Purificação e caracterização farmacológica
parciais das peçonhas das aranhas Lycosa
erythrognatha e Lycosa sp.
Daniel Moreira dos Santos
Orientadora: Profa. Dra. Maria Elena de Lima Perez Garcia
Co-orientador: Prof. Dr. Marcelo Porto Bemquerer
Co-orientador: Prof. Dr. Jader dos Santos Cruz
INTRODUÇÃO
•Biologia das aranhas
As aranhas são animas pertencentes ao filo Arthropoda,
sub-filo Chelicerata, classe Arachnida.
Há cerca de 40 mil espécies descritas.
A maioria das espécies são inofensivas.
Algumas espécies de aranhas são bastante
venenosas.
Todas são carnívoras e preferem caçar a sua presa viva,
matá-las e comê-las, sugando as partes líquidas das
mesmas.
Para se apoderarem das presas, há dois métodos:
- O primeiro consiste em ver, pressentir,
atrair ou caçar a vítima;
- O segundo método consiste na construção
de uma teia onde os insetos alados, se
tornam presas fáceis.
•As Tarântulas
São conhecidas como aranhas-lobo ou aranhas de
jardim.
Há cerca de 2200 espécies em todo mundo e
cerca de 120 no Brasil.
Podem ser identificadas pelo arranjo característico
de seu olhos: quatro pequenos na fileira anterior,
dois grandes e dois medianos na fileira posterior
(FOELIX, 1996).
As aranhas do gênero Lycosa não constroem
teias, são ágeis caçadoras.
•Venenos e toxinas de aranhas
A peçonha das aranhas é o produto de secreção de
um par de glândulas situadas na região anterior do
cefalotórax, utilizada para paralisar sua presa.
O efeito letal é unicamente secundário (FRIEDEL,
1989).
Apesar de quase todas as espécies de aranhas
serem venenosas, somente cerca de 20-30 espécies
são perigosas para o homem (FOELIX, 1996).
Os venenos são constituídos por uma grande
variedade de compostos:
Toxinas protéicas.
Acilpoliaminas
Aminoácidos
Enzimas proteolíticas
Sais
Ácidos nucléicos
Fatores humorais
Trabalhos com classes distintas de artrópodes
mostraram que o veneno destes animais possuem
uma grande variedade de efeitos:
- Podem se ligar em canais de sódio, potássio ou
cálcio de membranas excitáveis.
- Podem atuar no sistema glutamatérgico de insetos
e mamíferos.
- Podem ter ação antibacteriana.
Toxinas presentes na peçonha de aranhas são
classificadas quimicamente em dois grandes grupos
principais:
- Acilpoliaminas
- Peptídeos ricos em cisteína
Acilpoliaminas
São toxinas de baixa massa molecular (300 a 700 Da).
Possuem estrutura básica formada por uma
poliamina alifática, um grupo cromóforo e, na maioria
das vezes, um aminoácido.
Apresentam ação farmacológica bloqueando os
receptores de glutamato.
Toxinas peptídicas
Consistem de cadeia de 30 à 77 resíduos de
aminoácidos.
Possuem alto conteúdo de cisteínas.
Normalmente afetam canais iônicos.
•Lycosa erythrognatha
A espécie Lycosa erytrhognatha pode ser encontrada
com relativa facilidade na região sudeste do Brasil.
O gênero Lycosa, não é considerado potencialmente
perigoso para a espécie humana (LUCAS, 1988).
Dados eletrofisiológicos anteriores sobre o veneno
dessa aranha demonstraram um efeito similar a
toxinas do tipo a de escorpião em preparações de
nervoso isquiático de rã (CRUZ e cols, 1994).
O veneno de Lycosa erythrognatha é pouco estudado e o
conhecimento de seus componentes, farmacologicamente
ativos, pode ser interessante para a revelação de novos
fármacos (ex. antibióticos), inseticidas, enzimas proteolíticas,
ou mesmo de moléculas que sirvam como sondas para
estudos bioquímicos, envolvendo estrutura e função de
receptores e de canais iônicos.
OBJETIVOS
O objetivo desse trabalho foi iniciar a purificação e a
caracterização farmacológica do veneno de Lycosa
erythrognatha e Lycosa sp.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Comparar os perfis cromatográficos dos venenos de
Lycosa erythrognatha e de Lycosa sp.
Comparar os perfis cromotográficos dos venenos de
Lycosa erythrognatha em relação a espécimes:
machos e fêmeas, jovens e adultos e quanto à
época de extração.
Verificar a ação do veneno total de Lycosa erytrhognatha
em mosca doméstica e em camundongos.
Verificar a ação do veneno de Lycosa sp em mosca
doméstica.
Verificar a ação do veneno de Lycosa erythrognatha em
células GH3, por técnicas eletrofiológicas.
•Coleta, identificação das aranhas e extração das
peçonhas de Lycosa sp e Lycosa erythrognata
As aranhas foram coletadas na região da grande Belo
Horizonte e de Santa Bárbara, MG.
As aranhas eram mantidas em criatório no Laboratório
de Aracnobiologia do Departamento de Zoologia (ICBUFMG).
A partir das aranhas recebidas foram distinguidas duas
espécies, Lycosa erythrognatha e Lycosa sp.
O veneno é obtido através de estímulo elétrico das
quelíceras da aranha.
•Dosagem de proteína dos venenos
Dosagem do conteúdo protéico dos venenos de Lycosa
erythrognatha e Lycosa sp. pelos métodos de Lowry e Bradford.
Espécie / método
Lowry
Lycosa erythrognatha 63  18 µg/µl (n= 3)
Lycosa sp.
70  19µg/µl (n=3)
Bradford
45  10 µg/µl (n=8)
49  16 µg/µl (n=3)
•Bioensaios em camundongos
A partir dos bioensaios em camundongos (ICV) não se
verificou letalidade com doses de até 80µg de veneno
de Lycosa erythrognatha (n=6).
Observou-se um aumento passageiro da frequência
respiratória dependente da dose.
•Bioensaios em moscas domésticas
Os efeitos das injeções intratoráxicas dos venenos de
Lycosa erythrognatha e Lycosa sp. em moscas
começaram a ser observados após 10 minutos da
aplicação (n=16).
Produziram perda da atividade motora por paralisia
flácida, a partir de 25 ng/mosca, para o veneno de Lycosa
sp e 50 ng/mosca, para Lycosa erythrognatha.
Doses de 50 ng/mosca do veneno de Lycosa sp e 100
ng/mosca do veneno de Lycosa erythrognatha mataram
todos os indivíduos.
•Perfis eletroforéticos e cromatográficos da peçonha
de Lycosa erythrognatha e de Lycosa sp.
Foi realizada comparação do veneno de Lycosa
erythrognatha e Lycosa sp utilizando-se as técnicas
de eletroforese em gel de poliacrilamida (SDStricina) e cromatografia de fase reversa em HPLC.
A
B
L.erythrognatha
C
D
Lycosa sp.
Fig. 3. Eletroforese em gel de poliacrilamida SDS-tricina do veneno
de Lycosa erythrognatha e Lycosa sp. Amostras: (A) 10 µg do veneno
de l. erythrognata; (B) 20 µg do veneno de Lycosa erythrognatha; (C) 10
µg do veneno de Lycosa sp.; (D) 20 µg do veneno de Lycosa sp. Gel de
16,5%de acrilamida em Tris-HCl 1,0 M pH 8,45, contendo 13,3% de
glicerol. Coloração pelo Azul brilhante G. A corrida foi desenvolvida por,
aproximadamente 3 horas a 150 V.
Absorvância a 220 nm (x1000)
50
400
40
300
30
200
20
100
10
0
0
0
15
30
45
60
75
90
105
120
Tempo (min.)
Fig. 4. Perfil da cromatografia do veneno de Lycosa erythrognatha (fêmeas) em fase reversa (HPLC). Coluna
Supelco (C18), equilibrada com solução 0.1% de TFA em água e eluída contra um gradiente linear de solução de
acetonitrila 90%, TFA 0,1% a um fluxo de 0,75ml/min. A quantidade de veneno aplicado foi de 50µg. Veneno
extraído em março de 2001.
% do solvente B
500
500
50
400
40
300
30
200
20
100
10
0
0
0
15
30
45
60
75
90
105
120
Tempo (min.)
Fig. 5. Perfil da cromatografia do veneno de Lycosa sp (fêmeas) em fase reversa (HPLC). Coluna Supelco
(C18), equilibrada com solução 0.1% de TFA em água e eluída contra um gradiente linear de solução de
acetonitrila 90%, TFA 0,1% a um fluxo de 0,75ml/min. A quantidade de veneno aplicada foi de 50µg. Veneno
extraído em março de 2001.
Variações intraespecíficas do veneno de Lycosa
erythrognatha
Variações em venenos de indivíduos de uma mesma
espécie são pouco estudadas, entendermos a
variabilidade a esse nível tem três funções.
-Pode conduzir à descoberta de toxinas com
diferentes efeitos neurológicos;
-Pode ajudar nos estudos evolutivos que
causaram a diversidade de um número elevado de
toxinas.
-É importante para se escolher o tratamento
apropriado e o antiveneno a ser usado no caso de
espécies que produzem toxinas com importância
médica.
Utilizando-se cromatografia em fase reversa (HPLC)
verificamos variações significativas na composição do
veneno de L. erythrognatha em relação à época de
extração, sexo e idade.
% do solvente B
eluente B
60
Absorvância a 220 nm
(x1000)
500
50
400
40
300
*
*
200
30
20
100
0
10
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Absorvância a 220 (x1000)
90
% do solvente B
eluente B
T e m p o ( m in . )
60
*
500
50
400
*
300
40
30
200
20
100
0
10
0
10
20
30
40
50
60
70
80
T e m p o ( m in . )
Fig. 6. Perfis das cromatografias dos venenos de Lycosa erythrognatha (fêmeas), coletados em diferentes
épocas, em fase reversa (HPLC). Coluna Supelco (C18), equilibrada com solução 0.1% de TFA em água e
eluída contra um gradiente linear de solução de acetonitrila 90%, TFA 0,1% a um fluxo de 0,75ml/min. A
quantidade de veneno aplicado foi de 50µg. O Perfil (A) foi obtido do veneno coletado no período de novembro
de 2000 a fevereiro de 2001, O Perfil (B) foi obtido do veneno recolhido no período de março a junho de 2001.
(*) Esse composto teve um aumento de aproximadamente 2,5 vvezes e este outro (*) teve um aumento de
aproximadamente 8 vezes do cromatograma A para o cromatograma B.
90
Absorvância a 220 nm (x1000)
500
50
400
40
300
30
200
20
100
10
0
0
0
15
30
45
60
75
90
105
120
Tempo (min.)
Fig. 7. Perfil da cromatografia do veneno de Lycosa erythrognatha (machos) em fase
reversa (HPLC). Coluna Supelco (C18), equilibrada com solução 0.1% de TFA em água e
eluída contra um gradiente linear de solução de acetonitrila 90%, TFA 0,1% a um fluxo de
0,75ml/min. A quantidade de veneno aplicado foi de 50µg. Veneno extraído em março de 2001.
Absorvância a 220 nm (x1000)
50
400
40
300
30
200
20
100
10
0
0
0
15
30
45
60
75
90
105
120
Tempo (min.)
Fig. 8. Perfil da cromatografia do veneno de Lycosa erythrognatha (jovens) em fase reversa (HPLC). Coluna
Supelco (C18), equilibrada com solução 0.1% de TFA em água e eluída contra um gradiente linear de solução de
acetonitrila 90%, TFA 0,1% a um fluxo de 0,75ml/min. A quantidade de veneno aplicado foi de 50µg. Veneno extraído
em março de 2001.
% do solvente B
500
•Estudos eletrofisiológicos do veneno de L.
erythrognatha em células GH3.
Foram realizados estudos eletrofisiológicos iniciais
utilizando a técnica de “patch clamp” “whole cell”, em
células GH3. Devido ao número limitado de
experimentos não foi feita a estatística dos dados
apresentados. Esses são registros representativos.
Efeito do veneno de L. erythrognatha sobre as correntes
de Na+.
Controle
200 pA
Veneno (100 µg/ml)
1 ms
5 ms
0 mV
-80 mV
-80 mV
Fig. 9. Curso temporal de registros da corrente de sódio,
medidas na condição controle e na presença do veneno de L.
erythrognatha. Os registros do curso temporal foram obtidos na
condição controle e na presença do veneno (100 µg/ml). observase um aumento no pico corrente e alteração no curso temporal da
corrente na presença do veneno em relação ao controle.
Efeito do veneno de L. erythrognatha sobre as correntes
de K+.
200 pA
Controle
10 µg/ml de veneno
1ms
5 ms
70 mV
-80 mV
-80 mV
Fig. 11. Curso temporal de registros da corrente de potássio,
medidas na condição controle e na presençca do veneno de
L. erythrognatha. Os registros do curso temporal foram obtidos
na condição controle e na presença do veneno (100 µg/ml). Não
observa-se diferenças significativas na corrente de potássio do
controle em relação à presença do veneno.
Efeito do veneno de L. erythrognatha sobre a relação
corrente-voltagem
Controle
Veneno (10 g/ml)
A
0
Corrente (pA)
-200
-400
-600
-800
-1000
-80
-60
-40
-20
0
20
40
60
80
Voltagem (mV)
Controle
Veneno (100 g/ml)
100
B
0
Corrente (pA)
-100
-200
-300
-400
-500
-80
-60
-40
-20
0
20
40
60
80
Voltagem (mV)
Efeito do veneno de Lycosa erythrognatha sobre a corrente de Na+.
Relação corrente voltagem da corrente Na+ antes ()e após () a adição de 10
µg /ml(A) e 100 µg/ml (B) de veneno de Lycosa erythrognatha fêmea. Os
canais eram mantidos em um potencial de – 80mV e os pulsos testes foram
aplicados de – 80mV a + 70 mV, com intervalos entre os pulsos de 2s. Após
a aplicação do veneno observa-se um pequeno deslocamento para potenciais
mais negativos da dependência de potencial para a ativação dos canais de
sódio alem de um aumento do pico da corrente.
Os estudos eletrofiológicos em células GH3 com o
veneno de L. erythrognatha demonstraram uma
ação nas correntes de sódio, sendo esse efeito
similar ao efeito de toxinas do tipo b de escorpião.
Em trabalho anterior publicado por CRUZ e
cols (1994) verificou-se um efeito típico de
toxinas do tipo a de escorpião.
CONCLUSÕES
- Os perfis cromatográficos e eletroforéticos dos venenos
de L. erythrognatha e Lycosa sp indicam que estas
peçonhas são misturas complexas, com similaridades e
algumas diferenças, entre elas.
- As peçonhas apresentaram fraca toxicidade quando
injetadas em camundongos, porém foram mais ativas em
insetos (mosca doméstica).
- A peçonha de Lycosa sp foi mais tóxica para
moscas que a peçonha de L. erythrognata.
- Foram evidenciadas diferenças nos perfis
cromatográficos das peçonhas de L. erythrognatha
quanto a época da coleta, ao sexo e a idade (jovens e
adultos).
- A peçonha de L. erythrognatha alterou a corrente
de sódio de células GH3, provocando aumento nos
picos das mesmas e um deslocamento para
potenciais mais negativos.
- A peçonha de L. erythrognatha não apresentou
nenhum efeito sobre canais de K+.
PERSPECTIVAS
- Purificar e caracterizar os componentes responsáveis pelo
efeito letal do veneno de L. erythrognatha e Lycosa sp em
insetos e verificar a sua possível utilização como
bioinseticidas.
- Purificar e caracterizar os componentes do veneno de L.
erythrognatha responsáveis pelo efeito em canais de sódio
observado em células GH3.
- Estudar o modo de ação das toxinas isoladas, por
diferentes métodos farmacológicos.
- Pesquisar a presença de acilpoliaminas nos venenos de
L. erythrognatha e Lycosa sp.
- Estudar a existência de agentes antimicrobianos nos
venenos de de L. erythrognatha e Lycosa sp, considerandose que já foi demonstrada sua presença em aranhas desse
gênero (YAM & ADAMS 1998).
- Determinar a DL50 em insetos do veneno de L. erythrognatha
e Lycosa sp.
- Estudar o possível efeito deste veneno e das toxinas em
preparações de mamíferos.
AGRADECIMENTOS
À profª Maria Elena pelo apoio, ensinamentos e confiança
deposita em mim para a realização desse trabalho.
Ao Prof. Marcelo Bemquerer, pelo ensinamentos e
disponibilidade em ajudar.
Ao prof. Jader Cruz e a Roberta pela inestimavem ajuda
nos experimentos de eletrofisiologia e a todos do
Laboratório de Membranas Excitáveis pela
receptibilidade.
Ao prof. Mário De Maria e ao Éder pela criação e
identificação das aranhas.
Aos meus amigos do Laboratório de Venenos e Toxinas
Animais, Adriano, Alessandra, Carla, Flávia, Glauco,
Julinho, Leida, Luciene, Malu, Márcia, Raquel, Sabrina e
Zulema, pela ajuda, amizade, e momentos agradaveis
proporcionados.
E a todos que de alguma forma tornaram esse trabalho
possível.
Download

Lycosa erythrognatha