32 ATRIBUNA VITÓRIA, ES, SÁBADO, 21 DE FEVEREIRO DE 2015 Economia AGÊNCIA CÂMARA - 07/04/12 OPINIÃO ECONÔMICA ELEONORA DE LUCENA (INTERINA) História econômica América Latina deveria ter aproveitado o recente período de bonança, com a alta dos preços de commodities, para diversificar sua estrutura produtiva, investir em tecnologia e adotar políticas muito mais ambiciosas de integração no continente, desenvolvendo um mercado regional que fosse um contrapeso aos freios da economia mundial. A análise é do economista uruguaio Luis Bértola, 60, que lança no Brasil, em 9 de março, “O Desenvolvimento Econômico da América Latina desde a Independência”. A CONGRESSO ainda precisa receber a proposta para adotar o reajuste Dilma diz que ajuste do IR será de 4,5% Presidente confirmou que não vai abrir mão do percentual. Correção é abaixo da inflação de 2014 e menor que o aumento médio salarial Any Cometti governo não vai abrir mão da correção de 4,5% na tabela do Imposto de Renda (IR) na fonte em 2015. A informação foi confirmada ontem pela presidente Dilma Rousseff, que disse que vetou a correção de 6,5% porque o Orçamento da União não pode ficar sem a arrecadação. A renúncia fiscal com a correção de 4,5% é da ordem de R$ 5 bilhões, enquanto para a correção de 6,5% o governo deixaria de arrecadar R$ 7 bilhões em impostos. O reajuste menor, como quer o governo, vai pesar mais no bolso dos assalariados com renda mensal entre R$ 2 mil e R$ 3 mil, que terão que recolher mensalmente 37,36% e 7,19% a mais, respectivamente, se a correção fosse de 6,5%. A correção da tabela em 6,5% foi aprovada pelo Congresso no último mês de dezembro e vetada em 19 de janeiro pela presidente. No entanto, o valor da correção em 4,5% ainda não está definido. De acordo com o delegado adjunto da Receita Federal no Estado, Ivon O Pontes Schayder, a presidente precisa encaminhar uma proposta ao Congresso para adotar o menor percentual do reajuste. Ele explicou que enquanto o reajuste não for feito, quem paga imposto em 2015 continua tendo referência na tabela do IR do ano passado. “Ainda não tem nada oficial, por isso vale a tabela anterior”. O aumento de 4,5% é abaixo da inflação do ano de 2014, que fechou em 6,5%, e bem menor que o aumento salarial médio do brasileiro, que foi de cerca de 8%, como calculou o doutor em contabilidade e professor da Fucape, Valcemiro Nossa. O especialista explicou que a correção de menor percentual na tabela faz com que assalariados de renda mais baixa, que antes não entravam na margem da declaração, passem a ter de pagar o imposto. Segundo ele, a correção deveria ser proporcional ao aumento médio dos salários no último ano. DIREITOS A presidente também afirmou ontem que o governo está disposto a negociar, com o Congresso Nacional, as propostas que devem reduzir o pagamento de benefícios como o seguro-desemprego. Desde que o pacote foi anunciado, o governo precisou lançar uma ofensiva para negociar alterações nas propostas, principalmente com as centrais sindicais, que rejeitaram as mudanças. Escrito com o colombiano José Antonio Ocampo, 62, ex-executivo da ONU, o livro faz um detalhado levantamento das marchas e contramarchas do desenvolvimento do continente, comparando-o com o dos países ricos. O trabalho identifica períodos em que a América Latina patinou (do início do século 19 até 1870), tempos em que cresceu bem (1870-1980) e novos momentos de estagnação, a partir dos anos 1980. Nos últimos anos, a região vinha dando um salto, mas agora o movimento de avanço e de redução da diferença (sempre enorme) em relação aos países ricos foi novamente interrompido. “A América Latina já está crescendo abaixo dos países ricos da OCDE e os prognósticos para os próximos anos são bastante moderados, em torno de 2,5%, 3%. Depois de uma década de fortíssimo crescimento, o 'catch up' foi cortado”, diz Bértola em entrevista à Folha, por telefone, desde Montevidéu. “Não conseguimos transformar a bonança em um processo sustentável de crescimento. Não teremos uma crise tão profunda como a que vivemos no passado. Não estamos diante de uma década perdida ou da crise de princípio do século 20. O que temos agora é baixo crescimento”. Bértola enfatiza que o continente obteve importantes avanços na área social na última década. “A redução parcial da desigualdade na América Latina está relacionada com a consolidação do sistema democrático na região”, declara. Ele aponta que governos de inclinação mais à esquerda reduziram desigualdades e investiram em políticas sociais, sem gerar grandes déficits e desequilíbrios políticos. “Os países não estão em situação financeira precária, mas a América Latina não centrou esforços em lançar bases para um crescimento sustentável; dependeu muito de uma situação externa favorável de preços de commodities”, afirma. Na sua definição, o que ocorreu foi um pacto conservador, pois as melhorias na distribuição de renda não foram acompanhadas por transformações produtivas que garantam a continuidade do processo no futuro. “Quando o pacto distributivo bloqueia as transformações produtivas, se hipoteca o potencial de desenvolvimento de longo prazo. As políticas social, educacional e produtiva precisam estar muito entrelaçadas”, declara. Sem mudanças mais profundas, os avanços sociais podem estar ameaçados a médio prazo. No caso do Brasil, Bértola diz que a desigualdade ainda é muito grande, apesar dos avanços nos últimos anos. “O Brasil deu passos enormes no sentido de ampliar os direitos dos cidadãos e reduzir a desigualdade. O problema é que cresce pouco”. O governo está certo em apostar em aperto agora? “Preferiria outro tipo de política, que não fosse muito contrativa”, opina. Gotemburgo, na Suécia. Na sua análise, o problema é que os Estados vivem todo o tempo sob as pressões das elites e das corporações locais, sem serem capazes de fazer transformações produtivas e a integração. O resultado é a desigualdade. “É muito difícil para um Estado atacar a desigualdade e manter estruturas produtivas cuja base de competitividade está principalmente nos recursos naturais, que quase sempre estão concentrados em poucas mãos”, avalia. Ao lado das elites locais, segundo Bértola, estão os interesses das corporações multinacionais, que respondem pela lógica da acumu- Base frágil lação internacional. “Os Estados nacionais perderam capacidade de negociação frente às multinacionais, que fazem dumping fiscal. A ação das elites, afirma, bloqueou mudanças significativas na estrutura tributária do continente, que segue 'sumamente primitiva'”. “Predominam impostos indiretos e, com o objetivo de atrair capital, há um impressionante sistema de isenções, nem sempre necessárias”. Para ele, muitos setores do continente confiaram que o boom das matérias-primas iria durar muito mais tempo. Mas a história da região é repleta de episódios assim, de forte bonança sucedidos de crises por queda de preços. “O que podemos aprender com o passado é que não devemos construir políticas públicas sobre essa base frágil. O caminho é fazer políticas mais ambiciosas de desenvolvimento produtivo: investimentos mais expressivos em tecnologia e uma cooperação regional muito mais intensa.” “Para integrarmos economias ligadas a commodities devemos nos transformar; e para nos transformarmos precisamos nos integrar. Para isso precisamos de Estados fortes, que tenham credibilidade e capacidade de negociação”, diz Bértola, que é doutor em história econômica pela Universidade de Publicação simultânea com a Folha de São Paulo LIVRO > TÍTULO: “O Desenvolvimento Eco- nômico da América Latina desde a Independência”. > AUTORES: Luis Bértola e Antonio Ocampo. > EDITORA: Elsevier. > QUANTO: R$ 89,90 (400 páginas). > AVALIAÇÃO: bom.