Anais do X Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS INFANTIS: O CAMINHO PARA INSERIR A CRIANÇA NO MUNDO DA LITERATURA Geuciane Felipe Guerim (G-CCHE-UENP/CJ) Joselice Adriane da Costa (G-CLCA-UENP/CJ) Roseli de Cássia Afonso (Orientadora-CCHE-UENP/CJ) Introdução O presente estudo visa discutir a importância da contação de histórias no espaço escolar para a formação do futuro leitor. Acredita-se que esta prática contribui significativamente para a aprendizagem e desenvolvimento do educando, sendo imprescindível para inserir a criança no mundo da literatura. Através da fantasia e do imaginário a contação de histórias proporciona à criança o desenvolvimento de diversas habilidades, ampliando os horizontes da leitura e da escrita. A interação do pequeno leitor com a literatura infantil é fundamental para sua vida e indispensável no contexto escolar, pois proporciona o desenvolvimento afetivo, cognitivo e social da criança. A contação de histórias é um dos meios mais antigos de socialização de conhecimento, capaz de comunicar e transmitir valores, atitudes, saberes e desenvolver o gosto e o prazer pela leitura, sendo uma fonte de extrema importância para o desenvolvimento da criatividade e enriquecimento cultural da criança. Este trabalho resulta-se de pesquisas bibliográficas e do conhecimento adquirido na apresentação de uma oficina destinada a acadêmicos e professores. Por meio das leituras e das vivências compartilhadas, considera-se de extrema importância esta prática no dia a dia escolar, como possibilidade para a construção de novos saberes e para o desenvolvimento integral da criança. A importância da contação de histórias na prática educativa Com o surgimento das novas tecnologias, desenvolver o gosto e o prazer pela leitura se torna um desafio cada vez mais intenso no dia a dia escolar. As histórias estão presentes em nossa cultura há muito tempo e apresenta-se como um instrumento de grande 208 Anais do X Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 valia neste desafio, pois proporciona o desenvolvimento de diferentes habilidades e potencializa a construção de uma aprendizagem significativa. Ramos (2001) enfatiza que é importante que os professores (re) conheçam a pratica de narrar historias como uma pratica de leitura fundamental para a formação dos alunos enquanto leitores. É indispensável que essa importância não fique só no discurso, ela deve ser tecida no dia a dia escolar, ano após ano. A prática de contar histórias deve ser viabilizada desde cedo na dinâmica escolar, como instrumento de mediação do processo de ensino-aprendizagem. Ouvir histórias estimula e desenvolve a criatividade, imaginação, expressão corporal, senso crítico, satisfação, alegria, desenvolve a linguagem, memória, concentração, a busca pelos livros, promove a aprendizagem, socialização, desenvolvimento de habilidades como o ouvir/falar, entre outros. “A arte de contar histórias nos liga ao indizível e traz resposta às nossas inquietações” (BUSATTO, 2003, p. 9), permite a interação com o outro e com as próprias emoções. A história contada através da oralidade permite a interação entre contador e ouvintes, já que o corpo e a voz propiciam vivências comunitárias, perdidas na aceleração da vida moderna. Muitos educadores ainda não descobriram o quanto as histórias podem ajudá-los. O principal objetivo de contar uma história é divertir, estimulando a imaginação, mas uma história bem contada pode aumentar o interesse pela aula ou permitir a auto-identificação, favorecendo a compreensão de situações desagradáveis e ajudando a resolver conflitos. Agrada a todos sem fazer distinção de idade, classe social ou modo de vida (TORRES; TETTAMANZY, 2008, p.1) O momento da contação de histórias exige motivação e envolvimento do professor, e não mera habilidade. O uso de diferentes recursos, proposta, tais como livros de pano, tapetes e avental de histórias, fantoches, entre outros, proporcionam uma proposta de contação atrativa e envolvente, estimula a imaginação e a atenção dos ouvintes para a compreensão da história. O ambiente para contar histórias deve ser atrativo, encantador, momento de surpresa, fantasia e emoção. O clima em sala de aula durante a contação de histórias deve ser interativo, assim como era na época dos antigos contadores, que ao redor do fogo contavam seus costumes e valores a seu povo. A este respeito Mainardes (2008, p. 5) comenta que hoje: A platéia não se reúne mais em volta do fogo, mas nas escolas, os contadores de história são os professores, elo entre o aluno e o livro. Depois de ouvir uma história, o aluno quer prolongar o prazer e a reação dele é pedir para ler o livro, momento de o professor promover esse encontro, pois é através da narração que podemos fazer nascer no ouvinte o desejo de ouvir, ler e descobrir outras histórias. 209 Anais do X Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 As narrativas compartilhadas com as crianças favorecem para lidar com mais segurança com os problemas e com os sentimentos de tristeza, alegria, raiva. “O hábito de ouvir histórias desde cedo ajuda na formação de identidades; no momento da contação, estabelece-se uma relação de troca entre contador e ouvintes, o que faz com que toda a bagagem cultural e afetiva destes ouvintes venha à tona, assim, levando-os a ser quem são” (TORRES; TETTAMANZY, 2008, p.2). Nos pressupostos de Ramos (2011) na experiência da contação de histórias “as palavras proferidas pelo contador são como linhas desenhadas pelo ar” (2011, p.28). Enquanto o contador liberta as palavras presas no texto, o ouvinte, leitor indireto do texto narrado, cria e interpreta os desenhos, adentrando-se em um mundo mágico e tornando-se coautor da historia. O aluno como coautor da história contada é capaz de vivenciar e interpretar diversas situações por meio da imaginação, com isso torna-se parte da história contada, contribuindo para o desenvolvimento de inúmeras habilidades, entre elas a formação do leitor e o prazer pela leitura. Ramos (2011, p.28) aponta que “[...] a contação conduz os ouvintes, por exemplo, os alunos a fazerem uma leitura por meio da escuta, levando-os a pensar e a verem com os olhos da imaginação. Assim a prática de contar de histórias pode e deve ser constantemente utilizada em sala de aula, como uma estratégia eficiente para a formação de leitores. Freire (1993, p. 9) elucida que: [...] o ato de ler, que não se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. A leitura do mundo precede a leitura da palavra, dai que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura critica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto. A contação de história apresenta-se como excelente recurso para aulas mais atrativas e instigadoras, contribuindo de forma ímpar para a construção de cidadãos mais criativos. Ao utilizar esta prática professores e alunos terão a oportunidade de resgatar a memória e propor novas significações. 210 Anais do X Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 A Literatura Infantil e suas contribuições para a formação do indivíduo A contação de histórias desde sua origem é vista como um mundo encantado repleto de mistérios a desvendar. As histórias repassadas de geração em geração e transmitida através da oralidade despertam a curiosidade e fantasia em seus ouvintes. Desde há muito tempo, a transmissão oral “[...] foi uma das soluções encontradas pelas comunidades que não possuíam a escrita, para informar as gerações mais novas os seus saberes, valores e crenças” (RAMOS, 2011, p.29). Através da oralidade acontece o primeiro contato com a literatura, por meio de lendas, mitos, contos e fábulas. Meireles (1979, p. 66) afirma que “[...] é a Literatura Tradicional a primeira a instalar-se na memória da criança. Ela representa o seu primeiro livro, antes mesmo da alfabetização, e o único, nos grupos sociais carecidos de letras. Por esse caminho, recebe a infância a visão do mundo sentido, antes de explicado; do mundo ainda em estado mágico” Para vários estudiosos a literatura infantil surgiu especificamente a partir do século XVII, época de grandes acontecimentos, período da reorganização do ensino e fundação do sistema educacional burguês. Foi a partir deste momento que se começou a pensar particularmente na criança, já que, anteriormente eram vistas como adultos em miniaturas, participavam de eventos que não eram condizentes a sua faixa etária, pois não existiam produções referentes às especificidades da infância. De acordo com Áries (1981, p.128), “as crianças eram desenhadas como adultos em escala menor, com músculos e feições de adulto”. Com o advento da revolução industrial no século XVIII, a Inglaterra tornouse o centro da comercialização e do fundo econômico, nesta época os escritores começaram a desenvolver literatura para criança, atendendo a especificidade da mesma, porém, com o intuito de produção econômica e fonte de renda, os livros eram produzidos com a intenção de gerar a expansão do comércio. Sobre isto Lajolo (1985, p. 17) aponta que: A criança passa a deter um novo papel na sociedade, motivando o aparecimento de objetos industrializados (o brinquedo) e culturais (o livro) ou novos ramos da ciência (a psicologia infantil, a pedagogia ou a pediatria) de que ela é destinatária. Todavia, a função que lhe cabe desempenhar é apenas de natureza simbólica, pois se trata antes de assumir uma imagem perante a sociedade, a de alvo de atenção e interesse dos adultos, que de exercer uma atividade econômica ou comunitariamente produtiva, da qual adviesse alguma importância política e reivindicatória. 211 Anais do X Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 Neste período a literatura infantil possuía como principal objetivo transmitir valores, mostrando as possibilidades de enfrentar a realidade social a partir da compreensão do texto. Com o passar do tempo foi agregando sua importância ao processo de ensinoaprendizagem, já que, é através dela que se pode despertar o imaginário e a fantasia da criança. Nesta perspectiva Abramovich (1995, p.17) elucida que “é ouvindo histórias que se pode sentir e enxergar com os olhos do imaginário [...] abrir as portas à compreensão do mundo”. Desta forma, a literatura infantil é um instrumento essencial na constituição do leitor, desperta a criatividade e aumenta o conhecimento cultural, possibilita ainda a formação cidadão críticos e conscientes de uma sociedade mais justa. No que se refere a isso Silva (2013, p.24) afirma que: Nunca é demais lembrar que a prática da leitura é um princípio de cidadania, ou seja, leitor cidadão, pelas diferentes práticas de leitura, pode ficar sabendo quais são as suas obrigações e também pode defender os seus direitos, além de ficar aberto às conquistas de outros direitos necessários para uma sociedade justa, democrática e feliz. A leitura deve ser incentivada pela família desde a infância, pois, de acordo com Lajolo (1981) é uma das primeiras instituições que a criança possui contato. Freire (1993) em sua obra “A importância do ato de ler”, discute a influência da leitura em sua infância e traz lembranças do seu contato com a leitura no ambiente em que vivia: A importância do ato de ler, eu me senti levado – e até gostosamente – a “reler” momentos fundamentais de minha prática, guardados na memória, desde as experiências mais remotas de minha infância, de minha adolescência, de minha mocidade, em que a compreensão crítica da importância do ato de ler se veio em mim constituindo. (FREIRE, 1993, p.11). A dimensão de literatura infantil é importante para a construção do indivíduo e das relações sociais em que vai se deparar no futuro, visto que, as histórias infantis trabalham sentimentos e emoções típicos da infância como curiosidade, medo, carinho, dor, perda, sentimentos de inveja, amizade, entre outros. Segundo Abramovich (2006, p.19): 212 Anais do X Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 É através de uma história que se pode descobrir outros lugares, outros tempos, outros jeitos de agir e de ser, outras regras, outra ética, outra ótica... É ficar sabendo história, geografia, filosofia, direito, política, sociologia, antropologia, etc... sem precisar saber o nome disso tudo e muito menos achar que tem cara de aula... Porque, se tiver, deixa de ser literatura, deixa de ser prazer, e passa a ser didática, que é um outro departamento (não tão preocupado em abrir todas as comportas da compreensão do mundo). Enfim, a literatura infantil possui o poder de influenciar a criança e auxiliála na compreensão do mundo e dos assuntos que circundam a sociedade a todo o momento, por meio da contação de histórias a criança experimenta novos lugares, tempos e conhecimentos das diferentes áreas do saber. Considerações Finais Acredita-se que a contação de histórias por meio de uma ação planejada e sistematizada constitui-se como possibilidade relevante para promover o desenvolvimento integral da criança e o incentivo à literatura infantil. No contexto escolar, a utilização da literatura infantil no torna-se indispensável para ampliar os horizontes do indivíduo, possibilitando a formação de novos leitores, cidadãos participativos, críticos e conscientes para interferir e transformar sua realidade. Assim, a prática da literatura infantil pode auxiliar no desenvolvimento da criança e auxiliá-la na construção e na compreensão do mundo, por meio da imaginação a criança é capaz de desvendar os segredos propostos pela história. De acordo com as leituras e vivências, pode-se afirmar que a contação de histórias auxilia a prática pedagógica, desperta o gosto pela leitura e contribui de forma significativa para a construção de novos saberes, no qual, contar histórias é compartilhar segredos e convidar os ouvintes a desvendá-los. Cabe ao professor gostar de ler, estar atualizado e principalmente ler para suas crianças, acreditar no poder da leitura, da fantasia e imaginação infantil. Assim, a contação de história terá significado, será constante em sua prática pedagógica, proporcionando um ambiente propício à aprendizagem e ao prazer humano. 213 Anais do X Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 Referências ABRAMOVICH, Fani. Literatura Infantil: gostosuras e bobices. São Paulo; Scipione, 1995. ______. Literatura infantil: gostosura e bobices. 5.ed. São Paulo: Scipione, 2006. ÁRIES, Philippe. A história social da criança e da família. 2 Ed. Rio de Janeiro:LTC, 1981. 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