volume 13 — nº 3 — 2005 ISSN - 0104-3579 www.unifesp.br/dneuro Artigos • Correlação entre transferência de peso sentado e alteração sensorial em região glútea em pacientes hemiplégicos/paréticos • Avaliação do equilíbrio estático em deficientes visuais adquiridos • Ausência de conflitos: relação entre religião e ciência na formação universitária • Manifestações neurológicas nas Hepatites Virais • Miastenia grave autoimune: aspectos clínicos e experimentais • As Representações Sociais e o Conhecimento do Cotidiano: uma crítica metodológica a partir da Filosofia da Linguagem • Importância da variabilidade na aquisição de habilidades motoras • Doença de Parkinson – Diagnóstico Neurociências Editorial revista 115 Neurociências Um núcleo de estudos do conhecimento No extenso campo das Neurociências, uma abordagem do Conhecimento não pode mais unicamente se dar apenas no entendimento de como o Sistema Nervoso processa informações, ou como integra associações entre diferentes áreas e centros. A complexidade de resultados de pesquisas e observações ocorre concomitantemente a transformações culturais e sociais entendidas pelas ciências humanas, de modo que a ciência não caminha isolada, mas vinculada a suas circunstâncias históricas, políticas e psicológicas. Desse modo, um estudo abrangente do Conhecimento pode compreender as interfaces entre as Neurociências e as outras áreas de estudo que também se prestam a avaliar esse fenômeno típico do ser humano. Dentro desse ponto de vista, foi criando o Núcleo de Estudos do Conhecimento – Necon – como sendo uma parceria entre a Disciplina de Neurologia, o Centro de História e Filosofia das Ciências da Saúde – Cehfi – e o Setor de Psicologia da UNIP. Em setembro de 2005, suas atividades completaram quatro anos, tendo desenvolvido no transcorrer desse tempo reuniões, debates, cursos de extensão e algumas publicações. Para o ano de 2006 estão sendo programados cursos dirigidos à pós-graduação, bem como o início de algumas linhas de pesquisa. O assunto “Conhecimento” tem sido bastante abordado por setores ligados à área empresarial e de marketing, como um importante fator de adensamento e progressão nessas áreas. Por outro lado, no campo da Educação, muitas vezes o Conhecimento tem sido tratado de uma maneira mais técnica. Sem desvalorizar essas diferentes abordagens, acreditamos que as Ciências, de modo geral, têm algo mais a dizer sobre o Conhecimento, além de esclarecer quais os neurotransmissores envolvidos nesse processo (que certamente também é importante), de modo que possa trazer a importância do Conhecimento de volta às atenções das Universidades, outrora principais centros formadores do mesmo. Afonso Carlos Neves Coordenador do Núcleo de Estudos do Conhecimento - NECON e médico neurologista da Disciplina de Neurologia da UNIFESP Índice ARTIGOS ORIGINAIS Correlação entre transferência de peso sentado e alteração sensorial em região glútea em pacientes hemiplégicos/paréticos Torriani C, Queiroz SS, Cyrillo FN, Monteiro CBM, Fernandes S, Padoan BB, Correa LCB, Coelho CG, Gama DM, Pereira DP, Relvas FR .................... 1 1 7 Avaliação do equilíbrio estático em deficientes visuais adquiridos Dayane Nunes de Oliveira, Renata Rezende Barreto ........................................................................................................................................................................ 1 2 2 Ausência de conflitos: relação entre religião e ciência na formação universitária Isabel FC Rayes, João Eduardo Coin de Carvalho .......................................................................................................................................................................... 1 2 8 ARTIGOS DE REVISÃO Manifestações neurológicas nas Hepatites Virais Denis Bernardi Bichuetti, Acary Souza Bulle Oliveira ........................................................................................................................................................................ 1 3 3 Miastenia grave autoimune: aspectos clínicos e experimentais Andrezza Sossai Rodrigues de Carvalho, Alexandre Valotta da Silva, Francis Meire Fávero Ortensi, Sissy Veloso Fontes, Acary Souza Bulle Oliveira ............ 1 3 8 As Representações Sociais e o Conhecimento do Cotidiano: uma crítica metodológica a partir da Filosofia da Linguagem João Eduardo Coin de Carvalho ........................................................................................................................................................................................................... 1 4 5 Importância da variabilidade na aquisição de habilidades motoras Denise Campos, Denise Castilho Cabrera Santos, Vanda Maria Gimenes Gonçalves ................................................................................................................. 1 5 2 Doença de Parkinson – Diagnóstico Egberto Reis Barbosa, Flávio Augusto Sekeff Sallem ........................................................................................................................................................................ 1 5 8 REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 Neurociências 116 REVISTA NEUROCIÊNCIAS Editor Chefe / Editor in chief Gilmar Fernandes do Prado, MD, PhD, São Paulo, SP Editora Executiva / Executive Editor Luciane Bizari Coin de Carvalho, PhD, São Paulo, SP Co-editor / Co-editor José Osmar Cardeal, MD, PhD, São Paulo, SP. Editores Associados / Associate Editors Alberto Alain Gabbai, MD, PhD, São Paulo, SP Esper Abrão Cavalheiro,MD, PhD, São Paulo, SP Fernando Menezes Braga, MD, PhD, São Paulo, SP Corpo Editorial / Editorial Board Desordens do Movimento / Movement Disorders Chefe / Head Henrique Ballalai Ferraz, MD, PhD, São Paulo, SP Membros / Members Francisco Cardoso, MD, PhD, Belo Horizonte, MG Sônia Maria Cézar de Azevedo Silva, MD, PhD, São Paulo, SP Egberto Reis Barbosa, MD, PhD, São Paulo, SP Maria Sheila Guimarães Rocha, MD, PhD, São Paulo, SP Vanderci Borges, MD, PhD, São Paulo, SP Roberto César Pereira do Prado, MD, PhD, Aracajú, SE Epilepsia / Epilepsy Chefe / Head Elza Márcia Targas Yacubian, MD, PhD, São Paulo, SP Membros / Members Américo Ceike Sakamoto, MD, PhD, São Paulo, SP Carlos José Reis de Campos, MD, PhD, São Paulo, SP Luiz Otávio Caboclo, MD, PhD, São Paulo, SP Alexandre Valotta da Silva, MD, PhD, São Paulo, SP Margareth Rose Priel, MD, PhD, São Paulo, SP Henrique Carrete Jr, MD, PhD, São Paulo, SP Neurophysiology Chefe / Head João Antonio Maciel Nóbrega, MD, PhD, São Paulo, SP Membros / Members Nádia Iandoli Oliveira Braga, MD, PhD, São Paulo, SP José Fábio Leopoldino, MD, Aracajú, SE José Maurício Golfetto Yacozzill, MD, Ribeirão Preto, SP Francisco José Carcchedi Luccas, MD, São Paulo, SP Gilberto Mastrocola Manzano, MD, PhD, São Paulo, SP Carmelinda Correia de Campos, MD, PhD, São Paulo, SP Reabilitação / Rehabilitation Chefe / Head Sissy Veloso Fontes, PhD, São Paulo, SP Membros / Members Jefferson Rosa Cardoso, PhD, Londrina, PR. Márcia Cristina Bauer Cunha, PhD, São Paulo, SP Ana Lúcia Chiappetta, PhD, São Paulo, São Paulo, SP Carla Gentile Matas, PhD, São Paulo, SP Fátima Abrantes Shelton, MD, PhD, Edmond, OK, USA Sandro Luiz de Andrade Matas, MD, PhD, São Paulo, SP Luci Fuscaldi Teixeira-Salmela, PhD, Belo Horizonte, MG Fátima Valéria Rodrigues de Paula Goulart, PhD, Belo Horizonte, MG Patricia Driusso, PhD, São Paulo, SP Distúrbios do Sono / Sleep Disorders Chefe / Head Lucila Bizari Fernandes do Prado, MD, PhD, São Paulo, SP Membros / Members Flávio Aloe, MD, São Paulo, SP Stela Tavares, MD, São Paulo, SP Dalva Poyares MD, PhD, São Paulo, SP Ademir Baptista Silva, MD, PhD, São Paulo, SP Alice Hatsue Masuko, MD, São Paulo, SP Luciane B. Coin de Carvalho, PhD, São Paulo, SP Maria Carmen Viana, MD, PhD, Vitória, ES Virna Teixeira, MD, PhD, São Paulo, SP Geraldo Rizzo, MD, Porto Alegre, RS Rosana Cardoso Alves, MD, PhD, São Paulo, SP Robert Skomro, MD, FRPC, Saskatoon, SK, Canadá Sílvio Francisco, MD, São Paulo, SP Doenças Cerebrovasculares / Cerebrovascular Disease Chefe / Head Ayrton Massaro, MD, PhD, São Paulo, SP. Membros / Members Aroldo Bacelar, MD, PhD, Salvador, BA Alexandre Longo, MD, PhD, Joinvile, SC Carla Moro, MD, PhD, Joinvile, SC Cesar Raffin, MD, PhD, São Paulo, SP Charles Andre, MD, PhD, Rio de Janeiro, RJ Gabriel de Freitas, MD, PhD, Rio de Janeiro, RJ Jamary de Oliveira Filho, MD, PhD, Salvador, BA Jefferson G. Fernandes, MD, PhD, Porto Alegre, RS Jorge Al Kadum Noujain, MD, PhD, Rio de Janeiro, RJ Márcia Maiumi Fukujima, MD, PhD, São Paulo, SP Mauricio Friedirish, MD, PhD, Porto Alegre, RS Rubens J. Gagliardi, MD, PhD, São Paulo, SP Soraia Ramos Cabette Fabio, MD, PhD, São Paulo, SP Viviane de Hiroki Flumignan Zétola, MD, PhD, Curitiba, PR Oncologia / Oncology Chefe / Head Suzana Maria Fleury Mallheiros, MD, PhD, São Paulo, SP. Membros / Members Carlos Carlotti Jr, MD, PhD, São Paulo, SP Fernando A. P. Ferraz, MD, PhD, São Paulo, SP Guilherme C. Ribas, MD, PhD, São Paulo, SP João N. Stavale, MD, PhD, São Paulo, SP Doenças Neuromusculares / Neuromuscular disease Chefe / Head Acary de Souza Bulle de Oliveira, MD, PhD, São Paulo, SP Membros / Members Edimar Zanoteli, MD, PhD, São Paulo, SP Helga Cristina Almeida e Silva, MD, PhD, São Paulo, SP Leandro Cortoni Calia, MD, PhD, São Paulo, SP Luciana de Souza Moura, MD, PhD, São Paulo, SP Laboratório e Neurociência Básica / Laboratory and Basic Neuroscience Chefe / Head Maria da Graça Naffah Mazzacoratti, PhD, São Paulo, SP Membros / Members Beatriz Hitomi Kyomoto, MD, PhD, São Paulo, SP Célia Harumi Tengan, MD, PhD, São Paulo, SP Maria José S. Fernandes, PhD, São Paulo, SP Mariz Vainzof, PhD, São Paulo, SP Iscia Lopes Cendes, PhD, Campinas, SP Débora Amado Scerni, PhD, São Paulo, SP João Pereira Leite, MD, PhD, Ribeirão Preto, SP Luiz Eugênio A. M. Mello, MD, PhD, São Paulo, SP Líquidos Cerebroespinhal / Cerebrospinal Fluid Chefe / Head João Baptista dos Reis Filho, MD, PhD, São Paulo, SP. Membros / Members Leopoldo Antonio Pires, MD, PhD, Juiz de Fora, MG Sandro Luiz de Andrade Matas, MD, PhD, São Paulo, SP José Edson Paz da Silva, PhD, Santa Maria, RS Ana Maria de Souza, PhD, Ribeirão Preto, SP Neurologia do Comportamento / Behavioral Neurology Chefe / Head Paulo Henrique Ferreira Bertolucci, MD, PhD, São Paulo, SP. Membros / Members Ivan Okamoto, MD, PhD, São Paulo, SP Thais Minetti, MD, PhD, São Paulo, SP Rodrigo Schultz, MD, PhD, São Paulo, SP Sônia Dozzi Brucki, MD, PhD, São Paulo, SP Neurocirurgia / Neurosurgery Chefe / Head Mirto Nelso Prandini, MD, PhD, São Paulo, SP Membros / Members Fernando Antonio P. Ferraz, MD, PhD, São Paulo, SP Antonio de Pádua F. Bonatelli, MD, PhD, São Paulo, SP Sérgio Cavalheiro, MD, PhD, São Paulo, SP Oswaldo Inácio de Tella Júnior, MD, PhD, São Paulo, SP Orestes Paulo Lanzoni, MD, São Paulo, SP Ítalo Capraro Suriano, MD, São Paulo, SP Samuel Tau Zymberg, MD, São Paulo, SP Neuroimunologia / Neuroimmunology Chefe / Head Enedina Maria Lobato, MD, PhD, São Paulo, SP. Membros / Members Nilton Amorin de Souza, MD, São Paulo, SP Dor, Cefaléia e Funções Autonômicas / Pain, Headache and Autonomic Function Chefe / Head Deusvenir de Souza Carvalho, MD, PhD, São Paulo, SP Membros / Members Angelo de Paola, MD, PhD, São Paulo, SP Fátima Dumas Cintra, MD, São Paulo, SP Paulo Hélio Monzillo, MD, São Paulo, SP José Cláudio Marino, MD, São Paulo, SP Marcelo Ken-It Hisatugo, MD, São Paulo, SP Interdisciplinaridade e história da Neurociência / Interdisciplinarity and History of Neuroscience Chefe / Head Afonso Carlos Neves, MD, PhD, São Paulo, SP Membros / Members João Eduardo Coin de Carvalho, PhD, São Paulo, SP Flávio Rocha Brito Marques, MD, São Paulo, SP Vinícius Fontanesi Blum, MD, São Paulo, SP Rubens Baptista Júnior, MD, São Paulo, SP Márcia Regina Barros da Silva, PhD, São Paulo, SP Eleida Pereira de Camargo, São Paulo, SP Dante Marcello Claramonte Gallian, PhD, São Paulo, SP Neuropediatria / Neuropediatrics Chefe / Head Luiz Celso Pereira Vilanova, MD, PhD, São Paulo, SP Membros / Members Marcelo Gomes, São Paulo, SP Coordenação editorial, criação, diagramação e produção gráfica: Atha Comunicação & Editora Rua Machado Bittencourt, 190 - 4º andar - conj. 410 CEP: 04044-000 - São Paulo - SP - Tel.: (11) 5087-9502 - Fax: (11) 5579-5308 - email: [email protected] Os pontos de vista, as visões e as opiniões políticas aqui emitidas, tanto pelos autores, quanto pelos anunciantes, são de responsabilidade única e exclusiva de seus proponentes. Tiragem: 3.000 exemplares REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 Neurociências 117 Artigo Original Correlação entre transferência de peso sentado e alteração sensorial em região glútea em pacientes hemiplégicos/paréticos Correlation among the sitting bearing weight and sensorial alteration in the gluteal region in hemiplegic/hemiparetic patients Torriani C¹, Queiroz SS¹, Cyrillo FN¹, Monteiro CBM¹, Fernandes S¹, Padoan BB², Correa LCB², Coelho CG², Gama DM², Pereira DP², Relvas FR² RESUMO Introdução: As alterações decorrentes do Acidente Vascular Encefálico (AVE) causam limitações importantes nas atividades saciais e nas atividades de vida diárias (AVD´S), devendo ser analisadas especificamente. Sabendo-se que os pacientes hemiplégicos podem ter diversos sistemas afetados, há grande possibilidade de as reações de equilíbrio estarem afetadas, influenciando de forma negativa a estabilidade e simetria nas posições sentada e em pé. Objetivo: Verificar a influência da alteração sensorial na região glútea na transferência de peso na posição sentada em pacientes hemiplégicos ou hemiparéticos após AVE. Método: O estudo foi realizado com 12 pacientes, apresentando hemiplegia ou hemiparesia por AVE. Foi realizado o teste de sensibilidade em região glútea com o estesiômetro e, em seguida, foi avaliada a transferência de peso na postura sentada por meio do Biofeedback de pressão “Stabilizer”. Resultados: Na correlação entre alteração sensorial e diferença de transferência de peso na posição sentada sugere-se que os pacientes que apresentam alteração sensorial em região glútea tendem a transferir o peso para o lado não plégico, ao passo que os pacientes sem alteração sensorial tendem a transferir o peso para o lado plégico. Unitermos: Equilíbrio Somatosensorial. Musculoesquelético, Hemiplegia, Acidente Cerebrovascular, Postura, Citação: Torriani C, Queiroz SS, Cyrillo FN, Monteiro CBM, Fernandes S, Padoan BB, Correa LCB, Coelho CG, Gama DM, Pereira DP, Relvas FR. Correlação entre transferência de peso sentado e alteração sensorial em região glútea em pacientes hemiplégicos/paréticos. Rev Neurociencias 2005; 13(3):117-121. SUMMARY Introduction: Alterations due to stroke cause important limitations in the ADL and should be specifically analyzed. Known is that hemiplegic patients can have several affected systems, with a great possibility of the balance reactions being affected, influencing in a negative way the stability and symmetry in the seated and standing positions. Objective: The objective of this study is to verify the influence of the sensorial alteration in the gluteal region in the weight transfer in the seated position in hemiplegic or hemiparetic patients after a stroke. Methods: The study was conducted with 12 stroke patients, presenting hemiplegia or hemiparesia. The test of exteroceptive sensibility was carried out in gluteal region of each patient with the esthesiometer and then the weight transfer was evaluated in the seated posture through “Stabilizer” Biofeedback pressure. Results: The correlation between sensorial alteration and difference of weight transfer in the seated position suggests that the patients that present sensorial alteration in the gluteal region tend to transfer the weight to the non-plegic side, while the patients without sensorial alteration tend to transfer the weight to the plegic side. Keywords: Musculoskeletal Equilibrium, Hemiplegia, Stroke, Posture, Somatosensor y. Citation: Torriani C, Queiroz SS, Cyrillo FN, Monteiro CBM, Fernandes S, Padoan BB, Correa LCB, Coelho CG, Gama DM, Pereira DP, Relvas FR. Correlation among the sitting bearing weight and sensorial alteration in the gluteal region in hemiplegic/hemiparetic patients. Rev Neurociencias 2005; 13(3):117-121. Trabalho Realizado: UniFMU - Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas, 1 - Docentes e supervisores de estágio do UniFMU 2 - Acadêmico do 4° ano do curso de Fisioterapia do UniFMU Endereço para Correspondência: Camila Torriani Avenida Santo Amaro, 1239 CEP04505-002 - São Paulo - SP Trabalho recebido em 30/06/05. Aprovado em 23/09/05 REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (117-121) Neurociências . INTRODUÇÃO Define-se Acidente Vascular Encefálico (AVE) como sendo “o rápido desenvolvimento de sinais clínicos de distúrbio focal (por vezes global) da função encefálica, durante mais de 24 horas ou levando à morte sem nenhuma outra causa aparente que a origem vascular”1-3. Mayo et al (1999) e Pereira et al (1993) descrevem o AVE como sendo a doença crônica mais incapacitante, sendo considerado um problema de saúde pública de grande magnitude2-3. Constitui a terceira causa de morte nos EUA e maior causa de institucionalização de idosos, com mais de 160 novos casos por 100.000 habitantes/ano. Anualmente, há cerca de 300.000 à 400.000 sobreviventes de doença cérebrovascular, sendo que muitos deles ficam significativamente incapacitados3-8. As causas do AVE são relacionadas com a interrupção do fluxo sangüíneo para o encéfalo, originado tanto por obstrução de uma artéria que o supre, caracterizando o AVE isquêmico, quanto por ruptura de um vaso caracterizando o AVE hemorrágico5-7, 9. Segundo Flick (1999)6 cerca de 75% à 85% dos pacientes recuperam a marcha, com ou sem órteses; 48% à 58% recuperam independências nas atividades de autocuidado e 10% à 29% são admitidos em serviços de home care. Desta forma, a avaliação precisa e quantitativa das habilidades funcionais e dos fatores que nela influenciam torna-se de extrema relevância, na medida em que é grande o número de pacientes com comprometimento na realização destas atividades. As seqüelas estarão relacionadas diretamente com a localização, tamanho da área encefálica atingida e o tempo que o paciente esperou para ser socorrido. Desta forma, a alteração mais comum é a hemiparesia ou hemiplegia, correspondendo à deficiência motora caracterizada por espasticidade e fraqueza muscular no hemicorpo contralateral à lesão, também podendo ser acompanhada por alterações sensitivas, mentais, cognitivas, perceptivas e de linguagem10-14. Além disso, pode levar a distúrbios do campo espacial, visual, dificuldade na execução das atividades de vida diária (AVD´s), alterações tônicas, sensoriais e perceptuais tanto apendiculares quanto axial. Sveen et al (1999) relatam que há poucas evidências sobre o impacto dos déficits perceptuais, cognitivos e motores na realização das AVD´s, fato que justifica a mensuração precisa dos prejuízos funcionais acarretados pelo AVE10 . Além disso, Clarke (1999) relata que as alterações decorrentes do AVE causam limitações importantes nas atividades sociais e nas AVD´s, devendo ser analisadas de modo específico11. Flick (1999) e Davidoff et al (1991) descrevem que como fatores preditivos para atraso na recuperação após um AVE temse: a presença de déficits visuais, sensoriais e de equilíbrio sentado, em decorrência da instabilidade no tronco6,12. Davidoff et al (1991) afirmam que a recuperação do equilíbrio sentado e do controle vesical durante o processo de hospitalização diminuem o tempo de REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (117-121) 118 internação e facilitam o prognóstico funcional no desempenho motor12. Embora amplos estudos caracterizem o mau funcionamento dos músculos apendiculares pós doença cerebrovascular, as informações relacionadas à atividade muscular do tronco ainda têm recebido pouca atenção. A hemiparesia/plegia não só danifica o controle sensoriomotor dos músculos apendiculares, mas também a função dos músculos axiais causando assimetria no tronco e, portanto, alteração no controle motor desta região15. Desta forma, a força muscular do tronco apresenta-se danificada multidirecionalmente e pode ser correlacionada à instabilidade e assimetria na postura sentada14. Existe perda importante da atividade seletiva nos músculos que controlam o tronco, particularmente nos músculos responsáveis pela flexão, rotação e inclinação, sendo que o paciente sente dificuldade de mover seu tronco contra a ação da gravidade, independentemente de qual tipo de atividade muscular for necessário16,17. A fraqueza muscular do tronco está focalizada contralateral à lesão, mas segundo Bohannon (1995) há também diminuição da força nos músculos ipsilateral à lesão16. A função dos músculos do tronco é um fator essencial para transferência, segurança, estabilidade e atividades diversas como sentar, levantar e caminhar. Entretanto, após o AVE os músculos do tronco apresentam alterações tônicas que influenciam no controle motor e na capacidade de gerar força18. Benaim et al (1999) relatam que o controle do tronco e equilíbrio na posição sentada e em ortostatismo são habilidades essenciais para a aquisição de autonomia no desempenho das AVD´s19. Quando há dificuldade na realização destas atividades, tanto por alterações sensoriais (visuais, vestibulares ou somatossensoriais) quanto por alterações motoras 20-23, faz-se necessária uma avaliação precisa da gravidade de acometimento do tronco para o estabelecimento de prognóstico destes pacientes. Sabendo-se que os pacientes hemiplégicos podem ter diversos sistemas afetados, há grande possibilidade de as reações de equilíbrio estarem afetadas e, portanto, a estabilidade e simetria nas posições sentada e em pé22. As alterações de tronco proporcionam assimetria ao paciente tanto sentado quanto em ortostase. Tais alterações no equilíbrio sentado em pacientes pós-AVE, estão relacionadas à transferência de peso, às dificuldades no recrutamento muscular e ao aumento de instabilidade postural em pé23. Hesse et al (1998) descrevem que geralmente há uma tendência de assimetria na postura sentada, que se diferencia entre os pacientes hemiparéticos à direita e à esquerda, sendo que os hemiparéticos à esquerda tendem a transferir o peso para o lado não acometido24. De qualquer forma, não se sabe ainda quais sinais clínicos influenciam nesta assimetria, porém algumas hipóteses podem ser levantadas para justificar a assimetria na postura sentada, dentre elas destacam-se: - alterações perceptuais;- heminegligência – não uso24;alterações de trofismo em região glútea no lado hemiplégico; - limitação articular no tornozelo22;- fraque- Neurociências za muscular em membro inferior, principalmente a relação entre adução e abdução da coxa22-24;- alteração sensorial em região glútea, que pode influenciar no lado de predomínio para transferência de peso22-24. Neste estudo será enfatizada a análise da assimetria na postura sentada, considerando a alteração no sistema sensorial exteroceptivo na região do músculo glúteo máximo, que caracteriza a base de suporte sentada. O objetivo deste trabalho é verificar a influência da alteração sensorial exteroceptiva da região glútea na transferência de peso na posição sentada, em pacientes hemiplégicos ou hemiparéticos após Acidente Vascular Encefálico. MÉTODO O estudo foi realizado com 12 pacientes, com diagnóstico de Acidente Vascular Encefálico Unilateral, apresentando hemiplegia ou hemiparesia, independentemente do lado de acometimento corporal. Todos os sujeitos preencheram termo de consentimento livre e esclarecido para participarem do estudo e serem fotografados, desde que sua identidade estivesse preservada para publicação.O estudo foi submetido à avaliação de Comitê de ética interno da Instituição. Desenvolveu-se o estudo na clínica de Fisioterapia da Uni FMU, sendo utilizados os seguintes materiais: estesiômetro (kit para teste de sensibilidade cutâneo – Monofilatos “Semmes- Weinstein’), lápis dermatográfico, Stabilizer (Biofeedback de pressão da marca Chatanooga Group) e banco de madeira. O estesiômetro foi utilizado para o teste de sensibilidade exteroceptiva em região glútea e contém 6 filamentos maleáveis de cores: verde, azul, violeta, vermelho escuro, laranja e vermelho claro. Cada um destes filamentos apresenta uma espessura, sendo a verde a mais fina e a vermelha a mais espessa. Os filamentos representam a sensação de 0,05 gr a 300 gr. Foi realizado o processo de montagem dos filamentos do estesiômetro, conforme as instruções de utilização do equipamento (Figuras 1.1 e 1.2). A partir daí, utilizouse os filamentos para avaliação sensorial de modo perpendicular à superfície glútea do paciente (Figura 1.3), sendo pressionados levemente até atingir a força suficiente para curvar o filamento (Figura 1.4); retirando-o suavemente em seguida. Figura 1. Preparo dos monofilamentos e técnica utilizada para o teste sensorial exteroceptivo. REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (117-121) 119 Neste estudo, foram considerados os seguintes critérios para a análise dos dados: Até 0,2 gramas: sensibilidade presente Acima de 2,0 gramas: alteração sensorial Para avaliação da transferência de peso foi utilizado o Stabilizer, que consiste em um aparelho simples destinado a registrar alterações de pressão em bolsa de pressão pneumática. È constituído por um conjunto composto de manômetro, pêra de inflação conectada a uma bolsa de pressão. Primeiramente foi realizado o teste de sensibilidade exteroceptiva em região com o paciente posicionado em decúbito ventral. Nesta posição, foi identificada a região dos ísquios, através da palpação e marcado com um lápis dermatográfico sobre a pele, este ponto. A partir deste ponto central, foram traçadas duas linhas na pele do paciente, dividindo o glúteo em quatro quadrantes. A região glútea foi então dividida em quadrantes, sendo os de número 1 e 4 os quadrantes da parte medial do glúteo, os de número 2 e 3 na parte lateral do glúteo. O ponto central, na região do ísquio, achado primeiramente, foi numerado como 5. Esta divisão foi feita tanto no glúteo direito quanto no esquerdo. Foi utilizado o primeiro filamento de cor verde, tocado no quadrante 1 de um dos glúteos, durante aproximadamente 1,5 segundos, com uma leve pressão até que o filamento se envergasse levemente. Foi perguntado ao paciente se sentia o estímulo e em qual local. Se o paciente não relatasse nenhuma sensação, era permitido mais duas tentativas no mesmo quadrante. Em seguida, realizou-se o mesmo procedimento no quadrante 1 do glúteo contra- lateral e assim sucessivamente até o quadrante 5. Após o término no quadrante 5 dos dois glúteos passou-se para a cor seguinte, testando apenas nos quadrantes em que não foi relatada nenhuma sensação. Quando relatada resposta positiva ao toque do filamento, foi preenchida uma tabela com os quadrantes correspondentes de acordo com as categorias definidas para cada monofilamento. Procedeu-se assim até que os quadrantes estivessem preenchidos totalmente. Quando relatada resposta negativa, nada era preenchido, passando- se assim para a cor seguinte. Após a realização deste teste de sensibilidade realizou-se o teste de transferência de peso. Foram insufladas as duas bolsas de pressão até 70 mmHg. O paciente sentou –se em um banco de madeira sobre as duas bolsas simetricamente, de forma que os pés, o tornozelo e o quadril ficassem em um ângulo de 90º. Foi registrada a pressão inicial, logo após o paciente sentar, e depois a cada minuto foi mensurada a pressão em cada ísquio, até o décimo minuto. Conforme ilustra a foto (Figura 2). Após a aplicação dos testes foi calculada a diferença de pressão entre o lado direito e esquerdo no primeiro minuto, quinto minuto e décimo minuto, de cada um dos pacientes. Neurociências 120 Tabela 2. Número e porcentagem de pacientes em relação à sensibilidade na região de ísquios do lado parético. Tabela 3. Número e porcentagem de pacientes em relação à sensibilidade na região de ísquios do lado sadio não-parético. Figura 2. Ilustração da mensuração da diferença da transferência de peso sentado com 2 bolsas de pressão pneumática. RESULTADOS Os resultados serão expostos nas tabelas abaixo: Na tabela 1 referente à caracterização de amostra em relação sexo, idade, lado acometido e tempo de lesão, observa-se que o sexo masculino constitui 66,7%. A idade média foi de 54,5 anos, sendo que 58,3% apresentaram lado plégico/parético direito. Em relação ao tempo de lesão, 58,3% dos pacientes era de até 2 anos e 41,7% apresentavam o tempo de lesão maior que 2 anos. Tabela 1. Caracterização da amostra em relação sexo, idade, lado acometido e tempo de lesão DISCUSSÃO No teste de sensibilidade com estesiômetro, considerou-se apenas o resultado em região de ísquios, devido ao grande número de variáveis nos quadrantes 1, 2, 3 e 4. Pode-se notar, na tabela 2, que em região isquiática do lado acometido, 4 pacientes apresentaram sensibilidade normal e 8 dos pacientes apresentaram sensibilidade alterada. Na região isquiática do lado não parético, como demonstra a tabela 3, oito pacientes apresentaram sensibilidade normal e 4 sensibilidade alterada, sugerindo que a sensibilidade em região glútea no lado não plégico também apresentou alteração. Tal fator corrobora com os daREVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (117-121) dos encontrados por Bohannon (1986,1997) que cita que o lado não plégico de pacientes hemiplégicos também pode apresentar-se afetado13,14 . Tanto em relação a idade versus diferença da transferência de peso, quanto na correlação entre sexo versus diferença da transferência de peso não houve significância estatística para a amostra estudada. Quando comparado o lado acometido versus diferença da transferência de peso observa-se, que os pacientes hemiplégicos/ paréticos à esquerda tendem à transferir o peso para o lado esquerdo e os pacientes hemiplégicos/ paréticos à direita tenderam à transferir o peso para o lado esquerdo. Este fato pode ser justificado pois sabe-se que os pacientes hemiplégicos/paréticos à esquerda tendem à apresentar maior incidência de déficits perceptuais23. E, além disso, os pacientes hemiplégicos a direita não tinham alterações sensitivas em nenhum hemicorpo e, portanto, transferem o peso para o lado não parético. Ao cruzar os dados tempo de lesão versus diferença da transferência de peso nota-se que os pacientes com tempo de lesão até 2 anos tenderam a transferir o peso para o lado acometido, e pacientes com o tempo de lesão superior a 2 anos tenderam a transferir o peso para o lado sadio, o que não nos parece um dado clinicamente relevante ou com justificativa aparente. Ressalta-se também na correlação sensibilidade versus diferença da transferência de peso (tabelas 4 e 5) que os pacientes que apresentavam alteração de sensibilidade na região isquiática transferiram o peso para o não-parético e os pacientes que não apresentavam alteração da sensibilidade transferiram para o lado parético, com um índice de p=0,098, sendo que o valor de significância assumido para este estudo foi de 0,05. Neurociências 121 Tabela 4. Perfil individual da diferença da transferência de peso entre ísquio hemiplégico/parético e sadio no 1º, 5º e 10º minuto em relação a sensibilidade exteroceptiva. Perfis individuais - Isquio Hemi Alterado (3+4_5+6) Perfis individuais - Isquio Hemi Normal (1+2) 60 Diferença em mmHg (Hemi - Sadio) Diferença em mmHg (Hemi - Sadio) 60 40 20 0 -20 -40 20 0 -20 -40 -60 -60 1ºmin 5ºmin 10ºmin Tabela 5. Perfil médio da diferença da transferência de peso entre ísquio hemiplégico/parético e sadio no 1º, 5º e 10º minuto em relação a sensibilidade exteroceptiva (1 e 2 – normal; 3, 4, 5 e 6 – alterado). Perfis Médios 40 30 20 10 0 -10 -20 -30 -40 1ºmin 5ºmin 1ºmin 5ºmin 10ºmin sendo que uma amostra maior poderia garantir a significância destes dados. CONCLUSÃO Não houve correlação estatisticamente significante entre os dados idade, sexo, lado de acometimento e tempo de lesão em relação à diferença de transferência de peso entre a região isquiática direita e esquerda na posição sentada. 50 Diferença em mmHg (Hemi - Sadio) 40 10ºmin Este dado sugere que há uma tendência a não transferência de peso para o lado com alteração sensorial, Na correlação entre alteração sensorial e diferença da transferência de peso na posição sentada sugere-se que os pacientes que apresentam alteração sensorial em região glútea tendem a transferir o peso para o lado não plégico, ao passo que os pacientes sem alteração sensorial tendem a transferir o peso para o lado plégico. Sugere-se que o trabalho seja reproduzido em uma amostra maior para garantir melhor significância estatística dos dados encontrados, pois a casuística utilizada não foi adequada para apresentar conclusões definitivas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Rowland LP. 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Phys Neurociências 122 Artigo Original Avaliação do equilíbrio estático em deficientes visuais adquiridos Static balance evaluation in acquired total blindness subjects Dayane Nunes de Oliveira1, Renata Rezende Barreto2 RESUMO Objetivos: Verificar se há alteração significativa na manutenção do equilíbrio estático em indivíduos portadores de deficiência visual adquirida (DVA) e se há correlação entre o tempo de perda visual e a oscilação corporal. Métodos: Foram avaliados onze indivíduos portadores de DVA e onze indivíduos com visão normal. As avaliações dos deslocamentos ântero-posterior (A/P) e latero-lateral (L/L) do centro de gravidade corporal na postura bípede estática foram realizadas utilizando uma plataforma de força AMTI modelo OR6. Resultados: Verificou-se que os deficientes visuais apresentam um deslocamento máximo L/L significativamente maior que os indivíduos com visão normal (t=2,397; p=0,026). Porém, no deslocamento A/P não houve diferença significativa entre os grupos (t=0,144; p=0,887). Não se obteve correlação entre o tempo de perda visual e o deslocamento L/L (p=0,971). Contudo, encontrou-se correlação positiva entre o tempo de perda visual e o deslocamento A/P (p=0,041). Conclusão: Há alteração significativa na manutenção do equilíbrio estático corporal em indivíduos portadores de DVA apenas no deslocamento L/ L e existe uma correlação positiva entre o deslocamento A/P e o tempo de perda visual. Unitermos: Equilíbrio Músculo-esquelético, Postura, Cegueira. Citação: Oliveira DN, Barreto RR. Avaliação do equilíbrio estático em deficientes visuais adquiridos. Rev Neurociencias 2005, 13(3): 122-127. SUMMARY Objectives: Check if there is significant changes in the static balance maintenance in total acquired blindness subjects (TAB) and if there is a relationship between the time of visual loss with the postural sway. Methods: Eleven subjects with TAB and eleven subjects with normal vision were tested. The displacement antero-posterior (A/P) and latero-lateral (L/L) evaluations of the corporal gravity center in the static biped posture were done using a force plate AMTI model OR6. Results: It was checked that the blind subjects showed a significantly maximum displacement L/L bigger than the subjects who were not blind (t=2.397; p=0.026). However, in the A/P displacement there was not a significant difference between the groups (t=0.144; p=0.887). We did not obtain a relationship between the time of visual loss and the displacement L/L (p=0.971). Therefore, it was found a positive relationship between the time of visual loss and the displacement A/P (p=0.041). Conclusion: There is a significant changing in the maintenance of the postural static balance in the subjects with TAB only in the displacement L/L and there is a positive relationship between the displacement A/P and the time of the visual loss. Keywords: Musculoskeletal Equilibrium, Posture, Blindness. Citation: Oliveira DN, Barreto RR. Static balance evaluation in acquired total blindness patients or subjects. Rev Neurociencias 2005, 13(3): 122-127. Trabalho realizado: Laboratório de Movimento da Universidade Estadual de Goiás (UEG) - Unidade ESEFFEGO. 1 - Fisioterapeuta pela UEG, Formação no Conceito Neuroevolutivo Bobath, Despertar - Núcleo Educacional e Terapêutico, em Goiânia, Goiás 2 - Fisioterapeuta Mestre em Fisioterapia pela UNITRI, Docente da UEG - Unidade Eseffego. Endereço para correspondência: Dayane Nunes de Oliveira. Rua T-33 n188 Apto.204 A Setor Bueno Goiânia – Goiás CEP: 74215-140 Tel (62) 32513371 E-mail: [email protected] Trabalho recebido em 14/09/05. Aprovado em 04/10/05 REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (122-127) Neurociências 123 INTRODUÇÃO A estabilidade postural é a capacidade de manter o corpo em equilíbrio1, isto é, refere-se a habilidade do corpo de retornar ao ponto de equilíbrio quando exposto a uma perturbação2. A manutenção do equilíbrio corporal deve-se a integração de várias estruturas, que compõem um sistema de controle chamado de sistema do equilíbrio2 ou de sistema de controle postural2,3. Woollacott1 trás que no processo de uma orientação vertical, empregamos múltiplas referências sensoriais, incluindo a gravidade (aparelho vestibular), a superfície de apoio (sistema somatossensitivo) e a relação do nosso corpo com o ambiente (sistema visual). A atuação conjunta destes três sistemas permite a estabilização do campo visual nas diversas situações de movimento, às quais o indivíduo é submetido, e, assim, participa ativamente na manutenção do equilíbrio4. As informações provenientes destes sistemas são integradas e processadas no sistema nervoso central no córtex cerebral, tronco cerebral e cerebelo, os quais se encarregam do planejamento e execução dos atos motores pertinentes à manutenção ou à restauração do equilíbrio estático. Vários estudos correlacionam a deficiência visual com alterações na função de equilíbrio, o qual tende a tornar-se insuficiente na presença de comprometimento visual. Um comprometimento do sistema de equilíbrio pode reduzir a estabilidade, resultando em aumento da oscilação corporal e/ou alteração da estratégia de movimento2,5. A lesão ou doença de qualquer uma das estruturas (por exemplo: olhos, orelha interna, receptores periféricos, medula espinhal, cerebelo, cérebro) envolvidas nos estágios do processamento da informação podem afetar o equilíbrio6. Skaggs e Hopper7 relataram em seu trabalho sobre o comportamento motor de indivíduos com deficiência visual que o equilíbrio é significantemente menor em indivíduos deficientes visuais, que em indivíduos com visão normal. A partir do momento em que ele perde um dos três sistemas envolvidos na função do equilíbrio, no caso, a visão, há uma perda funcional dos mecanismos visuais envolvidos no controle do equilíbrio. Levando em conta a integridade dos centros superiores e dos outros dois sistemas intimamente ligados ao equilíbrio, estes podem compensar a perda visual, fato relatado em estudos anteriores. Rougier e Farenc10 concluíram que indivíduos cegos apresentam um comportamento motor específico, desenvolvendo um controle dos mecanismos de correção do equilíbrio mais eficiente. Lewald11 afirmou que a compensação plástica dos cegos pode melhorar o processamento da informação vestibular e proprioceptiva associados à informação espacial auditiva. Barreto12 trás também que os indivíduos cegos podem usar diferentes estratégias sensório-motoras para atingir a estabilidade postural, indicando que a informação auditiva pode substituir a ausência da informação visual. Contudo até a plena harmonia dessas compensações o indivíduo que adquire deficiência visual total pode apresentar alterações importantes no controle do equilíbrio estático corporal. O propósito deste estudo é avaliar os efeitos da amaurose, ou seja, da perda completa da visão, na função do equilíbrio estático corporal do adulto que adquiriu a deficiência visual, além de verificar se há correlação entre o tempo de perda visual com alterações da oscilação corporal. MÉTODO Esta pesquisa teve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa Médica Humana e Animal do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás. Casuística 1. Grupo Experimental Stones e Kozma concluíram em sua pesquisa, correlacionando equilíbrio e idade em indivíduos cegos e com visão normal, que os primeiros apresentam pobre controle postural. - Critérios de inclusão da amostra: indivíduos portadores de deficiência visual adquirida; do sexo masculino e feminino; idade entre 18 e 40 anos; sedentários; que não apresentam comprometimento do sistema vestibular, proprioceptivo, auditivo, neurológico e/ou mental. Andreotti e Teixieira9 também versaram que o deficiente visual apresenta um equilíbrio falho, além de déficit de mobilidade, de coordenação motora, lateralidade e direcionalidade, esquema corporal e cinestésico prejudicados. - Critérios de exclusão da amostra: indivíduos não sedentários; com comprometimento mental, auditivo, neurológico, vestibular e/ou proprioceptivo; portadores de deficiência visual congênita; mulheres grávidas. Enquanto o indivíduo possui sua visão intacta (juntamente com o sistema proprioceptivo e vestibular) teoricamente, segundo a neurofisiologia da função do equilíbrio, esta se encontra preservada. 2. Grupo de Controle 8 REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (122-127) - Critérios de inclusão do grupo controle: Indivíduos com visão normal; sedentários; homens e mulheres; Idade entre 18 e 40 anos. Neurociências - Critérios de exclusão do grupo controle: indivíduos que não tenham visão normal; não sedentários; mulheres grávidas; indivíduos com comprometimento mental, neurológico, vestibular, proprioceptivo e auditivo. A seleção da amostra deu-se por meio da aplicação de um questionário. Todos os indivíduos assinaram previamente um termo de consentimento, o qual foi transcrito para o Braile para que os deficientes visuais o lessem. A deficiência visual foi confirmada por atestado médico enquanto que a visão normal foi verificada pela aplicação da escala optométrica de Snellen, onde, estando o indivíduo posicionado sentado confortavelmente em uma cadeira a seis metros da escala, deve ler a linha referente à distância 20/200 para ser considerado com visão normal. Local A avaliação do equilíbrio estático foi realizada no Laboratório de Movimento da Escola Superior de Educação Física e Fisioterapia de Goiás, Unidade Universitária de Goiânia, da Universidade Estadual de Goiás, no período de maio a julho de 2003. 124 ma da panturrilha, segundo o protocolo de Hellen Heyes Hospital 13 . Cada indivíduo foi, então, posicionado em frente à plataforma biomecânica e orientado a: subir na plataforma com os dois pés de forma independente, mantendo pés confortáveis, postura ereta, membros superiores estendidos paralelos ao tronco, cabeça alinhada, mantendo-se parado e equilibrando-se por 30 segundos. Os indivíduos videntes foram orientados a manterem os olhos abertos. Todos estavam descalços e usando roupas leves durante os procedimentos. A captura dos dados foi feita nos dez segundos finais através de filmagem, utilizando-se as seis câmeras de infravermelho cujos raios foram refletidos pelos marcadores refletores e, simultaneamente através do cálculo do centro de gravidade corporal e deslocamento do mesmo a partir da plataforma de força, sob a qual o sujeito se encontrava. Dessa forma, a partir dos dados antropométricos lançados no microcomputador, o software Peak Motus 2000® determinou o centro de gravidade de cada sujeito possibilitando a captura da oscilação do mesmo através da filmagem e da plataforma durante a manutenção da postura estática. Material Foram utilizados para as avaliações de equilíbrio estático os seguintes materiais: fita métrica de 30 centímetros, paquímetro (Lafayette Instrument Company® modelo 01290), fita crepe, 15 marcadores refletores, balança Filizola® (série 3134 nº 86713 com divisões de 100g e carga máxima de 150Kg), uma plataforma de força AMTI ® modelo OR6 (Advanced Medical Technologies, Newton, MA, EUA), 6 câmeras de infravermelho Pulnix® (modelo TM 6701NA, 120Hz, posicionadas a 1,75m de altura e a 4 metros umas das outras e do centro da passarela formando um hexágono), um microcomputador (Processador Pentium II® 400MHz, 128Mb de memória RAM) com o software Peak Motus 2000® (Peak Performance Technologies, Englewood, Colorado, EUA) para coleta e interpretação dos dados. Procedimentos Análise Estatística Para análise estatística foram empregados o teste t de Student para análise de amostras independentes e o coeficiente de correlação de Pearson. RESULTADOS Caracterização da Amostra Vinte e dois indivíduos participaram deste estudo, sendo onze videntes e onze cegos totais. A distribuição quanto ao sexo está ilustrada nos Gráficos 1 e 2. As causas da cegueira estão dispostas no Gráfico 3. Dados como idade, peso e altura estão dispostos na Tabela 1. Grupo Controle Todos os indivíduos foram inicialmente submetidos ao exame antropométrico, utilizando-se a balança, a fita métrica e o paquímetro. Em seguida, fez-se a fixação dos 15 marcadores refletores com fita crepe no sacro, nas asas ilíacas ântero-superiores, nos epicôndilos femorais laterais, nos maléolos laterais, no calcâneo e na cabeça do segundo metatarsiano, e, com velcro foram fixadas a haste femoral no ponto médio do comprimento de coxa, e a haste tibial no nível da circunferência máxiREVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (122-127) Gráfico 1. Distribuição por sexo do grupo de controle. Neurociências 125 Grupo Experimental Gráfico 2: Distribuição por sexo do grupo experimental. Causas da cegueira L-L= látero-lateral ; A-P= ântero-posterior Gráfico 4. Média dos deslocamentos máximos dos grupos de cegos e evidentes. A Tabela 1 apresenta os resultados referentes às médias e desvios-padrão das medidas observadas no grupo de deficientes visuais e dos normais. Tabela 1. Média e Desvio Padrão das medidas observadas no Grupo de Deficientes Visuais e dos Videntes. Gráfico 3. Causas de cegueira total adquirida do grupo experimental. Resultados referentes à análise do equilíbrio estático Os dados obtidos na análise do equilíbrio estático foram o deslocamento máximo e mínimo do centro de gravidade corporal; o intervalo, a média e o desvio padrão destes deslocamentos no sentido ântero-posterior e látero-lateral. O dado utilizado para a avaliação do equilíbrio estático foi o deslocamento máximo do centro de gravidade corporal no sentido ântero-posterior e látero-lateral, o qual corresponde à maior oscilação do centro de gravidade obtida a partir da localização deste na postura ortostática. Estudos anteriores não fizeram referência a variável empregada na análise do deslocamento ânteroposterior e látero-lateral. O Gráfico 4 ilustra o aumento da oscilação corporal em metros do grupo dos cegos em relação ao grupo de videntes. Verificou-se que os deficientes visuais apresentaram um deslocamento máximo látero-lateral significativamente maior que os indivíduos com visão normal (t=2,397; p=0,026). Porém, no sentido ântero-posterior não houve diferença significativa entre os grupos (t=0,144; p=0,887). Não se obteve correlação entre o tempo de perda visual e o deslocamento látero-lateral do centro de gravidade corporal (p=0,971). Porém encontrou-se correlação entre o tempo de perda visual e o deslocamento ântero-posterior (p=0,041). REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (122-127) DISCUSSÃO Todos os indivíduos selecionados para este estudo eram sedentários, pois Skaggs e Hopper7 relataram em seu trabalho que indivíduos com limitações sensoriais são quem mais se beneficiam com o aumento dos níveis de atividade física ao apresentarem grande melhora da performance psicomotora. Os resultados de Stones e Kozma8 também sugerem que o Neurociências controle postural é sensível ao treinamento físico, tanto que eles indicam o uso do equilíbrio para o monitoramento do processo de reabilitação. Em relação ao peso, não se encontrou diferença significativa entre os cegos e os videntes, o que está de acordo com os resultados de Barreto12. Entretanto, estes achados não confirmam a tendência da obesidade entre os portadores de deficiência visual, pelo sedentarismo, como afirmaram Andreotti e Teixeira9. Os indivíduos selecionados apresentavam idade entre 19 e 37 anos. Houve uma preocupação em limitar a idade, pois se trata de um fator importante quando se refere à deficiência do equilíbrio. Isso porque a idade parece afetar todos os aspectos da tríade da estabilidade, isto é, somatossensorial, visual e vestibular, e todos os três estágios do processo, isto é, influxo da periferia, processamento da informação e geração de potência motora6. No presente estudo, constatou-se que a deficiência visual total adquirida atingiu pessoas em idade produtiva, uma vez que a média de idade dos cegos foi de 27,36 anos e o tempo médio de deficiência visual correspondeu a 9,60 anos, o que está de acordo com Bachega14, em cujo trabalho com cegos encontrou idade média de 30 anos. Riach15 demonstrou que o tempo de duração do teste é importante para a confiabilidade e validade da medida de estabilidade. Em seu trabalho ele concluiu que a otimização dos testes de estabilidade postural é obtida entre 20 e 30 segundos de realização do teste. Estudos posteriores2,16 aplicaram o tempo de 30 segundos com sucesso em seus trabalhos, onde compararam diferentes métodos de avaliação da estabilidade corporal. Em nossa pesquisa optamos em analisar os 10 segundos finais do tempo total de 30 segundos, visando a captura dos dados após a estabilização da oscilação corporal. O mesmo tempo de captura dos dados foi empregado por Kejonen17 em seu estudo randomizado sobre a relação entre características antropométricas e os movimentos corporais durante o equilíbrio postural. Pode ser que com essa metodologia tenha havido perda quanto à captura da oscilação corporal máxima dos indivíduos avaliados. Ao conceituar equilíbrio, a literatura sempre faz referência à base de apoio sobre a qual há um deslocamento normal e contínuo do centro de gravidade corporal. Portanto, mudança na posição dos pés afeta o deslocamento ântero-posterior e látero-lateral, o que está em acordo com Mayagoita16 independentemente do sistema empregado para as mensurações das oscilações corporais. A Tabela 1 permite constatar a heterogeneidade do grupo experimental, ao atentarmos ao elevado desvio padrão referente à idade, peso e altura. Os resultados dessa pesquisa revelaram que os deficientes visuais apresentaram um deslocamento máximo látero-lateral significativamente maior que os REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (122-127) 126 indivíduos com visão normal. Porém, no sentido ânteroposterior não houve diferença significativa entre os grupos. Estes resultados não condizem com os dados de Mayagoitia et al16. Nesta pesquisa, foi avaliada a eficácia de métodos para avaliação do equilíbrio estático, sendo que todos os indivíduos apresentavam visão normal. As condições do teste eram: pés posicionados confortavelmente e olhos abertos; pés posicionados confortavelmente e olhos fechados (PCOF); pés juntos e olhos abertos, e pés juntos e olhos fechados (PJOF). Os dados referentes ao deslocamento corporal A/P e L/L constataram maior aumento no deslocamento A/P na condição de PCOF. O mesmo ocorreu na condição PJOF. Na pesquisa de Braccialli e Baraúna18 os resultados sugerem que a acuidade visual é um importante mecanismo de controle postural e que sua falência seria responsável pelo aumento no grau de deslocamento da oscilação anterior e posterior do corpo em uma superfície de apoio. Este fato não condiz com os dados encontrados no presente estudo, pois verificamos que não houve diferença significativa entre os grupos no deslocamento ântero-posterior. A maior oscilação corporal no sentido L/L verificada no presente estudo pôde associar-se tanto ao tempo limitado de captura dos dados, quanto à provável diminuição da base de apoio dos indivíduos cegos durante as avaliações, fato este relatado por Kejonen17, que em seus estudos com a plataforma de força, verificou que a oscilação L/L era menor quando os pés eram mantidos afastados. Os dados revelaram que 46% dos indivíduos portadores de deficiência visual total adquirida tiveram o trauma ocular bilateral por arma de fogo como causa da cegueira, sendo que todos estes eram do sexo masculino. Houve também, predomínio de indivíduos do sexo masculino com 73%, em relação ao feminino, com 27% no grupo experimental, o que está de acordo com os estudos de Lewald 11, o qual também obteve um percentual masculino maior do que o feminino em sua pesquisa sobre a deficiência visual. A literatura revela que a visão é o importante sistema sensorial indispensável no mecanismo do controle de estabilidade postural, o que se confirmou nesta pesquisa, pois na ausência da visão verificamos que houve um aumento muito significativo da oscilação corporal nos indivíduos que adquiriram amaurose. Este resultado está de acordo com o que Rougier e Farenc10 relataram em seus estudos, onde após avaliação da oscilação corporal de indivíduos videntes e com cegueira congênita e adquirida, afirmaram que a ausência de visão pode desencadear aumento da oscilação corporal. O trabalho de Stones e Kozma8 também concluiu que os indivíduos videntes apresentam maior equilíbrio que indivíduos completamente cegos. Não se obteve correlação entre o tempo de perda visual e o deslocamento L/L do centro de gravidade corpo- Neurociências ral, porém encontrou-se correlação positiva entre o tempo de perda visual e o deslocamento A/P, ou seja, quanto maior o tempo de perda visual, maior torna-se o deslocamento do centro de gravidade no sentido A/P, o que contradiz Lewald11, o qual afirmou que a compensação plástica dos cegos pode melhorar o processamento da informação vestibular e proprioceptiva juntamente à informação espacial auditiva. CONCLUSÃO De acordo com a nossa amostragem, os cegos apresentaram uma oscilação corporal no sentido látero-lateral maior, estatisticamente significante, em relação aos videntes, enquanto que no sentido ântero-posterior não houve diferença significativa entre cegos e videntes. Não encontramos correlação entre o tempo de perda visual e a oscilação corporal, no sentido látero-lateral, entretanto encontramos uma correlação positiva entre o deslocamento A/P e o tempo de perda visual. 127 Diante do elevado desvio padrão das variáveis referentes à caracterização da amostra, novos estudos, portanto, são necessários para avaliar o equilíbrio estático em deficientes visuais totais adquiridos, utilizando uma amostra maior e mais homogênea, além de um melhor controle das variáveis envolvidas na função do equilíbrio, como o tempo de captura e a posição dos pés durante a avaliação da oscilação corporal. AGRADECIMENTOS Somos gratas a toda a equipe do Laboratório de Movimento da Escola Superior de Educação Física e Fisioterapia de Goiás, Unidade Universitária de Goiânia da Universidade Estadual de Goiás, pela assistência com a coleta de dados; à Associação de Deficientes Visuais do Estado de Goiás (ADVEG), à Biblioteca Braile José Álvares de Azevedo e ao Centro de Apoio ao Deficiente(CEAD), pelo apoio na seleção dos deficientes visuais e, ao professor Gercino Monteiro Filho, pela análise estatística. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Woollacott MH. Controle postural normal. In: Controle motor: teorias e aplicações práticas. São Paulo: Manole, 2003, p153-178. 2. Karlsson A, Frykberg G. Correlations between force plate measures for assessment of balance. Clin Biomech 2000; 15:365-639. 3. Nakata M, Yabe K. Automatic postural response systems in individuals with congenital total blindness. Gait and Posture 2001; 14:36-43. 4. Moreira MMF, Maudonnet OAQ. 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O objetivo é verificar se os alunos são conduzidos à obtenção de novas posturas, novos modos de pensar, novas “vias do olhar”. Métodos: Foram realizadas cinco entrevistas semi-abertas, baseadas num roteiro pré-estabelecido, com alunos do 3º ano de Psicologia. Resultados: Para eles, embora o conhecimento associado à religião apresente-se como dogmático, surpreendentemente não conflitua com o conhecimento científico, oferecendo um conhecimento complementar. De um lado utilizam-se da religião para suprir necessidades de bem estar, proteção, meditação e como alimento para a alma. De outro, a ciência oferece um conhecimento mais concreto, sem interferir na fé, mas sem provocar convicções mais profundas. Acreditam que a ciência traz conflitos somente no começo da formação acadêmica, e aprendem a separar ciência da religião no decorrer do curso. O conhecimento, nestas duas modalidades, se apresenta como algo individual, não se percebendo sua dimensão social e interferências ideológicas. Conclusão: Concluímos que num curso superior, como nos cursos de Psicologia, há grandes dificuldades para a instalação de uma visão crítica em relação ao conhecimento, seja quanto às suas diferentes modalidades, seja quanto ao seu uso. Tal cenário indica a necessidade da formação de mais áreas de “conflito” na formação acadêmica, na direção de efetivamente conduzir a um profissional instrumentalizado para uma posição crítica também como cidadão. Unitermos: Ciência, Religião, Educação, Conhecimento. Citação: Rayes IFC, Carvalho JEC. Ausência de conflitos: relação entre religião e ciência na formação universitária. Rev Neurociencias 2005, 13(3): 128-132. SUMMARY Introduction: The aim of this work is studying students’ representations of different ways of knowing, science and religion. We intend to verify if university experience can modify their relations with knowledge, improving new ways of realize their own lives. Methods: We have done 5 (five) semi-structured interviews with students from a Psychology Department in a private University sited in São Paulo. Results: Research reveals a representation of religion as offering a dogmatic knowledge, which, surprisingly, doesn’t oppose the scientific knowledge, and, indeed, it’s understood as a complementary knowledge. If religion can offer well being, protection, “food for our souls”, science, on the other hand, offers a way of knowing based on facts. But this specificity of science is not enough to modify private beliefs as students learn to separate religion and science during their academic formation. Knowledge Trabalho Realizado: Curso de Psicologia, Instituto de Ciências Humanas, Universidade Paulista – UNIP. 1 - Graduanda em Psicologia, Instituto de Ciências Humanas, UNIP-Universidade Paulista. 2 - Professor Titular do Curso de Psicologia, Instituto de Ciências Humanas, UNIP-Universidade Paulista, NECON – Núcleo de Estudos do Conhecimento (UNIFESP). Endereço para Correspondência: João Eduardo Coin de Carvalho Rua Japurá, 55 ap. 617. São Paulo – SP E-mail: [email protected] Trabalho recebido em 27/09/05. Aprovado em 04/10/05 REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (128-132) Neurociências 129 is presented as a private experience and they don’t support the idea of a social and ideological process of producing knowledge. Conclusion: We conclude that it is very hard to Brazilian universities offer tools for constructing a critical understanding of knowledge. Such social scene claims for educational and political actions, which could create “conflicts” that lead students and professionals to a critical position as citizens. Keywords: Science, Religion, Education, Knowledge. Citação: Rayes IFC, Carvalho JEC. No conflicts: religion and science as knowledge during academic experience. Rev Neurociencias 2005, 13(3): 128-132. INTRODUÇÃO Costumamos ouvir que o homem é um animal espiritual. Homens e mulheres começaram a adorar deuses assim que se tornaram reconhecidamente humanos: criaram religiões ao mesmo tempo em que criaram obras de arte. Isso não foi apenas porque desejavam propiciar forças poderosas; essas fés primitivas exprimiam a perplexidade e o mistério que sempre parecem ter sido componentes essenciais da experiência humana neste belo, mas aterrorizante, mundo. Como a arte, a religião foi uma tentativa de encontrar sentido e valor na vida1. Através das religiões o universo físico se organiza em torno da alma humana, indicando o esforço de pensar a realidade “a partir da exigência de que a vida faça sentido”2. Contemporaneamente, o que ocorre com freqüência é que as mesmas perguntas religiosas do passado se articulam agora, travestidas por meio de símbolos secularizados e os deuses e esperanças religiosas vão se materializar em novos rótulos a que nos apegamos, ainda que insistamos em dizer que não somos “religiosos”. Armstrong1 afirma que em vez de se esperar que Deus descesse das alturas, deveríamos criar deliberadamente um sentido dele nela. Deus é um produto da imaginação criadora, como a poesia e a música, e, se Deus não existe, Ele, no entanto, é a mais importante realidade do mundo. A idéia de Deus formada numa geração por um conjunto de seres humanos pode não ter sentido em outra. A palavra Deus não contém uma idéia imutável, mas, ao contrário, contém todo um espectro de significados, alguns dos quais contraditórios ou até mutuamente exclusivos. Se a idéia de Deus não tivesse flexibilidade, não teria sobrevivido e se tornado uma das grandes idéias humanas. Sempre que um conceito de Deus deixou de ter sentido ou importância, foi discretamente abandonado e substituído por uma nova teologia. No processo histórico através do qual nossa civilização se formou, recebemos uma herança simbólicoreligiosa a partir das tradições culturais dos gregos e dos romanos. Com estes símbolos vieram visões de mundos totalmente distintas, mas eles se amalgamaram, transformaram-se mutuamente, e vieram a florescer em meio às condições materiais de vida dos povos que os receberam2. Na Idade Média os símbolos do sagrado adquiriram uma densidade, uma concretude e uma onipresença REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (128-132) que faziam com que o mundo invisível estivesse mais próximo e fosse mais sentido do que as próprias realidades materiais. Tudo girava em torno de um núcleo central, temática que unificava todas as coisas: o drama da salvação, o perigo do inferno, a caridade de Deus, levando aos céus as almas puras. Entretanto, aos poucos, mas de forma constante, progressiva, crescente, os homens começaram a fazer coisas não previstas no receituário religioso. Não eram aqueles que ficavam na cúpula da hierarquia sagrada que as faziam. E nem aqueles que estavam condenados aos seus subterrâneos. Enquanto aos que estão em cima não lhes interessaria as mudanças, os que se acham muito por baixo gastam suas poucas energias na luta pela sobrevivência. De uma classe social que se encontrava em meio a estes extremos que surgiu uma nova e subversiva atitude econômica, que corroeu as coisas e os símbolos do mundo medieval. Em oposição aos cidadãos do mundo sagrado que haviam criado símbolos que lhes permitia compreender a realidade como um drama e visualizar seu lugar dentro de sua trama, à nova classe interessavam atividades como produzir, comercializar, racionalizar o trabalho, viajar para descobrir novos mercados, obter lucros, criar riquezas. O que acontece é que, ao surgirem problemas novos relativos à vida concreta, os homens são praticamente obrigados a inventar conceitos novos. Produziu-se então, uma nova orientação para o pensamento derivada de uma vontade nova de manipular e controlar a natureza. Está aqui, segundo Alves, a semente de um pensamento efetivamente científico. E o início de um conflito entre um universo encantado e um que solicita e exige a previsão e o controle não mais divino mas humano. Carl Sagan3, diz que a ciência é mais do que um corpo de conhecimento, é um modo de pensar. A ciência é uma tentativa, em grande parte bem sucedida, de compreender o mundo, de controlar as coisas, de ter domínio sobre nós mesmos, de seguir um rumo seguro. A ciência por si mesma não pode defender linhas de ação humana, mas certamente pode iluminar as possíveis conseqüências de linhas alternativas de ação. O modo científico de pensar, ao mesmo tempo imaginativo e disciplinado, é fundamental para o seu sucesso. O uso de um método que permite e sustente a dúvida sistemática nos convida a acolher os fatos, mesmo quando eles não se ajustam às nossas preocupações. Aconse- Neurociências lha-nos a guardar hipóteses alternativas em nossas mentes, para ver qual se adapta melhor à realidade. A ciência também deve ser transmitida a todos os cidadãos, ela pode ser o caminho propício para vencer a pobreza e o atraso nas nações emergentes. Ela faz funcionar as economias nacionais e a civilização global. Nos esclarece sobre questões mais profundas das origens, naturezas e destinos de nossa espécie, da vida, de nosso planeta, do Universo. Os valores da ciência e da democracia são concordantes, em muitos casos indistingüíveis. A ciência confere poder a qualquer um que se der ao trabalho de aprendê-la. Ela se nutre do livre intercâmbio de idéias. O mesmo autor não acha que seja difícil de ensinar porque os seres humanos não estão preparados para esse tipo de conhecimento, ou porque ela nasceu apenas de um acaso feliz, ou porque de modo geral, não temos bastante inteligência para compreende-la. Ele acha que a inclinação da ciência está profundamente entranhada em nós, em todas as épocas, lugares e culturas. Tem sido o meio de sobrevivência do ser humano. É nosso direito hereditário. Quando nos privarmos da ciência, estaremos nos roubando das ferramentas necessárias para administrarmos o nosso futuro. Mas esta fé na ciência, especialmente no que se reconhece como ciência moderna, precisa ser qualificada em função do preço que se paga ao tomá-la como modelo hegemônico do conhecimento. Se a ciência produz um conhecimento que pode ser discutido e criticado, sua produção não está protegida da esfera do poder, das relações de dominação que atravessam todas os relacionamentos humanos e que transformam um conhecimento social e ideologicamente produzido em um conjunto de saberes naturalizado que contribui para a dominação4,5. Se o ensino da Ciência precisa ser relacionado a esta dimensão social e humana6, a forma como ele se dá em função das condições bastante concretas em que se oferece a formação acadêmica universitária não parece contribuir para colocar o estudante dentro deste conflito. No caso dos estudantes de Psicologia, especialmente, situação que se repete nos cursos superiores da área de saúde, o aluno é colocado – e se coloca – não como protagonista de um embate entre diferentes formas de se conhecer ou de se relacionar com o conhecimento, mas apenas como um receptor de informação profissionalizante7. Em pesquisa que busca avaliar os resultados acadêmicos dos cursos universitários8, um dos resultados mais significativos trata efetivamente de um descompasso entre o conhecimento sobre a prática, de um lado, e, de outro, questões metodológicas e epistemológicas, instrumentos típicos do embate científico. Em outra investigação sobre a imagem do profissional de psicologia 9, os próprios estudantes afirmam como a formação acadêmica levaria ao esvaziamento dos aspectos morais e valorativos em favor daqueles que caracterizam a racionalidade de sua atuação profissional. REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (128-132) 130 Pode-se dizer, como visto acima, que o conhecimento religioso é dogmático, não testável, depende de crença/ fé e o conhecimento científico é replicável, fidedigno, generalizável, embora sujeito a pressões ideológicas. Ainda assim, ciência e religião são ações humanas divergentes ou convergentes enquanto ao conhecimento? O objetivo deste trabalho foi estudar junto a aluno de Psicologia relações entre as representações sociais10 de ciência e religião. Tendo em vista que o curso superior de Psicologia oferece novos referenciais, condições de re-significar as experiências cotidianas que demandam escolhas e posicionamentos em relação a condutas e valores pessoais, e que o aprendizado da ciência constituído no decorrer do curso colocaria em xeque muitos dos conceitos que trazemos com a nossa crença religiosa, a pesquisa pretendeu responder se o aprendizado da ciência muda as formas de vivenciar o sentimento de religiosidade dos alunos, levando os alunos de Psicologia a encontrar o limite entre ciência e religião ou se sua formação “científica” oferece apenas o aprendizado de mais uma prática que será utilizada profissionalmente. MÉTODOS A amostra foi constituída de 5 sujeitos de classe média, com idades entre 20 e 45 anos, alunos do 3º ano (de cinco) do curso de Psicologia de uma rede particular de ensino, localizada na região metropolitana de São Paulo. Como instrumento de coleta de dados foi utilizada entrevista semi estruturada, na qual o entrevistador tem ampla liberdade para intervir sobre o fluxo de pensamentos do entrevistado11. A partir de um roteiro pré-estabelecido, foram investigados, de um lado, o conhecimento sobre a religião, sua importância e finalidade atribuídas pelo sujeito, suas experiências religiosas, e, de outro, a formação e conhecimento científico pessoal, a importância atribuída à ciência, e finalmente o entendimento do sujeito sobre a interferência da inserção acadêmica na relação com a religião e a ciência. As entrevistas, únicas, foram gravadas. Todos os sujeitos tiveram acesso a Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O material coletado foi submetido à análise discursiva de acordo com Bernardes12. Neste sentido procedeu-se a leitura do material com a finalidade de destacar significados relativos ao fenômeno pesquisado que foram listados, classificados em categorias e transformados num texto consistente com o mesmo. RESULTADOS A religião dentro da vida dos pesquisados assume importância de graus variados, mas, via de regra, é apresentada como base da vida. Ela recebe um padrão de inquestionabilidade, de sentimentos únicos, e está associada ao sentir-se bem. Em todos os sujeitos aparece Neurociências a presença de fé, o que não implica necessariamente a freqüência a igrejas, cultos ou sessões. Em relação à freqüência, a importância indicada para alguns dos entrevistados fica relativizada pelo tempo que tem disponível para isto. A prática religiosa aqui entendida como viver a religião e seus ensinamentos, foi descrita por um dos membros como vivida no dia a dia, e em família. A importância da prática no contexto de vida apareceu como de fundamental importância, trazendo paz de espírito, calma, sensações de se sentir bem, de necessidade de se pensar nela para poder meditar, como alimento para a alma ou para o espírito e como algo que os protegesse. As respostas evidenciam um movimento que distancia os indivíduos das práticas religiosas institucionalizadas. Visão ampla da vida, visão maior do mundo, satisfação, resposta, complemento, ajuda, proteção, paz, tranqüilidade, necessidade de se agarrar a algo, respostas a perguntas que não fazem sentido, conhecimentos filosóficos, tudo isso é percebido como diferentes formas de conhecimento que a religião traz para os entrevistados. Por outro lado, ao tratar do conhecimento científico, os entrevistados dizem estar tendo o primeiro contato com a ciência nesta formação acadêmica. Isto se evidencia também no ambiente familiar que, eventualmente possui alguém com alguma experiência acadêmica, o que se dá em geral apenas com o entrevistado. A ciência ofereceria para eles um tipo de conhecimento mais concreto, mais objetivo. Conhecimentos que, no entanto, não interferem na sua fé; a ciência é algo que se tem para buscar respostas para suas dúvidas, e como comprová-las através de fatos. Ciência como forma de compreender o mundo, conhecimentos teóricos, mas sem abalar convicções mais profundas. Eles identificam alguma interferência da ciência sobre a religião apenas no começo da formação acadêmica, conflitando com crenças antigas. Mas, no decorrer do curso, aprendem a separar ciência da religião, de uma forma que estas não mais confluem. Para alguns deles, inclusive, essa interferência não se realiza, e a ciência aparece oferecendo a possibilidade de se buscar mais respostas, com esta trazendo uma outra “via do olhar”, complementando, de alguma forma, o conhecimento religioso. Eles informam terem encontrado conexões da ciência com a religião, como se uma explicasse a outra, uma complementando a outra. DISCUSSÃO As representações dos sujeitos acerca do conhecimento religioso convergem com aquela indicada na revisão da literatura, quando o sentido da religião está associado a tentativa de se encontrar sentido e valor na REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (128-132) 131 vida, como explicações de eventos do universo por um poder espiritual, e o esforço para se pensar a realidade a partir da exigência de que a vida faça sentido. Também, como Alves2, encontramos que as teias religiosas são tecidas em torno dos problemas individuais e sociais como necessidade de paz, proteção, resolução de lutas entre homens, harmonia com a natureza, etc. Ainda, o conhecimento que vem da ciência é dogmático. É o senso comum ainda que determina a representação de ciência: ela não é compreendida em oposição a outras formas de conhecer, mas oferece um conhecimento complementar, como uma também tentativa, em grande parte bem sucedida, de compreender o mundo, de controlar as coisas, de ter domínio sobre nós mesmos, de seguir um rumo seguro. A ciência não se apresenta como empreendimento coletivo e social, como algo que confere poder a qualquer um que se der ao trabalho de aprendê-la. Os depoimentos reconheceram claramente distinção entre ciência e religião. Todos os entrevistados mostraram-se conscientes da necessidade de religião em suas vidas, crença essa que não necessita de templos ou instituições, mas que se encontra entranhada dentro dos sujeitos. E isto, por outro lado, é o que parece indicar uma convergência entre ciência e religião: trata-se de um conhecimento individualizado, pessoal, algo que, em última instância não está disponível para a crítica e para a reconstrução. Compartimentos separados, que se entrecruzam às vezes, que não se contrapõem. A fé religiosa reina soberana, com linguagem diferente da ciência, que responde às necessidades afetivas e aos desejos da pessoa, faz parte da vida, mora no registros emocional e social do indivíduo. Neste sentido é que se pode compreender como, de acordo com os entrevistados, o contato com a ciência não muda o sentimento de religiosidade. Esse sentimento de religiosidade recebe uma carga de conflitos, que logo é superado, passando a conviver lado a lado, ciência e religião. Todos os entrevistados reconheceram a possibilidade de compatibilidade entre ciência e religião, como sistemas de conhecimento. Se os objetivos em relação ao aprendizado da ciência como proposta para a aquisição de uma nova postura em relação ao conhecimento não foram alcançados, a formação acadêmica não tem suprido essa necessidade de conflito para que a ciência se estabeleça como nova forma de se pensar, uma nova “via do olhar”. Assim, o conhecimento é tomado também de forma totalizante, fundamentalista, como algo pronto e dogmático. O aluno parece não se dar conta da sua inserção no ambiente científico como alguém que poderia interferir sobre um determinado campo do conhecimento. Não há uma atitude crítica junto a este processo de aprendizagem, mas apenas uma assimilação que Neurociências pretende encontrar um lugar para este conhecimento “novo” junto aquele que já vem das suas práticas religiosas. Daí esta busca por uma complementaridade do conhecimento. Vale indicar que esta representação do conhecimento científico se faz, ao que tudo indica, não tendo o próprio universo reificado da ciência como referente, isto é, a aprendizagem se faz – e não pode ser diferente – tendo como referência um universo consensual de conhecimento, o universo do senso comum do grupo de referência destes alunos, e que tem como paradigma de conhecimento sobre o mundo, em grande medida, o conhecimento religioso. A questão do método, tão própria do conhecimento científico, e que permite que o pesquisador exerça sua prerrogativa de duvidar de um conhecimento que tem origem nele mesmo e nos outros está absolutamente abandonada, ou sequer foi apreendida pelos alunos. Eles se vêem diante de conhecimentos que, quando compreendidos, são tomados como mais uma parcela de um conhecimento que é único e definitivo e não construído socialmente, marcado pela ideologia e pelo conflito de discursos sobre a verdade5. Assim, se é possível dizer sobre as dificuldades em se construir uma posição científica em alunos do curso de Psicologia, também deve-se olhar para a formação como contaminada pela proposta de um conhecimento que, ainda que nomeado como científico, tem uma dimensão totalizante, opondo professor e aluno numa batalha pelo domínio sobre um discurso que um tem e o outro não. 132 CONCLUSÕES Tendo em vista esses resultados, conclui-se que a ciência não interfere nas crenças mais profundas e arraigadas do aluno de Psicologia. Sendo a religião, religiosidade, fé, aspectos que cumprem funções individuais e sociais, vêse a necessidade da formação de mais áreas de conflito no curso de Psicologia, para que o futuro psicólogo, realmente veja na ciência e na religião, uma outra “via do olhar”, que no arranjo da vida, se encontre a possibilidade de convivência da religião e da ciência, pois o hábito, a pressão social, os estados psicológicos, atitudes, conceitos, pré-conceitos e outros tantos, são aspectos que influem concretamente na vida dos futuros psicólogos. A formação acadêmica não produz conflitos suficientes nem para a instalação da “fé” na ciência, muito menos para a incorporação de um instrumental crítico sobre o conhecimento. Ela é representada apenas como mais uma prática que não conduz os alunos à formação de pensadores, favorecendo apenas a formação de praticantes que apenas a reproduzem, não criam, não aprendem a pensar e a questionar. Entendemos esta condição como extremamente série, exigindo ações concretas sobre a formação científica que emana da cultura universitária contemporânea em tempos que neo-liberais, desde que este movimento atravessa a universidade e situa os futuros profissionais como cidadãos sem os recursos que sustentam um posicionamento participativo nas suas realidades cotidianas, e de responsabilidade sobre a manutenção ou a transformação das condições sociais e humanas do país. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Armstrong K. Uma História de Deus. São Paulo, Cia das Letras,1999. 2. Alves R. O que é Religião. São Paulo: Brasiliense, 1992. 3. Sagan C. O Mundo Assombrado Pelos Demônios. São Paulo: Cia das Letras, 2002, 4. Luz M. Natural, Racional, Social: razão médica e racionalidade científica moderna. 2ª edição. São Paulo: Hucitec, 2004, 209p. 5 . Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 8ª edição. São Paulo: Hucitec, 2004, 269p. 6. 7. Bagnato MHS. 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O tratamento específico antiviral pode reverter estes sintomas. Neste artigo revisamos as principais manifestações neurológicas das hepatites virais com um enfoque clínico e sugestão terapêutica. Unitermos: Hepatite, Manifestações Neurológicas. Citação: Bichuetti DB, Oliveira ASB. Manifestações Neurológicas nas Hepatites Virais. Rev Neurociencias 2005; 13(3):133-137. SUMMARY Infections due to viral hepatites are becoming more prevalent, mainly by hepatites virus A, B and C. Neurologic Manifestations of viral hepatites can be divided in acute and chronic, the former are related to acute encephalitis and meningitis and, rarely, transverse myelitis and Guillain-Barré syndrome. Hepatites B and C virus chronic infections have been related to autoimmune polyneuropathies, cryoglobulinemia and diverse central nervous system symptoms. Specific antiviral therapy can revert these manifestations. In this article we review the main neurologic manifestations of viral hepatites with a clinical focus and therapeutic suggestion. Keywords: Hepatitis, Neurologic Manifestations. Citation: Bichuetti DB, Oliveira ASB. Neurologic manifestations of viral hepatitis. Rev Neurociencias 2005; 13(3):133-137. INTRODUÇÃO Hepatites virais correspondem a 50% dos casos de hepatites no Estados Unidos da América, sendo 95% causadas pelos vírus A, B, C, D e E. Apesar de chamados “vírus hepatotrópicos”, sabemos hoje que, principalmente os vírus B e C, podem levar a transtornos extra-hepáticos. Esta afirmação torna-se mais prevalente para pacientes portadores de hepatite C e crioglobulinemias, como rashs cutâneos, artralgias, parestesias, glomerulonefrites, tireoidites, porfiria cutânea tarda, líquem plano, sialoadenite linfocítica, linfoma não Hodgkin, e úlceras de Mooren na córnea1,2. Esta revisão tem como foco as manifestações neurológicas nas hepatites virais, principalmente A, B e C, nas Trabalho realizado: Departamento de Neurologia e Neurocirurgia – Disciplina de Neurologia Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) - Escola Paulista de Medicina (EPM) 1 - Médico residente 2 - Médico contratado Endereço para corredspondência: Denis Bernardi Bichuetti Rua Luiz Dib Zogaib, 80 cep: 05613-020 São Paulo – SP [email protected] Trabalho recebido em 23/05/05. Aprovado em 02/09/05 REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (133-137) Neurociências quais encontramos um maior número de relatos, provavelmente pela sua prevalência em relação às demais (tabela 1). De uma forma didática dividiremos em manifestações agudas e crônicas (figura 1). Tabela 1. Principais síndromes neurológicas nas hepatites virais. 134 hepatite C (HCV) tornam-se crônicas1, devendo ser realizada sorologia na fase aguda e após alguns meses. A Síndrome de Guillain-Barré (SGB) pode estar relacionada com diversos desencadeantes, como infecções (citomegalovírus, Epstein-Barr, Campylobacter jejunni, Mycoplasma pneumoniae) e vacinações (raiva e influenza)9. Chama a atenção, entretanto, que em um estudo prospectivo de 100 pacientes com SGB, onde 38% deles apresentassem alterações de enzimas hepáticas, nenhum deles desenvolveu sorologia positiva para hepatites A, B e C10. Em outra análise com 167 pacientes, 2 deles foram positivos para hepatite A11. Estes números são pequenos e representam uma pequena porcentagem dos pacientes com esta síndrome, no entanto a análise sorológica torna-se importante uma vez que relatos isolados desta associação vêm aumentar esta casuística12-14. Posteriormente, estes pacientes devem ser revistos para avaliar possível conversão sorológica. O mecanismo de lesão neurológica nestes casos ainda é incerto. Acredita-se que mecanismos imunomediados relacionados devam estar relacionados a um mimetismo viral e atividade inflamatória, assim como efeito direto dos vírus no sistema nervoso central (SNC). Estas evidências são mais claras em casos de hepatites crônicas, como veremos adiante. Manifestações neurológicas nas hepatites crônicas O comprometimento tanto do SNC quanto periférico (SNP), mesmo que incomum, é muito mais freqüentemente relatado que nas hepatites agudas. A lesão neurológica acontece com maior freqüência naqueles que apresentam comorbidades como poliarterite nodosa e crioglobulinemias, acreditando-se que o sintoma neurológico advenha de lesões vasculares, tanto de vasa nervorum, quanto de pequenos vasos intracranianos. Provavelmente, a capacidade de indução inflamatória e vascular destes vírus deve tardar a aparecer, justificando a maior relação entre hepatites crônicas e manifestações neurológicas. Manifestações neurológicas na hepatite B crônica Figura 1. Manifestações Neurológicas das Hepatites Virais. Manifestações neurológicas nas hepatites agudas Apesar de raras, hepatites virais podem ser causa de síndromes medulares (mielite transversa), meningites, encefalites. Estas manifestações podem ser concomitantes ao quadro ictérico ou precedê-lo por meses3-8. Estes dados tornam-se importantes na avaliação destes pacientes, uma vez que sabemos que 5% dos casos de hepatites B (HBV) e 85% das infecções por REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (133-137) A infecção pelo HBV cursa com manifestações extrahepáticas em até 20% dos casos15, sendo o acometimento do sistema nervoso ainda menos freqüente, geralmente associado à poliarterite nodosa. Esta relação é reforçada pelo fato do antígeno de superfície do HBV estar presente em até 60% dos pacientes com poliarterite nodosa (PAN)16, sendo relatada neuropatia periférica em 89% de pacientes com PAN e HBV e apenas 52% dos pacientes com PAN sem HBV17. Interessantemente, em um acompanhamento prospectivo de 1400 pacientes portadores do HBV, nenhum desenvolveu sinais de doença neurológica ou crioglobulinemia18. Apesar de descrita, a relação entre HBV e crioglobulinemia permanece controversa19,20. Neurociências Existem, ainda, relatos de doença neuromuscular, SGB e alterações em ressonância magnética em pacientes com infecção crônica pelo HBV, porém a relação causa-efeito destas manifestações é incerta21-23. Manifestações neurológicas na hepatite C crônica Dentre os portadores crônicos do HCV sintomas extra-hepáticos são relatados em até 74% dos pacientes, sendo sintomas neurológicos descritos em torno de 10 a 15% dos portadores do vírus2,24,25. A maioria dos casos envolve o SNP, com relatos de neuropatia periférica, mononeurite múltipla e poliradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória crônica, sendo também quase metade dos casos associados à presença de crioglobulinas 26 , sendo as manifestações clínicas semelhantes às da síndrome neurológica, com parestesias, dores neuropáticas e perda de força, principalmente nos membros inferiores. Nos casos em que foram realizadas biópsias de nervos, os achados são compatíveis com lesões inflamatórias perivasculares: vasculite perineural27-29, neuropatia axonal crônica27, vasculite necrotizante29. Em relação ao SNC, são descritos casos de encefalopatias crônicas evolutivas com sintomas demenciais e manifestações epilépticas, hidrocefalia de pressão normal e doença encefalovascular isquêmica7,8,27,30. Interessantemente, sintomas menores como vertigem, hipoestesias e dificuldades de coordenação são relatados em pacientes portadores do HCV, também apresentando alterações em ressonância magnética descritas como focos de hipersinal em T2 e flair localizados na substância branca subcortical31. Estas alterações, acreditam os autores, podem corresponder a focos de isquemia relacionados à vasculites e crioglobulinemia, porém não se pode descartar efeito direto do vírus no SNC. Casos de neuropatia óptica inflamatória e síndrome das pernas inquietas7 já foram relatados, demonstrando a heterogeneidade da relação entre HCV e sintomas neurológicos, sugerindo que outros casos de portadores do vírus devam estar subdiagnosticados para esta infecção. Assim como para os portadores de HBV, alterações em ressonância magnética de pacientes cirróticos portadores de vírus C são também descritas, porém seu significado é incerto, podendo ser decorrentes de um estágio pré-clínico de degeneração hepatocerebral23. O mecanismo de lesão é provavelmente multifatorial, e acredita-se estar relacionado à formação de imunocomplexos, ativação do complemento e presença de crioglobulinas. Como descrito acima, os sintomas relacionados ao SNP são atribuídos a vasculite de vasa nervorum e degeneração axonal. Já manifestações do SNC estão relacionadas à vasculites intracranianas levando a quadros isquêmicos bem definidos ou REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (133-137) 135 lencoencefalopatia, esta provavelmente a microinfartos em substância branca evoluindo de forma lenta e progressiva. Em um caso de encefalomielite progressiva com rigidez generalizada, RNA viral foi demonstrado no tecido cerebral após necropsia, demonstrando um tropismo pelo SNC. Isso pode significar um mecanismo de lesão independente às lesões inflamatórias e vasculares do HCV no SNC, como efeito primário do vírus, principalmente em doenças degenerativas32. Em relação aos diferentes genótipos do HCV, os tipos 1b e 2a mostram-se mais freqüentes associados à crioglobulinemia, no entanto os portadores dos tipos1b e 3 apresentaram maior envolvimento neurológico (88%) que os portadores dos tipos 2a e 2a/c33. Manifestações neurológicas após vacinação contra hepatite B Complicações neurológicas da vacinação contra hepatite B já foram descritas, mais freqüentemente com quadros desmielinizantes (mielite transversa e SGB), neurite óptica, plexopatias lombossacra e braquial, podendo aparecer dias a semanas depois de administrada uma das doses da vacina (50% ocorreram após a primeira dose)34-36. A afirmação de que a vacinação tenha sido responsável pelo processo desmielinizante não possuí significado estatístico, sendo hoje considerada coincidente e a vacina segura37. TRATAMENTO Não existem trabalhos randomizados ou séries de casos uniformizadas com descrições sobre o tratamento de sintomas neurológicos secundário a hepatites virais. Os pacientes devem receber o suporte necessário em situações agudas, como encefalites e SGB, seguindo as recomendações para o tratamento da manifestação neurológica, como imunoglobulina humana hiperimune ou plasmaférese para SGB9 e suporte intensivo se necessário. Os sintomas de polineuropatia podem ser aliviados com medicações sintomáticas (carbamazepina, gabapentina, amitripitilina), porém a causa de base (neste caso o vírus) deve ser tratada em conjunto com um profissional habituado a esta situação, visto os avanços com uso de interferons e agentes antivirais38. O uso de altas doses de metilprednisolona em forma de pulsoterapia, ciclofosfamida e plasmaférese para pacientes com manifestação de encefalite aguda e uso de corticóides para neuropatia periférica mostraram resultados favoráveis7,8. Estas respostas devem estar relacionadas à modulação de resposta inflamatória, no entanto vale dizer que são relatos isolados e não devem ser interpretados como orientações definitivas, cabendo a cada serviço decidir utilizá-las ou não. O tratamento de polineuropatias de origem autoimune envolve o uso de cortocosteróides, Neurociências plasmaférese, imunoglobulina humana hiperimune e ciclofosfamida39,40. Interessantemente, tratamento com interferon e antivirais foi capaz de reverter os sintomas de poliradiculoneurite desmielinizante inflamatória crônica em um paciente 27,41 e polineuropatia associada à vasculite e crioglobulinemia em outro28, sugerindo que a erradicação do vírus pode reverter os sintomas. Paradoxalmente, há relatos em que o próprio interferon alfa possa induzir resposta autoimune, exacerbando ou precipitando outras doenças autoimunes, incluindo artrite reumatóide, síndrome de Sjogren, sarcoidose, lúpus eritematoso sistêmico e neuropatias imunomediadas (mononeurite múltipla e PDIC). O seu uso deve ser interrompido tão logo apareçam sinais e sintomas sugestivos destas doenças. Nestes casos, o tratamento com agentes imunossupressores pode controlar a evolução da neuropatia autoimune42. O uso de interferon foi relatado em dois pacientes com vasculite cerebral, no entanto alterações de substância branca em ressonância magnética persistiram após o tratamento30. É incerto se o resultado do tratamento antiviral decorrente de sintomas do SNC pode ser tão eficaz quanto aos relatados para SNC, no entanto acreditamos que deva ser tentado, uma vez que ambos são decorrentes de processo inflamatório relacionado à infecção viral, como discutido acima. 136 CONCLUSÕES Sintomas neurológicos decorrentes de hepatites virais são infrequentes, porém não tão raro quanto se pensava. Este fato deve-se provavelmente à maior difusão dos testes para hepatite A, B e C, assim como aumento do conhecimento sobre o processo inflamatório conseqüêncial à infecção viral. Sintomas neurológicos devem ser objetivamente pesquisados em pacientes portadores crônicos do HBV e HCV, assim como as respectivas sorologias virais para hepatites A, B e C devem fazer parte da investigação de apresentações neurológicas agudas (principalmente encefalites, meningites, síndromes medulares e doença encefalovascular em jovens ou idosos sem outros fatores que a expliquem) e crônicas (principalmente neuropatias periféricas). Estudos prospectivos procurando identificar o RNA viral no líquido cefalorraquiano podem ajudar a ampliar o conhecimento da patofisiologia das lesões centrais não vasculares causadas pelo HCV. O tratamento do vírus deve ser considerado mesmo na ausência de manifestação hepática sintomática, uma vez que os sintomas neurológicos podem ser incapacitantes. O uso de altas doses de metilprednisolona, ciclofosfamida, plasmaférese e imunoglobulina permanecem incertos, podendo ser usados como moduladores da resposta inflamatória em encefalites ou neuropatias periféricas graves. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Hepatites, Viral. Wolf CD. Disponível no site: http:// www.emedicine.com/med/topic3180.htm Last Updated: September 2, 2004. acessado em 01/05/2005. 2. Cohen P. Les manifestations extra-hépatiques du virus de l’hepatite C. Press Med 2000;29:209-214. 3. Mtsushima K, Niwa K, Fujita H, Yamamoto M, Shinohara Y. Acute hepatitis A (HA) presenting findings of meningoencephalitis. Rinsho Shinkeigaku 1992;32:441-443. 4. Breningstall GN, Belani KK. Acute transverse myelitis and brainstem encephalitis associated with hepatitis A infection. Pediatr Neurol 1995;12:169-171. 5. Fujita H, Chuganji Y, Yaginuma M, Momoi M, Tanaka T. Case report: acute encephalitis immediately prior to acute onset of hepatitis C virus infection. 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Neurociências 138 Artigo de Revisão Miastenia grave autoimune: aspectos clínicos e experimentais Myasthenia gravis autoimmune: clinical end experimental aspects Andrezza Sossai Rodrigues de Carvalho1; Alexandre Valotta da Silva2; Francis Meire Fávero Ortensi3; Sissy Veloso Fontes4; Acary Souza Bulle Oliveira5. RESUMO A Miastenia Grave (MG) é caracterizada por uma alteração na transmissão nervo músculo, decorrente da deficiência, bloqueio e destruição de receptores de acetilcolina na junção neuromuscular. A presente revisão tem o objetivo de trazer informações atuais sobre a MG, abrangendo os seguintes aspectos: histórico; fisiopatologia; procedimentos diagnósticos; classificação e tratamento da doença. Além disso, revisamos os principais modelos experimentais que mimetizam as manifestações clínicas observadas na MG humana. Unitermos: Miastenia Gravis, Fisioterapia, Atividade Motora. Citação: Carvalho ASR, Silva AV, Ortensi FMF, Fontes SV, Oliveira ASB. Miastenia grave autoimune: aspectos clínicos e experimentais. Rev Neurociencias 2005; 13(3):138-144. SUMMARY Myasthenia gravis (MG) is characterized by an alteration in nerve-muscle transmission due to an acetylcholine receptor deficiency, blockade and destruction in the neuromuscular junction. The present review was aimed to bring current information about MG, including: history, physiopathology, diagnostic procedures, classification and treatment of the disease. Moreover we reviewed the main experimental models that simulate the clinical manifestations observed in human MG. Keywords: Myasthenia Gravis, Physical Therapy, Motor Activity. Citation: Carvalho ASR, Silva AV, Ortensi FMF, Fontes SV, Oliveira ASB. Myasthenia gravis autoimmune: clinical end experimental aspects. Rev Neurociencias 2005; 13(3):138-144. INTRODUÇÃO Muitas doenças interrompem a transmissão entre os neurônios e suas células-alvo, sendo a miastenia grave (MG) uma delas. O termo MG é proveniente do latim e do grego, onde “mys” = músculo, “astenia” = fraqueza, “gravis” = pesado ou severo. A MG é caracterizada por uma alteração na transmissão nervo-músculo, decorren- te da deficiência de receptores de acetilcolina (AChR) na junção neuromuscular (JNM)1,2. Histórico da MG O primeiro caso de miastenia foi descrito em 1877 por Wilks, mas apenas em 1895, Jolly empregou o termo Trabalho realizado: Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina - UNIFESP 1 - Fisioterapeuta Especialista em Intervenções Fisioterapêuticas nas Doenças Neuromusculares pela UNIFESP. 2 - Doutor em ciências e pesquisador do Laboratório de Neurologia Experimental da UNIFESP 3 - Mestre em neurociências e professora das Faculdades Ítalo-Brasileira e João Paulo II. 4 - Doutora em neurociências e professora das Universidades Metodista de São Paulo (UMESP) e Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina – UNIFESP. 5 - Chefe do setor de investigação de doenças neuromusculares e professor da pós-graduação da Universidade federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina – UNIFESP. Endereço para correspondência: Andrezza Sossai R: Pedro de Toledo, 377 – Vila Clementino São Paulo-SP – Cep: 04039-032. Tel. (11) 5571-3324 – e-mail: [email protected] Trabalho recebido em 24/05/05. Aprovado em 26/09/05 REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (138-144) Neurociências MG1-3. Por volta de 1900, alguns neurologistas descreveram características clínico-patológicas importantes da doença, como a relação entre a MG o timo, e a proposta de que algum agente causava fraqueza muscular1,4. Por volta da metade da década de 1930, duas descobertas ajudaram a identificar a MG como uma doença da transmissão neuromuscular. Primeiramente, descobriu-se que inibidores da acetilcolinesterase (AChE) revertem os sintomas da MG e, posteriormente, que a transmissão na JNM se dá através de um mediador químico que foi denominado acetilcolina (ACh)2,3,5. Blalock (1939)6 foi o primeiro a afirmar que os sintomas dos pacientes miastênicos portadores de timoma melhoravam após a remoção do tumor. Após esse achado, descobriu-se que a remoção do timo era benéfica também para pacientes miastênicos que não apresentavam timoma2-5. A concepção de que a MG é decorrente de um transtorno imunológico foi proposta em 1960 por Simpson seu argumento baseava-se na presença de anormalidades tímicas nos pacientes miastênicos e a associação da MG com outras doenças auto-imunes. Também sugeriu que os anticorpos competiam diretamente com o AChR, bloqueando a transmissão neuromuscular2,5,7,8. Em 1973 e nos anos seguintes, a natureza auto-imune da doença foi estabelecida especificamente por Fambrough e Drachman 9 , que usaram alfabungarotoxina radioativa para marcar AChR em placas motoras humanas e encontraram menos sítios de ligação no músculo miastênico do que nos controles. Fisiopatologia da MG A MG pode ser considerada uma doença rara, porém tem se observado um aumento na sua prevalência, que pode ser atribuído a uma maior acurácia diagnóstica. Essa doença manifesta-se em qualquer raça, idade e sexo e apresenta um pico de incidência entre 20-30 anos para mulheres e entre 60-70 para homens10,11. Há diferentes formas clínicas de MG. A miastenia do recém-nascido, a miastenia congênita, a miastenia de origem medicamentosa e a forma mais comum que é a miastenia auto-imune, na qual há a ação de anticorpos contra os AChR na JNM. A maneira como se inicia a produção de anticorpos contra os AChRs na MG auto-imune ainda é desconhecida. Existe a hipótese de que o timo teria alguma relação com a MG, porém isso ainda não é claramente definido. Pode-se dizer que a ação do timo na transmissão sináptica da JNM na MG ocorre através da presença de um antígeno que transforma linfócitos normais em linfócitos imunocompetentes. Cerca de 75% dos pacientes com MG apresentam anormalidades no timo. O timo miastênico contem um número aumentado de células B e linfócitos tímicos que liberam anticorpos contra AchR. Em decorrência a estímulos desconhecidos, as REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (138-144) 139 células mióides do timo se danificam provocando uma falha no mecanismo supressor de linfócitos T helper propiciando um aumento incontrolado de anticorpos contra os AChRs, produzidos pelos linfócitos B. Outras possibilidades compreendem na ocorrência de uma infecção viral que poderia alterar as propriedades da superfície da placa motora, tornando-a imunogênica ou na presença de antígenos virais ou bacterianos que compartilhem epítopos com o AChR, de modo que, quando uma pessoa é infectada, os anticorpos gerados contra o organismo estranho também podem reconhecer o AChR2,4,11,12. Apesar de não ter sido comprovada a maneira como se inicia a produção de anticorpos, estes interferem na interação da ACh com seus receptores. Na MG, os anticorpos ligam-se aos AChR induzindo sua internalização e degradação. Assim, quando a ACh é liberada na JNM, a chance da molécula de ACh encontrar um receptor antes de ser hidrolisada pela AChE torna-se menor visto que a densidade de AChR está reduzida 4,12 . Além disso, algumas mudanças morfológicas, tais como a alteração na geometria da placa motora, a redução das dobras juncionais e o alargamento da fenda sináptica, levam à difusão da ACh para longe da fenda e diminuem ainda mais a probabilidade da ACh interagir com receptores funcionais ainda presentes. Todas essas mudanças interferem na transmissão nervo-músculo, já que a ACh torna-se menos eficaz na estimulação da placa motora e, como resultado, o músculo esquelético não se contrai adequadamente4,9,13. A fraqueza da MG quase sempre afeta músculos cranianos, sendo que 50% dos indivíduos apresentam diplopia transitória e ptose assimétrica. Fraqueza muscular decorrente do comprometimento bulbar é comum e pode produzir regurgitação nasal de líquidos, engasgo, disfagia e voz anasalada. A fraqueza da musculatura cervical faz com que a manutenção da cabeça seja cansativa. Freqüentemente, há fraqueza dos músculos proximais dos membros produzindo dificuldade para subir escadas e levantar os braços, mas os membros dificilmente são afetados isoladamente. A fraqueza dos músculos respiratórios nos pacientes com MG geralmente é sintomática, podendo variar desde uma dispnéia em repouso até uma dispnéia decorrente de esforço intenso. A alteração do volume pulmonar pode levar a áreas de atelectasia e conseqüente hipoxemia, pode haver hipercapnia, como resultado da hipoventilação, e debilidade do reflexo de tosse, devido a fraqueza dos músculos expiratórios. Os músculos enfraquecidos apresentam atrofia, mas os reflexos estão preservados. Outro sinal clínico importante é a fadiga muscular decorrente da estimulação repetitiva dos nervos, que prejudica o poder de contração muscular e leva a paresia progressiva. Vale ressaltar que, nessa situação, o repouso restaura parcialmente a força muscular1,2,4,12,14-19. Neurociências 140 Procedimentos Diagnósticos Recursos Terapêuticos O diagnóstico da MG geralmente é clínico, a partir dos sinais e sintomas da doença. Entretanto, em pacientes que apresentam fraqueza focal de certos grupos musculares, o diagnóstico pode ser difícil. Por este motivo é realizado um teste farmacológico com uma droga anticolinesterásica (Tensilon®), que aumenta a probabilidade de ligação da ACh com os AChR remanescentes, produzindo melhora da força muscular 13,14,20. As drogas anticolinesterásicas são usadas para o alívio sintomático, que raramente é completo, não alterando a evolução da doença. Essas drogas permitem a ACh uma disponibilidade maior na fenda sináptica e conseqüentemente uma maior probabilidade de se fixarem aos receptores remanescentes17,23. Corticosteróides podem ainda ser utilizados quando os pacientes não apresentam boas respostas ao uso dos anticolinesterásicos12,24. O eletrodiagnóstico, através do teste de estimulação motora repetitiva, pode também auxiliar na detecção e avaliação da MG10,14. Os imunossupressores inibem a proliferação celular, suprimindo assim a imunidade celular e humoral; sendo que os mais conhecidos são: azathioprina, ciclofosfamida e metotrexato. Seus efeitos colaterais estão limitados ao uso prolongado das drogas. Alguns autores não encontram diferenças significativas quanto ao uso da azathioprina do corticóide, e por isso recomendam o tratamento com imunossupressor para reduzir a dose de corticóides13. Finalmente, anticorpos contra os AChR podem ser detectados no soro de aproximadamente 80% dos pacientes miastênicos. Entretanto, o nível medido de anticorpos contra AChR, não se correlaciona com a intensidade da doença em muitos dos pacientes2,12,20. FORMAS DE CLASSIFICAÇÃO Classificação clínica da MG segundo Osserman13,18. Grupo I: fatigabilidade e debilidade nos músculos oculares externos. Grupo IIA: MG de forma generalizada e pouco intensa. Há o comprometimento dos músculos cranianos, das extremidades inferiores e do tronco poupando-se os músculos respiratórios. Grupo IIB: MG de forma generalizada e moderadamente intensa. Há a presença de diplopia, ptose palpebral, disartria, disfagia, dificuldade para soprar, debilidade dos músculos das extremidades e intolerância aos exercícios. Grupo III: MG aguda e fulminante. Apresenta grande afecção bulbar e alteração dos músculos respiratórios o que pode levar a necessidade de ventilação mecânica. Grupo IV: MG tardia. A doença torna-se generalizada no primeiro ou segundo ano após o estabelecimento do quadro. Outros autores, tais como Compston e colaboradores (1980)21 e Limburg e colaboradores (1983)22, classificam a MG de acordo com a presença ou ausência de timoma: Tipo I: presença de timoma, sem relação com sexo. A MG usualmente é intensa. Tipo II: não há presença de timoma e ocorre predominantemente em mulheres antes dos 40 anos. Tipo III: não há presença de timoma e ocorre predominantemente em homens após os 40 anos. REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (138-144) No tratamento com altas doses de gama globulina intravenosa supõe-se que haja um bloqueio dos anticorpos por inibição competitiva deixando livre os AChRs da placa motora. Outra possível forma de atuação é a diminuição da produção de anticorpos contra os AChRs por um mecanismo de feedback negativo. Este tratamento está praticamente isento de efeitos colaterais, porem um de seus inconvenientes é seu elevado custo, fazendo com que seja necessário uma correta seleção dos pacientes13. A plasmaferese tem sido usada terapeuticamente em pacientes com MG auto-imune e apresenta grande valia quando utilizada para: (1) preparar o paciente para a timectomia; e (2) reverter as manifestações da doença nos episódios mais graves (crises), produzindo uma redução rápida dos níveis de anticorpos contra AChR23,25. A remoção cirúrgica de timoma e a timectomia são dois procedimentos distintos. Quando há timoma, a remoção cirúrgica é necessária devido à possibilidade de disseminação. Na ausência de tumor, até 85% dos pacientes apresentam alguma melhora após a cirurgia e 35% podem apresentar remissão da doença2,26. Porém a relação entre timectomia e a melhoria ou remissão da MG ainda trás dúvidas. Uma revisão sistemática realizada em 2000 por Gronseth e Barohn26 visava mostrar resultados, quanto a remissão ou melhoria da MG, em pacientes que sofreram ou não a timectomia, mas os resultados obtidos não foram conclusivos mostrando relações conflitantes sobre os benefícios da timectomia em pacientes com MG. Outro estudo, também no ano de 200027, comparou grupos de pacientes, em estágio clínico similar, submetidos a timectomia ou que realizaram tratamento conservador e não encontraram diferenças estatisticamente significantes entre esses grupos com relação a remissão ou a melhoria da doença. Neurociências Esses tratamentos têm permitido uma melhoria significativa no prognóstico para os pacientes com MG. Entretanto, apesar da possibilidade de remissão, a estabilização ou a continuidade da progressão da doença ainda são os resultados mais freqüentes4. 141 ser utilizados como terapia complementar em pacientes com MG por reduzir a dispnéia, retardar as crises respiratórias e produzir certa melhora na força muscular dos membros. Apesar desses resultados, a relação entre o exercício físico e a evolução da MG ainda não está clara devido à carência de parâmetros mais objetivos e uniformes para a avaliação dos pacientes. Exercícios e MG Alguns trabalhos propõem o treinamento da musculatura respiratória como tratamento coadjuvante da MG. Keenan e colaboradores (1995)28 realizaram um estudo com dezessete pacientes (nove homens e oito mulheres) com o objetivo de avaliar a força dos músculos respiratórios (pressão inspiratória e expiratória máxima), resistência e espirometria, antes e vinte minutos após a administração de neostigmina, comparando os pacientes com indivíduos normais. Os pacientes com envolvimento isolado da musculatura ocular apresentaram força normal dos músculos respiratórios e os pacientes com MG generalizada apresentaram uma redução da força e da resistência dos músculos respiratórios. Nesses casos, a administração de neostigmina produziu um aumento significativo da pressão inspiratória máxima. Os autores observaram ainda que o treinamento da musculatura respiratória propiciou uma melhora na força, principalmente, dos músculos inspiratórios. Em um outro estudo, Weiner e colaboradores (1998)29 buscaram determinar os efeitos do treinamento dos músculos respiratórios através de espirometria, classificando os diferentes graus de dispnéia, em pacientes com MG generalizada. Os autores observaram que o treinamento da musculatura inspiratória, isolado ou combinado com o treinamento da musculatura expiratória, melhora a força e a resistência dos músculos respiratórios. A melhora na performance da musculatura respiratória acompanhou-se da melhora da função pulmonar e redução da dispnéia. MG experimental Considerando as dificuldades e limitações do estudo envolvendo seres humanos, modelos experimentais de MG têm sido desenvolvidos em animais de laboratório. Tais modelos tem sido utilizados, principalmente, na investigação de novas terapias medicamentosas para a MG. Em 1959, Nachmanson31 teve a idéia de usar o órgão elétrico do peixe Torpedo californica, como uma rica fonte de AChR, mas naquela época não havia métodos específicos para sua purificação, marcação ou avaliação de sua atividade28. A partir da década de 70, a estrutura bioquímica, a localização e a quantificação dos AChR passou a ser investigada32. As variações estruturais dos AChR são razoavelmente pequenas entre as espécies. Estudos bioquímicos indicam que o AChR é uma glicoproteina de membrana formada por cinco subunidades: duas subunidades alfa, uma beta, uma gama e uma delta. A ACh apresenta grande afinidade ao terminal amino da subunidade alfa do receptor, que fica exposto na superfície extracelular da membrana25,33. Karlin e Akabas (1995)34 demonstraram a presença de dois sítios ligantes para a ACh em cada canal. Esses sítios encontram-se entre as subunidades alfa-gama e alfadelta e, para que o canal se abra de forma eficaz, uma molécula de ACh deve se ligar a cada um esses sítios, permitindo assim o influxo de sódio, potássio e cálcio. Em 1973, Patrick e Lindstron35 injetaram AChR purificado do órgão elétrico do peixe Torpedo californica em coelhos para a obtenção de anticorpos para o estudo das propriedades desse receptor. Surpreendentemente, a produção de anticorpos pelos coelhos foi acompanhada pelo surgimento de sintomas parecidos com os da MG, sendo a fraqueza revertida com a aplicação de AChE. Finalmente, Lena-Eva e colaboradores (1993)30 buscaram determinar se pacientes com MG leve poderiam aumentar sua força muscular ou sua resistência à fadiga através de treinamento físico. Os pacientes selecionados aleatoriamente realizaram exercícios de contração isométrica máxima repetida, com duração de dois a quatro segundos e dez segundos de descanso nos membros superior e inferior, usando como controle os membros superior e inferior contralaterais. Para o teste de fadiga, os pacientes foram submetidos a contrações máximas com duração de três segundos e dois segundos de descanso. Os autores observaram que um treinamento muscular isométrico não apenas pode ser executado com segurança na MG leve, mas também produz certa melhora na força muscular, sem efeitos colaterais negativos. Lennon e colaboradores36 descreveram um modelo de MG auto-imune experimental (MGAE) em ratos e porcos da índia e observaram que a MGAE é similar à doença humana nas manifestações clínicas, imunopatológicas e histológicas. Essas características compreendem (1) a redução da amplitude dos potenciais da placa motora; (2) a redução das dobras juncionais da placa motora; (3) a perda dos AChR e (4) a deposição de anticorpos nos locais pós-juncionais onde houve a perda dos AChR. Esses estudos mostram que o treinamento da musculatura respiratória e o treinamento isométrico de determinados grupos da musculatura apendicular podem Além da indução por meio de AChR purificado do órgão elétrico da enguia (TAChR), anticorpos humanos também causam sintomas da MG. Linfócitos-B de paci- REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (138-144) Neurociências entes com MG mantidos em cultura produzem anticorpos para os AChR e ao injetar-se repetidamente o soro de pacientes em camundongos, é possível reproduzir as anormalidades eletrofisiológicas nos animais4,37. Diferentes animais podem ser utilizados para a indução de MGAE experimental, entretanto melhores respostas são observadas quando se utiliza o modelo em ratos da cepa Lewis (quadro 2), mais especificamente em fêmeas (quadro 1). Esses animais são imunizados com idade entre 6-8 semanas de vida, através da aplicação na pata traseira de uma emulsão contendo peptídeo sintético com a seqüência de aminoácidos imunogênica (R97-116 – DGDFAIVKFTKVLLDYTGHI ou T97-116 - DGDFAIVHMTKLLLDYTGKI) e adjuvant completo de Freud (CFA) suplementado com 1mg de H37Ra/ rat no dia zero e estimulado no dia trinta com o mesmo peptídeo em adjuvante incompleto de Freud (IFA). A imunização também pode ser realizada com TAChR purificado e adjuvant completo de Freud (CFA) suplementado com 1mg de H37Ra/rat38-40. Quadro 1. Comparação da indução da MG em ratos da cepa Lewis e camundongos B6 142 Nesse modelo, três fases bem delimitadas podem ser observadas: aguda, latente e crônica. Após a imunização, os ratos passam por duas fases de fraqueza muscular. A primeira, transitória, é a fase aguda, com fraqueza iniciando entre 7 e 11 dias após a indução, com recuperação após três ou quatro dias. Esta fraqueza afeta, predominantemente, os membros superiores, cabeça, pescoço e músculos laríngeos e respiratórios. Os animais adotam uma postura onde a cabeça tende voltar-se para baixo e muitas vezes o queixo e o cotovelo ficam sobre o chão; há presença de giba no dorso do animal e as coxas ficam parcialmente abduzidas. Ocorre também incontinência urinária e dificuldade para engolir. Quando há tentativa de deambulação, movimentos espásticos da cabeça e dos quatro membros são observados25,36,40. O uso do adjuvante completo de Freud (ACF) favorece a indução da fase aguda na MGAE, mas eventualmente os animais podem permanecer assintomáticos até a fase crônica25,38-40. Na fase latente (originalmente descrita como “passiva”) é observada uma estabilização tanto do quadro de fraqueza quanto das posturas adotadas na fase aguda. Apresenta uma duração de 15-20 dias que vai desde o término da fase aguda até o início da fase crônica41,42. A fase crônica constitui a segunda fase de fraqueza muscular, é progressiva e inicia-se entre 28 e 30 dias após a imunização, sendo normalmente precedida, um ou dois dias, por perda de peso e sinal de doença respiratória crônica, que piora com o tempo39,43. O conteúdo muscular de AChR diminui e aproximadamente 70% dos receptores remanescentes estão ligados a anticorpos39,40. Esses aspectos da fase crônica são semelhantes àqueles observados na MG humana crônica44. Quadro 2. Comparação da EAMG e da MG humana Baggi e colaboradores (2003)38 determinaram a intensidade da doença em ratos através de uma escala para a mensuração da fraqueza muscular. Nessa escala, a evolução clínica é descrita em relação à presença de: (1) espasmos, (2) giba na região dorsal, (3) força muscular e (4) fatigabilidade. Para a avaliação da fatigabilidade muscular, os animais são colocados sobre uma grade metálica, o examinador puxa o animal pela cauda e avalia a preensão das patas. A pontuação pode variar do nível 0 (zero) ao nível 4 (quatro), sendo que o nível 0 corresponde à força normal, no nível 1 há um médio decréscimo da força, no nível 2 há um início de fraqueza, no nível 3 o animal encontra-se em estado agonizante e no nível 4 o animal evolui para o óbito. Do ponto de vista laboratorial, a MGAE pode ser confirmada através do teste de cloreto de edrofônio e do teste de estimulação repetitiva do nervo. CONSIDERAÇÕES FINAIS A MG é a doença que mais comumente afeta a transmissão nervo-músculo e tem sido amplamente investigada REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (138-144) Neurociências do ponto de vista clínico. Ao longo do século XX, o substrato fisiopatológico da MG crônica foi esclarecido e diversas terapias foram desenvolvidas na tentativa de aliviar as manifestações clínicas e retardar a evolução da doença. Entretanto, sob muitos aspectos, a MG continua sendo um desafio para terapeutas e pesquisadores. Nesse sentido, a utilização de diferentes modelos experimentais de MG têm possibilitado o desenvolvimento de novas estratégias imunoterapêuticas38,40,45-48, como também o estudo das 143 manifestações clínicas da doença5,7,25,36, da estrutura do AchR22,33,34,41,44 e dos distúrbios eletrofisiológicos associados à disfunção da JNM8,49. Nesse início de século XXI, a MG permanece como o protótipo das disfunções da junção neuro-muscular. Para um futuro próximo, a integração dos resultados de estudos clínicos e experimentais constituirá uma nova fase no desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas para a MG (quadro 2). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Adams RD et al. Miastenia grave e distúrbios correlatos da transmissão neuromuscular. In: Adams RD, Victor M. Neurologia. Traduzido por: Amaury J Cruz Junior et al. 6º ed. Rio de Janeiro: Mac Graw Hill; 1998, p 957-968. 12. Drachman DB. Myasthenia gravis and other diseases of the neuromuscular junction. In: Fauci AS et al. 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Neste trabalho, procura-se situar como este “uso” da TRS pode ser compreendido num certo entendimento da função da Linguagem, o que a mantém, recorrentemente ligada a uma concepção de linguagem como “cálculo”. Conclui-se que a TRS, resgatada na concepção da linguagem como meio universal, deve ser compreendida no âmbito da pesquisa social e das metodologias qualitativas, o que implica um desafio à naturalização dos grupos e das representações sociais, e implica um relacionamento entre o pesquisador, sujeito e objeto de conhecimento, que não é apenas de descoberta, mas de construção. Unitermos: Ciências Sociais, Conhecimento, Psicologia Social, Linguagem, Pesquisa Qualitativa. Citação: Carvalho JEC. As Representações Sociais e o Conhecimento do Cotidiano: Uma crítica metodológica a partir da Filosofia da Linguagem. Rev Neurociencias 2005, 13(3):145-151. SUMMARY On this article I discuss a modality of knowledge constructed inside social groups: the social representations. As a well-known approach to Public Health problems, especially on Brazilian reality, Social Representations Theory (SRT) has been taken many times just as an analytic tool, what conducts to the naturalization of groups and group’s discourses. Such approach denies the acute criticism present on Serge Moscovici’s intent of studying a modality of knowledge submitted to social context and history. The article’s aim is indicating, as usually SRT and its methodological approach are located inside a special modality of language, a language as calculus, on the tradition of a Husserlian philosophy of language. I conclude that, from another conception of language, language as a universal medium, SRT must be understood as a social and qualitative enterprise, which supports a kind of relationship among scientist and knowledge, with the researcher as a better social constructor than an explorer. Trabalho Realizado: Instituto de Ciências Humanas, Universidade Paulista e NECON - Núcleo de Estudos do Conhecimento, UNIFESP. Parte deste trabalho foi realizado através de bolsa CNPQ (132814/1991-9). 1 - Doutor em Psicologia (USP). Pesquisador Visitante do Departamento de Antropologia da Johns Hopkins University, Baltimore, EUA. Endereço para correspondência: João Eduardo Coin de Carvalho Rua Japurá, 55 ap 617 São Paulo – SP – CEP 01319-030 e-mail: [email protected] Trabalho recebido em 09/06/05. Aprovado em 02/09/05 REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (145-151) Neurociências 146 Keywords: Social Sciences, Knowledge, Social Psychology, Language, Qualitative Research. Citation: Carvalho JEC. Social Representations Theory and Everyday Knowledge: A methodological criticism from Philosophy of Language. Rev Neurociencias 2005, 13(3):145-151. REPRESENTAÇÃO SOCIAL: FENÔMENO DA INTERAÇÃO Se a questão da psicologia social é procurar integrar indivíduo e sociedade, encontrar o caminho que leva a este objetivo tem se mostrado uma tarefa bastante árdua para a pesquisa1. Tomando ou retomando as obras e idéias de Wundt ou Durkheim (ou Weber) muitos pesquisadores se interessaram em constituir teórica e metodologicamente um campo de trabalho onde se possa recuperar a idéia de grupo dentro da psicologia social. Nesta perspectiva se encontram os esforços de Serge Moscovici em forjar uma teoria que viesse incluir um problema crônico dentro das ciências sociais: a relação entre o pensamento científico e aquele que se refere ao senso comum, o pensamento popular 2 . Preocupado com os problemas sociais do nosso tempo, procurando lidar com eles levando em conta sua dimensão histórica, contextual, Moscovici se deparou com o que ele entendia ser um fenômeno, antes de ser um conceito, a representação social, que ele definiu como sendo “uma rede de imagens e conceitos interagindo, cujos conteúdos se diferenciam continuamente através do tempo e do espaço”3. Fruto da interação, a idéia de representação social se apresenta com uma plasticidade que a diferencia do conceito de representação coletiva, definido por Durkheim. Ela irá se constituir no contexto das relações, sejam elas entre indivíduos, intragrupos ou intergrupos. A forma pela qual estas relações se dão, o lugar e o momento onde acontecem, são os parâmetros que irão conferir sentido a uma representação social. Surgindo de uma rede de interações em constante mudança, a representação social se caracteriza, então, por ser dinâmica. Mais ainda, ela propicia não apenas o reconhecimento do mundo como também é uma “preparação para a ação” que, por ser singular, reconstrói o meio, não o reproduz. A representação social é uma ferramenta que fornece ao indivíduo parâmetros para o comportamento e orientação para as relações sociais. No dizer de Moscovici: “Ela consegue incutir um sentido ao comportamento, ao integrá-lo numa rede de relações em que está vinculado ao seu objeto, fornecendo ao mesmo tempo as noções, as teorias e os fundos de observação que tornam essas relações estáveis e eficazes.”4 A representação social refere, assim, um indivíduo que participa da sociedade, interpretando as suas variações, os seus saberes. Através da representação social o indivíduo se apropria e ordena o mundo, dando sentido àquilo que parece ser “estranho”, ou que, à primeira vista, é hermético, considerado propriedade de especialistas. Na passagem da teoria para o senso comum, num processo mediado pelo diálogo entre os indivíduos, a idéia de representação social descobre nos grupos sociais um discurso que explica o mundo e que orienta o comportamento dos indivíduos pertencentes a este grupo*. Não sendo uma teoria científica, mas uma versão do senso comum, isto não lhe confere, no entanto, o status de pensamento primitivo ou menor. Ao contrário, a representação social se apresenta como uma categoria especial de conhecimento5, variando, como já foi dito, em função de onde, quando e de quem se serve dela. Um exemplo talvez possa ilustrar melhor estas características: o que acontece quando determinada população fala de “doenças”? “A população de origem espanhola do Sudoeste dos Estados Unidos possui nada menos de quatro registros para classificar e interpretar as doenças: (a) a sabedoria popular medieval do sofrimento físico; (b) a cultura das tribos ameríndias; (c) a medicina popular inglesa nas zonas urbanas e rurais; (d) a ciência médica. De acordo com a gravidade da doença, e com sua situação econômica, eles empregam um ou outro destes registros para procurar a cura”.4 Por se definir em função de um contexto, a representação social também se caracteriza por atualizar no comportamento do grupo um componente histórico. Assim, o comportamento não é função apenas de circunstâncias imediatas mas, de alguma maneira, é controlado por aquilo que não é mais, ou melhor, que só é através da representação social que preserva este passado, que não é um passado de eventos apenas, mas é um passado de relações entre indivíduos, e assim anterior à própria constituição do indivíduo. Dinâmica, organizadora, integradora, histórica, a representação social se apresenta e se reproduz nas conversas do dia-a-dia, nas esquinas, bares, praças – e salas de espera – instalando-se de uma maneira que subverte “as normas e a rigidez habituais de aprendizagem”4. Integrando o que é desconhecido, a representação social * Desta forma a representação social se mostra um conceito mais abrangente do que outros usualmente presentes em psicologia social, como os de opinião, associado à previsão do comportamento de um indivíduo - ou grupo - em face do objeto, de imagem, que implica uma reprodução precisa do objeto, ou mesmo o de atitude, já que, a representação social é mais do que uma posição frente ao objeto, pois dá conta de uma teoria, de um conhecimento sobre o mesmo. REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (145-151) Neurociências possibilita apontar a importância do senso comum nas ações dos indivíduos no mundo. A objetivação e a ancoragem Uma representação social se constitui, de acordo com Moscovici, a partir de dois processos básicos: a objetivação e a ancoragem. A objetivação é o processo pelo qual se tenta reabsorver um excesso de significações, materializando-as4. A quantidade de significantes e indícios que um determinado grupo utiliza pode se tornar de tal maneira abundante que os sujeitos, frente a esta situação, procuram combatê-la tentando ligar as palavras a coisas. Moscovici entende que desta forma os conceitos ganham cor ou se concretizam, e assim a objetivação permite ao sujeito apoderar-se de determinado conhecimento, eliminando intermediários. Transportando para o seu mundo um conhecimento que era apenas inferência ou símbolo os sujeitos o incorporam ao oferecer-lhe status de objeto e, então, podem manuseá-lo. A objetivação ocorre segundo as operações de naturalização e classificação. No processo de objetivação é necessário, inicialmente, que se transporte os elementos objetivos para o meio cognitivo, onde se prepara para eles uma mudança fundamental de status e função. Esta é a naturalização. Realizado isto, ocorre a classificação, operação que coloca e organiza as partes do meio ambiente e, mediante seus cortes, introduz uma ordem que se adapta à ordem preexistente, atenuando dessa forma o choque de toda e qualquer nova concepção. Assim, podemos dizer que o processo de objetivação consiste na incorporação de determinado objeto social que, de idéia passa a coisa, adentrando no universo cognitivo dos sujeitos e tomando forma e posição de acordo com a singularidade deste universo. O outro processo presente na constituição da representação social é a ancoragem. Ela implica a inserção de um determinado objeto social “na hierarquia de valores e entre as operações realizadas pela sociedade. (...) a sociedade converte o objeto social num instrumento de que ela pode dispor, e esse objeto é colocado numa escala de preferência nas relações sociais existentes”.4 Assim, a ancoragem é o outro lado da moeda em relação à objetivação. Se esta última procura integrar o objeto social a um universo cognitivo, aquela procura fazer deste objeto incorporado instrumento de ação e modificação da realidade. A ancoragem ajusta o objeto representado à realidade da qual ele foi sacado, promovendo a constituição de uma rede de significações em torno do objeto e orientando as conexões entre ele e o meio social. Assim, o objeto, via representação social, passa a ser um instrumento auxiliar para a interpretação da realidade. REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (145-151) 147 Representando a Representação Social: uma crítica metodológica Reconhecida como uma corrente importante e inovadora no contexto da psicologia social européia, a Teoria das Representações Sociais de Moscovici, junto com os trabalhos de sobre identidade social e relações intra e intergrupais6 e a abordagem “etogênica” de Harré7, é apontada como uma resposta européia e, assim, de vocação “mais” social, à psicologia social de orientação americana e suas teorias de cunho individualista8,9. Apesar de sua importância e mesmo por conta dela, desde a apresentação do trabalho pioneiro sobre a psicanálise no inicio da década de 604 as críticas às representações sociais têm sido muitas e de diversas ordens no próprio cenário da psicologia social européia. Räty e Snellman10 já apontavam entre os principais temas destas críticas a ambigüidade da teoria, as definições de grupo e consenso e os processos de formação e transformação das representações. Tomando como ponto de partida tais críticas, que envolvem não apenas aspectos teóricos mas que também demandam a discussão das práticas de pesquisa11-15, destacamos uma questão que atravessando vários temas pode nos servir como chave para discutir parte delas: o uso e o conceito de linguagem no âmbito da Teoria da Representações Sociais. Propomos discutir qual o estatuto da linguagem presente na TRS, tendo como referência trabalhos e discussões do campo da Filosofia da Linguagem, em função das conseqüências teóricas e metodológicas desta filiação. Como vimos acima, a representação social pode ser apresentada como fruto da relação homem-sociedade. Ela é um produto sócio-cognitivo enquanto processo social que torna acessível o antes inapreensível de um outro discurso como o discurso científico, sendo uma ferramenta para a interpretação do mundo. Mais ainda, ela se presta para a construção da realidade, num processo que integra os universos individual e social. O processo no qual está envolvida a representação social não resulta numa cópia inerte da realidade, mas na reconstrução desta realidade, de tal maneira que a reconstrução ocorre através de interações e, portanto, ao longo do tempo. Tendo isto como ponto de partida, iremos verificar qual é a concepção – ou concepções – de linguagem que pode ser apreendida do conceito de representação social. Para isso tomamos como referência a classificação sugerida por Hintikka16, segundo a qual a linguagem pode ser entendida como cálculo ou como meio universal. Discutiremos, então, qual a conseqüência disto para o estudo das representações sociais. Baseado na distinção entre duas maneiras de conceber a lógica proposta por Jean van Heijenoort, Jaakko Hintikka distingue dois tipos de teoria da linguagem: a linguagem como cálculo e a linguagem como meio universal. Esta divisão permitiria uma clara oposição em relação a determinadas questões dentro das teorias da Neurociências linguagem, como a da verdade, a da possibilidade da metalinguagem, a do relativismo, a dos mundos possíveis e a do formalismo. Para o primeiro tipo, que teria a teoria da linguagem desenvolvida pelo filósofo alemão Edmund Husserl como referência, a linguagem seria uma ferramenta, algo que pode ser manipulado, reinterpretado, melhorado, mudado e substituído como um todo, ou ao menos em larga escala. Seria possível discutir, na linguagem, suas relações semânticas com o mundo. Segundo Kusch16 os princípios centrais da visão da linguagem como cálculo são a acessibilidade dos sentidos, a reinterpretabilidade das linguagens, a possibilidade de metalinguagem, a verdade como correspondência, a oposição ao relativismo e a defesa do realismo. Já a concepção de linguagem como meio universal, que tem filósofos como M. Heidegger, H. G. Gadamer e L. Wittgenstein como representantes, comportaria por sua vez a relação entre a linguagem e o mundo como algo que não poderia ser objetivamente traduzido, na medida em que não seria possível falar de fora da linguagem. Neste caso a impossibilidade de expressão do sentido levaria ao entendimento da metalinguagem como um mau uso da linguagem, à impossibilidade da verdade como correspondência com o mundo, à aceitação do relativismo e à rejeição da idéia de mundos possíveis. Quanto ao formalismo, ele seria recusado pelas teorias da linguagem como meio universal quando concebido como uma forma de libertar a linguagem de uma interpretação fixa, e seria assimilado na medida em que um estudo gramatical da linguagem seria tudo o que resta para fazer em vista da inefabilidade da semântica. Procurando exemplificar o que foi indicado quanto a esta última corrente, tomamos especificamente Heidegger e Gadamer, verificando que eles compreendem a linguagem, mais especificamente a fala, ocupando um lugar que é mais do que um elo, que a fala é responsável pela construção da realidade e que é mesmo anterior a esta realidade do ponto de vista do indivíduo. Esta posição não pretende indicar, no entanto, que não exista algo “aí”, fora do sujeito, mas que este real só existe a partir da linguagem. A linguagem é meio universal, reservatório da tradição em e através do qual nós existimos e percebemos nosso mundo17. Heidegger e Gadamer propõem o papel da linguagem como potencializado, já que ela mais do que apenas revelar, faz a realidade. A linguagem não pode ser entendida como objeto, mas sim investida de aspectos dinâmicos que implicam uma rede de relações que organiza o mundo e sobre a qual não temos controle. No limite, poderíamos dizer que não falamos, mas que na verdade somos falados através da linguagem. Heidegger e Gadamer utilizam a metáfora do “jogo”, procurando explicar essa autonomia da linguagem. Eles explicam que a fascinação do jogo está justamente em se estar à mercê dele. O jogo tem sua própria dinâmica que envolve o jogador: REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (145-151) 148 “Agora eu afirmo que a constituição básica do jogo, de acordo com seu espírito e para satisfazer quem está jogando é estruturalmente relacionada à constituição do diálogo no qual a linguagem é a realidade”.17 Os indivíduos que participam do “jogo” têm, a partir desta concepção, uma relação com a linguagem que nega a possibilidade de haver um controle absoluto sobre ela. Voltando à metáfora do jogo: embora possamos operar com as regras para buscar atingir uma certa meta, os caminhos que o desenrolar do jogo vão seguir escapam ao nosso domínio absoluto enquanto jogadores. A visão não-husserliana da linguagem, que a trata como tendo a função não de representar o mundo, mas a de construir o mundo através de seu uso, tem também sua origem nos trabalhos de Wittgenstein sobre a teoria da linguagem. Quando busca uma relação entre os objetos do mundo e a linguagem, Wittgenstein18 afirma que é necessário que essa relação possa ser verificada rigorosamente. A verificabilidade da relação, no entanto, não implica que a linguagem deverá ser um reflexo da realidade. Essa verificação se dará, sim, na checagem da estrutura lógica da própria linguagem, isto é, de sua gramática, entendida aqui não nos seus aspectos formais, mas nas possibilidades que definem como ela pode e será utilizada. Considerando a irredutibilidade entre o mundo físico e a linguagem, ele entende que esta jamais poderá reproduzir o mundo, sendo apenas possível uma linguagem que fale das possibilidades do mundo, ou ainda, das possibilidades das falas sobre o mundo contidas na sua sintaxe. O sentido de uma determinada palavra será compreendido apenas a partir das relações dessa palavra dentro de um certo sistema, esta gramática, estando assim sujeita a uma verificação lógico-gramatical, e não a uma verificação “física”. Face a essa linguagem que “fala” do mundo sem pretender refleti-lo, fica ressaltada a idéia do uso, do discurso como constituído de jogos que regulam as relações de significação. Isto é, o entendimento de um discurso se dá na medida do uso que se está fazendo dele. Estes jogos de linguagem seriam meios únicos, assim, de falar de nossa experiência, de fazê-la pública através do único caminho que a linguagem oferece para tratar da realidade do mundo. Assim, as concepções não-representacionais da linguagem indicam que as condições de uso da linguagem são decisivas para a interpretação da linguagem e de sua função, mostrando uma dificuldade fundamental nas pretensas tentativas de tratar “objetivamente” tudo o que diz respeito à linguagem. Desde que a linguagem é a morada do ser, todas as operações que pretendermos fazer a partir da linguagem irão por em jogo a condição de “ser” daquele que fala. Voltando à Teoria da Representações Sociais, verificamos que o papel desempenhado ali pela linguagem – em que pese seu caráter imagético – é muito impor- Neurociências tante. A representação se constitui através de relações, e entendemos que estas relações são, antes de mais nada, relações entre falantes. A linguagem serve como meio, mas através das conversas entre os indivíduos uma dada representação social também é construída e modificada. Para a linguagem não está reservado apenas o papel de transmitir uma representação, mas ela também tem o papel de construir a representação. E, construída, ela “transforma” aquilo que é objeto de especulação através da elaboração de argumentos que se prestam para interpretar e explicar a realidade, fazendo da representação uma ferramenta que é usada como linguagem19. Essa linguagem que é, simultaneamente, mídia e ferramenta para a construção da realidade, será utilizada então por indivíduos que, tomados na perspectiva das representações sociais, não são sujeitos particulares, mas membros de um grupo. Não se trata aqui de dizer que não existam sujeitos singulares, mas que as representações sociais não se constituirão a partir da soma das representações dos indivíduos, mas num processo coletivo de argumentação e de confronto. Quem fala, fala por outros e não apenas por si e a interpretação deste discurso irá desvelar uma certa representação social que toma como referência a posição ocupada pelo grupo a que pertencem os falantes. Neste sentido, como pode ser visto em um sem número de investigações conduzidas nos últimos anos20, a linguagem interpretada é uma linguagem repleta de significações – inclusive contraditórias – compartilhadas pelo grupo, que permitiria que a filiação do falante a este grupo fosse estabelecida. É neste ponto que se encontra uma encruzilhada que, na opção por uma ou outra concepção de linguagem, produz efeitos importantes tanto sobre a própria TRS quanto nos aspectos metodológicos associados a este campo. De fato, a discussão sobre a concepção de linguagem por trás da TRS ecoa outras tantas discussões que se fazem no âmbito das Ciências Sociais a respeito das diferenças entre pesquisas qualitativas e quantitativas ou entre as práticas científicas nas Ciências Sociais e Humanas e nas Ciências Naturais. No campo da saúde, especialmente, esta tem sido uma questão recorrente21, 22. Ao se instalar como “ferramenta” reconhecidamente importante nas investigações sobre o conhecimento do senso comum (por exemplo, na área de saúde) repetidas vezes, a linguagem é tomada como o que garante o acesso a um sentido único (para o grupo), onde há uma verdade que se funda na correspondência entre o sentido e o significado (dentro do grupo), onde a realidade é a dada pelo social (que é, antes de mais nada, grupal). A linguagem aqui é “coisa” que pode ser medida, sua relação com a realidade – o meio social – pode ser estabelecida diretamente, fazendo da palavra “representante” da representação social, da unidade que é resultado da relação entre o objeto e o processo cognitivo REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (145-151) 149 social correspondente, através do grupo. Nestes casos, a linguagem inerente à representação social, uma linguagem de grupo, de consenso, se localizaria, neste sentido, próxima às concepções que descrevem a linguagem como cálculo, passível de se alcançar seu sentido pela própria linguagem sem maiores dificuldades. O uso da Teoria das Representações Sociais se faz assim dentro de uma perspectiva tecnológica que naturaliza o “objeto”, isto é, o grupo e “suas” representações sociais, cabendo ao investigador descobrir a verdade sobre aquele objeto, aproximando a pesquisa social das práticas de investigação próprias das ciências naturais. No caso em que a linguagem é “objeto”, entendo que a própria representação social também está congelada, destituída de seu caráter dinâmico, estando a linguagem, assim, enquanto representante da representação – e solidaria à subtração que lhe foi imposta – também se apresentando como algo inerte, destituído de seu caráter instituinte da realidade. Esta forma de se tratar a linguagem como uma ferramenta representacional dentro da Teoria das Representações Sociais já foi objeto de importantes críticas13,14,23. Estes autores entendem que, apesar da sensibilidade de Moscovici em relação à importância da linguagem, isto é, apesar dele próprio reconhecer que não vem sendo dada atenção suficiente ao papel da linguagem no estudo das representações sociais24, que ela é o método através do qual entendemos e trocamos nossas maneiras de ver as coisas5, e de que as palavras fazem mais do que representar coisas, elas criam coisas13, e isto apenas como exemplos, a importância deste caráter instituinte da linguagem não é tomada como relevante, isto é, ela seria, ainda, invariável, de sentido único, podendo ser apreendido diretamente, o que, se acontece, se dá pela demanda tecnológica sobre o uso das representações sociais: o conhecimento do senso comum, afinal de contas, também é instrumento de dominação e controle social. A linguagem, mesmo ocupando um lugar importante na constituição de uma representação social, acaba por ser para muitos dos que atuam junto à Teoria das Representações Sociais, reduzida à sua dimensão representacional, na maioria das vezes não se observando em qual determinado jogo, em que gramática, a linguagem se insere. Isto é, não levam em conta a linguagem como tendo um caráter instituinte e mais, do qual participam não apenas os “objetos” da investigação, sujeitos e grupos sociais com suas linguagens, mas também os próprios pesquisadores. Algumas das sugestões metodológicas para tentar escapar a isto passam pela realização de análises lingüísticas do discurso através do estudo de repertórios interpretativos, abrindo mão da Teoria das Representações Sociais e assim descartando problemas como o do consenso e da necessidade de uma teoria cognitiva13,25,26. Neste caso se estaria levando em conta não uma representação enquanto Neurociências conceito “puro”, mas uma representação referenciada ao uso específico que dela se faz numa determinada situação. O sentido da representação estará ligado ao lugar ocupado por ela em relação à função desempenhada por uma certa fala, de tal forma que se procura buscar na linguagem uma função que não é a de apenas representar mas, e principalmente, a de propiciar um campo onde o significado se apresente como fruto de um jogo do qual os indivíduos participam usando a linguagem segundo as possibilidades que ela oferece. Ainda assim, estas abordagens críticas podem não considerar o que indicamos acima como o caráter instituinte da linguagem, isto é, que as práticas de investigação no âmbito das Ciências Sociais e Humanas, que se dão através da linguagem , não permitem que um pesquisador apenas acesse a realidade do outro que é alvo de sua investigação, seja a representação social, sejam repertórios interpretativos. A ação do pesquisador, redefinida a relação entre sujeito e objeto do conhecimento22, é instituinte na medida em que ele se coloca num jogo de linguagem ou, ainda, cria um dispositivo de investigação que confronta discursos, reconstrói significados e produz efeitos sobre as subjetividades tanto dos outros como dele mesmo. Isto implica o pesquisador no campo da TRS não como um aplicador de técnicas, mas, a cada vez que se encontra em campo, como um interventor social, com suas singularidades, escolhas políticas e éticas. CONCLUSÕES Quando tomamos a linguagem como referência para o estudo das representações sociais e presenciamos ali a insistência sobre as teorias que falam da linguagem como cálculo, nos deparamos com uma questão que tem, para nós, importantes conseqüências metodológicas. Ela diz respeito ao que apontamos como caráter inerte da representação social quando vista em relação a uma linguagem de grupo. Neste caso a representação social espelha uma linguagem fundamentalmente representacional e gera uma dificuldade no lidar com sua vocação para ser uma unidade dinâmica, sujeita às ingerências da história e do social – no que, aliás, a teoria das representações sociais carrega uma de suas principais virtudes – numa vertente que aproximaria a TRS das teorias que falam da linguagem como meio universal. Enquanto resposta possível, vimos as propostas indicadas por Potter que apostam na análise de discurso como solução para resolver este problema e que procuram discutir a função da linguagem num determinado contexto. Entendemos, no entanto, que embora fundada na palavra a representação social é mais do que linguagem, segundo os termos apontados acima. A representação social poderia ser tomada como unidade de uma linguagem “particular” na medida em que é uma linguagem de grupo, e é necessário conhecer o grupo e sua REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (145-151) 150 história para poder desvelá-la, assim como perceber em que jogo aquele determinado grupo esta implicado. Assim, a solução proposta por Potter, que encontra fundamento nas teorias não representacionais da linguagem e aponta para a importância de se estudar a função da linguagem na representação social, ainda não dá conta do uso “encarnado” da própria representação social para um grupo determinado. Se ele reconhece que nas pesquisas que pretendem um estudo das representações sociais restrito aos seus conteúdos, quando se exige da linguagem um papel essencialmente representacional, que supõe um consenso de grupo, que se deixa de lado, a função constitutiva da linguagem reclamada por Potter, ele ainda não considera a dimensão histórico-grupal da representação social. Este fato, que deve ser entendido como dizendo respeito a um certo cenário metodológico, ocorre tendo em vista que muitos trabalhos têm tomado os grupos que são alvo de suas investigações “fora do tempo”, ou seja, fazem o levantamento da representação social mas não de suas histórias, histórias do grupo e histórias da representação social. Desta forma, isolando os conteúdos dos processos envolvidos na sua constituição, perdem-se aqueles elementos responsáveis pelo que há de dinâmico na produção e modificação da representação e, na mesma medida, fica posta de lado o manejo que um determinado grupo faz em relação a uma certa representação social, seus elementos imaginários27. Assim, para o estudo das funções psicológicas e, principalmente, sociais das representações sociais, entendemos ser necessária uma investigação que preserve as questões da história e da função (jogo) destas representações, numa preocupação que continua aquela apontada entre os estudiosos da linguagem como meio universal, sem restringir a análise a sua dimensão retórica. Concordando com o já sugerido por Jodelet28 e Spink29,30, reafirmo a importância de pesquisas que invistam nos conteúdos mas também nos processos envolvidos com as representações, integrando estas duas dimensões e apelando para a história de sua produção como fonte da investigação. Finalmente, considerando a importância de localizar a TRS no âmbito da Pesquisa Social, as pesquisas que se dão em meio à linguagem levam à necessária implicação das subjetividades daqueles envolvidos na investigação, numa posição que não pode deixar de considerar estas práticas como intervenções que se apoiam em aspectos éticos e políticos. Neste sentido, é necessário que estas dimensões ética e política devam acompanhar as discussões sobre os objetivos destas investigações, as suas implicações sociais e o desvelamento ideológico ao qual elas podem estar a serviço. Quando transformam as representações sociais em objetos naturais, os pesquisadores reafirmam uma relação com o conhecimento que se pretende verdadeira e precisa, contribuindo para práticas de controle e dominação. Neurociências Procuramos neste texto, a partir de alguns elementos retirados da filosofia da linguagem, esclarecer as críticas quanto às abordagens que retiram o caráter dinâmico das representações sociais, e que têm no uso da linguagem enquanto ferramenta representacional um espelho. Partindo da linguagem na Teoria das Representações Sociais e caminhando em direção à presença das representações sociais em linguagem, apontamos para um caminho 151 metodológico que, sem deixar de lado as preocupações sobre os conteúdos, leva em consideração os processos envolvidos, as histórias de um grupo e das próprias representações sociais, e as subjetividades e responsabilidades dos indivíduos que participam deste esforço, como maneira de indicar a importância das dimensões simbólica e imaginária no estudo dos grupos sociais e de suas expressões quando isto se dá “em linguagem”. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Doise W. Da psicologia social à psicologia societal. Psic Teor Pesq 2002; 18(1): 27-35. 17. 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Pesquisadores da Teoria Neuromaturacional afirmam que a variabilidade se origina ao nascimento e espelha o desenvolvimento do sistema nervoso normal. Em contrapartida, estudiosos da Teoria de Sistemas Dinâmicos relacionam a variabilidade motora às influências ambientais. A partir da combinação entre a perspectiva Neuromaturacional e de Sistemas Dinâmicos, admite-se que o desenvolvimento motor normal é caracterizado por duas fases de variabilidade. A variabilidade primária é determinada por informações genéticas e a variabilidade secundária é gerada para adaptar a performance motora a situações específicas. Sendo assim, inicialmente os movimentos são altamente variáveis e a seguir os padrões de movimento com maior valor adaptativo são selecionados. Nesse sentido, a variabilidade tem sido relacionada com diferentes resultados, dependendo do estágio de desenvolvimento motor. Nos primeiros meses de vida, a baixa variabilidade de movimentos pode apontar para déficits motores, enquanto que em fase mais tardia representaria um comportamento estabilizado. Unitermos: Desenvolvimento Infantil, Atividade Motora, Diversidade Genética, Meio Ambiente. Citação: Campos D, Santos DCC, Gonçalves VMG. Importância da variabilidade na aquisição de habilidades motoras. Rev Neurociencias 2005; 13(3): 152-157. SUMMARY This study, accomplished from revision of the literature, was aimed at describing the theories that base the normal motor development and to show the importance of motor variability. Researchers from different theoretical approaches agree that the variability is a fundamental aspect of motor development. However, they diverge as for the explanation of variability origin. Researchers of Maturational Theory affirm that variability originates at birth and reflects the development of normal nervous system. On the other hand, the Dynamic Systems Theory relates the motor variability to environmental influences. Starting from the combination between the Maturational and of Dynamic Systems perspective is admitted that the normal motor development is characterized by two variability phases. The primary variability is determined for genetic information and the secondary variability is generated to adapt the motor performance to specific situations. Being like this, initially the movements are highly variable and to follow the movement patterns with larger adaptative value are selected. In that sense, the variability has been related with different results, depending on the stages of motor development. In the first months of life, the low movements’ variability can point to motor disabilities, while in later phase it would represent a stabilized behavior. Keywords: Child Development, Motor Activity, Genetics Variation, Environment. Citation: Campos D, Santos DCC, Gonçalves VMG. Importance of variability in the acquisition of motor’s abilities. Rev Neurociencias 2005; 13(3): 152-157. Trabalho realizado: Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP). 1 - Mestre em Fisioterapia, Programa de Pós-Graduação em Fisioterapia FACIS/UNIMEP, Fisioterapeuta. 2 - Profa. Dra. do Programa de Pós-Graduação em Fisioterapia FACIS/UNIMEP, Fisioterapeuta. 3 - Livre Docente do Departamento de Neurologia e Centro de Investigação em Pediatria, FCM/UNICAMP, Neurologista Infantil. Endereço para Correspondência: Denise Castilho Cabrera Santos Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP) Rodovia do Açúcar Km 156, Bloco 07 Sala 46 CEP 13400-911, Piracicaba/SP. Tel. (19) 3124-1558 / Fax (19) 3124-1503 Email: [email protected] Trabalho recebido em 12/07/05. Aprovado em 15/09/05 REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (152-157) Neurociências INTRODUÇÃO O primeiro ano de vida da criança é caracterizado por grandes mudanças. O termo desenvolvimento, quando aplicado à evolução da criança, significa constante observação no crescimento das estruturas somáticas e aumento das possibilidades individuais de agir sobre o ambiente1. Os primeiros estudos sobre desenvolvimento motor surgiram no século 20, e os pioneiros foram Shirley, McGraw e Gesell. Esses pesquisadores acreditavam que as mudanças nas habilidades motoras resultavam da maturação do sistema nervoso central (SNC), mais especificamente de um controle do córtex cerebral2. Esta visão de habilidades motoras dependentes da maturação do SNC foi denominada Teoria NeuroMaturacional, na qual as transformações motoras ocorrem em razão das propriedades intrínsecas do organismo, ou seja, sem interferência das influências ambientais3. Recentemente, as novas perspectivas teóricas no vasto campo da ciência da motricidade, aumentaram nossos conhecimentos sobre o desempenho motor. Admite-se que as etapas de desenvolvimento motor têm uma base genética, mas as potencialidades inatas só se desenvolvem na medida em que o recém-nascido encontra um ambiente favorável4. O desenvolvimento neural é fundamental para que a criança adquira habilidades5, porém outros fatores como a prática e a oportunidade para interagir com o ambiente também parecem exercer influência decisiva sobre o desenvolvimento motor. Frente a esses achados, o foco das avaliações que tradicionalmente priorizava o comportamento reflexo, atualmente está voltado para a observação do desempenho funcional do lactente, enfatizando sua movimentação espontânea no ambiente6,7. Acredita-se que a habilidade do lactente para ajustar e variar as atividades motoras representa um marco para o desenvolvimento motor normal8. Ao passo que a estereotipia ou diminuição da variabilidade dos movimentos muitas vezes aponta para alterações no desenvolvimento9. Pretende-se com este artigo discutir a importância da variabilidade motora à luz das principais teorias que embasam o desenvolvimento motor normal. Teoria Neuromaturacional A Teoria Neuromaturacional pressupõe que o ritmo e a seqüência de desenvolvimento motor são invariáveis e dependentes da maturação neural8. Nesse sentido, frente à avaliação do desenvolvimento motor, é esperado que um lactente classificado no percentil 75, na avaliação de quatro meses, permaneça nessa faixa de percentil nas avaliações seguintes, refletindo assim uma constância na taxa de aquisição motora10. A Teoria Neuromaturacional aplica os conceitos de controle motor da Teoria Reflexo-Hierárquica para explicar a evolução do comportamento motor da criança11. O modelo reflexo-hierárquico pressupõe que o SNC é organizado numa hierarquia vertical, na qual um centro superior comanda, planeja e delega o programa motor para os centros subordinados o executarem. Seguindo essa linha de REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (152-157) 153 pensamento, a Teoria Neuromaturacional oferece interpretações sobre as mudanças no comportamento motor ao longo da vida, baseando-se na maturação dos centros cerebrais superiores12. A idéia que os padrões motores emergem numa ordem genética resultou na distinção de regras para a evolução motora, sendo a seqüência de desenvolvimento descrita como céfalo-caudal e próximo-distal13. Considerando essa progressão, estima-se que inicialmente, por volta do 3º mês, apareça o controle de cabeça, a seguir a habilidade para sentar sem apoio no 8º mês e a marcha por volta do 12º mês14. A partir dessa concepção, os movimentos de chute, normalmente vistos nos lactentes durante os primeiros meses de vida, são considerados expressão de padrões de movimentos simples e não intencionais, controlados pelos centros medulares15. Acredita-se que as atividades precoces criam as condições necessárias para as atividades consecutivas, ou seja, constituem um requisito indispensável para os atos subseqüentes. Sendo assim, qualquer variação no tempo ou na ordem de surgimento dos padrões motores está associada com desenvolvimento motor anormal. Illingworth (1966) apud Touwen9 sugere que a variabilidade na seqüência ou no ritmo de desenvolvimento indica pior prognóstico. De maneira geral, a Teoria Neuromaturacional contribuiu muito para a compreensão e descrição do desenvolvimento normal e patológico. No entanto, as explicações das mudanças comportamentais baseadas na dependência da maturação neural não foram suficientes para definir a complexidade do desenvolvimento motor16. Teoria de Sistemas Dinâmicos A Teoria de Sistemas Dinâmicos contrasta com essa visão tradicional e propõe novos fundamentos sobre como o lactente aprende a se mover e manipular objetos. Enquanto a Teoria Neuromaturacional afirma que os reflexos primitivos precisam ser inibidos para que os movimentos voluntários se estabeleçam, a abordagem de Sistemas Dinâmicos considera esse comportamento como pré-funcional, o qual se aperfeiçoaria em direção à ação motora adequada à tarefa e ao contexto17. Existe inter-relação entre maturação neurológica e experiências ambientais, sendo que uma favorece o desenvolvimento da outra18. Como resultado da experiência, profundas mudanças maturacionais podem ocorrer no tecido neural. Paralelamente, as mudanças maturacionais podem por sua vez, alterar a prontidão do organismo para assimilar os estímulos ambientais. Particularmente no primeiro ano de vida observa-se uma seqüência progressiva, no que se refere à aquisição das habilidades motoras. O lactente vai aumentando seu repertório motor e os movimentos tornam-se mais eficientes, adequando-se às intenções da criança. No entanto, embora a capacidade para executar determinados movimentos surja à medida que ocorre a maturação neural, não significa obrigatoriamente que, apenas porque um certo ato motor precede outro, aquele deva sempre ser anterior a este ou que a sua instalação em época mais precoce facilite a aquisição do outro ato motor. O engatinhar, por exemplo, Neurociências não é uma condição indispensável para a aquisição da marcha, pois se trata de um ato biomecânico muito diferente, no que se refere à função muscular, mais especificamente aos ajustes posturais19. Lactentes com dois meses de idade alcançaram os brinquedos inicialmente usando os pés e após um mês ou mais realizaram o alcance com as mãos20. A maior estabilidade da articulação do quadril proporciona menor grau de liberdade da perna21 e, portanto diminui a quantidade de movimento que precisa ser controlado ativamente. Esses resultados sugerem que o aparecimento dos comportamentos motores não necessariamente segue um padrão céfalo-caudal. Bernstein (1967) apud Shumway-Cook e Woollacott22 reconheceu que não era possível compreender o controle motor sem compreender as características de um sistema em movimento e que forças externas e internas estão agindo sobre o corpo. O corpo foi considerado como um sistema mecânico, com massa corporal, sujeito a forças externas, como a gravidade e forças internas tal como a inércia. Portanto, esta perspectiva considera que não apenas o sistema nervoso atua no controle motor, mas também os músculos, o sistema esquelético, a força da gravidade e inércia. Acredita-se que os padrões motores dos lactentes resultam da interação dinâmica entre vários fatores que facilitam ou dificultam os movimentos. Esses fatores podem ser internos como, o estado cognitivo, a habilidade de percepção, o peso do corpo, a força muscular, a biomecânica; e externos tais como as condições ambientais e a tarefa23. Alguns estudos mostram os efeitos de fatores externos no comportamento motor. Lactentes posicionados em prona, aumentaram a freqüência e o tempo de permanência do comportamento mão-boca, em relação à postura supina24. Lactentes de seis meses de vida produziram um padrão mais adequado de alcance, quando o controle postural foi facilitado por cadeira com apoio na região pélvica e suporte nas pernas25. Portanto, na Abordagem de Sistemas Dinâmicos não existem níveis superiores e inferiores, mas uma interação entre percepção, cognição e ação. Desta forma, o SNC é visto como um dos sistemas que interage para produzir o movimento26. Os atos de percepção e ação estão intimamente ligados e não há separação no desenvolvimento motor2. Admite-se que os impulsos sensoriais e perceptivos contribuem para a aprendizagem de habilidades motoras. Sendo assim, o lactente refina o padrão de agarrar baseando-se nas informações táteis, sinestésicas e visuais de como os objetos são manuseados e transferidos de uma mão para outra27. As informações visuais, vestibulares e proprioceptivas permitem ao lactente orientar a cabeça e o corpo para o equilíbrio e a marcha22. Cabe destacar, entretanto, que não somente a percepção conduz a ação, mas também o movimento origina a percepção de mundo ao lactente. Adicionalmente a Teoria de Sistemas Dinâmicos preconiza que a emergência de comportamentos motores se dá a partir de processos de auto-organização. Um exemplo que retrata o processo de auto-organização está assoREVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (152-157) 154 ciado ao engatinhar. Trata-se de um comportamento coerente que o lactente utiliza para se mover quando ele tem força e coordenação suficiente para assumir a posição de quatro apoios, mas ainda não tem condições para manter a posição ortostática. Sendo assim, o engatinhar prevalece durante muitos meses, no entanto, quando o lactente aprende a andar, ocorre a substituição do primeiro comportamento (engatinhar) pelo segundo (andar), uma solução mais eficiente28. Admite-se, portanto que, o organismo evolui de um estado menos organizado para um mais organizado, cujos sub-sistemas tais como muscular, esquelético, nervoso e circulatório se reúnem em cooperação para que novos comportamentos possam se manifestar16. Estes sub-sistemas estão em constante flutuação, mudando ao longo do tempo29. Como resultado desta instabilidade, os padrões de comportamento emergem quando um ou mais sub-sistemas atingem “pontos críticos”, fazendo com que o sistema entre em um novo estado de organização. Considerando que os sub-sistemas podem se desenvolver em períodos distintos, a evolução do organismo é vista como uma série de estados de estabilidade e instabilidade. Nesse sentido, os lactentes em desenvolvimento não apresentam surgimento estável das habilidades motoras, havendo períodos em que poucas habilidades são adquiridas e outros marcados por grande quantidade de aquisições acontecendo simultaneamente30. Durante os períodos de estabilidade, os lactentes não aprendem muitas habilidades novas, portanto, a classificação na faixa de percentil diminui10. Para os autores essa diminuição na faixa de percentil não significa que as habilidades motoras foram perdidas, mas que a taxa de aquisição de novas habilidades não ocorreu de maneira uniforme. Sendo assim, embora o desenvolvimento seja comum a todas as crianças, a idade para o surgimento de novas habilidades varia, visto que a evolução é determinada por fatores genéticos e ambientais31. Acredita-se que a utilização de brinquedos inapropriados para a faixa etária e a baixa condição sócio-econômica da família podem exercer influências negativas sobre o desenvolvimento de crianças biologicamente saudáveis32. Além disso, alguns estudos, que comparam lactentes de diferentes grupos culturais, têm demonstrado que o padrão de desenvolvimento motor não é universal33, 34. Foi observada diferença significativa entre os lactentes brasileiros e norte-americanos nas avaliações de 3º, 4º e 5º meses. Nesses períodos, os lactentes brasileiros apresentaram baixo desempenho nas provas que envolviam as habilidades de sentar e preensão33. Outro estudo comparando lactentes brasileiros e canadenses34 demonstrou diferença no desenvolvimento motor dos dois grupos, principalmente nas posições prono e em pé. Acredita-se que os lactentes brasileiros vivenciam poucas experiências nessas posições. Variabilidade de Movimentos O desenvolvimento sensório-motor é um processo de seleção de movimentos. Ao nascimento a criança apresenta repertório de movimentos específicos, o qual tende Neurociências a se modificar com o desenvolvimento e a demanda de tarefas. Portanto, o sistema motor mostra grande capacidade de adaptação e flexibilidade35. Nos primeiros meses de vida, passam grande parte do tempo explorando o próprio corpo, observando como se movem e agindo sobre o ambiente36. Inicialmente, seus movimentos parecem carecer de controle e coordenação. As diferentes partes do corpo, tais como cabeça, tronco e membros parecem mover-se de forma independente uma da outra, demonstrando considerável variabilidade nos movimentos37. Estudos verificaram que o comportamento motor de fetos e recém-nascidos é caracterizado pela abundante variação na trajetória e nos aspectos temporal e quantitativo dos movimentos38. Essa variabilidade pode ser ilustrada pelos movimentos gerais, os quais constituem parte do repertório de movimentos espontâneos, variam quanto à intensidade, força e velocidade e estão presentes desde o período fetal até o sexto mês de vida pós-natal. Trata-se de movimentos complexos, que ocorrem freqüentemente e envolvem o corpo todo numa seqüência variável de movimentos de braços, pernas, pescoço e tronco39. Acredita-se que a qualidade dos movimentos gerais pode ser indicadora da integridade funcional do sistema nervoso central dos recém-nascidos. Vários padrões anormais em sua expressão estão relacionados à evolução neurológica insatisfatória, sugerindo que os movimentos gerais podem ser uma ferramenta importante no diagnóstico de lesão cerebral40. Por volta dos três meses de idade os movimentos gerais adquirem seu maior valor preditivo41,42. A rica variação no comportamento motor também tem sido documentada nas primeiras fases do controle postural, alcance, engatinhar e andar43-46. Pesquisadores de diferentes abordagens teóricas concordam que essa variabilidade é um aspecto fundamental do desenvolvimento motor9,47. O entanto, eles divergem quanto à explicação da origem da variabilidade. A origem da variabilidade motora foi atribuída às propriedades do sistema nervoso normal e na presença de lesão cerebral ocorre redução da variabilidade9. Semelhante a esses achados, foi observado em lactentes de alto risco, movimentos monótonos e estereotipados47. Ambos pesquisadores, adeptos da Teoria Neuromaturacional, afirmam que a variabilidade se origina ao nascimento e espelha o desenvolvimento do sistema nervoso normal. Em contrapartida, para os pesquisadores adeptos da Teoria de Sistemas Dinâmicos a variabilidade é vista como uma medida de estabilidade do movimento. Dessa maneira, o grau de variabilidade se modifica conforme o estágio de aprendizagem de uma habilidade específica. Novos comportamentos são instáveis e representados por considerável variabilidade, ao passo que os comportamentos praticados e selecionados apresentam diminuição da variabilidade48. Foi observado diminuição na quantidade de movimentos fetais gerais entre 28 e 38 semanas de gestação49. Esse resultado foi atribuído não somente a diminuição do espaço intra-uterino, mas também a maturação neurológica do feto. REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (152-157) 155 Todos os movimentos observados nos fetos também estão presentes nos lactentes50. Entretanto, os lactentes possuem maior variedade de tipos de movimentos. De acordo com a perspectiva de Sistemas Dinâmicos, esse aumento da variabilidade seria justificado pela redução dos fatores físicos limitantes no ambiente extra-uterino. A perspectiva Neuromaturacional atribuiria o aumento da variabilidade ao desenvolvimento do sistema nervoso, sendo que o aumento das conexões neurais resultaria em aumento dos padrões de movimentos disponíveis. Nesse sentido, a variabilidade no desenvolvimento motor normal pode ser explicada a partir da combinação entre as perspectivas Neuromaturacional e de Sistemas Dinâmicos. É referido que existem duas fases de variabilidade, denominadas como primária e secundária13. A variabilidade primária pode ser verificada no comportamento de fetos e lactentes, os quais apresentam variação na trajetória e nos aspectos temporal e quantitativo dos movimentos. Cabe destacar, que essa variação não é aleatória, mas determinada por informações genéticas. Durante esse período, ocorre exploração de todas as possibilidades motoras disponíveis para a execução de uma determinada função. Com relação à variabilidade secundária, esta é produzida para adaptar a performance motora de acordo com as diferentes condições externas. Segundo o autor, ambos os tipos de variabilidade, por meio de informações aferentes, selecionam o padrão de movimento mais eficiente. Foi observado que, antes dos lactentes adquirirem o sentar sem apoio, já existia um complexo de respostas posturais altamente variáveis51. Sendo assim, acredita-se que inicialmente esses ajustes posturais se desenvolvem através de repertório congênito, e a seguir, a experiência da postura contribui para a seleção do padrão de resposta mais eficiente com relação a estabilização. O processo de exploração-seleção é definido como repetidos ciclos de percepção e ação em relação à meta estabelecida23. O princípio de exploração-seleção baseiase na perspectiva de que o ser humano está percebendo e participando ativamente do movimento, no qual múltiplos sistemas sensoriais (visual, vestibular e somatosensorial) contribuem para percepção do movimento, postura e interação com ambiente. De modo geral, pode-se inferir que o lactente recebe informações da periferia e pode modificar sua ação de acordo com a percepção52. Portanto, a idéia central do processo de exploração-seleção é que o lactente realiza determinado movimento motivado por uma tarefa, admitindo várias possibilidades de execução, o que lhe permite escolher a melhor maneira para executar aquela ação53. A integração de novas estratégias motoras ocorre por meio de um processo de seleção neuronal, no qual as conexões de neurônios associadas aos padrões de movimento mais eficientes são fortalecidas por meio do uso repetido54. Sendo assim, inicialmente os movimentos gerados são espontâneos e altamente variáveis. A seguir, as informações sensoriais são recebidas e os padrões de movimento com maior valor adaptativo são selecionados. A partir dessa linha de pensamento, a baixa variabilidade de movimentos tem sido relacionada a diferentes mecanismos. Nos primeiros meses de vida, pode apon- Neurociências tar para déficits motores, enquanto que numa fase mais tardia representaria um comportamento mais estabilizado ou aprimorado55. A lesão cerebral durante os primeiros meses de vida resulta em perda ou redução da variabilidade motora e prejuízo nos processos de seleção dos padrões de movimento eficientes56. Acredita-se que a seleção seja dificultada em virtude de prejuízos no processamento das informações proprioceptivas, táteis ou visuais57. Corroborando com esses achados, foi observado58 que as crianças com grau moderado de paralisia cerebral manifestam um repertório limitado de estratégias motoras e processamento sensorial prejudicado, o qual interfere nos processos de seleção da melhor solução motora para tarefas específicas. Portanto, a variação reduzida nos primeiros meses de vida continua sendo indicadora de anormalidade no desenvolvimento. Lactentes com paralisia cerebral apresentam pouca variação na mobilidade e postura; e em idades mais avançadas o comportamento motor dessas crianças é caracterizado pela estereotipia, havendo dificuldade para adaptar o ato motor as diferentes condições ambientais9. Complementando esse aspecto, em revisão sistemática recente sobre os efeitos da intervenção no desenvolvimento motor59 foi concluído que o tratamento neuroevolutivo não tem efeito benéfico sobre o desenvolvimento motor, e indicaram que aqueles programas que atuam sobre o desenvolvimento geral ou específico, estimulando a exploração do comportamento motor ativo, podem ter efeito mais positivo. 156 CONCLUSÃO Este estudo descreveu as principais teorias que fundamentam o desenvolvimento motor normal e mostrou a importância da variabilidade motora, através de revisão da literatura. Concluiu-se que o desenvolvimento motor resulta da interação contínua entre potenciais biológicos, geneticamente determinados e circunstâncias ambientais. Tendo em vista os inúmeros fatores que atuam em cada indivíduo, uma das características do desenvolvimento motor normal é a variabilidade. Pôde-se notar que pesquisadores de diferentes abordagens teóricas concordam que a variabilidade é um aspecto fundamental do desenvolvimento motor. No entanto, os adeptos da Teoria Neuromaturacional atribuem a origem da variabilidade às propriedades do sistema nervoso normal; e os adeptos da Teoria de Sistemas Dinâmicos defendem que a variação motora se deve às influências ambientais. A partir da combinação entre a perspectiva Neuromaturacional e de Sistemas Dinâmicos foram estabelecidas duas fases de variabilidade denominadas: primária e secundária. Na fase primária, a variação no comportamento motor é determinada por informações genéticas. Na fase secundária, a variação surge para adaptar a performance motora as diferentes condições externas. Ambos os tipos de variabilidade, a partir das informações aferentes, selecionam o padrão de movimento mais eficiente. Nesse sentido, a baixa variabilidade nos primeiros meses de vida tem sido associada com déficits motores e numa fase mais tardia tem sido relacionada ao comportamento aprimorado. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Vayer P, Roicin C. Psicologia atual e desenvolvimento da criança. São Paulo: Manole, 1990: 9-71. 2. Lockman JJ, Thelen E. Developmental biodynamics: brain, body, behavior connections. Child Dev 1993; 64: 953-59. 3. Thelen E, Kelso JAS, Fogel JAS. Self-organizing systems and infant motor Development. Dev Review 1987; 7: 39-65. 4. Le Boulch JO. Indicações educativas do nascimento até 3 anos. In: Le Boulch JO. Desenvolvimento psicomotor do nascimento até 6 anos: a psicocinética na idade pré-escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1984: 72-81. 5. 6. 7. Shepherd RB. Desenvolvimento da motricidade e da habilidade motora. In: Shepherd RB. Fisioterapia em pediatria. 3. ed. São Paulo: Santos, 1998: 9-42. Piper MC, Darrah JM. Motor assessment of the developing infant. Philadelphia: W.B. 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Neurociências 158 Artigo de Revisão Doença de Parkinson – Diagnóstico Parkinson´s Disease – diagnosis Egberto Reis Barbosa1, Flávio Augusto Sekeff Sallem2 RESUMO O diagnóstico de doença de Parkinson é feito avaliando-se a história do paciente, o seu exame neurológico e a resposta à terapia dopaminérgica. Não há marcadores biológicos que permitam fazer o diagnóstico, e a tomografia computadorizada/ressonância magnética tipicamente não demonstra alterações. Causas de parkinsonismo secundário devem ser excluídas antes que o diagnóstico de doença de Parkinson seja feito. Parkinsonismo atípico, ou parkinsonismo-plus, é um termo cunhado para se referir a um subgrupo de parkinsonismo secundário. Incluído nessa definição está uma ampla variedade de condições cujas características clínicas se sobrepõem às da doença de Parkinson. Este artigo tem por objetivo fornecer uma visão geral das dificuldades e desafios que podemos encontrar ao dar o diagnóstico de doença de Parkinson. Unitermos: Doença de Parkinson, Transtornos Parkinsonianos, Diagnóstico, Parkinsonismo Secundário, Doenças Neurodegenerativas. Citação: Barbosa ER, Sallem FAZ. Doença de Parkinson – Diagnóstico. Rev Neurociencias 2005, 13(3): 158-165. SUMMARY The diagnosis of Parkinson’s disease is made by evaluation of the patient’s history, neurological examination and response to dopamine replacement therapy. There is no biological marker that makes the diagnosis, and CT and MRI are typically unrevealing. Causes of secondary parkinsonism are excluded before a diagnosis of Parkinson’s disease is made. Atypical parkinsonism, or parkinsonism-plus, is a term coined to refer to a subtype of secondary parkinsonism. Included under these terms is generally a wide group of conditions that overlap in their clinical manifestations with Parkinson’s disease. The aim of this article is to provide an overview of the difficulties and the challenges we can find when giving the diagnosis of Parkinson’s disease. Keywords: Parkinson Disease, Parkinsonian Disorders, Diagnosis, Secondar y Parkinson Disease, Neurodegenerative Diseases. Citation: Barbosa ER, Sallem FAZ. Parkinson´s disease – diagnosis. Rev Neurociencias 2005, 13(3): 158-165. INTRODUÇÃO Entre as moléstias que afetam o sistema nervoso central a doença de Parkinson (DP) apresenta importância especial, pois se inclui entre as mais freqüentes enfermidades neurológicas, com prevalência na população ao redor de 100 a 150 casos por 100.000 habitantes1. A DP é uma moléstia crônica e progressiva do sistema nervoso central que acomete principalmente o sistema motor, porém manifestações não motoras como distúr- bios do sistema nervoso autônomo, alterações do sono, de memória e depressão, também podem ocorrer1. O início da doença ocorre geralmente próximo dos 60 anos de idade, acometendo igualmente ambos os sexos e diferentes raças2. Os casos da doença que têm início antes dos 40 anos são denominados como parkinsonismo de início precoce3. A etiologia da doença ainda é obscura e controversa, contudo supõe-se a participação de vários mecanis- Tabalho realizado: Grupo de Estudo de Distúrbios de Movimento da Clínica Neurológica do CH/FMUSP 1 - Livre-Docente da FMUSP, Coordenador do Grupo de Estudo de Distúrbios do Movimento da Clínica Neurológica do HC/FMUSP 2 - Médico Colaborador do Grupo de Estudo de Distúrbios de Movimento da Clínica Neurológica do CH/FMUSP. Endereço para Correspondência: Egberto R. Barbosa Rua Sergipe 401, sala 311 - Higienópolis - São Paulo - CEP 01243-001 Tel: (11) 3214-1457 E-mail: [email protected] Trabalho recebido em 20/09/05. Aprovado em 02/10/05 REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (158-165) Neurociências mos etiopatogênicos como: fatores genéticos, neurotoxinas ambientais, estresse oxidativo, anormalidades mitocondriais e excitotoxicidade3. A DP tem caráter degenerativo e é caracterizada pela perda progressiva de neurônios da parte compacta da substância negra, situada no mesencéfalo. A degeneração nesses neurônios é irreversível e resulta na diminuição da produção de dopamina, que é um neurotransmissor essencial no controle dos movimentos4. A deficiência dopaminérgica leva a alterações funcionais no circuito dos núcleos da base (estruturas localizadas profundamente no cérebro envolvidas no controle dos movimentos), provocando o aparecimento dos principais sinais e sintomas da doença1,3. Quadro Clínico da DP Na DP a principal manifestação clínica é a síndrome parkinsoniana, decorrente do comprometimento da via dopaminérgica nigro-estriatal. Os distúrbios mentais, demência e depressão e os distúrbios autonômicos como obstipação intestinal, seborréia e tendência à hipotensão, freqüentes na DP, são decorrentes em grande extensão do envolvimento de estruturas fora do circuito dos núcleos da base3,4. A Síndrome Parkinsoniana O parkinsonismo ou síndrome parkinsoniana é um dos mais freqüentes tipos de distúrbio do movimento e apresenta-se com 4 componentes básicos: acinesia, rigidez, tremor e instabilidade postural. Pelo menos dois desses componentes são necessários para a caracterização da síndrome5. 159 Outras alterações motoras eventualmente presentes na síndrome parkinsoniana e consideradas como independentes da acinesia, do ponto de vista fisiopatológico, mas semiologicamente a ela relacionados são a acinesia súbita e a cinesia paradoxal3,5. A acinesia súbita ou congelamento (freezing) caracteriza-se pela perda abrupta da capacidade de iniciar ou sustentar uma atividade motora específica, mantendo-se as demais inalteradas. Manifesta-se mais freqüentemente durante a marcha, e pode, portanto, ocorrer como uma hesitação no seu início ou determinar uma frenação súbita dos movimentos dos membros inferiores, às vezes levando à queda, já que a inércia tende a manter o corpo em movimento3,5. A acinesia súbita pode surgir quando o paciente se depara com um obstáculo real, como uma pequena elevação do solo, ou apenas visual, como uma faixa pintada no solo. Outras vezes, uma situação de tensão emocional pode desencadear o fenômeno. Determinados estímulos sensoriais ou motores podem fazer desaparecer essa dificuldade, e alguns pacientes, conscientes desse fato, utilizam-no para controlar a acinesia súbita. Esse tipo de quadro motor é incomum nos primeiros anos de evolução DP, mas tende a surgir com a progressão da mesma, podendo agravar consideravelmente a incapacidade motora3,5. O inverso da acinesia súbita pode ocorrer no parkinsonismo, ou seja, melhora abrupta e de curta duração do desempenho motor, quando sob forte emoção. Este fenômeno é conhecido como cinesia paradoxal5. A acinesia súbita e a cinesia paradoxal, diversamente da acinesia, que é dependente do déficit dopaminérgico, parecem estar relacionadas a oscilações de atividade noradrenérgica3,5. A acinesia é caracterizada por pobreza de movimentos e lentidão na iniciação e execução de atos motores voluntários e automáticos, associada à dificuldade na mudança de padrões motores, na ausência de paralisia. Esse tipo de desordem motora pode englobar ainda incapacidade de sustentar movimentos repetitivos, fatigabilidade anormal e dificuldade de realizar atos motores simultâneos3,5. A acinesia e os distúrbios correlatos mencionados interferem decisivamente na atividade motora voluntária, sobretudo automática, e levam a dificuldades que se manifestam nos atos motores básicos da vida diária como a marcha, a fala e as atividades que requerem a conjugação de atos motores como a alimentação, o vestir-se e a higiene corporal3. O termo bradicinesia ou oligocinesia refere-se mais especificamente à lentidão na execução de movimentos. Hipocinesia é a designação dada por alguns autores para a pobreza de movimentos manifestada por redução da expressão facial (hipomimia), diminuição da expressão gestual corporal, incluindo a diminuição ou ausência dos movimentos associados dos membros superiores durante a marcha (marcha em bloco), e redução da deglutição automática da saliva, levando a acúmulo da mesma e perda pela comissura labial (sialorréia). Outro distúrbio motor relacionado à acinesia é a aceleração involuntária na execução de movimentos automáticos e a sua forma mais conhecida é a festinação, que se caracterizada por uma aceleração involuntária da marcha3,5. No parkinsonismo a escrita sofre modificações precoces e, por vezes, características, quando tende à micrografia3,5. REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (158-165) A marcha desenvolve-se a pequenos passos, às vezes arrastando os pés e, como já mencionado, há perda dos movimentos associados dos membros superiores (marcha em bloco), hesitações no seu início, interrupções e aceleração involuntária3,5. Na fala há comprometimento da fonação e da articulação das palavras, configurando um tipo de disartria denominada hipocinética. Nessa disartria sobressaem: redução do volume da fala, que pode tornar-se apenas um sussurro; perda da capacidade de inflexão da voz que se torna mo- Neurociências 160 nótona; e distúrbios do ritmo, que podem consistir em episódios de hesitação inicial e cadência lenta, pontuada por pausas inadequadas, hesitações ou acelerações involuntárias (semelhantes à festinação da marcha)3,5. No contexto das alterações psiquiátricas na DP destaca-se a depressão, que está presente em cerca de 40% dos pacientes com DP, podendo ocorrer em qualquer fase da evolução da doença 3,6. A rigidez é outra anormalidade motora quase sempre presente na síndrome parkinsoniana. Trata-se da hipertonia denominada plástica. A resistência à movimentação do membro afetado pode ser contínua ou intermitente, sendo que esta configura o fenômeno da “roda denteada”. Outra característica da hipertonia plástica é o acometimento preferencial da musculatura flexora, determinando alterações típicas da postura, com ântero-flexão do tronco e semiflexão dos membros (postura simiesca). Outro aspecto semiológico relacionado à hipertonia plástica é a exacerbação dos reflexos tônicos segmentares (reação paradoxal de Wesphal ou reflexo local de postura de Foix-Thévenard). Esse fenômeno pode ser mais facilmente observado quando o examinador faz a flexão dorsal do pé do paciente. Essa movimentação passiva desencadeia uma contração prolongada dos músculos envolvidos levando à persistência dessa postura por algum tempo3,5. Entre as alterações autonômicas a mais freqüente é a obstipação intestinal, porém podem estar ainda presentes: seborréia, hipotensão postural e alterações de esfíncter vesical3. O tremor parkinsoniano é clinicamente descrito como de repouso, exacerbando-se durante a marcha, no esforço mental e em situações de tensão emocional, diminuindo com a movimentação voluntária do segmento afetado e desaparecendo com o sono. A frequência varia de quatro a seis ciclos por segundo e costuma envolver preferencialmente as mãos, configurando a alternância entre pronação e supinação ou flexão e extensão dos dedos3,5. A instabilidade postural é decorrente da perda de reflexos de readaptação postural. Esse distúrbio que não é comum em fases iniciais de evolução da DP, eventualmente evidenciando-se em mudanças bruscas de direção durante a marcha, posteriormente pode agravar-se e determinar quedas freqüentes2,5. Blefaroespasmo espontâneo ou provocado pela pesquisa de reflexo glabelar pode ocorrer na DP e é comum em várias formas de parkinsonismo, notadamente no pós-encefalítico. A limitação da convergência ocular é uma anormalidade freqüentemente observada na DP, assim como a paresia do olhar vertical para cima, igualmente comum em indivíduos idosos3,5. Manifestações não Motoras da DP Pacientes com DP podem apresentar, além das manifestações motoras alterações cognitivas, psiquiátricas e autonômicas. As alterações cognitivas em fases iniciais da moléstia, quando presentes, geralmente são discretas (distúrbios visuoespaciais) e sem repercussão significativa sobre o desempenho cognitivo. Entretanto, em cerca de 15 a 20% dos casos, em fases adiantadas da evolução da doença podem instalar-se alterações cognitivas graves, configurando um quadro demencial1,3,6. REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (158-165) Diagnóstico da DP A identificação de síndromes parkinsonianas manifestadas através do quadro clínico clássico, descrito anteriormente, geralmente não oferece dificuldades. Porém, em fases iniciais ou mesmo em fases mais avançadas, o quadro pode apresentar-se de forma fragmentária, dificultando o seu reconhecimento. Essas formas fragmentárias de parkinsonismo podem ser divididas em dois tipos básicos: a forma rígidoacinética, caracterizada pela presença de acinesia e/ ou rigidez, e a forma hipercinética, onde está presente apenas o tremor1,3. Nas formas rígido-acinéticas, a diferenciação deve ser feita em relação a algumas condições. Quando bilateral deve ser diferenciada de quadro depressivo e hipotireoidismo. Em situações em que o quadro rígidoacinético é unilateral, a dificuldade motora pode simular hemiparesia devido à disfunção do trato córtico-espinal (lesão piramidal). A ausência de outras anormalidades, comumente presentes na síndrome piramidal, tais como hipertonia elástica, hiper-reflexia, sinal de Babinski e abolição do reflexo abdominal, permitem a diferenciação6. Na síndrome parkinsoniana que se expressa apenas por tremor, o diagnóstico diferencial deve ser feito em relação ao tremor essencial7,8. As características básicas do tremor parkinsoniano são: a) está presente no repouso; b) geralmente é unilateral ou assimétrico; c) pode acometer áreas localizadas do segmento cefálico; c) há história familiar positiva em apenas 5 a 10% dos casos; d) responde a drogas de ação antiparkinsoniana. Por outro lado, as principais características do tremor essencial são: a) presença na postura, particularmente na extensão dos membros superiores; b) geralmente é bilateral e simétrico; c) ao acometer o segmento cefálico o faz globalmente, com movimentos de cabeça em afirmação ou negação; d) melhora sensivelmente após a ingestão de bebida alcoólica; e) há história failiar positiva em 30 a 40% dos casos; f) responde favoravelmente ao tratamento com betabloqueadores adrenérgicos ou primidona. Embora na maioria dos casos esses critérios para diferenciação permitam separar as duas condições, em pacientes com DP a distinção pode ser mais difícil em função da comorbidade. Nessa situação são de grande valia os critérios propostos pelo consenso sobre tremores da Movement Disorders Society a propósito da cara- Neurociências cterização dos diversos tipos de tremor na doença de Parkinson9 que estão resumidos no Quadro 1. Quadro 1. Tremor na Doença de Parkinson (DP) 1) Presença de qualquer forma de tremor patológico 2) Paciente com DP de acordo com os critérios do “London Brain Bank” . Presença obrigatória de bradicinesia Tipo I: (Tremor Parkinsoniano Clássico): repouso ou repouso + postural / cinético com a mesma freqüência (4-9 Hz) Tipo II: Tremor de repouso + postural / cinético com freqüências diferentes, sendo o tremor postural predominante >> Comorbidade - DP + Tremor Essencial (< 10 % dos pacientes com DP) Tipo III: Tremor postural / cinético (4-9 Hz) sem componente de repouso >> Comorbidade - Forma rígidoacinética da DP + Tremor Essencial Tremor de repouso monosintomático (ausência de outros sinais de parkinsonismo) com duração maior que 2a >> DP? 161 Quadro 2. Causas de Parkinsonismo Secundário • Drogas: neurolépticos (fenotiazínicos, butirofenonas, tioxantenos, reserpina, tetrabenazina), antieméticos (benzamidas), bloqueadores de canais de cálcio (cinarizina, flunarizina), amiodarona, lítio, ciclosporina, antidepressivos inibidores de recaptação de serotonina e duais, meperidina • Intoxicações Exógenas: manganês, monóxido de carbono, dissulfeto de carbono, metil-feniltetrahidroperidina (MPTP), metanol, organofosforados, herbicidas (paraquat, glifosato) • Infecções: encefalites virais, neurocisticercose e síndrome da imunodeficiência adquirida • Doença Vascular Cerebral • Traumatismo Cranioencefálico • Processos Expansivos do SNC • Hidrocefalia • Distúrbios Metabólicos: hipoparatireoidismo Parkinsonismo Secundário apenas expressada por acinesia e rigidez (sem tremor), associa-se a distúrbios autonômicos, cerebelares, piramidais, de neurônio motor inferior ou, ainda, de motricidade ocular extrínseca 5,6. O parkinsonismo atípico, ao contrário do que ocorre com a DP, geralmente instala-se de forma simétrica e responde mal a drogas de efeito antiparkinsoniano, inclusive a levodopa10. Essa forma de parkinsonismo relaciona-se a uma série de moléstias neurológicas degenerativas ou dismetabólicas, que podem ser didaticamente divididas em 2 grupos: a) doenças, geralmente esporádicas, que instalam-se na meia idade (após os 45 anos); b) doenças, freqüentemente com história familiar positiva, instaladas antes dos 45 anos3,6. As principais causas de parkinsonismo secundário estão relacionadas no Quadro 2. Entre estas destacam-se as drogas que bloqueiam os receptores dopaminérgicos como os neurolépticos e os antivertiginosos (bloqueadores de canais de cálcio) como a flunarizina e a cinarizina. Dado importante a ser considerado é que o parkinsonismo induzido por drogas pode persistir por semanas ou meses após a retirada do agente causador. Dessa forma as informações de anamnese a serem obtidas em pacientes portadores de parkinsonismo devem ser bastante minuciosas em relação a esse aspecto6. O grupo A inclui as seguintes condições: paralisia supranuclear progressiva, atrofia de múltiplos sistemas, degeneração córtico-basal e demência com corpos de Lewy. Essas doenças neurodegenerativas que são as que oferecem maiores dificuldades para serem distinguidas da DP, porque do mesmo modo que a forma clássica desta moléstia instalam-se na meia idade (acima dos 40 anos) e geralmente são esporádicas. O reconhecimento precoce dessas moléstias reveste-se ainda de grande importância porque todas apresentam prognóstico pior que a DP6. Observando-se o Quadro 2 nota-se que a identificação das demais causas de parkinsonismo secundário pode ser feita através de dados de anamnese, exames de neuroimagem e eventualmente investigação metabólica para hipopatireoidismo. Portanto, dada a relevância desse grupo de moléstias na diferenciação com a DP faremos uma breve descrição de suas características com ênfase nos critérios habitualmente empregados para a sua identificação. Tipos de Parkinsonismo Estabelecido o diagnóstico sindrômico de parkinsonismo, passa-se à identificação de sua causa. As diversas formas de parkinsonismo podem ser classificadas em 3 tipos básicos: parkinsonismo primário (doença de Parkinson idiopática e as formas hereditárias); parkinsonismo secundário; e parkinsonismo-plus ou atípico. O diagnóstico de parkinsonismo primário pressupõe a exclusão das outras duas formas, que serão, portanto abordadas inicialmente6. Paralisia Supranuclear Progressiva Parkinsonismo Atípico O parkinsonismo-plus ou atípico ou é a denominação empregada para caracterizar quadros neurológicos em que uma síndrome parkinsoniana, geralmente REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (158-165) A paralisia supranuclear progressiva (PSP) é uma taupatia que se apresenta na sua forma mais típica como uma síndrome parkinsoniana em que sobressai a instabilidade postural que, diferentemente do que ocorre na DP, é Neurociências 162 acentuada já em fase inicial da doença. Posteriormente, ao longo do segundo ou terceiro ano de evolução da doença manifesta-se a oftalmoparesia supranuclear vertical (OSV) que vem a definir o diagnóstico da PSP11,12. No Quadro 313 estão especificadas as principais diferenças clínicas, farmacológicas e de neuroimagem entre a PSP e a DP. Quadro 3. Principais Diferenças entre a Paralisia Supranuclear Progressiva (PSP) e a Doença de Parkinson (DP) mais recente, mais rara, de início mais tardio e de mais difícil caracterização do que a PSP e a AMS6. Na sua forma mais conhecida a DCB apresenta-se com uma síndrome rígido-acinética (às vezes com posturas distônicas) com acentuada e persistente assimetria, associada a uma ou mais das seguintes manifestações de disfunção cortical: apraxia ideomotora, síndrome da mão alienígena, alterações sensoriais corticais (ex: fenômeno de extinção, agrafoestesia, estereoagnosia) ou mioclonias corticais15. Da mesma forma que a PSP e a AMS responde mal à levodopa14. PSP DP • Parkinsonismo Simétrico e Quedas Precoces Assimetria no Início • Instabilidade Postural em Extensão Manifestações Tardias • Postura do Tronco Postura em Flexão • Expressão Facial de “Espanto” Hipomimia Mais recentemente tem sido reconhecida uma variante da moléstia, possivelmente ocorrendo com a mesma freqüência que a forma clássica, que se manifesta com quadro predominantemente de disfunções cognitivas de tipo frontal ou afasia primária progressiva. Essa variante deve ser diferenciada das demências frontotemporais14. • Tremor de Repouso é Incomum Tremor de Repouso Frequente Demência com Corpos de Lewy • Frequência de Piscamento: 3-5/min Frequência de Piscamento: 10-14/ min • Proeminente OSV Eventual OSV para cima • Posturas Distônicas de Predomínio de Axial Predomínio em Membros • IRM: Redução de Diâmetro do Mesencéfalo Alterações Inespecíficas • Resposta Precária à Levodopa Boa Resposta OSV: Oftalmoparesia Supranuclear Vertical IMR: Imagens de Ressonância Magnética Atrofia de Múltiplos Sistemas A atrofia de múltiplos sistemas (AMS) é uma doença que pode manifestar-se através 2 formas: uma com predomínio de parkinsonismo (forma rígido-acinética ou estriatonigral) e outra com predomínio de alterações cerebelares (tipo atrofia olivopontocerebelar), ambas associadas a distúrbios autonômicos graves (hipotensão postural, impotência sexual e disfunção de esfíncter vesical). A forma rígido-acinética é a mais comum (cerca de 80% dos casos) e a que pode ser confundida com a DP. A denominação síndrome de Shy-Drager é freqüentemente empregada para designar essa forma da AMS14. As imagens de ressonância magnética (IRM) em pacientes com AMS podem revelar alterações de sinal no putâmen, além de atrofia de tronco cerebral e cerebelo, que, embora não específicas não são encontradas na DP6,14. Degeneração Corticobasal A degeneração corticobasal (DCB) é uma doença degenerativa relacionada à proteína de tau, descrição REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (158-165) Os corpos de Lewy, inclusões intraneuronais tipicamente encontradas na substância negra de pacientes com DP, nos fim dos anos 70 começaram a ser identificados em várias outras áreas do encéfalo, incluindo o córtex cerebral em indivíduos que haviam falecido com quadro demencial. Definiu-se a partir de então uma nova entidade nosológica denominada “demência com corpos de Lewy” (DCL), em que as características clínicas predominantes são parkinsonismo e demência frequentemente associados a quadro alucinatório visual14. Cerca de 15-20% dos pacientes com DP desenvolvem quadro demencial em fases avançadas da doença. Contrariamente na DCL o quadro demencial está presente em fases iniciais da evolução da moléstia. Por outro lado, alucinações visuais espontâneas, não relacionadas a efeito de drogas, são extremamente raras na DP, mas frequentes na DC16. Embora para critérios de diagnóstico da DCL seja incluído apenas o parkinsonismo espontâneo, pacientes com essa moléstia que não apresentam sinais de parkinsonismo são extremamente susceptíveis a desenvolverem esse tipo de alteração quando tratados com neurolépticos, mesmo em baixas doses, drogas que frequentemente são empregadas para controlar as alucinações visuais ou outros distúrbios psiquiátricos que apresentem. Esse tipo de resposta aos neurolépticos em pacientes ainda não diagnosticados pode levantar a suspeita de que se trate da DCL6. Parkinsonismo Atípico Grupo B Esse grupo de doenças é mais facilmente distinguível da DP por suas características básicas, já mencionadas: instalação precoce e freqüente positividade de história familiar. No Quadro 4 constam as principais moléstias desse grupo. Neurociências Quadro 4. Parkinsonismo Atípico Instalação Precoce e/ou com História Familiar • Parkinsonismo Primário de Causa Genética (PARK 1 PARK 11) • Doença de Wilson • Doença de Hallervorden - Spatz • Calcificação Estriato-Pálido-Denteada (Síndrome de Fahr) • Degeneração Palidal (ou Dentato-Rubro- Pálido-Luysiana) • Parkinsonismo com Neuroacantocitose • Atrofias Espinocerebelares tipos 2 e 3 • Demência Fronto -Temporal com Parkinsonismo (Cr/17) • Forma Rígida da Doença de Huntington (Variante de Westphal) • Parkinsonismo em Distonias Hereditárias (DYT 3, DYT 5, DYT 13, DYT 14) • Parkinsonismo Associado à Doença de Gaucher • Parkinsonismo Atípico das Antilhas (Guadalupe) • Parkinsonismo - Demência - Esclerose Lateral Amiotrófica da ilha de Guam O primeiro subgrupo de afecções neste quadro é representado pelas formas genéticas de parkinsonismo primário (PARK 1 - PARK 11), das quais a mais frequente é o PARK 2, na qual mutações no gene parkin levam ao aparecimento da doença17. Em pacientes com parkinsonismo de início precoce a doença de Wilson deve sempre ser considerada e investigada através do estudo do metabolismo do cobre, pois comporta tratamento específico. A presença de sinais de parkinsonismo é comum em pacientes com doença de Wilson. Barbosa e col.18 constataram a presença de algum sinal de parkinsonismo em 86% de 95 casos com manifestações neurológicas. Contudo, na doença de Wilson na maioria dos casos o parkinsonismo está associado a quadro distônico ou tremor postural, dado que facilita o diagnóstico. Outro elemento que pode auxiliar na identificação dessa moléstia é a presença de anel de Kayser-Fleischer, consequente a depósito de cobre na córnea, que é encontrado em virtualmente todos os casos que expressam alterações neurológicas18. A doença de Hallevorden Spatz que se instala mais tardiamente (na adolescência ou no adulto jovem) pode manifestar-se com quadro em que predomina o parkinsonismo, diferentemente do que ocorre na infância em as manifestações distônicas são mais comuns. As alterações de sinal no globo pálido (aspecto em “olhos de tigre”) são muito sugestivas, embora não exclusivas, dessa moléstia6. A doença de Huntington quando instalada precocemente, ou seja, nas primeiras 3 décadas de vida, frequentemente manifesta-se com quadro rígido-acinético, contrariamente do que ocorre na forma clássica que se inicia mais tardiamente em que predominam os movimentos coréicos19. A presença de história familiar facilita o diagnóstico que, suspeitado pode ser comprovado através de teste de DNA. REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 (158-165) 163 As atrofias espinocerebelares tipo 2, 3, 6 e 17 eventualmente podem apresentar-se com síndrome parkinsoniana, mas que geralmente se associa a outras anormalidades neurológicas20. Novamente a história familiar pode ser útil para o diagnóstico, que é feito através de teste genético. A calcificação dos gânglios da base que pode manifestar-se com variadas formas de quadro neurológico, inclusive parkinsonismo pode ser constatada à tomografia de crânio (TC)6. A neuroacantocitose, condição rara que geralmente manifesta-se com quadro coréico excepcionalmente podem apresentar-se com parkinsonismo e o diagnóstico baseia-se na presença das alterações hematológicas próprias dessa condição6. Entre as diversas formas de degeneração palidal algumas podem expressar-se com parkinsonismo. Essas entidades são raras e geralmente o seu diagnóstico só é comprovado em necrópsia. A suspeição pode basearse na presença de parkinsonismo atípico e eventualmente em alterações de neuroimagem. A atrofia pálido-dentato-rubro-luyisiana pode ser diagnosticada com base em teste genético6. Na demência frontotemporal com parkinsonismo ligada ao cromossomo 17, além da presença da deterioração cognitiva precoce há história familiar positiva. O teste genético confirma o diagnóstico6,14. Entre as distonias primárias de causa genética o parkinsonismo pode estar presente nos seguintes tipos: DYT 3, DYT 5, DYT 13 e DYT 14 6,14. Parkinsonismo relacionado à doença de Gaucher foi recentemente descrito em diversos relatos na literatura21. O complexo parkinsonismo-demência-esclerose lateral amiotrófica da ilha de Guam e o parkinsonismo atípico de Guadalupe (Antilhas) são entidades patológicas restritas a essas regiões6. Sinais de Alerta que Sugerem Parkinsonismo Atípico Esses sinais (red flags) estão sumarizados no Quadro 56, 14. Quadro 5. Evidências de Parkinsonismo Atípico (“Red Flags”) • Início Precoce; História Familiar Positiva; Instalação Bilateral e Simétrica ou Aguda; Evolução por Patamares; Assimetria Acentuada e Persistente • Ausência de Tremor de Repouso; Presença de Tremor Atípico • Instabilidade Postural, Demência ou Distúrbios Autonômicos Graves em Fase Inicial da Doença • Presença de: Déficit de Olhar Vertical para Baixo; Sinais Piramidais; Sinais Cerebelares; Mioclonias; Acometimento de Neurônio Motor Inferior; Sinais Parietais ou Síndrome da Mão Estrangeira em Qualquer Fase da Evolução da Doença • Parkinsonismo Afetando Exclusivamente a Marcha • Resposta Precária à Levodopa Neurociências Exames Complementares e Testes Terapêuticos no Diagnóstico da DP Os exames de neuroimagem estrutural (TC e IRM) ou funcional (Positron Emission Tomography e Single Photon Emission Computed Tomography), particularmente os primeiros são de grande utilidade na diferenciação entre a DP e as síndromes parkinsonianas de diversas etiologias. Contudo, não há anormalidades evidenciáveis por esses exames que sejam características da DP6. Recentemente foram descritas anormalidades da ecogenicidade na substância negra demonstráveis por sonografia transcraniana em pacientes com DP4. Porém, o significado dessas evidências ainda deve ser elucidado por novos estudos. O teste da apomorfina10, que é um potente agonista dopaminérgico D1 e D2, consiste na administração de 1,5 mg dessa substância por via subcutânea, precedida pelo uso do antiemético domperidona. Este deve ser administrado na dose de 20mg 3 vezes por dia, durante 1-3 dias antes do teste. A avaliação da resposta deve ser feita pelo bloco III da UPDRS (Unified Parkinson’s Disease Rating Scale). As doses podem ser repetidas, caso não haja resposta a cada 30 minutos até 5-10 mg no total. Considerase como resultado positivo uma melhora de 15-20%. O teste da apomorfina é útil para avaliar a responsividade dopaminérgica e tem sensibilidade de cerca de 80%. Contudo, a responsividade dopaminérgica não é exclusiva da DP. Pacientes com outras doenças que se manifestam com parkinsonismo podem apresentar resposta, 164 ainda que inferior à observada na DP, a agentes dopaminérgicos e, portanto resposta positiva ao teste da apomorfina. Entre estas doenças destacam-se aquelas que são mais difíceis de serem diferenciadas da DP como a PSP e AMS. Estima-se que 20% dos pacientes com PSP12 e 50% dos casos de AMS5 respondam à levodopa em fases iniciais dessas doenças. Particularmente na AMS a resposta a agentes dopaminérgicos pode aproximarse daquela observada na DP e, eventualmente, persistir até fases mais avançadas da moléstia. Deve-se considerar ainda que embora a boa resposta à levodopa seja uma regra na DP há relatos, raros, de casos dessa moléstia, com comprovação por necrópsia que não respondem a essa droga. CONCLUSÃO Como pode-se deduzir do exposto o diagnóstico da DP, nos caos típicos não oferece maiores dificuldades mas, em situações em que há elementos atípicos o leque de diagnósticos diferenciais é amplo. Deve-se considerar ainda que os conhecimentos a respeito das condições degenerativas e heredodegenerativas que podem ser apresentar-se com síndrome parkinsoniana, tem aumentado de forma exponencial. Do mesmo modo novas causas de parkinonismo secundário a drogas ou exposição a agentes tóxicos tem surgido constantemente na literatura médica. Portanto, este tema, que é de grande interesse prático, requer revisões periódicas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Horstink MWIM, Morrish PK. Preclinical diagnosis of Parkinson’s disease. Adv Neurol 1999; 80: 327-334. 2. 3. 4. 5. 6. Fearnley JM, Lees AJ. Aging and Parkinson’s disease: substantia nigra regional selectivity. Brain 1991; 114: 2283-2301. Kashmere J, Camicioli R, Martin W. Parkinsonian syndromes and differential diagnosis. 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Parkinsonismo em pacientes com doença de Gaucher. Rev Bras Neurol 2005; 41: 5-10. Neurociências 166 NORMAS PARA PUBLICAÇÃO A Revista Neurociências é voltada à Neurologia e às ciências afins. Publica artigos de interesse científico e tecnológico, realizados por profissionais dessas áreas, resultantes de estudos clínicos ou com ênfase em temas de cunho prático. São aceitos artigos em português, inglês e espanhol. Os artigos devem ser inéditos e fica subentendido que serão publicados exclusivamente nesta revista, com o que se comprometem seus autores. O Corpo Editorial da revista reserva-se o direito de avaliar, aceitar ou recusar artigos. Quando aceitos, sugerir modificações para aprimorar seu conteúdo, se necessário, aperfeiçoar a estrutura, a redação e a clareza do texto. Para publicação, será observada a ordem cronológica de aceitação dos artigos. Os artigos são de responsabilidade de seus autores. Submissão do artigo: os artigos devem ser encaminhados ao Editor Chefe em disquete mais três cópias do texto original digitado ou via e-mail e poderão ser utilizados editores de texto “Word”, alternativamente no formato “doc”. Adotar as recomendações abaixo. Título: em português e em inglês ou espanhol e em inglês, sintético e restrito ao conteúdo, mas contendo informação suficiente para catalogação. A Revista prefere títulos informativos. Autor(es): referir nome(es) e sobrenome( s) do modo como preferir para indexação, seu grau e posição. Referir a instituição em que foi feita a pesquisa que deu origem ao artigo. Referir o título maior de cada autor ou grupo de autores, ex.: 1Professor-adjunto, 2- Pós-graduando, 3- Residente. Identificar o autor e endereço para correspondência. Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos, métodos, resultados e conclusões. Não exceder 200 palavras. Orientamos os autores a produzirem resumos estruturados. Unitermos e Keywords: Máximo de 6 (seis), referir após o Resumo e o Summary, respectivamente. Como guia, consulte descritores em ciências da saúde (http://decs.bireme.br). Texto: apresentar a matéria do artigo seqüencialmente: introdução, material (casuística) e método, resultados, comentários (discussão e conclusões), referências bibliográficas, eventualmente agradecimentos, suporte financeiro. Não repetir no texto dados que constem em tabelas e ilustrações. Quadros, Gráficos e Tabelas: até cinco, apresentadas em páginas separadas e no final do texto. Em cada uma, devem constar seu número de ordem, título e legenda. Figuras: até duas ilustrações com tamanho não superior a 6 cm x 9 cm cada uma. Fotos em preto e branco bem contrastadas; eventuais detalhes com setas, números ou letras. Identificar cada ilustração com seu número de ordem, nome do autor e do artigo, com etiqueta colada no verso e nela marcada na parte superior. Não grampear e nem colar as ilustrações, embalar cada uma em separado. Encaminhar separadamente as respectivas legendas. Ilustrações reproduzidas de textos já publicados devem ser acompanhadas de autorização de reprodução, tanto do autor como da publicadora. Ilustrações em cores podem ser publicadas; dado seu custo elevado, será de responsabilidade dos autores, assim como o custo por número de tabelas e ilustrações acima dos mencionados e desde que sua publicação seja autorizada pela editora. O material recebido não será devolvido aos autores. Manter os negativos destas. Referências: Até cerca de 30 (para artigos originais ou de atualização), restritas á bibliografia essencial ao conteúdo do artigo. Para artigos de revisão, até 100 referências. Todos os autores e trabalhos citados no texto devem constar na listagem de referências bibliográficas. No texto, as citações devem seguir o sistema numérico, isto é, são numerados por REVISTA NEUROCIÊNCIAS V13 N3 - JUL/SET, 2005 ordem de sua citação no texto, utilizando-se números arábicos sobrescritos segundo o estilo Vancouver(www.icmje.org). Por exemplo: “....o horário de ir para a cama e a duração do sono na infância e adolescência6-12,14,15.” As referências devem ser ordenadas consecutivamente na ordem na qual os autores são mencionados no texto. Listar todos os autores no máximo de 6, quando forem 7 ou mais, listar os 3 primeiros seguidos de “et al.”. a) Artigos: Autor(es). Título do artigo. Título do periódico (abreviados de acordo com o Index Medicus) ano; volume: página inicial – final. Ex.: Wagner ML, Walters AS, Fisher BC. Symptoms of attention-deficit/hyperactivity disorder in adults with restless legs syndrome. Sleep 2004; 27: 1499-504. b) Livros: Autor(es) ou editor(es). Título do livro. Edição, se não for a primeira. Tradutor(es), se for o caso. Local de publicação: editora, ano, total de páginas. Ex.: Ferber R, Kriger M. Principles and practice of sleep medicine in the child. Philadelphia: W.B. Saunders Company, 1995, 253p. c) Capítulos de livros: Autor(es) do capítulo. Título do capítulo. In: Editor(es) do livro. Título do livro. Edição, se não for a primeira. Tradutor(es), se for o caso. Local de publicação: editora, ano, página inicial e página final. Ex.: Stepanski EJ. Behavioral Therapy for Insomnia. In: Kryger MH; Roth T, Dement WC (eds). Principles and practice of sleep medicine. 3rd ed. Philadelphia: W.B. Saunders Company, 2000, p.647-56. d) Resumos: Autor(es). Título. Periódico ano; volume (suplemento e seu número, se for o caso): página(s). Quando não publicado em periódico: Título da publicação. Cidade em que foi publicada: editora, ano, página(s). Ex.: Carvalho LBC, Silva L, Almeida MM, et al. Cognitive dysfunction in sleep breathing disorders children. Sleep 2003; 26(Suppl):A135. e) Comunicações pessoais só devem ser mencionadas no texto entre parênteses. f) Tese: Autor. Título da obra, seguido por (tese) ou (dissertação). Cidade: instituição, ano, número de páginas. Ex.: Fontes SV. Impacto da fisioterapia em grupo na qualidade de vida de pacientes por AVCi (Tese). São Paulo: UNIFESP, 2004, 75p. g) Documento eletrônico: Título do documento. Endereço na Internet, data e hora do acesso. Ex.: Agentes dopaminérgicos no tratamento da Síndrome das Pernas Inquietas. Diponível no site: http:// www.sindromedaspernasinquietas.com.br, acessado em 10/05/2005, às 14h. Categoria: O próprio autor deve indicar a qual categoria pertence seu texto. a) artigo original b) artigo de revisão c) artigo de atualização d) relato de caso Endereço para submissão de artigos para revista Neurociências: Prof.Dr. Gilmar Fernandes do Prado – Editor Chefe R: Cláudio Rossi, 394 – Jardim da Glória São Paulo - SP - Brasil CEP: 01547-000 Telefone/fax: 5081-6629 E-mail: [email protected] [email protected] http://www.unifesp.br/dneuro