have been built through logical connections and identification of particulars generalizing and confronting its results with the theoretical referential. The objective here is to come to a satisfactory interpretation of what is being observed and through that, be able to use this research as a model of comprehension of the way the production of senses and the construction of speeches occurs in the general media. Keywords: Media. Speech. Communication. Subjectivity. REFERÊNCIAS BACCEGA, Maria Aparecida. Comunicação e linguagem. São Paulo: Moderna, 1998. BENVENISTE, Emile. Problemas de linguística geral I. Campinas: Pontes Editores, 1988 BENVENISTE, Emile. Problemas de linguística geral II. Campinas: Pontes Editores, 1989 CERVONI, Jean. A enunciação. São Paulo: Ática, 1989. CULIOLI, Antoine. Transcription du séminaire de D.E.A. de M. A. Culioli - 1975-1976. 339 FAIRCLOUGH, Norman. Media Discourse. New York: Edward Arnold, 1995. FAUSTO NETO, Antônio. Fragmentos de uma enunciação desmesurada. In: ______.; VERÓN, E. (orgs.). Lula presidente: televisão e política na campanha eleitoral. São Paulo: Hacker; São Leopoldo: Unisinos, 2003, p. 119-146 FOWLER, Roger. Language in the news: discourse and ideology in the press. London: Routledge, 1994. GOMES, Mayara Rodrigues. Jornalismo e ciências da linguagem. São Paulo: Hacker Editores/Edusp, 2000. KERBRAT-ORECCHIONI, Catherine. L'Énonciation: de la subjectivité dans le langage. Paris: Armand Colin, 1980. LAVILLE, Cristian; DIONNE, Jean. A construção do saber: manual de metodologia da pesquisa em ciências humanas. São Paulo: Artmed, 1999. MAINGUENEAU, Dominique. A análise de textos de comunicação. São Paulo: Cortez, 2001. MARIANI, Bethania S. Corrêa. "Sobre um percurso de análise do discurso jornalístico - A Revolução de 30". In: Os múltiplos territórios da Análise do Discurso. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1999. NEGRA, Carlos Alberto Serra; NEGRA, Elizabete Marinho Serra. Manual de trabalhos monográficos de graduação, especialização, mestrado e doutorado. São Paulo: Atlas, 2004. PINTO, Milton José. Comunicação e discurso. São Paulo: Hacker,1999. TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais. São Paulo: Atlas, 1987. WOLF, Mauro. Teorias da comunicação. Lisboa: Presença, 2006. 340 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura POESIA E PINTURA NA OBRA DE MÁRIO QUINTANA1. Rosilene Frederico Rocha Bombini2 RESUMO Ao falarmos da poesia de Mário Quintana é preciso acima de tudo destacar as experimentações literárias em que o autor mostrava a sua originalidade, oscilando entre o tradicional e o moderno, inventando e reinventando temas e formas para encantar e até chocar o leitor. Pode-se ainda perceber o aparecimento da reflexão criadora na sua linguagem poética e no processo de criação da sua poesia, seja por meio da prosa poética ou de versos, rimados ou não. Dessa forma, Mário Quintana não só faz poesia, mas também fala de poesia, como em seu Caderno H, no qual aborda com grande refinamento concepções de Arte, Linguagem, Literatura e Poesia. Percebe-se, ao longo da leitura de seus minitextos, grande preocupação com o tema da linguagem, com a metalinguagem. Para isso, o poeta trabalha a palavra de forma inovadora, surpreendente. Sua poesia é essencialmente lírica, individualista, criadora de um mundo ideal - uma realidade transfigurada - em que fantasia, sonho e real se confundem. A linguagem poética é criadora de imagens. Imagens que se configuram através da linguagem. Em seus textos percebe-se a escolha precisa das palavras, a brincadeira que desperta o leitor para um jogo em que a novidade e o estranhamento fazem rir e, ao mesmo tempo, pensar. Em dois textos selecionados para este trabalho, o poeta expressa o momento da criação, o fazer artístico: semelhante ao pintor que trabalha com a cor e a luz, o poeta explora a palavra, forma gráfica ou sonora. Cabe ao leitor aprender a ver, buscar nas linhas e entrelinhas o esboço de uma poética, uma concepção de poesia que só a percepção e visão apurada poderão ajudar a desvendar. O poeta é uma espécie de pintor que, por meio da criação de imagens ricas em elementos concretos e sensoriais, busca fazer o leitor "ver" o que está lendo; as imagens que os poemas apresentam captam o real em sua dinamicidade, em suas constantes transformações. Por meio de associações inusitadas de imagens, o poeta dá um novo colorido ao "mundo representado" em sua poesia. Quintana é esse poetapintor! Sua poesia, plena de cores, luz e imagens, cria algo novo, linguagem nova, criativa. O mundo é redesenhado. Palavras – chave : Poesia. Pintura. Imagens. Imaginação. Jogo. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Mestre em Comunicação pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil (2001). Professor auxiliar da Universidade Sagrado Coração. 341 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E DA COMUNICAÇÃO PRESENTES TRANSVERSALMENTE NO TRABALHO PEDAGÓGICO COM A INFÂNCIA1 . Thaís Cristina Rodrigues Tezani2, Marcia Cristina Argenti Perez3 RESUMO O presente trabalho apresenta alguns resultados de um projeto de extensão universitária do Departamento de Educação, da Faculdade de Ciências da UNESP de Bauru SP, denominado "Direitos da criança: o ECA na escola". A partir de um referencial histórico-cultural, sabemos que, hoje, a formação de crianças para a cidadania passa pelo conhecimento, reflexão e vivência do ECA, como parte de uma política pública que tem interface imediata com a política educacional. Nesta perspectiva, o objetivo do projeto foi contribuir para o desafio da implementação do ECA nas escolas, por meio do trabalho com vivências no ambiente das instituições e planejamento de oficinas lúdico-educativas. Vale destacar que a questão central que orientou o trabalho foi possibilitar a criança o conhecimento e a aprendizagem de seus direitos, garantidos por lei. As tecnologias da informação e da comunicação foram utilizadas como estratégia pedagógica para o trabalho dos conteúdos relacionados à temática do projeto de modo transversal. A possibilidade de uso desses recursos, mais especificamente do computador, representou avanços nos processos de ensino e aprendizagem dos conteúdos abordados. Para isso, foi necessário: planejar, organizar e executar as atividades que englobavam a temática dos direitos, deveres e cidadania e articulá-las ao uso da tecnologia de modo transversal. Concluímos que, com o uso das tecnologias da informação e da comunicação, houve maior interesse as crianças na realização das atividades. A possibilidade da transversalidade que o uso desses recursos proporciona foi fundamental no desenvolvimento das atividades realizadas tanto na educação infantil quanto nos anos iniciais do ensino fundamental da rede municipal de ensino. Sabemos que há ainda muito a ser explorado com relação ao uso dos recursos da tecnologia da informação e da comunicação com a infância, e que tal prática pedagógica encontra barreiras diversas, mas acreditamos que este projeto de extensão mostrou essa possibilidade com sucesso. Palavras-chave: Política educacional. Estatuto da Criança e do Adolescente. Tecnologias da informação e da comunicação. Infância. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Departamento de Educação - Faculdade de Ciências - UNESP Bauru. 3 Departamento de Educação - Faculdade de Ciências - UNESP Bauru. 342 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura PORTABILIDADE E MOBILIDADE NA TV DIGITAL: ATRATIVOS PARA A HOSPITALIDADE SOCIAL1 Thalita Maria Mancoso Mantovani e Souza2 Maria Cristina Gobbi3 RESUMO A Televisão Digital em fase de implantação no Brasil representa uma ampliação e interação entre as diversas áreas de pesquisas e do conhecimento, tais como: gestão da informação, tecnologia, educação, comunicação e, especialmente, a hospitalidade, para que, juntas, busquem resultados favoráveis, contemplando os seres humanos sempre com dignidade. Neste contexto, o presente trabalho destaca a portabilidade e a mobilidade da Televisão Digital como possibilidades de promoção para a hospitalidade social. São recentes as pesquisas sobre Televisão Digital e hospitalidade no Brasil. As tecnologias digitais apresentam novos ingredientes aos conceitos da hospitalidade, convergindo para a possibilidade do resgate do ser social, integrando e reforçando seus vínculos sociais no espaço tecnológico. A metodologia escolhida para este estudo consiste nas pesquisas exploratória, bibliográfica e documental, com a consulta em livros, revistas, periódicos, dissertações, teses e artigos científicos, relacionados aos temas: Televisão Digital, hospitalidade, relações humanas, comunicação, espaços públicos. Assim, com a Televisão Digital, é possível que tenhamos novas formas de sociabilidade, pois poderá ser levada e assistida em qualquer lugar, em decorrência dos seus recursos de portabilidade e mobilidade, os quais permitem a construção de laços sociais ou em um conceito mais amplo, a hospitalidade social nos espaços públicos. Na relação entre TV e hospitalidade social, Wolton (1996) aborda que a televisão (e a Televisão Digital) constitui-se um laço social quando o espectador assiste a um programa e sabe que outra pessoa o assiste também, simultaneamente. A implantação da Televisão Digital, além do progresso tecnológico, também permite uma comunidade mais comunicativa, com o receptor da mensagem mais ativo, participativo e interativo inclusive na construção de 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Televisão Digital: Informação Conhecimento da FAAC/UNESP.Especialista em Planejamento e Gestão da Hospitalidade em Turismo pela Integrale/FECAP.Bacharel em Turismo pela USC. 3 Docente do Programa de Pós-Graduação em Televisão Digital: Informação e Conhecimento da FAAC/UNESP. Pós-Doutora em Integração da América Latina da Universidade de São Paulo (PROLAM/USP). Diretora-Suplente da Cátedra Unesco de Comunicação para o Desenvolvimento Regional. Coordenadora dos Grupos de Pesquisa "Pensamento Comunicacional Latino-Americano" e "Comunicação Digital e Interfaces Culturais na América Latina" do CNPq. Editora do JBCC - Jornal Brasileiro de Ciências da Comunicação e do Anuário Unesco/Metodista de Comunicação. Coordenadora Nacional do Prêmio Luiz Beltrão de Ciências da Comunicação da Intercom. 343 laços de hospitalidade. Nestas considerações, a Televisão Digital e as ferramentas de portabilidade e mobilidade contribuem para tornarem os espaços públicos em lugares de reconhecimento, de possibilidades de encontro, de proximidade com o outro, enfim, de hospitalidade social. Palavras-chave: Televisão digital. Portabilidade. Mobilidade. Hospitalidade. 1 INTRODUÇÃO A Televisão Digital, já consolidada nos Estados Unidos, Europa e Japão e que no Brasil está em fase de implantação, avançando gradativamente desde 02 de dezembro de 2007, tem a capacidade de agregar benefícios aos telespectadores, tais como a qualidade da imagem e do som em alta definição (som surrond 5.1 e tela no formato 16:9), mobilidade, portabilidade, multi-programação e interatividade (SOUZA; GOBBI, 2009, p. 2). Isto representa, em linhas gerais, uma ampliação e interação entre as diversas áreas de pesquisas e do conhecimento, como por exemplo: gestão da informação, tecnologia, educação, comunicação e, especialmente, a hospitalidade, para que, juntas, busquem resultados favoráveis, contemplando os seres humanos sempre com dignidade. Neste contexto, o presente trabalho destaca a portabilidade e a mobilidade da Televisão Digital como possibilidades de promoção para a hospitalidade social. São recentes os estudos e as pesquisas sobre Televisão Digital e hospitalidade, no Brasil. As tecnologias digitais apresentam novos ingredientes aos conceitos da hospitalidade, convergindo para a possibilidade do resgate do ser social, integrando e reforçando seus vínculos sociais no espaço tecnológico. Além da alta qualidade de som e imagem, a Televisão Digital é capaz de agregar inovações, como a portabilidade e a interatividade, ou ainda desenhar outras formas de preservar e manter a cultura. A combinação desses ingredientes permitirá uma maior participação dos telespectadores nos múltiplos cenários da sociedade. Isso possibilitará novas formas de ver e viver o espaço e o tempo, ampliando os vínculos sociais (hospitalidade social), contribuindo, inclusive, para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Os aparatos tecnológicos estão criando possibilidades de uma comunicação cada vez mais universalizada, conformando antigas fronteiras que, muitas vezes, impediam o livre e igualitário intercâmbio de informações e a troca de conhecimentos 344 entre os homens em seu ambiente social. E esses fatores se apresentam como estímulo para o desenvolvimento desta pesquisa. A escolha deste objeto foi motivada pelas áreas de atuação das autoras, sendo que ambas integram, respectivamente, o quadro de discentes e docentes do Programa de Pós- Graduação – Mestrado Profissional em Televisão Digital: Informação e Conhecimento, promovido pela Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FAAC/UNESP). 2 OBJETIVOS 2.1 GERAL Destacar a portabilidade e a mobilidade da Televisão Digital como possibilidades de promoção para a hospitalidade social. 3 METODOLOGIA A metodologia escolhida para este estudo consiste, especialmente, nas pesquisas exploratória, bibliográfica e documental, com a consulta em livros, revistas, periódicos, dissertações, teses e artigos científicos, relacionados aos temas: Televisão Digital, hospitalidade, relações humanas, comunicação, espaços públicos. Para a elaboração da dissertação de Mestrado em Televisão Digital: Informação e Conhecimento da FAAC/UNESP, além dos métodos já citados, utilizaremos a pesquisa qualitativa, com a observação sistemática, objetivando obter dados mais aprofundados sobre a questão que está sendo investigada. Assim, acreditamos, será possível avaliar aspectos múltiplos da realidade na qual os cidadãos estão inseridos. Em outras palavras, como observam Marconi & Lakatos (1999, p. 78), essa combinação metodológica “não consiste apenas em ver e ouvir, mas também em examinar fatos ou fenômenos que se desejam estudar”. Também é importante mencionar que há diversas formas de observação. Optamos pela sistemática, que acontece em condições e situações controladas, para responder a propósitos pré-estabelecidos. Desta forma o pesquisador tem conhecimento do que procura e do que é importante em determinados momentos e situações do cotidiano. 345 O universo da pesquisa, tais como amostragem, local, período, tratamento e apresentação dos dados estão sendo delimitados em conjunto com a orientadora, Profa. Dra. Maria Cristina Gobbi, justamente pela dissertação estar em fase de construção, à medida que avança a conclusão das disciplinas e orientações do Mestrado Profissional. 4 RESULTADOS ESPERADOS A evolução natural do homem permitiu avanços e a expansão dos seus conhecimentos, contemplando informações, contatos, trocas, comunicação, haja vista as interferências e exigências decorrentes da tecnologia. Os indivíduos devem enfrentar os desafios tecnológicos na busca de respostas e soluções que atendam a todos, de forma satisfatória e que minimizem as desigualdades sociais, culturais, políticas e econômicas presentes nas sociedades. Como aborda Sartori (2001, p. 16), “[...] é compreensível que qualquer inovação incomoda porque muda situações em que a sociedade humana está constituída”. Contudo, não se pode pensar que a tecnologia determina a sociedade. A tecnologia é resultado de pesquisas produzidas por pessoas e colocada à disposição das pessoas. Lévy (2007, p. 25) informa que: Uma técnica é produzida dentro de uma cultura, e uma sociedade encontrase condicionada por suas técnicas. E digo condicionada, não determinada. [...] Dizer que a técnica condiciona significa dizer que abre algumas possibilidades, que algumas opções culturais ou sociais não poderiam ser pensadas a sério sem sua presença. Castells (2002, p. 43) complementa: É claro que a tecnologia não determina a sociedade. Nem a sociedade escreve o curso da transformação tecnológica, uma vez que muitos fatores, inclusive criatividade e iniciativa empreendedora, intervêm no processo da descoberta científica, inovação tecnológica e aplicações sociais, de forma que o resultado final depende de um complexo padrão interativo. Na verdade, o dilema do determinismo tecnológico é, provavelmente, um problema infundado, dado que a tecnologia é a sociedade, e a sociedade não pode ser entendida ou representada sem suas ferramentas tecnológicas. 346 Além da tecnologia, tanto a informação quanto o conhecimento e a comunicação integram a era da chamada Sociedade da sociedade tem o enfoque, principalmente, na Informação. Esta possibilidade de conectividade, de compartilhamento, de processamento, armazenamento e transmissão das inúmeras informações. “[...] não só as informações se tornaram entrelaçadas como o próprio entrelaçamento gera conhecimento” (WEINBERGER, 2007, p. 125). Nas palavras de McLuhan em 1968, hoje a humanidade vive uma verdadeira “aldeia global”, onde tendências, opiniões, críticas, entre outros, são compartilhados igualmente. Contudo, ao mesmo tempo em que esta aldeia integra – que diminui distâncias em razão do uso da internet, computadores pessoais, ciberespaço, celulares, entre outros e da aplicação das Tecnologias da Informação e da Comunicação (conhecidas como TIC) – é também excludente. Basta pensarmos na exclusão digital, em que ainda, muitas pessoas não possuem acesso, por exemplo, à internet. A Sociedade da Informação está cercada pela convergência, pelo digital e comunidades. Surge, portanto, a partir da expansão das redes digitais, o ciberespaço, termo cunhado por Lévy (2007, p. 17), que significa: [...] (que também chamarei de “rede”) é o novo meio de comunicação que surge da interconexão mundial dos computadores. O termo especifica não somente a infra-estrutura material da comunicação digital, mas também o universo oceânico de informações que ela abriga, assim como os seres humanos que navegam e alimentam esse universo. Assim, o desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação implicam em uma nova cultura, um novo sistema de valores, de símbolos, de práticas, de atitudes, de compartilhamento, de criação coletiva, de convergência, ou, a cibercultura, também definida por Lévy (2007, p. 17) como sendo “[...] o conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço.” Sem dúvida alguma, o nosso mundo é cercado pelas telas do computador, da televisão, dos games, dos celulares (LIPOVETSKY; SERROY, 2009), sendo estas de todos os tamanhos, públicas, privadas, abertas, pagas e das imagens, em todos os lugares. 347 “Tudo se torna visualizado”, nos diz Sartori (2001, p. 08) e, da mesma forma, temos a capacidade de ver à distância. Assim acontece com a televisão, que nos oferece, de fato, a possibilidade de ver tudo sem a necessidade de irmos ao encontro das imagens de coisas reais. A televisão – como diz o próprio nome – consiste em “ver de longe” (tele), e portanto, levar à presença de um público de espectadores coisas para ver, quer dizer, visualmente transmitidas de qualquer parte, de qualquer lugar e distância. E na televisão o fato de ver predomina sobre o falar, no sentido que a voz ao vivo, ou de um locutor, é secundária, pois está em função da imagem e comenta a imagem (SARTORI, 2000, p. 15). A trajetória da televisão brasileira salienta que ela é o meio de comunicação mais importante devido a sua ampla cobertura e penetração em todas as camadas da população, além de ser uma fonte de informação e de participação na difusão da cultura e formação e reformulação da sociedade (MONTRESOL; SOUZA, 2009, p. 01), conforme corrobora Lopes (2004, p. 133): Está na TV o principal referencial cultural de milhões de pessoas. A exclusão de outras possibilidades e a diminuição de acesso às ações culturais tradicionais ou à vivência social em torno da TV são fatos insofismáveis, os quais atravessam o tecido social criando um novo paradigma de autor-reconhecimento e de identificação. A TV é, sem dúvida, o principal veículo formador dos mais recentes contratos de comunicação que conhecemos em nossa época. Contudo, após quase 60 anos de televisão analógica, hoje, graças à digitalização – que consiste no processo de conversão, transmissão e armazenamento de dados (imagem, texto, som) analógico em formato digital, através dos recursos da informática – chegamos à televisão digital, a qual está sendo implantada em nível nacional desde dezembro de 2007. Bolaño e Brittos (2007, p. 25) elucidam que a “[...] televisão digital apresentase como uma plataforma tecnológica capaz de realizar a convergência de inúmeros serviços de comunicações [...]”. Megrich (2009, p. 25-26) afirma que: [...] torna-se possível enxergar um leque de possibilidades presentes nos fundamentos da televisão digital que extrapola de longe quaisquer vislumbres de aproveitamento quando da consideração da TV analógica e de seus (parcos) recursos e potencialidades. 348 O Brasil, justamente por possuir a televisão analógica em 92,6% dos lares, segundo dados do Grupo de Mídia São Paulo (2008, p. 189), disponibiliza o sistema digital terrestre de forma gratuita. O artigo 4º do Decreto nº 5.820, de 29 de junho de 2006, que dispõe sobre a implantação do Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre (SBTVD-T), é muito claro e pertinente ao inferir que: “Art. 4º O acesso ao SBTVD-T será assegurado, ao público em geral, de forma livre e gratuita, a fim de garantir o adequado cumprimento das condições de exploração objeto das outorgas(BRASIL, 2006). Conforme o artigo 6º do mesmo Decreto: Art. 6º O SBTVD-T possibilitará: “I - transmissão digital em alta definição (HDTV) e em definição padrão (SDTV); II - transmissão digital simultânea para recepção fixa, móvel e portátil; e III – interatividade” (BRASIL, 2006). A interatividade é, ainda, cenário de muitos estudos e discussões entre academia, indústria, emissoras e este estudo, portanto, ficará a cargo da portabilidade e da mobilidade propostas pela TV digital. Assim sendo, a portabilidade permite “[...] a recepção em equipamentos portáteis em qualquer localidade, utilizando-se de celulares, televisores de mão ou computadores equipados com receptor de TV [...] estando parado ou em movimento” (DTV, 2009). Para Marques e Leite (2009, p. 630): [...] a portabilidade – componente de hardware ou software que os tornam capazes de ser utilizados em diferentes tipos de computadores, e eventualmente mediante pequenas modificações, possibilita carregar, acessar e se comunicar em diferentes plataformas, como ocorre com os games eletrônicos e aparelhos que funcionam com tecnologia wireless ou mesmo com a TV aberta, com sinal digital. Já a mobilidade é o conceito que capta os sinais de TV em dispositivos – celulares e mini-televisão – em movimento, dentro de ônibus, de trens, de carros, entre outros (DTV, 2009). A mobilidade é entendida por Ferraz (2009, p. 25) como: A capacidade de recepção em aparelhos móveis ou portáteis (ex., celulares) implica em outra forma diferenciada de assistir televisão. A recepção de TV em movimento, mesmo em altas velocidades, como em automóveis, ônibus, trens etc., diferencia-se pela qualidade, isto é, imagens estáveis tanto em 349 aparelhos de pequeno porte, como celulares, quanto em aparelhos instalados em meios de transporte a alta velocidade (ex., 200 km/h) – sabese que a recepção em movimento na TV analógica piora gradativamente ao passo em que as velocidades aumentam. Além desta melhoria da qualidade da imagem, a mobilidade da Televisão Digital terrestre brasileira tem a possibilidade de ser personalizada, isto é: Unindo-se o conteúdo audiovisual de qualidade, a mobilidade e a interatividade, é possível imaginar cenários de personalização en que cada usuário pode receber conteúdo orientado a localizações específicas, adaptado a suas preferências pessoas etc. Além disso, uma vantagem da TV móvel é que já se tem, desde o início, pelo menos um canal de interatividade possível, como, por exemplo, o canal de telefonia celular. Enfim, a TV digital móvel tem sido vista como uma grande oportunidade de novos negócios, tanto para emissoras quanto para operadoras de telefonia móvel (FERRAZ, 2009, p. 25). Assim, com a chegada da Televisão Digital, é possível que tenhamos novas formas de sociabilidade, pois poderá ser levada e assistida em qualquer lugar, em decorrência dos seus recursos de portabilidade e mobilidade. Tanto a portabilidade quanto a mobilidade da Televisão Digital brasileira segue permitindo a construção de laços sociais, ou, em um conceito mais amplo, a hospitalidade social nos espaços públicos. Por hospitalidade entende-se que “é o ritual básico do vínculo humano” (CAMARGO, 2004, p. 16), ou seja, desempenha a função primordial de estabelecer relacionamentos ou promover um relacionamento já estabelecido. A partir dos estudos mais específicos das escolas francesa, americana e brasileira, a hospitalidade possui quatro vertentes, também chamados de domínios: privada (doméstica), social (pública), comercial (profissional) e a virtual. Desta forma, a hospitalidade no domínio social (enfoque deste trabalho) se relaciona com as particularidades do contexto social estudado, em especial nos espaços públicos. Neste domínio, a satisfação, o prazer, o vínculo são obtidos simplesmente pelo fato de estar com o outro. Aqui também implica a necessidade de fornecer acessibilidade e legibilidade ao outro, para que este se sinta integrado, sendo que a hospitalidade social acontece “em decorrência do direito de ir-e-vir e, em conseqüência, de ser atendido em suas expectativas de interação humana”, conforme aponta Camargo (2004, p. 54). 350 Lashley (2004, p. 12) contribui com este raciocínio ao escrever que: Ao exprimir-se socialmente em espaços públicos, os indivíduos revelam tanto sua ligação com a sociedade quanto sua cultura e compreensão relativamente às normas comuns [...]. Além disso, as atividades de hospitalidade ajudam no desenvolvimento de laços sociais com terceiros e na satisfação subseqüente das necessidades especiais. Em que pese a relação entre TV e hospitalidade social, Wolton (1996) aborda que a televisão (e consequentemente a Televisão Digital) constitui-se um laço social quando o espectador assiste a um programa e sabe que outra pessoa o assiste também, simultaneamente. A Televisão Digital, portanto, potencializa a “humanização de espaços de trânsito como estações de trem, aeroportos, hotéis, cafés, centros comerciais, parques, praças públicas e todos os outros territórios onde todos os dias se cruzam, na riqueza de sua diversidade e pluralidade, os destinos individuais” (BAPTISTA, 2002, p. 162). Nestas portabilidade considerações, a Televisão Digital e as ferramentas de e mobilidade contribuem para tornarem os espaços públicos em lugares de reconhecimento, de possibilidades de encontro, de proximidade com o outro, enfim, de hospitalidade social. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A implantação da Televisão Digital em esfera nacional representa não só um progresso em comunidade termos de tecnologia, como também permite uma mais comunicativa, com o receptor da mensagem mais ativo, participativo e interativo inclusive na construção de laços de hospitalidade. Os avanços da comunicação humana foram e são necessários, pois modificam constantemente a vida de um indivíduo. Thompson (1998, p. 77) aborda que: O desenvolvimento de novos meios de comunicação não consiste simplesmente na instituição de novas redes de transmissão de informação entre indivíduos cujas relações sociais básicas permanecem intactas. Mais que isso, o desenvolvimento dos meios de comunicação cria novas formas de ação e de interação e novos tipos de relações sociais – formas que são bastante diferentes das que tinham prevalecido durante a maior parte da história humana. 351 Os usuários dos meios de comunicação e, consequentemente da Televisão Digital devem interagir com a tecnologia ofertada, na procura de criar um sentido em sua utilização. Mesmo com o avanço da tecnologia, a televisão analógica e agora a digital permitem criar o vínculo, o laço social, a sociabilidade, a hospitalidade social entre os seus espectadores e destes, com suas comunidades. ABSTRACT The Digital Television in phase of implantation in Brazil is an expanded and interaction between different areas of research and knowledge, such as information management, technology, education, communication, and especially the hospitality, for together, seek favorable results, considering the human beings with dignity. In this context,this paper ditach the portability and mobility of Digital Television as opportunities for promotion to the social hospitality. The researchs on Digital Television and hospitality are recent in Brazil. The digital technologies add news concepts to hospitality, converging to the possibility of redemption of the social being, integrating and strengthening social ties in the technological space. The methodology chosen for this study consists of exploratory research, literature and documents with the consult in books, magazines, periodicals, dissertations, theses and papers related to the topics: Digital Television, hospitality, human relations, communication, public spaces. Thus, with the Digital Television, we may have new forms of sociability, because may be required and assisted in any place, as a result of their actions for portability and mobility, which allows the construction of social ties or na ample concept the hospitality social in public spaces. The relationship between TV and social hospitality, Wolton (1996) says that television (and Digital Television) consists of a social bond as the viewer watches a program and know someone else also attends the same time. The introduction of Digital Television, as well as technological progress, it also allows a more communicative community, with the recipient of the message more active, participatory and interactive even build ties of hospitality. Under these considerations, the Digital Television and tools for portability and mobility contribute to make the public spaces in places of recognition, networking opportunities, proximity to each other and, finally, social hospitality. Keywords: Digital Television.Portability. Mobility. Hospitality. REFERÊNCIAS BAPTISTA, I. Lugares de hospitalidade. In: DIAS, C. M. M. (Org.). Hospitalidade: reflexões e perspectivas. Barueri: Manole, 2002. p. 157-164. 352 BOLAÑO, C. R. S.; BRITTOS, V. C. A televisão brasileira na era digital: exclusão, esfera pública e movimentos estruturantes. São Paulo: Paulus, 2007. BRASIL. Decreto nº 5.820, de 29 de junho de 2006. Dispõe sobre a implantação do SBTVD-T, estabelece diretrizes para a transição do sistema de transmissão analógica para o sistema de transmissão digital do serviço de radiodifusão de sons e imagens e do serviço de retransmissão de televisão, e dá outras providências. 2006. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Decreto/D5820.htm>. Acesso em: 16 fev. 2010. CAMARGO, L. O. L. Hospitalidade. São Paulo: Aleph, 2004. CASTELLS, M. A sociedade em rede: a era da Informação: economia, sociedade e cultura. 6. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002. v. 1. DTV. Glossário da TV digital: TV móvel.Disponível em: <http://www.dtv.org.br/materias.asp?menuid=3&id=1>. Acesso em: 16 fev. 2010. .Glossário daTV digital: TV portátil. Disponível em: <http://www.dtv.org.br/materias.asp?menuid=3&id=1>. Acesso em: 16 fev. 2010. FERRAZ, C. Análise e perspectivas da interatividade na TV digital. In: SQUIRRA, S.; FECHINE, Y. (Org.). Televisão digital: desafios para a comunicação. Porto Alegre: Sulina, 2009. p. 15-43. GRUPO DE MÍDIA SÃO PAULO. Mídia dados 2008: anuário de Mídia do Grupo de Mídia São Paulo. São Paulo: Porto Palavra Editores Associados, 2008. LASHLEY, C. Para um entendimento teórico. In: LASHLEY, C.; MORRISON, A. (Org.). Em busca da hospitalidade: perspectivas para um mundo globalizado. Barueri: Manole, 2004. p. 01-24. LÉVY, P. Cibercultura. 6. ed. São Paulo: Ed. 34, 2007. LIPOVETSKY, G.; SERROY, J. A tela global: mídias culturais e cinema na era hipermoderna. Porto Alegre: Sulina, 2009. LOPES, L. C. O culto às mídias: interpretação, cultura e contratos. São Carlos: EdUFSCar, 2004. 353 MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Técnicas de pesquisa: planejamento e execução de pesquisas, amostragens e técnicas de pesquisa, elaboração, análise e interpretação de dados. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1999. MARQUES, J. A.; LEITE, E. TV Digital: mobilidade democrática ou impositiva?. In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE TELEVISÃO DIGITAL, I., 2009. Anais... Bauru: SIMTVD, 2009. p. 629-649. Disponível em: <http://www2.faac.unesp.br/pesquisa/lecotec/eventos/simtvd/anais/MARQUES%3b% 20L EITE%20%20TV%20Digital%20mobilidade%20democr%e1tica%20ou%20impositiva%20(629649).pdf>. Acesso em: 16 fev. 2010. MEGRICH, A. Televisão digital: princípios e técnicas. São Paulo: Érica, 2009. MONTRESOL, E. C. R.; SOUZA, T. M. M. M. Publicidade interativa na televisão digital.In: FÓRUM CIENTÍFICO FEMA, II., 2009. Anais... Assis: FEMA, 2009. SARTORI, G. Homo videns: televisão e pós-pensamento. Bauru: EDUSC, 2001. SOUZA, T. M. M. M.; GOBBI, M. C. Televisão digital e hospitalidade: reflexões iniciais. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, 32., 2009. Anais...Curitiba: Intercom, 2009. Disponível em: <http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-2431-1.pdf>. Acesso em:16 fev. 2010. THOMPSON, J. B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. Petrópolis: Vozes, 1998. WEINBERGER, D. A nova desordem digital. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. WOLTON, D. Elogio do grande público: uma teoria crítica da TV. São Paulo: Ática, 1996. 354 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura ANÁLISE PRELIMINAR DOS ITENS DA ESCALA DE REAÇÕES DO ESTRESSE NO TRÂNSITO1. Thelma Margarida de Moraes dos Santos2, Hugo Ferrari Cardoso3, Marcelo Mendes dos Santos4 RESUMO A Avaliação Psicológica no BrasIl tem enfrentado vários desafios nas últimas décadas e agrupadas nos seguintes eixos: entender as diversas faces do ensinar as técnicas de exame psicológico, rever a fundamentação teórica das medidas, investigar as qualidades psicométricas das técnicas empregadas na formação e atuação profissional e construir instrumentos válidos e precisos tendo a população brasileira como referência.Sendo assim estas questões também assolam a avaliação pericial para a obtenção de carteira de habilitação, iluminada pelas discussões relativas aos fazeres do Psicólogo no contexto do trânsito. Entretanto entre as mais variadas temáticas colocadas para o profissional avaliar no trânsito um dos pontos principais trata-se dos estressores e comportamentos externalizantes presentes no motorista. Dessa forma esta pesquisa analisou os itens de uma medida psicológica e que foram construídos para verificação de respostas ao estresse e direção veicular. Refere-se a uma pesquisa quantitativa sendo os participantes 450 pessoas, de ambos os sexos, com diversas categorias de carteira de habilitação. O instrumento utilizado foi a Escala de Reações ao Estress composta por 65 itens, do tipo Likert e com cinco pontos. A coleta de dados foi realizada individualmente mediante a assinatura de Termo de Livre Consentimento Esclarecido e analisado a luz da matriz de correção e análise fatorial exploratória. Os principais resultados apontam que a escala apresenta-se sensível a análise fatorial, sendo que o teste KMO indicou a possibilidade de fatoração. Dos 65 itens originais ficaram 17 e agrupados em quatro categorias de reações: físicas, psicossomáticas, cognitivas e agressivas. Finalmente a análise preliminar dos itens possibilitou a verificação de como o construto (reações ao estresse) se apresenta em uma medida. Os autores desta pesquisa indicaram como limitação do estudo que os itens construídos não evidenciaram as reações eminentemente emocionais, se constituindo esta questão uma oportunidade para outros estudos com o instrumento em questão. Palavras – chave : Avaliação Psicológica. Análise de Itens. Reações ao Estresse. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Professora Integral da Universidade Sagrado Coração – USC, Bauru/São Paulo/Brasil. Mestre em Avaliação Psicológica pela Universidade São Francisco – Itatiba/São Paulo/Brasil. 3 Professor convidado do curso de Especialização em Psicologia do Trânsito da Universidade Sagrado Coração - USC, Bauru/SP/Brasil. Mestre em Avaliação Psicológica pela Universidade São Francisco – Itatiba/São Paulo/Brasil. 4 Professor Integral da Universidade Sagrado Coração – USC, Bauru/São Paulo/Brasil. Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas/São Paulo/Brasil. 355 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura INTERATIVIDADE EM AMBIENTE VIRTUAL CONTRIBUIÇÕES DE UMA EXPERIMENTAÇÃO1. DE APRENDIZAGEM: Vanessa Matos dos Santos2 Maria Teresa Miceli Kerbauy3 RESUMO A relação existente entre o homem e a tecnologia - na qual os papéis de dominador e dominado estão constantemente sendo debatidos - a humanização da técnica é o componente capaz de garantir a apropriação social da tecnologia. Nesse sentido, esta humanização pode ser alcançada à medida que a tecnologia passa a transformar o processo da comunicação e, por conseguinte, passa a contribuir para o crescimento e desenvolvimento educacional do homem. Fala-se, portanto, em tecnologias comunicacionais – isto é, tecnologias que se prestam a facilitar o processo comunicacional entre os sujeitos. No âmbito da comunicação mediada, o computador e a internet, juntos, são capazes de permitir uma espécie de ambiência social mediada e, desta forma, também terminam por possibilitar que o homem experiencie a imersão num ambiente virtual de comunicação. Juntando-se às possibilidades oferecidas pelos ambientes virtuais a necessidade crescente de educação continuada no cenário da Sociedade Aprendente, forma-se o cenário de desenvolvimento dos Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA). Conforme as tecnologias da informação e comunicação se desenvolvem, também os ambientes virtuais de aprendizagem avançam, pois incorporam o potencial tecnológico da sociedade. O presente artigo analisa, através dos estudos de interatividade, os comportamentos interacionais dos Sujeitos imersos num AVA como ponto de apoio para o desenvolvimento educacional. Palavras-chave: Ambiente virtual de aprendizagem. Interação. Interatividade. 1 INTRODUÇÃO A comunicação é, antes de tudo, uma interação entre sujeitos semelhantes. Não ocorre no sentido de um indivíduo somente, mas existe a interação criada entre 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Educação Escolar da Faculdade de Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Campus de Araraquara. Mestre em Comunicação pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil (2007). Jornalista - Chefe de Reportagem da Televisão Universitária Unesp. Docente da Universidade Sagrado Coração. 3 Doutora em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Brasil (1992). Professor Colaborador da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. 356 os indivíduos. Isto é, o indivíduo se integra e passa a fazer parte da comunicação. Enquanto parte integrante do sujeito, a comunicação é essencial para vida em sociedade e, como tal, à medida que o homem se desenvolve esta também se transforma, juntamente com a técnica e a tecnologia do momento histórico. A técnica é traduzida como uma habilidade específica para se fazer algo (aptidões entendidas como intransferíveis, tal como no mundo grego) enquanto que a tecnologia visa à produção com base em processos lucrativos, reproduzíveis rapidamente. A relação existente entre o homem e a tecnologia - na qual os papéis de dominador e dominado estão constantemente sendo debatidos - a humanização da técnica é o componente capaz de garantir a apropriação social da tecnologia. Nesse sentido, esta humanização pode ser alcançada à medida que a tecnologia passa a transformar o processo da comunicação. Fala-se, portanto, comunicacionais – isto é, tecnologias que se prestam em tecnologias a facilitar o processo comunicacional entre os sujeitos. Para cada momento específica histórico houve uma tecnologia comunicacional que traduzia o período, conforme as modificações da sociedade; inicialmente, o homem utilizou- se da tecnologia do alfabeto, que alterou a sua maneira de estruturar pensamentos, seguida da tecnologia do livro, rádio, TV etc. até alcançarmos o computador e a internet na arquitetura de uma sociedade tecnológica. Castells (2002, p.108) esclarece que é necessário atentarmos para o fato de que estamos vivendo uma revolução tecnológica; porém “A primeira característica do novo paradigma é que a informação é sua matéria-prima: são tecnologias para agir sobre a informação, não apenas informação para agir sobre a tecnologia, como foi o caso das revoluções tecnológicas anteriores”. O novo ambiente comunicacional digital obriga-nos a desenvolver novas linguagens e termina por propiciar novas formas de sociabilidade e aprendizagem. Uma vez inseridos no contexto da problemática, não conseguimos, por vezes, o distanciamento necessário a uma pesquisa científica, razão de nosso atraso no tocante a algumas questões contemporâneas, como as novas formas de comunicação e suas possibilidades nos mais variados campos do saber. Nas palavras de Dominique Wolton (2003, p.33), o que realmente se verifica é a “evolução do modelo cultural de comunicação”, mudanças não ou seja, as ocorrem, necessariamente, segundo a velocidade das novas 357 tecnologias e sim, de acordo com a cultura em geral. Neste sentido, portanto, podemos destacar a iminência de novos paradigmas para entender o processo de comunicação na contemporaneidade. Para tanto, destacamos, por exemplo, o paradigma das redes de comunicação com a contrapartida cultural da cibercultura. As modificações da sociedade refletem-se em todos os campos da vida cotidiana e da organização das atividades humanas, de forma que a comunicação em seu aspecto social - também sofre re-configurações, uma vez que se insere num contexto sócio-cultural mais amplo, traduzindo a interação homem - mundo. Esta interação homem-mundo pressupõe um tipo específico de comunicação, podendo esta segunda ser direta (face-a-face) ou mediada por algum suporte tecnológico (televisão, computador). No âmbito da comunicação mediada, o computador e a internet, juntos, são capazes de permitir uma espécie de ambiência social mediada e, desta forma, também terminam por possibilitar que o homem experiencie a imersão num ambiente virtual de comunicação. Juntando-se às possibilidades oferecidas pelos ambientes virtuais a necessidade crescente de educação continuada no cenário da Sociedade Aprendente, forma-se o cenário de desenvolvimento dos Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA). Estes ambientes são também chamados de plataformas de ensino a distância, vez que são usados nos mais variados tipos de projetos envolvendo educação4 a distância. Conforme as tecnologias da informação e comunicação se desenvolvem, também os ambientes virtuais de aprendizagem avançam, pois incorporam o potencial tecnológico da sociedade. Finalmente, o desenvolvimento dos AVA ampara-se nos processos de comunicação e seu sucesso depende da eficácia dos mesmos. O estudo minucioso desta questão pode revelar outras potencialidades das novas tecnologias e, conforme já exposto, novas formas de interação (sociabilidade), e novas formas 4 Optou-se aqui pela terminologia Ensino a Distância em detrimento de Educação a Distância por conta da diferença que deve ser considerada entre educação e ensino. De acordo com Fétizon e Minto (2008), o conceito de educação é mais abrangente do que o de ensino: a educação é um processo social que se relaciona ao instrumental de que o grupo humano dispõe para promover a autoconstrução da humanidade de seus membros; enquanto que o conceito de ensino diz respeito à forma sistematizada, organizada e didaticamente estruturada com vistas à seleção de conteúdos e métodos – de trabalho pedagógico, que é adotada com o objetivo de disponibilizar, a todos os membros da sociedade, as informações, os conhecimentos e as teorias que já compõem um acervo de saberes que, por sua vez, é patrimônio da humanidade. O ato de ensinar está, portanto, contido no ato de educar, sendo este último um conceito mais amplo. 358 de gerir o conhecimento e a informação baseadas em um media. Trata-se, pois, de um novo paradigma para o estudo da comunicação midiática. Trata-se do que André Lemos (2004) chama de paradigma de redes, típico da cibercultura. O imaginário da cibercultura ordenação possibilita da uma nova maneira de estruturação informação e conhecimento. Kenski do pensamento (2008) praticamente impossível dissociar educação e comunicação, afirma que e é porque as novas tecnologias são capazes de promover – e em muitos aspectos até suscitar – novos saberes. O suporte tecnológico – aqui traduzido como AVA – propicia que ensino possa ser mediado por uma máquina e a questão da interatividade ganha especial importância, vez que diminui a possível sensação de isolamento e favorece a troca de experiências multiculturais. As propriedades interativas do canal (e também ambiente) comunicacional é que vão determinar o grau de interatividade por eles proporcionados. Além do mais, a interatividade garante a rapidez das respostas dos professores ou tutores às dúvidas dos alunos e vice-versa (feedback), fazendo com que o aluno consiga progredir mais rapidamente. Porém, implementados, para que projetos desta natureza torna-se necessário o desenvolvimento possam ser de experimentações científicas – e, neste sentido, este artigo configura-se como uma experiência piloto com o uso de AVA na disciplina “Teorias da Comunicação” do Programa de PósGraduação em Comunicação Midiática da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (FAAC), Unesp, C. Bauru. O Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) utilizado na experimentação foi o TelEduc, desenvolvido pelo Instituto de Computação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), em razão da sua qualidade, bem como a proximidade geográfica de suporte técnico. O TelEduc é um ambiente bastante intuitivo e, além de possuir uma interface amigável, também dispõe de uma função crucial para o desenvolvimento desta pesquisa: a ferramenta intermap (interaction map) que é capaz de construir, computacionalmente, mapas interacionais (sociogramas). O TelEduc desempenha aqui – basicamente – a função de ambiente virtual no interior do qual ocorrem as interações entre os sujeitos. Busca-se, como objetivo geral, compreender e analisar as interações ocorridas no AVA TelEduc, tendo por base o conceito de interatividade desenvolvido por Steuer (1993) e a classificação proposta por Sheizaf Rafaeli (1988). 359 2 ANALISANDO A INTERATIVIDADE EM AMBIENTE APRENDIZAGEM: CONTRIBUIÇÕES DE RAFAELI E STEUER VIRTUAL DE As várias conceituações sobre o que vem a ser interatividade privilegiam o modelo clássico emissor - mensagem - receptor. No caso do modelo aqui tratado, proposto por Sheizaf Rafaeli (1988), um componente é adicionado ao processo: o feedback. Isto ocorre, em especial porque, na visão do autor, os avanços nas ciências da comunicação, se considerados apenas pelo viés tecnológico, privilegiaram questões técnicas como, por exemplo, o aumento da largura de banda, ignorando por vezes o viés sociológico e comunicacional. Para Van Dijk e De Vos (2000), a interação - ainda que seja freqüentemente trocada por interatividade - pode ser considerada uma parte especial da comunicação. Os autores seguem ressaltando a razão das inversões de termos: In communication science the concept interaction - notably replaced by the term interactivity - is a special part of communication. Communication scientists are referring to forms and patterns of communication that are not interactive, such as the traditional press and broadcasting. This inversion can be explained by the adoption of the most common object of communication science: the study of communication means. Though it observes these means both in mediated and face-to-face communication, the prominence of media has always remained dominant in this discipline, particularly when it deals with interactivity. A origem do termo interatividade remonta do neologismo inglês interactivity e a massificação de seu uso se deu a partir dos anos de 1960 para denominar os avanços comunicacionais impulsionados pelo desenvolvimento da tecnologia computacional. Embora tenha sido impulsionada pelas Novas Tecnologias da Informação e Comunicação (NTIC), a interatividade é muito anterior a elas. Rafaeli (1988, p. 112) explica que a interação foi alvo de estudo da Sociologia e da Comunicação e era vista por alguns sociólogos, a exemplo de Bale (apud RAFAELI, 1988) e Goffman (apud RAFAELI, 1988), como um veículo através do qual a interação se tornava possível; assim as pessoas se envolviam em processos interacionais e, de acordo com tal pensamento, a comunicação era uma subdivisão da interação. Com a comunicação subindo para o primeiro plano, a interação passou a ser uma subdivisão de uma área maior e novos estudos passaram adotar um outro foco 360 no qual a comunicação figurava na centralidade do processo. Assim, Rafaeli (1988, p. 116) explica que o estudo de processos de comunicação bilateral e reativa (estímulo) constitui-se em um verdadeiro fenômeno. No entanto, nenhum desses processos devem ser confundidos com interatividade. “Interactivity is even further advanced” e, como tal, um campo em estudo. Do ponto de vista sociológico, no entanto, trata-se da potencialização da reciprocidade no processo comunicacional. Rafaeli (1988, p. 116), explica que a reciprocidade não tem, necessariamente, um reflexo direto nas relações sociais: This technical tit - for - tat reciprocity, however, does not have an obvious reflection on the social relations involved. Even taken together, the technological improvements should not be mistaken as providing or even regulating interactivity. Uma vez que o avanço tecnológico também não deve ser compreendido como um possibilitador ou mesmo regulador da interatividade, então a essência do conceito em questão estaria na compreensão do modelo proposto pelo autor com base em três níveis de comunicação, sendo eles: comunicação bidirecional (two-way communication), comunicação reativa (reactive communication) comunicação plenamente interativa (interactive communication). Figura 1 - Fluxo comunicacional de Rafaeli Fonte: Rafaeli (1988, p. 120) e 361 Legenda P = Sujeito A O = Sujeito B M1 = Mensagem 1 M2 = Mensagem 2 M3 = Mensagem 3 M4 = Mensagem 4 M5 = Mensagem 5 A primeira situação tratada por Rafaeli (1988) demonstra a comunicação face a face; neste modelo o Sujeito A (P) transmite uma mensagem (M1) para o Sujeito B (O), este último por sua vez a recebe e transmite uma mensagem (M2) para o Sujeito A (P) – sempre num processo contínuo. A comunicação reativa, por sua vez, pressupõe que a mensagem (M1) emitida pelo Sujeito A (P) é incorporada pelo Sujeito B (O) que a elabora para, então, emitir outra mensagem (M2). O processo da comunicação interativa, no entanto, pressupõe uma incorporação de mensagens anteriormente emitidas que vão se somando ao processo comunicativo, daí a razão da marcação M3/M2/M1. Isto é, houve uma incorporação das mensagens 1, 2 e 3 que resulta na emissão de uma mensagem 4 (nova) que, por sua vez, também será somada ao processo. Assim, a comunicação unidirecional face a face pode ser reconhecida no fluxo de transmissão de informação. A segunda, comunicação reativa exige, além da característica da primeira, também que as mensagens presentes refiram-se, ou seja, são coerentes com as mensagens anteriores. Isto é, deste modo ocorre uma reação a um estímulo. Já a comunicação plenamente interativa difere da reativa porque, além de incorporar referenciais de conteúdo, natureza e formato, exige que a mensagem atual corresponda a uma seqüência de mensagens anteriores. Ou seja, trata-se de resgatar a seqüência da mensagem inicial. Aqui é possível fazer um resgate de Lévy (2003, p. 80) para quem “[...] a possibilidade de apropriação e de personalização da mensagem recebida” é um ponto importante na determinação do nível de interatividade do dispositivo de comunicação em questão. A interatividade pode ser explicitada, então, na concepção de Rafaeli (1988), no feedback que estabelece relações tanto com mensagens anteriores 362 quanto com o trajeto que estas mesmas mensagens estabeleceram com outras que as precederam. É um processo contínuo de reapropriação e reaproveitamento da mensagem; somente o feedback por si não possibilita interatividade. E, neste sentido, nem toda reação é necessariamente feedback. A reação pressupõe uma resposta instantânea enquanto que o feedback pressupõe um processamento do estímulo para, então, emitir o retorno.Para este estudioso, quando não há apropriação (e conseqüente reaproveitamento) da mensagem anterior pela posterior, então tudo o que houve foi reação a um estímulo. Embora a prerrogativa de percepção dessa característica esteja a cargo de cada comunicador envolvido no processo, fica claro pela citação de Rafaeli (1988) que a interatividade estabelece conexão com todos os outros componentes do modelo teórico informacional - podendo ser o emissor (pessoa) ou, por exemplo, o canal (máquina). A interatividade não significa necessariamente dupla via de comunicação (pressuposto do diálogo). Se assim fosse, o telefone seria o principal exemplo de meio de comunicação interativo, pois, permite o diálogo e a reciprocidade em tempo real, assim como acontece com videogames, hiperdocumentos e hipertextos. No entanto, no primeiro caso, a comunicação (e interação) se estabelece com uma pessoa enquanto que no segundo caso a mesma se dá com uma matriz de informações. Neste segundo caso, a interatividade é diferenciada porque, segundo Lévy (2003, p. 80) remete ao “virtual”, a uma outra forma de estar, porém não estando. Steuer (1993, p. 6) explica que: “Presence is defined as the sense of being in an environment”, enquanto experience que “Telepresence is defined as the of presence in an environment by means of a communication medium”. Isto é, a telepresença pode ser entendida como a experiência da presença mediada por um suporte comunicacional. Assim, a presença refere-se a percepção natural de um ambiente enquanto que a telepresença refere-se a uma percepção mediada do ambiente. Em síntese, a primeira situação remete ao físico enquanto que a segunda se desprende da materialidade para privilegiar os sentidos. Com a telepresença é possível estar em um local (porque existe o sentimento e a percepção de que isto ocorre), estando fisicamente em outro lugar 363 geográfico. Tal experiência se torna possível diante das possibilidades das mediações comunicacionais. Na concepção de Steuer (1993), a interatividade, juntamente vivacidade, é uma categoria formativa da telepresença. o autor: “[...] and interactivity refer only to the representational vividness No entanto, da alerta powers of the technology”. Ou seja, tanto a vivacidade como a interatividade devem ser pensadas sob o ponto de vista da tecnologia. Já a interatividade - nosso foco - se traduz, na concepção do Steuer (1993, p. 14) como "Interactivity is defined as the extent to which users can participate in modifying the form and content of a mediated environment in real time”. É possível perceber aqui a convergência de idéias entre Lévy (2003) e Steuer (1993), ainda que o primeiro priorize o aspecto social da interatividade e o segundo adote como parâmetro o viés tecnológico. Para Steuer (1993, p, 14) a interatividade “[...] é uma variável direcionada pelo estímulo e determinada pela estrutura tecnológica do meio de comunicação”. Em linhas gerais, a telepresença é um estágio tecnologicamente proporcionado para potencializar as ações humanas. 3 MÉTODO Os estudos em ciências sociais são ainda muito recentes quando comparados às outras áreas do saber, fazendo com que muitas pesquisas sociais adquiram um caráter pioneiro. As transformações sociais resultantes da inserção das novas tecnologias da informação e comunicação no cotidiano também têm reflexos nas pesquisas científicas, de forma que pesquisas relacionadas à área das NTIC são, em sua grande maioria, consideradas pesquisas exploratórias. A pesquisa exploratória é, sobretudo, um estudo que visa contribuir com o desenvolvimento de trabalhos futuros na área. Exatamente por essa característica, abre espaço para o papel da interdisciplinaridade na tentativa de buscar explicações científicas para os fenômenos sociais recentes. A complexidade do momento atual não permite mais um olhar singular sobre a realidade; a pluralidade se faz necessária e urgente. Conforme a classificação proposta por Selltiz (1974, p. 69), esta pesquisa é realizada sob a forma de uma experiência. O termo experiência, segundo a autora, não contempla os aspectos desta pesquisa. Os estudos de experiência fornecem um estudo das melhores 364 práticas em determinado campo ou situação. “Sua utilidade decorre da apresentação de intuições e de práticas eficientes, e não da apresentação do ‘típico’”. Esta pesquisa valeu-se da utilização de um Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) para o estudo do processo de comunicação em ambiente virtual. O Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) utilizado foi o TelEduc, desenvolvido pelo Instituto de Computação da Universidade (UNICAMP), em razão da sua qualidade, bem como de Campinas a proximidade geográfica de suporte técnico. O TelEduc desempenha aqui – basicamente – a função de ambiente virtual no interior do qual ocorrem as interações entre os sujeitos. Os sujeitos dessa experiência são alunos ingressantes no mestrado em comunicação midiática no ano de 2006, regularmente matriculados na disciplina Teorias da Comunicação ministrada na pós-graduação. Esse grupo de alunos foi submetido à experiência com o ambiente TelEduc para posterior análise do processo de comunicação ocorrido em ambiente virtual. A coleta de dados para a experiência foi realizada através de duas técnicas: análise de interações no ambiente virtual e questionários (inicial e final). As interações ocorridas são analisadas, quantitativamente, com o auxílio de uma ferramenta do ambiente TelEduc denominada intermap (interaction map), que é capaz de construir, computacionalmente, mapas interacionais (sociogramas). A análise de sociogramas privilegia as interações em ambiente virtual. No entanto, cabe destacar a afirmação de Selltiz (1974, p. 301) de que: “Fundamentalmente, a sociometria não é tanto um processo de coleta de dados quanto uma focalização em determinado tipo de assunto, e um método de análise ligado a esse assunto”. Desta forma, será possível verificar quais foram as dificuldades encontradas pelos alunos e verificar se existe relação com as interações no ambiente virtual (através do Intermap). Busca-se, também, verificar se existe a comprovação da hipótese desta pesquisa de que as possibilidades interativas oferecidas pelo ambiente virtual ao sujeito e a interação entre os sujeitos contribui para melhorar e tornar mais efetiva a comunicação. 4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS 365 Para a análise das interações ocorridas com o uso da ferramenta “fórum de discussão” do ambiente virtual de aprendizagem TelEduc foram selecionados quatro fóruns de discussão assim nomeados: “genealogias do virtual”, “grupo B”, “direitos à comunicação” e “pensar a comunicação”, escolhidos pela freqüência de participação dos componentes de seus grupos. Tabela 01 – Fluxos de comunicação do grupo “Genealogias do Virtual” Aluno Aluno X Aluno Y Aluno W Aluno Z Mensagem inicial de um assunto 2 0 10 1 Resposta de mensagem inicial 3 4 6 2 Mensagem de segundo nível ou 1 2 3 1 Mensagem de terceiro nível ou 2 2 3 1 Mensagem de segundo nível ou 1 2 3 0 2 2 Mensagem de terceiro nível ou 4 1 2 1 1 0 Tabela 02 – Fluxos de comunicação do grupo “B” Aluno Aluno A Aluno B Aluno C Aluno D Aluno E Aluno F Mensagem inicial de um assunto 1 1 1 0 5 1 Resposta de mensagem inicial 5 3 5 1 3 2 Tabela 03 – Fluxos de comunicação do grupo “Direitos à Comunicação” Aluno Aluno A Aluno B Aluno C Aluno D Mensagem inicial de um assunto 0 0 1 1 Resposta de mensagem inicial 2 1 0 0 Mensagem de segundo nível ou 2 1 0 0 Mensagem de terceiro nível ou 0 0 0 0 Tabela 04 – Fluxos de comunicação do grupo “Pensar a comunicação” Aluno Aluno A Aluno B Aluno C Mensagem inicial de um assunto 2 3 0 Resposta de mensagem inicial 0 1 1 Mensagem de segundo nível ou 0 1 1 Mensagem de terceiro nível ou 0 0 0 Nas tabelas 01, 02, 03 e 04 a mensagem inicial de assunto equivale à comunicação bidirecional (ou, neste caso, multidirecional, pois é emitida para todos os componentes do grupo), as respostas de mensagem inicial 366 representam a soma das mensagens de segundo nível e mensagens de terceiro nível. Serão efetivamente interativas, segundo Rafaeli (1988, p.120), somente as mensagens de terceiro nível, vez que incorpora referenciais de conteúdo, natureza e formato e exige que a mensagem atual corresponda a uma seqüência de mensagens anteriores, formando um desenho similar a uma árvore e suas ramificações. As tabelas 01 e 02 mostram fóruns nos quais pôde-se verificar a existência de comunicação interativa, isto é, a comunicação ocorrida entre os membros do grupo foi capaz de ultrapassar o nível reativo, o que é indicado pelo maior número de interações no sociograma (vide sociogramas 01 e 02). A mesma situação, no entanto, não pode ser verificada nas tabelas 03 e 04, pois nestes casos, a comunicação permanece somente no nível reativo da comunicação, o que pode ser verificado nas interações dos sociogramas, como pode ser verificado nos sociogramas 03 e 04. Sociograma 1 – Mapa das interações gerais ocorridas no grupo da tabela 4 367 Sociograma 2 – Mapa das interações gerais ocorridas no grupo da tabela 5 Sociograma 3 – Mapa das interações gerais ocorridas no grupo da tabela 6 368 Sociograma 4 – Mapa das interações gerais ocorridas no grupo da tabela 7 É possível concluir que o ambiente virtual de aprendizagem TelEduc constitui-se num ambiente que explora as possibilidades oferecidas pelas redes telemáticas, sem no entanto, poder ser considerado totalmente interativo. No entanto, não se trata somente de contabilizar as mensagens ocorridas em algumas ferramentas que possibilitam interação no ambiente virtual. Mesmo porque, se para Rafaeli (1988) as mensagens é que merecem o título de interativas ou não, para autores como Lévy (2003), os meios de comunicação é que oferecem possibilidades consideradas mais ou menos interativas, decorrendo dessa constatação o termo mídias interativas. Lévy (2003, p. 82), explica que o grau de interatividade de uma mídia ou dispositivo de comunicação eles: possibilidades pode ser medido com base em eixos, sendo de apropriação e de personalização da mensagem, reciprocidade da comunicação, acesso à virtualidade, implicação da imagem dos participantes na mensagem e, o ponto máximo da interatividade: a telepresença. No âmbito do TelEduc podemos afirmar que o ambiente permitiu apropriação de mensagens, mas não necessariamente a personalização das mesmas. O canal e o desenho do curso permitiram que houvesse reciprocidade de comunicação, melhorando a disseminação informacional, pois o ambiente facilitava a emissão de mensagens do tipo todos – todos, o que 369 favoreceu a interação em ambiente virtual, conforme podemos verificar no sociograma abaixo. Sociograma 5 – Interações gerais com destaque para as mensagens emitidas pelo docente da disciplina “Teorias da Comunicação”. O uso do ambiente em si já possibilita o acesso à virtualidade, ainda que esta ainda mereça ser re-pensada, vez que só configura como um desafio. A implicação de imagens também foi contemplada através da ferramenta Perfil na qual os alunos se apresentavam e anexavam suas fotos. 5 CONCLUSÃO A emergência da virtualidade abre possibilidades novas de interação e interatividade, evitando o desânimo e a desmotivação. O esforço realizado por pesquisadores desta pesquisa em busca do entendimento do processo de comunicação nesse interdisciplinaridade, novo ambiente faz com que se lance mão da vez que uma única área do conhecimento não conseguiu explicar todos os fenômenos ocorridos. A virtualidade “palpável” possibilitada pela Internet traz para a cena a questão da sincronicidade do processo de comunicação mediada.Com as tecnologias informacionais as oportunidades conectivas são ampliadas e o sujeito tem a possibilidade de dispor de um leque de informações. 370 Aqui entra o papel do professor /orientador como um guia; cabe ao professor a tarefa de guiar os alunos às informações necessitadas nos momentos em que serão úteis, para propósitos específicos. Através de ferramentas específicas (o portfolio, no caso do TelEduc), os AVA permitem que os alunos tenham a oportunidade de disponibilizar suas atividades para o grupo e também para o professor. É através desse compartilhamento de informações que se cria uma memória coletiva - fruto de uma atividade de construção informacional e conhecimento criado pelos próprios membros da comunidade. Por esta razão, a memória coletiva se destaca exatamente por sua característica mutável. Assim sendo, o ponto fundamental para o desenvolvimento da ambiência (também nos AVA) é o estudo virtual da dinâmica comunicacional, bem como dos espaços virtuais. A interface textual do ambiente virtual de aprendizagem TelEduc facilitou a navegação do aluno e possibilitou a interação nesse ambiente. No entanto, interação em ambiente virtual não significa, necessariamente, comunicação em ambiente virtual. Diferentes formas de interação pressupõem diferentes formas de comunicação. Em linhas gerais, a interatividade – pedagógica e comunicacional – é responsável pelo sucesso ou fracasso do processo de comunicação neste novo ambiente virtual. E, de fato, quanto maior a interação entre os sujeitos, melhor a comunicação. Se o sujeito não interage, consequentemente, não se comunica. A comunicação, por sua vez, é o elemento que conduz o indivíduo à autonomia. A base desta conclusão está nas freqüências de acesso ao ambiente virtual: os alunos que mais acessavam o ambiente foram os que apresentaram maiores índices de facilidade no decorrer da disciplina cursada através do AVA TelEduc e, quanto maior a facilidade, maior a autonomia do aluno em ambiente virtual. O desenvolvimento dos AVA está inserido neste momento histórico e é preciso desenvolver a autonomia aprendente. As transformações alcançam a sala de aula tradicional e não há mais espaço para aspectos retrógrados, ou estaremos comprometendo nosso próprio desenvolvimento. No entanto, a interatividade, em consonância com Steuer (1993) e conforme pudemos verificar nesta experimentação, traduz-se apenas em um estágio tecnologicamente proporcionado pelas novas mídias. Sem dúvida, oferece novas possibilidades em todos os aspectos da vida, mas todas potencializadas pela ação do homem - que precisa caminhar constantemente em busca de melhores e mais eficientes formas de utilizar a tecnologia. 371 ABSTRACT The relationship between man and technology - in which the rules are constantly being discussed - the humanization of technology is the component that can guarantee the social appropriation of technology. This humanization may be achieved as the technology is transforming the communication process and, therefore, is to contribute to the growth and educational development of man. We talk, therefore, in communication technologies - ie technologies that lend themselves to facilitate the communication process between the subjects. In the context of mediated communication, computer and Internet are capable of allowing a kind of social environment mediated and thus also end up enabling the man may experience an immersion in a virtual environment for communication. Joining the possibilities offered by virtual environments, the growing need for continuing education in the setting of learning society, formed the setting for the development of Virtual Learning Environments (VLE). As information technology and communication develop, so the virtual learning environments advance, since they embody the technological potential of society. This article examines, through studies of interactivity, the interactional behavior of subjects immersed in VLE as a support for educational development. Keywords: Virtual learning environment. Interaction. Interactivity. REFERÊNCIAS BARRETO, R. G. (Org.). Tecnologias educacionais e educação a distância: avaliando políticas e praticas. Rio de Janeiro: Quartet, 2001. BAUER, M. W.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Trad.: Pedrinho A. Guareschi. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002. CASALEGNO, F. Exploring the notion of presence in collaborative environments. Dossiê IAMCR. Revista FAMECOS, Porto Alegre, n. 24, jul. FETIZON, B. A. M. ; MINTO, C. A. Ensino a Distância: equívocos, legislação e defesa da formação presencial. Disponível em: <ww.adunesp.org.br/colegiados/2008/Artigo_EAD.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2008. FRAGOSO, S. Interatividade. Disponível: <orion.lcg.ufrj.br/seminarios/interatividade.ppt>. Acesso: 10 jul. 2008. FREITAS, J. S. Interatividade nas mídias digitais: o uso de agentes inteligentes na comunicação eletrônica na internet. 134f. 2002. Dissertação (Mestrado em 372 Comunicação e Cultura Contemporânea) - Faculdade de Comunicação, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2002. HOFFMANN, W.A.M.; FERNIVAL, A. C. (Org.). Olhar: ciências, tecnologia e sociedade. CSCH/ UFSCAR: Pedro e João Editores, 2008. JOHNSON, S. Cultura da interface: como o computador transforma nossa maneira de criar e comunicar. Rio de Janeiro: Zahar, 2001. KENSKI, V. M. Educação e Tecnologias: o novo ritmo da informação. 3.ed. Campinas, SP: Papirus, 2008. KERBAUY, M. T. M.; MELARÉ, D. V.B. Inovação tecnológica: o virtual como novo espaço educativo. In HOFFMANN, W.A.M.; FERNIVAL, A. C. (Org.). Olhar: ciências, tecnologia e sociedade. CSCH/ UFSCAR: Pedro e João Editores, 2008. KERCKHOVE, D. A pele da cultura: uma investigação sobre a nova realidade electrónica. Lisboa: Relógio D´Água Editores,1997. KROKER, A. Code warriors. (1996). Disponível em: <http://www.ctheory.com/a36code_warriors.html>. Acesso: 05 jun. 2008. LEMOS, A. As estruturas antropológicas do cyberespaço. Disponível em : <http://www.facom.ufba.br/pesq/cyber/lemos/estrcy1.html> Acesso: 20 jun. 2008. LÉVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 2000. . As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento da era da informática. São Paulo: Editora 34, 1993. LOCKWOOD, F. Evaluación de las actividades incluidas em los textos. In: RODRÍGUEZ, E; AHIJADEOS, QUINTILLÁN, M (Coord.). La educación a distancia em tiempos de cambio: nuevas generaciones, viejos y conflictos. Madrid: La Torre, 1999. MAFFESOLI, M. A comunicação sem fim (teoria pós-moderna da comunicação). In: MARTINS, F. M.; SILVA, J.M. (Org.). A genealogia do virtual: comunicação, cultura e tecnologias do imaginário. Porto Alegre: Sulina, 2004. 373 MAIA, Carmem (Org.). Ead.br: experiências inovadoras em educação a distância no Brasil. São Paulo: Anhembi Morumbi, 2004. NIJHOLT, A. Where computers disappear, virtual humans appear. Department of Computer Science of Twente University of Technology. The Netherlands. Disponível em: <www.sciencedirect.com>. Acesso: dez. 2007. PRIMO, A .; CASSOL, M. Explorando o conceito de interatividade: definições e taxonomia. Disponível: <www.psico.ufrgs.br/~aprimo/pb/pgie.htm>. Acesso: 03 jun. 2008. RAFAELI, Sheizaf. Interactivity: from new media to communication. In: Sage annual review of communication research: advancing communication science. Beverly Hills: Sage, 1988. p. 110-134. Disponível: <http://gsb.haifa.ac.il/~sheizaf/interactivity/>. Acesso: 05 jan 2009. SELLTIZ, et. Alii. Métodos de pesquisa nas relações sociais. 7.ed. Tradução: Dante Moreira Leite. São Paulo: EPU, 1974. (Coleção Ciências do Comportamento). STEUER, J. Defining virtual reality: dimensions determining telepresence. Journal of Communication, v. 42, n. 4, p. 72-93, 1992. Disponível em: <http://www.presence- research.org/papers/steuer92defining.pdf>. Acesso: 15 jun 2009. VAN DIJK, J.; VOS, L. de (forthcoming). Searching for the Holy Grail: Images of Interactive Television. New Media and Society, Sage Publications. In: VOS, L. de. Searching for the holy grail: images of interactive television. University of Utrecht, 2000. Disponível em: <http://www.globalxs.nl/home/l/ldevos/itvresearch/total.pdf> Acesso: 01 jul 2009. 374 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura PERFIL E AVALIAÇÃO DOS PARTICIPANTES DE UM CURSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA EM PRÁTICAS EDUCACIONAIS INCLUSIVAS NA MODALIDADE A DISTÂNCIA1. Vera Lucia Messias Fialho Capellini2, Olga Maria Rolim Piazentin3, Eliana Marques Zanata4 RESUMO Avaliação do curso de 180 horas e do perfil dos participantes, com 20 turmas, distribuídas em 16 redes de ensino, das 5 regiões brasileiras, atendendo a 504 professores da rede pública, em 2008, realizado por meio do TelEduc. O objetivo foi a veiculação de informações sobre deficiência mental e seus desdobramentos para a inclusão escolar. Os resultados apresentados foram com 352 concluintes, correspondendo a 70% de ingressantes, sendo que 17% nunca acessaram a plataforma e 13% não o concluíram por evasão ao longo do curso ou pela não realização correta das atividades propostas. Em síntese, o ensino a distância mostrou-se como ferramenta de formação continuada do professor-aluno, propiciando-lhe aquisição de conhecimentos importantes para a prática pedagógica da educação inclusiva, contribuindo para atuação pedagógica compromissada com a diversidade de alunos em sala de aula. Palavras – chave: Ensino a distância. Deficiência mental. Educação especial inclusiva. Formação continuada. 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Doutora em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos, Brasil (2004). Professora do Departamento de Educação e do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Aprendizagem da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. 3 Doutora em Psicologia (Psicologia Experimental) pela Universidade de São Paulo, Brasil(1995). Professor Adjunto do Departamento de Psicologia e do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Aprendizagem da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. 4 Doutora em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos, Brasil(2004). Professora do Departamento de Educação da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. 375 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura ALCOOLISMO NA SOCIEDADE BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XX1 Zulemar Augusta Girotto Savian2 RESUMO O presente artigo pretende focar dois discursos construídos na sociedade do início do século XX. O primeiro relaciona o problema do alcoolismo a negligência do governo e o segundo agrega-o ao conceito de Eugênia e do movimento da Pro-Temperança. Os discursos vem acompanhados de seus atores, no enfoque, os políticos e os médicos higienistas. O interesse pela questão do alcoolismo, surge nesse período, agregado ao marketing da propaganda de fabricantes cervejeiros, ao mercado interno que crescia com o progresso das cidades, as conversas dos intelectuais, a prescrição médica, a esfera política. O foco do artigo é com a análise das correntes especificadas, relativizar os conceitos e traçar um panorama geral das opiniões de alguns grupos envolvidos com a questão do alcoolismo, não menosprezando a interação das populações mais estigmatizadas no meio social. Palavras–Chave: Alcoolismo. Médicos higienistas. Movimento pro–temperance. 1 APRESENTAÇÃO Quando falamos de alcoolismo, temos automaticamente que pensar na questão da moderação versus atração do prazer, no domínio da vontade sobre os instintos e do equilíbrio em usar e consumir. Bem destaca Carneiro (1994, p. 157) que “a droga como um objeto claro e definido nunca existiu [...] A droga sempre foi um conceito antes de tudo moral”. E é com base nessa moralidade que as sociedades moldam-se de diversas formas. Goffman (1988) nos fala que o termo estigma vem do grego para designar os sinais no corpo feitos com cortes ou fogo que denunciavam que o portador era um escravo, um criminoso ou um traidor. O estigma procura 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluna do segundo ano do curso de História da Universidade Sagrado Coração - Bauru - SP. 376 anunciar que o indivíduo possuí algo de mau e que é prudente afastar-se daquela pessoa. Dessa forma a concepção, da construção de estigmas negativos para distinguir os indivíduos, é fato presente na sociedade do início do século XX brasileiro. São estigmatizadas em sua maioria, como notaremos no decorrer do artigo, as populações de classe econômica mais os pobres, os marginalizados. Este ensaio pretende focar dois discursos construídos na sociedade do início do século XX. O primeiro relaciona o problema do alcoolismo a negligência do governo e o segundo agrega-o ao conceito de Eugênia e do movimento da Pro-Temperança. Entre os diversos tipos de bebidas relacionadas ao alcoolismo, focarei dois: a água ardente e a cerveja, fazendo um breve parecer sobre a história de cada uma no Brasil, as primeiras fábricas e conseqüentemente a atuação no mercado urbano, com estratégias de marketing cervejeiro na captação de novos grupos consumidores. Nos discursos da crítica ao alcoolismo, identifiquei dois ramos contrários na classe dos médicos higienistas, principais mobilizadores de críticas relacionadas. Ora são adeptos do Movimento da Pro-Temperança e da teoria eugênica, como conceito justificante de sua análise da sociedade e ora estão preocupados em culpar o governo da responsabilidade do problema. Na esfera política, a inclinação à criação de leis no combate ao problema do alcoolismo, é articulada por uma minoria salientando dessa forma que havia apoio de pelo menos uma parcela de interessados. 2 O AGENTE E SEU VETOR Para falarmos de alcoolismo e suas diferentes abordagens no início do século XX, temos que começar pincelando sua difusão entre a população em geral. Falemos dos fabricantes e de alguns produtos de apreço popular e que estavam difundindo-se com a crescente industrialização das cidades. Começaremos com a aguardente que se popularizou no início do século XIX. Sua denominação “cachaça” pode ter derivada tanto da palavra cagaço, como de cachaça, vinho feito na Espanha e Portugal a partir da borra da uva. Outra designação conhecida como “pinga”, também dada à bebida e vem do fato que, 377 durante a produção nos engenhos de açúcar, o vapor do caldo de cana fermentado se condensa e “pinga” dentro dos tonéis. Entretanto, técnica e legalmente, existe diferença entre a cachaça e a pinga. Andrade (2007) explica que a Cachaça é a aguardente destilada a partir da borra ou melaço do açúcar, enquanto a pinga é a aguardente destilada a partir da garapa, do caldo da cana. Popularmente pinga e cachaça são a mesma bebida. Sabemos que a principal culpada pelo alcoolismo no início do século XX é a aguardente. Sua produção está intimamente ligada à escravidão e boa parte além de exportada, girava um comércio inter-provincial. Segundo Andrade (2007) no do Rio de Janeiro, no final do século XIX, haviam 253 alambiques funcionando, dos quais 155 ficavam na cidade litorânea de Paraty. Por se tratar de uma bebida altamente difundida entre a população de renda mais baixa, a propaganda em torno da aguardente tornou-se negativa no início do século passado, justamente porque nesse período os ideais eugênicos de degeneração da raça e o gosto por tudo que vinha da Europa, ainda estavam presentes em classes mais abastadas. A aguardente era a bebida alcoólica mais consumida em todo território brasileiro. Com a imigração a partir da década de 40 do século XIX houve uma variação nessa hegemonia e um desenvolvimento urbano no fabrico e consumo da cerveja nas principais cidades. É de se observar que num primeiro momento esse público consumidor tratava-se em sua maioria de uma classe média ascendente das cidades: profissionais liberais como advogados, professores, jornalistas, capitalistas e comerciantes médios. O Almanak Laemmert, publicado no Rio de Janeiro entre 1844 e 1889, pelos irmãos Eduard e Heinrich Laemmert, mostra mais de vinte produtores de cerveja só em 1888. Boa parte, eram de origem estrangeira e exemplos dessas novas fábricas são a firma Henrique Leiden e Cia que fundou a Imperial Fábrica de Cerveja Nacional, no Rio de Janeiro. Em São Paulo em março de 1889, Coutinho (2009) nos fala do primeiro anúncio de marca de cerveja brasileira, publicado no Jornal A Província de São Paulo, hoje o Estadão: “ Cerveja Antarctica encontra-se à venda na Rua Boa Vista , 50 A” . No ano seguinte ao anúncio, a Antarctica aumenta o quadro de 378 funcionários para 200 e a sua capacidade de produção passa de 40 mil hectolitros/ano, transformando-a numa companhia com 61 acionistas, com dois deles no comando de uma empresa de importação no porto de Santos, que facilitou a compra de máquinas e de matéria-prima para a cervejaria. Da mesma forma no Rio de Janeiro, a cervejaria Brahma fundada em 1888 por um imigrante suíço, Joseph Villiger, crescia abruptamente e se fundia com outras empresas. Já em 1904, a produção de chope em tonéis chega a 6 milhões de litros e a distribuição conta com 9 depósitos situados no centro. É certo que essas fábricas cervejeiras atendessem em princípio a maior parte das classes médias altas das cidades. Mas o interesse em mencioná-las é que, mesmo sendo a cerveja bebida associada a classes mais abastadas, foi também alvo de crítica de médicos higienistas. A forma adotada pelas cervejarias para manter a cerveja em evidência no meio social e se contrapor a propaganda anti-álcool, era o patrocínio de produções culturais em que o consumo de cerveja tivesse lugar de destaque. No enfoque publicitário da cervejaria Brahma, Marques (2007) fala-nos de uma propaganda em especial que chamou a atenção. Tinha enfoque ao público feminino de mulheres brancas. A propaganda era da seguinte forma: ao fundo haviam crianças brancas, enquanto a frente da gravura, uma mulher sentada amamentava seu filho. Na mesa a sua frente havia logo próxima ao bebê uma garrafa de cerveja escura ( Mazbier). O tipo de apelo publicitário deixa clara a posição dos fabricantes em atingir a população feminina. A idéia era difundir que a cerveja preta Mazbier era benéfica e saudável, pois como sugere a própria propaganda do panfleto: você mulher se beber Malzbier terá filhos fortes e saudáveis. Com relação as propagandas de aguardente, não há menção as mulheres em nenhuma delas com esse sentido. Outro anuncio muito difundido em jornais com relação ainda a cerveja Malzier era a associação do consumo do produto às refeições, como fonte de energia e vida mais saudável. 379 Propaganda da cerveja Malzier do Começo do Século XX. Disponível em: <http://forum.jogos.uol.com.br/MALZBIER-DA-BRAHMA-TEM-O-MESMO-VALORENERG%C3%89TICO-DE-UM-OVO-DE-GRANJA-OU-DE-UM-BOM-BIFE_t_389141> 3 DOIS OLHARES NA QUESTÃO Focando nesse segundo momento a analise crítica do alcoolismo, no segmento dos médicos higienistas e dos políticos, há proeminência de dois discursos. O primeiro relaciona o problema do alcoolismo a negligência do governo e o segundo agrega-o ao conceito de eugênia. Encontramos em Wadsworth (1999), considerações do médico higienista Dr. Arthur Mocorvo Filho, adepto do primeiro discurso. Durante sua longa carreira como médico, que teve início na década de 1880, com a fundação do Instituto de Proteção e Assistência à Infância no Rio de Janeiro, criticou com veemência propagandas que relacionavam bebidas alcoólicas a saúde. Moncorvo Filho, foi um defensor aguerrido dos marginalizados, criticou o descaso do governo em relação à pobreza no setor urbano, chegando mesmo a calcular o impacto negativo que esta falta de atenção teria acarretado para as crianças do país. Seu objetivo era evidenciar a negligência do governo em relação ao problema do alcoolismo e da pobreza, sublinhando o quanto tal postura comprometia o futuro da nação. 380 Médico atuante na cidade do Rio de Janeiro, foi responsável por uma série de melhorias às famílias pobres, no combate a falta de higiene, campanhas de vacinação, alcoolismo e subnutrição infantil. Sua crítica é clara a propaganda cristalizada no anuncio da Malzibier. Seu apelo é sincero quando fala as mães e as amas de leite, que devem parar com o costume de beber cerveja preta para possuir abundância de leite e que o consumo de álcool é no parecer médico algo que não condiz com a saúde do indivíduo, principalmente quando consumido junto das refeições. O Movimento Higienista, ao qual pertenciam esses médicos em questão, tem um caráter coletivo, com a prescrição de hábitos higiênicos como parte de um projeto com finalidades educativas visando uma formação moral. Os hábitos teriam um fim em si mesmo de preocupações com o indivíduo/privado para o coletivo/público. (JUNIOR, E. G.; LOVISOLO, p. 41). Ainda nesse primeiro discurso da relação álcool x estado, vale ressaltarmos no grupo dos políticos, o deputado eleito pelo Rio Grande do Norte, Juvenal Lamartine, que mesmo criticando a postura do governo, atentou-se a propostas relevantes a resolução do problema. Em uma sessão de 1917, propôs aumentar em três vezes o valor do imposto que incidia sobre a aguardente e o vinho de consumo popular, conclamando seus colegas a legislar em favor da população pobre. Nada temos feito até agora no sentido da defesa da nossa população contra o alcoolismo [...] enfraquecida nos seus elementos componentes, nos seus alicerces fundamentais, e cuja principal causa devemos ir buscar no abuso do álcool o grande número de desequilibrados que enchem os hospitais, a tuberculose que devasta a nossa população operária, as moléstias do fígado, dos rins, o envelhecimento prematuro das artérias tão freqüente no Brasil são, na sua maioria, efeitos de uma só causa: o álcool. (LAMARTINE, 1917 apud MARQUES, 2007, p.45). Lamartine foi autor de projetos audaciosos. Propôs a proibição em todo o território nacional, da importação e da fabricação de qualquer bebida com teor alcoólico superior a 2%, o que eliminaria do mercado todas as bebidas destiladas, especialmente a aguardente, o que para ele (como adepto da temperança) era o grande mau das massas urbanas mais pobres. Criou um projeto de lei que propunha que se uma pessoa, independente de raça ou classe social fosse encontrada bêbada na rua, seria recolhida a prisão 381 pelo prazo de dez dias, além de ser multada em 200$000 (duzentos mil réis). Reincidentes pagariam o dobro. E no caso do embriagado ser funcionário público a situação se agravaria, poderia ser demitido, a bem da moralidade pública e ficaria impossibilitado de exercer função no Estado por dez anos. (MARQUES, 2009). Quase todos os projetos de Lamartine relacionados a proibição do consumo de álcool, tal como os dois acima citados, não foram aprovados, mas tiveram uma repercussão de grande importância na imprensa da época, em jornais como O Jornal do Brasil e O Diário do País. Mesmo que Lamartine buscasse alternativas para ajudar a população afetada socialmente com o consumo de bebidas alcoólicas de fácil aquisição financeira, como a aguardente, suas propostas sugerem mudanças que implicariam uma reviravolta no mercado externo e interno do gênero. Pois mesmo o alcoólatra é um consumidor final. Para barrar seu acesso a bebida, existe toda uma engrenagem de fabricação e comércio, que movimenta o mercado. A constante negação de seus projetos denota que tanto para o governo como para os produtores de aguardente, (em sua maior parte ricos e influentes) e os emergentes produtores cervejeiros nas cidades, não era interessante a cessação, ou taxação alta à produção brasileira de bebidas alcoólicas. A outra vertente do discurso está relacionada, a grande parcela de médicos do Movimento da Pro – temperança. Podemos identificar em Marques (2007) que a ideologia da pró-temperança é fruto de idéias de uma burguesia intelectual, vigente desde 1870. Apesar dessa classe estar em condição econômica privilegiada em relação a maioria, seu foco de críticas é a classe mais pobre, marginalizada das áreas urbanas brasileiras. O pontapé inicial das produções do movimento Pro - Temperança, é o conhecimento por parte desses intelectuais da aprovação da Lei Seca norteamericana de 1919, que proibia a comercialização e produção de bebidas alcoólicas em 36 estados. Como cita Deursen (2009), seu texto instituía o Ato de Proibição Nacional, também chamado de Ato de Volstead (homenagem a Andrew Volstead, deputado que liderou a iniciativa). Era considerada “intoxicante” 382 qualquer bebida que tivesse mais de 0,5% de álcool (as cervejas mais fracas têm cerca de 2%). É interessante mencionar que a mesma lei que serve de inspiração a confabulações burguesas brasileiras anti-álcool se tornou um dos maiores fracassos legislativos norte-americano. Em vez de acabar com os problemas sociais atribuídos à bebida, Deursen (2009) nos lembra que em seus 13 anos de vida a Lei Seca fez o contrário, desmoralizou as autoridades e estimulou à corrupção. A criminalidade aumentou proporcionalmente em cidades como Chicago e Nova York, onde a máfia controlava o contrabando de álcool. O discurso desses médicos baseava-se na tese eugênica do embranquecimento da raça e propunham a instauração de políticas públicas para limitar os casamentos como forma de aprimorar o estoque racial. Reduzindo-se o número de casamentos, se reduziria a procriação e dessa forma, para eles, os elementos degenerados e perturbadores da ordem social, os negros, mestiços, epitéticos e prostitutas. Controlados e reduzidos, reduzir- se-ia na seqüência o problema do alcoolismo nas classes mais baixas, já que, segundo eles, o homem branco não partilhava desse mal. Eram esse os médicos que propunham questões de influência do álcool sobre a descendência, isto é, se os filhos de pais alcoólatras seriam indivíduos normais ou e se o alcoolismo devia ser combatido como medida de profilaxia social. Nesse ínterim Marques (2007) nos fala de Viana, um sociólogo que embasado na teoria eugênica relacionou o movimento da temperança com a nacionalidade brasileira, ameaçada por uma crescente massa de pobres não brancos. Menciona que o consumo do álcool esta diretamente ligado com a degeneração psíquica da raça. Em sua análise, Viana estabelece uma relação entre as raças, seus tipos de temperamento e ação na presença do álcool em grandes quantidades no organismo.O homem negro era propenso a instabilidade temperamental, sendo capaz de oscilar entre a extrema generosidade e solidariedade com seus pares e a cólera violenta. O índio era propenso a esquizofrenia de modo acentuado. Os mestiços precisavam de maior observação pois sua postura era multifacetada. Então da mesma forma que cresceu o mercado cervejeiro urbano, 383 cresceu o estigma negativo com relação a cachaça, principalmente graças a difusão de idéias dessa corrente intelectual, que associava o homem pobre a bebedor de cachaça descontrolado e o burguês a bebedor social de cerveja. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Podemos afirmar que houve interesse na questão do alcoolismo no início do século passado. Interesse esse tão grande, que gerou diferentes correntes. Essa pluralidade de abordagens foi importante para a implementação de medidas de controle do álcool no decorrer do século XX, tal como taxações internas, alfandegárias e restrições de consumo. A verdade sempre será relativa. Nunca existirá para a Nova História uma única verdade. Os seus multifacetados pareceres sempre estarão presentes nas diferentes análises dos mais variados temas. Os diversos pareceres fazem parte da sociedade do progresso, da locomotiva, do crescimento urbano, da capitalização de tudo, da mesma forma que a própria sociedade do início do século XX em questão o é, diversificada e heterogênea. A contribuição que podemos considerar válida, dessas diferentes abordagens, surge através dos interesses de médicos e políticos realmente preocupados com o bem estar das classes menos favorecidas. Quando analisamos os projetos de lei de Lamartine ou o trabalho do Dr. Mocorvo Filho, indivíduos pertencentes as esferas mais altas da sociedade, podemos observar um outro tipo de discurso, sob uma nova ótica, desprovida do etnocentrismo eugênico. Dessa forma a abordagem da faceta eugênica de parte dos médicos higienistas e do sociólogo Viana, pode ser considerada válida para verificarmos como essa parcela da elite burguesa urbana pensava o problema do alcoolismo. Porém quando afirmamos que esse conceito homogêneo de verdade eugênica é único, negamos toda a história de lutas de classes das populações mais pobres, dos negros, das mulheres, dos índios e dos excluídos. Devemos pois nos preocupar em relativizar todos esses conceitos para termos um panorama geral das opiniões dos diversos grupos envolvidos com a questão do alcoolismo, não descaracterizando por fim a interação das 384 populações mais pobres no meio social. ABSTRACT This article shows two discourses constructed in the society of the early twentieth century. The first concerns the problem of alcoholism government negligence and the second adds it to the concept of eugenics and the movement of the Pro-Temperance. The discourse is accompanied by his actors, the focus, politicians and doctors hygienists. Interest in the issue of alcoholism emerges in this period added to the marketing of advertising manufacturers of beer for the domestic market that grew with the development of cities, the chatter of intellectuals, doctors' prescriptions, the political sphere. Its focus is the analysis of current specified relative concepts and give an overview of the opinions of some groups involved with the issue of alcohol abuse, without diminishing the interaction of the poorest in the social stigma. Keywords: Alcoholism. Hygienist medician. Pro-temperance movement. REFERENCIAS ANDRADE, E. La R. Pinga ou Cachaça. 2007. Disponível em: < http://www.paraty.tur.br/> Acesso em: 20 nov. 2009. A HISTÓRIA da Cerveja no Brasil. 2009. Disponível em :< http://www.cervejasdomundo.com/>. Acesso em: 18 nov. 2009. BETTI, M. L. Casa do Poster. Disponível em: <http://www.casadoposter.com.br/posters/poster_mostra.php?id=181&categ=4>. Acesso em: 20 nov. 2009. CARNEIRO, H. Filtros, mezinhas e triacas: as drogas no mundo moderno. São Paulo: Ed. Xamã, 1994, p. 157. COUTINHO, C. A. Tavares. História da Cerveja no Brasil, Cronologia da Cervej: século XIX e XX. 2009. Disponível em : <http://www.cervisiafilia.com.br/cervbras3.html#1889/>. Acesso em: 18 nov. 2009. DEURSEN, F. V. Lei Seca: a lei que foi um porre. 2009. Disponível em: <http://historia.abril.com.br/canais/politica>. Acesso em: 20 nov. 2009. GOLFFMAN, E. Estígma: notas sobre a manipulação da identidade 385 deteriorada. Rio de Janeiro: Ed LCT, 1988. JUNIOR, E. G.; LOVISOLO, H. R. Descontinuidades e Continuidades do Movimento Higienista no Brasil do século XX, Revista Brasileira de Ciência e Esporte, v.25, n. 1, p.41-54, Set. 2003. Disponivel em: <http://www.rbceonline.org.br/>. Acesso em: 20 nov. 2009. LAEMMERT, E. Heinricht. Almanak Laemmert, 1844-1889. Biblioteca Nacional Digital. Disponível em: < http://bndigital.bn.br/periodico>, Acesso em: 18 nov. 2009. MARQUES, T. C. de N. Cerveja e aguardente sob o foco da temperança no Brasil, no início do século XX. Revista Eletrônica de História do Brasil, Juiz de Fora, v.9, n. 1, jan./jun., 2007. Disponível em: <http://www.rehb.ufjf.br> .Acesso: 18 nov. 2009. WADSWORTH, J. E. Moncorvo Filho e o Problema da infância: modelos institucionais e ideológicos da assistência à infância no Brasil. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.19, n.37, set. 1999. Disponível em: <http://www.scielo.br> . Acesso em: 18 nov. 2009. 386 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas Educação, mídia e cultura BLOGS EDUCATIVOS VOLTADOS PARA O ENSINO MÉDIO: UMA ANÁLISE DOS OBJETIVOS PEDAGÓGICOS1 Aline Kelly Ferreira da Silva2 Rosária Helena Ruiz Nakashima3 RESUMO O presente trabalho está diretamente relacionado ao projeto de pesquisa de iniciação científica, financiado pelo Fundo de Apoio à Pesquisa da Universidade Sagrado Coração (FAP/USC), intitulado “O blog como estratégia pedagógica no ensino da Filosofia”. O texto compreende resultados preliminares com abordagem de literatura especializada, apontando um referencial que, embora se encontre em construção, estabelece alguns pontos importantes sobre a utilização da ferramenta tecnológica “blog” para o ensino da Filosofia. Enquanto há um grande contato diário entre pessoas e tecnologias digitais, na educação, o trabalho com essas ferramentas ainda é pequeno, há muito que caminhar para uma construção metodológica consistente para a aplicação das mesmas no processo educativo. Para tanto, foi desenvolvido um trabalho de pesquisa sobre a estrutura dos blogs, voltados para o Ensino Médio, identificando os objetivos pedagógicos dos profissionais da educação de diversas instituições. Constatou-se que a maioria dos blogs pesquisados é utilizada como um recurso pedagógico, ou seja, como espaço de divulgação de informações, quer seja sobre o conteúdo da aula ou o que ocorre na escola. A utilização do blog como estratégia está relacionada com a autoria na produção dos textos e participação ativa de professores e alunos, sendo ele uma extensão da sala de aula. A continuidade da pesquisa envolve a elaboração de uma metodologia para explorar o uso de blogs como estratégia pedagógica, envolvendo a escolha de temas a serem tratados e sistematização das ações pedagógicas para a criação de categorias de observação do progresso dos alunos. Nesse contexto, o objetivo da pesquisa, em andamento, é propor ao professor de Filosofia que o blog seja utilizado como estratégia pedagógica com o intuito de desenvolver em seus alunos as competências de argumentação e criticidade, próprias da disciplina. Palavras-chave: Educação. Blogs. Ensino Médio. Ensino de Filosofia. 1 INTRODUÇÃO Na atual sociedade da informação a grande maioria das pessoas utiliza com 1 Trabalho apresentado no 3º Simpósio Internacional de Linguagens Educativas, sob o título Educação Mídia e Cultura, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 09 a 12 de março de 2010. 2 Aluna da Universidade Sagrado Coração. 3 Aluna da Universidade Sagrado Coração. 387 frequência diversos tipos de tecnologias digitais, como por exemplo: celulares, televisores, computadores, máquinas industriais, urna eletrônica, cartões de crédito, caixas eletrônicos, dentre outras. Seja no campo pessoal, social, econômico ou político, as ferramentas digitais estão presentes e são uma realidade diária não apenas no dito mundo desenvolvido, mas também nas nações em desenvolvimento e, mesmo que de forma escassa, nas subdesenvolvidas. No Brasil, uma das ferramentas digitais em maior ascensão de uso no dia-a-dia da população urbana é o computador com internet. Uma pesquisa divulgada pela Pew Institute Research, dos EUA, em 2007 revela que o país saltou de 22% para 44% no número de brasileiros com acesso a essa tecnologia. Um crescimento de 22%, que colocou nosso país no topo do crescimento no uso dessa ferramenta em específico (ABIN, 2009). De acordo com os próprios pesquisadores, esse número está muito longe daqueles correspondentes aos países desenvolvidos. No entanto, 44% da população não pode ser ignorada, tampouco o constante crescimento e desenvolvimento da tecnologia e o impacto que a mesma causa na sociedade. Além de não poder ignorar quase metade da população brasileira, é preciso ter em mente que esse número tende a aumentar cada vez mais. Esforços governamentais de inclusão digital são vistos por todo o território nacional. No caso do Estado de São Paulo, ressalta- se o “Acessa São Paulo”4. Esse programa de inclusão digital iniciado em julho de 2000, com unidades em todo o estado, não só oferece ao cidadão o acesso gratuito à internet, mas também minicursos, cadernos eletrônicos, projetos comunitários e programas para o uso consciente das tecnologias da informação e da comunicação. Além disso, dá suporte à produção de pesquisas e informações referentes à inclusão digital. Há ainda o crescente número de lan houses, espaços onde o acesso à rede mundial de computadores pode ser feito mediante o pagamento deste serviço. Uma pesquisa realizada em 2007 pelo Comitê Gestor de Internet no Brasil, o CGI, revela que o acesso à internet feito através das lan houses é maior que o doméstico, sendo 49% e 40% respectivamente. O mesmo estudo mostra que o número dessas casas de acesso já chegou aos 90 mil em todo o território nacional, ultrapassando o de salas de cinema (2.300) e livrarias (2.676) (CAMPUS PARTY, 2009). Esse cenário 4 http://www.acessasaopaulo.sp.gov.br/ 388 que se apresenta é novo, com elementos a serem explorados das mais variadas formas, inclusive pelos profissionais de educação. Essa exploração é uma das proposições deste trabalho, isto é, diz respeito a essas novas formas de comunicação, e como o professor poderá beneficiar-se delas. Como a educação se caracteriza também pela transmissão da cultura e, atualmente, destaca-se a cultura digital, torna-se importantíssimo a inclusão de ferramentas digitais no âmbito escolar. Caso contrário, este se tornará um local deslocado da realidade do mundo em que vivemos. É o processo chamado de contextualização: falar a mesma língua que o aluno, mostrar algo que tenha algum significado para ele, para que o processo de ensino e aprendizagem se torne frutífero, tanto para o professor, quanto para o aluno. A contextualização é amplamente defendida entre os construtivistas, dentre eles Paulo Freire, que defendia uma educação que entendesse, averiguasse e transformasse o mundo. Diz ele: [...] o pensar do educador somente ganha autenticidade na autenticidade do pensar dos educandos, mediatizados ambos pela realidade, portanto, na intercomunicação. Por isto, o pensar daquele não pode ser um pensar no isolamento, na torre de marfim, mas na e pela comunicação, em torno, repitamos, de uma realidade. (FREIRE, 2002, p. 64) E a realidade que se apresenta ao professor e ao aluno está envolta de tecnologias digitais. Como pensar uma dialogicidade dentro da educação sem levar em consideração a atual realidade? Foi a partir deste questionamento que se pensou em uma ferramenta pedagógica que pudesse somar uma das muitas possibilidades que a tecnologia digital proporciona, a fim de dar um passo pequeno, porém importante, rumo a uma educação significativa e significante, dentro do contexto de mudanças cada vez mais velozes que se apresentam. Na década de 60, o próprio Freire já tentava utilizar-se de ambientes interativos através de recursos audiovisuais no processo de ensino e aprendizagem. Segundo Gadotti (2009), posteriormente, Paulo Freire reforçou o uso de novas tecnologias no contexto educativo, principalmente o vídeo, a televisão e a informática. Nesta pesquisa que se encontra em andamento, dentre todas as ferramentas disponíveis, foi escolhido o blog para ser utilizado como uma ferramenta no ensino da filosofia. Schittine (2004) nos conta que o termo blog tem origem americana, 389 sendo uma abreviação de weblog (web – página na internet; log – diário de navegação). A autora o define como sendo “uma adaptação virtual de um refúgio que o indivíduo já havia criado anteriormente para aumentar o seu espaço privado: o 'diário íntimo'” que, mesmo com todos os avanços tecnológicos, permanece baseado na linguagem escrita. Mesmo quando há uma imagem, ela não possui a mesma técnica e a criatividade do texto em si, e normalmente se caracteriza como um princípio muito semelhante à bricolage que costumava/costuma haver nos diários de papel. “Cabe então ao texto, e principalmente a ele, a criação do ambiente e da personalidade virtuais” (SCHITTINE, 2004, p. 60-61). Em uma definição mais objetiva, feita por Chagas (2007, p.9), “os blogs, então, podem ser definidos como páginas web de atualização simplificada e organização cronológica reversa”. Ele segue nos dando alguns dados históricos: Historicamente, os blogs surgem em fins da década de 1990, da necessidade de alguns usuários manterem aplicativos web de fácil e rápida atualização, sobretudo para que pudessem cultivar diários, entendidos aqui também como relatórios. Em 1994 já existiam modelos de aplicações que baseavam suas funcionalidades em esquemas de simplificação de updates. Mas os primeiros formatos de blogs, como os conhecemos, são distinguidos somente a partir de 1998, quando o termo já havia sido cunhado por Peter Merholz, em sua famosa expressão we blog (“nós blogamos”) (CHAGAS, 2007, p.9) Rodrigues (2008), ainda ressalta o caráter híbrido do blog, podendo ser de produção individual ou coletiva, fechado para um grupo de pessoas ou aberto para todos, além da utilização de links, hipertextos, imagens e vídeos. No entanto, todos os autores pesquisados destacam as dificuldades em se definir precisamente o que é o blog, dada a liberdade que o usuário tem para configurá-lo e utilizá- lo da forma que quiser, com o conteúdo que quiser, tendo em mãos inúmeros recursos que podem ser utilizados para personalizar o seu espaço. Há, portanto, uma multiplicidade na forma dos blogs, porém encontramos uma constante: ele é sempre pessoal, e o blogueiro o utiliza para exprimir suas opiniões, ideias, preferências, ou até mesmo a sua própria vida. Utilizando, portanto, uma definição mais clara e precisa: O termo “blog” designa não apenas um texto, mas também um programa e um espaço. Primeiramente, blog indica um espaço onde blogueiros e 390 leitores/comentaristas se encontram. Para se ter um blog, enquanto texto e espaço, utiliza-se normalmente um programa de blog. De qualquer forma, o blog/programa não é condição necessária, pois o blog/espaço e blog/texto podem ser construídos através de recursos convencionais para a publicação de sites (HTML, PHP, MySQL, FTP, etc.). (PRIMO apud RODRIGUES, 2008, p. 42) Sendo um espaço para, principalmente, a exposição textual, não vimos ferramenta melhor do que essa para o uso na aula de filosofia, tendo em foco a produção conceitual e o desenvolvimento da argumentação e da crítica por parte dos alunos. Esta abordagem da filosofia como um ato produtivo, de criação, é relativamente novo, e precisamos especificá-lo para melhor compreensão do assunto. Mas qual a importância de desenvolver a capacidade argumentativa dentro da Filosofia? Ora, o que são as doutrinas de pensamento filosófico que não um conjunto de argumentos do filósofo acerca do que é, de como se dá e do porquê se dá certa coisa ou realidade? Independentemente da definição de Filosofia que se utilize, e como aponta Abbagnano (2007) elas são muitas, o principal e talvez único recurso que o filósofo tem em mãos para exemplificar, defender e propagar sua tese. Assim sendo, o argumento – que pode ser entendido como “qualquer razão, prova ou demonstração capaz de obter o assentimento e de induzir persuasão ou convicção” ou “tema ou objeto em torno do qual se versa um discurso qualquer” (ABBAGNANO, 2007, p. 90) – torna-se um pilar de suma importância dentro da Filosofia. Para poder argumentar, antes é preciso observar, perceber o mundo ao redor e, como disse Platão, admirar-se constantemente com ele. E, após todos esses movimentos, posicionar-se frente tudo aquilo que é percebido. É esse exercício proeminentemente filosófico, de construção de conceitos a partir da imanência do mundo, como propuseram Deleuze e Guattari (1997), que se pretende ajudar o professor de Filosofia a estimular nos alunos através dos blogs, de modo que eles se tornem mais críticos e perceptivos com o mundo em que vivem para que, posteriormente, eles possam fazer valer a definição de Filosofia proposta por Platão: a utilização do conhecimento em prol da humanidade. Portanto, as questões que permearão as discussões durante esta pesquisa são as seguintes: De que forma os blogs podem auxiliar o professor de Filosofia no desenvolvimento da capacidade argumentativa? Por que é importante que a Filosofia se encarregue do desenvolvimento desta competência? E qual a 391 importância da atualização contínua da metodologia pedagógica? Assim, esta pesquisa parte da hipótese de que o blog, utilizado como estratégia pedagógica pelo professor de Filosofia, pode ajudá-lo a estimular e melhorar a capacidade argumentativa do aluno, tornando-o mais crítico e perceptivo em relação ao mundo que vive. Sendo ele uma ferramenta de escrita e exposição, supõe-se que seja uma das formas de desenvolver essas competências no aluno. No blog, explica Cláudia, os alunos são colocados em contato com diversas fontes e opiniões e, neste aspecto, pode-se exercitar o poder de argumentação. Trata-se de uma ferramenta motivadora para a escrita, que pode ser usada pelo professor, e que se transforma em espaço de debate para o aluno. (SANTOS, 2009) Isso significa que nesta pesquisa será analisado como uma ferramenta tecnológica pode auxiliar no caminho do exercer filosófico dentro da sala de aula, reafirmar a importância de tal disciplina dentro do âmbito pedagógico, e como ela pode ajudar na melhoria da educação como um todo. 2 OBJETIVO GERAL O objetivo do presente trabalho é propor uma metodologia, utilizando os blogs como ferramenta, com a qual o professor de Filosofia poderá desenvolver em seus alunos as competências de argumentação e criticidade, próprias da disciplina. 2.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS • Analisar projetos que utilizam os blogs de forma educativa; • Selecionar temas específicos para discussão nos blogs; • Sistematizar as ações pedagógicas para abordagem dos temas; • Criar categorias, nos blogs, que evidenciem a evolução da capacidade crítica e de argumentação dos alunos. 3 METODOLOGIA Com o objetivo de buscar uma nova ferramenta pedagógica através da utilização dos blogs, proporcionando ao professor de Filosofia uma nova forma de 392 estimular e desenvolver as competências de argumentação e criticidade do aluno em sala de aula, está sendo realizada uma pesquisa exploratória com abordagem qualitativa, utilizando o método de análise de conteúdo. Segundo Gil (1996), é possível clarificar mais o problema a ser estudado através da pesquisa exploratória, visto que ela proporciona a construção de hipóteses, o descobrimento de idéias e o aperfeiçoamento de intuições. A análise qualitativa, embasada por uma análise de conteúdo, conforme Bardin (1976), revela, pela interface das comunicações, elementos significativos que permitem, posteriormente, a criação de uma forma de intervir sistematicamente no processo de desenvolvimento das competências desejadas. Para tanto, em um primeiro momento foi feito um trabalho de análise de exemplos, buscando projetos que utilizam os blogs já empregados em outras disciplinas do Ensino Médio, com a intenção de apropriação de pontos positivos que sejam relevantes para o presente trabalho. Para chegar até os blogs, utilizamos três vias: o estudo de dissertações de mestrado que já haviam analisado alguns deles, ou então tinham a construção de blogs dentro de seu estudo; ferramentas de busca na internet; e sites das Diretorias de Ensino do país que continham em suas páginas os links de alguns blogs sob sua direção. Também pesquisamos alguns blogs através da plataforma Edublogs5 que, de forma geral, não foram relevantes para nosso propósito, pois são estrangeiros e normalmente voltados ao ensino fundamental. Encerrada a primeira fase de análise de outros blogs, foi possível caracterizar e categorizar os principais usos que as escolas fazem desta ferramenta, que serão posteriormente detalhados na seção de resultados. Esta categorização foi possível, pois encontramos pontos em comum entre os blogs analisados, como o conteúdo apresentado, o nível de participação de alunos e professores, o tipo de linguagem empregada, etc. Em um segundo momento, serão selecionados os temas que os alunos abordarão em seus blogs. A escolha dos mesmos será feita através da Proposta Curricular do Estado de São Paulo ao ensino de Filosofia, pois o ensino da filosofia como criação conceitual pede, por sua própria estrutura, uma abordagem temática da disciplina, feita por este documento elaborado pela Secretaria da Educação do Estado. 5 http://edublogs.org/ 393 Serão sugeridas ao professor de Filosofia formas de abordar os temas a serem tratados nos blogs, de modo que ele possa auxiliar e acompanhar a mudança desejada. Partindo da visão do próprio aluno a respeito do tema tratado no momento, o professor irá adicionar novos elementos e questionamentos, que possam fazer o aluno refletir a respeito de sua própria visão, isto é, daquilo que o leva a ter tal visão e se é um ponto de vista apropriado. Tais reflexões deverão ser fruto da interferência do professor e da análise, introspectiva e extrospectiva, que a mesma deverá causar. Por fim, será feita uma pesquisa, de onde serão retirados indicadores para que o processo evolutivo dos alunos, do senso comum à criticidade, seja observado, categorizado e analisado, tanto pelo próprio professor, quanto por outros profissionais da educação. Para tanto, buscaremos a base teórica dos autores da área de didática e avaliação, cuja abordagem mais se aproxime daquela exigida para o ensino da filosofia como produção de conceitos, de acordo com Aspis e Gallo (2009). Assim, nosso intuito será buscar fundamentações que auxiliem na sistematização de indicadores do processo evolutivo de aprendizagem dos estudantes. Todas essas etapas fundamentarão a sistematização para uma sugestão de metodologia de ensino de desenvolver utilizando os blogs como ferramenta, com o objetivo as competências de argumentação e criticidade, próprias da disciplina de Filosofia, voltada para o Ensino Médio. 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO Até o presente momento, levantamos a bibliografia necessária para a nossa pesquisa, analisamos projetos de outras disciplinas que utilizam o blog como ferramenta, bem como também analisamos alguns blogs de professores e instituições de ensino, e demos início à seleção dos temas a serem tratados em nossa proposta pedagógica e como deve ser a estrutura dos blogs de nosso projeto. Ao iniciarmos nossa empreitada para uma nova proposta pedagógica visando as aulas de filosofia, sabíamos que o trabalho não seria fácil. A dificuldade se dá principalmente por termos escolhido uma área pouquíssimo explorada dentro da educação de uma forma geral, principalmente dentro de nossa disciplina: os blogs. 394 Apesar das TIC estarem em pauta na grande maioria dos discursos, a literatura a respeito do tema, e sobre a possibilidade de sua aplicação pedagógica, ainda é muito limitada, ficando majoritariamente reduzida a artigos científicos, teses e dissertações. Fora esta dificuldade de recursos bibliográficos, nossa pesquisa encontrou outra limitação dentro de um dos objetivos propostos no projeto: a análise de blogs já utilizados como um recurso pedagógico por professores de outras áreas. Encontramos muitos blogs relacionados a turmas de escolas que, no entanto, ficavam presos à: 1) Falar do dia-a-dia da sala de aula, como um diário eletrônico da classe; 2) Só o professor responsável escreve no blog, mesmo que sejam textos relacionados aos assuntos tratados em sala de aula; 3) Os alunos postam no blog, porém apenas copiando e colando textos de outros sites da internet. Figura 1- Página inicial do blog do 3º ano do Ensino Médio da E. E. Miguel Gontijo, de Bom Despacho – MG - http://3anomiguelao.blogspot.com/ O blog da figura 1 corresponde ao primeiro grupo, categorizado como um diário eletrônico, onde os alunos da escola descrevem o que acontece no seu dia-a-dia escolar, além de focar nos terceiros anos do ensino médio. Esporadicamente, há alguma dica sobre conteúdos e ferramentas na internet que podem ser relevantes para os demais alunos. 395 Figura 2: Página inicial do blog da Turma 61 do Colégio Santa Teresinha, de Campo Bom – RS http://www.santa.g12.br/turma61/ Figura 3 - Página inicial do blog da Turma 131 do Colégio Adventista – DF- http://131ceap.blogspot.com/ de Planaltina Já os blogs das figuras 2 e 3 correspondem ao segundo grupo, pois apenas o professor têm o direito de escrever, e faz uso do blog como depósito de conteúdos que os alunos verão/viram em sala de aula. Figura 4: Página inicial do blog do 3 ano do ensino médio, do Colégio Nacional de Ituiutaba MG - http://caosnotema.blogspot.com/ O blog da figura 4 faz parte do terceiro grupo, onde os alunos produziram-no e foram os únicos a escrevem no mesmo, porém em sua maioria os textos são copiados e colados de outros sites da internet. Com isso, o blog se caracteriza como um aglomerado de informações sobre um assunto de relevância para determinada classe ou escola, porém não há uma produção textual efetiva dos 396 alunos. Outra questão que veio à tona durante nossa análise dos blogs é a falta de informações, nos próprios blogs, sobre a escola, o professor, os alunos e o trabalho que está sendo desenvolvido naquele ambiente virtual. Em outras palavras, não há uma intenção de comunicar às pessoas fora daquele contexto o que está acontecendo, quem são aqueles estudantes e o que eles querem expressar, porque o querem, qual seu ambiente e como ele influencia expostas por aqueles que por ele são afetados. Outros nas questionamentos idéias que surgiram durante a análise foram: Como o professor utiliza aquele meio eletrônico? Qual seu método de avaliação? Como os alunos eram antes da intervenção deste profissional? Como ficaram depois, ou seja, o que foi agregado às suas existências? Há, portanto, uma perda de um princípio importante da internet e especialmente do blog, colocado por Komesu (2009), Schittine (2004) e Tapscott (1999) que é a comunicação com indivíduos externos, que não necessariamente compartilham do mesmo espaço vivente daquele que comunica. Os blogs de algumas escolas da cidade de Bauru, analisados durante nossa pesquisa, também não escapam destas três categorias por nós catalogadas, nem mesmo à falta de informação ao usuário externo. Figura 5: Página inicial do blog da E. E. Dr. Luiz Zuiani http://escolazuiani.blogspot.com/ 397 Figura 6: Página inicial do blog da E. E. Morais Pacheco http://www.moraispacheco.blogspot.com/ Figura 7: Página inicial do blog da E. E. Prof. Luiz Castanho de Almeida http://eeproflca.blogspot.com/ Os blogs das figuras 5, 6 e 7 funcionam como um diário dos eventos das escolas e, aparentemente, não é feito pelos alunos, mas por alguém da equipe gestora ou algum professor responsável. Figura 8: Página inicial do blog da E. E. Vereador Antônio Ferreira de Menezes - http://blog.clickgratis.com.br/ferreira10 O blog da figura 8, apesar de carecer de mais postagens, se apresenta como 398 um depósito de conteúdos das aulas, e também não há indícios de que seja feito pelos alunos. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A proposta de uso dos blogs no ensino da filosofia que será apresentada ao final da pesquisa vai muito além daquilo que foi observado, pois o objetivo é que este ambiente virtual torne-se uma extensão da sala de aula, ao mesmo tempo em que se torne uma janela para que o aluno possa expor seus conceitos, suas visões de mundo, e entrar em contato com outras perspectivas, próximas ou não das suas, podendo entrar num processo de contínuo amadurecimento e emancipação intelectual. Os pressupostos de nossa pesquisa estão em sintonia com o paradigma emergente acerca de como deve ser o ensino da filosofia, de forma temática e focando a produção de conceitos por parte dos alunos. Esta visão está em processo de construção, por isso nossa dificuldade em encontrar bibliografia especializada. No entanto, para compensar esta falta, e tendo em mente o comprometimento com este trabalho, participamos de um importante círculo de discussão sobre o tema, o II Simpósio Sobre Ensino de Filosofia, promovido nos dias 9, 10 e 11 de novembro de 2009 pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Nesse evento, foi possível entrar em contato direto com grandes nomes e pesquisadores da área do ensino da Filosofia, como Sílvio Gallo, Joaquim Antonio Severino e Celso Faveretto. Um dos focos abordados foi o ensino da filosofia como produção conceitual, o que permitiu a expansão dos horizontes e, principalmente, a busca de mais fontes bibliográficas acerca do assunto, visto que elas são bem escassas. Este problema não é simplesmente um insucesso no processo de busca, como se estas produções existissem em algum local e não estivéssemos conseguindo encontrá-las. Elas, realmente são poucas, e se resumem aos autores presentes nesse simpósio. O próprio Sílvio Gallo (2009), falou sobre a falta de material acerca dos novos paradigmas do ensino da disciplina, e enfatizou que este é o grande trunfo deste trabalho, pois agrega uma nova produção em uma área que precisa muito de novos 399 estudos. Disse também que, se não há material, devemos criá-los, pois a filosofia como produção conceitual é isso: encontramos problemas, o enfrentamos e criamos o novo para poder entendê-los e superá-los (informação verbal)6. Estas palavras nos serviram de inspiração para fazer um trabalho cada vez melhor, e nos deu maior certeza sobre a importância e a relevância desta pesquisa, que além de evidenciar uma nova e revolucionária forma de ensinar a filosofia, colocando os próprios alunos no papel de filósofos, também agrega uma ferramenta completamente atual a todo este processo, expandindo-o e contextualizando-o ainda mais. ABSTRACT This work is directly related to the research project, funded by Fundo de Apoio à Pesquisa da Universidade Sagrado Coração (FAP/USC), entitled "The blog as a pedagogical strategy in teaching philosophy." The text contains preliminary results with literature approach, pointing out a reference that, while being under construction, provides some important points about the use of technological tool "blog" for the teaching of philosophy. While there is a great daily contact between people and digital technology, in the education, work with these tools is still small, long way to go for building a consistent methodology for their implementation in the educational process. Therefore, was developed a research on the structure of blogs of the high school, identifying the educational goals of education professionals from different institutions. It was found that most of the bloggers surveyed is used as a pedagogical resource, or as a space for dissemination of information, either on the content of the lesson or what happens at school. Using the blog as a strategy is related to the production of written texts and active participation of teachers and students, being an extension of the classroom. Continuing research involves the development of a methodology to explore the use of blogs as a pedagogical strategy, involving the choice of subjects to be discussed and systematization of pedagogical actions to create categories of observation of student progress. In this context, the objective of the research in progress, is to propose a professor of philosophy that the blog is used as a pedagogical strategy in order to develop in students the skills of argument and criticality, their own discipline. Keywords: Education. Blogs. High school. Teaching philosophy. REFERÊNCIAS ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. 6 Informação fornecida por Gallo no II Simpósio Sobre Ensino de Filosofia, em 2009. 400 ABIN. Agência Brasileira de Inteligência. Uso do computador cresce 22%. Disponível em: <http://www.abin.gov.br/modules/articles/article.php?id=1164>. Acesso em: 05 jan. 2009. BARDIN, L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 1976. CAMPUS PARTY. Campus Party discute o papel das lan houses na inclusão social. Disponível em: <http://www.campus-party.com.br/index.php/imprensa.html> Acesso em: 26 fev. 2009. CHAGAS, V. H. C. S. A blague do blog: interatividde, subjetiviade e horizontalidade nos blogs jornalísticos da internet. Rio de Janeiro: Secretaria Especial de Comunicação Social, 2007. DELEUZE, G; GUATTARI, F. O que é a Filosofia? 2. ed. Rio de Janeiro: 34, 1997. FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 33. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. GADOTTI, M. Lições de Freire. Revista da Faculdade de Educação. São Paulo, v. 23, n.1/2, jan./dez. 1997. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010225551997000100002&script=sci_arttext> Acesso em: 26 fev. 2009. GIL, A. C. Como elaborar Projetos de Pesquisa. 3.ed. São Paulo: Atlas S.A., 1996. KOMESU, F. C. Entre o público e o privado: um jogo enunciativo na constituição do escrevente de blogs da internet. Disponível em: <http://libdigi.unicamp.br/document/?down=vtls000358660>. Acesso em: 05 jan. 2009. RODRIGUES, C. O uso de blogs como estratégia motivadora para o ensino de escrita na escola. 2008. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2008. SANTOS, R.C. Pesquisa demonstra que blogs melhoram desempenho escolar. Jornal da Unicamp, Campinas, ano XXIII, n. 419, dez. 2008. Disponível em: <http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/dezembro2008/ju419_pag08.php> Acesso em: 05 jan. 2009. 401 SCHITTINE, D. Blog: comunicação e escrita íntima na internet. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. TAPSCOTT, D. Geração digital: a crescente e irreversível ascensão da geração net. São Paulo: Makron Books, 1999.