Processo de Racismo envolve os jornalistas Paulo Henrique Amorim e Heraldo Pereira Por: Rosangela Malachias Colegas O processo contra Paulo Henrique Amorim, acusado de cometer o crime de racismo demonstra a urgência do enfrentamento, estudo e centralidade das Relações raciais e étnicas na mídia brasileira. Ali Kamel é o maestro regendo o discurso contra as ações afirmativas para negros, em especial, a política de cotas e com seus pares - que não merecem citação - ganham espaço nos programas de entrevistas afirmando não serem racistas. Segundo o artigo (link abaixo), Paulo Henrique Amorim dentre outras ofensas chamou Heraldo Pereira de "negro de alma branca" e a sua defesa teria explicado “o significado e contexto deste deste jargão”. É Amorim, você e sua defesa escorregaram! Há uma enorme contradição nesta defesa, visto que as relações raciais envolvem no mínimo dois lados: – discriminadores e discriminados. Caberia então questionar: Para quem acredita na existência da alma, “as pessoas com almas brancas” podem compor ambos os lados? Dentro de uma estrutura complexa como a Rede Globo e sob o comando do Sr. Kamel, os/as demais jornalistas – majoritariamente portadores/as de faces brancas – expressam na sua conduta profissional a cor de sua alma? Se o fazem, quais seriam as cores das almas dos/as jornalistas da Globo e das outras grandes e pequenas empresas de comunicação deste país? Amorim teria afirmado: “Heraldo Pereira, que faz um bico na Globo, fez uma longa exposição para justificar o seu sucesso. E não conseguiu revelar nenhum atributo para fazer tanto sucesso, além de ser negro e de origem humilde. Heraldo é o negro de alma branca. Ou, a prova de que o livro do Ali Kamel está certo: o Brasil não é racista. Racista é o Ali Kamel” (sic). Não perderei meu tempo falando do Sr. Kamel, mas quero afirmar que Heraldo Pereira, em outras situações, ao contrário do que Amorim pensa, demonstrou sim ter "consciência” (além da face negra). Uma delas, mais marcantes, é conteúdo das minhas aulas de formação de professores/as. Durante a celebração dos 40 anos do Jornal Nacional (JN), Heraldo concedeu uma entrevista a William Bonner e Fátima Bernardes (almas brancas também?), que ficaram visivelmente incomodados quando Heraldo Pereira, que segundo Paulo Henrique Amorim, "se agacha para entrevistar pessoas", insistia em listar suas melhores entrevistas no JN. 1) João do Pulo - um homem como ele, negro, de origem pobre e que teve a sua vida modificada. [Se Paulo Henrique Amorim conhecesse as relações raciais no Brasil saberia que a intersecção entre raça-classe-gênero propiciam impacto diferente na vida de brancos e negros. Saberia que ao afirmar-se negro, Heraldo incomoda aqueles que preferem escamotear o racismo institucionalizado no país e exalta aqueles que se posicionam contra as desigualdades]. 2) A cobertura dos conflitos raciais na África do Sul ainda durante a vigência do apartheid. [Resguardadas as proporções, como uma jornalista negra, ao ouvir Heraldo contanto a Bonner e a Fátima Bernardes este episódio, fiquei muito emocionada, porque resguardadas as proporções, nós jornalistas negros/as sabemos como funcionam as newrooms daqui e muitos/as de nós conhecemos o real significado da segregação dentro de uma empresa jornalística] Bonner e Bernardes tentaram o tempo todo mudar de assunto, mas o "negro de alma branca" (para Amorim) insistia em falar aos espectadores capazes de compreender, mesmo que subliminarmente, "estou aqui e sou negro, não me envergonho disso. Preciso matar um leão por dia para sobreviver". Heraldo também foi colega de um dos mais importantes jornalistas e talvez o mais reflexivo ativista negro do país, Hamilton Cardoso. Anos atrás, em conversas (que hoje considero aulas dadas por Hamilton a mim, uma jovem reporter) ele sempre falou bem de Heraldo Pereira, com quem trabalhou. Finalmente também gostaria de questionar se, sob o comando do Sr. Kamel, os jornalistas brancos, asiáticos, mestiços se "agacham" ou se mantêm em pé? Exemplo: Bonner e Bernardes agacham ou se mantêm em pé? Eu não sei a resposta, gostaria de compreender o que Amorim quis dizer com isto. Sabemos que Amorim é sim um crítico contumaz à mídia hegemônica, mas as alusões raciais na mídia brasileira somente podem ocorrer quando orquestradas por diretores, editores e apresentadores poderosos. Aqueles que, em geral afirmam: "Não somos racistas" e embora noticiem, com uma expressão indignada na face, fatos que evidenciam o racismo (externo), como as bananas jogadas para Neymar e Roberto Carlos no futebol, reproduzem em suas críticas diversas, uma conduta também preconceituosa. Por isso a formação para a igualdade racial é tão importante. Enquanto não tocarmos no assunto, não nos formarmos para(*) as Relações Etnicorraciais (ou Étnico-raciais) dificilmente superaremos o racismo e as desigualdades na mídia brasileira. Amorim e eu acrescento por minha conta e risco, o jornalista Luís Nassif, são sim parceiros e portadores de palavras afiadas contra a mídia poderosa, que não aceita ou admite a diversidade de pensamento, todavia, como jornalista profissional, ativista e pesquisadora acadêmica negra, comprometida com o trabalho cotidiano da formação de professores/as com práticas educomunicativas e de advocacy, ao ler mais de uma vez os Blogs de ambos comentando as políticas de promoção da igualdade racial promovidas pelo governo federal, sobretudo as cotas para negros nas universidades públicas, confesso ter pensado no polêmico e contraditório jargão: "Puxa, que pena! Eles têm alma branca!". (*) O grifo na preposição para foi incorporado por mim, graças às discussões reflexivas com o prof. Mestre e geógrafo Antonio Carlos Malachias (Billy) e isto merece citação. Link da matéria comentada: http://www.conjur.com.br/2011-jul-28/paulo-henrique-amorim-responde-acao-penal-racismo