MINISTÉRIO
DA CU LTURA
GOVERNO
DE MINAS
APRESENTAM
www.fid.com.br
Adriana Banana (Org.)
Clube Ur=H0r Editora
Belo Horizonte
2013
fid editorial
Banana, Adriana
FID 2013 : Fórum Internacional de Dança 2013 : dança que mobiliza transforma/ Textos originais
de Adriana Banana ... [et al.]; organização Adriana Banana.
Belo Horizonte: Clube Ur=H0r, 2013.84 p. Programa do Fórum Internacional De Dança 2013.
ISSN: 2237-5449
1.Fórum Internacional da Dança – 2. Festivais de dança – Brasil 3. Dança . I. Banana, Adriana.
CDD: 793.3
CDD: 793.3
FID Editorial
Adriana Banana
Clube Ur=H0r Editora
REVISÃO TÉCNICA
Rosa Hercoles
PROJETO GRÁFICO
Popcorn Comunicação
Conselho Editorial
Adriana Banana Artista e Diretora Artística do Fórum Internacional de Dança - FID
Ana teixeira Pontifícia Universidade Católica de São Paulo/ Artes do Corpo
carla lobo Diretora Executiva do Fórum Internacional de Dança - FID
eduardo de jesus Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC MG/ Comunicação Social
lenira rengel
Universidade Federal da Bahia - UFBA/ Dança
lívia guimarães Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG/ Filosofia
rosa hercoles
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC SP/ Artes do Corpo
andréia nhur
Universidade de São Paulo – USP/ Escola de Comunicações e Artes – ECA
ORGANIZAÇÃO
DIAGRAMAÇÃO
TEXTOS ORIGINAIS
REVISÃO PORTUGUÊS
Estúdio Deriva
Adriana Banana, Andréia Nhur, Bruno Freire, Christine
Greiner, Cris Oliveira, Fernanda Perniciotti, Frederico Canuto,
Giancarlo Martins, Juliana Polo, Lenira Rengel, Lívia Espírito
Santo, Mariana Lage, Marila Velloso, Nicolle Vieira, Rosa
Hercoles, Thembi Rosa, Tiago Gambogi e Tuca Pinheiro
Fátima Campos
[email protected]
2013, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil
páginas 84
IMPRESSÃO Rede Editora Gráfica Ltda. CAPA Supremo 250G
MIOLO Pólen 80G
Copyright © 2013 by Clube Ur=H0r
2013 – 1ª edição
ESTE LIVRO OU PARTE DELE NÃO PODE SER REPRODUZIDO POR QUALQUER MEIO SEM AUTORIZAÇÃO ESCRITA DO EDITOR.
Fórum Internacional de Dança
FID - Todos os direitos reservados © 1996
Diretora Artística Adriana Banana
Diretora Executiva Carla Lobo
índice
06
conexão internacional
08
42
território minas
Marlene Monteiro Freitas / Bomba Suicida (Cabo Verde/Portugal)
paraíso - colecção privada por Rosa Hercoles
10
43
Tiago Gambogi / F.A.B. - The Detonators (Belo Horizonte-MG/Reino Unido)
Trans-amazônia por Tiago Gambogi
Marlene Monteiro Freitas / Bomba Suicida (Cabo Verde/Portugal)
guintche por Nicolle Vieira
12
46
Tuca Pinheiro (Belo Horizonte-MG)
hyenna - não deforma, não tem cheiro, não solta as tiras
por Tuca Pinheiro e Rosa Hercoles
Luís Guerra / Bomba Suicida (Portugal)
a primeira dança de urizen por Lívia Espírito Santo
15
48
circulando grande bh
André Masseno (Rio de Janeiro-RJ)
o confete da índia por Fernanda Perniciotti
18
50
NOMEIODEPARACOM (Belo Horizonte-MG)
nomeiodeparacom por Mariana Lage
Panaibra Gabriel Canda (Moçambique)
tempo e espaço: os solos da marrabenta por Andréia Nhur
20
52
Marise Dinis (Belo Horizonte-MG)
dos meus olhos saem rosas por Thembi Rosa
Key Zetta e Cia. (São Paulo-SP)
obrigado por vir por Frederico Canuto
24
54
Terceira Dança (Belo Horizonte-MG)
processo por Juliana Polo
Iris Erez (Israel)
temporary por Marila Velloso
26
56
Cris Oliveira (Belo Horizonte-MG)
espaço para dança por Bruno Freire
Iris Erez (Israel)
homesick por Giancarlo Martins
28
Núcleo do Dirceu / Marcelo Evelin (Teresina-PI)
1.000 casas por Christine Greiner
30
58
Cris Oliveira e Paulo Chamone (Belo Horizonte-MG)
uma cachaça que se chama dança
por Cris Oliveira e Tuca Pinheiro
Benoit Lachambre / Par B.L.eux (Québec, Canadá)
snakeskins por Bruno Freire
32
FIDoteca
FIDinho
60
36
62
Números Fid 2013
Silvia Real (Portugal)
tritone por Lenira Rengel
38
64
ficha técnica fid 2013
Elisabete Finger (Curitiba-PR/Alemanha)
Buraco por Adriana Banana
40
65
fotos
fid 2013
7
O comprometimento começa no corpo.
Adriana Banana
Diretora Artística e Curadora do FID
Conexao
internacional
Essa é a linha de ações do FID dedicadas
ao fomento e promoção da dança brasileira e às relações entre o Brasil e os
outros países.
conexão internacional
Marlene Monteiro freitas / Bomba Suicida Cabo Verde/ Portugal
Paraíso – colecção privada
2012
As projeções idealizadas sobre o paraíso como um lugar da virtude, da liberdade e da recompensa para aqueles que tementes a Deus atravessaram sua existência carnal com resignação
nunca mais serão as mesmas depois do impactante concerto coreográfico de Marlene Monteiro
Freitas. Coreógrafa proveniente de Cabo Verde, integrante do coletivo: Bomba Suicida (Lisboa);
cujas obras apresentam o imaginário, a impureza e a intensidade como traços recorrentes.
Sua Coleção Privada é dissonante, repleta de constrangimentos e relações de submissão, promovendo sensações de estranhamento frente às ocorrências brutais, inesperadas
e eventualmente cômicas que a constituem. As questões trazidas em sua desconcertante
versão do paraíso nunca foram tão terrenas. Uma zona de conflitos povoada por habitantes
híbridos nada imaculados, marcantes e marcados não por modelos eternos de perfeição, mas
sim por uma ambiguidade que transita entre a idealidade do sagrado e uma realidade eroticamente profana.
Este paraíso instaura um lugar onde a virtude é transgredida e as relações de dominação
e submissão são consensuais, povoado por vaidades e regido por uma divindade grotesca,
perversa e embevecida por seu próprio poder cuja mão é perturbadoramente invasiva. Os
conflitos de nossa multifacetada existência terrena não se extinguem ou se solucionam, ao
contrário, potencializam-se e se projetam às esferas do bizarro, evidenciando proporções endêmicas.
PARAÍSO – Colecção Privada, em última instância, pode ser lido como uma crítica à
lógica neoliberal com sua constante regência sobre o indivíduo, sempre dirigida à implantação
de padrões de conduta finitos e desejáveis. Através da espetacularização do flagelo humano,
este inferno travestido de paraíso propõe um ambiente onírico minuciosamente projetado,
onde o possível encontra-se expandido pelo imaginário. Contudo, essa possibilidade repleta
de metáforas acerca das restrições e infortúnios presentes em nosso contraditório cotidiano
terreno força-nos a pensar que a finitude da existência configura-se como algo imensamente
mais digno.
11
• Rosa Hercoles
Eutonista formada pela Escola de Eutonia da América Latina (1990-94). Possui mestrado (2000)
e doutorado (2005) junto ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica,
pela PUCSP. Atua como dramaturgista da dança junto a grupos (Musicanoar, Suspensa, Clube
Ur=H0r) e solistas (Vera Sala, Cristian Duarte, Tuca Pinheiro). Pesquisa o corpo e seus processos
de comunicação, desde 1984, quando aluna e assistente de Klauss Vianna. É membro do Centro
de Estudos em Dança – CED/PUCSP, desde 1995; professora do Curso de Comunicação das Artes
do Corpo, desde 2000, sendo sua coordenadora de 2009-13, atualmente assume a Chefia do
Departamento de Linguagens do Corpo, ambos na PUCSP.
Paraíso – colecção privada Duração 60’ 01 e 02 Nov 21h | Teatro Oi Futuro Klauss Vianna
Coreografia Marlene Monteiro Freitas | Dançarinos Yair Barelli, Lorenzo de Angelis, Marlene
Monteiro Freitas, Luís Guerra e Andreas Merk | Música Marlene Monteiro Freitas com o apoio de
Nosfell e Tiago Cerqueira | Luz e som Yannick Fouassier | ADAPTAÇÃO E OPERAÇÃO DE SOM Eric
Houllier | Pesquisa e imagem João Francisco Figueira e Marlene Monteiro Freitas | Figurino
Marlene Monteiro Freitas | Produção e difusão Andreia Carneiro (Bomba Suicida, PT) e Erell Melscoet (FR) | Coprodução Le Spectacles Vivants - Centre Pompidou (Paris, FR), L’échangeur CDC Picardie (FR), Centre Chorégraphie National de Tours, direction Thomas Lebrun (accueil studio,
FR), Centre Chorégraphie National Rilieux-La-Pape, direction Yuval Pick (accueil studio, FR), Ballet National de Marseille (FR) - Centre Chorégraphique National, direction Frédéric Flamand (accueil studio, FR), CDC Uzès Danse (FR), Bomba Suicida - Associação de Promoção Cultural (PT), Festival Circular (PT), Maria Matos Teatro Municipal (PT) | Apoio Départs avec le soutien du programme Culture de l’Union européenne, Fundação Calouste Gulbenkian (PT), ALKANTARA (PT), Atelier Re.al (PT) e Centre National Danse Contemporaine Angers (FR) (direção: Emmanuelle Huynh) | Agradecimentos
Cédric Cherdel (FR), L’A./Rachid Ouramdane (FR), Neusa Freitas (CV) e Heloisa Monteiro (PT).
conexão internacional
Marlene Monteiro freitas / Bomba Suicida Cabo Verde / Portugal
Guintche
2010
Ocupamos um espaço no mundo, um espaço o qual escolhemos ocupar. Uma escolha feita
com base em todas as experiências que já foram vividas pelo ocupador. Ocupação que integra
o perceber e o agir de forma que o pensamento também se dê pela ação, pelo movimento,
constituindo uma coexistência múltipla de territórios distintos. Territorialização, desterritorialização e reterritorialização do corpo que dança e do espaço onde esse corpo dança através da
produção da diferença pela repetição. Pois, de acordo com o filósofo francês Gilles Deleuze1,
o novo, a diversidade só pode ser produzida a partir da repetição.
Guintche é um nome portador de diferentes significações: que seja o nome de um pássaro, de uma palavra para designar uma mulher prostituída ou ainda alguém que passa de uma
coisa à outra sem alguma lógica aparente assim como neste solo. Aqui os perceptos e afetos,
imagens e imaginários se emaranham em repetições ao ponto de não ser mais possível dizer
quem guia o quê: se a música guia a dança ou se o corpo guia o som. O que se vê é um
diálogo sem palavras onde paradoxos não dissolutos são criados para que uma metamorfose
libertadora se torne possível.
O primeiro paradoxo se trata do quadril que, em toda sua feminilidade, revela sua força
e cria mobilidade para os pés que não saem do lugar. Nesta peça, diante de todas as possibilidades, Marlene escolhe começar sua dança a partir de um ponto fixo, mas não de uma
fixação. Afinal o corpo não precisa se deslocar para se fazer presente em todo o espaço. Seu
olhar vaga e se projeta enquanto seus gestos e movimentos se repetem e se transformam
na própria repetição. Essa transformação é reforçada pela música que também se repete,
ampliando a peça em diversidades de sensações e percepções. Assim, ocupar um espaço
é afirmar uma posição. Repetir nesse espaço é a passagem da transformação natural que
promove uma forma de evolução metamorfoseante.
1 DELEUZE, Gilles. Différence et répétition. Paris: ed. PUF, 1968.
13
Um segundo paradoxo aparece nesta peça, em que o não ver permite a não fixação do corpo
no espaço. O encontro entre o silêncio e a cegueira permite que todo um universo de imagens e
sons se transmute. É só no encontro que alguma coisa significativa pode acontecer. Este é o encontro do “corpo sem órgãos” com o espaço que ele ocupa. Esse conceito foi criado pelo francês
Antonin Artaud – poeta, ator, escritor, dramaturgo e diretor de teatro – e retomado por Deleuze
em sua obra “Lógica do sentido”, a qual trata de um corpo que não pode ser ocupado, nem
habitado, a não ser que por intensidades. “Corpo sem órgãos” não é um corpo objetivo, muito
menos o corpo de carne e osso das aulas de anatomia. O “corpo sem órgãos” é o corpo subjetivo,
expressivo; aqui ele é compreendido como o corpo que dança: único e singular.
Cada corpo tem seus próprios potenciais a serem desenvolvidos, aprofundados. Nesse percurso de desenvolvimento e aprofundamento de potencialidades, a diferença aparece como um
contínuo entre dois extremos. Existe um ponto de partida e um ponto de chegada, dois extremos
de um percurso, e é justamente esse percurso a diferença, criada pela repetição do percorrer, de
forma que a pessoa que parte nunca é a mesma que chega: o próprio percurso é transformador.
A intensidade aparece então como profundidade do ser, como uma metamorfose perpétua de se
reinventar a si mesmo, que se dá pela repetição de determinadas ações. Isto é, quando o sujeito
deixa de ser o que era para se tornar um outro que o contém.
A diferença não acontece na fixação e o corpo que dança não quer se fixar. Ela só pode existir no deslocamento, no percurso entre dois pontos extremos, percorrido pela repetição de algo
que é singular, insubstituível. Só repetimos aquilo que faz sentido continuar existindo, aquilo que
faz eco ao interior de cada um que repete. Repetir não para reviver, mas repetir para aprofundar
aquilo que já foi vivido, para ir além, para ampliar e expandir. Como um buraco que quanto mais
se cava, maior e mais profundo ele se torna. E no próprio ato de cavar ele se transforma, sem
nunca deixar de ser um buraco, e não sendo um buraco qualquer. É um buraco que foi cavado
por alguém que em sua ação repetitiva de cavar o queria maior e mais profundo. Ações que se
repetem permitem dar um sentido à peça no interior de um contexto que se define progressivamente, desenvolvendo sua própria matéria, seu próprio universo, seu próprio espaço e seu
próprio imaginário.
Nessa peça vemos então um corpo que se desterritorializa enquanto corpo físico, biológico, corpo de carne e osso; para se reterritorializar enquanto corpo sem órgãos investido pelos
conexão internacional
sentidos, ganhando a possibilidade de escolher um novo lugar para existir. Ele busca o que
está entre si e o espaço que ocupa, e se projeta em sua expressão máxima através de suas
repetições. E no próprio encontro do corpo com o espaço, ambas as partes se transformam
a cada movimento, a cada gesto, a cada ação. Essas não só o transformam como também
intensificam a própria transformação e sua presença.
O corpo que dança não existe sem território, e mesmo este não é fixo. A territorialização
do corpo é então apenas um meio para que, através da repetição, esta possa se esgotar em
suas possibilidades. A cada repetição tudo se desfaz e se refaz para se desfazer e se refazer
na repetição seguinte. É nesse “caos” que o corpo que dança - corpo sem órgãos - pode existir
e se manifestar em sua potencialidade máxima de expressão, sem nunca se esgotar enquanto
acontecimento. Pois quando algo é esgotado, o território é desfeito, e na própria repetição ele
é refeito. Mas já é outro, sem deixar de ser o mesmo, pois foi atravessado por intensidades.
Nesse processo a dança não precisa de explicações, conceitos ou diálogos verbais. A
dança basta por si só em sua manifestação existencial.
Assim, Marlene deixa que a transformação aconteça através dos devires de sua dança
que afetam sua manifestação expressiva, levando-a a novos modos de existência. Através de
suas experiências o corpo se constrói, se destrói e se reconstrói num emaranhado de corpos,
espaços, territórios e intensidades que se desmistificam a cada gesto, a cada movimento,
revelando-o em todas suas formas mais expressivas.
• Nicolle Vieira Dançarina e coreógrafa. Formada em Psicologia (PUC MG), mestre em Dança e em Filosofia
pela Universidade Paris 8 Vincennes - Saint Denis (França) e, doutoranda em Filosofia pela
mesma universidade. No Brasil, trabalha em parceria com o duo experimental Marcella The
Post Modern na criação de videodança.
Guintche Duração 50’ 05 e 06 Nov 20h | Funarte MG
Concepção e interpretação Marlene Monteiro Freitas | Luz Yannick Fouassier | ADAPTAÇÃO E
OPERAÇÃO DE SOM Eric Houllier | Música Cookie | Produção Bomba Suicida (Lisboa) | Coprodução
ZDB-Negócio (Lisboa), Residência artística O Espaço do Tempo (Montemor-o-Novo) e Alkantara Festival (Lisboa) | Apoio Re.Al (Lisboa) e Forum Dança (Lisboa) | Agradecimentos Avelino Chantre,
Pedro Lacerda, João Francisco Figueira e Anatol Waschke
15
Luís Guerra / Bomba Suicida Portugal
A primeira dança de Urizen
2009
A Primeira Dança de Urizen pode ser pensada como ritual do homem em estado de conflito,
em estado limiar entre o gozar de sua liberdade à reconhecer suas fronteiras e barreiras. Ritual
como a dramatização do conjunto simbólico do ser histórico Urizen. Neste trabalho, a performance é a ritualização desse conflito. Corpo que aparece aprisionado no interior da liberdade,
impondo limitações, proibições e obrigações: até onde posso ir, é possível transgredir? Estado
de conflito que desmistifica o começo, o estável, o pronto, o passado. Como viver em uma estrutura de “liberdade” que vigia a si mesmo? Repetir o que foi? Ou pensar no como poderia ser?
Reconhecer um lugar, um estado, uma condição, lançar-se para o insólito e estranhar o que nos
é familiar é o que propomos como provocação de A Primeira Dança de Urizen.
Urizen, figura literária do livro “O primeiro livro de Urizen”, do escritor, pré-romântico e ilustrador William Blake (1757-1857), pode ser pensada como uma história conflitante (que pode ser
eu, você, o outro) que tenta se afastar de um conjunto de condições vigentes e hegemônicas que
sujeitam saberes e ideias. Tenta, porque o afastamento é um percurso de processos, ao mesmo
tempo, de crises, rupturas, reparações, reintegrações. Tenta, porque há sempre um pedaço do
que foi vivido na ação presente, agindo ora para transmitir e reforçar valores, ora para superá-los
e/ou renová-los. Tenta, porque a ideia de liberdade é sempre restritiva. Nesse sentido, o conflito
de Urizen opera no reconhecimento de que mudanças podem se configurar como novas regras.
Uma vez que aquilo que se apresenta como novo e libertador hoje pode vir a se institucionalizar,
cristalizar e, no amanhã, se manifestar, ao mesmo tempo, como norma e opressão. Estamos
legitimando o quê? Reforçando o hegemônico ou inaugurando novos rumos?
Luís-Urizen possibilita uma preciosa abertura para pensarmos sobre a ideia de mudança,
permanência e liberdade. Questões que a peça ajuda a refletir: Urizen seria o vigilante de si
mesmo? A máxima da apropriação das “verdades absolutas” que, subjetivamente, controlam e
vigiam as condutas e escolhas humanas? Seria o olhar castrador de si?
conexão internacional
17
Tudo isso para dizer que, nesse percurso, um rito de passagem, Urizen representa simbolicamente o aspecto provocativo e detonador para pensarmos nas ocasiões possíveis de
experimentarmos e vivenciarmos o tabu, o excessivo e o arriscado presentes em nossas vidas
e na dança. Percurso que nos convoca a pensarmos em nossos rituais. E, a cada instante,
esses rituais de passagem mostram-se como possibilidade de transformar, permanente ou
temporariamente, as pessoas, as realidades e as concepções de mundo. Transformação como
contínua reorganização de um padrão, a memória. Uma vez que o ritual encena sempre parte
de algo que é anterior e fixo, mas não imutável. Rituais são memórias em ação. Memórias como pedaços de lembranças construídas sempre a partir da circunstância relacional
e situacional em que vivenciamos. Fragmentos misturados de lembranças e de imaginação.
Memória como parte viva da história, do acontecimento, e, como “Rito de Urizen”, do estado
de conflito do homem. Colocar memórias em ação, ou seja, viver o pensado e o dito, faz surgir
novos significados e possibilidades de mudança. Talvez seja essa a contribuição da Primeira
Dança de Urizen.
A primeira dança de Urizen Duração 15’ 05 e 06 Nov 20 h | Funarte MG
Coreografia, dançarino, música e figurino Luís Guerra | Iluminação Zeca Iglésias | produção
bomba suicida - andreia carneiro
foto | sara moutinho
• Lívia Espírito Santo
Bailarina da Cia de Dança Palácio das Artes/MG, professora de Dança Contemporânea com ênfase em Improvisação e Criação, bacharel em Ciências Sociais pela PUC/MG, pós-graduanda
em Gestão Pública pela UEMG. Integrou a equipe de pesquisadores do Observatório da Diversidade Cultural e a Cia de Dança Camaleão/BH.
conexão internacional
André Masseno Rio de Janeiro - RJ
O Confete da Índia
2012
No Brasil do século XX, a Arte Queer (termo do inglês – “esquisito”), mesmo ainda não usando
esse modo de se apresentar, tem manifestações emblemáticas. Dzi Croquetes e Secos &
Molhados constituem dois exemplos que se destacam. Em plena época de repressão militar,
na qual descontinuar padrões de gênero era visto como uma referência de desobediência civil,
ambos se tornaram uma forma de resistência política.
Atualmente, diversos artistas na área da dança propõem hipóteses artísticas diante deste cenário. É possível perceber que alguns hábitos tendem a reincidir nas propostas em dança
atreladas ao que se delimita como Arte Queer. Exemplos: a presença constante da figura da
Drag Queen glamurosa, as dublagens de músicas estrangeiras, os depoimentos biográficos,
entre outras características.
Em seu penúltimo trabalho – To be or not to be (queer): that’s a toxic question, o artista
carioca André Masseno já apontava um princípio de inquietação que parece se consolidar em
O Confete da Índia. O trabalho de Masseno reposiciona-se diante deste contexto, tornando-se
Queer para o que estava estabelecido enquanto Queer.
O que está em cena não é apenas uma discussão de gênero, mas o borrar de fronteiras
entre muitos corpos. A sobreposição de imagens, que tendem ao escatológico, não permite
definição deste corpo. O trabalho parece se constituir em zonas indefinidas que, quando estão
para se definir, são desfeitas novamente. O trânsito que se desenha está entre as possibilidades dos que compartilham a inadequação (social, estética, sexual, intelectual e midiática)
em uma composição onde resistir não se apresenta enquanto opção, mas como condição de
ser o que se pode ser.
A apresentação de um corpo em deterioração parece se atrelar aos discursos de minorias. (minorias não enquanto quantidade, pois não são raras as vezes em que elas constituem
uma absoluta maioria). Segundo Michael Foucault, as minorias são constituídas por aqueles
que não obedecem aos modelos preestabelecidos por redes de poder. A partir disso, faz-se
necessário refletir sobre a flexibilidade do estado de minoria, uma vez que ele se condiciona
através de contextos, e sempre em relação ao ponto de vista de quem está exercendo a
classificação.
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O Confete da Índia anuncia a existência de vozes que atravessam tempos e não se podem
dizer sozinhas, daí a necessidade de serem conectadas umas às outras. E, nessa travessia, a Índia
de Gal Costa, que “deixa saudades da felicidade”, precisa compor com a Xirley, de Gaby Amarantos,
e o seu “café coado na calcinha capaz de enfeitiçar”, entre outras aproximações desenvolvidas na
composição cênica. O conceito de antropofagia, já anunciado na organização espacial e escolhas
estéticas, transforma-se em um vômito crítico e não poupa respingos ao público.
Com Roberto Esposito, filósofo italiano, é possível caminhar com a proposta de que, em
alguns momentos, o trabalho de Masseno traz a Terceira Pessoa. Ser uma terceira pessoa é
ser sempre um ‘ele’, uma pessoa de quem se fala, uma pessoa que só existe em uma fala que
não é a sua. Quando a fala se torna sua, esse ‘ele’ se transformou em ‘eu’, porque só o ‘eu’ (ou
os vários ‘eus’ que se reúnem no ‘nós’) fala por si mesmo. O ‘ele, ela, eles, elas’ nunca estão
presentes no diálogo, a não ser na voz de quem os anuncia para se fazerem presentes.
Talvez seja a politização e problematização de outros discursos dentro do que parecia se definir enquanto Queer que faça emergir uma proposta de formulação artística e crítica em O Confete
da Índia. A parceria com Tuca Pinheiro parece ter sido um disparador de novas perspectivas. A partir
desses outros horizontes para o contexto artístico no qual André se inscreve, a dúvida que surge é:
quanto é possível dizer desse outro que ainda não pode/ainda não pôde dizer-se artisticamente?
• Fernanda Perniciotti
Graduanda em Comunicação das Artes do Corpo (PUC-SP). Membro do movimento em prol de
políticas públicas para a dança - A Dança se Move. É assistente de produção e difusão de projetos culturais e estagiária na Anadarco Editora.
o Confete da Índia Duração 60’ 01 e 02 Nov 23h e 03 nov 21h | Gruta! Espaço de Arte
Concepção, Direção, Dramaturgia e Performance André Masseno | Colaboração Dramatúrgica
e Assistência de Direção Tuca Pinheiro | Desenho de Luz Renato Machado | Direção de Arte Fábio
Carvalho | Direção de Produção Verônica Prates | Figurinos e Seleção Trilha Sonora André
Masseno | Consultoria Teórica Leonardo Davino | Debatedor (RJ) Italo Moriconi | Programação
Visual Karin Palhano | Fotos Divulgação e Ensaio Fotográfico Nilmar Lage | Equipe de produção
Camila Camuso e anele rodrigues | Realização Quintal Produções | Agradecimentos Adriana
Banana, Ana Cristina Chiara, Antônio Neto e Família, Caixa Cultural RJ, Claudia Lobo, Espaço Meia Ponta Ambiente, José Martins, Krassen Krastev, Marcelo Castilho Avellar (in memoriam), Marisa Godoy, Marisa Monadjemi, Raul Correia, Tanzhaus Zürich, Valéria Martins, Valério Lima e Wagner Ferraz.
O Confete da Índia é contemplado pelos Prêmios de Dança Klauss Vianna 2011 e FADA 2011 – Fundo de
Apoio à Dança, da Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro.
conexão internacional
Panaibra Gabriel Canda Moçambique
Tempo e Espaço: os solos da Marrabenta
2010
“Eu sou um português, comunista, democrata, Bithonga, às vezes cidadão africano, falante da
língua portuguesa, lusófono...lusófono...Bithonga (...)” Com essas e outras palavras dispostas
num jogo entre braços, mãos e costas (já que o discurso é enunciado de costas, microfonado,
sem rosto), Panaibra Gabriel Canda – filho de uma costureira protestante e de um músico
compositor da tribo dos Bithonga – apresenta sua biografia. Biografia colapsada por uma
cronologia de “épocas”, contextos históricos e momentos políticos que se remontam num
discurso de sobreposições. Acerca desse discurso que se faz cumulativamente, Panaibra
arma uma grafia contingente de uma história cheia de curvas, cruzamentos, rabiscos, simultaneidades e contradições.
Ao testemunhar, sem mostrar a cara, imprime o registro de sua identidade (nome, sobrenome, nascimento e endereço) e, no mesmo instante, recusa ser identificado como particular – sintoma de que aquilo não diz respeito só a ele, mas a muitos que partilham de seu
contexto e tempo. Em um só discurso embaralha sentenças tautológicas e contraditórias
acerca de quem é, ou seja, afirma-se, desafirmando-se. As palavras que circunscrevem sua
identidade sugerem que as histórias de seus pais, de seu país e de seu idioma são tributárias
de um traço de continuidade que, de alguma maneira, estende-se nele. Mas as mesmas
palavras são contraditórias à medida que – enunciadas pelo corpo em movimento — unem
polos de formulações distintas, constituindo incongruências e descontinuidades.
Ao som da Marrabenta – música-dança criada nos subúrbios de Maputo e também no
sul do país –, Panaibra traz um serpentear rítmico, evocando rarefeitos indícios de uma dança
“típica”. “Típica” porque se assentou sobre passos que foram repetidos coletivamente a ponto
de serem reconhecidos como apontadores de uma “tradição”. Vista pelos portugueses como
subversiva, a Marrabenta foi bandeira dos ideais revolucionários e, a partir dos anos 70 do século
XX, foi difundida internacionalmente. Na guitarra elétrica, tocada ao vivo por Jorge Domingos,
a Marrabenta traz a “música de Moçambique”, isto é, uma sonoridade que ata o remetente de
Tempo e espaço: os solos da Marrabenta à sua “nação” Moçambique. No entanto, junto desse
som “nacionalizado”, Jorge Domingos apresenta restos-referências que fazem lembrar Jimmy
Hendrix, Jeff Beck e Jimy Page, numa ode híbrida que desmonta a ideia de típico nacional.
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Sob os traços melódicos de Domingos, os movimentos de Panaibra – atados a um discurso
recorrente sobre a condição resultante dos processos históricos – são apontamentos que surgem como forma de monumentos a serem destituídos. Por monumento entendamos o agregado
de substantivos monolíticos como “tradição”, “nação” e “origem” que são evocados para serem
questionados.
Ao longo do trabalho, quando Panaibra usa a fala, enuncia o passar de circunstâncias políticas que se atravessam em seu corpo: ora é o “corpo ritual”, ora é o “resto da colonização
— um pequeno português de cor preta”—, ora o “fracasso do comunismo”, a “experiência da
democracia”, o “resultado de uma independência negociada” ou de uma “paz inegociada”. Já
nos momentos em que dança, suas memórias descrevem restos despedaçados de um homem
-retalho, figura representativa daquilo que todos nós somos, restos sem identidade, impactados
pelas inconstâncias do entorno.
Instaura-se, então, um estado de desabrigo identitário que faz lembrar a noção de identidade sociológica, proposta por Stuart Hall (2003). Para Hall, o sujeito sociológico buscava a
relação entre o mundo pessoal e o mundo público, regido por um núcleo interior, uma “essência” em fricção com o entorno. Contra a unicidade desse sujeito nucleado, Hall definiu o sujeito
pós-moderno como aquele que cria novas identidades, contraditórias, fragmentadas, abertas
e plurais (HALL, 2003, pp. 10-13). Todavia, uma perspectiva evolutiva, que propõe natureza e
cultura como instâncias indissociáveis, iluminaria esse desabrigo identitário para além desse
sujeito pós-moderno. Pois, no fluxo das relações com o ambiente, o sujeito nunca estaria pronto
e acabado. Assim, poderíamos falar em um não-sujeito, um corpo sem unidade, sem predeterminações, ou seja, um corpo que não é nem único, nem plural, corpo em processo.
Nessa direção, será que o que pretende Panaibra, em sua narrativa historiográfica, é desidentificar-se, afastar-se de estratificações étnicas e culturais monolíticas, abrir-se a novas
combinações com seu entorno? Para isso, ele usa a dança como testemunho de tempos atravessados e enuncia a fala por meio de índices desorganizados.
Mas, num dado momento da obra, suas palavras tornam-se partes de uma construção
histórica de lógica factual e identitária. Talvez seja esse o ponto em que a proposta de escapar
das gavetas logra a si mesma, uma vez que para situar fatos Panaibra evoca um encadeamento
discursivo didático. Assim, no início do trabalho, o discurso verbal é desorganizado, tautológico e
contraditório, isto é, naturalcultural e evolutivo (do jeito que somos todos, do jeito que é o corpo
e a dança). Do meio para o fim, suas palavras vão se acomodando num formato histórico factual.
A ideia de factual, como está apontada aqui, desdobra-se de um modo de contar a história por
um viés positivista/progressista, tal qual descreve Paul Veyne, ao conceituar a história hegemônica
herdeira do positivismo. Esse viés histórico cuidou de vincular o fato a grandes acontecimentos
conexão internacional
• Andréia Nhur
Bailarina, atriz e pesquisadora. Atua ao lado da coreógrafa Janice Vieira, no Grupo Pró-Posição.
É atriz e preparadora corporal-vocal do Katharsis Teatro. Docente no Curso de Artes Cênicas da
Universidade de São Paulo - Escola de Comunicações e Artes - ECA USP.
foto | richard malcom
políticos, ignorando que qualquer acontecimento seria material de história e não somente os
“grandes fatos”. Esse estatuto seria modificado nos anos 20 do século XX, com a Escola dos
Annales e a Nova História. Só aí, fato passaria a ser acontecimento qualquer e não mais uma
demarcação pontual que enaltece o tempo, criando enquadramentos epocais. (VEYNE, 2008).
Diante disso, por que Panaibra insiste em retratar esses aspectos epocais de seu corponaturalculturalambientecontraditório se, além das correntes sociopolíticas, dos regimes, das
condições de colonização, de etnia e de geografia, existem outras implicações? Essa escolha
não seria uma rachadura no discurso, uma necessidade de explicar e dissecar as misturas?
Mas as misturas não são irreversíveis? Logo, o ato de explicitar os tempos e dissecar as
misturas não incorreria numa abordagem cientificista, didática historicista, em detrimento da
natureza não identitária do corpo?
Há de se pensar nas possíveis razões dessa escolha, afinal, o governo moçambicano
ainda persegue os subversivos, de modo que certas questões urgem e necessitam de claridade, insistência e, até mesmo, de certo didatismo, para se colocarem à prova em seu país.
De todo modo, seja pelo trajeto obtuso, seja pela escolha didática, a proposta de Panaibra é um grito.
A busca pelo fim dos enquadramentos unilaterais da questão da identidade reflete a
incômoda imposição de linhagens que nos destitui o direito de ser “desidentificado” no Brasil.
Aqui (e em todo lugar), as argumentações em prol de uma identidade-monumento – ainda
em uso constante – são perigosas e absurdas, já que imperam sobre sólidos pilares de origem e descendência, operando sob a lógica da exclusão.
23
Referências:
HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução de Tomás Tadeu da Silva e Guaracira Lopes
Louro. 7. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.
HARTOG, François. Evidência da História: o que os historiadores veem. Trad. Guilherme João de Freitas com
a colaboração de Jaime A. Clasen. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2011.
Marrabenta. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013. [Consult. 2013-08-10]. Disponível na
URL < http://www.infopedia.pt/$marrabenta >.
VEYNE, Paul. Como se escreve a história; Foucault revoluciona a história. 4ª ed., Brasília: Editora UNB, 2008.
Tempo e Espaço: os solos da Marrabenta Duração 60’ 02 e 03 Nov 19h30 | Funarte MG
Coreografia, dançarino Panaibra Gabriel Canda | Música Jorge Domingos | Textos Panaibra Gabriel
Canda | Projeto de luz Myers Godwin | Operador de luz Aude Dierkens | Figurinos Mama africa &
Lucia Pinto | Apoio administrativo Jeremias Canda | Objetos Panaibra Gabriel Canda com o apoio
de Gonçalo Mabunda | Música estruturada e inspirada pela Marrabenta, música de Moçambique,
desenvolvida apartir de analise de compositores importantes da Marrabenta s: Fany Mpfumo Trio,
Fany Mpfumo, Gatika, Abilio Mandlaze, Xidiminguana, Feliciano “Pachu” Gomes. e a musica portuguesa “Povo que lavas no Rio” do compositor J. Campus e interpretada pela Amália Rodrigues | Produção
CulturArte (Maputo) | Coprodução Sylt Quelle Cultural Award for Southern Africa 2009 – Goethe Institut Johannesburg | Apoio Kunsten festival des arts, Bates Festival, Panorama Festival e
VSArtsNM | Agradecimentos especiais Jesse Manno, Dan Minzer, Leah Wilks, Cynthia Oliver, Elsa
Mulungo e Timoteo Canda
conexão internacional
Obrigado por vir
2005, 2012
O...............R
Obrigado é uma palavra, etimologicamente, desdobrável. E quando colocada em contexto
numa frase ou num título, junto a outras palavras, como é o caso aqui, tal característica ganha contornos ainda mais específicos. É uma forma de agradecimento assim como particípio
do verbo obrigar, que é forçar, violentar, ir contra a vontade. Diz de quem briga: o brigado.
Expõe a situação daquele que está ali: forçado, obrigado. Aponta para (o) que(m) vem – por
vir – ou para (o) que(m) é – porvir. Portanto, linhas de sentido são produzidas pelas múltiplas
significações através da voz daquele que enuncia o título do trabalho da Key Zetta e Cia. A
escrita aqui abre campos.
Num determinado momento, um dos cinco “obrigados” enuncia ao longo de um monólogo a moral como estritamente relacionada a obrigação com a seguinte frase: “moral é o início
da confusão”. Essa, a moral, é começo dos obrigados, mas também seu limite. É ela o início
da confusão, que é o obrigado para a voz enunciadora. É ela que circunscreve um território
no qual ela mesma existe pela lei. Assim, sendo o obrigado e seu limite, a lei, o mesmo que
confusão na frase, então a moral é ponto de partida contra si. Por ser contra afetos, contra a
selvageria, contra diversas vontades de poder, contra desejos, obrigar é confundir, porque é da
própria língua e seu exercício, linguagem, o poder de abrir sentidos pela voz.
Se moral é confusão predeterminada ou com limite, isso significa que determinados
padrões de obrigação objetivam suspender qualquer afeto em relação ao outro para parametrizá-lo como obrigação: “sim”, “não”, “thanks for being here”. Assim, agradece-se obrigatoriamente: “agradeço e não é sincero, mas obrigação”.
O território da moral, desenhado por um quadrado no solo, é o limite dos obrigados – pedaços de carne selados em corpos – mas também sua possibilidade de autonomização pelo uso
da voz. Um por vir / porvir que não se desenha ao final como tal, mas dançado como potência
latente, pois é a língua das carnes que assegura um grau zero de passiva atividade: I would prefer
not to = obrigado por vir.
Nos movimentos mecânicos acotovelados e para dentro de cada um dos obrigados, indiferentes aos que estão ao lado, nas palavras padrão saídas do corpo e adensadas pelo(s)
microfone(s) à frente, tudo permanece em estado de latência.
Assim, no espaço-território de controle, multiplicado em escala até esses corpos que se
contorcem num palco e que à sombra de qualquer disfunção são estetizados como num cemitério, com flores, ri-se de si. Um riso (in)contido.
Mas para quem será espectador: há uma tensão, mas esta não se compromete. O-brigar não vira
nada que não seja um contorcionismo da carne e chute de flores; ninguém se obriga a olhar para o lado.
Obrigado por vir como irônico slogan publicitário é a armadilha do oximoro, projetando final destensionado
e repetível até o esgotamento.
Assim, nesse jogo, resta ao espectador elaborar e produzir sua própria voz, a partir do
título, para se aproximar do trabalho que nada mais é que escrita em ação. É enfrentando esse
jogo de sentido, que é infindável por natureza, que o esgotamento se torna para quem assiste
potencialmente continuidade.
• Frederico Canuto
Arquiteto e urbanista. Professor Adjunto A da Universidade Federal de São João Del Rei.
Mestre em Planejamento Urbano / Análise Crítica e Histórica da Arquitetura e Urbanismo.
Doutor em Poéticas da Modernidade.
foto | cris lyra
key zetta e cia. São Paulo - SP
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Obrigado por vir Duração 45’ 02 e 03 Nov 18h | Teatro Alterosa
Concepção e direção Key Sawao e Ricardo Iazzetta | criação e dança André Menezes, Beatriz Sano,
Key Sawao, Marina
Massoli e Ricardo Iazzetta | Luz Domingos Quintiliano |
Coordenação de Arte
Hideki Matsuka | Produção Key Sawao | Fotos André Menezes, Roberto André e cris lyra | Vídeo
Doctela | Agradecimentos Eduardo Fukushima, Nilson Muniz, Marco Xavier, Oficina Cultural Oswald de Andrade, Cássia Navas e Ana Francisca Ponzio
conexão internacional
Temporary
2007
Caixa preta. Piso branco. Roupas sendo distribuídas pelo chão. Erez, ao tecer uma combinação de assertividades, coreografa com precisão. Não parece ter espaços para aleatoriedades. Tem um “repetido” diferente no jeito como articula sua movimentação partindo de
temas recorrentes como identidade, saudades de casa, “sem teto”. É inevitável, nesse sentido, não ver uma proximidade com a coreografia Homesick, também de sua autoria. Neste,
o corpo, o movimento e a fisicalidade do ambiente propõem relações entre interno e externo, sobre espaço. Contudo, Homesick trata de uma distância concreta geográfica e mesmo
emocional, enquanto Temporary se detém em uma distância que é do próprio corpo em seu
próprio espaço. Temporary tem e produz tensão que Tatsuro Ishii (2007) reconhece como uma
“política física”. Uma política que se dá a ver, primeiramente, em uma espécie de resistência
que pode ser percebida na textura dos tecidos do corpo da Iris intérprete e na organização
coreográfica da artista. E, por outro lado, uma política física que se desenvolve pela relação
que a coreógrafa estabelece com o universo fashion por meio de um paradoxo entre produção
e destruição que ela acredita, está no próprio corpo. Chega a ser kitsch? A peça não deixa
de ser irônica - mesmo que demore para se perceber ... Iris troça desse universo a que faz
referência. Alternando momentos sem sonoridades, a peça se deixa embalar por um “vou de
táxi”, em francês, entre outras ondas sonoras editadas por Jeremy Berenheim. Cabe lembrar
que Iris Erez dançou e colabora com outra coreógrafa israelita, Yasmeen Goddei, com quem
parece partilhar ideias como a desconstrução de imagem do feminino e a deformidade como
estratégia criativa. Que permitem discutir, no corpo, estereótipos, caricaturas e (ou) moldes
recortados, entendidos usualmente como necessários, quando o ambiente e a realidade parecem grandes, complexos e transitórios demais. De certo modo, essas estratégias podem
ser percebidas em Temporary como mecanismos para fazer “troça”. Ainda que seja, de modo
mais leve do que em seu outro solo, It is not personal1, que demarca com ênfase esses
pressupostos críticos, gerando uma analogia entre percepção social e processo de impressão
ou produção em massa ao exagerar traços de personalidade associados às categorias que
representam. Agora, como seria assistir a Temporary no corpo de outra artista? Sabe-se que,
1 Este solo não está na programação do FID 2013.
usualmente, essa coreografia é performada por Maya Weinberg, valendo tomar em consideração
que Iris Erez vem introduzindo certa distância entre ela e suas peças de dança, ao coreografar
para outros, desde 2009. Temporary é de 2007. No corpo Iris - parece ser um convite a mais para
assistir a esse solo com a artista que o concebeu e que medeia suas próprias questões firmando
o passo do olhar do espectador.
• Marila Velloso
É professora no curso de Dança da Faculdade de Artes do Paraná/Unespar, em Curitiba. Artista da
dança e diretora da Emovimento Produções.
foto | itay marom
Iris Erez Israel
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Temporary Duração 17’ 06 e 07 Nov 21h | Teatro Oi Futuro Klauss Vianna
Coreografia e dançarina Iris Erez | direção de ensaio maya weinberg | música Hanayo, Vanessa
Paradies | Edição da música Jeremy Berenheim &Yaniv Mintzer | Projeto de luz tamar orr | estreia
Festival Operastate 2007 (Bassano, Itália)
conexão internacional
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Iris Erez Israel
Homesick
2010
• Giancarlo Martins
Professor e pesquisador da Faculdade de Artes do Paraná, onde coordena o Núcleo de Estudos
em Dança. Integrou a equipe de pesquisadores do Programa Rumos Itaú Dança e colaborou
com Enciclopédia de Dança do Instituto Itaú Cultural. Doutorando em Comunicação e Semiótica
(PUC-SP). foto | itay marom
De modo muito potente, Homesick nos convida a refletir sobre questões como singularidade,
compartilhamento e pertencimento.
Papelão ondulado recobrindo todo o palco, ambiente rigorosamente demarcado. Na tentativa de constituir relações com e neste território, os dançarinos vão, um a um, ocupando este
“chão”, fazendo emergir frágeis e instáveis articulações. Assim, expondo as distâncias entre
corpo e espaço, corpo e corpo.
Busca por acolhimento pelo espaço e pelo outro? Tentativa de redesenhar essas relações?
Essa busca que, aos poucos, promove uma redefinição das distâncias entre o local e o pessoal, e,
entre o eu e o outro, produz o esgarçamento das fronteiras entre o público e o privado, o interno e
o externo. Contatos apontando para a possibilidade (ou impossibilidade) da constituição de novas
formas de participação e vínculo.
Tudo parece ser temporário e circunstancial, mas ao construir essa topologia Irez apresenta
uma complexa representação das relações constituídas entre corpos e espaço. Relações que
permitem compreender as informações no ambiente e no corpo como processos de um sistema
relacional, que em um contínuo promove contaminações mútuas. Corpo e ambiente se transformam um ao outro, codefinem-se.
Homesick também nos lembra que, nesse espaço historicamente constituído por processos, tanto do passado como do presente, faz-se necessário emergir contra a perda de sentido da
existência, tanto individual quanto coletiva, novos modos de ser e estar no mundo. Uma tentativa
de resistência. Mesmo que seja por um lapso de tempo.
Homesick Duração 50’ 06 e 07 Nov 21h | Teatro Oi Futuro Klauss Vianna
Dançarinos e cocriadores Matan Daskal, Adi Boutrous e Tami Lebovits | Diretora Artística Tamar
Borer | Ensaiador Alex Shmurak | Trilha sonora Reckless Feet | Música Mount Eerie, A Silver Mt.
Zion e Reckless Feet | Figurinos Inbal Lieblich e Tamar Levit | Projeto de luz Tamar Orr | Cenografia
Hilla Ben-Ari | Produção Yael Gesser | ESTREIA Curtain Up festival 2010 (Tel Aviv, Israel)
conexão internacional
Núcleo do Dirceu / Marcelo Evelin Teresina - PI
1.000 casas
2012
Mil histórias para dançar
Ninguém nunca vai saber o que foi o projeto 1.000 Casas, proposto pelo Núcleo do Dirceu de Teresina, nos anos de 2011 e 2012. Há pequenas obras que foram chamadas de “documentalidades”,
que podem ser vistas no site do núcleo, e um livro. Mas como todo acontecimento-testemunho,
as histórias podem ser contadas, encenadas, performadas, rememoradas, satirizadas, mas acabam lidando com uma documentação pelo avesso, ou seja, com a própria ação de documentar,
muito mais do que com “documentos”, coisas ou produtos gerados a partir do acontecimento.
Isso não significa que o grupo relança a arte no universo da inefabilidade, e sim, que testa
a exposição brutal da impossibilidade de reter um acontecimento ou narrá-lo em sua totalidade.
Corpo e vida são descontínuos, precários, cheios de fissuras. Não é fácil invadir esses buracos.
No livro que reúne algumas experiências (textos, fotos e fabulações de quem participou),
Marcelo Evelin explica que a ideia do projeto partiu de muitas questões e da curiosidade de saber
o que acontece quando se entra na casa de outra pessoa, no seu cotidiano, e ali, sem nenhuma
preparação prévia ou convite, acontece um evento artístico: uma dança, uma conversa, uma
cantoria, uma performance ou simplesmente um “estar junto”. E por que não?
Durante a performance-instação que agora chega a Belo Horizonte, mas já circulou por São
Paulo (Itaú Cultural), Rio de Janeiro (Teatro Cacilda Becker) e Teresina (Clube dos Diários); muita
gente entendeu, mas muita gente achou esquisito. De todo modo, a experiência rendeu e apontou
outras questões que não estavam de saída na proposta. O mais inquietante não é o que pode ser
visto como performance, mas aquilo que se aproxima da experiência daqueles dias. Quando se vê
a performance ao vivo, há uma rota de percepções sugerida pelos deslocamentos das casinhas
de papelão, pelo cheiro do feijão, pela caoticidade de onde emergem eventos, quase sempre,
aparentemente descontextualizados.
Mas as perguntas mais significativas não são: o que significa aquela canção? Por que o
dançarino tirou a roupa? Por que aquela pessoa está empacotada? Por que está travestida? O
que a mulher sussurra? Por que os clichês se amontoam como as casas e as pessoas naquele
lugar sem dono e sem nome?
É sempre interessante ver uma performance primeiro como aquilo que acontece quando
acontece. Mas, ao mesmo tempo, 1.000 Casas sugere outras leituras, menos evidentes. Si-
31
tuações íntimas e absolutamente escancaradas pela presença de um intruso dentro de uma casa
desconhecida. Um tipo de ambivalência que só um estranho pode promover.
Em 2003, o livro de Zygmunt Bauman, A modernidade líquida, foi traduzido e publicado pela editora Zahar. Lá estava essa observação sutil de que o estranho (aquele que não é amigo nem inimigo)
insiste como uma espécie de presença inqualificável e só cumpre o seu papel desestabilizador se tiver
uma passagem rápida e provisória em certo ambiente. Por isso, se a sua presença reincide ou dura no
tempo, já será, inevitavelmente, classificada. Parece que o projeto 1.000 Casas encontra seu sentido
mais perturbador nessa mesma situação ao colocar “mundos ausentes paralelos em escuta”.
Não é o que se fala, o que fica daquela vivência ou as explicações incansáveis sobre a tensão
entre o público e o privado, a individualidade e o coletivo. O que me pareceu mais perturbador foi
o enigma da vida impessoal que aflora o tempo todo e insiste na transformação da pessoa em ser
vivo, sem individualidade imunizada.1
Escancarada como as casas mais precárias, sem muro, sem pintura, sem acabamento, em
meio a tantas vozes e tanta gente, sussurra a inquietude da vida qualquer.
Referências:
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Tradução: Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. 258p.
ESPOSITO, Roberto. Bios: Biopolítica e filosofia. Lisboa: edições 70, 2010.
NÚCLEO DO DIRCEU 1000 CASAS www.1000casas.nucleododirceu.com.br
• Christine Greiner
Professora do Departamento de Linguagens do Corpo da PUC-SP. Autora dos livos O Corpo, pistas para
estudos indisciplinares (2005) e O Corpo em Crise (2010), entre outros livros e artigos publicados no
Brasil e no exterior.
1 O paradigma da imunização foi proposto pelo italiano Roberto Esposito e desenvolvido em sua trilogia
Communitas: Origine e destino della comunità (1998), Immunitas: Protezione e negazione della vita (2002) e Bios:
Biopolítica e filosofia (2004). Bios é o único traduzido em português, pelas edições 70 de Portugal. Esposito explica
como, em uma espécie de proteção negativa da vida, os indivíduos têm se tornado cada vez mais imunizados em
relação aos outros, impedindo de maneira irreversível a constituição das comunidades.
1.000 casas Duração 75’ 07, 08, 09 e 10 Nov 19h30 | Funarte MG
Núcleo do Dirceu/1.000 Casas Allexandre Santos, Caio César, César Costa, Cleyde Silva,
Elielson Pacheco, Humilde Alves, Izabelle Frota, Jell Carone, Jacob Alves, Janaína Lobo, Layane
Holanda, Marcelo Evelin, Regina Veloso e Soraya Portela
1.000 Casas é apresentado pela Petrobras e pelo Ministério da Cultura, com patrocínio de manutenção
do Núcleo do Dirceu por dois anos (2011 e 2012), via Lei Rouanet e Governo Federal.
conexão internacional
Benoit Lachambre / Par B.L.eux québec, canadá
Snakeskins
2010
O maravilhoso.
“O maravilhoso deve ser crível. O inacreditável jamais causa maravilha.” (MONTEIRO,
2006)
Muito se fala pelos corredores das salas de espetáculos sobre se tal peça foi incrível ou
não, maravilhosa ou não. Mas o que significa essa capacidade de se maravilhar?
Em busca pelo miraculoso.
René Descartes chamava maravilha à primeira das paixões “uma súbita surpresa (...)
que tende a considerar atentamente aqueles objetos que parecem ser raros e extraordinários”
(DASTON & PARK, 2001).
Snakeskins é um solo fake talvez porque seja feito por um homem só, mas em rede e
talvez porque mesmo juntos estejamos sempre sós.
Talvez, também, porque o espetáculo lide com um universo de seres fakes, fantásticos,
monstruosos e maravilhosos que não fazem, necessariamente, parte de um mero mimetismo
da realidade, mas de uma fantasia
...
“Maravilhas são objetos que marcam os limites extremos do natural. Maravilhas como
a paixão que marca a linha entre o conhecido e o desconhecido.” (DASTON & PARK, 2001)
Benoit vai abrindo espaços
que atravessam o corpo para o ambiente e
vice-versa,
dotado de um vocabulário, aparentemente, inteligível
obscuro/onírico
e que por isso mesmo é capaz de captar a
atenção.
“Tudo é perigoso
33
Tudo é divino maravilhoso” (Caetano Veloso e Gilberto Gil, 1968).
Atenção esta que flutua/escapa/volta/gira/torce/medita/ativa.
Aos poucos o universo desse espetáculo vai nos abrindo as frestas,
fissuras entre as brechas,
até estarmos totalmente imersos/submersos num mundo onde distinguir o fake do real
não nos importa.
Esse ambiente povoado de seres fantásticos e maravilhosos
que se movimentam feito cobras,
cantores de rock,
lutadores de lucha libre,
homens-bolas de basquete, que vão expandindo espaços para ficções e ilusões
surreais
...
ali entre os movimentos das falas, dos braços, dos
fios de aços
...
e,
ao final,
quanto mais se caminha nessa jornada rumo ao maravilhoso,
mais podemos chegar aqui e nos deparar com um certo tipo de encantamento.
Aqui,
que já não é mais aqui.
Aqui onde a perspectiva se desenquadra e se contorce diante de nossos olhos.
A perspectiva é como uma ficção-lógica que renascentistas criaram para organizar/representar o espaço, mas que, ao longo dos séculos, foi deixando o nosso olhar e nossos corpos cada
vez mais enquadrados dentro de sua lógica implícita de poder, valores e hierarquias.
Em Snakeskins observa-se uma perspectiva fake que atravessa e desenha o espaço desde
o início do espetáculo.
Ao longo, como que em um ataque sorrateiro/ondulante
(feito cobra),
desconstrói-se diante de nós uma ilusão, disponível para quem caminha só, até aqui, o fim,
conexão internacional
MONTEIRO, Marianna. Noverre, Cartas sobre a dança. São Paulo: Ed. USP - FAPESP, 2006.
DASTON, Lorraine; PARK, Katharine. Wonder and the order of Nature. NY: Zone Books, 2001.
• Bruno Freire
Bruno Freire está interessado em coreografia e em pesquisar convergências entre a prática e
teoria nas artes cênicas. é mestre em comunicação e semiótica, fez artes do corpo, e atualmen- te, inicia um mestrado no ex.e.r.ce em Montpellier (FR).
foto | christine rose divito
a fim de, simplesmente, contemplar o encantamento, o que já é muita coisa.
O desenquadramento da perspectiva é uma possibilidade/realidade que faz com que se
compreenda o observar também enquanto uma experiência sensorial e kinestésica. Abrindo
mais espaços para outras formas de compreensão, criando outras conexões com o seu espectador, através de entendimentos que não nos são usuais e respostas para questões comuns
a essa arte de performance e que continua a envolver esse fazer em dança (contemporânea).
“Como teorizado pelos medievais e pelos intelectuais do começo do modernismo, maravilha era uma paixão cognitiva, tanto sobre o saber quanto sobre o sentimento. Registrar a
maravilha era registrar um limite violado, uma classificação subvertida. O fazer e quebrar de
categorias - o sagrado e o profano, natural e artificial, vegetal e mineral; sublunar e celestial.”
(DASTON & PARK, 2001)
“O maravilhoso é aquilo que desestabiliza a lógica, e está dentro da lógica. O maravilhoso surpreende como o caos, mas revira a lógica caótica. O maravilhoso é um conceito tomado das doutrinadas clássicas que designa um gênero dramático específico, mas, ao mesmo
tempo, é atributo de todo e qualquer gênero poético. Chapelain, um dos grandes teóricos do
classicismo, afirma que “a maravilha tem a mesma origem que a diversidade”, a natureza do
tema produz o maravilhoso quando por meio de um encadeamento de causas não forçadas,
nem provindas do exterior, vemos resultar elementos contrários ao esperado ou contrários ao
comum. O maravilhoso existe, portanto, para despertar o interesse do público pelos acontecimentos extra-ordinários, inesperados, que, no entanto, parecem naturalmente plausíveis.”
(MONTEIRO, 2006)
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Snakeskins Duração 60’ 09 e 10 Nov 21h | Teatro Oi Futuro Klauss Vianna
Conceito, coreografia e dançarino Benoit Lachambre | Com a participação de Daniele
Albanese | Música composta e apresentada ao vivo por Hahn Rowe | Colaboração artística
Daniele Albanese, Hanna Hedman | Figurino e objetos de cena (props) Alexandra Bertaut |
CENOGRAFIA Benoît Lachambre, Philippe Dupeyroux e Yves Godin | Fotografia Christine Rose Divito |
Iluminação Yves Godin | Direção técnica Johannes Sundrup | Direção de palco Erwan Masseron |
Produção Par B.L.eux (Montréal) | Coprodução Kunstenfestivaldesarts (Bruxelas), PACT Zollverein
– Centro Coreográfico NRW (Essen), Ateliê de Paris-Carolyn Carlson e CDC Paris Réseau/ centro de desenvolvimento coreográfico (Ateliê de Paris-Carolyn Carlson, L’étoile du nord, micadanses- ADDP,
estúdio Le regard du Cygne-AMD XXe), SNDO (Amsterdam, Holanda), La Bâtie – Festival de Genebra e Musée de La Danse / Centre Chorégraphique National de Rennes et de Bretagne (Renes). Como apoio
do Théâtre de la Bastille (Paris), do município de Paris no âmbito do programa de residências do Cité
internationale des Arts e a participação especial da Compagnie Stalk (Parma)
Apoio
fidinho
A crescente adesão do público infantil à programação
do FID impulsionou a criação, em 2008, deste espaço
dedicado especialmente às crianças.
F ID IN H O
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Silvia Real Portugal
Tritone
Trítono é um tipo de intervalo musical, uma das mais complexas dissonâncias possíveis no
que é chamado de música ocidental. Mais do que desenvolver uma argumentação sobre
quais os tipos de intervalo, é entendê-lo como intervalo.
Intervalo que é entre. Entre que tem lugar: o corpo. Tritone trata de um corpo que traça
mapeamentos precisos, muito precisos e que mantém uma plasticidade enquanto multidirecionalidades e multilocações, distendidas no dentrofora de um espaço capsular.
A estrutura do mapeamento de Tritone se mantém dinâmica, mesmo que um dado mapa
se repita, ou melhor, seja refeito, ou reensaiado. Ele é sempre alterado num outro, no tempo
e no comportamento, da contínua atividade motora do corpo (inserido na fronteira plástica
com o entorno). Mapeamento também tem um sentido matemático, no sentido de um traçado
entre espaços que preservam ângulos de interseção.
Um espaço entretecido no outro, assim são os ângulos de Tritone, matemáticas de fronteiras plásticas, permeáveis e comuns. Ângulos que colocam o corpo como referência do espaço.
Por exemplo, o corpo é que determina as noções de cima/baixo/direita/diagonal. E ângulos que
são coercitivos do corpo. Por exemplo, não há como sair do espaço capsular... Será???
Essa dissonância, essa riqueza de pensar o espaço no corpo e o corpo no espaço efetiva
a impossibilidade de prioridade entre os horizontes do cenário externo e os elementos cênicos internos do espaçocápsula e os fenômenos que aparecem neles (nos horizontes e nos
elementos).
Intervalo entre o desenho animado e a vida animada. Uma coisa se reduz à outra. E
redução é antes de tudo uma relação entre coisas.
• Lenira Rengel
Professora da Escola de Dança da UFBA, pesquisadora.
foto | susana neves
2007
Tritone Duração 45’ 02 e 03 Nov 16h | Funarte MG
tritone de sílvia real e sérgio pelágio | Argumento e interpretação Sílvia Real | Argumento e
sonorização Sérgio Pelágio | Direção técnica, desenho de luz e operação de luz Carlos Ramos |
Cenografia e design gráfico Carlos Bártolo | Figurino, adereços, direção de cena e produção
local Ana Teresa Real | Sonorização da animação inicial, operação de som e imagem Simão Costa
| Animação inicial Daltonic Brothers (João Pedro Gomes, realização; Paulo Abreu, fotografias;
Patrícia Rego, assistente) | Produção internacional Clara Riso | Apoio Fundação Calouste Gulbenkian - Programa de Língua e Cultura Portuguesas 2013 | Coprodução Culturgest, Fundação
Centro Cultural de Belém, Teatro Viriato, Festival Y/Quarta Parede, Centro de Artes de Sines,
Centro Cultural do Cartaxo e Teatro Circo | Apoio Segway, Revista NADA, Daltonic Brothers, Miso
Records, Restart - Escola de criatividade e novas tecnologias e Cadigital - Atelier de Impressão |
Agradecimentos Alkantara, Eira, Perseu Mandillo, Rosa Peliças, José Fabião, João e Tuta, Teatro São
Luiz | Apoio espaço de ensaios Teatro da Voz (Escola Voz do Operário/Lisboa)
Apoio
F ID IN H O
Elisabete Finger Curitiba - PR / Alemanha
Buraco
2013
Quando o que está em jogo é dança feita por adultos para crianças é absolutamente necessário estar atento, em especial, a algumas questões. Tanto quem está produzindo, quanto
quem está promovendo, quanto quem está levando as crianças para assistirem à dança - são
todos responsáveis pelo seu desenvolvimento cognitivo. O que elas veem, escutam, sentem é
fundamental para a aquisição e aprendizado da linguagem, da orientação espacial, desenvolvimento motor e da construção de conceitos. Assim, não apenas as artes, mas a matemática,
a física, a biologia, a ética, a política, a religião e toda a estrutura cognitiva humana está
implicada na experiência sensorial.
Quem faz, quem promove e quem introduz esta dança na vida da criança é corresponsável, e esta experiência funda possibilidades no adulto de amanhã.
Perguntas necessárias:
1) Qual entendimento de dança está sendo praticado e promovido nas danças feitas
para crianças?
2) Qual entendimento de criança está sendo praticado e promovido nas danças feitas
para crianças? De qual criança, de qual idade, de qual lugar é essa criança?
Uma das contribuições de Buraco é que nos ajuda a pensar a questão do espaço. Aqui,
o espaço proposto, não estático, desafia a criança. Uma das consequências é que a criança, e portanto o público, não é tratada como um ser passivo. Diferente do que costumamos
pensar, o espaço não vem pronto como uma caixa que ocupamos, que os objetos ocupam. O
espaço também não é só geográfico, métrico, geometria tridimensional - altura, profundidade
e largura, mas também é composto pela dimensão TEMPO. E, também, o espaço é social,
econômico, afetivo, histórico e muito mais.
É simples assim em Buraco. Espaço que se constrói por relações e, portanto, não vem
pronto. Os objetos, como a lona e o quadrado, são colaboradores dos dançarinos e não são
adereços, paisagens ou enfeites. Isso acontece porque o tipo de relação entre os dois, lona/
quadrado e dançarinos, constrói algo que não daria para acontecer sem um ou outro. Isso estimula a imaginação das crianças, estimula seu aprendizado sobre possibilidades de espaço.
Lembrando que, se muitos sabemos que a lona se move porque há pessoas embaixo delas,
41
crianças de até uma certa idade não sabem, quando já sabem é porque já aprenderam. Pode ser
uma cena simples para alguns, mas importa porque aguça a curiosidade e porque sem ela não
há perguntas, não há pensamentos.
Buraco promove um espaço no qual “buraco” são as possibilidades de imaginar, de sair e
entrar em lugares que não estão prontos, que não se dão a ver totalmente e nunca se darão, e
que para serem têm de ser construídos.
Em Buraco, muitas das cenas, principalmente as que não revelam todo(s) o(s) corpo(s), como
a do tecido verde, a da lona, a do quadrado, ajudam a quebrar a noção de que é possível ver todo o
espaço como algo passivo. A ideia de buraco funciona como um convite para que todos espiem algo
que não se dá a ver e que nunca se verá exatamente; chama atenção para o público que deixa de se
entender como passivo, mas é autor ativo do que percebe, o que não é necessariamente visual, mas
também ativa sensações em sua pele, no calor de seu corpo, na imaginação que tem de completar
aquilo que não vê e tudo mais que não é só a visão de algo pronto se impondo.
• ADRIANA BANANA
Artista e pesquisadora de dança, formada em Filosofia (UFMG) e mestre em Dança (UFBA). Desde
1988, já participou de mais de 17 espetáculos de dança e laboratórios com: Clube Ur=H0r, Toni Cots,
Alain Platel/ Les Ballets C. de La B., Marcelo Gabriel/ Cia de Dança Burra, Thembi Rosa, Renata
Ferreira, Jacqueline Gimenes, Shussaku Takeuchi/ Dormu Theatre II, Tuca Pinheiro, Cia de Dança de
Caxias do Sul e Grupo Camaleão. Já recebeu os Prêmios APCA – Associação Paulista de Críticos de
Arte de SP – 2012, Itaú Rumos Dança, edições 2003-2004 e 2009-2010; Medalha da Inconfidência
(Governo do Estado de MG) e Medalha da Inconfidência (2005 - Governo do Estado de MG), Bolsas
Vitae (2000) e Apartes (2001 – residência na Trisha Brown Dance Co). Em 2012, lançou o livro
“Trishapensamento: espaço como previsão meteorológica” (2012).
Buraco Duração 45’ 09 e 10 Nov 16h | Funarte MG
Concepção, direção e criação Elisabete Finger | Criação e performance Cinira Macedo, Jamil
Cardoso e Sandro Amaral | Acompanhamento Litó Walkey e Xenia Hauf | Materiais de cena e
figurino Elisabete Finger, Marion Montel e Marcello Busato (construção) | LUZ FÁBIA REGINA E YAIR
VARDI | PRodução Cândida Monte, Wellington Guitti (Brasil) E Ana Rocha (Alemanha) | Coprodução
Uferstudios Berlin e Pact Zollverein (Alemanha) E Festival Panorama (Brasil) | Apoio e residências
PACT Zollverein e Fabrik Potsdam (Alemanha) | Agradecimentos Barbara Friedrich, Eva Maria
Hoerster, Thiago Granato, Neto Machado, Jorge Alencar, Danilo Viana, Kerem Gelebek, Lena Sommer,
Murilo Moregola, Ana Trincao e gustavo bitencourt.
Este projeto foi financiado pelo Prêmio Rumos Itaú Cultural Dança 2012/2013, Prêmio Funarte Petrobras
de Dança Klauss Vianna 2012 (Brasil), fundo Senatskanzlei – Kulturelle Angelegenheiten, Bezirksamt
Mitte e Fachbereich Kunst und Kultur–Bezirkskulturfonds Berlim (Alemanha).
43
Tiago Gambogi / F.A.B. – The Detonators Belo Horizonte - MG / Reino Unido
trans-amazônia
estreia
territorio minas
Implementado em 1998, é a linha de atuação do FID que age diretamente para
fomentar a dança em Minas Gerais. Suas
ações abrangem: bolsas de pesquisa,
oficinas, imersões, apoio para apresentações, coproduções, intercâmbio entre
grupos e artistas, laboratórios, entre
outros.
Relato
Percorri os 4.223km da Rodovia Transamazônica, além de alguns desvios. Em Altamira, Pará, após
encontros com pescadores, indígenas, moradores e o Movimento Xingu Vivo para Sempre, em solidariedade à sua situação frente aos impactos e consequências negativas advindas da construção da
Usina Hidrelétrica de Belo Monte, realizo uma performance no dia 13 de dezembro de 2012.
Sete horas da manhã. No banheiro da FUNAI, preparo a maquiagem, um ‘clown’ macabro com
traços indígenas. Aquecimento na quadra de futebol. Crianças indígenas assistem atentas. Digo que
já fui à aldeia ‘dos Arara’, eles riem e dizem que a aldeia deles fica a três dias de viagem de barco
para o lado oposto.
Puxando uma canoa no asfalto, sigo em direção à empresa Norte Energia (responsável por
Belo Monte), à beira do Rio Xingu. Pessoas olhando com estranhamento. Um rapaz me ajuda a
puxar a canoa, depois vai embora. Paro no sinal junto aos carros. “É protesto contra Belo Monte?”, o
motorista me pergunta. Não falo nada. Passam caminhões, carros, bicicletas. Está longe. A reunião
começa em meia hora...será que vai dar tempo? Uma caminhonete de um conhecido passa, ele
coloca a canoa na carroceria e seguimos (eu e Margaret Swallow) até a orla.
A um quarteirão do destino, reinicio a ‘puxada da canoa’. Na frente da empresa Norte Energia
aglomeram-se pescadores, moradores atingidos e indígenas. Aproximo-me devagar e estaciono a
canoa. Observo. Interdito a rua, corro e giro ao redor. As pessoas aí se dão conta de que há algo performativo na minha presença. Batem palmas. Alguém grita: “É teatro! Pare Belo Monte!”. Pergunto
a um rapaz se é pescador ou trabalha para a empresa Norte Energia. Digo que sou pescador também
e que quero participar da reunião que acontece lá dentro a portas fechadas.
Interdito a escadaria com fita zebrada. “Tá tudo interditado!” e pergunto “Então, o que vale
mais, 100 mil reais ou um rio inteiro? E aí, vai ficar por isso mesmo?” “Claro, eu quero saúde! Preciso de floresta, de rios, bichos...”. “Ah...o progresso do Brasil! Algo tinha se apossado de mim - um
espírito, determinação - não havia medo, era seguir em frente e realizar a ação.”
O “clown” não perdoa e sente a presença de um possível espião que filma a performance.
“Esse é um espião da Norte Energia”, digo. “Você trabalha pra quem? Pra essa monstruosidade?
Não quer falar não...” Caminho até a canoa, retiro uma pequena árvore que coloco na cabeça e um
balão (preparado com anilina vermelha e água). Bato o coração no meu peito e digo: “Porque já não
Território Minas
tem mais coração...”. Corro em direção a uma caminhonete que passa. Paro outra caminhonete
e preparo a primeira das mortes simbólicas. Explodo o balão acima da cabeça, colorindo de
vermelho toda a roupa branca. A caminhonete espera. Abro caminho para ela e jogo a árvore por
cima. Depois, a segunda morte. Uma moça do público desenha com giz ao redor do meu corpo no
asfalto e escreve: “Vida!”. Percebo várias câmeras ao redor. Deixo-me fotografar e ser filmado.
Dos dois lados as pessoas assistem. A rua se torna um rio simbólico, seco, em asfalto. Do outro
lado, o Rio Xingu.
“Vocês querem Belo Monte ou querem uma bela morte?”, pergunto. “Um celular importado? Três mil reais no fim do mês? E o seu filho? O que vai fazer?” Reconheço a defensora pública:
“O que você vai fazer? Defenda o seu povo!”. Os carros agora passam livremente, interajo com
eles, aceno e sorrio.
Chegou a hora. Até ali, tudo segue conforme a sequência de ações planejadas. A última ação
é: subir as escadas e entrar com a canoa na empresa. Poderia funcionar ou não. Tinha visualizado
a minha entrada, isso eu me lembro.
Retiro as fitas que amarram a canoa, levanto-a e digo: “Eu sou pescador e vou à reunião!”.
Assim, começo a puxar e subir as escadas. Até aí tudo bem, ninguém sabia o que pretendia fazer,
somente eu. As pessoas estavam meio dispersas. As portas de vidro obscurecidas com filme
fumê brilhante estão entreabertas, somente uma fresta e vários seguranças por trás dela. Repito
em tom firme: “Sou pescador e quero ir à reunião!”. Nesse momento, coloco o meu pé direito na
fresta. A população atrás grita: “Deixa! Deixa! Deixa! Deixa ele entrar!”. Os seguranças me empurram. Mantenho meus braços abertos em sinal de não violência. Coloco meu corpo entre as portas
e empurro. Dois seguranças me empurram de volta. Um embate corporal se trava. Senti algo tão
forte, uma coragem absurda. Um segurança põe a mão no meu rosto com punho fechado e me
empurra. Não revido. Empurram mais uma vez. E mais uma. Caio de braços abertos para trás.
“Ajuda ele, gente!”, alguém grita. Pensei nesse momento que não haveria mais jeito, causa perdida. Um detalhe: mantive meu pé lá na porta, não podem fechá-la. “Não precisa fazer isso com
ele não”, uma senhora fala. Fico agachado, digo: “...me solta, não encosta em mim, não estou te
empurrando!”, digo ao segurança. Decido. Fico de joelhos. Sinto que vai dar. Coloco meu corpo
entre as duas portas. O bico da canoa está bem próximo. A população atrás começa a empurrar a
canoa. Empurro um pouco mais a porta. Todos atrás empurram a canoa. O bico começa a entrar.
Mais um pouco. E mais...a canoa abre o caminho! A canoa abre as portas! Os seguranças não
resistem. Todos entram. Vitória! A barragem – as portas – é vencida com o apoio de todos que
estavam ali. E a canoa. Todos entramos em direção à reunião. Veja a performance: http://www.
youtube.com/watch?v=KXR22_4Ljdc
www.transamazonia.wordpress.com
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•Tiago Gambogi
É bailarino, coreógrafo, ator e codiretor da companhia F.A.B. – THE DETONATORS, junto com Margaret Swallow. Pós-graduado em Dança Contemporânea pela LCDS / The Place (Londres, Inglaterra).
Trabalhou no Brasil e no exterior com: Nigel Charnock, Earthfall, Grupo Oficcina Multimédia, EDge
Dance Co., Angela de Castro, Marie-Louise Flexen, Institute for Crazy Dancing, Debbie Fionn Barr,
Jan Benes, César Volpe, Companhia Paulo Ribeiro, Backstage Company. Realizou 25 espetáculos, 9
filmes, 7 direções, apresentou-se em 15 países, durante mais de 20 anos de trabalho.
Trans-Amazônia Duração 60’ aproximadamente 08 nov 21h e 09 nov 18 h | Funarte MG
Debates após o espetáculo: 08 nov Luiz Carlos Garrocho e Dudude Herrmann | 09 nov Adriana Banana e Mônica Ribeiro
Concepção, criação, direção, performance Tiago Gambogi | Performers no vídeo Margaret
Swallow, Francis Baiardi, Adam Souza, Adriana Góes, André Duarte, Ângela Duarte, Baldoino Leite,
Flávio Soares, Getúlio Lima, Marilucy Lima, Meire Jane Melo, Sumaia Farias, Vanessa Viana, Osvaldo
Malaquias, Grupo de Projeção Folclórica Kuarup, Yaguara Cia de Dança, Sérgio Smith, Ana Barros,
Kátia Tapety, Pai de Santo Chico Sena, D. Têca do Côco, Dean, Rodrigo Santos, Beatriz Suellen, Carlos Henrique, Fabrício, Daniel Santos, Servo, entre outros | Artistas colaboradores/provocadores
Margaret Swallow, Dudude Herrmann E Luiz Carlos Garrocho | Música original Kiko Klaus | Música
adicional Dona Têca do Côco, Brian Eno, Leonard Cohen E This will destroy you | Vídeo e Fotografia
Richard Bleasdale, Tiago Gambogi, Margaret Swallow, Gypson Junqueira, Luiz Antônio Carvalho, Jota
Júnior Santos, TV Nazaré Altamira, Carlos Rubem, Ederson Oliveira, Lunaé Parracho, Andrea ROSSI E LILIA TANDAYA | Edição de Vídeo Paulo Vilela - Tanto Expresso | Cenário Rogério Alves | Postes
de pole dance MGB Inox | Consultoria de figurino e cenografia Thálita Motta | Maquiagem
Lorena Rocha | Desenho de luz Leonardo Pavalello | Aulas de pole dance Naiara Beleza | Aulas
de dança de salão Ensaio Escola de Dança | Assessoria de Imprensa Júnia Alvarenga | Revisão
de textos Maria Beatriz Gambogi | Fotos divulgação Guto Muniz | Design Gráfico Paulo Henrique
– NDG Comunicação | Produção Espaço Ampliar | Realização Tiago Gambogi / Companhia de Teatro
Físico F.A.B. – THE DETONATORS (Brasil / Reino Unido) | Apoio Fundação Clóvis Salgado e Centro de Formação Artística – CEFAR, Movimento Xingu Vivo Para Sempre, Fundação Tocaia, Fundação Nogueira Tapety, Associação Dança Cariri, Alysson Amâncio Cia de Dança, Associação dos Artistas Visuais do
Sul e Sudeste do Pará – ARMA - Ponto de Cultura, Rede Carajás de Cooperação Cultural, Aprodam
Manaus, Secretaria de Cultura de Oeiras (Piauí), FUNAI (Lábrea), ICMBIO (Carajás), Grupo de Projeção
Folclórica Kuarup, Fundação Casa da Cultura de Marabá, Yaguara Cia de Dança, Corpo de Dança do
Amazonas, Contém Dança Cia, Associação Indígena Porekrô, Galpão de Artes de Marabá (GAM), Revista Caros Amigos, Comunidade Quilombola dos Potes E Comunidade dos Coqueiros (Piauí), Atlético
Cajazeirense de Desportos, AMIMP – Associação das Mulheres Indígenas do Médio Purus, Institute for Crazy Dancing (GB), FOCIMP – Federação das Organizações das Comunidades Indígenas do Médio
Purus, OPAN – Operação Amazônia Nativa E Estúdio Naiara Beleza Pole Dance Art Fitness | Patrocínio
Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte
Território Minas
Tuca Pinheiro Belo Horizonte - MG
HYENNA - não deforma, não tem cheiro, não solta as tiras
coprodução FID 2013
estreia
“Uma vez feito o movimento, sê todo de pedra naquele instante, e no instante seguinte cria
suas asas como o falcão que tenha sido movido pela fome.” (Domenico di Piacenza) Abordagem político-artística do pensamento estético imposto à dança pela tradição
europeia, seus desdobramentos, consequências e conflitos instalados/instaurados na obra
e no corpo do artista-intérprete. Pensamentos que ainda atuam como dispositivos de poder,
estabelecendo parâmetros que legitimam um modelo de dança de qualidade asséptica, eugenista e adaptada às demandas de um mercado específico que tem o propósito de estabelecer
condutas desejáveis em seu público. Esse projeto seleciona a carta de Pero Vaz de Caminha
como referência ao nosso encontro com esse pensamento, verticalizado através de uma pesquisa in loco nos campos de extermínio de Auschwitz e Birkenau (Polônia).
“Um murro bem dado contém em si sua própria anestesia.” (Primo Levi)
O processo da pesquisa dos materiais coreográficos manteve-se atento e distante das
armadilhas lançadas pelas verdades absolutas e pelos julgamentos maniqueístas, entendendo que os vestígios são a matéria constitutiva de uma possível memória. Quem somos nós?
Ainda precisamos da tutela do olhar europeu? Somos réplicas de um processo neocolonialista
que se perpetua desde a corte francesa? Estes vestígios sustentam a obra? Esta dança ainda
não deformou? Não fedeu? Não soltou as tiras?
A figura da hiena se impôs como um poderoso símbolo para subcondições de vida, uma
existência ambígua que transita entre o riso e o resto, fato que favoreceu a investigação de
procedimentos coreográficos que colocam em discussão questões relativas à higienização e
à hienização.
“...fui no pagode, acabou a comida, acabou a bebida, acabou a canja. Sobrou pra mim o bagaço da laranja...” (Arlindo Cruz e Zeca Pagodinho)
47
• Tuca Pinheiro
Dançarino, coreógrafo e professor de dança. Trabalhou em diversos grupos, tais como: Clube
Ur=H0r (2011-2013), Meia Ponta Cia de Dança (2006-2008), Zikzira Physical Theatre (20022005), Benvinda Companhia de Dança (2001-2000), Primeiro Ato Grupo de Dança (19911999), Ballet Teatro Guaíra (1984-1988), Cia de Dança do Palácio das Artes (1983-1984). Entre
as coreografias que concebeu/dirigiu estão: He, She or It? (...vou ficar até a festa acabar) – solo
Tuca Pinheiro (2006), Coreografia de Cordel - Cia de Dança do Palácio das Artes (2004), Solilóquio - G2 Cia de Dança do Teatro Guaíra (2004) e Entre o Silêncio e a Palavra - Meia Ponta Cia
de Dança (2003).
• Rosa Hercoles
Eutonista formada pela Escola de Eutonia da América Latina (1990-94). Possui mestrado (2000)
e doutorado (2005) junto ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica,
pela PUCSP. Atua como dramaturgista da dança junto a grupos (Musicanoar, Suspensa, Clube
Ur=H0r) e solistas (Vera Sala, Cristian Duarte, Tuca Pinheiro). Pesquisa o corpo e seus processos
de comunicação, desde 1984, quando aluna e assistente de Klauss Vianna. É membro do Centro
de Estudos em Dança – CED/PUCSP, desde 1995; professora do Curso de Comunicação das Artes
do Corpo, desde 2000, sendo sua coordenadora de 2009-13, atualmente assume a chefia do
Departamento de Linguagens do Corpo, ambos na PUCSP.
HYENNA - não deforma, não tem cheiro, não solta as tiras Duração 65’ aproximadamente
07, 08, 09 e 10 Nov 20h | Espaço Cultural Ambiente
Concepção/Intérprete Tuca Pinheiro | Dramaturgista Rosa Hercoles | Consultoria Bibliográfica
Adriana Banana | Projeto de Luz Leonardo Pavanello | Pesquisa de Trilha Tuca Pinheiro | Captação/
Edição/Finalização de Áudio Kiko Klaus | Material Fotográfico Caroline Silas | Agradecimentos
Diva Piáu, Adriana Banana, Carla Lobo, Caroline Silas, Rosa Hercoles, Ana Teixeira, André Masseno,
Cláudia Lobo, Eduardo Laranjeira, Ricardo de Paula, Daniela Reinecke, Raul Correa, Kiko Klaus, Elena
Ciciliotti, Espaço Cultural Ambiente, Mercado Moderno, Keyla Monadjemi, Leonardo Pavanello,
Oscar Capucho, Renata Mara, Ana Vieira e Fernanda Bevilacqua
circulando
grande bh
Em 2013, o programa FID - CIRCULANDO
GRANDE BH, nascido em 2005, dá continuidade às suas ações de difusão, descentralização, democratização e acesso
à cultura da dança na cidade de Belo
Horizonte.
Uma programação com espetáculos e
videodocumentário de dança levada para
diversos bairros da cidade de modo absolutamente acessível, uma vez que todas
as atividades são GRATUITAS. O escopo
geográfico de atuação do CIRCULANDO GRANDE BH são os bairros e comunidades da Grande BH e municípios vizinhos
que compõem a Grande BH.
O FID 2013 – CIRCULANDO GRANDE BH coloca como objetivo a continuidade da circulação do evento pelas fronteiras urbanas
da grande cidade, tentando sempre atingir
com qualidade o maior número possível de
regionais e de um público crítico cada vez
mais profundo e interessado.
Nesses nove anos de existência, o FID Circulando Grande BH já passou pelos bairros São Bernardo, Alto Vera Cruz,
Pedreira, Parque Ecológico da Pampulha,
Barreiro, Barragem Santa Lúcia, Venda
Nova, Salgado Filho, Urucuia, Vila Fátima,
São Geraldo, Jardim Guanabara, Vila Santa Rita e Zilah Spósito. Além dos municípios vizinhos de BH, Nova Lima, Sabará,
Ribeirão das Neves, Brumadinho e Betim.
Em 2009, o FID - Circulando Grande
BH e MINAS ampliou ainda mais seu raio
de ação, indo para a cidade de Viçosa, na
Zona da Mata.
Circulando Grande BH
nomeiodeparacom
2012
Ser jovem no meio de para com, ou O teste das possibilidades
Corpo que se descobre.
Corpo que convulsiona em conjunto.
Conjunto que se compõe de fragmentos. De fragmentos de eus. Fragmentos dispersos
de vivências, impulsos e desejos, em um tempo muitas vezes dilatado, mas, sobretudo, disperso, entrecortado, friccionado entre dimensões não corporais.
Corpo fracionado em diferentes tempos e espaços, através da incisiva presença de dispositivos móveis eletrônicos.
Corpo que pulsa, que se mostra, que se joga, que vai e que volta atrás, que deseja com
intensidade, ao mesmo tempo em que solta com facilidade.
Corpo que se forma entrecortado por expectativas, disperso na imensidão dos próprios
desejos. Solto no presente.
Corpo revestido por bombardeios de exigências sobre silhuetas, modos de ser e estilos
de vestir. Que utiliza como vestimenta colagem de referências alheias. Dispostas sobre o corpo em finas camadas fragmentadas, tais referências, ao mesmo tempo que imperativas, são
frágeis, pois não resistem ao choque e à fricção com um outro corpo. Com o outro do corpo.
Na elaboração do movimento próprio, descoberto em diálogo, tensão e dispersão, o jovem se apresenta e se faz presente. Manifesta seu universo.
A presença de um corpo jovem em que tudo está presente.
Ser jovem. O que significa? Que forças o atravessam? O que deseja? E de que modo
manifesta seu mundo e aquilo que pauta seus anseios?
Em NoMeioDeParaCom, o universo da juventude é o protagonista. Nascido de oficinas
de danças, realizadas em quatro centros culturais de Belo Horizonte1, o espetáculo põe em
relevo temas e dinâmicas característicos desse tempo de transição entre a infância e a vida
adulta – desse espaço de transição que é o corpo. Jogos improvisacionais entre os bailarinos,
1 Centro Cultural Jardim Guanabara (regional Norte), Centro Cultural Vila Maçola (Centro-Sul), Centro
Cultural Padre Eustáquio (Noroeste) e Centro Cultural São Geraldo (Leste), entre maio e novembro de 2012,
com jovens entre 14 e 25 anos.
assim como com a iluminação e a trilha sonora, dão a dimensão do aberto e do possível, ao
mesmo tempo em que permitem trazer à luz aspectos que compõem experiências particulares
dos jovens. O compromisso de experimentar e tais particularidades se fazem presentes também
na escolha dos objetos e do figurino, no movimento corporal, na apropriação do espaço pelos
bailarinos e na disposição do público durante as apresentações.
NoMeioDeParaCom Palavras dispersas que titulam um espetáculo que nasce do encontro,
do diálogo e da disposição de jovens para investigar a própria história, percepção, posição, vivência, o próprio corpo e próprio universo.
• Mariana Lage
Jornalista. Doutoranda em Estética e Filosofia da Arte, na Fafich-UFMG, lançou seu primeiro romance, No Dorso do Leão, neste ano. Escreve crônicas, contos e haikais, alguns dos quais foram
publicados no jornal O Tempo e no Suplemento Literário de Minas Gerais.
foto | fernanda abdo
NOMEIODEPARACOM BELO HORIZONTE - MG
51
NOMEIODEPARACOM DURAÇÃO 40’ 14 nov 19h | centro cultural são bernardo | 20 nov 19h | centro
cultural santa rita | 24 nov 15h | centro cultural venda nova
BAILARINOS Daniele Mesquita, Gabriel Felippe, Joana Wanner e Johnny Cezar | CRIADORES Gabriel
Felippe, Johnny Cezar, Joana Wanner e Joelma Barros | CONCEPÇÃO Violeta Penna | ORIENTADOR Tuca
Pinheiro | PREPARAÇÃO CORPORAL Tuca Pinheiro e Wallison Culu | PRODUÇÃO Junio Nery | ILUMINAÇÃO
Ricardo Cavalcanti | TRILHA SONORA Cristian Tunes | TÉCNICO Ricardo Cavalcanti | CONCEPÇÃO DE
FIGURINO coletivo | CONCEPÇÃO DE CENÁRIO (OBJETOS CÊNICOS) coletivo | OPERAÇÃO DE SOM E LUZ
Ricardo Cavalcanti e Cristian Tunes | DESIGNER GRÁFICO Raul Correa
Circulando Grande BH
MARISE DINIS BELO HORIZONTE - MG
DOS MEUS OLHOS SAEM ROSAS
2011
Provocando a desierarquização dos sentidos
Sentir a escuridão, a luminosidade, escutar os passos que se aquietam, aceleram, desaceleram, desenham distâncias. Os sons do corpo, os ritmos criados pelos passos, a respiração, a
proximidade e a intimidade que começa a ser compartilhada com o público. Uma composição
de estados corporais que amplifica a percepção aguçando os sentidos, a sensorialidade e a
imaginação.
A pesquisa para esta obra teve início em 2005 através da extinta e preciosa Bolsas Vitae
de Artes, onde propunha relacionar-se com realidades referentes a visão, ou Sobre o não ver,
título da sua pesquisa contemplada. O disparo para a pesquisa levou em conta a hegemonia da visão sobre as demais categorias sensórias. Sua ideia era partir do não ver e da não
predominância da visão. Nas suas experimentações, a dançarina se propôs a ficar durante
72 horas com os olhos vendados, testando sua percepção e suas adaptações, ao reduzir tão
drasticamente a primazia da visão.
Em 2001, o fotógrafo e cineasta Cao Guimarães, que publicou o livro Histórias do não ver,
tirou fotos com os olhos vendados e relatou suas histórias e sensações ao ser “sequestrado”
por amigos, que vendavam os seus olhos e o levavam a algum lugar inusitado. O local do
encontro poderia ou não ser combinado, mas a condição era que sua câmera pudesse ser
usada para fotografar aquilo que ele não estivesse vendo. Sentir o mundo com os outros
sentidos, retirar a tirania da visão e propiciar que a câmera não fosse mais a extensão, mas
sim, a própria visão foi uma das metas dessa experiência, segundo o artista.
Marise, ao dialogar inicialmente com a proposta de Histórias do não ver, também se
aproximou do universo dos deficientes visuais convidando-os para participarem de oficinas
de dança, e testando seus procedimentos artísticos junto a eles.
Seu trabalho é para todos os públicos, mas busca, em especial, uma atenção à sensorialidade e à noção das imagens mentais que podemos construir através de todos os sentidos.
Com essa premissa, um cego participa na construção de um trabalho de dança com a sua
possibilidade de gerar imagens ativadas pelas sensações.
53
Ao longo da pesquisa, Marise compreendeu que a ausência da visão instaura outras conexões, e graças à comprovada flexibilidade e plasticidade do nosso cérebro somos aptos a
estabelecer novos circuitos e lidar com novos referenciais. Lidar com as gradações de luz, o
mínimo e a máxima claridade, torna, por exemplo, a audição mais alerta, proporcionando ouvir,
tatear o entorno e não somente o ver. O mero exercício de nos movermos com os olhos abertos
ou fechados demonstra singularidades, altera-se, por exemplo, a propriocepção, responsável
pela percepção do nosso corpo e das suas relações com espaço, o equilíbrio, e a interação
que estabelecemos com os outros. Quem vê, ao abrir e fechar os olhos enquanto dança, acaba por modificar seu comportamento sensório-motor, lidando assim com outras possibilidades
sensório-motoras, que implicam em outras relações entre corpo e ambiente. Isso é importante
enquanto potência capaz de promover outras corporalidades para quem dança e para o público
que partilha dessa experiência.
• Thembi Rosa Dançarina e coreógrafa. Mestre em dança pelo PPG-Dança da UFBA (2010). Desde 2000, desenvolve projetos de dança em parceria com O Grivo e com artistas convidados. Em 2011, iniciou
com Manuel Guerra, a criação de interfaces digitais para interação entre dança, software sons
e imagens. Integra o Dança Multiplex com Margô Asiss e Renata Ferreira e o Interferências,
comunidade artística formada por mais de 20 artistas de diversos continentes.
Dos meus olhos saem rosas Duração 40’ 19 Nov 19h | Centro Cultural São Geraldo
21 Nov 19h | Centro Cultural Jardim Guanabara
Concepção, criação e interpretação Marise Dinis | Direção Gabriela Christófaro | Trilha sonora
original Kiko Klaus | Iluminação Leonardo Pavanello | Figurino Gilda Quintão | Cenografia
digital (ao vivo) Gabi e Tatu Guerra | Texto Grace Passô | Mulher que fala Gláucia Vandeveld |
Projeto gráfico Rodrigo Borges | Fotos Guto Muniz | Registro em vídeo Imago Filmes | Produção
e agenciamento Leonardo Pavanello
Circulando Grande BH
55
terceira dança belo horizonte - mg
processo
coprodução FID
O grupo Terceira Dança coloca o espectador diante daquilo que culturalmente buscamos evitar olhar: o envelhecimento do corpo. Pessoas que resolveram enveredar pelos caminhos da
pesquisa do movimento a que se propõe a dança contemporânea respiram fundo, levantam
e adentram o espaço cênico. Com toda a coragem que esse ato exige, elas dançam, cantam,
contam histórias, e até suas intimidades são, aos poucos, reveladas.
Assim como há infinitos números possíveis entre o zero e o um, cada corpo, impregnado
de história, apresenta um infinito de possibilidades de movimento dentro do seu universo
particular. O trabalho com o corpo, desenvolvendo a criatividade, expande as possibilidades,
não só de movimento, mas de existir no mundo.
A pesquisa revela particularidades de cada um dos quatorze integrantes: prazer em estar
no palco, descoberta de movimentos, interações, angústias, lembranças, timidez, sensualidade... É instigante se deparar com a versão da vovozinha nas histórias de criança, com o tabu
do sexo na terceira idade ou com o simples caminhar de muitas pessoas ocupando o espaço.
Vale aqui ressaltar o processo, que acontece fora do palco, da luta de continuar existindo, a busca por auto-organização e autonomia do grupo. Essa postura é de total coerência
com o que se vê no palco: a desestabilização de conceitos predeterminados de um corpo
preparado para a dança, o aprofundamento de questões relacionadas ao indivíduo e suas
relações com o grupo.
O trabalho tem seus momentos divertidos e seus momentos emocionantes. Mas o que fica é a
lição de que sempre é tempo; enquanto há movimento, há possibilidade de dançar; enquanto há vida,
há possibilidade de novas descobertas, de trilhar novos caminhos. O Terceira Dança coloca o espectador diante da finitude da vida e da coragem de a qualquer tempo se reinventar, redescobrir,
ampliar as perspectivas, ocupar novos espaços e fazer novas relações.1
• juliana polo
Pesquisadora em Dança. Coordenadora da Faculdade Angel Vianna (RJ).
1 Texto originalmente publicado no catálogo do FID 2011.
foto | thiago theo
2010
processo duração 60’ 13 Nov 15h | centro cultural Ramacrisna (Betim)
Terceira Dança Conceição Maria da Silva, Geralda Magela de Oliveira, José Vaz Souza, Luci Maria de Almeida e Lima, Madalena Cristina de Souza, Maria de Lourdes, Noé Cotta Barcelos, Rosália Cristina do Nascimento, Sandra Miriam Fraga, Thereza Dias da Silva e Zilma Lúcia de Almeida e Lima |
Coordenação Marcelle Louzada | Preparação corporal Fábio Dornas, Karina Collaço e Marcelle Louzada | Trilha sonora Philippe Lobo e Wilson Souza | Cenografia Ana Gastelois | Coprodução
FID 2010
Circulando Grande BH
57
cris oliveira belo horizonte - mg
espaço para dança
2009
Oh baby, baby
How was I supposed to know
That something wasn’t right here
Oh baby, baby
Britney Spears
Espaço para dança dá título ao espetáculo da coreógrafa Cristiane Oliveira, que nos questiona
qual é afinal o espaço para a dança? Tendo em vista que a dança acontece em muitos espaços, tanto em pequenas frestas da realidade, quanto nas festas, diante do espelho do quarto,
na webcam, nas rodas de hip-hop, nos megashows, casas noturnas, festas de quinze anos,
casas de funk, etc. A dança está aí, todo mundo dança, dançou ou vai dançar (caso a sua
“religião” assim permitir, mas isso é uma outra história).
Por que um artista da dança se ocupa em criar um espaço para dança em lugares públicos, onde a dança, a princípio, já estaria? O artista quer dialogar com o público ou com a
história da dança? O artista quer se afastar da caixa-preta, esse lugar instituído como o lugar
das artes cênicas, ou quer simplesmente pensar um novo jeito de inebriar seu espectador?
Houve um tempo em que artistas eram minoria e espectadores maioria na sociedade.
De acordo com o filósofo de arte Boris Groys (2010), nesse período, mais precisamente na
passagem do século XVIII para o XIX, “a questão de por que alguém deveria fazer arte parecia
irrelevante”1. A questão que os incomodava era “por que as pessoas deveriam olhar para a
arte?”2 Então, artistas se ocupavam em convencer espectadores a contemplar suas obras,
com argumentos como “a arte é formadora do gosto e proporciona o desenvolvimento da
sensibilidade estética”3. Até então, os homens de bom gosto da arte revelavam ao seu público
a importância de ir a museus, galerias, casas de espetáculo, fundamentais para o desenvolvimento humano e aprimoramento dos sentidos. Assim, ocupavam-se em fazer das suas
obras produtos mercadológicos vendáveis capazes de conquistar a atenção de espectadores
enquanto consumidores.
Hoje, sucede-se um pouco o inverso, artistas são muitos, diriam alguns que todos são
1 GROYS, Boris. Poetics x Aesthetics in Going Public. E-flux Journal. Sternberg Press, 2010. p.14
2 ibidem.
3 ibidem.
artistas em algum nível. Todos são fotógrafos com suas câmeras de celular, todos são dançarinos mesmo que diante do espelho em casa, todos cantam mesmo que somente no chuveiro,
esculpem imagens publicamente no facebook, etc. A dança é, atualmente, em alguma medida,
para todo mundo, em muitos sentidos.
Por outro lado, existe um certo tipo de dança que tem uma relativa baixa na quantidade de
público interessado em suas obras contemporâneas. Portanto, logicamente, é uma consequência, quase natural, que artistas de hoje façam como os de outrora, e se ocupem em realizar obras
preocupadas com o acesso ao público, afinal precisam de espectadores interessados em consumi-las, ou seja, a pagar para ver. No entanto, até onde se sabe, dinheiro de espectador não é
mais a principal fonte de renda do artista. Seu orçamento vem de Instituições e Editais. E Instituições estão fartas de espectadores, desinteressados em arte, mas interessados em consumir as
muitas atividades ali fornecidas. Logo, colocam-se obras de artistas em saguões, restaurantes,
escadarias, corredores e diversos locais alternativos ou “site-specifics”. O intuito da Instituição
é ocupar seus frequentadores com programações culturais diversificadas, preencher vãos livres
com arte e ocupar vazios de suas dependências. Seus usuários relaxam enquanto realizam suas
atividades e se alimentam enquanto contemplam a paisagem de artistas que passam solicitando
atenção. Nesse contexto, ainda nos restam dúvidas: Até que ponto é obrigação da arte pensar
a fruição do espectador? Até que ponto o artista que está preocupado com o público não acaba
se tornando um gerenciador de expectativas e frustrações alheias e estéticas? Qual a diferença
entre alteridade e preocupação excessiva com público? Existe “espaço para dança” distante de
uma lógica mercadológica? Sim, há de existir e é essa dança que tem que ser para todo mundo.4
• Bruno Freire Perfomer que trabalha, mora e sobrevive em São Paulo desde que nasceu (1983). Interessado
em pesquisa teórica e coreográfica. Atualmente é residente do Lote (2011-2013). Mestrando em
Comunicação e Semiótica (2010-2012) e graduado em Artes do Corpo (2005-2009), ambos na
PUCSP.
4 Texto originalmente publicado no catálogo do FID 2012.
Espaço para dança Duração 40’ 18 Nov 10h | centro cultural Ramacrisna (Betim) 22 Nov 20h | Centro Cultural Salgado Filho
concepção e performer Cris Oliveira
Circulando Grande BH
cris oliveira e paulo chamone belo horizonte - mg
uma cachaça que se chama dança (videodocumentário)
Bolsa de pesquisa / coprodução FID
2008
A cachaça que os gregos registram como ‘ácqua ardens’, ou água que pega fogo, nas mãos
dos alquimistas se transforma em água da vida, são atribuídas a ela propriedades místico-medicinais. A ‘Eau de Vie’ é receitada como elixir da longevidade. Pela fermentação da substância os egípcios antigos curavam várias moléstias, inalando seu vapor. É algo ancestral.
A dança na sociedade e na cidade é uma manifestação cultural. Um rito ligado ao bem
-estar mental, físico e até espiritual. É uma forma de ‘expurgo’ da vida cotidiana, para se estar
só ou compartilhar com pessoas queridas.
O corpo, no momento em que dança, experimenta diferentes estados, são corpos livres,
soltos, relaxados e com sentimentos de prazer e satisfação. É um ato que envolve pulsão,
transe, amizade, bem-estar, paixão, sedução, liberdade e adoração.
A dança aproxima as pessoas. A dança traz um potencial transformador na nossa relação
entre o corpo, o outro e o mundo. E, assim como a cachaça, a dança é apreciada por todos.1
Cris Oliveira
Performance: O último a parar
“O Último a Parar” surge da reflexão: O que é a dança pra você? Confesso que fiquei incomodado e constrangido pela dificuldade em organizar palavras e concluir uma resposta
satisfatória para mim. A dança contextualiza os corpos nos tempos e nos espaços, abre possibilidades para dilatar conceitos de artista como cidadão, estando ele na pista, nos bailes, nos
palcos, nas academias, na rua, nas quadras, nas universidades...; dançando, disponibilizando
conhecimento, compartilhando, sociabilizando! Sendo feliz!1
Tuca Pinheiro
1 Texto originalmente publicado no catálogo do FID 2008.
59
• Cris Oliveira
É dançarina e coreógrafa. Graduada em Artes Cênicas, pós-graduada em Gestão Cultural e possui
formação na área de pesquisa e composição coreográfica pelo programa ‘Transforme – Perceptions’ (2009-2010) em estudos realizados na Fondation Royaumont - Paris. Foi integrante da Cia.
de Dança Palácio das Artes (2001-2009). É representante do projeto Interferências no Brasil para
a edição do encontro no país para 2013 e colaboradora do Interferencia’s Book, apresentado no
Impulstanz Viena (Áustria), Devir CAPA (Portugal) e Centro de las Artes de San Luís Potosí (México). Desde 2006 desenvolve trabalhos independentes e em parceria com outros profissionais.
• Tuca Pinheiro
Dançarino, coreógrafo e professor de dança. Realiza trabalhos solos em parceria com outros artistas e grupos como: Clube Ur=H0r (2011-2013), Meia Ponta Cia. de Dança (2006-2008), Zikzira
Physical Theatre (2002-2005), Benvinda Companhia de Dança (2001-2000), Primeiro Ato Grupo
de Dança (1991-1999), Ballet Teatro Guaíra (1984-1988), Cia. de Dança do Palácio das Artes
(1983-1984), André Masseno e Cris Oliveira.
Uma cachaça que se chama dança Duração 40’
19 Nov
21 Nov
21 Nov
22 Nov
24 Nov
27 Nov
19h | Centro Cultural vila santa rita
19h | Centro Cultural são bernardo
20h | Centro Cultural jardim guanabara
19h | Centro Cultural Salgado filho
14h | Centro Cultural venda nova
19h30 | Centro Cultural são geraldo
Equipe Angioma
Produção e Direção Cris Oliveira | Casting, Produção de Imagem e Som Paulo Chamone |
Fotografia, Câmera, Edição e Projeto gráfico Marco Aurélio Ribeiro | Bailarino Convidado e
Performer “O Último a Parar” Tuca Pinheiro | Assistente Técnico Euber Silva | Fotógrafo Still
Gustavo Rezende e Paulo Chamone
conexão internacional
Por lidar com uma arte basicamente existente em apresentações ao vivo, o FID percebeu o potencial educacional de seu acervo em um país marcado pela injusta
distribuição de informação como o nosso. Para colaborar com o processo de educação em dança, a partir de
2007, o FID passou a disponibilizar um dos mais ricos
acervos do país, que permanece carente da preciosa informação sobre os espetáculos apresentados em todas
as edições do FID. Esse material se destina à pesquisa e
estimula a produção de conhecimento e estará disponibilizado gratuitamente.
fidoteca
SESC Palladium – Acervo artístico e literário
De 1º a 16 de novembro
Terças e quartas das 10 às 20H | Quintas e sextas das 10 às 21H
Sábados das 10 às 18H | Feriados das 12 às 18H
63
FID 2013 NÚMEROS POR PROGRAMA
PROGRAMA CIRCULANDO GRANDE BH (novembro)
Cidades contempladas Belo Horizonte e Betim
NÚMEROS GERAIS
DA EDIÇÃO
05 grupos participantes
08 apresentações
06 exibições de videodocumentário
07 espaços / teatros ocupados
estimativa de 50 empregos diretos gerados
estimativa de público total: 800 pessoas
todas as atividades gratuitas
cidades contempladas belo horizonte e betim
01 mês de atividades: novembro
17 grupos participantes
01 projeto bolsista / coprodução
41 apresentações
06 exibições de videodocumentário
FIdoteca acervo de 17 anos para pesquisa
12 espaços / teatros ocupados
estimativa de 250 empregos diretos gerados
estimativa de público total: 5.000 pessoas
ingressos das apresentações: R$ 4,00 (inteira),
R$ 2,00 (meia)* e entrada franca
todas as demais atividades com entrada franca
* O valor reduzido do ingresso faz parte da política de relacionamento
do FID com o seu público: deixa claro, na forma de um ingresso
acessível, que seu custo real já foi pago com recurso público por meio de
patrocínios, via leis de incentivo à cultura.
PROGRAMAS FIDinho, TERRITÓRIO MINAS, CONEXÃO iNTERnACIONAL
(NOVEMBRO)
Cidade contemplada Belo Horizonte
Estados Minas Gerais, Paraná, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo
Países Brasil, Cabo Verde, Canadá, Israel, Moçambique e Portugal
12 grupos participantes
33 apresentações FIdoteca acervo de 17 anos para pesquisa
01 coprodução Território Minas
05 espaços / teatros ocupados
Estimativa de 200 empregos diretos gerados
Estimativa de público total: 4.200 pessoas
Ingressos das apresentações: R$ 4,00 (inteira), R$ 2,00 (meia) e todas as demais atividades com entrada franca
Ficha tecnica
65
Marlene Monteiro freitas / Bomba Suicida
paraíso – colecção privada
fid 2013
Realização Atômica Artes e Tapioca Cultura
Correalização Clube Ur=H0r
Direção artística e curadoria Adriana Banana
Direção Executiva e de produção Carla Lobo
Coordenação técnica Leonardo Pavanello
Assistente de produção Clarisse Marinho
Assistentes técnicos Alexandre Figueiredo, Cristiano Geraldo de Medeiros,
João Bosco da Mata Jr e Sérgio Lúcio da Silva
Receptivos Julianete Azevedo, Laura Pantaleão e Lúcia Cambraia
foto | Hervé Véronèse
Produção Karla Danitza
Correspondente FID na França Gustavo Schettino
Gerenciamento financeiro Direta Gestão de Projetos
Assessoria jurídica Gomes Castanheira Advocacia
Assessoria de Imprensa Pessoa Comunicação e Relacionamento
Assessoria Contábil Empresarial Assessoria Contábil
Coordenação Comunicação Carla Lobo e Adriana Banana
Organização e edição de textos Encarte e site Adriana Banana
Design gráfico e publicidade Popcorn
Site Nauweb
Vt institucional e registro em vídeo Tanto Expresso
Áudio vt e spot Neutra Produtora de Som
Locução Talita Roriz
Transporte Banana Veloz Disk Van
Serviço de expedição Henrique Jorge de Castro
Catering Mon Petit
foto | margarida ribeiro
Fotógrafo Adriana Moura
Luís Guerra / Bomba Suicida
marlene monteiro / bomba suicida
guintche
foto | joão figueira
a primeira dança de Urizen
foto | sara moutinho
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André Masseno
Panaibra Gabriel Canda
o confete da índia
tempo e espaço – os solos da marrabenta
foto | richard malcom
foto | nilmar lage
69
71
Iris Erez
obrigado por vir
Cris Oliveira (BH)
espaço para dança
foto | itay
marom
divulgação
key zetta e cia.
foto | cris lyra
temporary
73
Núcleo do Dirceu / Marcelo Evelin
homesick
Cris Oliveira (BH)
espaço para dança
fotos
mario miranda
foto | |divulgação
Iris Erez
foto | itay marom
1.000 casas
foto | christine rose divito
75
Benoit Lachambre / Par B.L.eux
snakeskins
Silvia Real
snakeskins
Cris Oliveira (BH)
espaço para dança
foto
haanpaa
foto || laura
divulgação
Benoit Lachambre / Par B.L.eux
foto | christine rose divito
tritone
buraco
Tiago
Cris Oliveira
Gambogi (BH)
/ F.A.B. – The Detonators
trans-amazônia
espaço para dança
foto | divulgação
Elisabete finger
foto | elisabete finger
fotos | lunaé parracho
77
hyenna - não deforma, não tem cheiro, não solta as tiras
nomeiodeparacom
Cris Oliveira (BH)
nomeiodeparacom
espaço para dança
foto
foto || fernanda
divulgaçãoabdo
Tuca Pinheiro
foto | silas & banana
79
foto | thiago theo
dos meus olhos saem rosas
marise dinis
foto | guto muniz
Cris Oliveira (BH)
espaço para dança
processo
foto | divulgação
terceira dança
81
espaço para dança
cris
paulo chamone
Crisoliveira
Oliveirae(BH)
uma
cachaça
que se chama dança (videodocumentário)
espaço
para dança
foto | divulgação
cris oliveira
foto | paulo lacerda
fotos | marco aurélio ribeiro
83
85
PARCEIROS
CIRCUITO DE FESTIVAIS
INCENTIVO
COREALIZAÇÃO
REALIZAÇÃO
www.fid.com.br
ISSN 2 2 3 7 - 5 4 4 9
v.1, n. 1 (2013)
belo horizonte | minas gerais | brasil
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