Teixeira Pinto devia fazer tudo para que não houvesse AG
Cristina Ferreira e Paulo Ferreira
Quando e porquê? Uma boa parte da entrevista a Jardim Gonçalves, realizada na sextafeira, foi passada à volta destas duas questões sobre as divergências internas no Banco
Comercial Português (BCP). O fundador e líder do banco nos primeiros 20 anos de
actividade, até 2005, preferiu dar a entender as causas e algumas críticas à falta de
liderança de Paulo Teixeira Pinto, o sucessor por si apontado, que não terá cuidado
devidamente das regras de colegialidade em algumas decisões no Conselho de
Administração.
Aos 72 anos, Jardim Gonçalves vai enfrentar na Assembleia Geral marcada para o
próximo dia 6 de Agosto o maior desafio ao seu poder no banco. Diz que não conhece
os accionistas mais recentes do BCP – “não sei se se agruparam ou se houve um
ajuntamento” – e, se estivesse no lugar de Paulo Teixeira Pinto “faria tudo para que esta
AG não se realizasse”. E alerta: “Esta AG pode não ter efeitos perversos perpétuos, mas
pode ter alguns. E acho muito bem que o sistema actue, porque este é um tema do
sistema”.
As divergências: quando e porquê
Quando é que sentiu que havia divergências no BCP?
O que efectivamente foi perturbador foi que desde há dois ou três meses toda e qualquer
divergência ou contributo para uma discussão dentro do Conselho de Administração
(CA) passou a ser noticiada com antecedência. Em todas as equipas que gerem é
perfeitamente natural haver maiores ou menores divergências na construção de uma
solução. A grande novidade foi que tudo o que estava a acontecer dentro do CA – e falo
só neste órgão, não falo do Conselho Geral de Supervisão ou da alta direcção – foi
dramaticamente ampliado para o exterior.
Isso traduz alguma coisa. Quando passa para o exterior é porque as divergências
não são suaves.
É normal existirem divergências. E o normal é também que o que passa para o exterior
seja o bom entendimento. E o bom entendimento constrói-se com uma liderança que
evita que antes da existência desse patamar de entendimento saia qualquer versão para o
exterior.
O que está a dizer é que a falta de coesão neste CA deriva de uma falta de
liderança.
A coesão é algo que não existe definitivamente. Não é algo que se compre nem que se
imponha. A coesão vai-se construindo todos os dias. Para liderar, as equipas têm que
estar sempre debaixo de um fluxo de comunicação, ausência de mistérios, com a
percepção clara de que nada é escondido, que só não se pode saber aquilo que ainda não
foi definido. Isso é que gera a solidariedade e a coesão. Quem lidera tem que criar um
clima simples que faz as pessoas acreditarem-se entre si, para os subordinados e para a
hierarquia. Quando isso não acontece as pessoas sentem-se desobrigadas do vínculo de
esperarem por esse momento do entendimento e nessa altura começam a falar para fora
do banco. Esse clima está de facto perturbado.
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Mas houve algum facto determinante para a criação desse clima? Foi a OPA sobre
o BPI?
Não acho nada. Aí não notei nada.
Na definição dos remédios a apresentar à Autoridade da Concorrência para que a
operação fosse aprovada havia notícias de divergências no banco.
Não. Isso é só trabalho. Os remédios têm uma consequência: estamos a aumentar ou não
o preço da oferta e à custa de quê? O Conselho Geral e de Supervisão (CGS) tem a
obrigação de saber quais são os compromissos que a instituição vai assumir. E a cada
proposta de remédios o CA tinha que submetê-la à apreciação do Conselho Superior,
que depois da alteração estatutária passou a ser o CGS.
O CGS alguma vez pensou que se tinha ido longe demais nas condições oferecidas
pelo BCP e no reflexo disso no preço oferecido pelo BPI?
Não, porque no final de tudo o CGS ainda aprovou um aumento do preço. Só houve o
entendimento de que era necessário aprofundar todas as consequências e esse
aprofundamento era feito pelo CA e pelos serviços técnicos. Depois, dentro de
determinados intervalos, o CGS fixou o preço.
Então se não houve divergências em relação à OPA...
Não. Houve trabalho.
... como é que se chega a este ponto? Como é que as notícias de divergências
aparecem diariamente sem que alguém explique o que é que se passou?
Há muita gente que se relaciona directamente com o BCP: trabalhadores, clientes,
accionistas. Nesse universo, o que existe de mais visível, são os órgãos de governo do
banco. E nesses, há três que são diferentes entre si.
Há um CA executivo, que deve executar aquilo que está definido e aprovado e que dá
certo conforto aos accionistas e ao mercado na perspectiva de determinados
rendimentos que vai ter.
Há o CGS que é também um órgão social com responsabilidades perante a supervisão e
as autoridades. É um órgão com responsabilidades de sociedade.
E depois existe um Conselho Superior, que já não é um órgão social, que é um espaço
mais amplo de accionistas e de personalidades que opina e dá parecer sobre
determinados passos que os CA e CGS lhe colocam. Mas uma vez dado esse parecer, já
não tem responsabilidade de seguir e acompanhar se esse parecer foi adoptado.
O CGS é diferente, porque é um órgão de supervisão e não é apenas das contas, mas
também da gestão, da estratégia, da nomeação das pessoas... Por isso é que é que tem
três comissões, e pode vir a ter mais: uma de matérias financeiras, que substitui o antigo
Conselho Fiscal, outra de sustentabilidade e governo societário, que acompanha a forma
como a casa é governada, e depois tem a comissão de nomeações e selecção que pode
apontar quem ocupa determinados lugares.
Há órgãos que têm que intervir em determinado momento, tal como a avaliação do
funcionamento de cada órgão também tem momentos determinados. Isso faz parte da
vida das instituições.
Se eu for administrador do banco, eu não posso dizer “eu já me entenderei na
Assembleia Geral dos Accionistas”. Não! Se eu sou administrador do banco eu tenho
que me entender com os meus colegas, com as orientações e o acompanhamento do
CGS, em determinadas matérias tenho que ouvir o Conselho Superior e em determinado
momento tenho que ser avaliado em Assembleia Geral.
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O que está a dizer é que houve quem não cumprisse essas regras?
Não. Estou a dizer que existe uma disciplina orgânica.
Mas alguém violou essa disciplina, senão as divergências não cairiam na praça
pública.
No meu tempo de executivo havia também discussões e pontos de vida diferentes para o
próprio desenvolvimento do banco. Na fundação do BCP havia administradores que
defendiam que o banco tinha que consolidar a abertura das suas primeiras sucursais –
uma no Porto e outra em Lisboa – e só depois disso, que não levaria menos de um ano, é
que se poderia abrir outras duas. E no terceiro ano, outras duas... E acabámos por abrir
24 sucursais em três anos, ao contrário dessas opiniões.
O mesmo se passou com a internacionalização, quando se falou de ir para a Polónia.
Houve quem dissesse que era uma loucura.
O que estamos a tentar entender é o que é que se passou agora para que essas
diferentes opiniões, que são normais nas instituições, tivessem passado a ser
colocadas na praça pública.
O que eu posso dizer teoricamente – mas só teoricamente porque não assisto às reuniões
do Conselho de Administração – é que se não se tem o cuidado de criar um clima em
que todos os administradores – porque todos assinam o balanço – sintam que nada que
acontece no banco lhes possa estar a ser escondido, omisso... Fazendo um ponto e
vírgula: o óptimo é que nada aconteça que não seja fruto da colegialidade.
O que está a dizer é que o rosto do banco, o dr. Paulo Teixeira Pinto, tomou
decisões estratégicas sem conhecimento de outros administradores?
Eu não disse isso. Não disse isso e não vou dizer isso. Em termos teóricos, quando se
gere uma equipa, deve-se criar condições para que todas as decisões sejam
colegialmente assumidas...
E não foram criadas?
...espere... sabendo antecipadamente que é impossível o colégio permanente, porque as
pessoas não podem estar sempre juntas, não estão sempre disponíveis, etc. A única
maneira de compensar a não colegialidade permanente é haver a convicção em todos os
membros de que todas as decisões que cada um vai tomando – individualmente, dois a
dois, três a três, com o presidente ou sem o presidente – não foram ainda conhecidas
mas serão naturalmente conhecidas no primeiro momento.
E isso não aconteceu?
Não digo que não aconteceu. Digo que se isso não acontece, pode alimentar
efectivamente fracturas.
Mas ao não esclarecer agora esse ponto, o eng. Jardim Gonçalves pode também
estar a alimentar fracturas.
Mas eu estou a esclarecer muitíssimo. Se isso acontece pode alimentar
desresponsabilidade em relação a determinadas matérias. Até que haja determinadas
matérias em que as pessoas digam: “Não! Nessas matérias eu sou verdadeiramente
responsável”. O caso Sonangol é um desses casos. E estou a falar disto porque já é
público. Houve administradores que disseram: “se isto é assim, nós não poderemos ser
solidários numa ratificação deste acto”. Parece que não era assim. Mas é algo que, neste
momento, o Conselho de Administração está completamente informado. O CGS, sobre
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Angola, não tem neste momento conhecimento de nada. De nada que esteja estabelecido
entre o banco e alguma companhia de nacionalidade angolana. Não tendo qualquer dos
membros do CGS nada contra nada e nada contra ninguém. Mas até este momento nada
foi agendado.
Então o que parece é que o caso da Sonangol é um pretexto para que o sr.
engenheiro e alguns administradores tenham posto o assunto na mesa.
Não é um pretexto, é uma razão. E o sr. engenheiro [o próprio Jardim Gonçalves] não
teve nada a ver com o assunto. O sr. engenheiro sobre o assunto da Sonangol ainda não
fez nada. Cuidado, porque eu tenho que ouvir o meu Conselho e só faço alguma coisa
depois disso.
Sobre a Sonangol a única coisa que posso dizer é que foi um assunto que tratei
directamente com o presidente do banco. O que eu disse e o que ele disse,
compreenderão que eu não diga.
A Sonangol foi então um dos casos em que a colegialidade das decisões não foi
respeitada. Em que outros casos é que isso se passou?
A Sonangol é um caso já público. Não digo mais nenhum.
Mas houve mais?
Não digo mais nenhum. Não digo nada... Saberão por outros. Esses problemas todos
temos e lá pelo Público deveis ter também alguns e não são públicos.
O próprio presidente do banco disse que havia falta de coesão.
Se o presidente referiu isso, é porque ela existe em determinados momentos, é
conjuntural. Permanente não é, porque os administradores mostraram-me a mim,
presidente do CGS, factos que mostram que decidem aquilo que é necessário. No caso
da Sonangol, uma parte do CA alertou que se a outra parte tomasse compromissos eles
não seriam solidários. Se não houvesse outros precedentes provavelmente não fariam
isso. Mas fizeram, e fizeram para bem do banco, não fizeram a pensar neles. A primeira
assinatura é do dr. Filipe Pinhal, que é um profissional completíssimo. Se ele assume
essa atitude perante o presidente do banco e outros dois colegas é porque, em boa
consciência, entende que está a defender o banco.
A defender o banco do seu presidente?
Eu diria que está a defender até o presidente do banco. Está a impedir que o presidente
do banco faça algo que não é conveniente para ele próprio.
E porque é que o presidente do banco toma esse tipo de decisões?
O presidente é vértice mas também é consequência de determinados contributos que à
sua volta lhe chegam. Não é que não tenha a sua própria estrutura, a sua própria cabeça,
a sua própria vontade, a sua determinação. Mas muitas vezes também está condicionado
por determinadas informações. O que os outros administradores quiseram alertar é que
do ponto de vista deles não deve ser feito.
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Podemos então ter como certo que, não tendo havido problemas de relacionamento
entre diferentes órgãos, o que se passou aconteceu dentro do próprio CA.
Entre órgãos não há problemas.
Mas alguns accionistas que apoiam o dr. Paulo Teixeira Pinto, como a Moniz da
Maia e Joe Berardo, vieram pedir a destituição de cinco administradores do BCP
sem que o dr. Paulo Teixeira Pinto se tenha demarcado deles. E o CSG, a que o sr.
preside, veio solidarizar-se com esses cinco administradores.
Não, não. O presidente do Conselho Superior [o próprio Jardim Gonçalves] escreveu
aos accionistas todos sem qualquer distinção – portanto o sr. Moniz da Maia, o sr.
Berardo, etc. terão recebido a minha carta – a explicar que o património do banco
passava pelo património, pelo curriculum e sabedoria desses cinco senhores. Foi uma
informação que eu dei, mais nada.
Isso significa que o CS, ou pelo menos o seu presidente, tomou posição a favor de
uma parte do CA?
Não é tomar posição. É ser justo em relação a um património. Uma pessoa é afectada
quando é publicamente apontada como sendo destituível. E o perfil dessa pessoa
também é perfil do banco. E entendi que devia dizer isso aos meus accionistas:
“Cuidado! Estes cinco senhores representam mais de 90 por cento das contas e do
património do banco”.
Mas como é que consegue estar solidário com um presidente do CA que não se
distancia daquele pedido de destituição e que aceitou integrar uma lista de órgãos
sociais de que aqueles cinco administradores não fazem parte?
Cada um actua de acordo com a sua consciência institucional, profissional e pessoal.
Para saber isso têm que entrevistar o dr. Paulo Teixeira Pinto.
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A relação com Paulo Teixeira Pinto
Está arrependido de ter proposto o dr. Paulo Teixeira Pinto para o suceder como
presidente do Conselho de administração?
Não estou nada arrependido. Tudo o que fazemos acontece em determinados momentos.
A primeira conversa que eu tive sobre o tema foi com o dr. Filipe Pinhal [que era
indicado como possível sucessor, uma vez que era o número dois da administração]. Era
mais que justo. E precisava do conselho dele. Fiz 70 contactos pessoais entre a minha
decisão pessoal e a sua divulgação. Houve muita ponderação e houve uma larga base de
apoio para que o nome a propor à AG fosse o dr. Paulo Teixeira Pinto. Naquela altura
houve a intenção de dar um sinal de que o futuro presidente do CA viveria por muito
tempo.
Mas podia ter integrado previamente o dr. Paulo Teixeira Pinto na administração
antes de fazer a transição, como aconteceu no BPI quando a liderança passou de
Artur Santos Silva para Fernando Ulrich.
O BPI tem tido a sorte e o mérito de que algumas coisas não se saibam. O BPI é o BPI e
eu farei coisas muito mais mal feitas do que o dr. Artur Santos Silva. O dr. Paulo
Teixeira Pinto não foi administrador do banco mas, como secretário-geral, durante cinco
anos assistiu ao comportamento de todos os administradores dentro do Conselho de
Administração.
E depois de ter sido indicado para presidente não devia o dr. Paulo Teixeira Pinto
ter feito uma renovação da administração à maneira dele?
Naquele momento foi feito o que o dr. Paulo Teixeira Pinto quis.
Não houve pressões?
Não. Ao contrário. Todos os administradores renunciaram e a AG elegeu todos ao
mesmo tempo. É um assunto arrumado.
O dr. Paulo Teixeira Pinto terá feito então um erro de avaliação?
Não. A minha opinião é que ele avaliou muito bem. Escolheu a melhor equipa que
podia ter escolhido.
Porquê então a proposta apresentada pelo CGS na anterior Assembleia Geral de
passar a ser este órgão, e não a própria AG, a escolher o presidente do CA?
A experiência de quase um ano de modelo dualista [depois de publicada a lei que obriga
as empresas a optar por um ou outro sistema] aconselhava que se fizessem
aperfeiçoamentos aos estatutos, coisa que aconteceu em quase todas as AG da vida do
BCP. Foi só isso. A grande maioria das empresas em todo o mundo que tem o modelo
dualista adopta esta prática.
Mas na AG acabou por retirar essa proposta, que tudo indica não seria aprovada.
Vai insistir nela? Não houve da sua parte uma deficiente avaliação do timing para
a fazer?
De certeza que os estatutos do banco vão ser permanentemente actualizados. Mas a
mesma proposta eu não a subscreverei. Está retirada em definitivo. Sobre o momento,
não retiro nada sobre a bondade do momento. O que eu digo é que esse momento foi
aproveitado para determinadas atitudes que já estavam a ser desenvolvidas...
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E não percebeu isso?
Nós não estamos obrigados a fazer as coisas para que elas sejam fáceis. Temos que
ponderar. Mas aquilo que foi dito, que eu tinha saudades e queria voltar ao poder, hoje
está bem claro que não havia nada disso.
Essa proposta foi conversada com o Conselho de Administração?
Foi conversada com o presidente do CA, sem ser em segredo.
Mas o dr. Paulo Teixeira Pinto não concordou com essa proposta.
Mas em quantas matérias não há pontos de vista diferentes?
Não era importante que o presidente do CA concordasse com essa proposta?
Não, era muito importante que os órgãos sociais estivessem de acordo em levar essa
proposta à AG. E isso aconteceu.
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A próxima Assembleia Geral e o futuro do BCP
Que comentário faz às listas candidatas aos órgãos sociais, encabeçadas pelo dr.
Paulo Teixeira Pinto?
Não vou fazer nenhum comentário. Não tenho nada a ver com o assunto.
Mas também é accionista do banco.
Na AG votarei, não tenha dúvidas. Eu não tenho informação de quem é que
efectivamente elaborou essas listas.
Joe Berardo disse que confiava nas listas porque tinham sido feitas pelo presidente
do CA.
Eu acredito em toda a gente. Mas não vejo bem o presidente do banco estar a fazer
propostas fora da Comissão de Nomeações. Não vejo bem que o presidente faça listas
diferentes para o mesmo banco.
E como é que vê os accionistas mais recentes, como Joe Berardo, João Rendeiro,
Moniz da Maia, Sonangol?
Não conheço. O único que conheço e com quem falei foi com o dr. João Rendeiro. Não
tenho nada a comentar. O banco está cotado.
Acha que há um “assalto” ao BCP?
O que penso é que há alguma confusão de procedimentos.
Mas este é um grupo de investidores que aparentemente se organizou...
Mas são investidores?
Tem dúvidas que sejam investidores?
Não sei, estou a perguntar. Não sei mesmo nada.
Esses novos accionistas vão ter peso nas decisões estratégicas do banco. Isso não o
preocupa?
Os accionistas que eu olho sempre quando penso no banco são accionistas de mercado,
que se devem tratar muito bem, merecem toda a informação, entram e saem quando
entendem. Depois há um outro grupo chamado mais activo, que não quer lugares na
administração.
O BCP foi construído segundo um modelo em que nenhum accionista tinha muito
poder, que estava muito concentrado em si.
Bom, não fiquem com a ideia de que os accionistas não mandam no BCP. Sempre
conversei com todos eles. Nunca surpreendi os accionistas com decisões. E se o tivesse
feito, a tal autoridade moral que vocês dizem que eu tinha sobre eles, não existiria. E se
tinha alguma era porque os ouvia sempre e partilhava toda a informação para cima e
para baixo.
Uma instituição que quer crescer não pode ter accionistas com participações muito
grandes. E as grandes percentagens de capital só podem ter os grandes institucionais e
quando têm criam condições para uma maior hegemonia.
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O que parece agora é que existe um vazio de poder. Não havendo um poder
efectivo por parte de um accionista...
Mas nunca houve. E nunca se desejou, mesmo ao nível dos fundadores, não foi o CA
que decidiu.
Mas quando estava à frente do BCP, havia um poder muito forte ao nível do
presidente do CA. Hoje esse poder existe?
Pelos sinais que eu vejo o Presidente Executivo está a defender muita coisa.
E bem?
No momento próprio a comissão que avalia o CAE e cada um dos seus membros se
pronunciará. Não vejo o Presidente Executivo do banco limitado na sua actuação
Acha que ele pode protagonizar o centro de poder e de decisão que o senhor teve
até há dois anos?
É diferente, porque [quando Jardim estava como CEO] o CA era o único órgão social
[não existia CGS] e o Conselho Superior era um corpo social (sem funções
vinculativas). Todo o poder tinha que aparecer através do CA. O CA é que dizia o que
ia fazer. Agora há um conselho de administração que é executivo e que é
supervisionado por um CGS e em certas matérias ouve igualmente o CS. Esta estrutura
não é fácil, é complexa.
Neste momento há dois blocos de accionistas...
Se calhar há muitos mais. E antigamente as propostas que chegavam à AG eram sempre
propostas de órgãos sociais. E quando não partiam do Conselho Superior, partiam de
accionistas que diziam que tinham ouvido o CS.
Neste momento não é assim?
Não. Neste momento, [as propostas que vão ser votadas na AG de Agosto] não
passaram pelos órgãos sociais. Não há uma divisão, o que há é um facto novo. Há umas
pessoas que terão umas acções...
...e que se agruparam.
Não sei se se agruparam ou se houve ajuntamento... E que apresentaram uma proposta.
Nunca isso aconteceu no banco. Por isso é que o CGS considerou a AG inoportuna.
Em seu entender quais as intenções dos novos accionistas que surgiram para
apoiar Teixeira Pinto?
Não sei, terá de lhes perguntar. Dar-lhe-á algum trabalho porque o grupo não tem um
presidente.
Porque é que o CGS considerou a AG inoportuna?
Porque os mandatos estão em curso [o do CAE termina em Dezembro] e não existe
nenhum facto que seja perturbador da vida do banco.
Há uma divisão. Acha que é sanável?
Perfeitamente sanável.
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Mas o CEO diz que há divisão no CA.
Já lhe perguntou agora?
A ruptura é conhecida. Porque razão continua sem assumir o conflito?
Aquilo que acontece dentro do banco acontece em qualquer instituição e é resolvido
dentro dos órgãos sociais.
Mas no BCP a divisão sai cá para fora.
Agora sai e não devia. E os administradores sabem que não devia sair. E sabem que
estão confrontados com uma situação que chegou a eles, para usar uma expressão que
um deles usou.
O que é que isso significa?
Foi uma situação que nos invadiu..
Mas isso é uma constante de uma sociedade com capital aberto na bolsa.
Não, uma coisa é o capital chegar e haver uma recomposição, e outra coisa é entrar pela
instituição através de veículos que comunicam com determinadas estruturas que não
estão habilitadas.
O que está a dizer é que neste momento o BCP tem um vírus?
É como se fosse um vírus.
No caso de Filipe Pinhal, que está consigo desde o início, acha que a confiança em
Paulo Teixeira Pinto pode ser reconstruída?
Nenhum deles pediu para substituir o dr. Teixeira Pinto. E o dr. Filipe Pinhal já disse
numa entrevista que não falava nos seus chefes.
Espera que a próxima AG de Agosto seja clarificadora?
O que é isso? Os accionistas chegam ao cliente através dos órgãos sociais. Os vários
departamentos têm uma hierarquia e nada está "roto". Não há ruptura.
Mas na AG vão ser discutidas duas propostas opostas. Uma defendida por um
grupo de accionistas e pelo CEO e mais dois gestores, outra por cinco gestores e
outros accionistas, que é aquela que partilha.
E quanto a isso não há nada a fazer.
Mas vai ser clarificadora?
De quê?
Por exemplo, se uma proposta ganhar esmagadoramente é um sinal..
Está a falar de accionistas que entraram recentemente e que se calhar saem rapidamente.
Mas pode passar a haver uma voz mais constante no banco..
A voz constante não saiu. E a AG não vai melhorar a situação. A AG vai ser um
acontecimento.
Mas o BCP está perante um movimento de accionistas que se organizou...
E que não apresentam nenhum programa. Só houve um, que foi o sr. Berardo, que falou
no Millennium 2010.
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Mas é um movimento que propõe pessoas para os órgãos sociais completamente
diferentes das que lá estão hoje.
Não explicam quem vai ser o CFO [chief financial officer, administrador responsável
pela área financeira] e COO [chief operations officer, administrador responsável pelas
operações].
Como vê o facto do BPI votar contra os seus adversários?
É uma posição dentro do sistema financeiro muito benéfica para a coesão do sector.
Embora tenhamos o Banco de Portugal (BdP), que é o garante do bom funcionamento
do sector, todas as partes devem dar o seu contributo para que o sistema funcione bem.
E a convocatória desta AG pode não ter efeitos perversos perpétuos, mas pode ter
alguns. E acho muito bem que o sistema actue, porque este é um tema do sistema.
Tem falado com o BdP?
Tenho falado muitas vezes com o sr. Governador e como o sr. vice-Governador.
E o que lhes tem dito?
[silêncio]
Como viu a saída do Grupo José de Mello do capital do BCP?
Foi uma opção estratégica. O BCP também saiu da Brisa.
Perante esta enorme instabilidade já há quem defenda que o BCP e o BPI se
deveriam juntar amigavelmente. Neste momento como vê a situação? Poderia
travar apetites de outros investidores mais oportunistas e evitar situações como as
que estão a acontecer?
Todos sabem que eu sou a favor de alguma concentração no sector. Qual? A máxima.
Há condições para se avançar para uma concentração em pareceria, sem que o
BCP queira absorver o BPI, como aconteceu há pouco?
Essa é matéria que depende das duas instituições.
Para garantir uma concentração amigável, por exemplo com o BPI, estaria
disponível para sacrificar algumas das suas ideias, designadamente, o tipo de
sistema de governação que sempre defendeu, e adoptar um modelo semelhante ao
do BPI?
[Silêncio] Os modelos são aqueles que se quiserem.
O BCP está agora mais vulnerável a uma investida hostil?
Acho que não, mas que é bom que não tenha esse problema, é.
Na AG, e se as propostas apresentadas pelos apoiantes de Paulo Teixeira Pinto, e
de que este nunca se distanciou, forem derrotadas esmagadoramente, qual é a
ilação que o CEO deve tirar?
A pergunta é feita a quem?
Ao presidente do CGS.
Não respondo.
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E o engenheiro Jardim Gonçalves, o que faria? Pedia a demissão?
Eu [risos]? [Silêncio] Faria tudo para que não houvesse AG.
Acha normal que os nomes dos sócios da Heidrich&Struggels [Rafael Mora, Nuno
Vasconcelos, e Ramon Bartolomé], a consultora, fornecedora de serviço e
responsável por definir o esquema de remunerações dos gestores do BCP, constem
como candidatos aos órgãos sociais do banco nas listas lideradas por Teixeira
Pinto?
Sou franco, eu não sabia que eles trabalhavam para o BCP.
Mas acha que há conflito de interesses?
[Risos].
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