UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
MESTRADO EM EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
MANOEL LUIS MELO
IMPORTÂNCIA DAS ESCOLINHAS DE FUTEBOL NA
FORMAÇÃO DO JOVEM ATLETA
EM CAMPINA GRANDE - PB
JOÃO PESSOA – PB
JUNHO DE 2008
MANOEL LUIS MELO
IMPORTÂNCIA DAS ESCOLINHAS DE FUTEBOL NA
FORMAÇÃO DO JOVEM ATLETA
EM CAMPINA GRANDE - PB
Dissertação apresentada como requisito para
obtenção do título de Mestre no curso de Educação
de Jovens e Adultos da Universidade Federal da
Paraíba.
Orientador Prof. Dr. Wilson Honorato Aragão
JOÃO PESSOA – PB
JUNHO DE 2008
MANOEL LUIS MELO
IMPORTÂNCIA DAS ESCOLINHAS DE FUTEBOL NA
FORMAÇÃO DO JOVEM ATLETA
EM CAMPINA GRANDE - PB
Banca Examinadora
Examinado em ___ de __________ de 2008
____________________________________________
Orientador Prof. Dr. Wilson Honorato Aragão
_____________________________________________
Examinador Prof. Dr. Iraquitan de Oliveira Caminha
_____________________________________________
Examinador Prof. Dr. Orlandil de Lima Moreira
_____________________________________________
Suplente Prof. Maria da Salete Barbosa de Farias
Jamais poderia concluir esta dissertação de
Mestrado, sem a ajuda e colaboração de mãos
amigas, que se estenderam para mim.
(Manoel Luis Melo)
Dedico
A todos que direta ou indiretamente estiveram
envolvidos no processo de elaboração desta
dissertação.
AGRADECIMENTOS
A minha esposa Leninha, pela paciência e por estar ao meu lado desde o início desta jornada.
Ao professor Dr. Wilson Honorato Aragão, por me possibilitar dar mais este importantíssimo
passo em minha vida.
Ao professor Chateaubriand Pinto Bandeira Júnior, pelo apoio, incentivo e ajuda nos
momentos mais difíceis de minha vida.
Aos professores Drs. Iraquitan de Oliveira Caminha e Orlandil de Lima Moreira, pela
compreensão e sensibilidade na conclusão desta pesquisa.
A professora Dra. Marinalva Freire da Silva, presidente de la Associación de Professores de
La Espanhol de Paraíba.
Ao professor Luiz Antônio Zaluar, da Associação Brasileira de Técnicos de Futebol – ABTF,
Rio de Janeiro, pela amizade e contribuição ao meu crescimento pessoal.
Ao jornalista Franklin Robson Melo da Silva, pela colaboração e incentivo a novos
conhecimentos.
Aos atletas e ex-atletas profissionais, que gentilmente se colocaram à disposição para
realização das entrevistas, fornecendo informações imprescindíveis para a conclusão deste
estudo.
Enfim, pedindo desculpas se fui traído pela memória, agradeço a todos os demais amigos,
alunos e professores que contribuíram com sua parcela para a finalização deste trabalho.
A todos,
Meu muito obrigado!
RESUMO
Os atletas brasileiros até um passado não muito distante aprendiam a praticar o futebol nas
ruas ou nos campinhos de várzea. Mas o futebol que tantos valores revelou nestes espaços
virou refém do desenvolvimento urbano, e a cada dia mais vem sendo praticado e
desenvolvido no ambiente das escolinhas de futebol que estão espalhadas pelo País. Por essa
razão, é que a pesquisa sobre esse tema tem como objetivo analisar a importância das
escolinhas de futebol na formação dos jovens atletas de Campina Grande. Trata-se de uma
pesquisa exploratória com abordagem quantiqualitativa, baseada no método indutivo, que teve
instrumento de coleta de dados uma entrevista com vinte atletas que passaram pelas
escolinhas de futebol locais. Os resultados das análises realizadas sobre o material coletado
permitiram a confirmação da importância do papel que têm as escolinhas na formação dos ex
e novos atletas, fato comprovado pelos resultados da consulta que ratificam a contribuição
destas para a sua formação como atletas, cidadãos de caráter e dignos de respeito,
merecedores de uma oportunidade que ainda na infância lhes é tirada, resultado da própria
condição social da família. Diante disso, percebeu-se que se tais escolinhas fossem assistidas
financeira e pedagogicamente, poderiam se transformar num grande espaço para a formação
de grandes atletas e/ou homens que, ao invés de ficarem expostos à criminalidade das ruas,
passariam a encher os estádios do mundo com torcedores os aplaudindo.
Palavras-chave: Futebol. Formação dos atletas. Escolinhas de futebol.
ABSTRACT
The Brazilian athletes to a not too distant past learned to carry the football in the streets or in
campinhos of lowland. But the game that so many values revealed in these spaces become
hostage to urban development, and each day more is being practised and developed in the
environment of the day football that are spread throughout the country. For that reason is that
research on this topic aims to analyze the importance of football day in the training of young
athletes from Campina Grande. This is an exploratory research with quantitative and
qualitative approach, based on inductive method, which took tool for data collection an
interview with twenty athletes who have spent the day for local football. The results of
analyses on the material collected, allowed the confirmation of the importance of the role that
day in the training of former and new athletes, a fact confirmed by the results of the interview
that ratify the contribution to their training as athletes, citizens of character and worthy of
respect and a place in the sun to them drawn in childhood by their condition of life that have
just social the family. Given this, realized that if such day be assisted financially and
pedagogically, instead of being exposed to street crime, would fill the stadiums in the world
with the fans cheering.
Keywords: Football. training of athletes. Escolinhas football.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Suélio Lacerda bicampeão pelo São Paulo Futebol Clube..................................... 47
Figura 2 - Celso Fio jogando na Suíça.................................................................................... 48
Figura 3 - Marcelinho Paraíba no Flamengo........................................................................... 49
Figura 4 - Fábio Bilica na Seleção Brasileira.......................................................................... 51
Figura 5 - Orientação sobre comportamento dos atletas dentro e fora de campo.................... 53
Figura 6 - Robinho e Ronaldinho................................................................................................. 58
Figura 7 – Meia Kaká do Millan, Itália.....................................................................................
58
Figura 8 - Atletas realizando alongamentos antes de treino tático.......................................... 63
Figura 9 – Atletas em palestra sobre drogas no SAFEPB....................................................... 69
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Idade dos atletas entrevistados............................................................................. 46
Gráfico 2 - Origem dos clubes em que os atletas atuam......................................................... 52
Gráfico 3 - A importância da escolinha na vida dos atletas.................................................... 60
Gráfico 4 - Importância das escolinhas no combate às drogas............................................... 67
Gráfico 5 - A importância das escolinhas no combate à exclusão social................................ 78
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1 - 1INTRODUÇÃO........................................................................................ 11
1.1 A relação com o objeto de estudo...................................................................................... 11
1.2 Contextualizando a temática.............................................................................................. 15
CAPÍTULO 2 - BREVE HISTÓRICO DO FUTEBOL E SUA CHEGADA AO
BRASIL.................................................................................................................................. 22
2.1 Do futebol de rua do passado às escolinhas de futebol da atualidade............................... 24
2.2 A importância das escolinhas de futebol na atualidade..................................................... 28
2.3 O futebol como fator de valorização da cidadania e vetor do crescimento pessoal.......... 30
2.4 Um olhar sobre a indisciplina na formação do atleta do futuro......................................... 35
CAPÍTULO 3 – A IMPORTÂNCIA DAS ESCOLINHAS DE FUTEBOL NA VISÃO
DE ATLETAS E EX-ATLETAS DE CAMPINA GRANDE – PB................................... 46
CONSIDERAÇÕES.............................................................................................................. 87
REFERÊNCIAS..................................................................................................................... 90
APÊNDICE............................................................................................................................. 93
11
CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO
1.1 A relação com o objeto de estudo
A inspiração para pesquisar sobre a importância das escolinhas de futebol veio da
nossa experiência de vida, marcada inicialmente por uma infância pobre no bairro de São José,
em Campina Grande – Paraíba, e posteriormente por uma carreira ascendente no futebol que
teve início no Treze Futebol Clube (PB), e serviu como ponto de partida para superação dos
problemas que nos afetavam, e culminada por passagens por clubes como Alecrim (RN),
Itabaiana (SE), Ferroviário (MA), Sampaio Correia (MA), Flamengo e River (PI), Botafogo e
América (PB), Sergipe (SE), CSA e ASA (AL).
Para sobreviver com a minha família, investi nos estudos, concluindo o Ensino Médio.
Em seguida, aprovado no vestibular para Comunicação Social da Fundação Universidade
Regional do Nordeste – FURNe, hoje Universidade Estadual da Paraíba - UEPB, em 1979, a
duras penas consegui concluir o curso, mesmo ano em que fui aprovado no vestibular de
Licenciatura Plena em Educação Física, também pela Furne.
Ainda em 1979, fui convidado pela diretoria do Treze Futebol Clube para exercer a
função de treinador das divisões de base, cargo que assumimos e já no primeiro ano à frente
dos juniores conseguimos ser campeões.
No início da década de 1980, transferi-me para os juniores do Campinense Clube,
arqui-rival do Treze, clube no qual havíamos sido campeões no ano anterior, e após algumas
conquistas, resolvi escrever minha autobiografia, através do livro “Futebol, Arte de Um
Nômade”.
Após conquistar o título de campeão paraibano, como preparador físico, em
1979/1980 pelo Campinense, fui mandado embora. Desempregado, viajei para o Piauí, mais
especificamente para Teresina, onde consegui me destacar durante o tempo em que lá
permaneci e acabei sendo convidado pela Associação de Garantia ao Atleta Profissional do
Futebol do Piauí – AGAP-PI, através do seu presidente Duílio, para participar do 1º Curso de
Técnico de futebol do Brasil, no Rio de Janeiro.
12
No Rio de Janeiro, depois de fazer teste físico e de conhecimentos gerais, fui aprovado
junto a mais 29 atletas. A experiência adquirida no curso, através do contato com atletas
renomados de clubes do Sul do País e da Seleção Brasileira, a exemplo de Nilton Santos,
Felix, Altair, Silva, Calazans, Miguel, Franz, Dutra e Pampoline. Essa convivência nos levou
a publicar outra obra intitulada “A difícil missão de comandar”.
A partir da minha formação profissional como técnico de futebol no Sul do País, na
Escola de Educação Física do Exército, comecei a lecionar em vários educandários e estagiar
em clubes profissionais, período muito importante para minha formação intelectual, pois
participei de dezenas de cursos, simpósios e outros eventos sobre futebol em várias capitais
brasileiras, como Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre, Brasília e Paraná.
Regressando ao Nordeste, para labutar como treinador do Alecrim Futebol Clube, e
prestes a concluir o curso de Educação Física, consegui transferência para a Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), onde terminei o curso superior em 1984, e em
seguida, fui responsável pela monitoria das disciplinas Futebol I e II na UFRN. Nesta mesma
época, passei a lecionar a disciplina Educação Física no Colégio Agrícola de Ceará-Mirim.
Em 1985, fui tentar a sorte em Porto Velho (RO). Já no 3º dia, após ter distribuído
meu currículo na Universidade Federal de Rondônia, Secretarias do Governo Estadual e
Clubes de Futebol, fui contratado para lecionar as disciplinas Futebol de Campo I e II, e
Treinamento Esportivo no curso de Educação Física da Universidade de Rondônia - UNIR, e
também, para atuar como jornalista pela Secretaria de Cultura, Esporte e Turismo de
Rondônia.
Durante a nossa permanência em Porto Velho, desenvolvemos vários projetos
esportivos, a exemplo do Projeto Bola Cheia, que objetivou implantar dez núcleos esportivos
nos subúrbios da capital rondoniense, patrocinados pelo governo estadual. Momento este que
marcou a nossa iniciação à frente das escolinhas de futebol, e nos inspirou para publicarmos
mais dois livros, intitulados “Aprenda a Jogar Futebol” e “Futebol com Humor”,
respectivamente.
13
Em julho de 1985, a UNIR escolheu dez professores para cursar pós-graduação “latu
sensu” em Metodologia do Ensino Superior, na Pontifícia Universidade Católica (PUC), em
Belo Horizonte (MG), da qual participamos e concluímos em julho de 1987.
Ainda na Capital rondoniense, trabalhamos como técnico de futebol nas equipes
profissionais e juniores do Ferroviário, Moto Clube, Mixto e Ipiranga, além de treinarmos a
seleção principal, oportunidade em que disputamos o campeonato brasileiro e fomos vicecampeões da chave Norte.
Em 1989, após ter sido eleito coordenador do curso superior de Educação Física, fui
redistribuído para o cargo de professor retide de 3º grau, onde passamos a lecionar a disciplina
de Educação Física, nas modalidades de Futebol de Campo e Futsal, na Universidade Federal
da Paraíba (UFPB), Campus III, em Bananeiras.
Transferido de Porto Velho para Bananeiras, na Paraíba, a nossa primeira missão foi
reativar a Associação de Garantia ao Atleta Profissional – AGAP-PB, fundada por nós em
1991, entidade esportiva que defende e assiste socialmente os atletas e ex-atletas profissionais
e seus dependentes. Neste mesmo ano, agora como presidente da AGAP-PB, fomos até
Brasília e conseguimos trazer de lá, para uma visita a Paraíba, o presidente da Federação das
Associações dos Atletas Profissionais – FAAP-DF, o atleta tricampeão do mundo Wilson
Piazza que para cá veio com a tarefa de oficializar, de fato e de direito, a AGAP-PB.
Após a oficialização da AGAP-PB, a entidade passou a receber verba mensal que
serviu para financiar projeto social “Futebol Também se Aprende na Escola”, cuja meta
principal não apenas esportiva, mas social, pois visava tirar das ruas crianças em situação de
risco, ajudando na formação cultural e social das mesmas.
A implantação do projeto social “Futebol Também se Aprende na Escola”, veio
beneficiar centenas de crianças e adolescentes, na faixa-etária de 07 a 17 anos, além de
contribuir para o emprego de ex-atletas de futebol (sócios da AGAP-PB), que passaram a
atuar como instrutores de futebol, responsáveis pela formação de jovens valores para o
esporte local e nacional, projeto este que acabou sendo estendido para outras regiões da
Paraíba, a exemplo de Bananeiras.
14
Após sua implantação no campus III da UFPB, em Bananeiras, além de atender a
comunidade universitária local, o projeto também atendia às crianças das cidades
circunvizinhas, como Solânea, Araras, com a única exigência de que estivessem matriculadas
no ensino regular em seus respectivos Municípios.
Para que o nosso trabalho alcançasse o sucesso almejado, fazia-se necessário qualificar
os 14 (quatorze) instrutores para que estes pudessem oferecer a formação adequada aos alunos
matriculados no referido projeto, oportunidade que veio com a participação destes no curso de
Futebol da Escola de Educação Física do Exército, no Rio de Janeiro, para onde foram
levados com todas as despesas pagas pela AGAP-PB.
Após serem diplomados, os professores passaram a pôr, em prática, as suas novas
funções, como técnicos de futebol, em diversos bairros de Campina Grande, além da cidade
de Bananeiras.
O resultado do sucesso do projeto social “Futebol Também se Aprende na Escola”,
veio com a revelação de diversos talentos oriundos dos subúrbios de Campina Grande e
Bananeiras, a exemplo de Marcelinho Paraíba, Fábio Bílica, Glauber Gomes, Léo Oliveira,
Luciano Amaral, Franklin, Nêgo, André Luiz, Ranieri, Ziquinho, Adriano, Ítalo, Túlio, Felipe,
Tony, Hulk, Igor, Júlio César, Suélio, Luciano Paraíba, Isaias, Alix, Rômulo, e muitos outros
em plena atividade atualmente.
Em 1999, visando fortalecer e apoiar a carreira dos atletas e ex-atletas de futebol
profissional da Paraíba, fundamos o Sindicato dos Atletas de Futebol da Paraíba – SAFEPB.
Nesta oportunidade, a meta principal do SAFEPB era orientar seus associados a estudarem
enquanto atuavam nos seus clubes de origem, pois como a carreira de futebol é curta, dura em
média de 10 a 20 anos, muitos que não conseguiam alcançar o sucesso esperado, poderiam,
através dos estudos, obter uma outra profissão e assim ter alguma perspectiva em relação ao
futuro.
Atualmente, o SAFEPB possui uma boa estrutura para a formação de jovens atletas em
futebol de campo e conta com o trabalho de professores (ex-atletas) diplomados que
semanalmente estão em atividade nos subúrbios locais, visando oferecer aos jovens a
15
formação necessária para a prática do futebol e o exercício da cidadania, hoje uma exigência
da grande maioria das equipes do Brasil e do mundo.
Campina Grande é reconhecida nacionalmente como um celeiro de grandes talentos
para o futebol, e a prova disso está nas chamadas “peneiras”1 que anualmente realizamos em
nossa cidade, onde sob os olhares de empresários e representantes de clubes de grande porte
do futebol nacional vários atletas são revelados, fato que mostra que tais revelações estão
associadas ao trabalho que vem sendo realizado há anos nas escolinhas de futebol locais, e
como se percebe tem dado bons frutos.
O resultado da experiência obtida com o trabalho realizado nas escolinhas da UFPB,
campus III, e de Campina Grande, foi a publicação de mais quatro obras esportivas,
intituladas “Futebol para Todos”, “Vocabulário Popular e Humor do Futebol”, Futebol
Também se Aprende na Escola”, e a mais recente “Abecedário do Futebol”.
Foi com base na experiência acima citada, contando com a colaboração de alguns
atletas que dela fizeram parte, que procuramos demonstrar no decorrer desse estudo, a
importância que têm as escolinhas de futebol na formação do jovem atleta.
1.2 Contextualizando a temática
Boa parte das crianças e jovens brasileiros sonha um dia poder ser um atleta
profissional de futebol. Muitos até procuram se espelhar em outros atletas que jogaram ou
estão jogando por vários clubes do Brasil e do mundo. Na intenção de unir a paixão que
sentem pelo futebol à perspectiva de um futuro melhor para si e suas famílias - já que muitos
são de origem pobre - muitos deles passam a praticá-lo vendo-o como um caminho mais
rápido de conseguirem sucesso e independência financeira. Para isso, muitos acabam
recorrendo às escolinhas de futebol para se aperfeiçoarem nas técnicas desse esporte e assim
adquirirem a formação necessária que possa levá-los um dia a ser um atleta profissional.
1
Segundo a bibliografia especializada, é uma seleção realizada para se escolher dentre um grupo de atletas, um
ou alguns que vão jogar numa determinada agremiação esportiva.
16
Copiadas da Europa para o Brasil, as escolinhas espalharam-se por todo País e se
desenvolveram, algumas não apenas com a finalidade de revelarem novos talentos para o
futebol, mas também oferecer às crianças que delas participam a oportunidade de ocuparem
seu tempo com uma atividade que possa evitar que estas venham a seguir pelos caminhos da
delinqüência juvenil que tanto têm ameaçado a vida de muitos meninos e/ou jovens pelo
Brasil afora.
Como mostra Scaglia (2006), as escolinhas ganharam espaço com a expansão
imobiliária que acabou provocando o desaparecimento de muitos campos de várzea existentes
nas médias e grandes cidades brasileiras. Implantadas como alternativa para a formação de
novos atletas para o futebol brasileiro, as escolinhas fizeram com que o futebol, que antes era
jogado de forma aberta e espontânea nos campos de peladas espalhados pelo Brasil, passasse
a ser praticado em locais quase sempre fechados - muitos deles sob a responsabilidade de exatletas - que viram nisso uma oportunidade de poderem repassar aos seus alunos o que
aprenderam dentro do futebol, e também uma forma de explorarem lucrativamente essa
atividade.
Assim, o futebol que antes era praticado por puro divertimento, com o passar dos anos,
foi-se profissionalizando e se tornando produto de exportação do Brasil para toda parte do
mundo, abrindo-se a partir daí uma porta para que muitos jovens, a maioria oriunda da classe
menos favorecida, pudessem por meio dele desfrutar da oportunidade de poderem vencer as
adversidades que enfrentavam, e muitos ainda enfrentam atualmente.
Além de ser uma oportunidade para que os jovens possam mostrar o seu talento e
melhorar de vida, as escolinhas são tidas como uma atividade que pode ajudar muitas crianças
e jovens a se manterem longe de algumas armadilhas que permeiam o mundo atual, a exemplo
da violência, das drogas etc. E foi por meio do trabalho realizado em algumas escolinhas de
futebol de Campina Grande, que muitos dos jovens aos quais nos referimos na pesquisa
conseguiram chegar ao topo do sucesso, fato que está comprovado nos depoimentos colhidos
através das entrevistas que utilizamos para as análises finais deste estudo.
Apesar do reconhecimento ao trabalho que é executado no dia-a-dia pelas escolinhas,
nunca é demais lembrar que a realidade que separa as escolinhas do sonho de muitos jovens
em se tornarem um atleta profissional é dura, e nem sempre corresponde às expectativas
17
iniciais. Daí vem à importância da orientação que é repassada por algumas escolinhas – sejam
elas com ou sem fins lucrativos - a exemplo das coordenadas por nós com finalidade
meramente social e/ou inclusiva, no sentido de mostrarem aos seus alunos e/ou futuros atletas
a necessidade de estudarem enquanto praticam o futebol para que possam ter outra profissão
que venha corresponder as suas expectativas, em caso de não realização do seu sonho inicial
de serem jogador profissional de futebol.
Sem querer entrar no mérito da discussão ideológica em torno da validade ou não das
escolinhas com fins lucrativos (criticadas por alguns por serem não-seletivas e visarem mais o
lucro do que a formação e o desenvolvimento dos alunos), em relação àquelas de propósito
meramente social e inclusivo, a intenção aqui é discutir qual a importância destas escolinhas
para a formação do jovem atleta.
Apesar da constatação de que existe por parte de algumas escolinhas a preocupação
em orientar os jovens para a conquista da cidadania, algumas até exigindo como pré-requisito
para a aprendizagem do futebol que seus alunos estejam matriculados na educação formal,
vale ressaltar que não existe nenhum estudo que possa confirmar esse interesse, coisa que
procuramos obter através do histórico fornecido por alguns atletas que iniciaram suas
carreiras nas escolinhas locais, cujos depoimentos serviram de base para as discussões
realizadas nesse estudo.
Diante da falta de respostas para esta questão é que se norteou a realização desta
pesquisa junto a algumas escolinhas da cidade de Campina Grande – PB, que funcionam nos
bairros de José Pinheiro, Malvinas, Prata e São José, todos de Campina Grande – PB.
A escolha das referidas escolinhas se deu pela nossa experiência pessoal no trabalho
que nelas vimos realizando há mais de 20 anos, que as têm transformado em grandes
exportadoras de talentos para o futebol do Brasil e do mundo. Trata-se de um trabalho sem
fins lucrativos, que atende uma média de 200 jovens, a cada ano, a maioria carente e sob
ameaça de risco social, residente em áreas periféricas de Campina Grande – PB.
Na metodologia da pesquisa, procuramos destacar alguns aspectos indispensáveis à
sua execução, dentre eles: a) O método utilizado na pesquisa; b) Tipo de estudo; c) Local e
18
período de estudo; d) População e mostra; e) Instrumento para coleta de dados; F) Tratamento
e análise dos dados; g) Apresentação e análise dos resultados.
O método utilizado foi o indutivo, partindo de aspectos particulares para construir
análises sobre a realidade das escolinhas de futebol e sua importância para um determinado
segmento social. Admitindo-se os limites desse método e de sua capacidade de generalização,
considerou-se o contexto social em que a presente pesquisa foi realizada.
Cabe esclarecer que a partir do método indutivo, buscou-se levantar dados que
pudessem nos levar a compreensão sobre qual a importância das escolinhas de futebol para
formação do jovem atleta, procurando detalhar vários aspectos que envolvem a formação
pessoal e profissional do atleta, seu comportamento e caráter, além da disciplina.
Trata-se de um estudo de caráter exploratório com abordagem qualiquantitativa.
Quanto ao aspecto qualitativo da pesquisa, Neves (1996) afirma que em certa medida, os
métodos qualitativos se assemelham a interpretação de fenômenos que empregamos no nosso
dia-a-dia, que têm a mesma natureza dos dados que o pesquisador emprega em sua pesquisa.
Tanto em um como em outro caso, trata-se de dados simbólicos, situados em determinado
contexto; revelam parte da realidade ao mesmo tempo que escondem outra parte. Para o autor,
nas ciências sociais, os pesquisadores, ao empregarem métodos qualitativos estão mais
preocupados com o processo social do que com a estrutura social.
Em relação à abordagem quantitativa, Trindade (2003) afirma que esta permite ao
pesquisador tirar conclusões que não poderiam ser tiradas sem o levantamento e o cruzamento
de informações quantitativas.
Danton (2002, p. 22), por sua vez, afirma que “o observador, munido de uma listagem
de comportamentos, registra a ocorrência dos mesmos durante um período de tempo”. No
caso deste estudo, buscou-se levantar dados quantitativos que auxiliassem na análise sobre a
importância das escolinhas de futebol na formação do atleta.
Diante do exposto e das especificidades do objeto desse estudo, considerou-se
necessário fazer a união de dois modelos de análise: qualitativo e quantitativo, para
compreender aspectos sócioeconômicos e aspectos ligados aos valores e opiniões dos sujeitos
19
da pesquisa. Modelos estes que proporcionaram uma visão mais ampla das questões que
envolvem a importância das escolinhas de futebol na formação dos atletas do futuro.
A pesquisa foi realizada no período de outubro de 2007 a junho de 2008, na cidade de
Campina Grande – PB. A escolha deste local se deu em razão de nossa atuação já há mais de
vinte anos com escolinhas de futebol, tempo que nos serviu de experiência para prosseguir
trabalhando na formação de vários atletas que se destacaram, e outros que atualmente se
destacam no futebol brasileiro e mundial, e nos levaram assim a poder transcrever todo o
nosso aprendizado no presente estudo.
A população analisada diz respeito aos atletas e ex-atletas de futebol profissional que
passaram por algumas escolinhas de futebol locais, boa parte deles, inclusive, ainda em pleno
exercício do futebol por várias equipes do Brasil e do exterior.
Para Silva e Menezes (2001), a população ou universo da pesquisa representa a
totalidade de indivíduos que possuem as mesmas características definidas para um
determinado estudo. No entendimento de Richardson (1999), trata-se de um conjunto de
elementos que possuem determinadas características similares.
A amostra correspondeu a um total de 20 pessoas selecionadas para a entrevista. De
acordo com Belo (2004), a amostra é uma parcela significativa do universo pesquisado ou de
coleta de dados. Já para Murakawa (2007), a amostra é uma parte da população retirada
segundo uma regra conveniente.
Para a coleta de dados foi elaborada uma entrevista semi-estruturada com 05 (cinco)
questões abertas, onde se procurou obter, junto aos atletas entrevistados respostas que
contribuíssem para viabilização de um diagnóstico sobre a temática da importância das
escolinhas de futebol na formação do atleta do futuro. De acordo Bleger (1993) apud Teixeira
(2002), a entrevista semi-estruturada permite ao entrevistador uma maior flexibilidade, na
medida em que pode se alterar a ordem das perguntas e se tem ampla liberdade para fazer
intervenções, de acordo com o andamento da entrevista.
No caso específico, procurou-se selecionar pessoas com as quais poderíamos explorar
o tema e delas obtermos as informações necessárias para nossas análises. Definidas tais
20
pessoas participantes, como aconselha a bibliografia especializada, elaborou-se com
antecedência as perguntas que foram feitas obedecendo a uma ordem previamente
estabelecida.
A Internet é uma novidade nos meios de pesquisa. Este recurso representa uma
revolução no que concerne à troca de informação, pois veio facilitar a busca e a coleta de
dados. Através da utilização desse processo informatizado, foram realizadas as entrevistas por
meio de e-mails, tendo em vista que boa parte dos participantes entrevistados não estava
presente no local da pesquisa.
De acordo com o Instituto Qualibest (2008, p. 3), “A entrevista on-line é semelhante a
uma entrevista em profundidade tradicional, porém realizada através da Internet.”, cujas
vantagens, são: a) O baixo custo de realização; b) Abrangência nacional; c) Agilidade no
recrutamento; d) Possibilidade de exibição de imagens, textos, links, vídeos, gráficos e
embalagens; e) Comodidade para a participação do pesquisado; e f) As transcrições
instantâneas das entrevistas.
Para o tratamento dos dados bibliográficos, foi utilizado o recurso do fichamento, que
é um instrumento importante na organização para a efetivação da pesquisa de documentos,
tendo em vista que ele permite um fácil acesso aos dados fundamentais para a conclusão do
trabalho. Sendo assim, dois tipos básicos de fichamento foram utilizados na pesquisa, o
fichamento bibliográfico e o fichamento de citações.
Os dados foram analisados estatística e qualitativamente a base de números absolutos
e percentuais e através da bibliografia especializada. Os dados quantitativos obtidos mediante
a entrevista foram relacionados com os dados bibliográficos, visando confrontar a teoria
levantada com a prática vivenciada pelos atletas entrevistados.
As cinco questões foram elaboradas levando-se em consideração os objetivos
pretendidos, onde se procurou explorar algumas questões que envolvem o universo das
escolinhas a partir de hipóteses que apontavam para a importância destas para a formação do
atleta do futuro.
21
O objetivo geral desse estudo foi analisar a importância de algumas escolinhas de
futebol de Campina Grande – PB, a partir dos depoimentos de alguns atletas e ex-atletas que
por elas passaram.
Especificamente o trabalho objetivou o seguinte:
- Fazer um resumo sobre a origem e desenvolvimento das escolinhas de futebol no Brasil e
em Campina Grande;
- Analisar os aspectos metodológicos e pedagógicos presentes nas escolinhas de futebol;
- Mostrar a importância da disciplina na formação dos jovens atletas;
-Identificar
entre
os
indivíduos
entrevistados,
quais
os
aspectos
que
mais
contribuem/contribuíram para sua formação como atleta e cidadão.
O trabalho foi dividido em três etapas. A primeira refere-se à introdução que reúne a
justificativa, o problema e os objetivos. A segunda parte referiu-se à fundamentação teórica,
que constou de uma revisão bibliográfica sobre o histórico do futebol e outros aspectos a ele
inerentes, além de um levantamento sobre o surgimento das escolinhas no Brasil e em nível
local, que serviu de base para as discussões realizadas no decorrer do trabalho. Enquanto que
a terceira parte foi dedicada à apresentação e análise dos resultados, onde procuramos fazer
um paralelo entre a teoria discutida e os dados colhidos juntos aos atletas e ex-atletas
entrevistados, para ao final apresentarmos nossas considerações acerca do tema abordado.
22
CAPÍTULO 2 - BREVE HISTÓRICO DO FUTEBOL E SUA CHEGADA AO BRASIL
Consolidado na cultura mundial, como afirma Scaglia (1999), o futebol é talvez o
esporte mais popular do planeta, amplamente massificado e praticado da mesma maneira ao
redor do mundo.
De acordo com Scaglia (1999), o estudioso das origens do futebol, o chinês Liu
Bingguo, afirma que este esporte teve início na China há 5.000 (a.C), no tempo do imperador
Amarelo. Depois de surgir na China e seguir para a Europa, Scaglia afirma que o futebol
chegou na América do Sul na metade do século XIX, primeiramente na Argentina, onde era
visto como jogo maluco praticado pelos ingleses.
Em seu livro intitulado “Jogando com Pelé”, Nascimento (1974) afirma que foi na
Inglaterra que o futebol moderno teve sua origem. Segundo ele, no início, havia um pouco de
confusão e muita discussão entre os adeptos do futebol jogado com as mãos – o rugby – e o
jogado com os pés. Mas, tudo só se definiu mesmo a partir de 1863, quando a turma que
preferia o jogo com os pés fundou The Football Association, para uniformizar o uso das
regras que naquele ano haviam sido lançadas.
Sobre este assunto, Araújo e Didonê (2006) afirmam que o campo de futebol e a sala
de aula podem parecer dois universos distintos, mas foi exatamente nos colégios da Inglaterra
que as primeiras regras do esporte foram criadas, no século XIX.
No Brasil, a história oficial registra que o futebol chegou ao Brasil por São Paulo, no
ano de 1894, trazido por Charles Miller, que ao retornar da Inglaterra, onde fora estudar,
trouxe as primeiras bolas, uniformes e chuteiras. Entretanto, Araújo e Didonê (2006), afirmam
que em 1880, os padres jesuítas do colégio São Luís, em Itu (SP), já incentivavam a prática
desse esporte.
Para Scaglia (1999, p. 15): “[...] a difusão do futebol pelo Brasil não se deu do centro
para sua periferia, mas de quase simultâneos focos disseminadores, ou seja, o futebol se
difundiu no nosso país de maneira regional”.
23
Essa disseminação parece explicar a popularização que o futebol alcançou em todo
território nacional desde sua chegada, e demonstrar o porquê de o Brasil ter se transformado
no país do futebol, que já há algumas décadas, vem exportando atletas para várias partes do
mundo.
A popularização do futebol propagada pelas várias regiões do país e a difusão fez com
que esse esporte começasse a ser praticado pelas camadas mais pobres da população. Witter
(1996), apud Scaglia (1999, p. 15), “registra um aumento no número de praticantes em
campos improvisados que ladeavam as margens dos rios Pinheiro e Tietê, em São Paulo,
dando origem ao futebol varzeano (realizado nas várzeas dos rios)”.
Com o futebol se expandindo e cada vez mais conquistando espaço entre a população
brasileira, Wilpert (2005, p. 20) informa que “O primeiro jogo importante aconteceu entre os
funcionários do Comércio de Nobiling contra o pessoal inglês da Companhia de Gás, da
estrada de ferro e do Banco no ano de 1899, perante um público surpreendente de 60
torcedores, vencido pelos ingleses”.
Para Wilpert (2005), a institucionalização do futebol brasileiro tem haver com a sua
colonização através da história. Baseado no que afirma Souza (2001, p.24) que “a influência
da Europa, em especial na Inglaterra, com seus costumes, cultura e modelos nesta sociedade,
com o tempo demarcado entre o final do século XIX e início do século XX, não se dá por
acaso”, Wilpert afirma que com a invasão de Portugal pela França em 1808, o Brasil ficou
para Inglaterra.
Diferentemente do que acontecia na Inglaterra, onde o futebol nos colégios era jogado
às escondidas, no Brasil foi justamente nos colégios brasileiros que o futebol foi abertamente
estimulado, inclusive apoiado pela igreja Católica (ROSERNFELD apud WILPERT (2005, p.
20).
Assim, Scaglia (1999) afirma que ao longo das duas primeiras décadas do século XX,
os ricos vão se misturando e sendo substituídos pelos pobres, negros, mulatos e,
principalmente, pelos operários, que incentivados pelas fábricas construíam campos para
atrair e manter os funcionários em seus quadros funcionais, aspecto esse que promoveu um
grande avanço no processo de profissionalização. Sendo assim, Scaglia (1999, p. 15) afirma
24
que “em pouco mais de um século de história, o Brasil passa a ser considerado uma
superpotência mundial no futebol, conquistando, neste período, quatro títulos mundiais”.
Depois de ter se massificado nas camadas mais populares do País, o futebol percorreu
um longo caminho para sua aprendizagem pelos brasileiros. segundo Scaglia (1999):
As peladas, as rebatidas, os controles e os bobinhos, brincadeiras infantis
realizadas nestes locais, pertencentes ao universo da cultura das brincadeiras
de bola com os pés, são apontadas por Freire, como as responsáveis pela
maneira toda particular do brasileiro jogar futebol. Pois foi brincando com
elas que nossos antigos craques aprenderam a jogar futebol.
Sendo assim, como afirma Scaglia (1999) e nós concordamos, tendo em vista que
também vivenciamos esta realidade em toda a sua plenitude, foi em meio à liberdade
propiciada pelas brincadeiras tradicionais infantis que se deu à aprendizagem do futebol
durante um longo período da história do futebol brasileiro. Para este autor, até bem pouco
tempo atrás, essa era a única maneira de se aprender a jogar futebol no Brasil, e talvez por
isso o brasileiro tenha se transformado num dos melhores praticantes deste esporte no mundo.
2.1 Do futebol de rua do passado às escolinhas de futebol da atualidade
Os antigos espaços destinados ao lazer das crianças, ao longo do dia, atualmente têm
dado lugar para a expansão urbana e imobiliária que vêm mudando cada vez mais a paisagem,
antes ocupada pelo futebol de rua e pelos campinhos de pelada, que serviam de diversão para
os jovens, para dar lugar a outras atividades que não envolvem mais as brincadeiras do
passado.
Em outras palavras, as crianças que no passado procuravam os campinhos de várzea
ou as ruas para jogar, hoje são obrigadas a procurar as escolinhas de futebol, que como afirma
Scaglia (1999, p. 18), “[...] deverão viver um processo de substituição das funções antes
atribuídas às ruas e aos campinhos”, razão pela qual um número grande de crianças tem
procurado as escolinhas para aprender a jogar futebol, pensando no futuro se tornarem bons
atletas.
25
A vivência como coordenador de escolinhas de futebol permite-nos dar o nosso
testemunho dessa procura que, a cada dia, aumenta mais nos vários locais onde são
ministradas as aulas de futebol para crianças e/ou jovens atletas. Da mesma forma, pode-se
afirmar que em grande parte essa procura se deve ao sonho dos garotos de um dia poderem
jogar em um grande clube brasileiro ou mesmo do exterior, e por meio do futebol, vencerem
as dificuldades que a maioria enfrenta e assim buscarem melhorias para si e suas famílias.
A experiência daqueles que trabalham nas escolinhas tem mostrado que o futebol é
considerado um atalho importante na vida das crianças, pois através das escolinhas, elas
procuram driblar não apenas os adversários por meio do esporte, mas todo um campo cercado
de dificuldades e incertezas cuja porta de saída, para alguns, é pelas escolinhas.
Apesar de ser reconhecidamente um atalho inquestionável, não se deve esquecer que
tais escolinhas não oferecem a todos a certeza do sucesso na carreira futebolística. Por essa
razão, é que muitas procuram orientar as crianças para que estudem, visando mostrar que o
caminho para conquistar o espaço no futebol é espinhoso e que por isso todos devem antes
investir no conhecimento para que no futuro não fiquem apenas com um sonho que não foi
possível de se realizar nas mãos.
A preocupação com os estudos deve ser um aspecto importante para quem procura
uma escolinha de futebol. Em algumas delas, a exemplo daquelas que oferecem o acesso
gratuito à prática do futebol, como é o caso das coordenadas por nós, em Campina Grande –
PB, estar regularmente matriculado é uma das principais exigências. Porém, outros aspectos
devem ser levados em consideração pelos pais ou responsáveis na hora de colocar seu filho
numa escola de futebol, dentre eles analisar cada detalhe de suas instalações e não acreditar
que o simples contato com ex-jogadores famosos, que muitas vezes comandam algumas
escolinhas com fins lucrativos, seja um caminho para o sucesso total.
Como se constata, embora nem todos venham a galgar o sucesso desejado no futebol,
alguns poderão chegar ao topo e conseguir alcançar seus objetivos. Mas independente de uns
chegarem ao topo e outros não, o exemplo mais digno e importante que as escolinhas podem
dar é o de contribuir para que as crianças tenham um futuro mais digno.
26
Um exemplo da importância que a escolinha pode ter na vida de um garoto pode ser
tirado da história de Anikson Mariano Mendonça, ou simplesmente Mariano, que foi revelado
pelo futsal no Esporte Clube Cabo Branco, onde iniciou sua carreira, sagrando-se campeão na
categoria fraudinha.
Segundo Lima (apud Jornal A União, 2007), Mariano surgiu no cenário do futebol de
campo em 2002, quando foi campeão paraibano das escolinhas na categoria pré-mirim,
vestindo a camisa do Cabo Branco. No ano seguinte, tornou-se bicampeão e passou a integrar
a escolinha do Clube Náutico Capibaribe (PE). E em 2006, o talento do jovem atleta foi
descoberto por Severino Ferreira, fundador do Centro Sportivo Paraibano – CSP, de João
Pessoa – PB, clube em que se sagrou campeão paraibano sub-13. Seus chutes, as belas
jogadas, sua movimentação em campo, a marcação aos adversários, bem como a agilidade
com a bola no pé despertaram a atenção do São Paulo Futebol Clube. No entanto, segundo o
pai do atleta, Suetônio Mendonça Soares, “o nervosismo fez com que ele Anikson fosse
reprovado nos testes”.
Após sofrer problemas em outros clubes em que foi apresentado, o atleta foi
convidado para fazer testes no Coritiba e já no segundo treino foi confirmado no elenco.
Atualmente, o atleta tem contrato com o Coritiba até 2014, podendo negociar seu passe com
qualquer outro clube a partir dos 16 anos, porém para que isto ocorra, informa Lima (2007), o
clube interessado terá que pagar ao Coritiba Futebol Clube a quantia de R$ 600,00 (LIMA,
apud A União, 2007, p. 17).
O exemplo de Anikson Mariano e de outros atletas que também sonham com a fama e
em fazer um bom contrato profissional pode ser resumido nas palavras do jovem atleta a
seguir: “Sei que ainda sou jovem, mas o importante é pensar também na família, pois sei das
dificuldades que ela enfrenta. Vou vencer no futebol e tenho certeza que ela terá melhores
condições no futuro” (LIMA, 2007, p. 17)
Antes, porém, da história recente de Anikson Mariano, no ano de 1999, em matéria
intitulada “Esporte traz esperança a crianças pobres”, edição de 26 de dezembro de 1999, do
Diário de Pernambuco, Lopes (1999), já mostrava a importância desse tema, afirmando que
milhares de crianças carentes estavam começando a virar o placar de um jogo em que
nasceram perdendo de goleada para adversários como a pobreza, analfabetismo e falta de
27
perspectiva. Crianças estas, que faziam parte de diversos programas sociais, espalhados pelo
País, e que têm no esporte um meio de atraí-las para as salas de aulas, reduzindo os
alarmantes índices de evasão e repetência escolar.
São os casos dos projetos tipo escolinhas. Capitaneadas muitas vezes por
craques dos campos e das quadras, elas dão assistência médica e
complementação alimentar, e têm como objetivo principal revelar talentos e
oferecer o esporte como uma forma de lazer, tirando crianças e adolescentes
das ruas. (LOPES, 1999, p. 4)
Dentre os projetos citados por Lopes (1999) à época, estava o Projeto Romarinho, do
atacante vascaíno Romário, que atendia a crianças entre 14 e 17 anos, no Rio de Janeiro,
dentre outros.
Todos estes projetos visavam ao esporte como meio de socialização, motivação e
recuperação da auto-estima, aliando a isso atividades pedagógicas, artísticas e culturais, além
de um acompanhamento junto aos professores e pais dos integrantes. Mais que garimpar
talentos em regiões pobres do País para transformá-los em novos fenômenos, estes projetos
devem buscar incentivar a prática da educação.
Apesar da afirmação de Scaglia (1999) de que essas escolas são, na sua grande maioria
particulares, portanto, dão lucro aos seus proprietários - quase sempre ex-atletas - que, usando
os seus nomes e prestígios, atraem as crianças, fascinadas, com sonhos de sucesso e a fama,
não tendo, portanto, apenas aquela finalidade social, mesmo assim não se pode negar a
relevância do trabalho que elas vêm desempenhando juntos a estas crianças e jovens nas mais
diversas regiões do País, como ficou demonstrado nos exemplos acima.
No nosso currículo, por exemplo, contam-se mais de 30 anos dedicados à formação de
jovens atletas que através do aprendizado nas escolinhas de futebol, diga-se de passagem
“gratuito”, conseguiram ganhar o Brasil e o mundo e alcançaram o sucesso, como é o caso de
Marcelinho Paraíba, Fábio Bílica, Glauber Gomes e, mais recentemente, o atacante Túlio,
contratado pelo Botafogo carioca, atletas que passaram pelas nossas escolinhas nas duas
últimas décadas.
Daí porque a importância de se procurar saber como e de que formar as escolinhas têm
contribuído para a formação das crianças e jovens brasileiros que se aventuram na carreira
28
esportiva para tentar vencer na vida. Para isso, buscar-se-á, a seguir, responder a estas
questões e procurar-se-á entender como ocorre esse processo de formação de jovens atletas.
2.2 A importância das escolinhas de futebol na atualidade
De acordo com Scaglia (1999), ainda não existem estudos que mostrem a importância
do trabalho que vem sendo desenvolvido nas escolinhas de futebol da atualidade, daí porque
este autor afirma que:
[...] apesar da consciência de que ainda é muito cedo concluir uma avaliação
que venha a dizer se escolinhas conseguirão se igualar ao nível de
competência da rua e dos campinhos, lançando mão de uma pedagogia que
possibilite, através de um processo de ensino-aprendizagem, produzir
resultados semelhantes, não temos dúvida em afirmar que essa será a sua
tarefa. (SCAGLIA, 1999, p. 18)
Em meio à incerteza dos resultados práticos que as escolinhas poderão proporcionar, o
autor afirma que o futuro do futebol brasileiro está aí posto. Para ele, não se pode negar que
negar a existência, a proliferação, a necessidade e a importância das escolas de futebol para o
cenário social e futebolístico de nossa atualidade.
Negar a existência e a importância que as escolinhas representam dentro do nosso
contexto social, seria o mesmo ignorar as oportunidades que estas têm oferecido aos jovens,
no sentido de mantê-los ocupados e longe das armadilhas que o mundo atual os impõe, a
exemplo das drogas, da violência e outros vícios que têm arrasado a vida e a carreira de
muitos jovens. Aliado a isso, não se deve esquecer que as escolinhas surgiram como uma
alternativa à falta de espaço nas grandes cidades, pois sem elas como se poderiam formar
novos atletas e dar a estes uma chance de superar os desafios?
Apesar de neste cenário, Scaglia ainda ver incertezas, Valentin e Coelho (s/d)
vislumbram a certeza de um futuro melhor, pois para eles, nos dias atuais, o futebol se
apresenta como um fenômeno de grande importância sociocultural, que é amplamente
vivenciado pelo brasileiro em seu dia-a-dia e ressignificado a partir de sua institucionalização
e de sua apropriação pelos diversos grupos sociais. Para estes autores, “seja ditado pela
competição racionalizada, seja impregnado pelo sentimento lúdico, seja utilizado pelo Estado
29
ou atuando na coesão social, pode-se dizer que o futebol desempenha um papel central na
nossa cultura”.
Ratificando a importância mostrada acima por Scaglia (1999) e Valentin e Coelho
(s/d), em seu estudo Bielinski (s/d) afirma que as escolinhas de futebol surgiram devido à
redução das condições naturais para a prática livre e espontânea do futebol, o que provocou a
formalização de uma atividade informal, decorrendo daí o surgimento de dois tipos de
organização, cada uma dedicada a um intuito específico: a escola seletiva, cujo objetivo é a
formação de jogadores, trabalhar com crianças que demonstram um potencial próprio, uma
aptidão a ser desenvolvida; e a não-seletiva, que visa possibilitar a prática do futebol a
qualquer criança, sem o pré-requisito da sua habilidade inata para o esporte.
Para Bielinski (s/d), a escolinha de futebol não-seletiva é um importante caminho para
a valorização da qualidade de vida, como sociedade, quer pela oportunidade de assegurar um
momento de lazer aberto e não-impositivo às crianças, quer pela sua condição de agenciador
concorrente do processo educacional, e quer, ainda como estágio preliminar para o ingresso
na Escolinha Seletiva. Ou seja, trata-se de um modelo que não visa exclusivamente à
aprendizagem do futebol, mas oferecer outras oportunidades de lazer e ocupação para as
crianças.
Nesse sentido, Bielinski (s/d, p.136) chama a atenção para cinco aspectos importantes
que na sua opinião devem ser lembrados:
1. As normas de convivência social são melhor seguidas pela criança,
quando assimiladas na prática esportiva.
2. As escolinhas seletiva e não-seletiva possuem objetivos diferentes, o que
acarreta procedimentos administrativos e educativos também diferentes.
3. A atração da criança pela bola chega a ser sublime.
4. A melhor escolinha é a que permite, à criança, ser criança.
5. Para a criança, jogar futebol é pura emoção. Trata-se, portanto, de um
momento mágico para o ensino e a aprendizagem.
Os aspectos relacionados acima fazem parte de um conjunto de fatores que são
apontados pelo autor acima citado e outros especialistas, como essenciais na formação dos
jovens atletas que freqüentam as escolinhas de futebol.
30
2.3 O futebol como fator de valorização da cidadania e vetor do crescimento pessoal
Uma olhada mais superficial sobre os problemas que afligem as crianças e jovens
brasileiros, revela que apesar do esforço que alguns setores da sociedade têm feito para
permitir que estes desfrutem de uma vida mais digna, saudável e tenham para isso respeitados
os seus direitos, a realidade que permeia as ruas e as periferias das pequenas, médias e
grandes cidades brasileiras é outra bem diferente.
De forma mais abrangente, o que se nota nas ruas e nas periferias da maioria das
cidades brasileiras é que boa parte de nossos jovens convive no seu dia-a-dia com um modelo
de sociedade que está ainda muito aquém daquele que todos almejam e reivindicam dos
governantes, que é uma sociedade mais justa que privilegie a classe mais pobre, levada a
conviver com o abandono e a falta de perspectivas, simplesmente porque não se cumprem as
prerrogativas básicas para o cidadão, que são o respeito à pessoa humana e aos seus direitos
previstos na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA,
colocando-os dessa forma à margem do processo social e produtivo, formando assim uma
legião de pessoas sem qualquer perspectiva de futuro.
Assim, lançados ao abandono e necessitando sobreviver à miséria a eles imposta,
muitos jovens caem na armadilha traiçoeira das ruas, mergulham no submundo do crime e das
drogas e passam a conviver com toda sorte de mazelas que a desigualdade produzida pela
sociedade lhes impõe, formando assim uma legião de delinqüentes marginalizados e sem
esperança. Outros, no entanto, apoiados pelo trabalho voluntário de alguns membros da
sociedade, solidários à questão do menor do Brasil, acabam encontrando no esporte,
especialmente no futebol, uma oportunidade para minimizar seus dilemas.
Uma das contribuições nessa direção já vem sendo usada em alguns países, que é a
ampliação da jornada escolar reivindicada por alguns analistas. Para Steinbruch (2006),
ampliar a jornada escolar é uma necessidade básica no Brasil. Ele cita o caso da Coréia do Sul,
que fez uma revolução educacional nos últimos 40 anos, as crianças ficam na escola até 12
horas por dia, das quais sete estudando. Quando saiu da guerra, nos anos 1960, a Coréia do
Sul era um país tão pobre quanto o Brasil, com mais de 30% de sua população analfabeta. Lá
o analfabetismo está erradicado, 82% dos jovens estão na universidade (20% no Brasil) e o
país já chegou ao Primeiro Mundo.
31
A revolução feita na Coréia no período pós-ditatorial pode ser comparada aos anos de
ditadura que o Brasil viveu. Seguindo o exemplo e deixando de lado os erros do passado, por
que não se copiar o exemplo coreano e investir alto num projeto que ofereça o suporte
necessário às nossas escolas e dê as nossas crianças e jovens uma perspectiva de futuro?
Dentro desse contexto, o futebol pode ser um importante aliado no caminho da
educação e da disciplina dos jovens brasileiros. Sobre isso, Melo (2004) afirma que o futebol
contribui e muito para o desenvolvimento físico mental e social da criança e do adolescente,
influenciando diretamente no processo de formação da identidade. Para Melo trata-se de um
processo que favorece o desenvolvimento da cidadania e dinamiza as atividades de
relacionamento humano.
Bielinski (s/d), entende que a prática do futebol deve ser analisada quanto ao seu
aspecto de agente que concorre com o processo educacional não-formal que se evidencia com
mais ênfase na percepção das relações sociais por parte dos seus praticantes: o respeito a
normas, ao trabalho em equipe e a importância da dedicação individual, entre outros valores.
Diante disso, o autor afirma que “Se considerarmos a visão holística pela qual se deve
considerar o todo, mais uma vez o futebol vem-se marcando como elemento efetivo para
apoio e reforço do processo educacional” (p. 6).
Nesse sentido, professores e educadores devem ter o cuidado de não exigirem das
crianças tarefas e desempenhos acima de suas possibilidades, fatos que provocariam
sentimentos de fracasso e inferioridade. Isso pode ser equacionado através do professor de
educação física e da atividade física/desportiva, por meio do olhar clínico sobre as reais
condições físicas do aluno, de onde é possível identificar o potencial e estabelecer os limites
individuais ao aluno/atleta em qualquer atividade a que seja submetido. Agindo assim estará o
educador contribuindo para sucesso e a elevação da auto-estima da criança e do jovem.
Na busca de um modelo de ensino-aprendizagem que atenda os requisitos acima e
corresponda às expectativas tanto de educadores quanto de alunos, faz-se necessário estar
ainda atento para o que afirma Bielinski (s/d, p. 136) que “A educação é um processo que
ocorre através de redes e estruturas sociais. Por meio dele repassa-se o conhecimento
dominado pelo ser humano, de uma geração para outra”.
32
Em outras palavras, a educação é instrumento indispensável que toda a sociedade dele
necessita para se desenvolver em todos os aspectos e, dessa forma, manter-se integrada e em
plena interação diante do contexto social. Daí porque, a preocupação que vem de alguns
setores da sociedade, entre eles das escolinhas de futebol, no sentido de contribuir para a
melhoria do padrão de educação dos brasileiros.
Oliveira (2006), utilizando a frase celebrizada por Noel Rosa em uma de suas
imorredouras composições “Samba não se aprende na escola”, afirmou que ela foi
transportada para o futebol, donde se criou a crença de que ninguém aprende a jogar futebol.
De fato, durante muito tempo ficamos acostumados a ouvir que o jogador brasileiro já
nasce craque e que em todo mundo ninguém jamais superaria o Brasil nesse esporte, porque
era o melhor e seus atletas já nasciam com esse dom. Com o passar do tempo, e mais
atualmente, percebe-se que isso não é verdade. A realidade tem mostrado que futebol é
vontade de aprender e prática.
A prova da aceitação por alguns da idéia de que craque já nasce feito, no Brasil está,
segundo Oliveira (2006), no fato de que quando surge na Europa uma equipe de alto nível
técnico, composta de jogadores de incontestável valor, por aqui muitos ficam sem entender
como eles podem jogar tanta bola.
Outra prova de que futebol é vontade de aprender e prática, pode ser tirada de um
exemplo bem próximo de nós, o do futebol equatoriano, cujos clubes e a própria seleção
serviram durante muito tempo, como se diz no jargão do futebol de “saco pancada” para
clubes tradicionais da América do Sul, a exemplo de Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e
outros do exterior, mas que recentemente conquistou com méritos e em pleno Maracanã o
título de campeã da Copa Libertadores da América através da Liga Deportiva Universitária
contra um clube tradicional do futebol brasileiro, o Fluminense, coisa que nunca havia
acontecido antes.
A façanha proporcionada pela LDU em pleno território brasileiro mostra que o futebol
pode ser sim aprendido. E as escolinhas, mesmo com a crítica de alguns sobre a sua utilização
para obtenção de lucro financeiro, ao nosso ver têm um papel fundamental nessa tarefa, já que,
33
como foi mostrado, além dos campinhos de várzea do interior, não resta outra alternativa de
se formar novos atletas nas grandes cidades, senão através das escolinhas de futebol.
A nossa larga experiência com as escolinhas nos permite afirmar que o futebol
mundial cresceu e se desenvolveu contando com a ajuda de atletas brasileiros, a maioria
formados em escolinhas, que saíram e saem daqui para servir como modelo para a prática
deste esporte em várias partes do mundo, fator que vem provocando críticas por parte de
alguns setores ligados ao esporte, de que os que comandam o nosso futebol nada fazem para
repensar essa prática que vem sendo apontada como bastante maléfica para os destinos do
futebol local.
De acordo com Oliveira (2006), o desenvolvimento do futebol nos quatro continentes
está relacionado às diferenças culturais que para ele:
[...] determinam variantes na formação dos esportistas nas várias partes do
mundo. Enquanto a miscigenação racial predomina em nosso meio e permite
que apresentemos uma característica toda particular em várias expressões
artísticas, como música, dança e futebol, do outro lado do Atlântico
encontramos sociedades muito mais rígidas e organizadas que determinam
um outro tipo de comportamento (OLIVEIRA, 2006, s/p).
Não é por acaso que o futebol é o esporte mais popular do mundo. Pode-se observar
que ele está espalhado pelos quatro continentes e em que pesem os contrastes político-sociais
que abrangem estas sociedades, o futebol se coloca como algo acima de qualquer ideologia ou
sistema político. Trata-se, como alguns especialistas afirmam, de um esporte coletivo,
multidisciplinar, socializante e agonístico por excelência, que auxilia na maturação do caráter
e da personalidade dos seus praticantes. Todos os grandes atletas passaram por várias fases de
aprendizado, aperfeiçoando a técnica natural e assim puderam se tornar craques.
Quem convive com o futebol no dia-a-dia sabe que para dominá-lo tem que ser um
eterno aprendiz. Quem convive no dia-a-dia das escolinhas sabe que no futebol se estar
sempre aprendendo coisas novas, seja uma tática, uma nova técnica, ou um novo recurso que
acaba sendo incorporado e utilizado de forma a melhorar a postura, a disciplina e outros
aspectos que fazem a diferença num puramente coletivo.
34
Daí a importância da afirmação de Oliveira (2006), que uma escola de futebol deve se
fundamentar em uma filosofia prática, nos conceitos de pedagogia2 e da agonística3, através
da didática orientada pelos sistemas cíclicos (em que a matéria do curso é vista pelo aluno de
uma forma genérica e repetitiva, permitindo que os conhecimentos a qualquer momento
estejam sendo estimulados) e evolutivos de formação e educação moral, social e esportiva do
jovem atleta.
Sendo assim, a prática do futebol deve ser vista como agente que concorre com o
processo educacional não-formal, que se evidencia, com mais ênfase, no que se refere à
percepção das relações sociais por parte dos seus praticantes: o respeito às normas, o trabalho
em equipe, e a importância da dedicação individual, entre outros valores (BIELINSKI, s/d. p.
6).
Uma prova da veracidade do que afirmam Oliveira e Bielinski, acima, pode ser
observada na própria mudança de comportamento dos atletas adultos da atualidade, que
visivelmente se preocupam bem mais com a sua formação moral e social e o respeito às
normas, além de outros valores que, inclusive, são uma própria exigência dos médios e
grandes clubes do mundo inteiro para contratá-los.
Entre os que trabalham diariamente nas escolinhas, essa é uma prática comum, pois
visa atender as próprias demandas da sociedade, em especial dos clubes de futebol, que
exigem atletas disciplinados, cumpridores de suas obrigações, conscientes de seu papel e de
sua condição de agente multiplicador de bom comportamento e, acima de tudo, exemplo de
cidadão para as outras gerações.
Por isso, Oliveira (2006) defende que a formação deve ser orientada por um currículo
em que constem todos os elementos fundamentais e indispensáveis à prática do futebol, além
de palestras sobre higiene, primeiros socorros, civismo, ética desportiva e muitos outros
assuntos que poderão ser explorados em benefício do indivíduo-cidadão. É preciso
2
A Pedagogia é a ciência ou disciplina cujo objetivo é a reflexão, ordenação, a sistematização e a crítica do
processo educativo (Wikipedia, 2008).
3
O caráter agonístico presente nas realizações atléticas imprime ainda maior dramaticidade e plasticidade ao
espetáculo esportivo, embora no princípio a agonística fosse como um prolongamento das lutas dos heróis nos
campos de batalha, uma vez que também no agón os que disputam fazem uso de vários artifícios bélicos, e,
dependendo da contenda, expõem-se à morte, ainda que em tese a agonística não tenha por objetivo eliminar
fisicamente o adversário (RUBIO, K, 2008).
35
fundamentar os treinamentos em métodos científicos de preparação física, técnica, tática,
psicológica, orientados por um plano diário de trabalho, controlados e avaliados por meio de
elementos individuais e coletivos e dosagem de trabalho pelo gráfico de esforço, tudo visando
o bom rendimento dos instrumentos na pretensiosa aplicação desse trabalho.
Sendo assim, no trabalho de formação do atleta, vários são os objetivos que deverão
ser atingidos. Especificamente no futebol, citamos aqueles que consideramos de maior
importância, tendo em vista a atual estrutura do esporte, praticado empiricamente pela maioria
dos iniciantes e simpatizantes. A doutrinação amadora, um dos principais objetivos do esporte,
deve ser feita desde o primeiro contato do jovem com o futebol. Ele deve ser conscientizado
de que este, como qualquer outro esporte praticado sob uma orientação capacitada e honesta,
só lhe trará benefícios físicos, morais e espirituais por longos anos de sua vida.
Para Oliveira (2006), o futebol é antes de tudo um esporte amador e como tal deve ser
praticado. A transformação em profissão deve vir com naturalidade, e:
Jamais o atleta deverá abandonar seus estudos ou sua formação em outro
ramo profissional pela ilusão do futebol como um meio de vida. Pode-se
propor desenvolver todas as qualidades para um bom desempenho na prática
e elevar o nível técnico de todos os alunos, mas jamais se deve afirmar que
se tornarão atletas profissionais. Alguns se destacarão e se aproximarão
dessa realidade. Nesse caso poderão ser encaminhados para estruturas mais
desenvolvidas e adequadas para que dêem seus últimos passos em direção a
esse objetivo. Acompanhar com proximidade a evolução técnica e tática e
estimular a filosofia coletiva do nosso futuro futebolista o dotarão de um
harmonioso desenvolvimento psicossomático. (OLIVEIRA, 2006, s/p).
Além destes aspectos, há também que se discutir sobre a problemática da disciplina,
que tanto tem preocupado pais e educadores em todo país.
2.4 Um olhar sobre a indisciplina na formação do atleta do futuro
Antes de tratarmos da indisciplina, achamos necessário pesquisar sobre o significado
da palavra disciplina, que é o oposto da primeira. Em sua etimologia disciplina significa
"educar", "instruir", "aplicar" e "fundamentar princípios morais". Segundo Foucault, a
disciplina estende-se a sociedade como um todo, distinguindo-se das formas tradicionais de
dominação por não se utilizar da repressão brutal, nem de castigos espetaculares. Em outras
36
palavras, não exige dos indivíduos formas externas de obediência, serviços nem tarefas
penosas, ela se dá através de um controle minucioso dos gestos, dos trajetos e do emprego do
tempo.
Na visão de Foucault (1977), a disciplina tem uma função política, pois permite
controlar importantes massas humanas, graças à organização na qual estão circunscritas. A
organização da escola e da disciplina escolar são também exemplos de ajuda a esse modelo.
Porém, Foucault (1977, p. 153) destaca que “O sucesso do poder disciplinar se deve sem
dúvida ao uso de instrumentos simples: o olhar hierárquico, a sanção normalizadora e sua
combinação num procedimento que lhe é específico, o exame”.
Embora não se possa negar o uso dos instrumentos acima citados, em relação à função
a qual se refere Foucault não parece ser essa a metodologia aplicada às escolinhas com as
quais lidamos no dia-a-dia, já que no nosso entendimento, não existe uma função política, mas
sim de aconselhamento sobre comportamentos ideais ou excedentes por parte dos atletas, que
são requisitos para que estes adquiram uma conduta ideal - que é uma exigência atual de
muitos clubes espalhados pelo mundo - para todos que desejem vestir suas camisas.
Em outras palavras, no caso das escolinhas a que estamos vinculados não existe a
pretensão de querer levar os atletas, por meio da disciplina, a qualquer tipo de dominação e/ou
manipulação de qualquer natureza. E não havendo essa pretensão de se querer manipular
politicamente os jovens, não se pode dizer que o uso da disciplina nas escolinhas tenha uma
função política.
Partindo da compreensão do significado de indisciplina, que é a "desobediência", a
"confusão" ou "negação da ordem", podemos dizer então que esta é produto da falta de
disciplina. Sendo assim, parece óbvio que onde não se tem disciplina há uma tendência de
reinar a confusão, a desobediência às normas, a indisciplina.
Mas como nós devemos analisar a questão da indisciplina na atualidade? Inicialmente
devemos destacar que a problemática da indisciplina não está restrita apenas às salas de aula,
mas a todo o conjunto da sociedade que está relacionado à obediência a padrão de
convivência e hierarquia que tem como objetivo manter as pessoas atuando e agindo dentro de
uma ordem social previamente estabelecida.
37
Dentro de uma organização social, a disciplina é usada de diversas formas para manter
o controle das atividades, a obediência e o respeito à hierarquia pré-determinada. Um dos
problemas mais graves decorrentes das questões disciplinares dentro de instituição escolar é
indiscutivelmente a violência escolar que no nosso entender é reflexo dos problemas
enfrentados pelas pessoas no seu cotidiano dentro das sociedades.
Tornou-se algo “normal”, corriqueiro, hoje em dia, ligarmos o rádio ou televisão,
abrirmos um jornal ou uma revista e nos dar de cara com a violência explícita. Os próprios
meios de comunicação que, pelo menos a princípio, têm o dever de manter a população
informada – o que se supõe incluir aí também notícias agradáveis, amenas, construtivas até acabaram por desenvolver uma “cultura da desgraça alheia”. “Notícia boa não vende”, parece
ser uma regra disseminada entre todos, a tal ponto que desrespeitam a integridade moral e
física das pessoas e chegam ao absurdo de criar programas que têm como prioridade trazer
para dentro de nossas casas as barbaridades do ser humano –, ou seja, já que brigam, xingamse, batem-se, expõem-se em suas formas mais vis em todo canto de rua, e de graça, por que
não fazer isso na televisão, em horário nobre, à frente de milhões de telespectadores,
arriscando-se a ficar famoso(a) e a ganhar um punhado de reais? É a total e completa
banalização da violência.
Diante desse quadro, é possível afirmar que os professores não se sentem confortáveis
em defender em suas aulas a justiça, a eqüidade, o respeito e a dignidade humana, se seus
alunos vivem em um contexto social contraditório, pois são bombardeados com informações
que mostram que a corrupção, o tráfico de influências e a impunidade são banais,
notadamente, quando se referem aos denominados “crimes do colarinho branco”.
Podemos até tentar explicar dizendo que violência sempre existiu, é da natureza
humana. Quem é adepto da Teoria da Evolução das Espécies4 há de encontrar, pesquisando,
exemplos “magníficos” de violência do homem contra o homem ainda na pré-história.
Por outro lado, podemos tentar explicar, também, alegando à explosão demográfica, e
êxodo rural, o inchamento das cidades, as desigualdades sociais, a má distribuição de renda, o
4
A teoria da evolução, também chamada evolucionismo, afirma que as espécies animais e vegetais, existentes na
Terra, não são imutáveis.
38
desemprego. Afinal, em maior ou menor grau, esses e muitos outros aspectos são fatores que
contribuem para a violência, explicando e até, muitas vezes, justificando-a e como desencargo
de consciência, culpamos a sociedade. “É a sociedade!”, dizemos nós, mas não como uma
forma de culparmos a todos nós, ou responsabilizarmos a todos nós por uma solução; é muito
mais uma tentativa alienada de nos escondermos atrás de algo impessoal. É quase como se
disséssemos: a minha parte eu faço: eu guardo o meu ouro, eu tranco a minha casa, o meu
carro tem alarme, a minha rua tem vigia e dez mil cães a nos proteger, e eu ainda dou esmolas.
O resto é com o governo. Ele que faça mais cadeias, que aprove a pena de morte etc.
O nosso cinismo é tanto que chegamos ao ponto de ficar aliviados quando a televisão
nos mostra o “tipico bandidão”: cabelos desgrenhados, olhos vermelhos, barba por fazer,
negro, feio. É o famoso “cara de bandido”. Porém, quando o “bandidão” que entra pela nossa
casa a dentro – através da televisão ou pessoalmente – não passa de uma criança, um menino
de 12, 14 anos. E quando este menino é filho de um deputado ou juiz?
Isso tem acontecido com uma freqüência espantosa, ultimamente, tanto nas ruas como
nas escolas. São meninos espancando meninos, meninos esfaqueando meninos, meninos
baleando meninos; meninos sendo assassinados por seus próprios colegas, pelos motivos mais
fúteis. E os professores não estão livres deste terror.
Excluindo as drogas, sobre as quais tratamos num capítulo do livro Futebol Também
se Aprende na Escola, publicado em 2004, pela Edições CFT, acreditamos que as maiores
violências sofridas pela escola e pelos seus integrantes são as internas, advindas, na sua
grande maioria, do seu próprio corpo discente. São os alunos os principais promoventes de
danos físicos e materiais na escola: carteiras são quebradas, paredes são pichadas, banheiros
são depredados, meninos são feridos etc.
E o que fazer diante desse vandalismo inaceitável? Vamos impor mais leis, punições
mais rígidas, reprimir mais duramente, procurando adiar uma solução que se faz mais do que
urgente com medidas apenas paliativas que, no final, servem somente para agravar ainda mais
o problema? Ou vamos, de fato, tentar agir, compreender, envolvendo todos os segmentos e
interessados – a sociedade, em suma – a fim de construir uma solução paliativa e duradoura?
A violência, assim como o respeito às normas, tem uma dimensão individual e outra social
que se intercruzam e devem ser consideradas. Para Foucault (1977, p. 52):
39
[...] a disciplina deve ser fundada na idéia de direito, e não no poder das
normas. Mas isso depende dos próprios pedagogos. Depende da filosofia em
que se inspira sua prática, da concepção de Estado e de educação sobre a
qual se baseia sua prática. Daí, o interesse de uma filosofia crítica das
ciências e das técnicas pedagógicas, que permita destacar os pontos de vista
dos quais elas provêm e o uso que delas se faz.
Tão importante quanto discutir as raízes históricas da problemática da relação entre
disciplina e indisciplina na escola brasileira, é preciso compreender como se funda o respeito
às regras do desenvolvimento de cada indivíduo. A construção do respeito a tais regras
representa uma possibilidade de explicação dos motivos que levam crianças e adolescentes a
desrespeitarem levianamente as normas de convívio social e “optarem” pela indisciplina,
lembrando que isso pode perfeitamente desembocar no surgimento da violência.
A questão básica que se discute em âmbito acadêmico principalmente é sobre quais os
limites a ser impostos aos alunos e qual o papel da escola nessa relação. Imaginemos uma
sociedade na qual cada pessoa agisse como bem lhe conviesse, ou seja, uma sociedade sem
leis que regulamentassem a convivência mútua. Nessa sociedade, haveria sinais de trânsito,
mas somente os respeitaria quem quisesse; haveria impostos, mas somente os pagaria quem
sentisse vontade; haveria médicos, professores, motoristas, agricultores, ou seja, todo tipo de
profissional, mas somente trabalhariam quando bem entendessem; haveria até mesmo um
governo, representantes do povo, mas somente agiria como tal a seu bel-prazer.
Uma sociedade como a demonstrada acima assim não sobreviveria, o caos a destruiria
em pouco tempo. Dessa forma, compreendemos que para uma sociedade existir, desenvolverse, sobreviver, é necessário haver comportamentos determinados, normas, leis que a
organizem e às quais todos estejam sujeitos. Nesse caso, quem foge à regra incorre em
desobediência, em indisciplina.
Dessa forma, constata-se que as regras são criadas para regularem a vida em sociedade
e não permitirem que tudo vire uma anarquia como no exemplo mostrado acima. Em outras
palavras, as regras, normas e leis existem para fazer com que a sociedade funcione de modo
que todos possam usufruir dos bens construídos pelo próprio homem.
40
Embora ratificando o não uso da disciplina como função política, entendemos que fazse necessária a abordagem da disciplina na perspectiva das relações sociais, considerada por
Foucault (1977) como fundamental nas relações de poder e de resistência.
Diante desta visão, talvez esteja a explicação sobre a falta de bons resultados dos
castigos aplicados repetidamente nos mesmos alunos, e às vezes, pelo mesmo professor,
durante um, dois, três anos escolares. Por isso, para Foucault o poder da disciplina está na sua
função maior de adestrar, que não é o nosso caso no trabalho com as escolinhas. A afirmação
que a disciplina fabrica indivíduos pode ser correta, mas que tipo de indivíduo ele fabrica?
Essa é questão que deve ser reparada, tendo em vista que nas escolinhas que coordenamos nós
não pensamos em fabricar a disciplina, mas tratá-la de forma que os atletas possam dela tirar
proveito para sua formação no futebol e na vida.
Se para Foucault (1977), na essência de todos os sistemas disciplinares funciona
sempre um mecanismo penal, no caso das escolinhas, essa função de penalizar fica em
segundo plano, pois o que se procura é orientar o aluno para que possa escolher entre manter
o bom comportamento e obter sucesso na profissão, ou agir de forma contrária e perder a
oportunidade de poder realizar seu sonho.
Esse mecanismo funciona como um repressor, através de toda uma micropenalidade
do tempo (atrasos, ausências, interrupção de tarefas), da atividade (desatenção, etc.), da
maneira de ser (grosseria), dos discursos (tagarelice), do corpo e da sexualidade. A título de
punição são utilizados processos sutis que vão do castigo físico leve a ligeiras e pequenas
humilhações.
Para Foucault (1977), a punição é tudo aquilo que é capaz de fazer as crianças
sentirem a falta que cometeram, de humilhá-las e de confundi-las. Os castigos físicos, para
ele, têm a função de reduzir os desvios, sendo essencialmente atos corretivos que visam
sempre à restauração da ordem.
Contudo, a maneira como se faz esta restauração depende da estratégia de poder
dominante em uma determinada época. Foucault chama de poder disciplinar a estratégia
predominante de poder da modernidade. Na modernidade, o poder disciplinar é caracterizado
pela não corporeidade da pena.
41
Na modernidade, o corpo não é mais castigado publicamente de forma direta. Como a
liberdade é o seu valor máximo, retirá-la tornou-se a punição mais utilizada e isso não se pode
negar. No entanto, é preciso levar em conta que nem todas as instituições estão obrigadas a
utilizar esse tipo de punição, ainda que ela seja imposta pelas relações de poder, o que nos
leva afirmar que dependendo do tipo de comportamento expressado pelo indivíduo, ela pode
ou não ser utilizada.
Na escola, a palmatória foi substituída por castigos que limitam os movimentos e
impedem a comunicação com os outros. O objeto da punição é o da reeducação do indivíduo.
É por isso que a disciplina traz consigo uma maneira específica de punir e sua especificidade
está em produzir docilidade e eficiência, servindo-se da domesticação e moralização. A se
admitir essa afirmação, parece que estamos negando os novos paradigmas que regem a
sociedade atual em construção que coloca como elemento principal o diálogo para resolução
dos problemas, dos menores aos mais graves.
Se ainda hoje se constata que os castigos continuam sendo incentivados e aplicados
nas escolas, e os diretores, supervisores, professores e alunos se mostram convencidos de que
“o castigo é bom porque faz aprender”, é porque o conceito de educação que os orienta
impõe-se na sociedade atual. Porém, deve-se observar que há, nas últimas décadas, uma forte
orientação dos Parâmetros Curriculares Nacionais e outras novas, de se buscar o diálogo e
banir de uma vez por todas o castigo das escolas.
A razão para a orientação acima, pode estar no fato de que quanto mais rígida e severa
for a construção dos pilares da disciplina, na infância e durante a formação escolar, tanto
maior será a exigência com relação a mesma e maiores as dificuldades em adequar as ações
disciplinares ao momento em que a criança vive. Nesse sentido, mais do que esperar a
transformação das famílias ou de lamentar a falta de limites nos dias atuais, é necessário que o
professor faça uma análise dos fatores responsáveis pela indisciplina na escola.
Por isso, é nessa linha que o estudo da disciplina e do disciplinamento escolar, a partir
dos habitus, pode ser considerado uma alternativa interessante, porque pode contribuir para
uma redefinição dos conceitos e representações que o professor possui sobre essa questão.
Certamente, a partir dessa visão, suas apreciações e percepções sobre a disciplina e o
disciplinamento poderão ser mais adequadas ao momento atual e às crianças, principalmente,
42
que precisam aprender que a ordem, o respeito, a responsabilidade, a cooperação são valores
inerentes à disciplina.
No ambiente escolar, a prática pedagógica dos professores deve dar condições para
que as crianças interiorizem esses valores, não devido ao receio de ameaças e punições, mas
através de ações que lhes possibilitem discutir e entender que as regras que fazem parte da
nossa cultura são importantes quando se pensa numa sociedade mais justa e solidária.
Além da brincadeira e de outras formas de entretenimento que a escola atual vem
utilizando como recurso pedagógico, a prática esportiva paralela ao ensino regular é outra
atividade que tem ganhado destaque no apoio a atividade docente.
As escolinhas de futebol, dentro e fora do ambiente escolar, têm dado uma
contribuição muito salutar ao ensino e ao futuro de muitos jovens carentes moradores, na sua
maioria, da periferia das grandes e médias cidades brasileiras. Essa constatação não é à toa,
pois segundo Scaglia apud Araújo e Didonê (2006, s/p), “A escola foi a primeira instituição a
perceber que o futebol tem uma ordem e uma disciplina peculiares. Por isso, sua prática
contribui para a formação do cidadão".
O jogo serve de justificativa para muitas situações que ocorrem no dia-a-dia do ser
humano, e segundo Florezano apud Araújo e Didonê (2006, s/p) a ética, tema transversal
importantíssimo, é o tópico mais apropriado a ser discutido. Segundo este autor, basta lembrar
que o primeiro passo é acatar as regras. Craques como Ronaldinho Gaúcho, Kaká, Ronaldo e
Robinho somam o talento pessoal e a dedicação a uma postura de companheirismo com
relação aos outros membros de equipe, sem jamais humilhar ou agredir os adversários. Os
atletas também devotam enorme respeito aos técnicos, tanto que costumam chamá-los de
professor!
Nos estádios, por outro lado, têm aflorado traços nada nobres do comportamento
humano, como o racismo e a xenofobia (nas arquibancadas da Europa, torcedores já foram
flagrados imitando sons de macacos e fazendo saudações fascistas, entre outras barbaridades).
Nesse sentido, Streapco apud Araújo e Didonê (2006), observa que é saudável
ressaltar em sala de aula a importância e o talento de atletas negros, como Leônidas da Silva,
43
o Diamante Negro; Didi, o inventor da folha-seca; Garrincha, o Anjo das Pernas Tortas; e
Pelé, eleito atleta do século XX e aclamado por todos como simplesmente o Rei.
Nas últimas décadas, diversas áreas do conhecimento desenvolveram estudos para
esquadrinhar a paixão do brasileiro por futebol e desvendar como ele ajuda a explicar nossa
identidade como nação.
No Brasil, grande parte desses jovens sonha em ser jogador de futebol e ganhar o
mundo para, através dele, mudarem a sua história de vida e de sua família muitas vezes
sofrida. Nesse sentido, o papel das escolinhas de futebol tem sido de grande contribuição, pois
no momento em que, esta associa a prática futebolística (principal alvo para realização do
sonho de muitos jovens), à sua dedicação e a sua boa participação nas atividades da escola,
ela está fazendo com que estes jovens tenham o estudo como uma das ferramentas necessárias
para o seu sucesso futuro, seja como atleta de futebol ou um profissional de outra área, já que
com o estudo ele terá uma chance a mais em relação à carreira de jogador de futebol que,
como nós sabemos, que é muita curta.
Para isso, concordamos com Foucault (1977) quando ele afirma que o que importa é
estabelecer as presenças e as ausências, saber onde e como encontrar os indivíduos, instaurar
as comunicações úteis, interromper as outras, pode a cada instante vigiar o comportamento de
cada um, apreciá-lo, sancioná-lo, mediar as qualidades ou os méritos. Com base nessa
afirmação, entendemos que a escolinha de futebol é um dos espaços em que nós, enquanto
professores, podemos fazer isso sem necessariamente o aluno/atleta estar preso às paredes da
escola. Além disso, outra grande vantagem que a escolinha de futebol pode dar no apoio a
atividade escolar, é o fato de poder oferecer a criança uma disciplina a céu aberto, tendo em
vista que muitas delas utilizam campos de várzea para suas atividades, diferentemente das
escolas tradicionais que se utilizam de um ambiente fechado e, teoricamente, mais rígido no
sentido disciplinar.
Tal constatação nos leva a refletir, que quando o aluno/atleta está em contato com a
natureza, tem a liberdade e se sente livre das paredes que cercam muitas instituições de ensino,
eles tendem a ter um melhor desempenho e se comportarem de maneira mais disciplinada, ao
ponto até de procurarem exercer outras atividades, como a estudantil, sem transformar isso
num transtorno ou algo descartável, como ainda ocorre nos dias atuais. Isso porque, mais do
44
que nunca o jovem sabe que estudar e ser um aluno exemplar são condições básicas que boa
parte das escolinhas de futebol exige para que estes participem de seus quadros.
Em outro sentido e como já foi dito antes, a carreira de jogador de futebol é muito
curta, e o mercado de trabalho como em qualquer outra profissão está cada vez mais
competitivo devido à revelação de muitos talentos precoces, no Brasil, que são exportados
para o futebol europeu. Por estas razões, a formação técnica do profissional é um elemento
valorizado pelos clubes e pelos próprios profissionais.
Aliado a isso, há a necessidade de incorporação de uma disciplina que possa extrapolar
a formação meramente técnica do jogador de futebol, torna-se evidente. Isso ocorre porque se
sabe que um jogador com conduta reprovável durante os treinamentos e na sua relação com a
sociedade acaba por tornar-se um exemplo negativo prejudicando sua própria imagem, a do
clube, patrocinadores etc. Conseqüentemente esse jogador não terá mais espaço no mercado,
seu passe será desvalorizado, este fica estigmatizado e acaba ficando à margem.
Um exemplo disso pode ser dado no trabalho que se desenvolve hoje nos grandes
clubes que tem buscado dar contar dessa demanda, isto é, procurando dar suporte ao atleta
desde a sua formação nas categorias de base até a categoria profissional, no que se refere tanto
a dimensão técnica quanto cidadã. Normalmente, através do trabalho de uma equipe
interdisciplinar, busca-se contribuir para que o jogador seja um atleta consciente de seus atos,
de seus direitos e deveres, de sua função para e com a sociedade.
Nesse sentido, entendemos que se faz necessário uma prática interventiva e libertadora
durante o processo de formação do jogador. Esse processo deve-se iniciar nas categorias de
base e potencializar-se na categoria profissional para que o jogador passe de uma atitude
limitada pelos padrões de rigidez para atitudes mais conscientes principalmente do seu papel
na sociedade e no exercício de sua cidadania. Por esse motivo, é importante que seja
trabalhada durante esse processo a formação de um profissional cidadão.
Diante disso, os clubes de futebol têm uma função muito importante sobre as questões
de poder, controle e formação de seus jogadores que, por outro lado, são formadores de
opinião e influenciam centenas de jovens que acabam se tornando seus ídolos. Sendo assim, o
45
conceito de formação e sua abrangência saem da visão micro – (sujeito), para uma visão
macro que abrangem as relações do sujeito com a sociedade.
Nessa perspectiva, a formação designa as qualidades sociais que a escola e outros
modos de socialização dominantes, na sociedade industrial, instauram em seus indivíduos, ao
mesmo tempo que desenvolvem competências específicas.
Diante disso, fica evidente que todo o processo de formação, na atualidade, precisa
considerar a disciplina e a dimensão da cidadania, principalmente porque o processo de
formação é constante e permanente assim como o exercício da cidadania deve ser contínuo.
Assim, podemos entender a formação, em sua amplitude, como um instrumento capaz
de transformar a sociedade e também como um processo de democratização das relações
sociais de trabalho e, conseqüentemente na sociedade, na medida em que os sujeitos em
formação vão exercendo sua cidadania. Entendendo-se por exercício da cidadania ter direitos
civis, políticos e sociais, coisa que, nos últimos anos, tem sido bastante discutida no âmbito
político e em instituições como a escola e outras entidades.
46
CAPÍTULO 3 – A IMPORTÂNCIA DAS ESCOLINHAS DE FUTEBOL NA VISÃO
DE ATLETAS E EX-ATLETAS DE CAMPINA GRANDE – PB
Os depoimentos de 20 atletas e ex-atletas de futebol profissional que passaram por
algumas escolinhas de futebol de Campina Grande, foram de fundamental importância para
ratificar vários aspectos relatados no decorrer do Referencial Teórico, contribuindo, assim,
para a realização de uma análise mais detalhada acerca da importância das escolinhas na
formação dos jovens atletas aprendizes do futebol.
A primeira questão analisada, representada respectivamente pelos gráficos 1 e 2, teve
como item abordado à idade dos atletas, e os clubes em que atuaram ou atuam com respectivo
País de origem.
Como se verá a seguir, a maior parte dos alunos das escolinhas tem idade entre 15 e 25
anos, e a maioria deles atuam em equipes do futebol brasileiro. Sobre isso, cabe ressaltar que
o contato com os atletas e ex-atletas de futebol participantes da pesquisa foi realizado através
de telefone, por e-mail e/ou pessoalmente.
Gráfico 1 – Idade dos atletas entrevistados
10%
40%
Fonte: Elaboração própria
50%
15 a 25a
26 a 35a
36 a 40a
47
Para se ter uma idéia da faixa etária de idade dos atletas e a origem do clube em que
atuaram ou atuam atualmente, inicialmente o gráfico 01 mostra que dos 20 entrevistados, 10
ou 50% têm idade entre 15 a 25 anos de idade, 08 ou 40% têm de 26 a 35 anos, e apenas 02
ou 10% estão na faixa etária entre 36 a 40 anos.
Dentre os ex-atletas entrevistados que passaram pelas escolinhas e conseguiram se
destacar no futebol nacional e internacional, estão Suélio Lacerda, atualmente técnico de
futebol, Celso Fio que atuou durante muitos anos na Suiça, além de Glauber Gomes,
Marcelinho Paraíba e Fábio Bilica ainda em atuação por equipes do Brasil e da Europa.
Figura 1 - Suélio Lacerda bicampeão pelo São Paulo Futebol Clube
Fonte: Arquivo próprio.
Suélio Lacerda, 40 anos de idade, atualmente técnico de futebol, iniciou sua carreira
esportiva em nossas escolinhas, saindo depois para atuar em equipes como o Campinense
Clube – PB, Matsubara – PR, Puebla – México, Ponte Preta – SP, Botafogo – RJ, Bahia – BA,
tendo conseguido grande destaque a ponto de ser contratado para o São Paulo, onde acabou se
sagrando bicampeão do Mundo, em 1993.
48
Como produto das escolinhas locais, na década de 90, Suélio atuou no meio-de-campo
do São Paulo ao lado de estrelas com Raí, Muller, Macedo, Elivelton, Cafu, Antonio Carlos
entre outros. Na época, ele foi comandado pelo técnico Telê Santana e, em 1991, conquistou
dois títulos: o Campeonato Paulista e o Brasileiro. Porém, o maior de todos os títulos foi o de
campeão do mundo pelo São Paulo, em Tóquio, Japão.
Figura 2 - Celso Fio jogando na Suíça
Fonte: Arquivo próprio.
Celso Fio foi outro atleta que se destacou no cenário internacional. Tendo iniciado sua
carreira nas nossas escolinhas, este atleta atuou em diversos clubes do Brasil e da Europa,
mais precisamente da Suíça, onde acabou se naturalizando.
Na suíça Fio, como era mais conhecido, jogou por quase uma década por clubes como
o Sion, o Etóile-Carouge e o Cervete, onde foi campeão por várias vezes, encerrando sua
carreira no ano de 1994.
49
Figura 3 - Marcelinho Paraíba no Flamengo
Fonte: Arquivo próprio.
Seguindo os passos de Suélio e Celso Fio, outro que goza de grande destaque no
futebol nacional é o atleta Marcelinho Paraíba, atualmente jogando no Clube de Regatas
Flamengo. Também revelado pelas escolinhas de base, esse atleta foi mais longe chegando a
vestir a camisa da Seleção Brasileira, o que foi motivo de muito orgulho para os paraibanos,
que depois de Mazinho, ex-lateral esquerdo que defendeu a Seleção nas copas de 88 e 92, não
via um atleta local defender o selecionado nacional.
Jogando no circuito internacional, mais especificamente por equipes do futebol alemão,
Marcelinho conseguiu a consagração que muitos atletas que freqüentam as escolinhas desejam.
Consagração essa que acabou lhe rendendo até um convite para participar de um filme
realizado pela cineasta carioca Ana Azevedo, que em fevereiro de 2005, foi selecionada para
50
participar do “Talent Campus Festival de Berlim”, optando por rodar um filme sobre o futebol
com o qual concorreria às premiações do certame em 2006.
Declaradamente amante do futebol, Segundo o Jornal A Palavra (2005), Ana Azevedo
passou a pesquisar sobre a prática desse esporte na capital alemã e para sua grata surpresa,
logo percebeu que seria impossível dissociar a figura de Marcelinho Paraíba do futebol jogado
na Alemanha.
Recentemente, através de uma negociação feita com o seu ex-clube, o Wolfsburg,
Marcelinho Paraíba retornou ao Brasil, desta feita para defender as cores do Clube de Regatas
Flamengo, considerado um dos clubes mais tradicionais do País, onde vem se destacando
como um dos seus principais jogadores.
Além de Marcelinho Paraíba, outro que também é fruto das escolinhas de futebol
locais e que conseguiu se destacar no cenário nacional e ainda atua no futebol internacional é
o atleta Fabio Bilica (Figura 4).
51
Figura 4 - Fábio Bílica na seleção brasileira
Fonte: Arquivo próprio.
Depois de passar por diversas escolinhas de futebol, em Campina Grande – PB, o
atleta seguiu para a Bahia, onde foi revelado para o mundo pelo Esporte Clube Vitória. Do
Vitória, Bílica, como é mais conhecido, foi negociado para o Venezia, da Itália, onde
conseguiu grande destaque, sendo por isso convocado para a Seleção Brasileira, onde atuou
na Copa do Mundo de Sidney, nos Estados Unidos.
Depois de atuar por equipes da Romênia e França, Bilica atualmente está jogando no
futebol turco. No entanto, informações veiculadas pela mídia nacional dão conta de que Bilica
vem sendo pretendido por alguns clubes do Brasil, o que poderá trazê-lo de volta para atuar
no País.
52
Assim como os atletas apontados acima, outros que estão em evidência na atualidade
jogando pelo Brasil afora e/ou no exterior, são: Túlio Show, do Botafogo – RJ; Glauber
Gomes, do Desportivo Santa Clara de Portugal; Givanildo Hulk, considerado atualmente a
maior estrela do futebol japonês, sendo inclusive pretendido, já há algum tempo, pelo São
Paulo Futebol Clube; Raniere, que atua pelo futebol espanhol e já defendeu as cores do Treze
Futebol Clube, de Campina Grande; Luciano Paraíba, que já atuou em Cingapura e
atualmente joga pelo Campinense Clube.
Gráfico 2 - Origem dos clubes em que os atletas atuam
30%
Europa e Ásia
Brasil
70%
Fonte: Elaboração própria.
O gráfico 02 revela que dos 20 atletas consultados, 14 ou 70% atuaram ou atuam em
clubes brasileiros. Enquanto 06 ou 30% jogam atualmente em clubes do continente Europeu e
Asiático.
Os resultados revelam vários aspectos observados no âmbito das escolinhas que fazem
parte do trabalho sócioeducacional que vem sendo realizado pelo autor desse estudo, há trinta
anos, em Campina Grande e cidades circunvizinhas, das quais muitos dos atletas que
participaram da entrevista já vivenciaram algumas experiências aqui mencionadas, quando de
lá saíram para ganhar o mundo.
53
Um destes aspectos refere-se à contribuição que as escolinhas oferecem à preparação e
conscientização dos jovens atletas, no sentido de fazerem com que eles possam conquistar o
espaço tão desejado no futebol, procurando se manterem alertas quantos aos desafios que irão
encontrar em sua vida pessoal e profissional, principalmente com relação às drogas, o álcool e
outros vícios, além da falta de disciplina e da violência que têm comprometido a carreira de
muitos atletas pelo mundo afora. Contribuição essa, oriunda da orientação sócioeducacional e
psicológica que os alunos iniciantes na prática futebolística desfrutam nas escolinhas, como
mostra a figura 5.
Figura 5 - Orientação sobre comportamento dos atletas dentro e fora de campo
Fonte: Arquivo próprio.
Uma das críticas que mais se ouve, hoje em dia, é em relação à precocidade com que
os jogadores brasileiros andam deixando o País para jogar em clubes pelo mundo afora. Sobre
isso, especialistas e técnicos de futebol, a exemplo de Vanderley Luxemburgo, atualmente
treinador da Sociedade Desportiva Palmeiras, afirmam que o surgimento de craques no
futebol brasileiro tem se tornado algo cada vez mais raro, devido ao êxodo precoce verificado
nos últimos anos. Tal afirmação de Luxemburgo reflete no que afirmou Perón (2006, s/p),
que não existia à época nenhum grande craque atuando no Brasil, fato que se confirma
atualmente.
54
A grande preocupação de todos que militam no futebol é que estamos revelando e
vendendo muitos jogadores (alguns de qualidade duvidosa), mas a maioria de boa qualidade
técnica que vai cedo para a Europa.
Esta é uma das razões que muitos especialistas apontam para que o aparecimento de
craque mesmo esteja ficando cada vez mais raro. Se pararmos para pensar, desde a conquista
da Copa 2002, só Robinho foi revelado craque realmente. Enquanto desde o início deste
século, apenas Kaká faz parte da lista.
O reflexo dessa falta de revelação no futebol brasileiro está na Seleção Brasileira.
Pode não parecer, mas sem muitas opções, Parreira teve de usar Cafu e Roberto Carlos, que já
têm mais de dez anos como titulares absolutos da Seleção que disputou a Copa de 2006.
Segundo Perón (2006, p. 1):
A situação atual pode ser comparada com o início do declínio do futebol
uruguaio. Bicampeão da Copa do Mundo, o país teve no final da década de
1970 e início 1980 um êxodo monstruosos de jogadores, que começaram a
sair do país cada vez mais jovens, e o futebol do Uruguai deixou de ser uma
potência, para ser uma seleção que luta para conseguir vagas em Mundiais
de futebol. É lógico que nossa população é quase 60 vezes maior que a do
país vizinho e a nossa extensão territorial é infinitamente maior, mas o
exemplo uruguaio deve servir de alerta ao nosso futebol.
Perón (2006) aponta vários motivos para a falta da formação de craques no nosso
futebol. A primeira razão está na exportação cada vez mais cedo dos nossos jogadores para o
exterior, o que representa um perigo muito grande para a carreira destes, pois a maioria dos
jovens que vão para o Velho Continente cedo fracassa não por não jogar futebol, mas sim por
não ter experiência ou maturidade para viver longe do Brasil.
Apesar dessa constatação, sabe-se que não há estimativa de quantos atletas o Brasil
vem perdendo e vai continuar a perder nesta situação. Sem deixar de citar os que são
enganados por empresários e são obrigados a viver em situação precária na Europa, sendo na
volta obrigados a parar de jogar.
Em relação a isso, Perón (2006) cita o caso de Nilmar, revelado pelo Internacional do
Rio Grande do Sul. “Ele é o típico jogador que tem potencial, mas foi muito cedo para a
55
Europa. Se não fosse o retorno ao Corinthians, sua carreira sofreria, após o seu mau
desempenho no Lyon, um sério risco de ser prejudicada, ou interrompida”. Em outras
palavras, afirma-se que se não fosse sua volta ao Brasil, ele poderia jogar em times de
segunda linha da Europa.
Além disso, há também outra versão que revela que:
São muitos os pais que pagam para que seus filhos, mesmo pernas-de-pau,
sejam aprovados, em detrimento de muitos futuros craques. A denúncia do
goleiro Félix, campeão do mundo em 70, no México, define muito bem
porque não há mais jovens craques, salvo raríssimas exceções, tais como o
meia Kaká, do São Paulo. "Eles (treinadores) recebem dinheiro dos pais para
que os filhos sejam aprovados ou entrem no time. Às vezes, um menino tem
potencial, mas, se não pagar, fica de fora. Infelizmente, é assim que
funciona. Os dirigentes não tomam nenhuma atitude. Simplesmente se
omitem. E aí tudo se agrava, pois o problema acaba se tornando um dos
maiores motivos para a falta de renovação no futebol. Nem sempre os
melhores conseguem espaço, prejudicando os mais pobres, de onde saem os
maiores talentos. O resultado é o futebol se afundando cada vez mais, não só
pela corrupção e bagunça, mas também pela presença de jogadores
inexpressivos na maioria dos próprios grandes clubes". (CARVALHO, 2002,
p. 5)
Não se trata de impedir que os atletas sigam para a Europa e ganhem dinheiro, mas
está na hora de dirigentes e empresários pensarem na carreira dos seus jogadores. Seria muito
mais vantajoso que os jogadores ficassem mais tempo no Brasil, ganhassem experiência e
maturidade e aí fossem para a Europa. Além de terem mais chances de fazer sucesso na
Europa, eles poderiam ser vendidos por quantias mais elevadas (PERON, 2006, p. 1).
Pensando nisso, quase que semanalmente se ouve nos comentários de rádio e TVs os
comentaristas defendendo alguma posição da Confederação Brasileira de Futebol – CBF, no
sentido de tentarem criar mecanismos que impeçam que jovens talentos brasileiros sejam
exportados desde cedo, sem o treinamento e a qualificação necessária para vários clubes
espalhados pelo mundo.
De acordo com Perón (2006), outro fator que inibe o surgimento de novos craques é a
decadência das divisões de base de alguns times que sempre foram celeiros de jogadores. Para
ele, os clubes deixaram de lado a formação de atletas para se tornarem casa de jogadores de
empresário. Sem falar no final de futebol de várzea, que era uma grande escola, onde os
jovens aprendiam muito de futebol. Diante disso, este autor afirma que “[...] ainda seremos
56
por muito tempo o País do futebol, mas já está na hora de se tomar alguma providência, pois
neste ritmo, em menos 30 anos, não seremos os melhores do mundo”.
Outra razão para isso pode estar na acusação que alguns setores ligados ao futebol
fazem de que o futebol arte está acabando. Desde que alguns treinadores decidiram trocar o
futebol arte, rico em jogadas espetaculares e dribles desconcertantes que deixava qualquer
torcedor extasiado, pelo modelo europeu baseado na objetividade aliado à velocidade, que
muitos especialistas vêem como burocrático e sem muita graça, é que o nosso futebol foi
decaindo até chegar ao que é hoje: apenas o futebol como é praticado no resto do mundo.
Também tem sido bastante criticada por alguns analistas a falta de retorno financeiro
para o País com as transferências de jogadores para o exterior. Essa constatação pode ser
tirada da experiência com atletas locais que são revelados nas escolinhas daqui e negociados
para a Europa e outros continentes, com contratos com valores irrisórios que na maioria das
vezes não dão um retorno satisfatório para o Brasil.
De acordo com Nery (2007), apesar de o futebol brasileiro ter exportado, no primeiro
semestre de 2007, quase 600 jogadores, o volume de dólares que entrou no país entre janeiro e
junho com a transferência de atletas para o exterior não chegou a US$ 50 milhões, segundo o
Banco Central.
Na opinião de Alves apud Nery (2007, s/p), “O aumento das transferências não se
reflete em dividendos para os clubes, porque "a maioria dos jogadores que saem atualmente
são muito jovens e muitas vezes não têm nenhum valor comercial". Para Alves, os clubes
estrangeiros estão apostando cada vez mais nos adolescentes, com baixo valor comercial.
Além disso, diz o autor “[...]muita gente sai sem vínculo com clubes e vai para times muito
pequenos, de Países do segundo e terceiro escalões".
Só para se ter uma idéia, Nery (2007) informa que nos seis primeiros meses de 2007, a
exportação de atletas para o exterior rendeu US$ 49,8 milhões para os clubes brasileiros. Na
média, cada jogador deixou o País para atuar em times estrangeiros por um valor de
aproximadamente US$ 8,3 mil. Segundo este autor, o valor médio destas transferências está
bem abaixo do registrado nos dois últimos anos.
57
Em 2005, por exemplo, 804 jogadores deixaram o Brasil para jogar no exterior, o que
rendeu US$ 159,2 milhões (US$ 19,8 mil por atleta). Enquanto eu em 2006, 851 atletas se
transferiram para clubes de 86 Países, incluindo alguns, como Líbia, Uzbequistão, Ilhas Faroe,
Chipre, Vietnã, Tailândia, com pouca tradição. As vendas renderam, segundo o Banco
Central, US$ 131 milhões (valor médio de US$ 15,4 mil).
Diante destes números que, como se vê, crescem a cada ano, o que mais impressiona é
a falta de ação das autoridades, e principalmente dos que fazem o futebol brasileiro que
parecem assistir a tudo de camarote, como se isso não tivesse tanta importância para o País.
Não há, no Brasil, nenhuma legislação que proteja as equipes. “Os jogadores terminam
os contratos e vão embora. Não representam nenhum ganho para os nossos clubes”. A razão
para essa distorção é a Lei Pelé, que acabou, em 2001, com a chamada Lei do Passe, que
mantinha os jogadores presos aos clubes, transformando-a no que é hoje, um vínculo de
contrato, e eles (jogadores) só esperam terminar para irem embora" (KOFF apud NERY,
2007).
Parece inegável que houve um certo prejuízo para o futebol brasileiro com a Lei Pelé,
já sem o passe preso às equipes muitos atletas adquiriram o direito de ir para o clube que
quisessem, ficando assim mais expostos aos olheiros que mais tarde se transformariam em
empresários. Por outro lado, será que não faltou também das autoridades um estudo mais
aprofundado sobre a referida lei, no sentido de vislumbrar os efeitos que alguns de seus
dispositivos provocariam em nosso futebol e a partir daí tomarem uma providência que
pudesse coibir o êxodo anunciado?
O fato é que: “Esse problema do êxodo de jogadores brasileiros para o futebol
internacional é um fato real. Na década de 80, só deixavam o País os atletas consagrados,
mas, a partir de 2000, começou o êxodo mesmo de jogadores desconhecidos e jovens”,
(KOFF apud NERY (2007, s/p).
Atualmente impressiona a quantidade de jogadores brasileiros que vão e vêm do
futebol pelo mundo afora, o que ratifica as constatações e a preocupação de Perón e Alves em
relação às transferências e que pouco resultado tem dado ao Brasil, a não ser um prejuízo
incalculável, se levarmos em consideração que estas negociações não trazem quase nenhum
58
retorno financeiro para o País, e o que é pior: têm comprometido o surgimento de novos
talentos na velocidade como ocorria há algumas décadas atrás.
De acordo com Nery (2007, s/p), dados da Confederação Brasileira de Futebol (CBF),
mostram que o primeiro semestre de 2007 quebrou o recorde de transferências para o exterior.
Segundo a CBF, o maior êxodo de atletas aconteceu em 2003, quando 858 deixaram o País
para jogar em clubes estrangeiros.
Em 2003, a exportação de atletas rendeu ao país US$ 72,8 milhões. Após o
fim do passe no futebol brasileiro em 2001, o menor volume de dólares
registrado com a transferência de atletas aconteceu em 2002, com apenas
US$ 66,6 milhões (665 jogadores). (NERY, 2007, s/p)
Como se percebe, trata-se de um negócio bastante lucrativo que aparentemente dá a
impressão que envolve mais o interesse financeiro, tanto de atletas como de clubes e
empresários, do que a preocupação com a difusão do futebol brasileiro no exterior.
Figura 6 - Robinho e Ronaldinho
Fonte: Portal Terra, 2006.
Figura 7 – Meia Kaká do Millan, Itália
Fonte: Reuters/G1 (2007).
59
Diante disso, Nery (2007) informa que poucos foram os clubes brasileiros que
obtiveram bons lucros em transações de atletas para o exterior. Segundo ele, em 1998, o São
Paulo recebeu do Bétis (ESP) US$ 32 milhões pelo atacante Denílson, e em 2005, o Real
Madrid (ESP) desembolsou US$ 30 milhões para tirar o atacante Robinho do Santos. Mesmo
jogadores de ponta como Kaká, afirma este autor, “[...]foram negociados por valores abaixo
do valor de mercado. Em 2003, o Milan (Itália) contratou do São Paulo o meia-atacante por
US$ 8,25 milhões, valor considerado baixo pelos próprios dirigentes milanistas”.
Se atletas de ponta do futebol brasileiro são negociados por valores bem abaixo do
valor mercado, como afirma Nery, por aí dá para se ter uma idéia do valor que os outros que
não são de ponta são negociados com a maioria dos clubes estrangeiros.
Um fato que comprova as palavras de Nery, é que: “[...] após a contratação de Kaká,
que se tornou em pouco tempo um dos principais jogadores do clube italiano, o presidente do
Milan e ex-primeiro-ministro da Itália, Sílvio Berlusconi, disse: "Foi a maior contratação da
história do Milan. E a preço de banana”.
Diante do exposto, cabe entre nós uma reflexão sobre como deve ser voltado o papel
das escolinhas diante da falta de craques mencionada pelos autores acima, e a enorme
demanda do futebol mundial pelos atletas brasileiros que partem cada vez mais cedo em busca
da sobrevivência no exterior.
No caso específico dos atletas participantes desta pesquisa, a maioria com passagem
pelas escolinhas de futebol sob o nosso comando, pode-se ter claramente a constatação do que
afirmam os autores acima, acerca da saída cada vez mais cedo de jovens atletas brasileiros
para jogar em gramados internacionais, como é o caso dos aqui entrevistados que atualmente
atuam em equipes da Europa e da Ásia e certamente já viveram as experiências como as
relatadas por Perón (2006) e Nery (2007), respectivamente, fato que se poderá comprovar
com mais clareza de detalhes no decorrer das questões tratadas na entrevista.
60
Gráfico 3 - A importância da escolinha na vida dos atletas
Boa formação de base
15%
Educação e formação
cidadã
5%
40%
10%
10%
Bom comportamento e
disciplina
Aprendizagem dos
fundamentos do futebol
20%
Formação profissional e
do caráter
Combate às drogas e a
exclusão social
Fonte: Elaboração própria.
Na questão acima, quando perguntados sobre a importância de futebol em suas vidas,
os atletas apontaram alguns aspectos que justificam essa relevância, a saber: a) boa formação
de base; b) educação e formação cidadã; c) bom comportamento e disciplina; d) aprendizagem
dos fundamentos do futebol; e) a formação profissional e do caráter; f) combate às drogas e a
exclusão social.
De acordo com o gráfico 03, com base na afirmação dos atletas, 40% deles afirmaram
que o futebol foi de grande relevância para a formação de base, 20% apontaram a educação e
a formação cidadã, 10% destacaram o bom comportamento e a disciplina, outros 10%
responderam a aprendizagem dos fundamentos do futebol, 15% a formação profissional e do
caráter e, por fim, 5% atribuíram a importância das escolinhas no combate as drogas e a
exclusão social.
Como se percebe, a partir dos dados das entrevistas, a maioria dos atletas atribui a
importância das escolinhas para a formação de base e aprendizagem dos fundamentos do
futebol. Porém, somados todos os outros aspectos destacados pelos entrevistados, pode-se
61
observar que essa importância divide espaço com os aspectos sociais, comportamentais e do
caráter humano, o que ratifica a contribuição a que alguns especialistas se referem em relação
ao papel das escolinhas de futebol na orientação e formação dos jovens atletas, a exemplo de
Valentin e Coelho (2005, p. 1) que afirmam:
[...] o futebol tem se mostrado um fenômeno de grande relevância
sociocultural e é, também, amplamente vivenciado pelo brasileiro em seu
cotidiano e ressignificado a partir de sua institucionalização e de sua
apropriação pelos diversos grupos sociais. Seja ditado pela competição
racionalizada, seja impregnado pelo sentimento lúdico, seja utilizado pelo
Estado ou atuando na coesão social, podemos dizer que o futebol
desempenha um papel central na nossa cultura.
Quando se trata da formação do atleta, deve-se atentar para o fato de que aqui não se
está querendo dizer que a escola de futebol substitui a escola regular, não. O papel
desempenhado pelas escolinhas é de oferecer um apoio orientacional, no sentido de tentar
incutir nos jovens em fase de aprendizagem padrões de condutas essenciais ao seu
desenvolvimento como pessoa humana, principalmente, e como futuro atleta profissional,
tendo em vista que os clubes atuais cada vez mais estão preocupados com um tipo de atleta
com conduta exemplar em todos os sentidos.
Por outro lado, Melo (2004) afirma que a importância de se estudar o desenvolvimento
motor aplicado aos diferentes esportes reside no fato de se procurar diferenciar e escolher as
melhores metodologias a serem utilizadas na iniciação de cada faixa etária.
Para Melo (2004), a aprendizagem como uma mudança interna, via de regra, fica
guardada na memória tal como foi repetida, traduz pelos gestos específicos realizados pela
criança após as aulas, como o profissional atuou. Ou seja, o desempenho da criança reflete
seu processo e seu desenvolvimento com o aprendizado (Figura 6).
Nesse sentido, a bibliografia especializada observa que a criança começaria a ter
condições para chutar aos 4 anos de idade, pois este gesto seria um “movimento
fundamental” que é possível após a realização eficaz dos movimentos ditos rudimentares.
Contudo, os estágios de desenvolvimento sofrem interferência no meio ambiente, logo na
nossa cultura imaginamos se o chute seria um gesto que estaria ligado aos movimentos
rudimentares.
62
A cultura do futebol é tão forte que qualquer criança, menino ou menina, ganha bem
cedo uma bola. Independente do objeto, todos nós já nos percebemos chutando chapinhas,
pedras, latas etc. Willians e Wickstron (1983) afirmam que para dominar o chute são
necessários dois pré-requisitos: 1) assumir a posição de equilíbrio num só pé; e 2) ser capaz
de correr.
Não é necessário que a criança tenha 4 anos de idade para executar um chute eficiente.
O mais importante é saber como está cada criança em relação aos pré-requisitos citados, no
caso de se fazer exigência de desempenho. Outro fator imprescindível é ensinar o movimento
certo, principalmente para os iniciantes com mais de seis anos. Uma vez aprendendo o gesto,
corrigi-lo é mais difícil.
Deixar que a criança execute certas tarefas seguindo os estímulos que recebe é a
melhor maneira, se ela for orientada durante a execução. A teoria do movimento oralmente e
mesmo visualmente transmitida para a criança não tem valor. Ela e muitos de nós precisamos
experimentar, vivenciar com todo corpo para aprender, do contrário o armazenamento só
ocorrerá nas memórias sensoriais, não envolveremos a memória motora.
O futebol é uma atividade esportiva e física que, no Brasil, especificamente, não
precisa de muito sacrifício para ser ensinada. Para aprendê-la, a criança precisar ter prontidão,
motivação, experiências anteriores, maturação e inteligência e saber selecionar a metodologia,
atentando para os seguintes aspectos:
Prontidão. Sabemos que algumas das bases para esta prontidão, o nosso dia-a-dia oferece
para a criança, como os exercícios físicos e outras atividades que exigem dela habilidade e
agilidade.
Motivação. Embora esta não seja uma tarefa fácil, quando adquirimos motivação, só
precisamos mantê-la.
Experiências anteriores. São raras as crianças que nunca chutaram uma bola ou nunca
viram jogo pela TV.
Maturação e inteligência (Nível de normalidade genético) - não modificamos com nenhum
esporte. Logo, o futebol teria vantagem ao ser ensinado, cabendo ao professor escolher a
melhor estratégia.
63
Selecionar a metodologia. Não é difícil, basta levar em conta as características da
aprendizagem.
Além do mais, o futebol é um esporte eclético que reúne em si as seguintes
características: a) é global, pois aprendemos com todo corpo e o movimento todo. Isso não
quer dizer que não se deva dividir os gestos, mas no momento da realização, o ser humano
realiza o movimento; b) é gradativo, já que se aprender do mais simples para o mais complexo;
c) é dinâmico, porque envolve uma troca de conhecimentos entre alunos e professores; é mais
eficaz se houver movimento (seja ele qual for); d) é cumulativo, pois o que se aprendeu antes
será somado ao novo; e) é pessoal, ninguém aprende por outro, temos que vivenciar. Além do
mais, somos diferentes, logo “não existe receita de bolo”.
O treinamento técnico e tático é outro aspecto indispensável ao jogador de futebol em
todas as fases do aprendizado ao mais alto nível. O treinamento técnico se apresenta como
fundamental na vida da qualquer jogador de futebol, pois é através dele que são apresentadas
as técnicas do futebol, ao passo que no treinamento tático são treinadas as jogadas estratégicas
a serem utilizadas durante a realização dos jogos.
Figura 8 - Atletas realizando alongamentos antes de treino tático
Fonte: Arquivo próprio.
64
Os fundamentos do futebol deverão ser permanentemente exercitados no exercício da
profissão de jogador de futebol. O passe, o controle, a condução, o drible, a finta, o chute e o
jogo de cabeça são a matéria prima do jogador.
Na carreira de um verdadeiro profissional, a busca pela perfeição faz parte do seu
caminho. Um médico cirurgião não pode deixar de se atualizar tecnicamente, o mesmo se
aplica ao músico e assim sucessivamente. Da mesma forma, o atleta precisa se especializar
para que possa conseguir o sucesso almejado, e as escolinhas se destacam como um
importante aliado nessa especialização, pois é através dela que ele pode adquirir o domínio
das técnicas e as orientações necessárias para exercer a sua profissão.
Ninguém pode indicar um método único e preciso de ensinar e/ou aprender futebol.
Pois segundo nossa visão, cada um aprende de modo diferente do outro. Contudo, se
observamos alguns aspectos, podemos no geral dizer que: a) quem decora, memoriza, não
aprende; b) Só há vontade de aprender algo quando nos desperta a curiosidade, o interesse, ou
se há necessidade ou um desafio a vencer; c) Só se conhece bem quando se observa, informase e se conclui por conta própria com o uso da percepção e do raciocínio; d) O que se aprende
racionando e concluindo jamais se esquece; e) O comparar uma coisa com outra, vendo as
semelhanças e as diferenças, faz funcionar o raciocínio e a percepção; f) Não interessa muito
a definição e o conceito de algo, mas que se saiba identificá-lo e usá-lo (quando se sabe usar e
identificar, por conta própria, cada um consegue conceituar e definir a seu modo).
Com base nisso, o mais indicado é partir do geral, do fato real para o teórico, para o
conceito, para a definição - fazer com que o aprendiz chegue a eles por si próprio. É
importante ensinar o geral, que é básico, deixando o específico e a exceção como
aprimoramento. Quem aprender o que é um boi, depois por si verificará que há bois chifrudos
e mochos, pequenos e grandes, com ou sem corcova. Quem aprender a telefonar, depois
telefona em qualquer aparelho, com qualquer número, discando ou digitando.
E, para avaliar o aprendizado, pedir o básico é o fundamental. Pedir, por exemplo, que
se mostre o que é caneta, não sendo necessário que se identifique tipo ou marca. Quem sabe o
que é caneta, percebe o específico ou se aprofunda quando quiser.
65
Se atentarmos para estes pontos, ao ensinar, faremos despertar o interesse ou a
curiosidade; mostrar e chamar a atenção para o que se quer ensinar, comparando coisas para
que se leve à percepção, observação e o raciocínio; fazer com que o aprendiz raciocine e
conclua por conta própria ou junto com quem ensina; deixar que o aprendiz, no final, formule
o seu conceito e defina.
Então, não é bom definir e conceituar mostrando depois os exemplos. É bom reprisar
para fixação o que já foi ensinado antes. É bom explicar o sentido das palavras que aparecem
ou vão sendo ditas, estabelecendo relação com outras. Depois é exercício para treinamento e
fixação.
Se aplicarmos esse processo, atingiremos outro principal objetivo: ensinar a pensar, a
raciocinar, a aprender para aprender sempre qualquer coisa pela vida afora.
Porém, sem disciplina na escola, em casa, nos estudos, em qualquer coisa, só se
perderá tempo.
A atividade esportiva é reconhecida e aceita como um elemento importante na
formação do jovem. O esporte contribui para o desenvolvimento físico harmonioso da criança,
prepara-a fisiologicamente para o esforço, auxilia no seu equilíbrio físico e psíquico, participa
na formação da sua vontade, do seu caráter e favorece a sua adaptabilidade social. Por isso, a
educação moderna deve, além disso, preparar a criança para os seus descansos, para quando
for jovem e adulto. Para que o homem, durante toda a sua vida, pratique esporte, deve adquirir
este hábito e gosto desde a infância.
A formação moral, intelectual e física do indivíduo, qualquer que venha a ser mais
tarde sua responsabilidade na sociedade, exigira paralelamente um equilíbrio em relação às
disciplinas que deverão refletir no conteúdo dos programas e dos horários estabelecidos. Daí a
importância em se determinar limite razoável para o total dos horários consagrados às
disciplinas intelectuais.
Entretanto, ainda mais importante é que um terço a um sexto do emprego total do
tempo seja reservado à atividade física, que deve ser diminuída à medida que a criança for
66
crescendo. Uma grande parte dessa atividade deve ser orientada para o esporte, aumentando a
proporção com a idade da criança.
Diante do exposto, e levando em consideração a nossa experiência na formação dos
jovens em escolinhas de futebol, é valida a observação de que a formação intelectual física,
moral e cidadã do indivíduo, qualquer que possa ser mais tarde sua responsabilidade na
sociedade, exige equilíbrio das diversas disciplinas que fazem parte do conteúdo dos
programas das escolinhas de futebol.
Este pensamento é comungado por Zaluar (2008), que afirma que o futebol atual exige
dos atletas um maior desempenho físico e técnico, bem como uma maior capacidade
intelectual. Para ele, a necessidade global de um melhor nível intelectual dos indivíduos
atletas e praticantes é evidente, e a atuação dos professores e treinadores na educação desses
jovens atletas se torna muito importante. “Hoje os atletas de futebol têm um nível muito
melhor, mas ainda precisamos melhorar muito, pois depois que esses atletas param de jogar, o
que farão em suas vidas profissionais?” (ZALUAR, 2008, p. 01).
Daí se percebe a importância do trabalho das escolinhas de futebol na atualidade, que
na visão de Zaluar (2008, p. 1): conta com quatro aspectos importantes:
Em primeiro lugar as escolinhas de futebol vêm suprir uma deficiência
geográfica da falta de locais para a prática de futebol. Não existem mas
tantos campos e agora com as quadras e campos de grama sintética com
escolinhas vêm dar mais oportunidades a prática de futebol.
Em segundo lugar, essas escolas abrem grandes portas para a utilização de
ex-jogadores como professores e treinadores, passando assim um pouco de
sua experiência aos novos atletas. É importante frisar a necessidade de
preparação acadêmica desses profissionais, que esses ex-atletas participem
de cursos e palestras antes dessa nova atuação profissional.
Como terceiro aspecto cito o desenvolvimento físico e técnico completo
dos atletas e a diminuição das deficiências dos jogadores. Podemos
visualizar Kaká, Ronaldinho Gaúcho e Alexandre Pato como oriundos das
escolinhas, jogadores com muito poucas deficiências físicas e técnicas.
O quarto e talvez mais importante aspecto nessa atuação das escolinhas de
futebol é na formação e educação do indivíduo. Muitos desses jovens que
estão nas escolinhas, talvez não cheguem a ser jogador profissional, e as
escolinhas são um meio de educar esses jovens para obterem sucesso fora do
mundo do futebol.
67
Sendo assim, Zaluar (2008) observa que para o Brasil conquistar a excelência tão
almejada é preciso aprimorar os treinamentos dos nossos atletas, desenvolver os
conhecimentos de nossos treinadores, melhorar as qualidades técnicas de nossos jogadores e
educar mais nossos jovens atletas e para ele, as escolinhas são o principal meio para conseguir
esse objetivo.
Outra questão apontada pelos entrevistados e propositalmente deixada para a discussão
a seguir, por se tratar de assunto da terceira pergunta da entrevista, diz respeito à importância
das escolinhas de futebol no combate às drogas, sobre a qual trataremos no gráfico seguinte.
Gráfico 4 - Importância das escolinhas no combate às drogas
25%
45%
30%
Manter os atletas ocupados
Orientar sobre as drogas
Educar para a vida contra o vício
Fonte: Elaboração própria.
De forma unânime, os atletas se manifestaram positivamente quanto à importância da
escolinha de futebol no enfrentamento à problemática das drogas.
Como mostra o gráfico 4, dentre os entrevistados, 45% são da opinião de que as
escolinhas ajudam a manter os jovens ocupados e longe das drogas. Para 30% deles, a
68
importância está na orientação e no aconselhamento sobre o mal que as drogas podem trazer
para o indivíduo, e 25% disseram que as escolinhas educavam o atleta para a prática do
esporte e da cidadania, mantendo-o longe do vício.
Para a sociedade brasileira, em particular, as drogas têm sido consideradas umas das
maiores ameaças aos jovens nos dias atuais. Apesar dessa constatação, deve-se ressaltar que a
problemática das drogas não se trata de um problema originário dos dias atuais. Pelo contrário,
desde os primórdios, alguns grupos sociais já utilizavam produtos alucinógenos em seus
rituais.
De acordo com Guedes (2002), a questão mais grave das drogas é que geralmente o
primeiro contato com ela ocorre normalmente na fase de formação intelectual mais importante
da vida do cidadão, que é a adolescência. Para o autor, dentre os motivos que levam a esse
envolvimento estão a curiosidade, a solidão, os problemas familiares, as angústias, a falta de
segurança no futuro, dentre outros, que acabam fazendo com que os jovens ingressem no
mundo das drogas.
Em meio a esse envolvimento, os especialistas afirmam que são as amizades que mais
têm preocupado os pais dos adolescentes, que se vêem diante de um dilema ainda sem
resposta: como saber com quem seus filhos estão andando e o que andam fazendo em suas
ausências.
Refletindo sobre essa questão, Guedes (2002) afirma que o ser humano, desde criança,
tenta fugir da realidade, quando esta não está de acordo com suas perspectivas individuais.
“Na infância, faz uso das fábulas, na adolescência, dos ídolos e, quando adulto, dos sonhos de
um mundo perfeito” (2002, p. 10). Para o autor, é nesta última fase que o jovem busca a fuga
mais avassaladora que é o caminho terrível das drogas.
A busca de respostas para as questões que envolvem as drogas, os adolescentes e suas
famílias é um dos principais objetivos que têm levado muitos especialistas do assunto a
apontarem a participação dos jovens em algumas atividades esportivas, como essenciais para
sua formação e, principalmente, a fuga de certos vícios que podem levar a destruição da
pessoa, como é o das drogas, por exemplo.
69
Sobre isso, a resposta dos atletas entrevistados confirma a afirmação dos estudiosos
que as escolinhas de futebol representam um espaço alternativo que, se não representa a
solução definitiva para o problema, pelo menos tem contribuído para oferecer orientações e
aconselhamentos essenciais para dar um futuro melhor para os jovens e suas famílias.
Figura 9 – Atletas em palestra sobre drogas no SAFEPB
Fonte: Arquivo próprio.
Em estudo anterior, Melo (2004) tratou de mostrar a importância da orientação e do
aconselhamento sobre determinados vícios para a formação dos jovens das escolinhas, a
exemplo das drogas, licitas ou ilícitas, como a maconha, o crack, a cocaína, o tabaco e o
álcool que representam um grande risco para a juventude. Nesse sentido, o autor ressalta a
importância de se realizar palestras rotineiras com os jovens, a exemplo das que são por ele
realizadas com freqüência (Figura 9).
A preocupação que constantemente vem sendo manifestada pela mídia, ou mesmo
através de órgãos ligados à educação e a saúde, serve de alerta sobre a problemática das
drogas. A razão para essa preocupação está na percepção de que o que antes parecia ser um
problema relacionado apenas a alguns grupos sociais, hoje se reflete em toda sociedade,
exigindo de todos um grande esforço no sentido de compreender melhor o tema e buscar
soluções que possam ajudar no combate a este mal que tem afetado grande parte da juventude
brasileira especialmente.
70
Conhecer melhor sobre que drogas são essas é essencial para que se tenha noção do
perigo que elas representam e de como as escolinhas e outras instituições envolvidas na
solução do problema podem contribuir, através da orientação, do aconselhamento ou de
outros mecanismos de controle do problema.
A maconha, considerada ao lado do crack como a droga de uso mais comum entre os
adolescentes na primeira fase de suas vidas adultas, é a mais usada pelos jovens de 15 a 17
anos, ao menos na classe média-baixa. Para alguns, ela provoca dependência física, mas para
outros, ela é inofensiva.
Reconhecida como a porta de entrada para o uso de outras drogas, entre elas a cocaína,
o crack e tantas outras, a maconha se massificou e se constituiu num grave problema de saúde
pública. E embora nas últimas décadas, alguns setores da sociedade venham defendendo a
liberação das drogas para uso medicinal e terapêutico, para alguns especialistas, os malefícios
da maconha se manifestam a longo prazo, depois que as pessoas consumem a droga por muito
tempo.
Segundo Gikovate apud Melo (2004, p. 207), “o grande problema da maconha é que
ela é usada nos primeiros anos da puberdade e na adolescência, justo numa das fases mais
importantes da juventude em que estão sendo formados a personalidade e o caráter do jovem”,
motivo pelo qual se justifica a importância da orientação que as escolinhas têm oferecido aos
seus alunos no decorrer de suas passagens por estas.
Outro aspecto, que muitos estudiosos e especialistas do assunto fazem questão de
enfatizar, é que além de prejudicar a memória, coisa grave para quem está em fase de estudo e
de aprendizado, a maconha interfere na formação do sentido moral da pessoa, no seu sentido
de responsabilidade e de dever. Na visão de Gikovate (2004, p. 208), a maconha faz “bons
meninos” virarem um pouco “bandidos”, e o estudante médio ficar preguiçoso de vez. [...] faz
o jovem que não gosta de levantar cedo ficar na cama até o meio-dia sem nenhum remorso. A
maconha acaba com o remorso em geral, e isso é o fim do sentido moral”.
O sentido moral a que se refere Gikovate (2004) significa exatamente que existe
dentro de nós um mecanismo que consegue frear certas ações, ações estas que podem
71
provocar a dor do remorso. Caso não existisse tal mecanismo, não haveria limites internos
para o controle de nossas ações.
Em outras palavras, esse sentido moral é um dos principais aspectos representativos da
nossa imagem e da formação de nossa personalidade, que são elementos essenciais para que
nos aceitemos e sejamos aceitos pelos outros como pessoas dignas de conviver em sociedade.
Diante do exposto, pode-se afirmar que o uso da maconha é péssimo para os jovens,
porque além de levá-los a quererem fugir de suas responsabilidades e de encararem os
desafios próprios da fase adulta, faz com que a sensação de covardia e de incompetência se
transforme em qualidade diante das dificuldades.
Apesar de ser verdadeira a constatação de que muitos jovens que não se sentem à
altura da disputa, buscam nas drogas uma forma mais fácil de superarem as dificuldades da
vida, na prática, constata-se que essa não é a maneira mais racional de conseguir tal objetivo.
Pelo contrário, a bibliografia especializada mostra que as drogas têm levado muitas pessoas a
um mundo de solidão, tristeza e melancolia que quase sempre se consome num sofrimento
quase interminável.
Preocupação igual e cada vez mais crescente tem ocorrido em relação ao crack. Assim
como a maconha, a cocaína e outras drogas que têm assustado a população das médias e
grandes cidades brasileiras, o crack tem sido considerado como outro perigo à vista para a
vida dos jovens. Derivado da cocaína, mais barato e com efeitos muito parecidos com ela, o
crack é considerado a bola da vez entre a juventude.
Surgido nos anos 80, o crack é uma pasta branca que se fuma em um cachimbo
pequeno, similar aos usados, nos anos 60, para a maconha. Embora ainda não se tenha relato
de sua incidência no meio futebolístico, a prevenção e o trabalho de orientação realizado
ainda na formação dos futuros atletas nas escolinhas parece ser, por hora, a melhor indicação.
O consumo do crack é maior que o da cocaína, pois é mais barato e seus efeitos duram
menos. Por ser estimulante, ocasiona dependência física e, posteriormente, a morte por sua
terrível ação sobre o sistema nervoso central e cardíaco.
72
Devido à sua ação sobre o sistema nervoso central, o crack gera aceleração dos
batimentos cardíacos, aumento da pressão arterial, dilatação das pupilas, suor intenso,
tremores, excitação, maior aptidão física e mental. Os efeitos psicológicos são euforia,
sensação de poder e aumento da auto-estima.
A dependência se constitui, em pouco tempo, no organismo. Se inalado junto com o
álcool, o crack aumenta o ritmo cardíaco e a pressão arterial o que pode levar a resultados
letais.
A cocaína5, da qual se originou o crack, é uma das drogas mais consumidas entre os
jovens atualmente. Segundo Gikovate apud Melo (2004), trata-se da droga mais badalada e
consumida pelos jovens e os artistas, que são seus ídolos.
Em relação a esta e outras drogas, Gikovate apud Melo (2004) afirma que lançar mão
da cocaína e de outras drogas para poder se divertir, como muitos jovens costumam fazer,
pode representar um desastre para suas vidas. Isso porque, o efeito euforizante que causa
êxtase e vicia pode trazer a curto, médio e longo prazo, prejuízos irreparáveis a saúde da
pessoa.
Sobre o exposto, Gikovate apud Melo (2004) afirma que do ponto de vista humano,
afetivo e social, a droga é um desastre. Quem passa a noite bebendo e consumindo estas
substâncias não estará em boas condições para o trabalho no dia seguinte. O resultado disso é
que, com o passar do tempo, os malefícios aparecerão, e uma carreira que, na prática, teria
tudo para dar certo, pode ser completamente destruída.
Além das drogas acima, também conhecidas como drogas ilícitas, outras cujo
consumo tem crescido bastante entre os jovens são as chamadas drogas lícitas, como o tabaco,
o álcool e alguns medicamentos que, segundo os especialistas, fazem tanto mal quanto as
drogas ilícitas.
5
A cocaína é um alcalóide (produto extraído das folhas de uma planta chamada Erythroxilon coca encontrada
principalmente em países da América do Sul e Central). Também é conhecida como coca, pó dourado, neve ou
"senhora" (http://psicoativas.ufcspa.edu.br/cocaina.html).
73
Entre as drogas licitas, o tabaco é comprovadamente uma das que mais tem
preocupado as autoridades de saúde, tanto pelos seus efeitos agudos como pelos crônicos,
como pela redução da capacidade de rendimento físico que ela provoca nos fumantes. Isso,
porque de acordo com Gikovate apud Melo (2004), o consumo do fumo aumenta o esforço
respiratório, devido a certos fatores imediatos que duplicam ou triplicam a resistência à
passagem do ar, através das vias respiratórias.
Além dos efeitos acima, Gikovate apud Melo (2004) afirma que outro igualmente
nocivo consiste em que o máximo de carbono produzido na combustão do tabaco ocupa entre
5 a 6% da capacidade de hemoglobina para transportar oxigênio. Porcentagem que pode subir
para 10% nos fumantes inveterados. Além disso, a “descarga” nos tecidos do oxigênio que o
sangue transporta também encontra obstáculos. Os pequenos vasos sanguíneos da periferia se
contraem, ou seja, diminui o seu calibre (vasoconstrição), o qual se manifesta por uma ligeira
elevação da pressão sangüínea e um aumento da sensibilidade do frio nos dedos.
Para quem pratica alguma atividade esportiva, o ideal seria não fumar antes de
exercitar e nem após. Ou então deixar de fumar para sempre que é o mais recomendado pelos
especialistas. Caso encontrem alguma resistência em parar de fumar, os amantes do futebol e
mesmo de outros esportes deveriam seguir os conselhos de Gikovate apud Melo (2004, p. 208)
que orienta para o seguinte:
[...] atente para esses cuidados: os efeitos imediatos e mais graves do tabaco
no aparelho respiratório incidem diretamente sobre a circulação coronariana,
cuja maior susceptibilidade está no coração que tende a sofrer transtorno de
ritmo. Esses dois efeitos, unidos aos mencionados anteriormente, constituem
boas razões para advertir as pessoas que sabem ou suspeitam de que sofrem
transtornos do ritmo cardíaco (arritmias), para que tomem cuidados ao
fazerem exercícios físicos intensos ou prolongados, depois de terem fumado.
A mínima margem de segurança entre o consumo do tabaco e o exercício,
deve ser de 20 minutos.
Assim como o tabaco, o alcoolismo também é outra droga que desenvolve uma
intoxicação crônica repetida e pode resultar em conseqüências físicas, psíquicas e sociais para
o indivíduo.
O consumo freqüente de álcool pode causar danos irreparáveis ao organismo humano.
E, segundo a bibliografia especializada, tudo isso tem início quando o álcool é absorvido no
74
sistema digestivo e passa para a corrente sangüínea. Pelo sangue, o álcool vai a todo o
organismo, principalmente ao cérebro, desestabilizando o sistema nervoso central. Segundo
Gikovate apud Melo (2004), a sua ingestão contínua, a princípio, gera uma sensação
agradável que é substituída pelo entorpecimento, tonteira, instabilidade, perturbações
estomacais. Esse processo leva em média uma hora para cada unidade de álcool ingerida e é
cumulativo. Isto é, duas unidades levariam duas horas e assim por diante.
O álcool puro existente em cada dose de bebida, corresponde a aproximadamente nove
gramas. Cada tipo de bebida tem uma concentração diferente de álcool por volume. Assim,
um copo de chope ou uma cerveja equivale a uma dose de uísque, vodka, gim, rum ou
cachaça, que por sua vez é igual a uma taça de vinho ou cálice de xerez6.
Para o homem, o limite máximo recomendado é de 21 unidades distribuídas nos dias
da semana. Para a mulher, esse limite é de 14 unidades por semana. Essa diferença se dá
porque o homem possui maior quantidade de água no organismo do que a mulher. Ao se
distribuir pelos líquidos orgânicos, o álcool apresenta maior concentração no indivíduo que
possui menor quantidade desses líquidos.
Este limite só é válido para os indivíduos não-alcoolistas. Em relação a isso, é
importante lembrar que mesmo dentro desses limites de segurança para o organismo, sempre
que se ingerir qualquer quantidade de bebida alcoólica, há uma diminuição dos reflexos,
predispondo o indivíduo a acidentes de todo tipo, desde uma simples queda ou esbarrão num
móvel, até graves acidentes industriais ou automobilísticos.
Para Gikovate apud Melo (2004), embriagar-se em eventos especiais ou nos finais de
semana não é sinônimo de alcoolismo, porém se isso se repete freqüentemente pode indicar
uma tendência que, com o passar do tempo, tem levado muitos a se tornarem alcoólatras.
Nesse sentido, pode-se observar que tanto as drogas licitas quanto as ilícitas podem
causar ao homem problemas físicos, psíquicos e sociais, a exemplo de desajustes no lar, como
a separação conjugal, perda de emprego, incapacidade de desempenhar papéis sociais,
endividamento, acidentes de trânsito e demandas legais, distúrbios psíquicos, com
6
Tipo de cálice onde é servido o Xerez, ou Jerez, vinho fabricado na Andaluzia. Esse vinho é ideal para beber
antes das refeições, muito usado como aperitivo e também na culinária (ClickFulano.com, 2008, p.1).
75
empobrecimento da auto-imagem, perda de memória, problemas de orientação temporal e
espacial, delírio alcoólico, desestruturação da personalidade, ciúme patológico, alienação,
demência; doenças físicas, como hepatite, cirrose hepática, inflamação dos nervos dos braços
e pernas, problemas do coração, disfunções do pâncreas, gastrites e úlceras estomacais,
deficiências vitamínicas, traumatismos, redução da coordenação motora, impotência sexual e
lesões cerebrais.
Com base nas informações dadas acima, pode-se ter uma idéia do tamanho da
preocupação que envolve vários setores da sociedade, em especial as famílias que diante de
um problema tão grave e de difícil solução como parece ser esse, vêem nas escolinhas de
futebol uma esperança para que seus filhos possam escapar do perigo que representa as drogas
nos dias atuais.
Nesse sentido, as respostas dadas pelos atletas apontam para uma atividade de apoio
ao trabalho coletivo aliado à orientação no sentido de promover a valorização do indivíduo, de
forma que todos possam ser ajudados na superação dos traumas e sofrimentos a que muitos
ficam submetidos desde a infância, a exemplo do problema das drogas que podem ocorrer no
decorrer da vida.
Além desse papel orientador atribuído às escolinhas, outro aspecto destacado pelos
sujeitos entrevistados foi com relação à sua função socializadora, que como se pode observar
no decorrer desta análise, engloba a problemática da exclusão social e da formação do caráter
que não se trata de uma preocupação recente, mas já de algumas décadas.
Para se entender o significado dessa função socializadora e dos aspectos a ela
associados, cabe ressaltar o que afirmam Vallentin e Coelho (2005, p. 186) que “a
preocupação pedagógica em gerir e controlar os hábitos e o estilo de vida dos jogadores de
futebol brasileiros surgiu a partir da derrota do Brasil na Copa do Mundo de 1966, realizada
na Inglaterra”. Segundo estes autores, o motivo apontado pelos treinadores e a mídia esportiva
para a derrota massacrante da Seleção Bbrasileira, na Copa de 1966, foi o insuficiente preparo
físico e os maus hábitos, vícios e demais hedonismos apresentados pelos jogadores.
A partir daí, teve origem a preocupação das comissões técnicas em procurarem se
manter vigilantes em relação ao estado físico, comportamental e emocional dos atletas, desde
76
a sua inicialização no futebol. Tal preocupação, como se pode constatar através dos
depoimentos dos atletas consultados, foi de fundamental relevância para a manutenção do
controle sobre certos hábitos e deficiências que acabavam influenciando negativamente no
desempenho destes dentro de campo.
Tal função foi designada às escolinhas, sobre o que Florenzano afirmou o seguinte:
No discurso de técnicos de campo, preparadores físicos e jornalistas
esportivos, a premente necessidade de consertar insuficiências, combater
vícios, tirar defeitos do jogador brasileiro constituem objetivos que podem
ser satisfeitos de modo mais adequado se arrostados desde a tenra idade, e
sem interrupção ao longo de toda a série que o jovem pretendente à profissão
de atleta deve percorrer. Na verdade, confere-se às categorias de base uma
missão por demais nobre, cujo comprimento as técnicas corretivas nelas
desenvolvidas encarregam-se de assegurar (FLORENZANO, 1998, p. 37).
Posto o desafio, essa ação vigilante da parte dos que atuam no universo do futebol já
vem sendo aplicada pelos coordenadores de escolinhas durante os treinamentos que são
realizados semanalmente. E na prática, o que se observa é que elas têm surtido bons
resultados, já que muitos jogadores formados nessas categorias de base já saem de lá
conscientes de que para vencerem no mundo do futebol não basta apenas serem bons
jogadores, é preciso ter boa conduta e se manterem afastados de certos vícios que podem
destruir para sempre a carreira de um atleta.
A partir do que afirma Florenzano, e levando em consideração as afirmações de
Vallentin e Coelho (2005), pode-se perceber a importância atribuída às categorias de base,
cujo trabalho que vem sendo realizado por várias delas,
[...] apresentam-se como possibilidade de sanar os vícios e defeitos dos
jogadores antes de se apresentarem às equipes federadas, bem como
manipular seus corpos de forma que os mesmos alcancem o elevado patamar
de força física exigido pelo modelo mundialmente adotado pelas equipes
federadas, conhecido como "futebol-força" (VALENTIN apud COELHO,
2005, p.186)
Em outras palavras, os atletas que passam pelas escolinhas acabam encontrando nelas
um suporte psíquico-social que acaba refletindo sensivelmente no seu desenvolvimento e,
conseqüentemente em suas carreiras, tendo em vista que quando passam a atuar
profissionalmente já chegam lá moldados e cientes do papel que têm de exercer se quiserem
alcançar seus sonhos.
77
Embora não seja essa a única e definitiva solução para este e outros problemas que
afetam diretamente a juventude em nosso País, não se pode negar que as escolinhas
representam um atalho importante para quem deseja sair dessa fuga muitas vezes sem volta,
em busca de um mundo real que pode oferecer ao jovem chances de superar seus problemas e
as deficiências que porventura venham surgir no decorrer de suas vidas.
Por isso Vallentin e Coelho (2005, 186), vêem a escolinha como “[...uma forma de
compreender o percurso através do qual os pretendentes à profissionalização terão que passar,
sendo, por vezes, imbuídos de normas e regras”.
Um exemplo simples dessa preocupação com a problemática das drogas foi dado em
1995, quando os organizadores do 2º Campeonato de Futebol Infantil de Favelas do Rio de
Janeiro publicaram, com o apoio da Confederação Brasileira de Futebol – CBF, da
Arquidiocese e da ONG SóRio, o Guia do Atleta, onde afirmavam que o esporte podia ser o
maior aliado, por via pacífica, na luta contra as drogas. Caminho esse que, segundo os
organizadores, já provou ser bem mais eficaz que punições e proibições severas.
Para os idealizadores do evento acima citado, através do exercício físico (seja ele qual
for), crianças e jovens são atraídos para um novo habitat, para uma convivência em grupo
marcada pela solidariedade. Um ambiente em que as necessidades de respeitar os limites
estabelecidos e as regras de competição acabam se tornando um aprendizado essencial ao
processo de desenvolvimento humano.
De acordo com o Guia do Atleta (1995, p. 04):
É um estilo de vida marcado pela disciplina e pelo prazer: ao conviver em
grupo com pessoas que têm um objetivo comum, a criança tende a se
sociabilizar e a absorver as coisas boas daquela comunidade. Para agüentar a
rotina diária dos exercícios, automaticamente terá que rever seus hábitos.
Aumentará a sua necessidade de descanso e, ao mesmo tempo, diminuirá seu
tempo livre. E por fim, terá uma rotina de treinamento, com
acompanhamento médico e até psicológico quando necessário. A teoria
ganha corpo na prática: os resultados podem ser comprovados na
comunidade da Mangueira, por exemplo, onde há nove anos é desenvolvido
um mega projeto olímpico, que conseguiu praticamente zerar o número de
menores infratores do morro. Paralelo a isto aumentou o seu nível de
escolaridade. Assim, ela é hoje a comunidade do Rio com o menor número
de jovens infratores e o maior número de alfabetizados. Um grande gol dos
esportes.
78
Em resumo, o Guia mostra que os jovens que praticam esporte aprendem a ganhar e a
perder e a conviver em equipe. Isso tudo, num ambiente que une ludicidade a
responsabilidade.
Essa mesma experiência vem sendo vivenciada por nós ao longo de quase trinta anos
dedicados às escolinhas de futebol, onde podemos constatar a importância deste espaço no
combate a certos vícios e a exclusão social que afetam a vida de muitos atletas. Entretanto,
não podemos tomar como exemplo apenas a nossa experiência pessoal nessa área e
simplesmente ignorar os estudos teóricos de grande relevância de outros autores que tratam
desse tema. Em outras palavras, apenas reconhecermos a nossa prática não é suficiente para
ratificar a importância do futebol como instrumento de combate às drogas e a exclusão social,
é preciso levar em consideração o que outros especialistas afirmam em relação ao tema, e
procurar saber dos próprios atletas o que eles pensam a respeito do assunto, como está
demonstrado no decorrer desta análise.
Gráfico 5 - A importância das escolinhas no combate à exclusão social
0%
100%
Sim
Não
Fonte: Elabora própria.
O gráfico 05 mostra que os 20 entrevistados, ou 100%, ratificaram a relevância que
representam as escolinhas de futebol no combate a exclusão social que aflige a vida de grande
79
parte dos jovens que para estas se dirigem em busca de uma oportunidade de subirem na vida
e conquistarem a cidadania.
Diante da relevância antes mencionada das escolinhas para a formação do indivíduo,
que envolve aspectos como a orientação para educação, comportamento e disciplina que
igualmente são aspectos indispensáveis para a formação do caráter, constatamos que as
escolinhas acabam contribuindo, de fato, para o combate à exclusão social.
As razões para esta dedução se justificam pela constatação que grande parte das
escolinhas de futebol fica localizada nas periferias das grandes e pequenas cidades do País e
quase todas surgem com um objetivo comum: dar às crianças e jovens a oportunidade de
terem um futuro mais digno e conquistarem a cidadania através do futebol.
É fato que o papel que as escolinhas vêm desempenhando é fruto da crise econômicosocial que o País vem enfrentando, há décadas, marcada principalmente pela má distribuição
de renda que faz com que uns poucos tenham muito e a maioria sobreviva sem quase nada.
Esse contraste acaba provocando uma imensa desigualdade social que acaba deixando muitas
famílias à margem da sociedade, ou excluídas socialmente.
Quem lida no dia-a-dia das escolinhas tem plena consciência de que as crianças e
jovens que para lá se dirigem, vão em busca de uma oportunidade de crescerem dentro do
futebol e, através dele, poderem lutar por dias melhores para si e seus familiares. Fato esse
comprovado nas entrevistas com os atletas e ex-atletas que unanimemente ratificam as
afirmações acima.
Para todos os entrevistados, as escolinhas representaram à válvula de escape de um
mundo de abandono social e de pobreza, para outros de conquistas e realização pessoal e
profissional. Mesmo os atletas que não conseguiram essa conquista são afirmativos em
ratificar o papel das escolinhas na superação das desigualdades sociais a eles impostas.
Tal constatação se concretiza nas palavras de Deccache-Maia (1998), quando ele
afirma que as escolinhas de futebol surgem como uma alternativa que reúne atrativos, como
oferta de uma atividade que faz parte do universo simbólico de quase todas as pessoas do sexo
masculino; atividade que congrega tanto o aspecto lúdico como o profissional, uma vez que se
80
acredita ser possível iniciar uma carreira no mundo do futebol; segurança no que se refere a
seu local de funcionamento, possibilitando a convivência com outros jovens, muitos dos quais
vizinhos.
De acordo com Deccache-Maia (1998), não se pode perder de vista que o futebol, em
nosso País, tem um forte apelo junto aos jovens e muitos buscam ingressar em escolas de
futebol independentemente de outros aspectos. Entretanto, com o decorrer do tempo, esse
apelo passou a agregar em si não apenas o mero interesse em jogar futebol, mas a
oportunidade dos jovens de obterem sucesso como atletas profissionais, no nosso
entendimento como alternativa a exclusão social a que muitos vivem submetidos.
A exclusão social é, pois, resultado do estado de pobreza e miséria a que muitos
jovens se acham submetidos e que, muitas vezes, torna-se um entrave ao seu desenvolvimento
pessoal e profissional. E o que ocorre diante disso é que, achando-se, muitas vezes, sem a
oportunidade de crescerem e se desenvolverem como homem e cidadão, muitos acabam
caindo na armadilha da criminalidade e provocando sua própria destruição.
Segundo Spozati (2000), a exclusão social é um tema bastante discutido, nos dias
atuais, e são necessários vários recortes para entendê-la, já que se trata de um fenômeno, de
um processo, uma lógica, que possui várias interpretações e uma gradação de situações.
Recortes estes que permitem afirmar que a exclusão social é relativa, cultural, histórica e
gradual, significando que ela pode variar de País para País, em diferentes momentos de um
mesmo País, como também variar em sua graduação em um mesmo momento.
Na visão de Delfin Neto apud Wilpert (2005), a exclusão divide-se em grupos sociais
(minorias étnicas, religiosas e culturais), gênero, termos de opção sexual, idade, aparência
física, universo de trabalho, do sóciocultural, da educação, da saúde, do social como um todo.
Embora seja, um conceito bipolar, ou seja, a exclusão social opõe-se à inclusão, para
Spozati (2000), não há um "estado puro" de exclusão, mas esta é sempre relativa a um dado
padrão de inclusão.
Na visão de Wilpért (2005), exclusão e inclusão social são conceitos dialéticos,
polarizados, simétricos, que constituem uma das grandes preocupações da sociedade atual.
81
Segundo ele, a inclusão social se apresenta como um processo de atitudes afirmativas, pública
e privada, no sentido de inserir no contexto social mais amplo todos aqueles grupos ou
populações marginalizadas. Para isso, Sawaia (apud Wilpert, 2005, p. 56) observa que “basta
construir teorias para induzir ações transformadoras, já que uma das dimensões do processo
de inclusão social é a inclusão escolar”. Em outras palavras, deve-se levar a escolarização a
todos os segmentos humanos da sociedade, com ênfase na infância e na juventude, na
construção de uma consciência cidadã.
Constata-se que a inclusão social é o compromisso fundamental, norteador de ações e
concepções pedagógicas da Educação Física escolar e a partir desta, toda e qualquer
manifestação e divulgação da cultura corporal e movimento. Para isso é preciso que se adote
uma perspectiva metodológica de ensino e aprendizagem que busque o desenvolvimento da
autonomia, a cooperação, a participação social e a afirmação de valores e princípios
democráticos (WILPERT, 2005, p. 56).
Com base neste conceito, destaca-se o que afirma os PCN´s (1998) que:
O lazer e a disponibilidade de espaços públicos para as práticas da cultura
corporal de movimento são necessidades essenciais ao homem
contemporâneo e, por isso, direitos do cidadão. Os alunos podem
compreender que os esportes e as demais atividades corporais não devem ser
privilégio apenas dos esportistas profissionais ou das pessoas em condições
de pagar por academias e clubes. Dar valor a essas atividades e reivindicar o
acesso a centros esportivos e de lazer, e a programas de práticas corporais
dirigidos à população em geral, é um posicionamento que pode ser adotado a
partir dos conhecimentos adquiridos nas aulas de Educação Física.
Desta forma, como avalia Wilpert (2005, pp. 56-57) “se inclusão significa garantia dos
direitos do cidadão, se a prática do futebol é utilizada intensamente para o lazer, sendo o lazer
um direito do cidadão”, deduz-se que o futebol tem um grande potencial de interação e
inclusão social.
Neste sentido, tendo-se a escola como um caminho para tomada de consciência para
inclusão social, o autor indaga qual a clientela alvo dessa educação inclusiva? Para ele a
resposta seria, não necessariamente, pobres, negros, pardos, crianças, idosos, mulheres,
homossexuais, portadores de incapacidades e deficiências físicas e mentais; mas aquela
82
desfavorecida economicamente ou alvo de estigmas sociais de toda ordem, originária da
periferia dos grandes centros urbanos e das zonas rurais.
Diante disso, Wilpert (2005) conclui que a inclusão social é a garantia da participação
do indivíduo em todo e qualquer ambiente social que o cerca. E sendo as escolinhas de futebol
um espaço contextual de ensino do futebol, segundo o autor, elas se apresentam como uma
possibilidade bastante interessante para o exercício da inclusão, da oportunidade, da garantia
dos direitos para todos.
Em outras palavras, quando falamos em questão social no esporte, devemos levar em
consideração a importância da atividade esportiva, que vem modificando a realidade de
milhões de crianças e jovens que vivem em estado de miséria e exclusão social por todo o
País.
Muitos projetos aproveitam o fato das crianças gostarem de alguma atividade para
mantê-las ocupadas, evitando que elas sejam desviadas para o mundo do crime. O mais
importante é transformar as crianças em cidadãos brasileiros.
Daí a constatação sobre o que afirma Wipert (2005) que a implantação de escolinhas
de futebol em comunidades carentes surge como uma garantia à acessibilidade e a inclusão
das crianças na sociedade e ainda como um instrumento valioso no combate às drogas e à
ociosidade entre os jovens.
Levando em consideração este princípio, o Jornal Imprensa Popular, de 17/05/2008,
publicou uma matéria em que o presidente da Federação de Futebol do Estado de Rondônia,
Heitor Costa, afirma que mesmo estando afastado da política partidária, há vários anos, não
perdeu seu ímpeto em participar das ações voltadas para a promoção da cidadania e da
inclusão social. De acordo com o Jornal acima, acreditando não existir outra alternativa para
“a construção de um futuro melhor e menos violento” que não seja a inclusão social, o
presidente da FFER advoga a idéia de que tanto os prefeitos como o próprio governo do
Estado podem, a um custo muito baixo, “espalhar escolinhas de futebol nas cidades onde a
exclusão social do jovem seja maior” promovendo, através dessas escolinhas, a inclusão
social.
83
[...] o desejo de Heitor é ver funcionando no vários municípios – e
especialmente em Porto Velho – várias escolinhas onde os alunos-atletas não
paguem nada por esta prestação de serviço social. Na opinião do presidente
da FFER, “enquanto as administrações não criar estrutura nas regiões
periféricas” poderiam utilizar aquilo que já existem, “como os diversos
campos de futebol de algumas agremiações” ou até terrenos baldios que
poderiam ser usados para esta prática (JORNAL IMPRENSA POPULAR,
2008, s/p).
Na opinião do presidente da FFER, o mais popular dos esportes entre os brasileiros
tem o poder de nutrir nas crianças e nos adolescentes que o praticam a esperança e a vontade
de uma carreira com a perspectiva de sucesso profissional e financeiro. Heitor reforça a
importância da prática do futebol destacando que, pela disciplina, ele promove a cidadania e,
conseqüentemente, a convivência comunitária e a inclusão social.
Afirmando que já houvera à disposição do prefeito Roberto Sobrinho para contribuir
com um programa nesses moldes, Heitor orienta que a prática da escolinha deveria ser uma
alternativa para o horário livre da escola e que poderia ser desenvolvida com cada grupo pelo
menos duas vezes por semana.
Na opinião do J.I.P (2008, s/p), o projeto de escolinhas imaginado por Heitor Costa
propunha um relacionamento estreito com as famílias do chamado estudante-atleta, através
dos dirigentes da escolinha, uma parceria com os pais desses meninos e adolescentes, onde
seria proporcionado um acompanhamento do desenvolvimento do garoto, seja como estudante,
como cidadão ou como jogador de futebol.
Entretanto, o presidente da FFER observa que o trabalho, nesse sentido, não precisa
ficar restrito à modalidade de futebol de campo, podendo também ser ampliado para o futebol
de salão. Na visão do dirigente, nestas escolinhas poderiam ser revelados jogadores para os
clubes profissionais de Rondônia e de outros Estados. Mas, segundo ele, o resultado mais
empolgante de um programa desse gabarito é dar aos jovens uma alternativa para a boa
convivência social. O negócio é buscar, na comunidade, meninos que apresentam problemas
de relacionamento com a sociedade, trazendo-os para a prática do futebol.
Mas o J.I.P (s/d) ratifica que Heitor Costa não perde as esperanças de ver empresas de
Rondônia apoiando, de forma mais decisiva, o futebol do Estado, principalmente em
iniciativas como as das escolinhas. Para ele, cada vez mais os consumidores passam a
84
prestigiar empresas que demonstram responsabilidade social, deixando de prestigiar aquelas
que “não estão nem aí com os problemas da comunidade”.
Para Heitor (2008, s/p):
O dia que os empresários de Rondônia descobrir que “investir no futebol
ajuda a melhorar a imagem da empresa”, a situação do esporte vai ser outra
no Estado. Mas, enquanto as empresas resistem a assumir o seu papel na
responsabilidade de revelar atletas e construir personalidades de cidadãos
conscientes, quem deve tomar as rédeas dessa iniciativa é o poder público. E
para isso, concluiu Heitor, “podem contar com toda ajuda possível da
Federação de Futebol do Estado de Rondônia”.
Diferente da visão acima, Mariano (2004), observa que o futebol se torna uma droga
social, quando a maioria da população volta sua atenção nos times (fantoches sociais) e
esquecem dos problemas, os quais impedem o crescimento do País. Assim como no futebol,
onde, muitas vezes, o poder econômico fala mais alto, essas pessoas são derrotadas pelo time
da elite do país.
Segundo Mariano (2004, s/p):
[...] os meios de comunicações por sua vez, dão mais importância para os
poderosos, para as religiões e mais ainda para o futebol. Ajudando assim, na
formação da imagem do Brasil como o país do futebol, do carnaval e da
bagunça geral. O Brasil é um país de muitos, mas não de todos! Enquanto o
Brasil exclui os menos favorecidos, não deixando eles participarem do seu
desenvolvimento econômico. Ele também vai sendo excluído das maiores
potências econômicas.
Em parte, a afirmação de Mariano (2004) é verdadeira, mas não se pode negar que o
Brasil tem futebol tipo-exportação, devido a grande quantidade de atletas talentosos
brasileiros que estão espalhados pelos quatro cantos do mundo, como mostra o gráfico 2 que
igualmente revela que foi e é através desse mesmo futebol que muitos conseguiram (e ainda
conseguem) vencer a pobreza em que viviam mergulhados e alcançaram o topo do mundo.
Ao nosso ver, o que mais importa, nos dias atuais, é o papel que o futebol tem
representado como importante instrumento de inclusão social e não apenas de alienação como
deixa transparecer Mariano (2004).
Diante disso, parece mais coerente a afirmação de Murad apud Chaves (2007), que:
85
[...] o futebol tanto é um misto de necessidades imediatas e práticas de luta como
expressão da alegria e arte popular. Há uma sintonia entre o individual e o coletivo
dentro e fora dos gramados. É um exemplo daqueles fenômenos complexos pelos
quais o conjunto das instituições se exprime, e o todo social pode ser observado.
Uma combinação de simbologias por meio das quais podemos estudar o Brasil,
revelando culturas e coletividades expressivas das condições humanas. O
imprevisível e a improvisação são marcantes no futebol, como a maioria das
resoluções populares.
Outro aspecto que muitos especialistas afirmam que as escolinhas de futebol têm
influenciado bastante diz respeito à formação do caráter dos jovens atletas. Embora a
finalidade da escolinha seja, teoricamente, a formação do atleta, no âmbito de sua tarefa, esse
parece ser apenas mais um dos muitos papéis que ela desempenha.
Tal constatação pode ser tirada das palavras dos atletas e ex-atletas entrevistados, que
apontaram como contribuição importante das escolinhas para a formação do seu caráter, a
não aceitação das várias formas de preconceito; o combate à desigualdade social; a
socialização e a integração dos atletas; a valorização pessoal e a formação do cidadão.
A opinião unânime dos atletas é a de que a escolinha foi de importância fundamental
no seu desenvolvimento, não apenas como atleta, mas principalmente como cidadãos. Um
exemplo disso é o atleta Luciano Paraíba, que afirma que, na escolinha, os jovens aprendem a
ter caráter, disciplina, educação e a seguir sua carreira de jogador profissional, que é o sonho
de todos que entram numa escolinha de futebol. Igualmente pensa o atleta Túlio Show que,
como a maioria, diz que: “[...] esse trabalho me ajudou a ser esse cara que sou hoje, de caráter
e responsabilidade.”
Um aspecto que deve ser observado, nesta análise, é que as escolinhas têm cada vez
mais ajudado a família no seu papel de contribuir com a formação moral e o caráter dos
jovens atletas do futuro. Aspecto esse que não deve ser confundido com uma troca de papéis,
pois essa é uma função nata e básica da família que não pode ser delegada a qualquer
instituição.
Ratificando a importância das escolinhas, todos os atletas afirmam que é nelas que o
aluno dá os primeiros passos não apenas para aprendizagem do futebol, mas também para
obtenção da disciplina, da orientação e formação do caráter, da dignidade, do respeito e da
86
moral que nas palavras de Suelio Lacerda “são virtudes de um futuro atleta e cidadão
vitorioso”.
De maneira geral, o que se observa na opinião dos entrevistados é que em todos os
depoimentos há unanimidade em ratificar o papel atribuído às escolinhas na formação não
apenas do atleta, mas do cidadão principalmente.
Diante dessa unanimidade e da positividade que permeia a opinião de todos os atletas
entrevistados em relação a sua própria formação dentro e fora do campo, fato este que nos
leva a concluir que as escolinhas de futebol têm uma participação essencial na formação do
caráter das crianças e jovens que delas fazem parte.
87
CONSIDERAÇÕES
Desde que o futebol foi trazido para o Brasil e se consolidou como a maior paixão do
povo brasileiro, muitas mudanças ocorreram em relação ao próprio comportamento de nossa
gente, e principalmente na forma de praticar este esporte.
O futebol, que se desenvolveu e tanto talento revelou nos campinhos de rua e de
várzea do Brasil, vem, ao longo das últimas décadas, sofrendo com a perda de espaço
provocada pela exploração imobiliária que é resultado do desenvolvimento urbano e faz com
que este esporte venha sendo praticado e desenvolvido no ambiente das escolinhas de futebol
que se espalham pelo País.
Apesar da constatação, por alguns, que boa parte destas escolinhas visa o lucro e não
exclusivamente o ensino e prática do futebol, como ocorre ainda que em menor escala nos
poucos campos que sobreviveram ao progresso urbano e servem, por exemplo, para o trabalho
sem fins lucrativos que realizamos junto a jovens de várias idades, parece que alternativa não
restava para o futebol brasileiro senão criar novos espaços onde se pudesse treinar e dar
prosseguimento ao trabalho de formação dos nossos futuros atletas.
Ao mesmo tempo em que as escolinhas foram surgindo, e com o advento da Lei Pelé,
que permitiu aos atletas serem donos de seu próprio passe e não mais os clubes, como
acontecia antes da referida lei, novos conceitos copiados principalmente do modelo tido por
muitos como burocrático, do futebol europeu, foram sendo adaptados ao futebol brasileiro na
passagem das décadas de 1990 para 2000, o que acabou provocando muitas mudanças na
forma de se fazer e jogar futebol no País.
Uma das mudanças apontadas é em relação ao próprio jeito de jogar futebol, que para
alguns já não é mais o mesmo de alguns anos atrás, quando por aqui se praticava o
chamado“futebol arte”, aquele cheio de malemolência, dribles desconcertantes e jogadas de
estética fora do comum, como as protagonizadas por Pelé e companhia na Copa do Mundo de
1970, no México, que foram responsáveis pelo grande crescimento do futebol nacional.
88
Outra mudança ocorrida foi com relação aos próprios atletas que antes se formavam e
se desenvolviam dentro dos seus clubes de origem e a eles passavam a servir durante muitos
anos de sua carreira e agora se formam nas escolinhas que, muitas vezes, formam os
jogadores e, em pouco tempo, negociam-nos (a preço de banana), via empresários ou por elas
próprias, para vários clubes interessados na aquisição de jovens talentos.
O reflexo da dissolução desse relacionamento fiel e duradouro que havia num passado
não muito distante, alguns afirmam que pode ser sentido pela produção de tão poucos craques
no futebol brasileiro na década atual, onde se pode destacar como exemplos destes poucos
atletas: Káká, Robinho, Ronaldinho Gaúcho e Nilmar.
O resultado disso é que os atletas que antes se criavam e davam como se diz dentro do
futebol “a vida pelo clube” e “jogavam por amor a camisa”, passaram a lutar por mais espaço
e melhoria para suas vidas em outras equipes espalhadas por toda parte além-fronteira,
deixando de lado a fidelidade e o apego sentimental, antes existente, em detrimento do seu
lado profissional, que passou a ser mais valorizado. Aspecto esse responsabilizado pelos
críticos a propalada Lei Pelé. Em outras palavras, aquela imagem do atleta que dava a vida
pelo clube, que jogava por amor a camisa foi substituída pelo atleta profissional que visava
não mais apenas o lado sentimental que tinha pelo clube, mas a sua melhoria financeira
enquanto profissional.
Embora alguns analistas, como Wilpert (2005) e Scaglia (1999) admitam que estas
mudanças têm haver com a visão distorcida de alguns pais que querem ver seus filhos ricos e
famosos e da política mercantilista empregada por alguns coordenadores destas escolinhas,
que pensando em levar vantagem financeira mal formam os atletas e já os negociam com
clubes em geral do exterior, acreditamos que de maneira geral as escolinhas têm cumprido o
seu papel na formação e desenvolvimento dos novos atletas do futebol brasileiro.
Esse papel executado pelas escolinhas ganha mais respaldo quando se sabe que, ao
contrário das outras que visam também o lucro, boa parte das escolas de futebol não está
preocupada com o lucro, mas sim com a formação do homem, do cidadão, como é o caso da
grande maioria das escolinhas de Campina Grande, em especial, as que estão sob a nossa
coordenação, que tantos atletas já formaram para o futebol brasileiro e internacional, a
exemplo de Celso Fio que jogou vários anos no futebol suíço, Suélio Lacerda que foi revelado
89
pelas escolinhas e acabou se sagrando bicampeão do mundo pelo São Paulo, Fábio Bilica e
Marcelinho Paraíba que já defenderam a Seleção Brasileira e atualmente brilham na Turquia e
Alemanha respectivamente, além de Glauber Gomes que atua em Portugal, Gilvanildo Hulk,
no Japão, Luciano Paraíba, atual campeão paraibano pelo Campinense Clube, Túlio Show,
que joga no Botafogo do Rio de Janeiro, e muitos outros que estão em atuação pelo mundo.
A prova da importância do papel que as escolinhas desempenharam e desempenham
na formação dos ex e novos atletas pode ser mostrada nos resultados da entrevista realizada
com os vinte atletas que passaram pelas escolinhas locais, que ratificaram a contribuição
destas para a sua formação como atleta, cidadãos de caráter, dignos de respeito e de um lugar
ao sol, que muitas vezes lhes é sonegado pela própria condição de vida que acabam herdando
da família, em geral, pessoas de baixa renda e sem a menor condição de oferecerem-lhes um
futuro melhor.
Além destas contribuições, outras foram consideradas igualmente de grande
importância como a orientação para uma vida baseada na disciplina e longe do uso de drogas
que tanto mal tem causado às famílias brasileiras de uma forma geral.
Diante de tais constatações, o que se pode observar é que se governo e sociedade se
unissem em torno de um projeto para disseminação de escolinhas pelo Brasil afora, muitos
dos problemas que hoje o País enfrenta poderiam ser resolvidos. A longo prazo, muitos dos
recursos que atualmente são investidos no combate a criminalidade, a violência que campeia
solta e no uso de drogas cada vez mais desenfreado no País, poderiam estar sendo revertidos
para a formação de homens de bem e com um futuro melhor pela frente que não o de roubar,
matar e se prostituir como se vê nos dias atuais.
As escolinhas de futebol, se bem preparadas para orientar psicológica e
pedagogicamente os jovens, poderão se transformar num espaço não apenas para produção de
grandes atletas, mas também e principalmente de homens que não mais iriam superlotar os
presídios como se vê agora e sim os estádios de futebol do mundo com o orgulho de serem
considerados os melhores do mundo não apenas no futebol, mas na vida.
90
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, P. e DIDONÊ, D. Bate-bola na escola. Escola on-line. Ed. 192 - mai/2006.
Disponível em <http://revistaescola.abril.com.br/edicoes/0192/aberto/mt_129542.shtml>.
Acesso em 10/01/2008.
BELLO, J. L. de P. Metodologia Científica. Pedagogia em Foco. Rio de Janeiro – 2004.
Disponível em <http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/met01.htm.> Acesso em 20/12/2007.
BIELINSKI, R. P. Escolinha de futebol: ensino com emoção. Rio de Janeiro: Grupo
Palestra Sport, [S.d.], 136 p.
CARVALHO, W. Fábrica de “craques” leva o futebol ao fundo do poço. In. Jornal A
Nova
Democracia,
ano
I,
nº
3,
2002.
Disponível
em:
<
http://www.anovademocracia.com.br/index.php/Fabrica-de-craques-leva-o-futebol-ao-fundodo-poco.html>. Acesso em 10/07/2008.
CHAVES, I. Lucro não tem time nem honra. A Nova Democracia. Vol. V, nº 34, abr.2007.
Disponível em: <http://www.anovademocracia.com.br/index.php/Lucro-nao-tem-time-nemhonra.html>. Acesso em 28/05/2008.
COSTA, H. Heitor insiste: o futebol é um instrumento de responsabilidade social.
Entrevista concedida ao Jornal Imprensa Popular, Porto Velho, sáb, 17/maio/2008.
Disponível
em:
<http://www.imprensapopular.inf.br/see.asp?codnews=1793&categoria=entrevista>. Acesso
em 17/05/2008.
DANTON, J. Metodologia Científica. Pará de Minas – MG: VirtualBooks, 2000/2002.
DECCACHE-MAIA, E. Esporte e juventude no Borel. Revista Estudos Históricos, 1998.
FOUCAULT, M. Vigiar e Punir. Petrópolis – RJ: Vozes, 1977.
FLORENZANO, J. P. Afonsinho & Edmundo: a rebeldia no futebol brasileiro. São Paulo:
Musa, 1998.
GUEDES, D. W. Drogas: problema meu e seu. Editora Alex Lacerda: João Pessoa/PB,
2002.
GUIA DO ATLETA. 2º Campeonato de Futebol Infantil de Favelas do Rio de Janeiro.
Rio de Janeiro: Bento Rubião, 1995.
INSTITUTO QUALIBEST. Conheça as metodologias de pesquisa trabalhadas pelo
Instituto
QualiBest.
24/07/2008.
Disponível
em:
<
http://www.institutoqualibest.com.br/metodologia/metodologias.shtm. Acesso em 24/06/2008.
LAKATOS, Eva. M. e MARCONI, Marina de A. Metodologia Científica. 4ª ed. São Paulo:
Atlas, 2006.
91
LIMA, M Um garoto de R$ 600 mil. In: A UNIÃO, João Pessoa/PB, 22 e 23 dez/2007, p. 17.
LOPES, C. Esporte traz esperança a crianças pobres. Diário de Pernambuco, p. 4,
26/dez/1999, Recife – PE.
MARIANO, G. de F. O futebol, a política e a religião como drogas sociais. YB News,
20/10/2004.
Disponível
em:<://www.ybnews.org.br/?system=news&action=read&id=498&eid=231>. Acesso em
28/05/2008.
MATTAR, F.; PRUSAK, L. Gerenciamento estratégico da informação: aumente a
competividade e a eficiência de sua empresa utilizando a informação como ferramenta
estratégica. Rio de Janeiro: Campus, 1999.
MELO, M. L. Futebol também se aprende na escola. João pessoa – PB, CFT, 2004.
__________. Projeto Atleta Cidadão do Futebol. Campina Grande – PB, 2007.
MURUKAWA, J. T. Metodologia Científica.
<www.qualiesporte.com.br>. Acesso em 20/12/2007.
26/09/2007.
Disponível
em
NASCIMENTO, E. A. Jogando com Pelé. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974.
NERY, A. L. Brasil exporta mais atletas, mas ganha menos. Portal de Notícias G1,
30/07/2007,
São
Paulo.
Disponível
em:
<http://g1.globo.com/Noticias/Economia_Negocios/0,,MUL76511-9356,00.html>. Acesso em
09/05/2008.
NEVES, J. L. Pesquisa qualitativa: características, usos e possibilidades. Cadernos de
Pesquisa em Administração. São Paulo, v. 1, nº 3, 2º sem/1996.
OLIVEIRA, S. B. S. de S. V. de. Escola de Futebol. In: Revista Carta Capital, 2006.
Disponível em <http://www.cartacapital.com.br/edicoes/2006/10/415/5443/>. Acesso em
10/01/2008.
PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS. Educação Física. Ministério da Educação
e Cultura. Secretaria de Ensino Fundamental. Brasília, DF: MEC/SEF, 1998.
PERON, H. Futebol brasileiro: a fonte está secando. Papo de Bola – O SITE. 13/mar. 2006.
Disponível em: < http://www.papodebola.com.br/futebolnarede/20060313.htm>. Acesso em
09/05/2008.
REZER, R.; :SHIGUNOV, V. Reflexões acerca da prática pedagógica em escolinhas de
Futebol e futsal a partir da leitura e compreensão de Contextos específicos. Revista da
Educação Física/UEM Maringá, v. 15, n. 1, p. 43-51, 1. sem. 2004
RICHARDSON, R. R. Pesquisa Social: métodos e técnicas. 2 ed. São Paulo: Atlas, 1999.
SANTOS, L. Campeões de exemplo para o Brasil. Flogão.com.br, 11/12/04. Disponível em:
<http://www.flogao.com.br/Modulos/Flogs/ReadNews.aspx?id=98797&idflog=137936>.
92
Acesso em 17/05/2008.
SCAGLIA, A. J. O Futebol que se aprende e o futebol que se ensina. Dissertação de
Mestrado. Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, 1999.
SILVA, E. L.; da. MENEZES, E. M. Metodologia da pesquisa e elaboração de dissertação.
Universidade Federal de Santa Catarina, 2001. (Editora).
SPOZATI, A. Exclusão social e fracasso escolar. Vol. 17, No 71 (2000). Disponível em <
http://www.emaberto.inep.gov.br/index.php/emaberto/article/view/107>.
Acesso
em
20/05/2008.
STEINBRUCH,
B.
O
futebol
e
escola.
Disponível
<http://www.universia.com.br/html/noticia/noticia_clipping_dadaj.html>.
acessado
05/02/2007.
em
em
STREAPCO, J. P. apud Araújo e Didonê. Bate-bola na escola. Escola on-line. Ed. 192 mai/2006.
Disponível
em
<http://revistaescola.abril.com.br/edicoes/0192/aberto/mt_129542.shtml>.
Acesso
em
10/01/2008.
TEIXEIRA, M. B. Empoderamento de idosos em grupos direcionados à promoção da
saúde. [Mestrado] Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública; 2002. 105 p.
TRINDADE, A. A. Comentário sobre pesquisas feito sobre o relatório de aprendizagem
02 na ferramenta Portfólio (Renata A Fonseca Del Castillo) do Teleduc. 2003.
VALENTIN, R. B.; COELHO, M. Os sentidos das escolinhas de futebol. Formação
Profissional em Educação Física e o Processo Civilizador. IX Simpósio Internacional
Processo Civilizador. UNESP, Ponta Grossa – PR. s/d.
ZALUAR, L. A. Escolinhas de futebol. Agora Esportes, 28, fev. 2008. Disponível em:
<http://www.agoraesportes.com.br/html/colunistas_sec.asp?not=19269>.
Acesso
em
10/05/2008.
WILPERT, R. A. O futebol como agente de inclusão e interação social: um estudo de caso
sobre as escolinhas de futebol de Florianópolis. Dissertação de Mestrado. Florianópolis –
SC. 2005.
93
APÊNDICE
94
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
PRO-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E ENSINO – PPGE
MESTRADO EM EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Eu, Manoel Luis Melo, aluno do Mestrado em Educação de Jovens e Adultos da Universidade
Federal da Paraíba, visando dar continuidade a mais uma etapa de minha dissertação, venho
solicitar a sua colaboração no sentido de responder as perguntas abaixo, pelas quais desde já
agradeço a gentileza.
APÊNDICE 1
1) Qual a sua idade, em que equipe joga atualmente e a que País pertence?
2) Em quais aspectos as escolinhas de futebol foram importantes para sua vida? Justifique.
3) Qual o papel das escolinhas de futebol no combate às drogas?
4) Qual a contribuição das escolinhas no combate a exclusão social?
5) Qual a importância das escolinhas de futebol para a formação do caráter do atleta?
95
ANEXO
96
O JOGADOR BRASILEIRO E SUAS ORIGENS
Da “pelada” surge o nosso jogador. Entregue a própria sorte, vai desenvolvendo suas
habilidades, até aparecer uma oportunidade de treinar no clube”.
O aprendizado começa bastante cedo. O primeiro presente do brasileiro é uma bola e por ação
da gravidade ela fica no solo. Talvez por comodidade ou facilidade acharam melhor
impulsioná-la com o pé.
Como vimos, na mais tenra idade, começa o gosto pelo futebol, favorecido ainda mais por
uma bola que não quica a bola de meia. É isso mesmo, uma meia cheia de pano e costurada à
mão. É a bola que os garotos mais humildes encontram para jogar.
Terrenos baldios, praças, ruas, pátios e outros espaços podem servir de lugar para a iniciação
do nosso futebol.
Não é preciso muita coisa para se praticar o futebol. Bastam quatro tijolos, quatro camisetas,
quatro sapatos ou qualquer objeto que forme o gol. A bola pode ser moderna, passando pela
bola de meia, chegando às bolas de papel e chapinhas de garrafa. O que o garoto quer é
movimento, liberar as energias é uma necessidade, e o gol uma tentação irresistível.
Este trabalho de pesquisa bibliográfica está restrito à análise dissertativa referente a
metodologia da iniciação no futebol, onde a realidade esportiva do futebol é excessivamente
competitiva, na qual as crianças estão expostas às variáveis dos aspectos físicos, técnicos e
táticos que operam sobre o desempenho esportivo.
Em relação aos aspectos físicos, as atividades aeróbicas são as mais indicadas para esse nível
de idade. Trabalhos multilaterais de longa duração e pouca intensidade.
No processo ensino-aprendizagem há uma preparação multilateral do indivíduo, trabalhos de
coordenação geral, e a preocupação com o tempo de competição a nível escolar, de forma
reduzida ou informal.
A iniciação ao futebol é ideal para adquirir habilidades coordenativas motoras básicas. A
princípio, o treino técnico deve objetivar a aprendizagem de movimentos e não o gesto
técnico específico do futebol.
A estratégia ou planejamento tático deve ser simples, sem muitas variações de jogo
(defensivas e ofensivas), podendo ser em forma de jogos reduzidos ou elementos e objetivos
essenciais ao jogo formal.
97
A ESCOLINHA
A escolinha de futebol surgiu como conseqüência da redução das condições naturais para a
prática livre e espontânea do futebol, com a formalização de uma atividade informal,
decorrendo daí a origem de dois tipos de organização, cada uma dedicada a um intuito
específico: a seletiva e a não-seletiva.
A escolinha seletiva é aquela que tem por objetivo a promoção de jogadores, o que indica
que se trabalhem com crianças que demonstrem um potencial próprio, uma aptidão a ser
desenvolvida.
A não-seletiva já se concentra em possibilitar a prática do futebol a qualquer criança, sem
o pré-requisito da sua habilidade inata para o esporte.
O PROFESSOR
Já foram vistos alguns aspectos que dizem respeito ao professor de Educação Física em
atuação na escolinha de futebol, e ficou muito claro que se trata de um profissional de alta
especialização.
O professor que atua como orientador na escolinha de futebol, além de ser um especialista em
futebol precisa entender de evolução biopsíquica do ser humano, pois vai lidar com crianças
ainda em formação.
O ESPORTE NA ESCOLA
A importância da atividade física na educação dos jovens é reconhecida de há muito. O
esporte contribui para o desenvolvimento físico harmonioso da criança, preparando-a
fisiologicamente para o esforço, auxilia no seu equilíbrio físico e psíquico, participando da
formação de sua vontade, do seu caráter, favorecendo assim a sua adaptabilidade social.
A educação moderna deve preparar a criança para as atividades do dia-a-dia quando for jovem
e/ou adulto, para que ao longo de sua vida, ela pratique esporte e venha a adquirir o hábito e
gosto pelo esporte desde a infância.
98
Muito se fala no futebol brasileiro sobre formação de jogadores, mas pouco se sabe
como fazer. Nosso futebol é vítima de um pequeno erro de interpretação, pensa-se que
formação seja sinônimo de captação.
Há uma valorização exacerbada na detecção de "talentos" precoces. Obviamente
devido ao fato de a grande maioria dos envolvidos acreditar cegamente na perspectiva de que
jogar bem futebol seja um dom divino ou mesmo uma aptidão inata.
A cena que vem à mente como analogia a esse fato é a Serra Pelada dos idos dos anos
80, em que um verdadeiro formigueiro humano escavava o solo para achar ouro.
Um observador atento verá que o mesmo acontece no futebol. Um número cada vez
maior de "empresários" e procuradores de jogadores saem pelo Brasil aliciando menores e
iludindo pais, prospectando jovens e encaminhando-os para clubes maiores, para futuras
negociações, de preferência com o exterior.
Porém esses empresários só existem porque os clubes também pensam da mesma
forma tacanha.Ou seja, abrem as portas para receber meninos captados de todas as partes do
Brasil, a troco de porcentagem nas possíveis futuras negociações.
Aí termina a função do "empresário" - um intermediário - agora ele só precisa dar um
chinelinho, um tênis, um celular para agradar de vez em quando os seus meninos, pois é o
clube que arcará com todas as despesas de alimentação, moradia, treinamento, transporte,
algumas vezes com escola.
E se houver uma negociação, o "empresário" leva em média 30% do valor da
empreitada. É um negócio da China, como se diz popularmente. Afinal, ele não tira do bolso
30% todo mês para ratear as despesas no investimento.
É como o intermediário na agricultura que não planta, não se preocupa com o tempo,
não sofre com as geadas, não tem perdas, só ganhos, sem preocupação com todo o processo
do plantio à colheita. Sua preocupação está nas vendas.
Não estou querendo dizer que estes "empresários" estejam errados, só acho que eles
existem, volto a repetir, porque os clubes não formam. Não sabem formar, não sabem gerir
um processo pedagógico de aprendizagem do futebol e se tornam reféns.
Não conseguem porque não acreditam que futebol se ensine. Para os clubes, o que está
implícito em seus discursos e ações é a fala de que, se ele captar bem (achar a pepita), tudo
está resolvido, pois é só deixar o menino talentoso confinado "engordando" nos alojamentos,
colocá-lo na vitrine e, à medida que aflora o seu talento nato, espera uma boa negociação.
Há clubes e aventureiros que gastam milhões construindo estruturas suntuosas,
alojando quase uma centena de jovens potenciais jogadores à espera de peneirarem jóias raras
e enriquecerem com apenas uma venda.
Porém esses investidores, por ignorarem o conhecimento, não gastam nada na
formação de seus treinadores, ou melhor, até gastam, pagando altos salários a ex-jogadores
que nunca estudaram o processo de formação, que não entendem nada de pedagogia ou
mesmo de desenvolvimento humano, mas têm o capital simbólico que o meio acredita
(reforçando e reproduzindo o discurso acima mencionado). Resultado: abrem falência muito
rapidamente. Manter uma estrutura de formação é muito cara, e o retorno é sempre em longo
prazo.
Download

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA