A IMPORTÂNCIA DA AGRICULTURA IRRIGADA PARA O DESENVOLVIMENTO DA REGIÃO NORDESTE DO BRASIL Braulio Cezar Lassance Britto Heinze 2002 Braulio Cezar Lassance Britto Heinze A IMPORTÂNCIA DA AGRICULTURA IRRIGADA PARA O DESENVOLVIMENTO DA REGIÃO NORDESTE DO BRASIL Monografia apresentada ao curso MBA em Gestão Sustentável da Agricultura Irrigada da ECOBUSINESS SCHOOL/FGV. Orientador Ph.D. Gertjan Berndt Beekman BRASÍLIA DISTRITO FEDERAL - BRASIL 2002 BRAULIO CEZAR LASSANCE BRITTO HEINZE A IMPORTÂNCIA DA AGRICULTURA IRRIGADA PARA O DESENVOLVIMENTO DA REGIÃO NORDESTE Monografia apresentada ao curso MBA em Gestão Sustentável da Agricultura Irrigada da ECOBUSINESS SCHOOL/FGV. APROVADA em quinta-feira, 30 de janeiro de 2003. D. Sc. Jânio Caetano de Abreu Fundação Universidade Federal de São João Del Rey Ph.D. Willer Hudson Pós Escola de Engenharia da UFMG Ph.D. Laércio Couto Universidade Federal de Viçosa Ph.D. Gertjan Berndt Beekman IICA (Orientador) BRASÍLIA DISTRITO FEDERAL - BRASIL A Deus, Por ter-me dado forças e iluminado meus caminhos para vencer os obstáculos; Aos meus Pais (Braulio e Solange), Por servirem de exemplo de dedicação e amor; OFEREÇO A minha esposa (Ana Karine) pelo apoio, compreensão e estímulo, contribuindo de forma decisiva para a conclusão deste projeto; DEDICO AGRADECIMENTOS A valorização de um trabalho técnico-científico não está apenas no produto final. A sua elaboração não depende somente do conhecimento e experiência do seu autor, tendo em vista que nenhum ser humano é capaz de sozinho, produzir algo em qualquer atividade sem o compartilhamento e o comprometimento de outras pessoas e entidades, na troca de experiências e informações. Neste contexto, quero expressar os meus agradecimentos. Ao meu orientador (Gertjan Berndt Beekman), aos mestres e colegas de curso e a todos aqueles que, direta ou indiretamente, contribuíram para o desenvolvimento das idéias contidas neste trabalho. BIOGRAFIA BRAULIO CEZAR LASSANCE BRITTO HEINZE, Graduado em ciências econômicas e Pós-graduado em administração financeira pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal – AEUDF. SUMÁRIO LISTA DE SÍMBOLOS ........................................................................................ i RESUMO......................................................................................................... iii ABSTRACT ......................................................................................................iv 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 1 2 REFERENCIAL TEÓRICO................................................................................ 3 3 MATERIAL E MÉTODOS................................................................................. 4 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO.......................................................................... 5 5 CONCLUSÕES..............................................................................................54 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................57 ANEXOS B - LISTA DE FIGURAS E TABELAS......................................................58 GLOSSÁRIO....................................................................................................59 LISTA DE SÍMBOLOS BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social CODEVASF Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco CVSF Comissão do Vale do São Francisco DNOCS Departamento Nacional de Obras Contra às Secas DNOS Departamento Nacional de Obras de Saneamento EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária FNE Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste IOCS Inspetoria de Obras Contra às Secas IRGA Instituto Rio-Grandense do Arroz GEIDA Grupo de Estudos Integrados de Irrigação e Desenvolvimento Agrícola PEA População Economicamente Ativa PIB Produto Interno Bruto PIN Programa de Integração Nacional POLONORDESTE Programa de Desenvolvimento de Áreas Integradas do Nordeste PPI Programa Plurianual de Irrigação PND Plano Nacional de Desenvolvimento PROFIR Programa de Financiamento de Equipamentos de Irrigação PROINE Programa de Irrigação do Nordeste PRONI Programa Nacional de Irrigação i PROVÁRZEAS SUDENE Programa Nacional para Aproveitamento Racional de Várzeas irrigáveis Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste SUVALE Superintendência de Desenvolvimento do Vale do São Francisco ii RESUMO HEINZE, Braulio Cezar Lassance Britto. A IMPORTÂNCIA DA AGRICULTURA IRRIGADA PARA O DESENVOLVIMENTO DA REGIÃO NORDESTE. BRASÍLIA: ECOBUSINESS, 2002. 59p. (Dissertação -)∗ A irrigação tem importante papel a cumprir no Nordeste semi-árido, garantindo à atividade agrícola sustentabilidade econômica, minimizando, sobretudo o risco tecnológico, representado pela escassez de água. Com efeito, este trabalho busca apresentar como o desenvolvimento da agricultura irrigada na região (como indutora de modernização agrícola e agroindustrialização) permitirá que seja desencadeada uma série de benefícios para a região, tais como: geração de divisas, abastecimento interno de hortícolas, geração de emprego e melhoria na qualidade de vida. ∗ Comitê Orientador: Gertjan Berndt Beekman (Orientador). iii ABSTRACT HEINZE, Braulio Cezar Lassance Britto. THE IMPORTANCE OF THE IRRIGATED AGRICULTURE FOR THE NORTHEAST AREA DEVELOPMENT. BRASÍLIA: ECOBUSINESS, 2002. 40p. (Dissertação - )∗ The irrigation has an important function to accomplish in the semi-arid Northeast, guaranteeing to the agricultural activity economical sustainability, minimizing above all, the technological risk, acted by the shortage of water. With effect, this work search to present how the development of the irrigated agriculture in the area (as inductor of agricultural modernization and agriculture industrialization) will allow a series of benefits for itself, such as: generation of exchange value, internal provisioning of horticultural, job generation and improvement in the life quality. ∗ Comitê Orientador: Gertjan Berndt Beekman (Orientador). iv 1 INTRODUÇÃO Com o conhecimento atual dos recursos de solo e água, o Brasil tem um potencial de irrigação de 52 milhões de hectares. A área atualmente irrigada atinge 3,0 milhões de hectares, sendo 1,4 milhão de hectares com irrigação a pressão e 1,6 milhão de hectares com irrigação por superfície. A área irrigada no Nordeste é de 495.370 ha e a área potencial de irrigação é de 2.717.820 ha. Têm-se desenvolvido apenas 18,2% da área potencial. A maior concentração de área irrigada está nos Estados da Bahia (33,95%), Pernambuco (17,97%) e Ceará (16,63%). A potencialidade de expansão da agricultura irrigada apresenta-se promissora em relação a diferentes aspectos que influem sobre o desenvolvimento econômico, quais sejam: • Do ponto de vista da utilização dos recursos naturais, para regiões semi-áridas permite a utilização dos solos durante todo o ano, obtendo-se, em alguns casos, duas a três colheitas por ano; • Efeito catalítico que podem exercer as áreas de irrigação em relação às atividades econômicas e aos serviços de apoio governamental abre perspectivas para a adoção 1 de enfoques de desenvolvimento integrado, ensejando a implantação de complexos agro-industriais e serviços conexos, especificamente para a produção de alimentos e produtos de exportação; • Os efeitos sociais da expansão maciça de áreas irrigadas com a correspondente integração de atividades produtivas deverão traduzir-se numa maior ocupação de mão-de-obra por hectare irrigado. 2 2 REFERENCIAL TEÓRICO A pesquisa proposta tem como referencial, diversos estudos realizados por instituições que atuam direta ou indiretamente na temática da agricultura irrigada e sua utilização como instrumento desencadeador de desenvolvimento na região Nordeste, buscando demonstrar como a agricultura irrigada pode ser importante para o desenvolvimento sócio-econômico da Região Nordeste do Brasil e também apresentar potencialidades da Região Nordeste a serem exploradas com a utilização da agricultura irrigada. Dentre as instituições utilizadas para a elaboração deste trabalho estão: Banco do Nordeste, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Ministério da Integração Nacional e a Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (CODEVASF), Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA). 3 3 MATERIAL E MÉTODOS O Trabalho foi formulado a partir de Pesquisas bibliográficas a diversos estudos realizados por instituições renomadas e que atuam direta ou indiretamente na temática da agricultura irrigada e sua utilização como instrumento desencadeador de desenvolvimento na região Nordeste, entre essas instituições estão: Banco do Nordeste, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Ministério da Integração Nacional e a Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (CODEVASF). As justificativas apresentadas neste documento permitem comprovar a relação existente entre o tema proposto e a área de concentração do curso MBA que está focado na Gestão Sustentável da Agricultura Irrigada. 4 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 IMPORTÂNCIA DO SETOR AGRÍCOLA NA ECONOMIA DO BRASIL E DO NORDESTE. A agricultura brasileira tem, no passado, no presente e terá, certamente no futuro, relevantes contribuições a dar ao desenvolvimento econômico e social do Brasil. No passado, contribuiu decisivamente, por meio das funções clássicas, para prover de alimentos baratos as populações urbanas, liberar mãode-obra para a indústria crescente, gerar divisas, via exportação de excedentes, e ainda capital para o processo de industrialização. O processo de modernização da agricultura provocou mudanças radicais no sistema interno de produção e no seu relacionamento com os setores industriais, situados antes e depois da porteira, dando corpo ao conceito de agronegócio ou complexo agroindustrial, envolvendo a atividade de produção agrícola propriamente dita (lavouras, pecuária, extração vegetal), aquelas ligadas ao fornecimento de insumos, às relacionadas com o processo agroindustrial e às que dão suporte ao fluxo de produto até à mesa do consumidor final. Esse enfoque de agronegócio tem implicações profundas na organização econômica do Brasil, pois, por meio dele, revela-se a real dimensão estratégica da agricultura 5 brasileira, que não pode ser mais vista como uma atividade estanque, cujo valor adicionado representa uma pequena e decrescente parcela do Produto Interno Bruto (PIB), com o avanço do desenvolvimento econômico, mas, sim, como centro dinâmico de um conjunto de atividades econômicas, capazes de gerar riqueza, emprego e divisas. 4.1.1 – Na geração de riqueza O PIB brasileiro foi de US$ 775,7 bilhões, em 1998, tendo crescido 17,3% no período 90/98, e apresentada tendência ascendente a partir de 1992, havendo, entretanto, redução no seu valor em 3,3% em relação a 1997. O PIB do setor agropecuário, no conceito de “dentro da porteira”, ao contrário, apresentou tendência descendente a partir de 1993, menos em 1998, mantendo, entretanto, participação variável da ordem de 8% a 10%. Por outro lado, quando se calcula o PIB agropecuário de forma sistêmica, ou seja, agregando os elos da cadeia do agronegócio, a sua participação passa a ser 46%, em 2002, transformando-o na atividade econômica mais importante do país. Calculada sobre o valor do PIB dos últimos três anos, essa participação se aproxima dos US$ 300 bilhões, anualmente. 6 Esta visão sistêmica enseja melhor compreensão do funcionamento da atividade agropecuária, mostra sua real dimensão, auxiliando os tomadores de decisão a formular políticas com mais foco e maior probabilidade de sucesso. Essa visão rompe com a análise segmentada, que muitas vezes perde informações importantes sobre o encadeamento das ações. É que a agroindústria e uma série de serviços de armazenamento, transporte e beneficiamento, além da indústria de insumos, máquinas e equipamentos, não existiriam sem a agropecuária. Os índices do PIB desagregados por região geográfica, confirmam a grande concentração da riqueza nacional na região Sudeste, que representa, em média, 60% do total, no período analisado, enquanto a região Nordeste participa, em média, com 12,5% do PIB do País. Por outro lado, analisando os dados desagregados por região e setor, vê-se que todas as regiões, no período analisado, 90/98, cresceram no setor da agropecuária (visão segmentada), exceção feita ao Nordeste, que apresentou pequenas oscilações, mas com pequena queda no período, mantendo uma participação relativa aproximada de 10% do PIB regional no período em análise, diferentemente do comportamento observado nos seus dois outros setores. 7 O setor agropecuário, apesar de todas as dificuldades que lhe são inerentes, em vista das incertezas e riscos por que passam as atividades da agricultura e daquelas que lhe são impostas por políticas macroeconômicas, no mais das vezes, desfavoráveis, vem cumprindo seu papel, gerando riquezas, pois é responsável por 46% do PIB nacional, numa visão sistêmica e moderna de agronegócio. 4.1.2 – Na geração de renda Para se analisar corretamente a importância da participação da agricultura na geração de emprego, a visão de integração da agricultura também é de suma importância. A produção agrícola propriamente dita empregou cerca de 16,7 milhões de pessoas em 1997, o que representa 22,3% da População Economicamente Ativa (PEA) do Brasil. Se este número, por si só, é muito representativo, estudiosos sustentam que, para cada ocupação na área agrícola corresponde uma outra ocupação no restante do agronegócio, o que significa mais ou menos 33,4 milhões de empregos gerados, correspondendo a 44,6% da PEA brasileira. Em termos de região Nordeste a agricultura é absolutamente fundamental. Nessa região, a agricultura no seu conceito convencional de “dentro da porteira”, empregava 8,2 milhões de pessoas, o equivalente a 38,7% da PEA regional e a 48,8% da PEA 8 do setor agrícola de todo o Brasil em 1997 Quando analisada a participação das diversas atividades econômicas, no Nordeste, na absorção da população economicamente ativa, verifica-se que 41,4% do total ativo está na agricultura, no conceito de atividade direta, sendo pequena a contribuição da indústria e serviços. Ademais, se considerado o agronegócio, este empregava no Nordeste cerca de 83% da população ocupada e 77% do total da população economicamente ativa em 1997. 4.1.3 – Na geração de divisas O setor agropecuário tem contribuído fortemente para a geração de divisas para o país. Historicamente, a participação da pauta agrícola na balança comercial brasileira foi sempre muito significante. Em 1970, ela chegou a representar 74,1% do total das exportações. Embora tenha decrescido sua participação relativa, em função do processo de industrialização e da diversificação da pauta de exportações, a agricultura brasileira no período 70/98 contribuiu ainda, expressivamente, com cerca de 32% do total exportado. Por outro lado, a participação das importações agrícolas, nesse período, é menor que 11%. Entre 1970 e 1998, o saldo da balança comercial brasileira atingiu US$ 99,3 bilhões, enquanto o do setor agrícola foi de US$ 130,6 9 bilhões, sendo, pois, o grande responsável pela geração de divisas do país. A distribuição espacial das exportações brasileiras mostra uma concentração, assim como no PIB, na região Sudeste, representando cerca de 58% do total exportado em 1998, passando este índice para mais de 82%, quando somada a região Sul, restando ao Nordeste brasileiro a contribuição de 8% do total exportado. Com este vasto potencial de participação no desenvolvimento econômico brasileiro (gerador de riquezas, divisas e emprego), a agricultura – como força motriz do agronegócio – tem o seu cenário futuro delineado em um novo ambiente, hoje marcado pela abertura econômica, esperando que o estado desempenhe seu papel de incentivador e moderador. 4.2 DESENVOLVIMENTO DA IRRIGAÇÃO NO BRASIL E NO NORDESTE 4.2.1 – Evolução da área irrigada no Brasil Com exceção das áreas de arroz inundado e faixas ribeirinhas restritas, a produção por meio de cultivos irrigados, no Brasil, é 10 relativamente recente. A sua evolução deu-se em 4 fases, estimando-se que, em 1998, a área irrigada no país era de 2.870.000 hectares. A primeira fase, iniciada na metade do último quartel do século XIX, estendeu-se até a metade da década de 60 do século XX, tendo-se a atuação, no domínio da irrigação, pautado por ações com as seguintes características: • Desenvolveu-se por meio de ações isoladas e tópicas, dirigidas para alvos específicos, em termos setoriais (por ex. arroz, no Rio Grande do Sul) e espaciais (região semi-árida do Nordeste), sem a correspondente estrutura de políticas ou de programas nacionais; • Manteve elevado grau de concentração na esfera federal; • Confinou-se, na esfera federal, em órgãos e agências caracterizadas por baixo grau de ação interinstitucional; • Submeteu as atividades do subsetor a estratégias de combate e à redução da pobreza. As diferentes administrações federais foram diretamente responsáveis pela implantação de projetos de irrigação, por intermédio de iniciativas quase que exclusivamente dirigidas à construção de açudes, em lugar do apoio direto às atividades produtivas e aos serviços por ela requeridos (conhecimento e tecnologia, crédito, informação de mercado, formação de recursos humanos e outros). 11 A primeira fase, bem como as demais, caracterizam-se pela descontinuidade das ações governamentais, relativas ao desenvolvimento da irrigação e drenagem. A segunda fase iniciou-se em fins dos anos 60, com a criação do Grupo de Estudos Integrados de Irrigação e Desenvolvimento Agrícola (GEIDA), cujas orientações produziram efeitos até o final da primeira metade dos anos 80. As características relevantes dessa fase foram: • A busca da ampliação do conhecimento global sobre os recursos naturais implementação de disponíveis programas e pela nacionais, concepção e exemplo do a Programa Plurianual de Irrigação (PPI), em 1969, e do Programa de Integração Nacional (PIN), em 1970; • A criação de oportunidades para manifestação da iniciativa privada na esfera da irrigação e drenagem, até então preterida, com o Programa Nacional para Aproveitamento Racional de Várzeas Irrigáveis (Provárzeas); o Programa de Financiamento de Equipamentos de Irrigação (Profir); a concepção de “lotes empresariais” nos projetos públicos de irrigação, o estabelecimento de objetivos, diretrizes e metas para um conjunto de iniciativas consolidadas no Projeto do I Plano Nacional de Irrigação, calcado em ações comandadas pelo 12 setor público, mas claramente pautadas pelo estímulo à iniciativa privada. A terceira fase caracterizou-se pela instituição do Programa de Irrigação do Nordeste (PROINE) e do Programa Nacional de Irrigação (PRONI), ambos em 1986. Essa fase, marcada por decisões adotadas em função de prioridades estabelecidas pelo governo federal, em articulação com o setor privado, implementação de projeto subsetorial de irrigação com infraestrutura de apoio à iniciativa privada, com divisão mais clara de papéis entre o setor público e a iniciativa privada, apresentou a seguinte particularidade: • Divisão mais clara de papéis entre o setor público e a iniciativa privada, no desenvolvimento de projetos de irrigação, restringindo-se a ação do governo à execução de obras coletivas de grande expressão (suporte hidráulico, elétrico e macrodrenagem), cabendo à iniciativa privada as demais providências para a sua consecução. A quarta fase considerou que as várias iniciativas postas em prática, ao longo de mais de um século, deviam ser submetidas a uma nova orientação, a partir de 1995, caracterizando um novo direcionamento para a Política Nacional de Irrigação e Drenagem, 13 que foi denominado na fase executiva de Projeto Novo Modelo de Irrigação. A área total irrigada no Brasil é estimada em 2.870.244 ha, com forte concentração nas regiões Sul e Sudeste, que representam 72,7%, conforme se visualiza na Figura 1 a seguir, que somente o Rio Grande do Sul, voltado à produção de arroz, é responsável por 35% da área irrigada no País. O Nordeste brasileiro respondia, em 1998 por 17,26% da área irrigada no país. FIGURA 1 DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DA ÁREA IRRIGADA NO BRASIL, POR REGIÃO - 1998 41,65% 31,04% 17,26% 7,03% 3,02% Norte Nordeste Sudeste Sul Centrooeste FONTE: Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) Com o domínio do Rio Grande do Sul na irrigação da cultura do arroz (método de irrigação por superfície), verifica-se que do total irrigado, em 1998, 60% estão sob irrigação por superfície, 17% 14 por aspersão, 19% por pivô central e apenas 6% por irrigação localizada. As maiores incorporações de áreas irrigadas no Brasil ocorreram nas décadas de 70 (1.300.000 ha) e 80 (1.100.000 ha). Isto como reflexo imediato da disponibilidade de linhas de crédito para irrigação privada e existência de programas governamentais, como o Provárzeas, Profir, Proine e Proni. Importante salientar que de 1970 a 1980 houve maior expansão de equipamentos de pivô central e aspersão convencional. O pivô central, apresentado pela indústria brasileira como equipamento de baixo custo de investimento/ha irrigado, tem sido o responsável pela incorporação de aproximadamente 538.000 ha, o que corresponde, mais ou menos, a 8100 pivôs. (CHRISTOFIDIS, 1999). Entretanto, cabe salientar que, naquela época, era baixo o nível de exigência por parte dos agentes financeiros quanto a estudos sobre solos, clima, recursos hídricos o que, conjugado com deficiências da legislação ambiente e na outorga de direitos de uso da água, levaram boa parte desses equipamentos, na atualidade, a não mais operar ou operar de forma inadequada por falta de água ou outras razões técnicas. No início da década de 90, houve estagnação na área irrigada em decorrência da retirada de algumas linhas de crédito específicas à 15 irrigação, principalmente nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste como o Programa de Aproveitamento das Várzeas Irrigadas (PROVÁRZEAS) e Programa de Financiamento para Equipamentos de Irrigação (PROFIR), da inexistência de patamares de juros indutores à adesão da iniciativa privada e das reformas administrativas, resultando em indefinições governamentais para o subsetor de irrigação. A área irrigada no Brasil só voltou a expandir-se quando passou de 2,63 em 1996 para cerca de 2,87 milhões de hectares irrigados em 1998. Neste período, houve incremento de 209.990 ha de área irrigada no País (Tabela 1), ou seja, um aumento de 7,9% em relação a 1996. A região Nordeste, com um incremento de 15,9%, correspondente a 67.976 ha, foi a que mais cresceu. O crescimento observado no período 96/98 deveu-se à expansão da irrigação privada, nos cultivos de fruticultura, grãos e café, notadamente na Bahia (regiões Oeste e Sul do estado), Norte do Espírito Santo, Norte e Alto Paranaíba, em São Paulo, em Minas Gerais, Rio Grande do Norte e Pernambuco e no cultivo do arroz irrigado no Sul. Ao se avaliar especificamente o Nordeste, verifica-se que a expansão ocorrida teve como carro-chefe o Estado da Bahia, responsável por 40,79% da expansão da irrigação da região, 16 principalmente para café, grãos e fruticultura, no período considerado. Entretanto, com a elevação do nível de exigência dos estudos básicos, devido à necessidade de melhor utilização do fator água e, consequentemente, de maior eficiência operacional dos sistemas, verificou-se, no período 1996-98, a expansão de métodos de irrigação por aplicação localizada (gotejamento e microaspersão), representando 30,76% do total de 209.990 ha de incremento (Tabela 2). 17 Tabela 1 – Crescimento da Área Irrigada no Brasil, por Estado, no Período 1996-1998. REGIÃO / ESTADOS BRASIL NORTE Rondônia Acre Amazonas Roraima Pará Amapá Tocantins NORDESTE Maranhão Piauí Ceará Rio Grande do Norte Paraíba Pernambuco Alagoas Sergipe Bahia SUDESTE Minas Gerais Espírito Santo Rio de Janeiro São Paulo SUL Paraná Santa Catarina Rio Grande do Sul CENTRO-OESTE Mato Grosso do Sul Mato Grosso Goiás Distrito Federal Crescimento Absoluto Crescimento Relativo (ha) (%) 209.990,00 3.300,00 2.130,00 60,00 510,00 -4.520,00 590,00 1.740,00 2.790,00 67.976,00 4.200,00 6.111,00 5.367,00 5.286,00 5.990,00 4.040,00 1.450,00 7.802,00 27.730,00 69.454,00 33.380,00 26.274,00 4.800,00 5.000,00 47.640,00 7.300,00 15.540,00 24.800,00 21.620,00 5.800,00 4.080,00 10.000,00 1.740,00 7,89 3,96 2130,00 10,00 42,50 -45,20 9,42 1740,00 4,29 15,90 10,50 33,60 6,97 36,47 22,43 4,75 19,33 43,25 19,74 8,45 12,84 66,52 6,67 1,11 4,15 13,27 13,08 2,55 12,00 10,43 50,37 9,39 17,51 FONTE: Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) 18 Tabela 2 – Crescimento da Área Irrigada no Brasil, por Método de irrigação, no Período 1996-1998. Método de Irrigação Crescimento Absoluto Crescimento Relativo (ha) (%) 55.967,00 58.274,00 31.172,00 64.577,00 209.990,00 26,65 27,75 14,84 30,76 100,00 Superfície Aspersão convencional Pivô central Localizada TOTAL FONTE: Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) 4.2.2 – Evolução da área irrigada no Nordeste A análise específica à irrigação no Nordeste é importante, uma vez que, de todas as regiões do Brasil, é a que apresenta características de déficit hídrico para as plantas, em condições normais, com índice pluviométrico baixo e distribuição irregular das chuvas, tornando a irrigação uma tecnologia fundamental para a agricultura da região, a qual, constitui-se na sua principal atividade econômica, com relação à absorção de mão-de-obra. As primeiras tentativas de levar-se o benefício da irrigação ao semi-árido ocorreram na década de 40, pelo hoje Departamento Nacional de Obras Contra as secas (Dnocs), com a construção de grandes açudes e canais de irrigação. 19 Em 1943, foi implantado no município de Petrolândia (PE), o Núcleo Agroindustrial São Francisco, pela extinta Divisão de Terras e Colonização do Ministério da Agricultura, onde se iniciaram os primeiros plantios de cebola irrigada nos aluviões do sub-médio São Francisco. Esse núcleo está submerso pelo lago da barragem de Itaparica. Com a criação da Comissão do Vale do São Francisco (CVSF), em 1948, o aproveitamento dessas terras com irrigação foi ampliado com outras culturas (melão, uva etc.). A Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) criada em 1959, com a missão de aglutinar ações que visassem, entre outras, o aproveitamento racional dos recursos de água e solo na Região, conferiu efetiva prioridade ao desenvolvimento da agricultura irrigada e à criação do Grupo Executivo de Irrigação para o Desenvolvimento Agrícola (Geida). Foram, contudo, os resultados positivos alcançados pelo projeto Sudene/FAO, nos latossolos do Campo Experimental de Bebedouro (1963) e nos grumossolos do Campo Experimental de Mandacaru (1964), localizados nos municípios de Petrolina-PE e Juazeiro-BA, que fizeram emergir uma nova filosofia de trabalho com a irrigação no Nordeste. Tais resultados forçaram a transformação das estruturas técnico-administrativas dos órgãos que atuavam na região, Dnocs e CVSF, culminando com a criação do Grupo Executivo de Irrigação para o Desenvolvimento Agrícola (Geida), 20 em 1968, vinculado ao então Ministério do Interior, marco principal da irrigação regional. Em 1973, o Plano Integrado para o Combate Preventivo aos Efeitos das Secas no Nordeste registrava: “com um potencial de 16,5 bilhões de metros cúbicos nos açudes públicos, a área irrigada no Nordeste, presentemente, é da ordem de 2.500 ha. Neste total estão incluídas as áreas das bacias de irrigação dos grandes açudes públicos e as áreas-piloto dos projetos Morada Nova (Ceará), Bebedouro (Pernambuco) e Mandacaru (Bahia)” (BRASIL, 1973). O Geida realizou o primeiro e amplo estudo das possibilidades de irrigação no semi-árido, determinando a viabilidade técnicoeconômica de 73 projetos (62 localizados no Nordeste) e traçou as diretrizes de uma política de irrigação que vieram constituir a primeira fase do Plano Nacional de Irrigação. A estrutura do setor de irrigação governamental esteve sempre ligada ao Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), criado em 1911, como Inspetoria de Obras Contra as Secas (IOCS) e que passou à denominação atual, em 1945, e a Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (Codevasf), criada em 1974, como sucessora da Superintendência de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (Suvale). Esta, por 21 sua vez, sucederá à Comissão do Vale do São Francisco (CVSF), instituída em 1948, e, em menor grau, pelo Departamento Nacional de Obras de saneamento (DNOS). Quando da instituição do programa de Integração Nacional (PIN), no início da década de 70, foi determinado pelo Governo federal que os projetos dele componentes e relacionados ao Nordeste teriam caráter de urgência. Em 1972 iniciou-se a formulação de planos nacionais de desenvolvimento. No I Plano Nacional de Desenvolvimento (I PND) (1972-74), foi estabelecida a meta de se irrigarem 40 mil hectares, a qual foi incorporada ao PIN, também em caráter de urgência. O II PND (1974-79) admitiu que o Nordeste brasileiro, “a despeito de possuir volume de água acumulado em açudes e áreas com um elevado potencial de águas subterrâneas, não tem usado convenientemente os recursos disponíveis para fins de irrigação. As áreas de lavoura irrigada no Nordeste, cerca de 11.300 ha, representam muito pouco em relação ao que se pode fazer na região”, estabelecendo, então, as seguintes metas para o período: 65.000 ha com estudos de viabilidade, 148.000 ha com projetos executivos, 130.000 ha implantados e 120.000 ha em operação. Os recursos se originaram do PIN e do Programa de Desenvolvimento de Áreas Integradas do Nordeste (Polonordeste). 22 O I Plano Nacional de Irrigação (PNI), elaborado em 1982, previa a continuidade das ações do Governo Federal, com ênfase nos grandes projetos públicos de irrigação, que já vinham sendo implantados pelo Dnocs e pela Codevasf. Porém, previa o estímulo ao desenvolvimento da irrigação privada em pequena escala, mediante a concessão de crédito especial e a utilização de recursos a fundo perdida para obras de infra-estrutura. No projeto Nordeste, elaborado na ocasião, não havia uma estratégia específica à irrigação pública. A institucionalização do Programa de Financiamento de equipamentos de Irrigação (Profir), em 1982, criou uma linha de crédito rural oficial para investimentos em sistemas de irrigação, sobretudo nos cerrados, mas também com atuação em algumas áreas do Nordeste. O primeiro texto legal sobre irrigação no Brasil data de 25 de junho de 1979, com a edição da Lei n.º 6.662 – a Lei de Irrigação. Sua regulamentação, no entanto, só ocorreu em 29 de março de 1984, mediante a edição do decreto n.º 89.496. Em janeiro de 1986, foram criados o Programa de Irrigação do Nordeste (Proine) e, no mês seguinte, o Programa Nacional de Irrigação (Proni), com atuação nas demais regiões. A gestão das 23 ações desses programas foi entregue ao Ministério Extraordinário para Assuntos de Irrigação, ao qual se vincularam o Dnocs, a Codevasf e o DNOS, com o propósito de elevar a área irrigada na região Nordeste em um milhão de hectares até 1990, meta posteriormente reprogramada em 1993. Em março de 1990, foi criada a Secretaria Nacional de Irrigação (Senir), no âmbito do Ministério da Agricultura e Reforma Agrária, com a responsabilidade de executar o Programa Nacional de Irrigação. O Dnocs e a Codevasf continuam como órgãos executores. Com a exclusão do DNOS, suas limitadas ações de irrigação, no Nordeste, foram assumidas pelo Dnocs. A política do Governo Federal, para o período de 1991-95, estava consubstanciada, em grande medida, na Resenha Setorial de Irrigação, elaborada pelo Proni, com o apoio de consultores privados, a participação da Codevasf, Dnocs e o estímulo técnico e financeiro do Banco Mundial. Iniciava-se o processo de conferir ênfase aos aspectos econômicos, sem se descuidar dos sociais, garantindo maior eficácia à ação do estado e maior estabilidade aos investimentos dos agentes privados. Os projetos de irrigação recebiam uma categorização que variava de A até D, segundo a participação do Governo em sua implantação. 24 A área irrigada no Nordeste é de 495.370 ha e a área potencial de irrigação é de 2.717.820 ha. Têm-se desenvolvido apenas 18,2% da área potencial. A distribuição da área irrigada nos Estados da Região Nordeste é mostrada na tabela 3. A maior concentração de área irrigada está nos Estados da Bahia (33,95%), Pernambuco (17,97%) e Ceará (16,63%). Tabela 3 – Distribuição da Área Irrigada nos Estados da Região Nordeste - 1998 ESTADO ÁREA IRRIGADA (ha) % Maranhão ÁREA POTENCIAL DE IRRIGAÇÃO (ha) 556.000 44.200 7,95 Piauí 248.823 24.300 9,77 Ceará 239.848 82.400 34,35 Rio Grande do Norte 71.780 19.780 27,56 Paraíba 59.220 32.690 55,20 Pernambuco 408.096 89.000 21,80 Alagoas 124.000 8.950 7,20 Sergipe 30.000 25.840 86,13 Bahia 980.053 168.210 17,16 TOTAL 2.717.820 495.370 18,23 Fonte: DH/SRH/MMA (1998) 25 4.2.3 – Desempenho da irrigação pública e privada no Brasil A macroconcepção brasileira, quanto aos esquemas de irrigação, notadamente a partir da década de 80, apresenta três situações: • Irrigação privada – particulares; a componentes hidráulico desenvolvida responsabilidade e em pela mecânico propriedades implantação do sistema dos é do proprietário. • Irrigação pública – promovida e desenvolvida em terras de domínio do governo (ou adquirida para isso); a infra-estrutura hidráulica coletiva – para derivação, armazenamento (quando necessário), captação e distribuição de água – é também por ele realizada. Na área são assentados pequenos, médios e grandes irrigantes, os quais pagam pela estrutura hidráulica valores estabelecidos anualmente por hectare irrigável. Pagam, também, pela terra, no caso dos pequenos irrigantes, a irrigação parcelar é estruturada pelo governo e pagam por ela. Tratando-se dos médios e grandes irrigantes, a estruturação do sistema parcelar de irrigação é de sua total responsabilidade. O gerenciamento da operação e manutenção do sistema coletivo, a partir de meados de 80, passou a ser realizado e 26 custeado (parcial ou totalmente) pelos irrigantes, por meio de suas associações e ou cooperativas, com apoio financeiro, técnico e material, em maior ou menor intensidade, do governo. Esse tipo de concepção abrange principalmente os perímetros públicos de irrigação no norte de Minas Gerais e Nordeste. • Irrigação privada com obras hidráulicas coletivas do governo – o governo implanta as obras hidráulicas – para derivação, armazenamento (quando necessário), captação e distribuição de água – em terras pertencentes a um grupo organizado de produtores que pagam por essa infra-estrutura em valores anualmente definidos, com base na área irrigável. A operação e manutenção do sistema são totalmente realizadas e custeadas pelos produtores, por intermédio de suas organizações. São exemplos os projetos PCPER II, em Paracatu, no noroeste de Minas Gerais, Barragem do Duro, no Rio Grande do Sul, e perímetro Irrigado Lagoa Grande, em Janaúba, região norte de Minas Gerais. No caso específico da irrigação privada, normalmente localizada em terras com condições mais favoráveis de solo, topografia e disponibilidade de água, a participação governamental se restringe à dotação de infra-estrutura de energia, estradas e, em algumas situações, trabalhos de macrodrenagem e obras de proteção de cheias. Na década de 80, houve forte apoio creditício, tornando 27 disponíveis recursos a juros subsidiados. Esse segmento representava cerca de 95% da área irrigada no Brasil em 1998, principalmente concentrado nas regiões Sudeste, Sul e CentroOeste. Nesta área, as principais culturas utilizadas são: arroz, feijão e milho. No caso da irrigação pública, no norte de Minas Gerais e Nordeste brasileiro, a localização das áreas a serem irrigadas implica um custo maior, com obras de derivação, ás vezes, armazenamento, captação e distribuição de água, em consequência de situar-se em áreas com condições não tão privilegiadas quanto à da iniciativa privada. Quase sempre, há necessidade da intervenção governamental na estruturação fundiária do projeto e sua participação direta no processo de reorganização fundiária regularização ou compra de terras, redistribuição em lotes para pequenos, médios e grandes irrigantes. Também na infra-estrutura de energia, estradas, obras hidráulicas coletivas e apoio creditício na execução dos sistemas parcelares de irrigação é necessária a participação do governo, bem como no início da operação do sistema hidráulico coletivo, com apoio tanto técnico como de material e equipamento. A irrigação pública representa em torno de 5% da área irrigada do País. Porém, é responsável por mais de 28% da área irrigada no Nordeste, região que, além das condições mais adversas de clima, quanto à 28 distribuição e quantidade de chuvas, tem os solos aptos para irrigações distantes da fonte hídrica, exigindo, assim, a construção de barragens ou açudes com acumulação de volume de água suficiente para atender à produção ou a grandes distâncias de condução de água, a partir de sua fonte de captação. É importante salientar que a irrigação pública no Nordeste brasileiro e norte de Minas Gerais (apenas 28% da área irrigável) vem sendo a grande responsável pela transformação com agricultura irrigada, como vem ocorrendo com fruticultura, notadamente no vale do São Francisco, além de contribuir como elemento propulsor de desenvolvimento da irrigação privada na citada região. Quando se analisa a área irrigada no Brasil e se verifica que a irrigação praticada no Rio Grande do Sul representa cerca de 35% dela, é necessário fazer uma análise mais detalhada do setor e as variáveis que sobre ele atuam para que se possam entender as razões dessas diferenças regionais. Mais de 95% da área irrigada no Rio Grande do Sul é plantada com arroz, ou seja, cerca de 33% daquela que o Brasil irriga. Além das condições excepcionais de topografia, solo e clima que o Estado possui, o arroz é um dos produtos básicos da alimentação brasileira. A sua produção no Rio Grande do Sul tem características 29 próprias. O governo estadual criou o Instituto Rio-Grandense do Arroz (IRGA) que desenvolve pesquisas, presta assistência técnica aos produtores, além de participar ativamente de estudos de comercialização do produto. Assim, o arroz tem tecnologia de produção definida, um complexo de pesquisa que periodicamente coloca à disposição novas tecnologias e, por se tratar de produto básico para alimentação brasileira, tem já montada uma organização para comercialização de sua produção. A análise da irrigação no restante do País mostra uma situação diferente e mais difícil. Com um número muito maior de culturas irrigadas, a maioria delas com tecnologia de produção apenas para sequeiro, devem sofrer adaptações para o plantio irrigado, além de ainda não ter o seu agronegócio organizado. Até época recente, deu-se muita atenção às obras de engenharia para irrigação em detrimento da agricultura irrigada. Tal situação começou a mudar nos últimos dez anos, pelos esforços do setor público, principalmente de Codevasf, Embrapa e da capacidade empreendedora da iniciativa privada. Apesar de todas as dificuldades, a revisão da literatura existente, as observações e os contratos regionais mostram que os 30 programas e projetos públicos e privados, desenvolvidos no subsetor de irrigação, geraram aumento de renda e emprego a montante e a jusante deles, com efeitos altamente positivos sobre as economias regionais e locais. Tais dificuldades são mais sentidas na região semi-árida. Os empresários contaram com a ajuda do setor público, inovado com culturas de alto custo de produção, com pouca ou nenhuma informação tecnológica, tais como: uva, manga, banana, goiaba, coco, melão, melancia, entre outras. Algumas delas, como a banana, manga e uva estão hoje em franco crescimento de área plantada e produção e em busca da organização de sua comercialização. Os principais pontos que limitaram o maior desenvolvimento da agricultura irrigada foram: • Ausência de ação coordenada e estruturada entre as obras de irrigação (canais, adutoras, barragens, estruturas de captação, etc.) e a estrutura de produção (capacitação de mão-de-obra, caracterização de mercado, caracterização tecnológica, etc.); • Falta de política de crédito rural para custeio voltada ao atendimento das condições de agricultura irrigada, permitindo que a atividade se desenvolva durante todo o ano, já que ela 31 tem um custo diferenciado de agricultura de sequeiro, além de permitir cultivo em épocas não tradicionais sob condições de sequeiro. As políticas de crédito não observam essas peculiaridades e são sempre dirigidas para a agricultura em geral. Excetuando-se este fato, pode-se citar a cultura do arroz irrigada na região Sul e, mais recentemente, a cultura do feijão. Outro fato relacionado a crédito, refere-se a investimentos, praticamente inexistentes, exceção para o Nordeste e Norte de Minas Gerais, como linhas do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE), Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) competitivo, entre outras. Mesmo assim, como o valor a ser investido no sistema de irrigação e cultura permanente exige, em média, de US$ 8.000 a US$ 10.000/ha, poucos produtores têm como contrair esses empréstimos, devido à sua baixa capacidade de endividamento e de exigência de garantia, considerada elevada pelos produtores; • Ausência de ação mais intensa de pesquisa, notadamente voltada para a busca de alternativas de espécies e cultivares adaptados, além de tecnologia de manejo água+solo+planta para as várias condições regionais. Até aqui, a tecnologia de produção irrigada é adaptada da agricultura de outros países e ou de regiões diferentes daquelas onde se desenvolve a irrigação; 32 • Inexistência de um programa estruturado, voltado para o mercado externo, principalmente para frutas tropicais, priorizando: área e produtos, marketing e promoção de sua qualidade, conhecimento das exigências dos diferentes mercados quanto aos aspectos de fitossanidade e resíduos químicos, estudos e definições de “áreas livres”, preparação do pessoal técnico, organização de empresas para controle da qualidade para atendimento a diferentes tipos de mercado; • Ausência de programa para aproveitamento do potencial de mercado interno de frutas e olerícolas, principalmente nos últimos cinco anos. Um programa estruturado, que priorize área, produtos, preparação tecnológica quanto a aspectos de fitossanidade e resíduos químicos, entre outros; • Falta de continuidade das políticas de irrigação, com planejamento, em longo prazo, para o desenvolvimento do setor, que sofressem apenas os ajustamentos normais nas mudanças de administração do setor público; • No caso mais específico da irrigação em perímetros públicos, além das limitações citadas, outras contribuíram podendo ser enumeradas; • Atraso no cronograma de execução das obras, principalmente devido a atrasos verificados em cronograma financeiros, e que também provocam atraso no assentamento dos irrigantes e, consequentemente, no processo de produção; 33 • Ênfase maior nos projetos e sistemas de engenharia (barragens, canais, adutoras, estações de bombeamento, etc.) em detrimento da agricultura irrigada; • Eficiente, com assentamento de algumas pessoas com capacidade gerencial, e que exige participação governamental no processo de operação e manutenção das obras hidráulicas coletivas, apesar da evolução positiva verificada a partir de meados dos anos 80, com maior evolução por parte da Codevasf e pouco avanço do Dnocs; • Falta de capacidade gerencial à maioria das organizações de produtores nos perímetros. A distribuição da área irrigada nos setores público e privado no Nordeste é apresentada na Tabela 4. 34 Tabela 4 – Área Irrigada no Nordeste (ha), Segundo Origem de Recursos e Natureza Gerencial ESTADO IRRIGAÇÃO IRRIGAÇÃO TOTAL FEDERAL/PÚBLICA ESTADUAL/PRIVADA Maranhão 2.692 41.508 44.200 Piauí 4.753 19.547 24.300 Ceará 14.169 68.231 82.400 1.212 18.568 19.780 Paraíba 3.638 29.052 32.690 Pernambuco 39.375 49.625 89.000 Bahia 48.777 119.433 168.210 Sergipe 6.279 19.561 25.840 Alagoas 2.692 6.258 8.950 Total 123.587 371.873 495.370 % 24,95 75,05 100,0 Rio Grande do Norte Novamente, torna-se responsabilidade importante enfocar da irrigação pública na o papel região, e a pois sua participação tem sido vital para o crescimento da área irrigada, por vários motivos: 35 • Revela as viabilidades técnicas e econômicas dos projetos, por estudos de solo e água, realizados pelas instituições governamentais envolvidas em promover a irrigação na região; • Permite que áreas irrigáveis, distantes das fontes provedoras de água, possam incorporar-se à agricultura irrigada. Por exemplo: o Projeto Nilo Coelho, em Pernambuco, que irriga terras à distância de até 30km das margens, ou o Projeto Jaíba, no norte de Minas Gerais, que pode irrigar terras ao longo de 40km. A superação de tais distâncias representa custo muito elevado para a iniciativa privada, o que limitaria a expansão da área irrigada no semi-árido; • Permite a formação de estoque estratégico de água (por meio de barramentos e açudagem), em regiões com sérios problemas de disponibilidade hídrica, para expansão da agricultura, como, por exemplo, a barragem Bico da Pedra, no município de Janaúba, Norte de Minas Gerais, e o açude Castanhão, no vale do rio Jaguaribe, no estado do Ceará; • Cria condições para que a iniciativa privada conheça e teste a aplicação de tecnologia de ponta na redução de risco tecnológico e no desenvolvimento de cultivos de maior densidade e valor econômico, como o da uva, manga, banana, praticamente introduzidos no Nordeste, inicialmente perímetros públicos de irrigação, pela iniciativa privada. 36 em 4.3 A IMPORTÂNCIA DA AGRICULTURA IRRIGADA A agricultura irrigada é de suma importância na contribuição para: (i) criação de empregos, (ii) inserção da dimensão competitiva e da modernização produtiva na agricultura e (iii) redução dos desequilíbrios regionais e sociais. A irrigação é peça fundamental, por constituir-se em: • Áreas especializadas em produtos hortícolas e frutícolas de exportação; • Áreas especializadas para a produção, em períodos de entressafra, de produtos alimentares que deverão cumprir a função de reguladores de mercado; • Fonte de oferta permanente (todos os meses do ano) de matérias primas para a indústria alimentar e de produtos energéticos; • Elemento de complementação para suprir déficits de precipitação pluviométrica nas áreas tradicionais de produção; • Fator de expansão da fronteira agrícola, com possibilidades de absorver excedentes de mão-de-obra rural. 37 A potencialidade de expansão da agricultura irrigada apresenta-se promissora em relação a diferentes aspectos que influem sobre o desenvolvimento agrícola, quais sejam: • Na ótica do abastecimento interno e do equilíbrio de mercado, apresenta possibilidades de constituir-se em áreas especializadas de produção em períodos de entressafra, cumprindo a função de reguladora de ofertas; • Do ponto de vista da utilização dos recursos naturais, para regiões semi-áridas e de savanas (cerrados), permite a utilização dos solos durante todo o ano, obtendo-se, em alguns casos, duas a três colheitas por ano; • Nas áreas de clima subtropical (Centro-Oeste e Sudeste) e temperado (Sul), a irrigação complementar permite intensificar o uso dos solos e a diversificação da produção; • O efeito catalítico que podem exercer as áreas de irrigação em relação às atividades econômicas e aos serviços de apoio governamental abre perspectivas para a adoção de enfoques de desenvolvimento integrado, ensejando a implantação de complexos agro-industriais e serviços conexos, especificamente para a produção de alimentos e produtos de exportação; • Os efeitos sociais da expansão maciça de áreas irrigadas com a correspondente integração de atividades produtivas deverão traduzir-se numa maior ocupação de mão-de-obra por hectare irrigado. 38 4.3.1 - A importância estratégica da agricultura irrigada para o Nordeste A irrigação tem importante papel a cumprir no Nordeste semiárido, garantindo à atividade agrícola sustentabilidade econômica, minimizando, sobretudo os riscos tecnológicos, representados pela escassez de água. O Nordeste semi-árido, com um potencial de área apta para irrigação de mais de 2,4 milhões de ha irriga pouco mais de 490.000 ha. Tem na atividade agropecuária a responsabilidade por 10% do PIB regional e pelo aproveitamento de 77% da população economicamente ativa. Ao conviver com uma instabilidade climática (distribuição irregular e quantidade insuficiente de precipitação pluviométrica), tem na agricultura irrigada uma opção estratégica importante no processo de desenvolvimento setorial e regional. 4.3.2 – Impactos sócio-econômicos A agricultura irrigada, trabalhando com tecnologia de ponta, em região semi-árida que apresenta condições climáticas favoráveis de temperatura e luminosidade, constitui-se num agronegócio e, como tal, transforma-se, via de regra, no principal indutor do processo de desenvolvimento regional. 39 Com efeito, são visíveis as transformações regionais, alavancadas pelo uso da tecnologia de irrigação, nos pólos Petrolina-Juazeiro, Norte de Minas Gerais (Janaúba), Sul da Bahia e outros. No entanto, faltam ainda, mais estudos de avaliação desses impactos e suas causas fundamentais, em regiões que lançam mão da irrigação para transformar sua economia agrícola e regional. Alguns estudos realizados mostram que a agricultura irrigada promove alterações favoráveis no PIB regional, refletido na diminuição do fluxo migratório rural-urbano, no aumento do PIB per capita e no crescimento demográfico mais equilibrado. Enfim, contribui para a redução da pobreza. Nos Municípios de Janaúba e, hoje, Nova Porteirinha, na região norte de Minas Gerais, onde se localiza o Perímetro de Irrigação do Gorutuba, foi desenvolvido, por iniciativa da Codevasf, o estudo “Impactos Sócio-econômicos do Perímetro Irrigado do Gorutuba, nos municípios de Janaúba e Porteirinha”. O perímetro de Gorutuba tem uma área irrigável de 4.813,55 ha. São 419 pequenos irrigantes e 50 empresários, com uma área irrigável média de 6,17 e 45 ha, respectivamente. É um perímetro público, implantado pela Codevasf. O abastecimento de água é feito pela barragem do Bico da Pedra com capacidade de 708,6 milhões de metros cúbicos e vazão para irrigação de 6m³/s. Os 40 estudos para implantação do perímetro iniciaram-se em 1969. Entre 1975 e 1977 foi implantada a primeira parte, com 740 ha, e a segunda entre 1982 a 1987. A pesquisa procurou analisar os impactos diretos sobre a produção, renda e emprego gerados na atividade agrícola e os indiretos, ou seja, aqueles sobre os setores industrial e comercial, além do impacto sobre o PIB e a qualidade de vida. Foram as seguintes as conclusões obtidas: • A implantação do perímetro promoveu mudanças sócioeconômicas importantes na região; • Criaram-se 3.248 empregos diretos, dos quais 815 são permanentes, além da ocupação da mão-de-obra familiar; • Os salários pagos no perímetro são ligeiramente superiores àqueles pagos pela indústria e comércio regionais; • Foi grande o efeito multiplicador desses impactos sobre a economia regional, significando aumento considerável na demanda por bens de consumo e serviços, refletido no aumento do número de estabelecimentos industriais e comerciais, gerando aumento dos níveis de emprego e renda nesses setores; 41 • Considerando-se apenas os efeitos indiretos das atividades de comércio e indústria, a relação emprego indireto/direto foi 1,86; • A relação entre o perímetro e a economia regional tem ocorrido em grau acentuado, com o incremento no número de estabelecimentos comerciais e industriais relacionados com a atividade do perímetro, conforme detectado junto a empresários urbanos na região que ampliaram suas transações comerciais pós-irrigação; • Impacto total da renda gerada no município de Porteirinha foi de 33,71% do PIB municipal e 38,05% em Janaúba; • Diminuição do fluxo migratório rural-urbano. Conforme mostram os dados censitários, a migração diminuiu após a implantação do perímetro irrigado. Na década de 70, o crescimento da população urbana de Janaúba foi de 11,54% ao ano, caindo para 1,55% na década de 80 e 1,76% na de 90; • Para 56,1% dos irrigantes as condições de saúde são melhores após o assentamento; para 57,3% melhoraram as condições de lazer e para 56,1% as condições de educação; • As condições habitacionais melhoraram para 96,34% dos pequenos irrigantes. 42 Outros estudos, desenvolvidos por SOUZA (1994) e SOUZA & OLIVEIRA (1995), mostram o resultado do impacto da agricultura irrigada no Pólo Petrolina-Juazeiro. Na época dos estudos (1994-95), esse Pólo, situado no rio submédio São Francisco, apresentava para projetos públicos e privados uma área estimada de 76.406 ha. A irrigação pública era responsável por 48% dessa área. No período dos estudos, a área cultivada atingia 22,2% com frutas, 22,5% com hortaliças, 25% com grãos/cereais e 25,2% com cana-de-açúcar. O primeiro estudo procurou analisar a importância da irrigação no desenvolvimento regional do semi-árido e concentrou-se em torno dos municípios de Juazeiro e Curaçá, na Bahia, Petrolina e Santa Maria da Boa Vista, em Pernambuco. Suas principais conclusões foram: • Os investimentos públicos em irrigação, que ocorreram a partir da segunda metade da década de 60, apoiados pela infraestrutura econômica existente, alavancaram investimentos privados, sobretudo a partir da década de 80; 43 • A região destaca-se como um dos pólos de desenvolvimento regional mais importantes do semi-árido nordestino, caracterizado por um agronegócio, apoiado fundamentalmente na produção de frutas e hortaliças; • PIB da microregião Sertão do São Francisco (considerando apenas os municípios da margem pernambucana do submédio São Francisco) cresceu a taxas superiores ao observado para o Estado de Pernambuco, no período 1970-90, fazendo com que o PIB regional passasse de 1,9% em 1970, para 3,7%, em 1990; • PIB per capita passou de US$ 374.00 em 1970, para US$ 1,251. 00, em 1990; • Número de estabelecimentos industriais quintuplicou, entre 1960-80, passando de 215 para 979, criando cerca de 23.800 novas ocupações; • Crescimento demográfico nos municípios de Petrolina e Juazeiro, observado no período 1990-91, foi bastante superior ao verificado nos estados de Pernambuco e Bahia, no mesmo período; • No período 1990-91, os municípios que concentraram os investimentos em irrigação apresentaram crescimento demográfico mais equilibrado, quanto à distribuição de sua população urbana e rural, contrariando as tendências de concentração populacional nas áreas urbanas. 44 4.3.3 – Geração de emprego A agricultura irrigada no Nordeste devido às condições climáticas, ali imperantes, permite o uso intensivo do solo, com cultivos durante todo o ano, ao contrário da agricultura irrigada no Sul do País, voltada basicamente para a monocultura do arroz e desenvolvida apenas num período do ano. SIMÕES (1999), em estudo realizado para o Projeto Nilo Coelho (Petrolina-PE), numa área de 15.583 hectares, avalia a geração de 11.732 empregos diretos, o que proporciona uma relação direta de 0,75 emprego/ha irrigado. No relatório anual do distrito de Irrigação do Jaíba, uma área irrigada de 6.214,39 ha gerou 12.428 empregos diretos e indiretos na região, o que corresponde a uma relação de dois empregos diretos e indiretos por hectare irrigado. CAVALCANTI & COSTA (1998) estimaram que, no Projeto Gorutuba, com uma área irrigada em 1995 de 2.990 ha, foram gerados 3.4287 empregos diretos, o que significa 1,14 emprego direto/ha irrigado e uma relação emprego indireto/direto de 1,86, o que permite concluir que cada hectare irrigado gerou 3 empregos. 45 Estudos realizados em 1990 pela Codevasf identificam no Projeto Nilo Coelho (PE), com a pauta produtiva do período analisado, a geração de 0,4 emprego direto e 0,4 a 0,55 indireto por hectare irrigado. A capacidade de geração de emprego da agricultura irrigada, na região do semi-árido permite avaliar o potencial da geração de empregos a partir do agronegócio da irrigação. Essa capacidade de geração de emprego vem contribuindo e poderá contribuir mais ainda para diminuir o êxodo rural desordenado no Nordeste. O Nordeste abrigava, em 1996, 45,7% de toda a população rural brasileira, ou seja, 15,6 milhões de habitantes (IBGE, 1996). ALVES, LOPES & CONTINI (1999) estimaram que o êxodo rural ocorrido no Nordeste no período 1991-99, com cerca de 4,3 milhões de pessoas corresponde a mais de 40% da migração rural brasileira no período. Os autores mostraram que o êxodo rural no Nordeste ganha velocidade e desacelera-se nas regiões sulinas. Nelas o estoque de migrantes é muito menor e a produtividade da terra e do trabalho supera, pelo menos quatro vezes, a do Nordeste. Além do mais, 46 na Região somente os estabelecimentos com área superior a 200 hectares remuneram o trabalho familiar com um salário mínimo ou mais e correspondem a menos de 6% dos 2,3 milhões de estabelecimentos da região (47,5% de todos os estabelecimentos do Brasil). De acordo com o estudo, tanto o trabalho familiar, visto pelo lado do estabelecimento, como o assalariado, são muito estáveis, quanto a permanecer no meio rural nordestino. E por conta exclusiva das forças de mercado, em virtude de o meio rural das demais regiões ser também perdedor líquido, os migrantes nordestinos se encaminharão de preferência como já vem fazendo, às cidades das regiões sulinas, e, como segunda opção, às cidades do Nordeste e do Norte, agravando os problemas urbanos de emprego e de violência. A retenção de população no meio rural e nas cidades atreladas à agricultura depende de ser viável uma agricultura que paga salários competitivos. Neste caso, a agricultura irrigada tem essa condição e uma capacidade empregadora multiplicada quando associada às exportações (principalmente de frutas, hortaliças, grãos e carnes) e à agroindústria. 47 4.3.4 – Diversificação de culturas A região Nordeste oferece condições de clima, luminosidade e temperatura, durante todo o ano, favorável ao desenvolvimento de várias culturas, quando sob irrigação. Com a implementação de uma agricultura tecnificada, programada e organizada por região, que possa minimizar o efeito da sazonalidade de oferta e de preços (as condições de temperatura, luminosidade, umidade do ar permitem o cultivo de olerícolas e frutícolas durante todo o ano), que poderá atender ao mercado interno de várias olerícolas e frutícolas, avaliado em 1998 para os 10 mais importantes estados brasileiros em US$ 4,4 bilhões e estimado para o ano 2030 em US$ 5,9 bilhões. Dados de estudos do Ministério da Integração Nacional mostram que apenas no setor supermercadista, o valor das hortifrutícolas representou transações de R$ 5,6 bilhões em 1998. Identifica-se um grupo de mais de 25 culturas (Tabela 5), com pacote tecnológico sendo utilizado e, portanto, comprovado, com bom nível de produtividade, como: abacaxi, limão, manga, banana, uva, feijão, cebola, etc. É importante frisar que a maioria delas apresenta, nos principais centros consumidores, sazonalidade de oferta e preço, decorrente 48 da produção ser originária de regiões que produzem sob o regime de sequeiro. As áreas irrigadas do Nordeste, por terem condições de produzir durante todo o ano, poderão planejar seus plantios e formas de condução das lavouras, de modo a reduzir o efeito dessa sazonalidade, permitindo aos consumidores desfrutarem de produtos todo o ano, a preços mais estáveis. Além disso, a região, em função das condições climáticas favoráveis (desde que com irrigação) poderá produzir sementes de grãos e hortaliças para atendimento da demanda de outras regiões, em condições mais favoráveis quanto aos aspectos fitossanitários e no período de entressafra das outras regiões. Outras culturas podem ser citadas como potenciais, como é o caso da graviola, em algumas situações específicas, café e soja. Essa pauta de produção, com estabilidade tem permitido em determinadas regiões, como por exemplo, Petrolina/Juazeiro, a implementação de um parque industrial e o desenvolvimento da agroindústria. A agroindústria (atividade industrial de beneficiamento ou transformação de produtos agrícolas) é uma associação industrial com o componente agrícola. E entre os dois setores, neste aspecto, ela pode exercer uma influência dinâmica, contribuindo 49 para modernizar e aumentar a eficiência e a estabilidade da agricultura, ampliando as oportunidades, mas impondo exigências severas quanto à qualidade, prazo, preço, entre outros. A agroindústria é um fator importante de apoio e dinamização, acrescendo valor aos produtos primários, ampliando os seus mercados, gerando renda e emprego, além de atuar como indutor da modernização e melhoria da eficiência de todo o setor agropecuário. 50 TABELA 5 - Opções de Culturas Irrigadas para a Região Nordeste, Faixa de Produtividade Observada em Culturas Bem Conduzidas e Produtividade Mais Observada em Culturas Bem Conduzidas em Condições Normais. Cultura Produtividade (t/ha) em cultura irrigada bem conduzida em Condições Comerciais Faixa observada Valor mais observado Abacaxi 35 – 75 50 Arroz 4,5 – 8,0 6,0 Milho (grãos) 4,5 – 8,5 6,5 Feijão (Phaseolus Vulgaris) 1,8 – 2,4 2,0 Uva 30 – 50 35 Manga 15 – 30 25 Limão 25 – 35 32 Coco 25 – 42 35 Melancia 25 – 45 35 Melão 18 – 28 22 Batata-doce 20 – 35 25 Banana-prata 35 – 52 40 Banana-nanica 45 – 90 60 Goiaba 20 – 35 25 Cebola 18 – 50 30 Maracujá 15 – 22 18 Cajú * 26 – 38 32 Mamão-papaia 19 – 30 26 Cenoura 10 – 28 25 Cana-de-açúcar 85 – 140 120 Acerola 18 – 32 25 FONTE: PLENA Consultoria de Engenharia Agrícola * Pedúnculo in natura 51 Nos últimos 30 anos, diversas políticas e programas dos governos estadual e federal têm-se dirigido ao fomento da agroindústria do Nordeste, buscando maior participação privada para sua implantação e ampliação, tendo como instrumento básico o crédito subsidiado e os incentivos fiscais. Entre os principais programas, pode-se citar: • Programa de Assistência Financeira à Agroindústria e à Indústria de Insumos, Máquinas, Tratores e Implementos Agrícolas (Proterra / Pafai), 1971. • Programa de Desenvolvimento da Agroindústria do Nordeste (PDAN), criada pelo Banco do Nordeste e pela Sudene, a partir de 1974. • Programa de Desenvolvimento Agroindustrial (Prodagri). • Programa Nacional de Assistência à Agroindústria (Pronagri). Neste período de 30 anos, alguns avanços importantes se verificaram na agricultura da região, como, por exemplo, o Pólo Petrolina-Juazeiro. Ainda assim, foi bastante limitado esse desenvolvimento, com algumas restrições, conforme estudos da Universidade Federal de Viçosa (1998): • Baixa competitividade da matéria-prima diante da concorrência de produtos importados, a exemplo do tomate em Petrolina. 52 • Distância relativa dos pólos aos principais centros consumidores do sudeste do Brasil. • Fatores inibidores relacionados à quantidade, qualidade, calendário de oferta, infra-estrutura de transporte e acesso, empenho, etc. • Relação ainda pouco profissional entre a indústria e os produtores. • Pouca ligação entre a base agroindustrial já implantada em algumas regiões e a produção dos perímetros. • Falta de um programa mais avançado de divulgação e promoção da potencialidade de cada região. O desenvolvimento da agroindústria, assim como o processo de desenvolvimento sócio-econômico do Nordeste, tem como condição necessária a criação de uma base de produção primária sólida que assegure um autodesenvolvimento sustentável, com a expansão do mercado regional e a participação da grande maioria da população. Para tanto, as políticas de desenvolvimento da região têm de contemplar a expansão e a modernização do setor primário. E, neste contexto, o programa com agricultura irrigada vem representar a mudança qualitativa, permitindo a formação da base consolidada de produção primária. 53 5 CONCLUSÕES A agricultura brasileira evoluirá para o patamar daquela dos países avançados, que se caracteriza pelo emprego de uma fração pequena da população economicamente ativa (PEA) do país e se baseará também em número cada vez menor de estabelecimentos agrícolas. A questão que se apresenta ao poder público é como conduzir esse processo de ajustamento, de modo a se atingirem três objetivos, quais sejam: (i) abastecer, adequadamente, o mercado interno; (ii) ampliar as exportações de produtos agrícolas in natura ou industrializados e (iii) criar empregos no campo e na cidade e, assim, reduzir o ímpeto do êxodo rural e seus malefícios. Dentre eles estão o subemprego e o desemprego urbanos. Políticas agrícolas que atendam, simultaneamente, os três objetivos devem receber prioridade. Entre elas destaca-se a de irrigação, porque: a) cria grande número de empregos estáveis dentro da “porteira” do estabelecimento agrícola e nas cidades, ou seja, fora da “porteira” (antes e depois dela); b) contribui para atender à demanda interna de frutas e hortaliças que se eleva a taxas elevadas, em função de uma elasticidade-renda igual ou superior a 1 e isto em todas as classes de renda; c) amplia as 54 exportações, sem causar aumento dos preços internos e, ainda, tem o papel adicional de contribuir para a solução de problemas específicos, como o do abastecimento de algumas culturas, como, por exemplo, o feijão. Relativamente ao êxodo rural, o problema está no Nordeste. Em 1996 abrigava 45,7% de toda a população rural brasileira, ou seja, 15,6 milhões de habitantes (IBGE, 1997). O Sudeste é a segunda região, do ponto de vista de população rural. Em 1996 continha 7,3 milhões de habitantes. Se o Nordeste caminhar para o mesmo índice habitante/valor da produção do Sudeste, sua população rural cairá para 3 milhões de habitantes, conforme citado por Alves, Lopes & Contini (1999). A retenção de população no meio rural e nas cidades atreladas à agricultura depende de ser viável uma agricultura que pague salários competitivos. A agricultura irrigada oferece esta condição. Sua capacidade empregadora é multiplicada, quando associada às exportações, principalmente de frutas e hortaliças, grãos e carnes. Desse modo, ela é prioritária para o Nordeste, sobretudo para sua porção semi-árida, e ainda muito importante para suas demais sub-regiões que também precisam reter população, abastecer o País e contribuir para a ampliação das exportações. Isto por que, pelo concurso da irrigação e o desenvolvimento de algumas de suas áreas privilegiadas, em termos de dotação de fatores (como 55 as localizadas no oeste baiano, sul do Maranhão e sudoeste do Piauí), o Nordeste tem condições de contribuir acentuadamente para o abastecimento do mercado interno e para as exportações, reduzindo, ademais, o fluxo de migrantes para as cidades. Efetivamente, na superação de tais desafios, a irrigação tem sido uma estratégia bem-sucedida, sobretudo nos países com maior área irrigada e, principalmente, nas regiões do Globo de elevados déficits hídricos, como a semi-árida, a qual pertence o Nordeste brasileiro. Ela tem a faculdade de reduzir o risco tecnológico, decorrente de condições climáticas adversas, diminui a oscilação da produtividade agrícola e incrementa a taxa de ocupação e a utilização intensiva de terras. Desse modo, a agricultura irrigada contribui para ampliar a oferta de alimentos, fibras e, no caso brasileiro, também de biomassa para fins energéticos. Assim, ela melhora salário e renda e cria ocupação estável no campo, como bem o demonstram os pólos de irrigação nordestinos, já mais consolidados e implantados nas últimas décadas. 56 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Ministério da Agricultura e Reforma Agrária. A atuação da CODEVASF e do DNOCS no desenvolvimento da irrigação no nordeste Brasília, 1990. BRASIL. Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal. Política nacional de irrigação e drenagem: projeto novo modelo de irrigação Brasília, 1998. 232p. CHRISTOFIDIS, Demetrios. Recursos hídricos e irrigação no Brasil Brasília, 1999. (Mimeogr.). FRANÇA, Francisco Mavignier Cavalcante (coord). Políticas e estratégias para um novo modelo de irrigação documento síntese 1.ed. Fortaleza: Banco do Nordeste, Banco Interamericano de Desenvolvimento e Ministério da Integração Nacional, 2001. 128p FRANÇA, Francisco Mavignier Cavalcante (coord). Modelo geral para otimização e promoção do agronegócio da irrigação do Nordeste 1.ed. Fortaleza: Banco do Nordeste, Banco Interamericano de Desenvolvimento e Ministério da Integração Nacional, 2001. 320p. FRANÇA, Francisco Mavignier Cavalcante (coord). A importância do agronegócio da irrigação para o desenvolvimento do Nordeste 1.ed. Fortaleza: Banco do Nordeste, Banco Interamericano de Desenvolvimento e Ministério da Integração Nacional, 2001. 113p. SOUZA, Hermínio Ramos DE. Agricultura irrigada e desenvolvimento sustentável no nordeste do Brasil Recife: Projeto Áridas, 1994. 58p. 57 ANEXOS B – LISTA DE FIGURAS E TABELAS FIGURA 1 – Distribuição percentual da área irrigada no Brasil, por região, em 1998 ..............................................................................14 TABELA 1 – Crescimento da área irrigada no Brasil, por estado, no período 1996-1998 ...........................................................................18 TABELA 2 – Crescimento da área irrigada no Brasil, por método de irrigação, no período 1996-1998 .......................................................19 TABELA 3 – Distribuição da área irrigada nos estados da região Nordeste – 1998....................................................................................25 TABELA 4 – Área irrigada no Nordeste (ha), segundo origem dos recursos e natureza gerencial.................................................................35 TABELA 5 – Opções de culturas irrigadas para a região Nordeste, faixa de produtividade observada em culturas bem conduzidas e produtividade mais observada em culturas bem conduzidas em condições normais.................................................................................51 58 GLOSSÁRIO Agronegócio – A agricultura está interligada a componentes e processos que propiciam a oferta de produtos aos seus consumidores finais. Este conjunto de processos e instituições ligadas por objetivos comuns, constitui um sistema denominado negócio agrícola, agronegócio ou agribusiness. Frutícolas – referente a frutas. Olerícolas – referente a legumes. 59