2005 International Nuclear Atlantic Conference - INAC 2005
Santos, SP, Brazil, August 28 to September 2, 2005
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ENERGIA NUCLEAR - ABEN
ISBN: 85-99141-01-5
ESTUDO DAS IRRADIAÇÕES GAMA E UVC COMO MÉTODOS DE
CONSERVAÇÃO PARA COMERCIALIZAÇÃO DO SUCO DE
BETERRABA VERMELHA DE MESA UTILIZADO COMO CORANTE
NATURAL
Maria Paula J. Gonçalves1, Paulo Maurício C. Gomes1, Ricardo F. Corrêa2 e Márcia
Cristina Souza1
1
2
Centro Universitário de Belo Horizonte – UNI-BH
Curso de Engenharia de Alimentos
Av. Prof. Mário Werneck, 1685 - Bloco A4
30455-610 Belo Horizonte-MG
[email protected]
[email protected]
Laboratório de Irradiação Gama – CDTN/ CNEN - UFMG
R. Mário Werneck, s/n - Cidade Universitária/Pampulha
Belo Horizonte-MG
[email protected]
RESUMO
A utilização da irradiação gama e ultravioleta (UVC) do suco de beterraba foi objeto de estudo desse trabalho,
que buscou comparar a eficiência destes métodos na eliminação de microrganismos que pudessem vir a crescer
a partir da disponibilidade de água e açúcar contidos no suco de beterraba e inviabilizar a comercialização desse
extrato como corante natural. Foram testados diferentes doses de irradiação gama (1,0; 2,0 e 3,0 kGy) e
diferentes tempos de exposição do suco à irradiação ultravioleta (1; 2 e 3 h). A amostra controle não recebeu
nenhum tratamento. Testes espectrofotométricos mostraram que as irradiações gama e a U.V. não causam
alteração na estrutura do pigmento e nem perdas significativas de cor, no entanto, testes microbiológicos
indicaram que nas condições testadas, apenas a irradiação gama (3,0 kGy) foi eficiente como técnica de
conservação do suco de beterraba a ser comercializado e utilizado como corante natural.
1. INTRODUÇÃO
A cor é um fator decisivo no momento da escolha de um produto, uma vez que o primeiro
contato do consumidor com o alimento é visual. Ao longo dos anos, com o desenvolvimento
industrial e a modernização da economia, surgiu o mercado de “alimentos prontos” para o
consumo. Estes produtos exigem a presença de uma série de aditivos, com classes e
finalidades diferentes, entre eles os corantes, substâncias adicionadas intencionalmente aos
alimentos com o objetivo de torná-los mais atraentes aos consumidores [7].
As betalaínas, encontradas no tecido da beterraba vermelha de mesa (Beta vulgaris L.), são
importantes como corantes de alimentos e apresentam potencial para servir como substitutas
para corantes orgânicos sintéticos [6]. A extração do pigmento é freqüentemente realizada
por pressão ou centrifugação. Neste líquido se encontram a betalaína, outros pigmentos e
grande quantidade de outras substâncias como açúcar e água, que constituem excelente
substrato para o crescimento de microrganismos.
Embora ainda seja grande a utilização de corantes sintéticos, eles vão cedendo espaço
rapidamente para os naturais. O momento histórico favorece a entrada dos naturais cada vez
mais no mercado mundial. A nova era, conhecida como “Verde” ou “Ecológica”, traça um
novo perfil de consumidor, para o qual qualidade de vida é mais que uma prioridade, é uma
necessidade. O consumidor atual busca saúde e longevidade [7].
Estudos têm mostrado que o pó de beterraba concentrado é um corante aplicável em sistemas
alimentícios. Porém, a preparação comercial viável tem relativamente baixa concentração de
pigmento, sendo requeridas maiores quantidades para se obter uma cor desejável. A
fermentação do ultrafiltrado do suco de beterraba sob condição anaeróbica parcial e técnicas
de concentração têm sido estudadas para elevar o teor de sólidos do extrato [5].
Entretanto, o suco de beterraba tem sido preferido como corante em relação ao pó de
beterraba em muitas aplicações. Apesar de seu poder tintorial ser menor, sua obtenção é
barata e fácil. Aplicações desse suco incluem sorvetes, iogurtes, glacês, frutas congeladas e
outros. O nível usado varia entre 0,2 e 1,0% [9].
A elevada quantidade de açúcar e água contidos no extrato de beterraba limita sua utilização
e comercialização, uma vez que favorece o crescimento de microrganismos deteriorantes.
Desde a antigüidade, já existia uma preocupação com a preservação dos alimentos, quando
então, empregavam-se variados métodos, mesmo que de maneira empírica com o objetivo de
controlar a sua deterioração, a transmissão de doenças e a infestação de insetos. Através dos
séculos, as técnicas de preservação de alimentos foram se desenvolvendo com o aumento do
conhecimento científico [1].
Atualmente há no setor de alimentos, uma busca crescente por métodos de conservação que
provoquem menos alterações nas qualidades físico-químicas e sensoriais dos mesmos. A
resposta das indústrias de alimentos tem sido investir em novas tecnologias que atendam a
esta demanda seja pelo emprego de diferentes tipos de embalagens ou ainda pela irradiação.
Em comparação aos métodos convencionais de conservação, a irradiação apresenta a
vantagem do alimento poder ser tratado já embalado e/ou congelado e ainda, dependendo da
dose empregada, ser capaz de permitir que alimentos classificados como perecíveis se
conservem por um tempo maior, sem perdas de qualidades sensoriais e nutritivas [3].
Dessa forma, a irradiação destaca-se como uma técnica promissora entre os recursos atuais
disponíveis na conservação de alimentos, a fim de reduzir perdas causadas por processos
fisiológicos (brotamento, maturação e envelhecimento), além de eliminar ou reduzir
microrganismos, parasitas e pragas sem causar qualquer prejuízo ao alimento, tornando-o
também mais seguro ao consumidor.
Pesquisas envolvendo a irradiação de alimentos têm procurado estabelecer doses de radiação
que reduzam, significativamente, a carga microbiana sem comprometer a qualidade sensorial
e nutricional do produto. Porém, toda a eficiência do processo de irradiação depende da
aplicação da dose apropriada e de sua correta medição, a fim de se correlacionar com as
análises laboratoriais. No Brasil, porém, ainda são deficientes as informações referentes às
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condições e formas de processamento, bem como aspectos tecnológicos envolvidos na
aplicação e irradiação em alimentos [8].
O uso da radiação UVC produzida por lâmpadas germicidas são amplamente usadas em
processos de esterilização. Estas lâmpadas geram um espectro de linha com uma emissão de
uma raia de 253,7 nm muito intensa. Tal comprimento de onda gerado está muito próximos
dos 265 nm, que sabe-se é o comprimento de onda de radiação UVC que apresenta um
máximo de ação bactericida. Este máximo coincide com o pico de absorção dos ácidos
nucléicos, o que sugere serem os principais alvos do processo da inativação das bactérias pela
radiação UVC [4].
Na ciência e tecnologia dos alimentos, a irradiação tem sido considerada um dos métodos
mais efetivos no controle microbiológico. Se comparada à irradiação gama, o potencial da
radiação UVC na redução da carga microbiana nos alimentos está limitado ao seu pouco
poder de penetração. Tentativas têm sido feitas, mas com pouco ou nenhum resultado
satisfatório [2]. A vantagem da sua utilização seria a sua disponibilidade através de lâmpadas
germicidas que são baratas e facilmente encontradas no mercado, em comparação a radiação
gama – o que tornaria possível a sua utilização por pequenos produtores. Assim, apesar das
dificuldades, acredita-se que vale a pena explorar um pouco mais este tipo de radiação, visto
que a inativação é proporcional ao tempo de exposição e à intensidade da energia germicida
emitida pela lâmpada, como também se poderia considerar a geometria da irradiação. Tais
variáveis possibilitam ainda vários estudos.
2. MATERIAL E MÉTODOS
O presente trabalho foi realizado nos laboratórios do Centro Universitário de Belo Horizonte,
UNI-BH, em Belo Horizonte-MG.
Foi utilizada a variedade vermelho-rubi da beterraba (Beta vulgaris L.). A beterraba foi
selecionada, eliminando-se as unidades que apresentavam danos mecânicos ou
microbiológicos. O vegetal foi lavado com água para eliminar possíveis restos de agrotóxicos
e terra, bem como para reduzir a flora contaminante.
2.1 Obtenção do extrato de beterraba
As beterrabas foram cortadas em fatias e submetidas a tratamento térmico durante 5 minutos
no microondas, na potência média. O tratamento térmico foi feito para quebrar a estrutura do
pigmento, melhorando sua extração, e inativar as enzimas. A extração do caldo da beterraba
foi realizada em centrífuga doméstica. O líquido obtido foi filtrado em coador de pano. Em
seguida foi colocado com auxílio de seringa e agulha em tubos de ensaio fechados a vácuo
(tipo usado para exame de sangue) e levados para serem irradiados.
2.2 Tratamento por irradiação
O tratamento por irradiação UVC usou um irradiador constituído de uma lâmpada germicida
típica de 15 W colocada em uma caixa fechada forrada internamente com papel alumínio. As
amostras foram colocadas a uma distância de aproximadamente 10 cm e sujeitas aos
seguintes tempos de exposição: 1h, 2h e 3h.
INAC 2005, Santos, SP, Brazil.
O tratamento por irradiação gama (Co 60) foi realizado no Laboratório de Irradiação Gama
do Centro de Desenvolvimento de Tecnologia Nuclear da Universidade Federal de Minas
Gerais. As doses recebidas foram: 1,0; 2,0 e 3,0 kGy.
2.3. Análise espectrofotométrica
Foi realizado espectro de varredura da absorbância do filtrado de 280 a 800 nm para verificar
se a irradiação alterava a estrutura do pigmento. O teor de betalaína foi determinado pela
concentração das frações de betacianina + betaxantina, a partir da leitura da absorbância (476,
537 e 600 nm) do filtrado do extrato de beterraba [9]. As análises foram feitas em triplicata.
2.4 Análises microbiológicas
Foram realizadas análises de Bolor e Levedura e Contagem Total de Psicrotróficos, uma vez
que o pigmento deve ser estocado sob refrigeração após irradiação em função da sua
sensibilidade térmica. As análises foram feitas em triplicata.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise espectrofotométrica mostrou que a estrutura do pigmento não é alterada após
irradiação gama ou UVC, pois o espectro dos tratamentos tem o mesmo perfil do controle.
No entanto, há uma pequena redução na concentração do pigmento, proporcional à dose de
irradiação gama ou tempo de exposição à irradiação UVC. Essa redução não é
estatisticamente significativa. As Figuras 1 e 2 (Absorbância x comprimento de onda)
ilustram o espectro de varredura dos tratamentos gama e UVC, respectivamente.
A espectrofotometria da cor da beterraba-vermelha mostra duas bandas de absorção, uma em
535-540 nm, correspondente ao pigmento vermelho-violeta, e outra em 476-486 nm,
correspondente ao pigmento amarelo da beterraba-vermelha de mesa [6].
Controle
1kGy
2kGy
3kGy
Figura 1. Espectro de absorção do extrato tratado
com irradiação gama.
INAC 2005, Santos, SP, Brazil.
Controle
3 horas
1 e 2 horas
Figura 2. Espectro de absorção do extrato de
beterraba tratado com irradiação UVC.
As análises microbiológicas mostraram que a irradiação UVC nos tempos de exposição
estudados neste trabalho não foi adequada para garantir a esterilidade do extrato e nem sua
viabilidade comercial. A irradiação gama apresentou melhores resultados, sendo que a 2,0 e
3,0 kGy não foi observado nenhum crescimento de psicrotróficos. Quanto à análise de Bolor
e Levedura, nenhuma dose testada conseguiu esterilidade do extrato, no entanto, o tratamento
a 3,0 kGy conseguiu reduzir em 3 logs o número inicial de células, garantindo uma boa
estabilidade comercial do extrato, principalmente devido à sua estocagem sob refrigeração.
4. CONCLUSÕES
A irradiação gama (dose de 3,0 kGy) apresentou-se como alternativa para conservação do
extrato de beterraba para ser usado como corante natural, devendo o mesmo ser estocado sob
refrigeração pela sensibilidade do pigmento ao calor.
Doses maiores, 4,0 e 5,0 kGy, poderiam ser testadas em trabalhos futuros para se verificar a
possibilidade de se conseguir esterilidade do extrato e, portanto maior vida útil do mesmo.
AGRADECIMENTOS
Ao Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN/UFMG) e ao Centro
Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH).
INAC 2005, Santos, SP, Brazil.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. CDTN (Centro de Desenvolvimento de Tecnologia Nuclear). Irradiação de Alimentos.
Folheto Informativo. Belo Horizonte, Minas Gerais, Agosto de 1994.
2. Eugênio, C. D.; Mendonça, R. C. S.; Andrade, N. J., Avaliação da Eficiência do
Tratamento com Radiação Ultra Violeta sobre a Microbiota acompanhante de diferentes
condimentos. XVIII Congresso Brasileiro de Ciência e Tecnologia de Alimentos. Porto
Alegre/RS. 2002.
3. Farkas, J. Microbiological safety of irradiated foods. Int. J. Food Microbiol. V. 9, p. 1-15,
1989.
4. Gomes, R. A.; Leitão, A. C., Radiobiologia e Fotobiologia – Fundamentos Biofísicos do
Uso das Radiações em Medicina. Rio de Janeiro/RJ. 1986.
5. Guimarães, I. S. S. Fontes alternativas de corantes naturais. Revista Brasileira de Corantes
Naturais, v.1, p.177, 1992.
6. Lee, Y. N. Efficiency studies of a solid-liquid extraction method to recover betalaines from
red table beets. Maryland: University of Maryland, 1978. Dissertação (Mestrado em
Ciência) - University of Maryland, 1978.
7. Mascarenhas, J.M.O. Corantes em alimentos: perspectivas, usos e restrições. Viçosa,
1998. Dissertação (Mestre) – Universidade Federal de Viçosa.
8. Pereira, A. S. C. Irradiação em alimentos. Revista Nacional da Carne. São Paulo, n.324, p.
53-62, fev. 2004.
9. Salgado, S.M.A. Estudo da estabilidade da betalaína extraída da beterraba- vermelha de
mesa (Beta vulgaris L.). Viçosa, 1997. Dissertação (Mestre) – Universidade Federal de
Viçosa.
INAC 2005, Santos, SP, Brazil.
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