artigo técnico Fernando J. T. Estêvão Ferreira[1] Programa Informático para Projecto de Enrolamentos de Motores de Indução Trifásicos Resumo serviços de manutenção curativa Os motores de indução são utilizados deve-se, em parte, à danificação em mais de 90% dos sistemas eléctricos do núcleo ferromagnético estatórico de força motriz, sendo estes últimos durante a extracção dos enrolamentos responsáveis pelo consumo de cerca danificados e à alteração indevida das de 70% da energia eléctrica consumida características dos enrolamentos, na indústria dos países desenvolvidos. o que se imputa, na maioria dos casos, Tipicamente, os motores de indução à falta de conhecimentos técnicos. são reparados 2 a 4 vezes ao longo do Neste artigo, descrevem-se as principais seu tempo de vida. Diversos estudos características de um programa confirmam que a aplicação de práticas informático desenvolvido de reparação inadequadas aos moto- especificamente para projectar e avaliar res de indução conduz, em média, à os enrolamentos dos motores redução do seu rendimento em 1% e, de indução trifásicos de baixa tensão consequentemente, ao aumento do seu e assistir a realização de um teste custo do ciclo de vida. A nível mundial, normalizado para controlo das perdas estima-se que a aplicação de práticas de no núcleo ferromagnético estatórico. reparação inadequadas conduz a perdas Devido à facilidade de utilização e ao energéticas adicionais de aproximada- ambiente gráfico, o programa descrito mente 40 TWh/ano, que se traduzem neste artigo apresenta-se como uma em emissões adicionais de 20 Mton/ ferramenta técnico-didáctica, ano de CO2. A fraca qualidade dos com aplicação no ensino técnico e nas actividades de manutenção [1] Instituto Superior de Engenharia de Coimbra; Instituto de Sistemas e Robótica de Coimbra; [email protected] 8 curativa de motores eléctricos. M A N U T E N Ç Ã O N. o 8 4 • 1 º T r i m e s t r e d e 2 0 0 5 artigo técnico Palavras Chave Enrolamentos Trifásicos, Motores de Indução, Rebobinagem, Controlo de Qualidade, Ensino, Projecto, Software. I. Introdução Os motores eléctricos consomem, em média, metade de toda a energia eléctrica consumida nos países desenvolvidos. Na União Europeia (UE), cerca de 70% da energia eléctrica consumida pelo sector industrial deve-se aos sistemas eléctricos de força motriz, dos quais 90% integram motores de indução trifásicos (MIs). A larga utilização dos MI deve-se às suas características peculiares tais como simplicidade de construção, reduzido custo de fabrico, elevada robustez e rendimento aceitável. As aplicações típicas(1) dos MIs incluem bombas, compressores, ventiladores, moinhos, elevadores, tapetes rolantes, etc. O aumento do rendimento dos MI apresenta-se como um dos principais meios de redução das perdas energéticas. Na indústria, dependendo de diversos factores(2), um MI consome tipicamente uma quantidade anual de energia que corresponde a 5-10 vezes o seu preço de compra o que, durante toda a sua vida útil de 12 a 20 anos(3), pode perfazer 60 a 200 vezes o seu preço de compra – O investimento inicial é pouco significativo quando comparado com o custo de funcionamento do MI que, além da energia consumida, integra também os custos de manutenção. Este facto justifica a importância da análise do custo do ciclo de vida(4) (LCC) do MI e não apenas o seu custo inicial ou, quando este avaria, o custo do serviço de manutenção curativa (SMC), vulgo reparação [1]. Da análise de diversos estudos realizados em laboratórios independentes, apurou-se que, na sua grande maioria, os SMCs aplicados aos MIs conduzem, em média, à redução do rendimento em 1%(5), podendo ainda ocorrer degradações significativas da fiabilidade e do desempenho geral [1]. Dado que numa fábrica um elemento motriz inactivo, pode afectar todo o processo produtivo e causar prejuízos avultados, a maior exigência feita aos SMCs é que a sua duração seja o mais reduzida possível o que, associado à preocupação da minimização do custo do serviço, à falta de exigência de qualidade por parte dos clientes, à falta de conhecimentos técnicos, à falta de material didáctico actualizado, à falta de software de cálculo/projecto e à incapacidade financeira para adquirir equipamentos mais modernos, culmina, na maioria dos casos, na utilização de práticas menos correctas que podem conduzir a uma redução significativa do rendimento e da fiabilidade originais dos MIs. A redução do rendimento e da fiabilidade deve-se, essencialmente, à danificação do núcleo ferromagnético estatórico durante a extracção dos N. o 8 4 • 1 º T r i m e s t r e d e 2 0 0 5 enrolamentos danificados (devido ao uso de temperaturas e forças de tracção excessivas), à substituição incorrecta dos rolamentos e à alteração indevida das características(6) dos enrolamentos [1]. Estima-se que na UE o mercado dos SMCs de MI, apesar de parecer irrelevante, representa em unidades 2 a 3 vezes o mercado de MIs novos. Tipicamente, os MI são reparados 2 a 4 vezes ao longo do seu tempo de vida, tendo os SMCs um papel muito importante na manutenção do seu rendimento e da sua fiabilidade. É bastante provável que, actualmente, muitas empresas possuam grande parte dos seus MIs a operar com um rendimento abaixo do original e, consequentemente, com custos de funcionamento adicionais significativos [1]. Para evitar tais cenários, é indispensável que, através do uso de técnicas, equipamentos e materiais adequados, bem como de ferramentas informáticas de projecto/cálculo, se assegure um SMC de elevada qualidade que, sem aumentos significativos do seu tempo de execução, mantenha ou melhore o rendimento e a fiabilidade originais dos MIs. Tais exigências poderão conduzir ao aumento do preço do serviço mas, dependendo de diversos factores, poderá ser vantajoso para o utilizador devido à possível redução do LCC do MI [1]. Relativamente ao impacto energético e ambiental, estima-se(7) que, em 2015, nos sectores industrial e terciário, os SMCs de baixa qualidade serão responsáveis por um consumo adicional de energia eléctrica (ou potencial de poupança) de 0.1 TWh/ ano a nível nacional, 5.6 TWh/ano a nível da UE e de 60 TWh/ano a nível mundial(8), conduzindo a emissões adicionais de CO 2 de 0.05 Mton/ano, 2.8 Mton/ano e 30 Mton/ano, respectivamente. Estes valores, ao actual preço médio europeu da energia eléctrica, traduzem-se anualmente em encargos adicionais de 6 700 000 , 380 000 000 e 4 071 000 000 a nível nacional, da UE e mundial, respectivamente [1][2]. Em 2002, a venda de variadores electrónicos de velocidade na UE atingiu 1.2 milhões de unidades, sendo na sua grande maioria do tipo inversor por fonte de tensão com modulação por largura de impulso (VSI-PWM). Este tipo de alimentação pode resultar na redução do rendimento e da fiabilidade dos MIs. No caso dos MIs velhos (ou concebidos para funcionarem com alimentação sinusoidal) a alimentação com VSI-PWM pode levar à sua falha precoce, ou mesmo imediata. No sentido de minimizar ou evitar tais efeitos, os SMCs devem contemplar, entre outros aspectos, o melhoramento das características dos enrolamentos, do sistema de isolamento e dos rolamentos [1]. Pelo exposto, e relativamente a Portugal, urge a criação mecanismos de formação técnica na área dos SMCs (seminários, cursos técnicos, etc.), bem como a produção de material didáctico em português(9) M A N U T E N Ç Ã O 9 artigo técnico (livros, brochuras, programas informáticos, etc.) cuja abordagem seja rápida e fácil [1]. Na continuidade do esforço que a UE tem vindo a fazer ao nível da formação/informação dos técnicos dos SMCs [2], foi desenvolvido um programa informático de projecto para enrolamentos de motores de indução trifásicos – denominado BobiSoft(10) – que se enquadra nas ferramentas de apoio ao ensino e ao projecto técnico [1]. II. Descrição Geral do Programa Desenvolvido O BobiSoft (Fig.1) é um programa informático em português e com ambiente Windows, o que permite a fácil e rápida compreensão do seu funcionamento. Fig.2 – Painel de inserção dos dados eléctricos e mecânicos do MI. Os dados mecânicos são introduzidos no sub-painel da Fig.3. Existem dados obrigatórios e facultativos. Os dados obrigatórios são efectivamente utilizados e imprescindíveis nos cálculos realizados. Os dados facultativos são apenas informativos. Todos os dados são guardados num ficheiro com uma extensão específica (*.bob). Dentro dos dados obrigatórios existem os comuns e os dados específicos dos projectos original e novo. Os dados comuns dizem respeito essencialmente às dimensões físicas do estator. Todavia, relativamente ao ventilador, rolamentos e tipo de rotor, é possível inserir dados diferentes para os projectos original e novo (Fig.4a). Os sub-painéis que dizem respeito aos dados do projecto original e novo têm cores diferentes (azul e verde). Fig.1 – Painel de entrada do programa desenvolvido (BobiSoft). O BobiSoft foi desenvolvido especialmente para o projecto e análise comparativa de enrolamentos de MIs trifásicos de baixa tensão, permitindo a comparação de dois projectos em simultâneo (original e novo). Tem ainda um painel para realizar todos os cálculos necessários ao teste das perdas no ferro (segundo a norma EASA(11), Tech. Note No. 17) cujo objectivo é avaliar se, após a extracção dos enrolamentos, ocorre degradação do núcleo ferromagnético estatórico. O BobiSoft suporta até 96 ranhuras (ou cavas) e 20 pólos, com possibilidade de adoptar até 20 grupos de bobinas em paralelo(12). Este programa não permite o projecto de enrolamento fraccionários nem admite bobinas com diferente número de espiras. Em termos de cálculo, não é contemplado o efeito da saturação do núcleo ferromagnético. O BobiSoft está programado para alertar o utilizador sempre que os dados inseridos não se encontrem dentro da gama de valores típicos, sejam fisicamente impossíveis, ou sejam matematicamente incompatíveis. A inserção dos dados é feita no painel apresentado na Fig.2. 10 Fig.3 – Sub-painel para inserir os dados mecânicos. Relativamente às ranhuras, é possível escolher a sua forma e introduzir as respectivas dimensões (Fig.4b). (b) (a) Fig.4 – (a) Sub-painel para introdução dos dados relativos à ventilação, tipo de rotor e rolamentos; (b) Sub-painel para introdução das dimensões das ranhuras. M A N U T E N Ç Ã O N. o 8 4 • 1 º T r i m e s t r e d e 2 0 0 5 artigo técnico É ainda possível definir as seguintes variáveis (Fig.5a): • Massa volúmica do cobre dos condutores; • Condutividade do cobre dos condutores; • Temperatura de funcionamento interna do motor; • Constante da equação da f.e.m. do enrolamento; • Factor de empacotamento do núcleo; • Comprimento adicional das testas das bobinas. O utilizador pode optar entre 6 tipos diferentes de enrolamentos trifásicos: 1. Enrolamento excêntrico de alojamento simples I; 2. Enrolamento excêntrico de alojamento simples II; 3. Enrolamento excêntrico de alojamento duplo; 4. Enrolamento concêntrico de alojamento duplo; 5. Enrolamento concêntrico de 2 camadas; 6. Enrolamento concêntrico de 3 camadas. Os únicos enrolamentos que permitem encurtar o passo são os de alojamento duplo. O programa permite ainda considerar até 20 condutores em paralelo com secções iguais ou diferentes. Após a inserção dos dados (originais e/ou novos), o programa permite o cálculo dos seguintes valores (Fig.5b): • Factores de enrolamento até à 17ª ordem; • Fluxo por pólo e fase no entreferro; • Indução magnética máxima no entreferro; • Densidade de corrente nos condutores; • Comprimento dos condutores por fase; • Resistência dos condutores por fase; • Perdas no cobre por fase; • Distorção harmónica total; • Factor de enchimento das ranhuras; • Balanço do cobre; • Peso total do cobre; • Índice geral de benefícios. (b) (a) Fig.5 – (a) Sub-painel para introdução de dados genéricos; (b) Sub-painel para visualização dos valores calculados. N. o 8 4 • 1 º T r i m e s t r e d e 2 0 0 5 As grandezas magnéticas podem contemplar opcionalmente o efeito da abertura das ranhuras (Fig.5a). A distorção harmónica total espacial da força magnetomotriz (f.m.m.) no entreferro traduz a relação entre os factores de enrolamento diferentes do fundamental e o factor de enrolamento fundamental. Quanto menor for este parâmetro melhor será o enrolamento do ponto de vista da distribuição da f.m.m. no entreferro, i.e., a sua curva de variação espacial aproxima-se mais de uma sinusóide (curva ideal). O factor de enchimento das ranhuras é dado pelo quociente entre a secção total do cobre nelas alojado e a sua secção útil. Para um mesmo número de espiras, quanto maior for este parâmetro menores serão as perdas por efeito de Joule no cobre, o que conduz ao aumento do rendimento e da fiabilidade do MI. O balanço do cobre é dado pelo quociente entre a quantidade de cobre nas testas (ou cabeças) das bobinas (não útil) e a quantidade de cobre alojada nas ranhuras (útil). Quanto menor for este parâmetro maior será o rendimento e a fiabilidade do MI. O índice geral de benefício é um parâmetro que relaciona a distorção harmónica total espacial da f.m.m. no entreferro com o volume e o balanço do cobre. Este parâmetro permite uma análise rápida do impacto que as alterações introduzidas têm no desempenho geral do enrolamento. Quanto maior for este parâmetro melhor será o desempenho do MI. No cálculo dos parâmetros do enrolamento novo, o programa assume por defeito que se pretende manter a mesma indução magnética máxima no entreferro (limitação magnética do MI [4]) e a mesma densidade de corrente nos condutores (limitação térmica do MI [4]) ou a mesma resistência dos enrolamentos. Todavia, o utilizador pode forçar a alteração desses parâmetros. Com base nestes pressupostos, e tendo em conta os restantes dados introduzidos (ex.: tensão, corrente, etc.) o programa calcula o número de espiras por fase, o número de bobinas por fase, o número de espiras por bobina e a secção de condução aconselhada para manter a mesma densidade de corrente ou as mesmas perdas no cobre. Como já foi referido, o programa assume que as bobinas têm todas o mesmo número de espiras, não obstante ser possível implementar bobinas com número de espiras diferentes sem violar a simetria do enrolamento [4]. O painel de visualização gráfica e numérica permite uma análise global dos resultados finais dos projectos original e novo (Fig.6). No sub-painel inferior do painel da Fig.6 pode-se visualizar a curva da f.m.m. no entreferro. Neste subpainel é possível visualizar simultaneamente as curvas da f.m.m. no entreferro dos enrolamentos original e novo. É ainda possível visualizar as curvas dos campos pulsantes e das harmónicas da f.m.m.. Para fins didácticos, o utilizador pode incrementar a variável tempo e visualizar a evolução temporal dessas mesmas curvas. Neste sub-painel exibe-se ainda o valor M A N U T E N Ç Ã O 11 artigo técnico Fig.9 – Esquema numérico das bobinas do enrolamento novo. Fig.6 – Painel de visualização gráfica e numérica dos resultados. máximo da f.m.m. no entreferro e o valor estimado da corrente de magnetização. No painel de visualização gráfica e numérica (Fig.6) é ainda possível visualizar o esquema circunferencial (Fig.7), explanado (Fig.8) e numérico (Fig.9) das bobinas e suas ligações. Os esquemas circunferencial e numérico permitem aos rebobinadores uma fácil e rápida interpretação da posição das bobinas no estator e das ligações entre elas. (a) (b) (c) No diagrama circunferencial, de uma forma geral, quanto maior for a área interna não ocupada pelos traços que representam as bobinas, menores serão as perdas no cobre. Para além da possibilidade de se visualizar passo-a-passo a construção virtual dos enrolamentos, pode-se ainda adicionar 180º eléctricos à posição dos enrolamentos de cada fase, com vista à optimização da disposição relativa das testas (ou cabeças) das bobinas dos enrolamentos das 3 fases. No painel da Fig.6, os valores inseridos e calculados mais relevantes dos enrolamentos original e novo são exibidos simultaneamente para facilitar a análise comparativa. Sendo uma das principais causas da degradação do rendimento dos MIs após a rebobinagem, o impacto do processo de extracção dos enrolamentos danificados nas perdas do núcleo ferromagnético deve ser controlado. Para tal pode ser utilizado o teste das perdas no ferro (núcleo ferromagnético estatórico), segundo a norma EASA. Com o objectivo de facilitar a realização dos procedimentos e cálculos definidos na referida norma, o BobiSoft integra um painel específico que já incorpora a avaliação final do estado do núcleo. Esta avaliação tem por base a variação da temperatura e das perdas do núcleo ferromagnético estatórico sob determinadas condições, antes e após a extracção dos enrolamentos (Fig.10). Fig.7 – Esquema circunferencial das bobinas do enrolamento: (a) original (concêntrico de 2 camadas); (b) novo (excêntrico com alojamento duplo e passo encurtado a 80%); (c) novo com grupos paralelos. (a) Fig.10 – Painel de apoio à realização do teste das perdas no ferro. (b) Fig.8 – Esquema explanado das bobinas dos enrolamentos: (a) original (concêntrico de 2 camadas); (b) novo (excêntrico com alojamento duplo e passo encurtado a 80%). 12 O Bobisoft permite imprimir relatórios automáticos com os dados do projecto, os esquemas numéricos, os esquemas circunferenciais, as curvas da f.m.m., os dados do ensaio das perdas no ferro e os dados do cliente/serviço. M A N U T E N Ç Ã O N. o 8 4 • 1 º T r i m e s t r e d e 2 0 0 5 artigo técnico III. Exemplo de Aplicação IV. Conclusões Como exemplo de optimização dos enrolamentos trifásicos, realizou-se a substituição de um enrolamento concêntrico de 2 camadas (Fig.7a) por um enrolamento excêntrico de alojamento duplo e passo encurtado a 80% (Fig.7b). Os resultados obtidos são apresentados na Tabela I. As empresas do sector secundário e terciário são fulcrais no processo de transformação dos SMCs uma vez que a qualidade da oferta depende da exigência da procura. Os SMCs não têm necessidade de investir na qualidade se os clientes não a exigem. Os utilizadores devem tomar consciência dos benefícios técnico-económicos que advêm dos SMCs de elevada qualidade. Devem mudar a linha de exigência típica “o mais rápido possível, ao menor custo” para “rápido, com qualidade, mesmo que um pouco mais caro”. Devido aos recentes desenvolvimentos tecnológicos e suas implicações no funcionamento e na manutenção dos MI, os técnicos dos SMC enfrentam novos problemas, de resolução mais difícil, que, associados à crescente exigência no tecido empresarial a nível da fiabilidade e do rendimento dos equipamentos, os obrigam a adoptar uma postura de investimento contínuo a nível do equipamento e da formação técnica, bem como a estabelecerem critérios de controlo de qualidade mais rigorosos que provem clara e inequivocamente a qualidade do serviço. O BobiSoft apresenta-se como uma ferramenta informática de fácil utilização que, de uma forma rápida, permite realizar projectos de alteração ou correcção dos enrolamentos dos MIs avariados (projectos que demoram várias horas poderão ser realizados em poucos minutos), mesmo que o utilizador não possua conhecimentos técnicos aprofundados. Adicionalmente, facilita a realização do teste das perdas no ferro. A nível didáctico, este programa informático pode ser utilizado como laboratório virtual no projecto e comparação em termos electromagnéticos e energéticos dos diversos tipos de enrolamentos trifásicos existentes, incluindo a análise teórica dos campos girantes. Futuramente, serão integrados no BobiSoft outros painéis de apoio ao controlo de qualidade (quantificação do rendimento segundo as normas existentes, teste de alto potencial do sistema de isolamento, etc.), e alargada a sua aplicabilidade aos enrolamentos monofásicos, bifásicos, fraccionários e de armaduras de máquinas de corrente contínua. Também será integrada uma base de dados com os valores típicos da indução máxima no entreferro e da densidade de corrente nos condutores, em função da marca, classe, potência e número de pólos do MI. Tal informação possibilitará a identificação de rebobinagens anteriores incorrectas. Na opinião do autor, o desenvolvimento do BobiSoft é, a nível nacional, um passo muito significativo na modernização dos SMC, não só na perspectiva pedagógica (formação técnica), bem como ao nível do (re)projecto real de enrolamentos de motores de indução trifásicos de baixa tensão. Tabela I Tensão: 400 V Corrente nominal: 16.5 A Número de ranhuras: 96 Número de Pólos: 4 Diâmetro interno estatórico: 110 mm Diâmetro externo estatórico: 162 mm Comprimento estatórico: 162 mm Entreferro: 0.5 mm Enrolamento Tipo de enrolamento Passo médio Indução máxima no entreferro Densidade de corrente Perdas por efeito de Joule Factor de enchimento Distorção harmónica total Peso do cobre por fase Balanço do cobre Índice geral de benefícios Original Conc. 2 camadas 24 ranhuras 0.9 T 6.2 A/mm2 190 W 33 % 4.7 % 6.4 kg 98 % 15 Novo Exc. aloj. duplo 19 ranhuras 0.9 T 6.2 A/mm2 182 W 35 % 1.8 % 6.1 kg 78 % 49 Resumindo, o novo enrolamento conduziu a: • Redução de 62% na distorção harmónica total espacial da f.m.m. no entreferro, que se traduz na redução do ruído acústico emitido pelo MI e na redução das perdas extraviadas (stray load losses) [4]; • Redução de 93% da 5ª harmónica da f.m.m. (sequência negativa), que se traduz na redução das perdas no rotor, no aumento do binário e na redução da corrente de arranque [1]; • Redução de 5 % no peso do cobre dos enrolamentos, reduzindo o seu custo; • Redução de 4 % nas perdas por efeito de Joule, que se traduz no aumento do rendimento e, devido ao menor aquecimento, no aumento do tempo de vida do MI [1]; • Melhoria de 6% no factor de enchimento, que se traduz numa melhor dissipação térmica e, consequentemente, num aumento do tempo de vida do MI; • Redução de 20% no balanço do cobre, que se traduz no aumento da robustez mecânica das testas das bobinas e na redução da temperatura interna do MI devido à redução de cobre num meio de baixa condutividade térmica (ar). Face ao enrolamento original, o novo enrolamento, do ponto de vista teórico, conduz ao aumento do rendimento e da fiabilidade do MI. Poderá ainda conduzir à redução do ruído acústico emitido. N. o 8 4 • 1 º T r i m e s t r e d e 2 0 0 5 M A N U T E N Ç Ã O 13 artigo técnico V. Referências Notas [1] Ferreira, F.: “Técnicas Avançadas de Manutenção Curativa e Reabilitação de Motores de Indução Trifásicos de Baixa Tensão”, Tese de Mestrado, Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, 2002. [2] Almeida, A.; Ferreira, F.; Parasiliti, F.; Walters, D.: “Barriers Against Energy-Efficient Motor Repair – Final Report”, ISR-University of Coimbra, Motors Study Group, DGXVII, European Commission, 1999. [3]Chalmers, B.; Williamson, A.: “A.C. Machines – Electromagnetics and Design”, John Wiley & Sons Inc., New York, USA, 1991. [4] Cistelecan, M.; Demeter, E.: “Induction Motors with Low Copper Windings and Improved Performances”, IEEE, 1996. [5]Fernando, F; Almeida, A: “Electric Machinery Winding Design Software for Teaching and Rewinding”, 16th International Conference on Electrical Machines, Poland, 2004; (1) A gama de aplicações deste tipo de motores foi estendida com o uso dos variadores electrónicos de velocidade. (2) Potência nominal, factor de carga, preço da energia eléctrica, rendimento e número de horas de operação. (3)Depende da potência nominal, factor de carga, qualidade da manutenção/reparação, condições de operação (e.g. temperatura ambiente, qualidade da alimentação, etc.), defeitos de fabrico, etc. (4) Na literatura anglo-saxónica o custo do ciclo de vida é denominado por “Life-Cycle Cost – LCC”, e corresponde ao custo total associado ao MI durante o seu tempo de vida, incluindo o custo inicial, o custo energético e o custo das operações de manutenção. (5) Nos piores casos, a redução do rendimento pode atingir 4 %. (6)Secção de condução, número de espiras e tipo de enrolamento. (7) Nas estimativas apresentadas considera-se que: o rendimento dos MIs decresce 1% após o SMC; o preço da energia eléctrica é de 0.055 /kWh e 0.1 /kWh respectivamente para os sectores industrial e terciário; é emitido ½ kg de CO2 por cada kWh produzido; e ⅔ dos MIs em operação já foram reparados pelo menos uma vez. (8)Assumindo que os MI consomem ½ da energia eléctrica consumida no mundo. (9)Refira-se a este respeito que, para a grande maioria dos técnicos dos SMCs, a língua inglesa, que é utilizada na maior parte dos textos técnicos, ainda é uma barreira. (10)Este programa foi desenvolvido em colaboração com o Instituto de Sistemas e Robótica da Universidade de Coimbra. (11)Electrical Apparatus Service Association. (12)A implementação de grupos de bobinas em paralelo é uma solução adoptada por muitos fabricantes. 14 M A N U T E N Ç Ã O N. o 8 4 • 1 º T r i m e s t r e d e 2 0 0 5