FGV Língua Portuguesa 11 de Novembro / 2001 Leia com atenção o texto abaixo. Depois, responda às perguntas a seguir. Um cachorro de maus bofes acusou uma pobre ovelhinha de lhe haver furtado um osso. — Para que furtaria eu esse osso — ela — se sou herbívora e um osso para mim vale tanto quanto um pedaço de pau? — Não quero saber de nada. Você furtou o osso e vou levá-la aos tribunais. E assim fez. Queixou-se ao gavião-de-penacho e pediu-lhe justiça. O gavião reuniu o tribunal para julgar a causa, sorteando para isso doze urubus de papo vazio. Comparece a ovelha. Fala. Defende-se de forma cabal, com razões muito irmãs das do cordeirinho que o lobo em tempos comeu. Mas o júri, composto de carnívoros gulosos, não quis saber de nada e deu a sentença: — Ou entrega o osso já e já, ou condenamos você à morte! A ré tremeu: não havia escapatória!... Osso não tinha e não podia, portanto, restituir; mas tinha vida e ia entregá-la em pagamento do que não furtara. Assim aconteceu. O cachorro sangrou-a, espostejou-a, reservou para si um quarto e dividiu o restante com os juízes famintos, a título de custas... (Monteiro Lobato. Fábulas e Histórias Diversas) Questão 1 – Peso: 5% O que significa de maus bofes, na primeira linha do texto? Resposta: “de maus bofes” significa que o cachorro é mau-caráter, não tem boa índole. Questão 2 – Peso: 10% a) Dê o superlativo absoluto sintético de pobre, em suas duas formas possíveis. b) Numa dessas formas, o superlativo absoluto sintético de pobre assume característica latina. Ofereça dois outros exemplos em que, de acordo com a norma culta, isso ocorra. Resposta: a) paupérrimo e pobríssimo. b) macérrimo e celebérrimo, aumentativos de “magro” e “célebre”. Questão 3 – Peso: 5% Ao gado formado de vacas, chamamos vacum. Aponte cada um dos adjetivos utilizados para designar o gado formado de: a) cabras; b) ovelhas. Resposta: a) caprum. b) ovelhum. Questão 4 – Peso: 5% Do texto, transcreva quatro palavras nas quais ocorram diferentes dígrafos. Resposta: cachorro, ovelhinha, osso, penacho Questão 5 – Peso: 10% No texto, encontramos o seguinte período: “— Para que furtaria eu esse osso — ela — se sou herbívora e um osso para mim vale tanto quanto um pedaço de pau?” Nesse período, teria sido possível escrever Por que em vez de Para que. Isso teria provocado sentido diferente à frase? Explique. Resposta: A locução interrogativa “para que” confere ao período a circunstância de finalidade; “por que” conferir-lhe-ia a circunstância de causa. Questão 6 – Peso: 10% Observe o período “Para que furtaria eu esse osso — ela — se sou herbívora e um osso para mim vale tanto quanto um pedaço de pau?”. A respeito dele, pede-se: a) O segmento para mim está próximo da palavra osso. Pelo sentido, porém, percebe-se que sua relação imediata não se faz com essa palavra, mas com outra. Diga com qual palavra ela se relaciona e explique. b) Explique a função da palavra ela. Resposta: a) O segmento “para mim” relaciona-se com a forma verbal “vale”. A impressão de que “para mim” está ligado a “osso” deve-se à inversão da ordem direta dos termos da oração, que recomendaria a construção “um osso vale para mim...”. b) A palavra “ela” é indicadora de que o discurso direto é proferido pela ovelhinha. FGV2aFASE2001 1 2 FGV NOVEMBRO / 2001 – 2a FASE Questão 7 – Peso: 10% A sentença a que a ovelha é condenada só se concretiza realmente no último parágrafo. No entanto, ao longo do texto, o narrador vai, aos poucos, oferecendo indícios de que isso ocorreria. Aponte pelo menos dois desses indícios e explique-os. Resposta: No primeiro parágrafo, observa-se que o cachorro é “de maus bofes”, isto é, de má índole, o que permite pressupor que ele faria de tudo para levar a cabo seus objetivos. Os urubus estão “de papo vazio” e são “carnívoros gulosos”, outro indício claro de que sairá a ovelha em desvantagem no julgamento. Questão 8 – Peso: 5% No início, o narrador utiliza verbos no pretérito perfeito do indicativo. Em certo momento, passa a utilizar o presente do indicativo. Esse recurso produz efeito na narrativa? Explique. Resposta: No sexto parágrafo, as formas “comparece”, “fala” e “defende-se” presentificam as ações verbais, de modo que o leitor, como se fosse um espectador do julgamento, prepare-se para o desenlace da narrativa. Questão 9 – Peso: 5% O adjetivo referente ao substantivo Espanha assume, por vezes, forma latina que pode ser notada em sua grafia. No texto acima, ocorre fenômeno semelhante com uma palavra. Identifique-a e explique esse fenômeno. Resposta: O adjetivo referente a “Espanha”, por vezes, assume a forma latina “Hispânico”, em lugar de “Espanhol”. O mesmo fenômeno ocorre com as palavras “erva” e “herbívoro”, em que o substantivo perdeu o “h” inicial, ao contrário do que acontece com o adjetivo. Questão 10 – Peso: 10% Explique o significado das expressões sublinhadas no seguinte fragmento do texto: “Defende-se de forma cabal, com razões muito irmãs das do cordeirinho que o lobo em tempos comeu”. Resposta: “Cabal” significa “completa, plena, por inteiro, perfeita”; “muito irmãs” significa “afins, semelhantes”; “cordeirinho que o lobo em tempos comeu” faz referência às vítimas frágeis devoradas injustamente pelo lobo em outras fábulas. Questão 11 – Peso: 5% Leia atentamente a seguinte frase extraída do texto: “Ou entrega o osso já e já, ou condenamos você à morte!”. Poder-se-ia dispensar uma das formas já dessa frase sem alterar-lhe o sentido? Explique. Resposta: Se uma das formas “já” for dispensada, não haverá alteração de sentido, no entanto, perder-se-á o efeito estilístico enfático pretendido pelo autor. Questão 12 – Peso: 5% Dê o plural de: a) gavião-de-penacho; b) espostejou-a. Resposta: a) gaviões-de-penacho b) espostejaram-na ou espostejaram-nas Questão 13 – Peso: 5% O que significa, no texto, a forma verbal espostejou? Explique o processo de formação desse verbo. Resposta: “Espostejar” significa “cortar em postas, esquartejar”. Ocorreu nesse verbo derivação parassintética, em que há necessidade de acréscimo simultâneo e obrigatório de prefixo e sufixo no radical (es + posta + ejar). Questão 14 – Peso: 5% Como se pode deduzir do texto, a palavra urubu não tem acento gráfico. A palavra baú, também terminada em u, tem acento agudo. Explique a razão dessa diferença. Resposta: “Urubu” é oxítona terminada em “u”, vocábulo que não é acentuado. Em “baú” ocorre hiato com a vogal tônica “u”, que recebe, por sua vez, acento agudo. Questão 15 – Peso: 5% Por que, no texto, o narrador usa o pretérito mais-que-perfeito do indicativo furtara? Resposta: O pretérito mais-que-perfeito do indicativo indica passado anterior em relação ao expresso pelas formas verbais “tinha” e “ia”. FGV2aFASE2001