ALTERNATIVAS NO TRATAMENTO DE EFLUENTES
A constante destruição da natureza e a negligência com nossos esgotos,
trouxeram graves conseqüências à vida humana, apresentando inúmeros
reflexos e danos à saúde. Um exemplo clássico é o Rio Tietê, em São Paulo,
que provavelmente não voltará nunca a atrair pescadores, mesmo com os
esforços e dinheiro gastos nas tentativas de limpa-lo. Com ele aprendemos que
é mais fácil e mais barato não poluir do que “despoluir”. A partir daí,
organizações e governos no mundo todo tentam definir normas e leis para
controlar a poluição. Um progresso nesta área foi a definição dos principais
aspectos da ISO14000, uma norma que certifica as industrias em harmonia
com o meio ambiente, e é muito bem vista aos olhos do consumidor.
A legislação também é clara no que diz respeito ao sistema de esgotos,
definindo todos os padrões e condições para lançamento de efluentes. Além
disso, a poluição, de qualquer natureza, que possa causar danos à saúde
humana, aos animais ou destruição significativa da flora, resulta em reclusão
de um a quatro anos, multa, ou até mesmo detenção. Podemos observar
facilmente que os aspectos éticos e legais que nos obrigam a praticar técnicas
de controle de poluição são similares ao médico que é obrigado a aplicar as
técnicas mais avançadas no tratamento de seus pacientes. Nos dois casos o
erro causa processo, adoecimento e as vezes a morte.
O controle de poluição visa eliminar os elementos nocivos à natureza (florestas,
rios, seres humanos, animais, etc.) e até converter parte de material nocivo em
não nocivo.
Os dejetos de matadouros ou frigoríficos possuem valores altos de DBO
(Demanda Bioquímica de Oxigênio, é a quantidade de oxigênio utilizada pelos
microorganismos na degradação bioquímica de matéria orgânica e é o
parâmetro mais empregado para medir poluição), sólidos em suspensão,
material flotável e graxas. Esses dejetos contém sangue, pedaços de carne,
gorduras e vísceras. São portanto altamente putrecíveis, entrando rapidamente
em decomposição liberando odores desagradáveis.
Basicamente, o controle de efluentes em um frigorífico deve prever o
tratamento dos sólidos, líquidos e gases.
Os sólidos são dispostos em aterros sanitários ou outro lugar definido pelo
órgão responsável do governo, ou então incinerados. Mas outras alternativas
podem ser adotadas, por exemplo, a compostagem.
Os pequenos frigoríficos e abatedouros, enquadram-se como agroindústrias
por processarem produtos de origem animal. Entretanto, pela estrutura e
capacidade de investimento limitadas, estes geralmente depositam seus
resíduos diretamente no ambiente. Neste caso a compostagem é uma
alternativa viável e eficiente no tratamento de resíduos, para descarte no
ambiente ou uso agrícola.
Dentre os procedimentos para realizar este processo, deve-se confeccionar
leiras de compostagem, utilizando-se resíduos sólidos de frigorífico, palha de
trigo ou aveia e serragem de madeira. Para favorecer a aeração e
homogeneização do material, realiza-se revolvimentos aos 15 dias de
compostagem, seguidos de revolvimentos semanais. A composição química do
composto, apresenta teores relevantes de macro e micronutrientes,
demonstrando seu alto potencial de reciclagem. A compostagem pode ser um
sistema eficiente no tratamento de resíduos sólidos de frigorifico, promovendo
o saneamento ambiental; a compostagem recicla os nutrientes presentes nos
resíduos, convertendo-os em subproduto comercializável na forma de adubo
orgânico; há necessidade da utilização de piso impermeável e estrutura de
cobertura durante a compostagem; a melhor relação de peso é de 7,2 e 16,6 kg
de resíduos, para cada kg de palha e serragem, respectivamente.
É importante notar que a recuperação de subprodutos em um frigorífico além
de diminuir a carga poluidora pode se tornar economicamente viável. Desde
que se respeitem os critérios sanitários que limitam bastante as medidas de
reuso e reciclagem, a recuperação de subprodutos faz parte do controle de
poluição.
O uso controlado da água, o reaproveitamento de subprodutos potencialmente
poluidores, práticas de conservação de água e alterações em operações e
processos para redução de consumo fazem parte do controle interno de
poluição. Por exemplo, a limpeza dos currais pode ser feita em duas etapas:
inicialmente uma limpeza a seco, com raspagem do material e posterior
disposição em aterro ou em leras de compostagem, e a seguir uma lavagem
sob pressão com utilização mínima de água.
No processamento do sangue, a sua coleta cuidadosa imediatamente à sangria
é de grande importância para a redução da carga poluidora. Os tanques,
paredes e pisos devem ser lavados com uma quantidade mínima de água
destinando aos tanques de coleta de sangue. Numa segunda lavagem a água
é conduzida aos esgotos. Quando se faz coagulação do sangue, o soro responsável por 10% da poluição causada por frigoríficos - não deve ser
descartado como resíduo, mas sim, misturado a outros materiais para
produção de ração animal.
O tratamento de efluentes líquidos é uma das principais questões ambientais
no que diz respeito ao atendimento da legislação e à conseqüente proteção ao
meio ambiente. A grande maioria dos sistemas de tratamento de efluentes
líquidos é composta por unidades de tratamento seqüencialmente dispostas,
nas quais ocorrem operação de separação e processos de transformação dos
constituintes presentes. O desempenho eficiente das unidades de tratamento
depende, em grande parte, da maior compreensão dos princípios fundamentais
que regem as operações físicas e os processos químicos e biológicos
envolvidos, bem como pelo conhecimento de estratégias de controle e de
operação das unidades do sistema de tratamento.
Os efluentes orgânicos podem receber tratamento por processo físico-químico
ou biológico. Os processos biológicos são adequados quando o efluente
orgânico apresenta características biodegradáveis.
Os processos biológicos que ocorrem na presença de oxigênio livre,
denominados aeróbios, são os mais utilizados e conhecidos. A implantação de
sistemas com processos aeróbios oferece, portanto, poucos riscos de
investimento; porém, equipamentos necessários como aeradores demandam
energia e o lodo, gerado como subproduto, ainda é passível de decomposição
por ação biológica. Outro processo de decomposição biológica ocorre na
ausência de oxigênio livre e denomina-se processo anaeróbio. Ele pode
apresentar como subproduto o gás metano que é utilizado como fonte de
energia. Há cerca de 25 anos o interesse por este gás proporcionou um
aumento na utilização do processo anaeróbio. Atualmente a produção de lodo
em menor quantidade e já estabilizado é a característica mais valorizada deste
processo.
O tratamento começa com gradeamento e separação dos efluentes conforme
suas origens: a linha verde que compreende os efluentes da lavagem dos
currais e do processamento de vísceras (representando 30 a 40% da vazão), e
a linha vermelha composta dos demais dejetos (50 a 70% da vazão). Os
efluentes, vão passar por caixas de gordura, peneiras estáticas e sofrer
decantações. Depois de deixarem em tanques apropriados suas porções
decantadas, são misturados para um primeiro tratamento, que é biológico.
Um procedimento eficiente são as lagoas de decantação anaeróbias que
precedem as lagoas aeróbias ou facultativas e após isso, há um procedimento
físico-químico para o tratamento, leitos de secagem com retorno de líquidos e
finalmente obtém-se o efluente tratado. Mas a prática mais comum são o
processo de lodos ativados e as lagoas aeradas.
Outra tecnologia já disponível no Brasil e ecologicamente correta é uma
estação de tratamento de efluentes que permite o reaproveitamento total da
água utilizada no processo. Além disso, o mesmo sistema produz eletricidade
mediante a fermentação anaeróbia de resíduos deixados pelo próprio frigorífico
(formando gás metano), o chamado ciclo completo (ou fechado). A água
utilizada também pode ser acondicionada em tanques para reconectar-se à
fábrica. É um sistema que utiliza a biodigestão anaeróbia.
Biodigestão anaeróbia
O sistema de biodigestão anaeróbia é um processo biológico no qual os
poluentes orgânicos são transformados por bactérias anaeróbias em biogás
rico em energia e pequena quantidade de lodo (muito menor que no sistema
aeróbio), obtendo-se um efluente purificado. Um sistema muito eficiente se
trata do reator anaeróbio de fluxo ascendente com manta de lodo (UASB Upflow Anaerobic Sludge Blanket), de construção vertical, compacto,
otimizando assim, a relação custo-benefício.
A decomposição anaeróbia é realizada basicamente por grupos de
bactérias em equilíbrio mútuo. Este equilíbrio depende primordialmente das
condições ambientais, como pH, temperatura, composição do meio etc., assim,
o controle operacional do sistema é fundamental para garantir a eficiência do
processo. O conhecimento das relações entre os parâmetros operacionais e a
eficiência do processo permite o dimensionamento e manutenção do sistema.
O processo baseia-se na utilização de microrganismos na ausência de oxigênio
livre, para a degradação de matéria orgânica. Esta degradação refere-se às
reações que reduzem as dimensões de partículas, tornando-as solúveis ou, a
nível molecular, quebram cadeias ou ligações triplas ou duplas existentes. Os
produtos finais do processo são metano e compostos inorgânicos, incluindo o
dióxido de carbono e amônia. O processo anaeróbio pode formar, além de gás
carbônico, metano e hidrogênio, outros compostos menos oxidados (como
álcoois ou ácidos orgânicos), que podem fornecer ainda alguma energia.
Este processo para tratamento de efluentes, é conhecido há mais de um
século, porém, até a década de 1960, o processo de digestão anaeróbia foi
utilizado basicamente para a estabilização do lodo gerado em sistemas de
tratamento de águas residuárias. O controle do processo geralmente era
precário e os reatores eram operados como reservatórios de lodo. Devido a
estes aspectos, o volume do reator era muito grande e o tempo de detenção
hidráulica freqüentemente maior que 30 dias. Porém, nos últimos 25 anos tem
sido identificado um número de novos projetos de reatores que têm tornado
possível aumentar a carga orgânica em sistemas anaeróbios.
A aplicação de altas cargas orgânicas volumétricas era impossibilitada
devido à configuração dos reatores. Os primeiros reatores anaeróbios (tanques
Imhoff, digestores de mistura completa, etc.) apresentavam um tempo de
detenção hidráulica igual ao tempo de retenção da biomassa; ou seja, igual ao
tempo requerido para que as reações anaeróbias ocorram. A escassez de
petróleo disponível na década de 1970 ocasionou a procura por fontes
alternativas de energia. Este fator foi importante para o desenvolvimento do
processo anaeróbio devido à geração do gás metano: esperava-se utilizá-lo
para geração de energia.
O desenvolvimento da tecnologia em sistemas anaeróbios para tratamento de
efluentes líquidos ocorre basicamente no sentido de: reduzir o tempo de
detenção hidráulica, reter o máximo de biomassa, tornar a operação destes
sistemas mais simples e prever a eficiência de remoção de matéria orgânica
para as características do efluente (incluindo possíveis variações).
Com a evolução do mecanismo de retenção da biomassa foi possível a
obtenção de reatores para altas cargas orgânicas, com tempos de detenção
mais curtos, isto é, com volumes reduzidos. Nestes reatores, o lodo é retido
como agregados de bactérias (UASB - reator anaeróbio de manta de lodo),
como biofilme sobre o material suporte (filme fixo e reatores de leito fluidificado
ou FBBR – Fluiidized Bed Biofilm Reactor), ou como ambos, agregados e em
biofilme (típico em filtros anaeróbios).
Dentre as vantagens da aplicação em tratamento de efluentes líquidos
do processo anaeróbio temos: baixa produção de sólidos biológicos residuais;
o lodo biológico residual é um produto altamente estabilizado, do qual pode-se
extrair água facilmente; não requer energia para aeração; produção de metano,
que é um produto final utilizável; pode-se aplicar altas cargas orgânicas, sob
condições adequadas; o lodo anaeróbio mantém-se ativado por vários meses
sem alimentação (necessária para a sobrevivência das bactérias). Por outro
lado o processo é mais sensível a alguns compostos específicos, como ao
triclorometano, ao clorofórmio e ao cianeto, por exemplo; relativos longos
períodos de tempo são requeridos para a partida do processo, como resultado
da baixa taxa de crescimento das bactérias anaeróbias; a digestão anaeróbia é
basicamente um método de pré-tratamento; um pós tratamento adequado é
requerido antes que o efluente seja lançado aos cursos d’água.
DBO e DQO
Para escolher o sistema de tratamento e a eficiência do mesmo, é necessário
realizar testes de demanda química e biológica dos afluentes e efluentes do
sistema.
O teste de DBO quantifica a matéria orgânica degradável de forma aeróbia.
Tem por interesse simular as condições aeróbias da natureza que o efluente
sofreria se lançado em corpos receptores. Amostras do efluente, contendo
concentrações adequadas de microrganismos aeróbios e nutrientes, são
incubadas por um período (convencionado em 5 dias) a 20 ± 10C. Em termos
legislativos, no Brasil, a DBO de 5 dias ou DBO5 é um dos parâmetros
utilizados para a determinação da matéria orgânica de um efluente.
A quantificação da matéria orgânica oxidável é obtida pelo teste de DQO demanda química de oxigênio. Neste teste, a amostra é fortemente oxidada em
meio ácido na presença de dicromato sob ebulição em refluxo por 2 horas.
A biodegradabilidade é obtida pela relação DBO/DQO. Uma vez
conhecida esta relação para águas residuárias de uma mesma fonte, e que não
apresente variações significativas em sua composição (quimicamente referente
à proporção entre as moléculas existentes), esta relação é aproximadamente
fixa. A DQO pode ser utilizada para operação e monitoramento, obtendo-se
resultados mais rápidos e, de forma indireta, a DBO é obtida.
É muito importante que se realizem testes para verificar a eficiência do
sistema e corrigir possíveis falhas.
Reatores anaeróbios
Os diversos modelos de reatores anaeróbios apresentam características
próprias quanto a retenção celular, tempo de detenção hidráulica, separação
de fases sólido-líquido-gás, concentração orgânica e presença de sólidos em
suspensão em seu afluente, regime hidráulico, vazão de operação, dimensões,
etc.
Uma vez escolhido o sistema anaeróbio para tratamento de um efluente,
a opção do reator deve ser feita de forma criteriosa. Maior eficiência do sistema
e menor tempo de detenção hidráulica geralmente eqüivalem a sistemas mais
sofisticados e com maior complexidade de operação.
Os primeiros reatores não possuíam sistemas de agitação; formava-se
uma camada de espuma ao topo do digestor e o
lodo depositava-se ao fundo. A utilização de
misturadores mecânicos, a partir da década de
50, eliminou a camada de espuma e aumentou o
contato entre o efluente e as bactérias. Com esta
alteração foi possível aumentar a carga orgânica
volumétrica.
Os digestores de biomassa em suspensão
foram
desenvolvidos
para
manter
altas
populações
de
bactérias,
permitindo
a
degradação a tempos de detenção hidráulicas
reduzidos. A esta classe incluem-se o processo
anaeróbio de contato, o digestor anaeróbio com clarificador e o reator
anaeróbio de manta de lodo.
Os reatores anaeróbios de filme-fixo
de leito estacionário e de leito expandido
são adequados para o tratamento de
águas residuárias relativamente diluídas.
Entre eles encontram-se os filtros
anaeróbios e os reatores anaeróbios de
leito expandido.
Modelos como o reator anaeróbio de rotação e o reator anaeróbio com
chicanas são variações de outros. O reator anaeróbio de rotação permite ao
fluxo atravessar a manta de lodo e ao mesmo tempo, revolvê-la. Os reatores
anaeróbios com chicanas operam como vários reatores de manta de lodo
dispostos em série. O número crescente de reatores anaeróbios de manta de
lodo aplicados no Brasil, revela o seu potencial e sua viabilidade, reconhecido
como uma boa opção.
Existem vários sistemas para tratamento de efluentes, que complementam os
tanques ou lagoas de aeração comumente usadas. Desde lodo ativado,
flotação por ar cavitado até osmose reversa com tratamentos totalmente
automatizados. Muitas empresas de consultoria estão importando tecnologias
que aceleram a atividade da biomassa e diminuem a produção de lama, mas
não podemos esquecer que simples práticas de procedimentos no fluxo de
produção, o aproveitamento de subprodutos e a reutilização da água em
tanques de resfriamento ou mesmo limpeza de ambientes externos, podem
reduzir substancialmente os efluentes e até aumentar sensivelmente os lucros,
Nesse mundo globalizado, de consumidores bem informados e, levando-se em
conta as exigências do mercado internacional, a qualidade do efluentes deixa
de ser apenas uma questão apenas legal e passa a ser também uma questão
comercial.
Referências
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agosto, 1986.
CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. Portaria n.36/GM, Resolução
n.20, 18 de junho de 1986. Classificação de corpos d’água. Diário Oficial da
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fevereiro de 1998.
DUARTE A.C.; ARROJA L.M.; DIEGUES P.F.; ROSADA I.; HALL A.; OLIVEIRA
J.B. Treatment of slaughterhouse wastewater in satbilization ponds, Water
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Gazeta Mercantil, Caderno "Finanças & Mercados", Quinta-feira, 13 de maio de
1999. Pg. B-24.
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Vol. 19. 1987.
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Utilizando Efluentes Líquidos de Industria alimentícia. Tese de Mestrado em
Engenharia Civil, área de concentração Recursos Hídricos e Saneamento,
1996.
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