Direito e Política
As licitações públicas
e o desafio do
combate à corrupção
Parte 1
RONNY CHARLES
Advogado da União. Professor/
palestrante. Mestre em Direito
Econômico. Pós-graduado em
Direito Tributário. Pós-graduado
em Ciências Jurídicas. Autor de
diversos livros jurídicos, entre
eles: Leis de Licitações Públicas
Comentadas (6ª Edição. Ed.
JusPodivm); Direito Administrativo
(3ª Edição. Ed. Jus Podivm) e
Terceiro Setor: entre a liberdade e
o controle (Ed. Jus Podivm).
O recente escândalo que envolveu uma das maiores estatais brasileiras vem reativando a discussão sobre a corrupção em nosso
país, sobretudo no âmbito das licitações públicas. O problema
ali identificado vem sendo somado a semanais denúncias de
fraudes em licitações, nas diversas esferas federativas, notadamente em governos municipais, avançando sobre contratações
públicas em todas as áreas, entre elas a saúde e a educação.
A corrupção é uma lástima, uma praga que está relacionada ao
poder, ao dinheiro e à falibilidade moral humana. Infelizmente,
não há um remédio simples, uma medida saneadora que, isoladamente, possa extirpar esse mal, potencializado, em nossa
sociedade, por uma cultura de impunidade, de favorecimento
individual e de falta de transparência.
Não tenho dúvida, contudo, que, em relação aos escândalos
recentemente identificados, o combate à corrupção exige uma
reforma política que diminua o desvirtuamento da intervenção
econômica no resultado das eleições. Essa intervenção influencia a tal crise de representatividade que vivenciamos atualmente
e os esquemas de corrupção engendrados nos períodos pré-eleitorais e pós-eleitorais, justamente por ampliar a necessidade de
custeio financeiro para as campanhas minimamente competitivas, o que gera necessidade de financiamento, normalmente
encontrado em setores econômicos que objetivam “investir” no
candidato, para alcançar favorecimentos egoísticos que descambarão em loteamento de cargos públicos estratégicos e contratações públicas viciadas, intentados para gerar receitas muito
maiores que os milhões oferecidos em financiamento.
Esse ciclo perverso de financiamento alimenta um “Sistema”,
responsável pela ocupação de espaços políticos, independente
da esfera da federação e do partido, que é excludente ao homem
honesto. Não quero dizer, aqui, que não temos políticos honestos ou partidos sérios, mas tenho convicção de que, quanto mais
NegócioS PúblicoS . Fevereiro 2015
Direito e Política
“caro” se torna o processo eleitoral, mais exclu- Essa primeira parte, aparentemente estranha ao
dente ele é, sobretudo para aqueles candidatos e tema desse singelo artigo, tem relação estreita
partidos que, mesmo com alto reconhecimento com ele. É importante perceber o ambiente em
e legitimidade eleitoral, não se submetem aos que é produzida a corrupção, para avaliar os insacordos que condicionam o alto financiamen- trumentos necessários a combatê-la.Entendendo
to de uma campanha política exorbitantemente que a corrupção não é um fenômeno meramencara! Se não estancarmos esse processo perverso
te individual, imputável a indivíduos, a empresas
de exclusão e de deterioração política, pouco a
ou a partidos, perceberemos que os instrumentos
pouco, veremos minguar o número de agentes
de combate, inclusive nas licitações, precisam ser
políticos que conseguirão alcançar seus mandamultifocais, para
tos ou cargos (eleialcançar a eficiêntos ou nomeados)
cia necessária ao
sem essa submissão
atendimento do
perversa a grupos de
A corrupção é uma lástima,
interesse público.
interesse que busuma praga que está relacionada
cam se locupletar do
E é dessa forma
ao poder, ao dinheiro e à
Estado. Em contraque, nas próximas
partida, continuafalibilidade moral humana.
linhas, buscareremos assistindo a
Infelizmente, não há um
mos, na limitaum triste filme em
ção natural a esse
remédio simples, uma medida
que órgãos e entes
espaço, pontuar
públicos são usados
saneadora que, isoladamente,
algumas questões
para firmar contrapossa
extirpar
esse
mal,
que precisam ser
tos com sobrepreço
potencializado,
em
nossa
aventadas,
em
ou superfaturamento, gerando receitas
uma eventual resociedade, por uma cultura de
que serão desviadas
visão do ambienimpunidade,
de
favorecimento
para beneficiamente normativo de
individual e de falta de
to de alguns maus
nossas licitações
agentes
políticos,
transparência.
e
contratações
seus financiadores
públicas. O come também daqueles
bate à corrupagentes públicos coção em nosso país, além da necessária atitude
optados, que passam a instrumentalizar as ações
repressiva àqueles que praticarem atos lesivos
de corrupção, engajando-se ao “Sistema”.
ao erário, deve evoluir para o implemento e a
A reforma política urge, então, como um instruacentuação de atitudes institucionais sistêmicas
mento necessário à diminuição dessa progrese preventivas, sobretudo aquelas que não criem
siva “deslegitimização” do resultado eleitoral e
empecilhos demasiados à atuação legítima da
cooptação de agentes políticos e de agentes púNP
blicos, por grupos econômicos interessados nas Administração Pública.
“
fraudes que queremos combater.
(continua)
NegócioS PúblicoS . Fevereiro 2015
Download

As licitações públicas e o desafio do combate à corrupção