Pró-Reitoria de Graduação
Curso de Letras
Trabalho de Conclusão de Curso
A GRAMÁTICA NOS LIVROS DIDÁTICOS DE ENSINO MÉDIO
SOB A PERSPECTIVA HISTÓRICO-DISCURSIVA
Autor: Camila Oliveira Ribeiro
Orientadora: Dra. Mariza Vieira da Silva
CAMILA OLIVEIRA RIBEIRO
Brasília - DF
2011
CAMILA OLIVEIRA RIBEIRO
A GRAMÁTICA NOS LIVROS DIDÁTICOS DE ENSINO MÉDIO SOB A
PERSPECTIVA HISTÓRICO-DISCURSIVA
Monografia apresentada ao curso de
graduação em Letras da Universidade
Católica de Brasília, como requisito
parcial para obtenção do Título de
Licenciado em Letras Português.
Orientadora: Dra. Mariza Vieira da Silva
Brasília
2011
Monografia de autoria de Camila Oliveira Ribeiro, intitulada “A GRAMÁTICA
NOS
LIVROS
DIDÁTICOS
DE
ENSINO
MÉDIO
SOB
A
PERSPECTIVA
HISTÓRICO-DISCURSIVA”, apresentada como requisito parcial para a obtenção de
grau de Licenciado em Letras da Universidade Católica de Brasília, em 18 de
novembro de 2011, definida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:
______________________________________
Profª. Dra. Mariza Vieira da Silva
Orientadora
Curso de Letras – UCB
_______________________________________
Prof. Dr. Maurício Lemos Izolan
Curso de Letras − UCB
_______________________________________
Prof. MSc. Juarez Moreira da Silva Júnior
Curso de Pedagogia, Proform e Pós-Graduação em Educação a Distância–
UCB(Católica Virtual)
Brasília
2011
AGRADECIMENTO
A Deus, por ter me dado forças, coragem e sabedoria. À professora Mariza, por toda
paciência, apoio, amizade e, principalmente, por me ensinar a acreditar no meu
potencial. Aos meus pais, Adriana e Valmir, por terem doado parte de suas vidas
para que esse sonho se concretizasse. Aos meus irmãos, Vanessa e Vinícius, pela
amizade e compreensão dos necessários momentos de silêncio. À minha madrinha,
“Elsi”, minha avó, “Maria do Socorro”: sem elas, esse sonho não poderia estar se
realizando. A todos os meus amigos que me apoiaram, em especial, Solange e
Janaína, por estarem sempre presentes na minha vida, e aos amigos da Ofitex que
tanto contribuíram para meu crescimento profissional, principalmente à querida
professora Vera. Agradeço, de forma especial, à minha amiga Aline Salgado por me
acompanhar durante toda a minha trajetória acadêmica, partilhando do mesmo
sonho.
RESUMO
RIBEIRO, Oliveira Camila. A GRAMÁTICA NOS LIVROS DIDÁTICOS DE ENSINO
MÉDIO SOB A PERSPECTIVA HISTÓRICO-DISCURIVA. 2011. 45p. Monografia
Letras – UCB, Brasília- DF, 2011.
Este trabalho tem como objetivo compreender como o nosso objeto de estudo – a
gramática no livro didático - produz sentidos. O nosso referencial teórico e
metodológico fundamenta-se na Análise de Discurso e na História das Ideias
Linguísticas, que nos levam a tomar a gramática e o livro didático como
Instrumentos linguísticos, tecnologias e discursos. Analisamos as condições de
produção do nosso objeto de estudo, buscando compreender a imagem de língua,
de conhecimento linguístico e de leitor presentes no livro didático por meio da
pergunta norteadora do nosso trabalho que é: como o saber gramatical é didatizado
pelo livro didático? Uma vez que observamos que não é por mera transposição de
conhecimentos, mas que eles obedecem a padrões e exigências estabelecidos pelo
Estado e pela Ciência, logo buscamos compreender como se dá esse processo,
ampliando nossa visão sobre as políticas públicas do livro didático, analisando,
principalmente, Guias que são resultantes do processo de seleção das obras
produzidas no Brasil. Por meio da compreensão do dispositivo teórico oferecido pela
teoria da Análise de Discurso, construímos o nosso dispositivo analítico, delimitando
o nosso corpus centrado nos Guias de Livros Didáticos do PNLEM e no livro
“Português Linguagens” de William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães,
atualmente mais usado no Brasil e em Brasília. E por meio da descrição e análise
chegamos à conclusão de que a gramática ainda é quem “comanda” o ensino, que o
conhecimento linguístico presente na escola ainda se resume em estudar uma
gramática fechada em conceitos e regras simplificadas e banalizadas, por meio de
exercícios para que o leitor identifique fatos gramaticais. Assim, a imagem de língua
é projetada como conceitos para serem identificados e decorados, uma língua una e
uniforme; a imagem de conhecimento como algo estável e controlável, e a de sujeito
como a de quem ainda não é capaz de dominar essa língua homogênea.
Palavras-chave: Tecnologias histórico-discursivas. Gramática. Livro didático. Ensino
de língua portuguesa. Análise de discurso. História das ideias linguísticas.
ABSTRACT
The objective of this paper is to comprehend how our object of study – grammar
within the didactic book – produces meanings. Theoretical and methodological
referential were Discourse Analysis and the History of Linguistic Ideas, which lead us
to take grammar and the didactic book as linguistics tools, technologies and
discourses. We have analyzed the conditions of production of our object of study,
trying to comprehend the image of language, linguistic knowledge and presence of
the reader in the didactic book through the guiding question of this paper: how is
grammatical knowledge didactically put through the didactic book? Once observed
that it's not through simple knowledge transposition, but that such knowledge obeys
patterns and demands established by the State and Science, soon we tried to
comprehend how this process occurs, broadening our view about public policies on
didactic books, analyzing, primarily, Guides which are a result of the process of
selection of books produced in Brazil. By comprehending the theoretical device
offered by the theory of Discourse Analysis, we have built our analytical device,
limiting our corpus of study within the Guide of Didactic Books of PNLEM and the
book currently highly used in Brazil and Brasília called “Português Linguagens” by
William Roberto Cereja and Thereza Cochar Magalhães. Through description and
analysis we have reached the conclusion that grammar is still the one “commanding”
the teaching process. We have also perceived that the linguistic knowledge used
nowadays in schools still means studying simplified and banalized rules and
concepts in a closed grammar through exercises which enable the reader to identify
grammatical aspects. Therefore, the image of language is projected as concepts to
be identified and memorized, a single and uniform language; the image of knowledge
is seen as something stable and controllable, and the image of the subject is one of
someone who still can't fully domain this homogeneous language yet.
Keywords: Historical-discourse Technology. Grammar. Didactic book. Portuguese
language teaching. Discourse analysis. History of linguistic ideas.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 7
CAPÍTULO 1 TECNOLOGIAS HISTÓRICO-DISCURSIVAS .................................... 10
1.1 A GRAMÁTICA ................................................................................................ 10
1.2 O LIVRO DIDÁTICO ........................................................................................ 17
CAPÍTULO 2 CONSTRUINDO UM DISPOSITIVO ANALÍTICO................................ 24
CAPÍTULO 3 O LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA NO ENSINO MÉDIO
.................................................................................................................................. 31
CAPÍTULO 4 DESCRIÇÃO E ANÁLISE: LINGUAGENS E LÍNGUA ......................... 37
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 50
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 53
7
INTRODUÇÃO
Este Trabalho de Conclusão de Curso busca compreender como a gramática,
no sentido de um saber produzido sobre a língua em um momento histórico de uma
determinada sociedade, vem sendo escolarizada por meio do livro didático. Isso
significa que estamos trazendo para reflexão e análise duas questões que têm
estado sempre presentes, pelo menos nas três últimas décadas, nos estudos e nas
discussões sobre o processo ensino-aprendizagem de língua portuguesa: a de
ensinar ou não a gramática e da centralidade do livro didático no processo escolar,
considerando seus efeitos em termos de qualidade da educação.
Podemos iniciar nosso trabalho, com as palavras de Dias (2000):
Já se tornou comum a idéia de que o ensino de gramática padece de sérios
problemas. Alguns desses problemas estão relacionados com a própria
metodologia utilizada pelo professor em sala de aula; outros estão ligados
às características excessivamente rebuscadas da linguagem utilizada pelos
gramáticos; outros ainda são devidos à falta de uma hierarquia nos níveis
de complexidade e detalhamento de conteúdo apresentado aos alunos
através do livro didáticos. Esses problemas têm sido levantados em
diversos trabalhos nos últimos anos (DIAS, 2000, p. 21).
É preciso ressaltar que Dias é a favor do ensino da gramática na escola e que
o problema não se resolve, segundo ele, apenas com métodos e técnicas,
estratégias pedagógicas adequadas. E, nesse mesmo artigo, sinaliza para o lugar
que merece reflexão mais aprofundada que é pensarmos nos conhecimentos que
temos sobre esse instrumento de normatização de uma língua, na nossa própria
atitude frente aos conceitos produzidos pela gramática; e aponta outros caminhos,
como o de não conceber a língua apenas como um fato gramatical e, sim, como um
fato discursivo, ou seja, que tem história e memória, que se produz pela relação
entre sujeitos em condições específicas.
A outra questão que está em jogo em nosso trabalho é o livro didático, o meio
pelo qual esse conhecimento gramatical chega à escola, pois não é mais comum a
própria gramática fazer parte do material escolar de cada aluno. O livro didático
tornou-se, no decorrer do tempo, principalmente nas escolas públicas, o ator
principal da cena enunciativa pedagógica, ocupando, muitas vezes, o lugar do
professor, decidindo sobre o conteúdo ou a metodologia a serem usados. Trata-se,
pois, de uma questão a que não se pode fugir de uma reflexão e análise mais
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aprofundadas, se quisermos tomar uma posição em nossa vida profissional, sermos
profissionais competentes e autônomos.
A partir da década de 1980, principalmente, outra discussão, relacionada ao
nosso objeto de estudo, também ganha a cena escolar, criando uma dicotomia entre
um ensino tradicional, superado, do qual a gramática seria representante, em
oposição a um ensino moderno, porque científico, objetivo, não preconceituoso,
representado pela linguística. Trata-se, contudo, de uma oposição redutora e
simplista que ignora toda a história de produção de conhecimento linguístico, do qual
a gramática faz parte. Por outro lado, observamos que quando se fala ou se
pergunta, ainda hoje, qual é o foco de ensino de Português na escola, ouvimos a
palavra “gramática”: saber português ainda é saber gramática. Mas, o que está se
entendendo por gramática? Como ela se articula com a leitura e a produção de
texto? Há, aí, várias questões a compreender que não podemos esgotar neste TCC,
mas queremos ampliar nossa visão sobre algumas delas.
Nosso objetivo, considerando o objeto de estudo – a gramática no livro
didático-, é compreender como essas tecnologias, responsáveis por descrever,
normatizar e instrumentalizar a língua portuguesa, como língua nacional, produzem
sentido no modo de dizer uma língua em diferentes espaços de circulação. Nosso
referencial teórico e metodológico para compreender esse objeto de estudo será a
História das Ideias Linguísticas e a Análise de Discurso, o que significa que a
gramática e o livro didático serão tomados, neste trabalho, como instrumentos
linguísticos (AUROUX, 1992) e como discursos (PÊCHEUX,1990 e ORLANDI,
2007). Tomamos como conceitos para reflexão e análise as condições de produção
da gramática e do livro didático no Brasil, com ênfase, em se tratando da gramática
no livro didático, nas imagens de língua, de conhecimento linguístico e de sujeito
leitor presentes no livro didático. Nosso dispositivo de análise tomou como corpus os
Guias de Livros Didáticos PNLEM- apresentação e de Língua Portuguesa, e o livro
didático de Ensino Médio atualmente mais usado no país e em Brasília, “Português
Linguagens 2” de William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães, edição de
2010, fazendo um recorte para descrição e análise, dado o tempo disponível, da
primeira Unidade do livro destinado ao segundo ano.
No primeiro Capítulo, ampliamos nossa visão acerca da gramática e do livro
didático, considerando-os como tecnologias histórico-discursivas, ressaltando as
9
suas condições de produção num sentido mais amplo, o que significou incluir em
nossa reflexão o contexto sócio-histórico (ideológico) em que são produzidos, ou
seja, o da gramatização (AUROUX, 1992) das línguas na Europa e no Brasil.
No segundo Capítulo, apresentamos conceitos que constroem o nosso
dispositivo de interpretação – a Análise de Discurso - e construímos o nosso
dispositivo de análise, a fim de que nos desse elementos para compreender, pelas
pistas e vestígios presentes na materialidade linguística dos textos, o nosso objeto
de estudo.
No terceiro Capítulo, tratamos das condições de produção do livro didático em
um sentido mais estrito, isto é, o contexto imediato em que o livro selecionado para
descrição e análise está inserido: o da disciplina de Língua portuguesa, o nível de
ensino e o das políticas públicas de educação, analisando parte do material – guias-,
que regem as relações entre essas instâncias, relações essas que envolvem muitos
interlocutores.
Por fim, no quarto Capítulo, descrevemos e analisamos o nosso corpus,
observando os efeitos de sentidos produzidos no processo de escolarização, de
didatização do conhecimento gramatical em termos das imagens de língua, de
conhecimento linguístico, de sujeito.
Todo esse trabalho analítico nos levou a algumas considerações finais sobre
esse processo de didatização, como a de que a gramática ainda é quem “comanda”
o ensino, mas uma gramática enrijecida, cristalizada, fechada em conceitos e regras
simplificadas e banalizadas, por meio de exercícios para que o leitor identifique fatos
gramaticais. Assim, a imagem de língua é projetada como conceitos para serem
identificados e decorados de uma língua una e uniforme; a imagem de conhecimento
como algo estável e controlável, e a de sujeito como a de quem ainda não é capaz
de dominar essa língua homogênea.
Este TCC criou condições também para nos situar em outro lugar em relação
às ciências da linguagem e ao ensino de língua portuguesa, abrindo possibilidades
para outros estudos e pesquisas.
10
CAPÍTULO 1
TECNOLOGIAS HISTÓRICO-DISCURSIVAS
Neste Capítulo, considerando nosso referencial teórico – a História das Ideias
Linguísticas no Brasil e Análise de Discurso-, iremos fazer uma reflexão sobre a
gramática e o livro didático como instrumentos linguísticos, como tecnologias e como
objetos discursivos, tendo ambos sido produzidos em condições históricas
específicas.
De acordo com Auroux (1992), a gramática, assim como o dicionário, é um
instrumento linguístico em que se evidencia uma relação com a alteridade, com o
outro que deve dominar a língua da qual já é falante como objeto de conhecimento.
A gramática não é uma simples descrição da linguagem natural, é preciso
concebê-la também como um instrumento lingüístico: do mesmo modo que
o martelo prolonga o gesto da mão, transformando-o, uma gramática
prolonga a fala natural e dá acesso a um corpo de regras e de formas que
não figuram junto na competência de um mesmo locutor (AUROUX, 1992,
p.69).
Consideramos o livro didático também como um instrumento linguístico, uma
vez que o aluno não domina todo o conhecimento apresentado pelo LD(Livro
Didático), que por sua vez tem a função de instrumentar esse conhecimento,
ampliando a competência do aluno em matéria de domínio de língua.
A Análise de Discurso tem como objeto de estudo o “discurso”, que é definido
por Pêcheux (1990) como “efeito de sentidos entre locutores”. Isso significa que, se
a gramática e o dicionário são considerados como discurso, é preciso compreender
os efeitos de sentido entre os interlocutores aí envolvidos. Enquanto uma teoria e
uma metodologia de leitura de textos, de arquivos, ela nos permite compreender a
relação desses instrumentos – gramática e livro didático – com o sujeito e com a
língua na história, em determinadas condições de produção.
Nesse sentido, apresentamos, a seguir, outras questões que ampliam a nossa
compreensão sobre esses objetos histórico-discursivos.
1.1 A GRAMÁTICA
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Inicialmente, é preciso distinguir os dois conceitos que são atribuídos à palavra
gramática: o de conhecimento produzido pelo homem e o do saber inerente ao
homem. Assim como explicam Dias e Bezerra (2006), após uma explanação mais
ampla sobre o uso do termo gramática pelo gerativismo, uma teoria da chamada
linguística moderna:
Podemos agora explicar melhor a diferença entre os dois usos do termo.
Em suma, há diferença básica entre:
a) gramática como o próprio saber a língua (competência internalizada),
objeto de estudo da teoria gerativa;
b) gramática como um saber sobre a língua, isto é, um conjunto de estudos
que descrevem ou explicam a língua (p.18).
Neste trabalho, estaremos trabalhando com a segunda acepção: a da gramática
no sentido de um saber metalinguístico que se constrói ao longo da história de
acordo com interesses e necessidades de uma sociedade dada. Trata-se de um
lugar da prática da linguagem e de normatização dessas práticas, de acordo com a
Análise de Discurso, no qual são produzidos efeitos de sentidos não transparentes,
afetados pela estrutura e pelo funcionamento da língua, da história e da ideologia,
tomados como a direção que esses sentidos tomam.
A produção desse saber, conforme Auroux (1992), iniciou-se na Mesopotâmia,
por volta do segundo milênio antes de Cristo, onde podemos encontrar os primeiros
rudimentos gramaticais, nos quais foram construídos agrupamentos de palavras com
características comuns. Isso, porém, não foi suficiente para construir uma gramática
como um corpo organizado de conceitos e regras.
Ainda, conforme Auroux, na Grécia, a Lógica e Retórica foram imprescindíveis
no desenvolvimento dessas reflexões, desses primeiros estudos. Com a contribuição
da Retórica, foi constituído o que hoje denominamos classe de palavras. E com a
contribuição da Lógica, nasceram os primeiros rudimentos de predicação, o que hoje
fundamenta a sintaxe.
Dias e Bezerra (2006), tratando também dessa história, afirmam que, mesmo
com as contribuições advindas da Grécia, ainda não existia uma gramática no
sentido tradicional, esclarecendo que a primeira gramática grega aparece por volta
de 170 a 90 a.C, escrita por Dionísio, o Trácio, e que já abordava a estrutura dos
sons e das classes de palavras. Outra gramática grega que merece destaque foi a
de Apolônio Díscolo, no século II d. C, que já abordava a sintaxe e as partes do
discurso. Dias e Bezerra(2006) ressaltam ainda que, antes dos gregos, por volta do
12
século V a. C, o gramático hindu Panini escreveu uma obra detalhada que analisava
os sons e a estrutura vocabular da língua sânscrita.
As primeiras gramáticas do Latim que se destacaram foram as de Varrão
(século I a. C) e a de Quintiliano (século I d. C). E alguns séculos depois, merecem
destaque, as gramáticas latinas de Donato e Prisciano no século V d. C, que já
trazem noções de transitividade e regência, que ainda hoje são fundamentais na
sintaxe.
Um conceito que tem sido central para os estudiosos de História das Ideias
Linguísticas, dentro e fora do Brasil, tem sido o de gramatização proposto por
Auroux (1992, p.65): “Por gramatização deve-se entender o processo que conduz a
descrever e a instrumentar uma língua na base de duas tecnologias, que são ainda
hoje os pilares de nosso saber metalinguístico: a gramática e o dicionário”.
Esse processo, em se tratando do Ocidente, tem como referência a produção
dos gregos e romanos e vem se desenrolando pouco a pouco, e ganha força a partir
do final da Idade Média, indo constituir o que Auroux (1992) chama de
“gramatização massiva” das línguas e que irá ocorrer em condições históricas
determinadas.
No curso desses treze séculos de história vemos o desenrolar de um
processo único em seu gênero: a gramatização massiva, a partir de uma só
tradição linguística inicial (a tradição Greco-latina) das línguas do mundo.
Esta gramatização constitui- depois do advento da escrita no terceiro
milênio antes da nossa era – a segunda revolução técnico lingüística. Suas
conseqüências práticas para a organização das sociedades humanas são
consideráveis. Essa revolução- que só terminará no século XX- vai criar
uma rede homogênea de comunicação centrada inicialmente na
Europa(p.35 – grifo nosso).
Esse autor explica tal fato sinalizando para o período de transição que se vivia
na época, e dentre os fatos por eles mencionados como causa desse processo,
ressaltamos a Reforma (Lutero) que difundiu o acesso às escrituras, o que até então
era exclusivo de membros da igreja que sabiam latim, abrindo, assim, espaço para a
tradução entre línguas. Em síntese, essa passagem de uma língua para a outra, foi
a primeira causa da gramatização, pois além desse interesse de tradução das
escrituras, era possível atender a vários outros interesses práticos, como:
i.acesso a uma língua de administração;
ii. acesso a um corpus de textos sagrados;
iii. acesso a uma língua de cultura;
iv. relações comerciais e políticas.
v. viagens (expedições militares, explorações);
vi. implantação/exportação de uma doutrina religiosa;
13
vii. colonização (AUROUX, 1992, p.47).
Outra causa da gramatização estaria ligada à política de uma língua no que
diz respeito à organização e regulação de uma língua literária e ao desenvolvimento
de uma política de expansão linguística de uso interno ou externo. Podemos
mencionar, ainda, a invenção da imprensa que permite a difusão de livros e exige,
com isso, uma uniformização dos textos, as grandes descobertas, possibilitando o
contato
com
línguas
até
então
desconhecidas,
como
outras
causas
da
gramatização, sem nos esquecermos de que a Europa passava por uma mudança
sócio-econômica, com a chegada do capitalismo e, consequentemente, de uma elite,
os burgueses, que não dominavam o latim como os nobres e o clero.
(AUROUX,1992).
Como vimos, essa gramatização massiva a partir do modelo greco-latino cria
uma rede homogênea de comunicação capaz de afetar a sociedade de tal forma a
ser considerada a segunda revolução técnico-linguística. A gramática e o dicionário
são, pois, tecnologias intelectuais que homogeneízam o modo de conceber e
normatizar a língua e que, com a tradução, possibilitam descrevê-la com as mesmas
categorias. Sua técnica principal consiste em, a partir do modelo greco-latino,
constituir uma metalinguagem capaz de ser transferida para qualquer outro
vernáculo, formando, assim, uma rede.
Assim, como as estradas, os canais, as estradas-de-ferro e os campos de
pouso modificaram nossas paisagens e nossos modos de transporte, a
gramatização modificou profundamente a ecologia da comunicação e o
estado do patrimônio lingüístico da humanidade (AUROUX, 1992, p. 70).
As gramáticas são produzidas a partir de uma estrutura fixa, denominada
quadro latino, um sistema unificador que faz com que as gramáticas tenham a
mesma forma básica, a mesma forma de sistematizar a língua, que desenvolvem
uma tradição e criam o chamado “modelo clássico”.
Uma gramática contém (pelo menos): a. uma categorização das unidades;
b. exemplos; c. regras mais ou menos explícitas para construir enunciados
(os exemplos escolhidos podem tomar seu lugar)(...) O conteúdo das
gramáticas é relativamente estável: ortografia/fonética (parte opcional),
partes do discurso ( cf. Apêndice 1), morfologia (acidentes das palavras,
compostos, derivados), sintaxe (freqüentemente muito reduzida:
conveniência e regime), figuras de construção(AUROUX, 1992, p.66-67).
Bechara (2009), no Prefácio da primeira edição de sua “Moderna Gramática
Portuguesa” de1961, mostra a presença dessa tradição ainda hoje.
14
Ao escrever esta Moderna Gramática Portuguesa, foi nosso intuito levar ao
magistério brasileiro, num compêndio escolar escrito em estilo simples, o
resultado dos progressos que os modernos estudos de linguagem
alcançaram no estrangeiro e em nosso país. Não se rompe de vez com uma
tradição secular: isto explica por que esta Moderna Gramática traz uma
disposição da matéria mais ou menos conforme o modelo clásico. A nossa
preocupação não residiu aí, mas na doutrina. Encontrarão os colegas de
magistério, os alunos e quantos se interessam pelo ensino e aprendizado
do idioma um tratamento novo para muitos assuntos importantes que não
poderiam continuar a ser encarados pelos prismas por que a tradição
apresentava.
Apesar de as gramáticas seguirem esse modelo clássico greco-latino, é
importante ressaltar que elas sofrem modificações ao longo da história,
considerando a estrutura de determinada língua, o local, o tempo e as políticas de
língua. Os conceitos, as regras, os exemplos têm historicidade.
Claro no detalhe, a construção da rede supõe adaptações locais e um certo
viezamento das descrições. O quadro teórico que se constitui assim
corresponde grosso modo a uma descrição comum que convém mais ou
menos à língua inicial e às outras. Neste sentido, pode-se falar em uma
Gramática latina estendida (GLE). (AUROUX, 1992, p.44).
Dias e Bezerra, em seu texto “Gramática e dicionário” (2006), trazem uma
análise do pronome em gramáticas brasileiras de três épocas diferentes, e mostram
como o saber gramatical sofreu mudanças ao longo do tempo sob perspectivas
teóricas diferentes em relação à produção do conhecimento. Os resultados
mostraram que nos autores do século XIX: Júlio Ribeiro (1881), João Ribeiro (1886)
e Maximino Maciel (1894), as gramáticas trataram os pronomes a partir de um juízo
de valor, de uma estilização do fato gramatical, isto é, perseguiam um determinado
modelo de estética. Já em meados do século XX, com Rocha Lima (1957), Evanildo
Bechara (1961) e Celso Cunha (1970/1985), as gramáticas se deslocam para a
produção de um saber avaliativo para descrever a língua, indicando os usos
legitimados pelos usos gerais e os legitimados pelos usos específicos da língua
padrão. Mário Perini (1995) e Moura Neves (2000), dois linguistas, que não seguem
a linha tradicional, e, sim, a estruturalista e a funcionalista, respectivamente, tratam o
pronome como um saber sustentado por suas teorias.
Vale a pena ressaltar ainda, em se tratando de refletir sobre a estrutura e
funcionamento das gramáticas, que nem todo estudo sobre a língua é considerado
uma gramática. Segundo Dias e Bezerra (2006), para que uma obra seja
considerada uma “gramática”, é preciso que atenda a dois parâmetros: I)apresente
uma visão integral da língua e II) apresente uma diretriz pedagógica.
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Apresentar uma visão integral da língua significa que a obra deve reunir,
mesmo que imaginariamente, todo o saber referente a uma dada língua, por meio do
conteúdo relativamente estável, o que, discursivamente, entendemos como um
“efeito” de completude, uma vez que é impossível uma gramática conter toda a
língua.
Em relação à diretriz pedagógica, isso implica em conceber a gramática como
um instrumento utilizado no ensino de uma língua. Porém, com o desenvolvimento
dos estudos da linguagem, houve um deslocamento no modo como se vê a
gramática em relação ao processo de ensino-aprendizagem, deixando de ser um
simples manual de consulta para se saber o certo e o errado, e tornando-se um
instrumento de informação sobre uma língua.
Ainda assim, as gramáticas modernas mantêm a diretriz pedagógica. De um
lado, no que se refere às variações de uso de preposições, pronomes ou
procedimentos de concordância, adota-se uma perspectiva informativa, isto
é, o gramático apenas apresenta essas variações para o leitor. De outro,
adota-se a perspectiva segundo a qual a gramática deve atuar no ensino
oferecendo uma visão concisa dos estudos morfológicos e sintáticos
produzidos na lingüística. Em ambos os casos, rejeita-se a perspectiva
doutrinária no ensino de língua, afastando-se da idéia de gramática como
manual de instruções sobre o uso da língua (DIAS; BEZERRA, 2006, p.16)
(grifo nosso).
A partir da década de 1980, principalmente, ganha a cena escolar uma
dicotomia para justificar o fracasso escolar, entre um ensino tradicional, superado,
do qual a gramática seria representante, em oposição a um ensino moderno, porque
científico, objetivo, não preconceituoso, representado pela linguística. Trata-se,
contudo, de uma oposição redutora e simplista que ignora toda a história de
produção de conhecimento linguístico, do qual a gramática faz parte. Essa dicotomia
nos faz, muitas vezes, menosprezar a gramática. Em nosso trabalho, contudo,
tivemos oportunidade de repensar essa dicotomia, compreendendo melhor esse
instrumento, que resulta secularmente de estudo sistematizado, sério, estruturado,
uma verdadeira tecnologia intelectual que possibilitou grandes avanços na história
da produção do conhecimento linguístico.
“A produção do saber metalinguístico inscreve-se em um jogo complexo entre
o papel legislador do Estado, o papel regulador da instrução e a tradição gramatical”
(ORLANDI; GUIMARÃES, 2001, p.21). Esses autores chamam a nossa atenção
para outros pontos desse processo de gramatização, mostrando que, além desse
papel regulador da instrução seguindo uma tradição gramatical, a produção do saber
16
metalinguístico articula Ciência e Estado. No caso do Brasil, essa relação se
evidencia, por exemplo, com a Nomeclatura Gramatical Brasileira (NGB), que, na
década de 1950, irá estabelecer uma nomenclatura oficial para a produção de
gramáticas brasileiras, alterando assim um modo de autoria até então construído.
Se a gramatização das línguas europeias se deu principalmente na relação
com o latim e foi um modo de a Europa conhecer e dominar o mundo, no Brasil,
esse processo ocorreu no embate entre o português do colonizador, as línguas
indígenas, as línguas africanas e as línguas dos imigrantes, e foi um modo de
marcarmos nossa independência de Portugal, de construirmos nossa brasilidade. O
processo de gramatização do português no Brasil significou mais que produzir
instrumentos linguísticos; tratou-se de constituir um sujeito brasileiro, de afirmar a
nossa identidade de povo autônomo.
Destituindo a universalidade do português de Portugal pelo deslocamento
de seu domínio da validade (seu território de definição), esse movimento
que traz, para um outro território(solo, país) que não é Portugal, a relação
entre unidade/diversidade, reinstala, no Brasil, o processo de legitimação da
língua portuguesa referindo-a não a um suposto modelo imóvel externo a
esse seu campo discursivo de validade. Se a colonização impõe uma
língua, a historização da língua faz com que essa mesma colonização sofra
um deslocamento visível no processo de gramatização. Como estamos
expondo, o trabalho de gramatização, em um país colonizado, desloca o
eixo relativo à universalização. A gramática, nessas condições, é
instrumento de legitimação, dá foros de universalidade, significa o direito à
unidade (imaginária) constitutiva de toda identidade. Correlatamente, falar
em usos variados é defender “outra” língua. E, desse lado do Atlântico, uma
vez conquistado o direito à unidade, de imediato se começa, de novo, a se
reconhecerem as variedades: a de relação com as línguas indígenas, as
línguas africanas etc.(ORLANDI, 2002, p.128).
As
primeiras gramáticas brasileiras surgiram no século XIX. “[...] configurando
um corpo de especialistas e se formando uma disciplina relativa aos estudos da
linguagem no Brasil” (ORLANDI, 2002, p.132). Foram elas: a gramática de Júlio
Ribeiro (Gramática Filosófica), a de João Ribeiro (Gramática Histórica) e a de
Maximino Maciel (Gramática Geral). Nesse período, foi se constituindo o
conhecimento linguístico do Brasil, pois as ideias vindas de fora não eram apenas
repetidas, mas passavam por um processo de ressignificação; e assim os
gramáticos dessa época foram formando a nossa própria tradição intelectual e
científica.
Contudo, como explica Orlandi (2002):
Com a NGB (1959) este estado de coisas muda sensivelmente, quando é
uma comissão que, a partir de um decreto, estabelece a homogeneidade de
uma terminologia que des-autoriza as variadas posições (gramática geral,
17
gramática histórica, gramática analítica, gramática descritiva etc) dos
gramáticos que traziam para si a responsabilidade de um saber sobre a
língua. Com a NGB o Estado brasileiro toma em mãos a administração da
relação institucional do brasileiro com a língua nacional, via gramática, pela
uniformização da terminologia (p.160).
A NGB desloca a posição da autoria do gramático, causando uma
transferência do conhecimento do gramático para o linguista, como podemos
observar nas palavras de Orlandi (2002, p. 160):
Depois desse deslocamento, a autoria do saber sobre a língua deixa de ser
uma posição do gramático e será patrocinada pelo lingüista para dizer como
uma língua é (português no Brasil/português europeu). A autoria da
gramática passa a necessitar da caução do lingüista, já que este tem o
conhecimento científico da língua. Há uma transferência do gramático para
o lingüista.
As gramáticas são, como vimos, instrumentos complexos, históricos, que
trabalham as línguas de forma determinada, sob condições de produção, que
envolvem o contexto sócio-histórico, ideológico, político em que as imagens e as
representações de língua, de conhecimento, de correção, de sujeito se constituem.
Como esse saber sobre a língua chega à escola? Até que ponto essa historicidade
do conhecimento não vai ser apagada?
1.2 O LIVRO DIDÁTICO
O conhecimento nas diversas áreas, inclusive o conhecimento gramatical
agora em questão, chega à escola por meio de um processo de didatização,
mediante estratégias sociais e educacionais, assim como explica Magda Soares
(1996):
Assim, na escola, o saber para ser ensinado, aprendido, avaliado, sofre um
processo de seleção, segmentação, organização em seqüências
progressivas, é em síntese, didatizado, escolarizado. Currículos, programas,
materiais didáticos representam estratégias sociais e educacionais para a
concretização e operacionalização desse saber escolarizado. Nesse
sentido, o livro didático instituiu-se, historicamente, bem antes que o
estabelecimento de programas e currículos mínimos, como instrumento
para assegurar a aquisição dos saberes escolares, isto é, daqueles saberes
e competências julgados indispensáveis à inserção das novas gerações na
sociedade, aqueles saberes que a ninguém é permitido ignorar (p.55).
Como se dá esse processo de seleção, segmentação, organização no LD, de
que fala Soares, em se tratando de gramática? Que saberes, em se tratando de
conhecimentos gramaticais, são indispensáveis, não se pode ignorar? Que imagem
de língua, de sujeito escolarizado eles produzem?
18
Uma vez que não há mera transposição dos conhecimentos gramaticais para
um LD, uma vez que são selecionados, segmentados, organizados, podemos dizer
que produzem um tipo de saber metalinguístico específico sobre a língua, provendoa de realidade, estabelecendo uma relação específica do sujeito com a língua, via
uma instituição legitimada pela sociedade. O saber gramatical adquire uma forma
escolar que funciona como verdadeira técnica intelectual para o trabalho com a
língua, dando uma nova dimensão ao conhecimento linguístico. Resta-nos
compreender como isso se dá.
Tanto o livro didático quanto a gramática, da perspectiva histórico-discursiva,
são construídos e circulam em determinadas condições de produção, produzindo,
assim, os seus efeitos de sentido e de sujeito. Em nosso trabalho, queremos
explicitar essas condições. Quem seriam os interlocutores em se tratando de LD?
Como podemos pensar a situação em que o LD que selecionamos para analisar se
constitui?
Choppin, pesquisador francês, de outra perspectiva teórica, em seu artigo
“História dos livros e das edições didáticas: sobre o estado da arte” (2004), chama
nossa atenção, inicialmente para a dificuldade de se definir o objeto “livro didático”
devido à diversidade de objetos utilizados para fins didáticos e à instabilidade dos
usos lexicais.
Na maioria das línguas, o “livro didático” é designado de inúmeras
maneiras, e nem sempre é possível explicitar as características específicas
que podem estar relacionadas a cada uma das denominações, tanto mais
que palavras quase sempre sobrevivem àquilo que elas designaram por um
determinado tempo. Inversamente, a utilização de uma mesma palavra não
se refere sempre a um mesmo objeto, e a perspectiva diacrônica (que se
desenvolve concomitantemente à evolução do léxico) aumenta ainda mais
essas ambigüidades. Alguns pesquisadores se esforçam em esclarecer
essas questões e estabelecer tipologias, mas constata-se que a maior parte
deles se omite em definir, mesmo que sucintamente, seu objeto de estudo.
(p.549).
Nós, como pesquisadores iniciantes, não iremos arriscar trabalhar nessa
definição, que tem se mostrado tão difícil para estudiosos experientes. Neste TCC,
tomamos como livro didático aquele que é comprado e distribuído nas escolas
públicas do país como tal, como parte de políticas públicas de educação.
O livro didático, como observou Chris Stray, em 1993, citado por Choppin
(2004), “ [...] é um produto cultural complexo. [...] que se situa no cruzamento da
cultura, da pedagogia, da produção editorial e da sociedade.” Esse autor mostra-nos
19
também que o LD tem exercido múltiplas funções, considerando o ambiente
sociocultural, época e métodos, entre outros fatores. Suas principais funções,
segundo ele, podem ser resumidas em quatro: I – Referencial: seguir o programa
curricular e transmitir os saberes julgados indispensáveis a nova geração; IIinstrumental: por colocar em prática métodos de aprendizagem por meio de
exercícios, de forma geral de sua estrutura; III- ideológica e cultural: exercer o papel
político de aculturar gerações; e IV- documental: fornecer textos a fim de
desenvolver a capacidade crítica do aluno.
De nossa perspectiva teórica, preferimos falar em funcionamento e não em
função, pois trabalhamos com a língua funcionando em relação à história e a
ideologia produzindo sentidos. Assim nos interessam as condições de produção em
relação à memória, que engloba a ideologia, o inconsciente, o esquecimento e a
falha, o equívoco a que a língua está sempre sujeita, bem como o saber sobre ela
produzido.
Uma ida a dicionários pode nos ajudar a começar a explicitar essas condições
de produção do LD. Segundo o Novo Dicionário Aurélio de Língua Portuguesa
(2009), o livro didático é “[...] destinado ao ensino e cujo texto deve obedecer aos
programas escolares; livro texto” (p. 1222, grifo nosso). Conforme o Dicionário
Houaiss (2001), é “[...] aquele adotado em estabelecimentos de ensino, cujo texto
se enquadra nas exigências do programa escolar; livro texto”(p. 1190, grifo nosso).
Segundo os dicionários, pois, o LD deve obedecer a padrões e se enquadrar em
exigências estabelecidas por outrem (Estado? Ciência?), afastando-se da noção de
discurso transparente, e apontando para outros interlocutores envolvidos no
processo que não apenas o autor e os leitores-alunos e professores. Podemos
reafirmar tal análise com as palavras de Choppin (2004):
Escrever a história dos livros escolares- ou simplesmente analisar o
conteúdo de uma obra- sem levar em conta as regras que o poder político,
ou religioso, impõe aos diversos agentes do sistema educativo, quer seja no
domínio político, econômico, linguístico, editorial, pedagógico ou financeiro,
não faz qualquer sentido(p.251).
A presença do político está presente em diferentes momentos e de diferentes
formas; se pensarmos no LD como um todo, observamos que, desde a sua
concepção, ao participar do Programa Nacional do Livro Didático, por exemplo, ele
obedece a parâmetros exigidos por outrem e cumpridos tanto pelos professores
quanto pelos alunos, a fim de se atingir uma homogeneização e um controle da
20
língua e de sentidos (controle ideológico) no âmbito escolar. Como explica Choppin
(2004):
Uma vez que são destinados a espíritos jovens, ainda maleáveis e pouco
críticos e podem ser reproduzidos e distribuídos em grande número sobre
todo um território, os livros didáticos constituíram-se e continuam a se
constituir como poderosos instrumentos de unificação, até mesmo de
uniformização nacional, linguística, cultural e ideológica. Isso porque, em
grande parte dos países, eles são objeto de regulamentação que difere
sensivelmente daquela a que são submetidas as demais produções
impressas; regulamentação que é geralmente mais estrita, quer ela se
exerça no início (elaboração, concepção, produção, procedimentos prévios
de aprovação) ou ao final do processo (modos de financiamento, de difusão,
procedimentos de escolha, formas de utilização) (p. 561).
Um dos vestígios dessa uniformização, da presença do político como gestão
das diferenças, das desigualdades, podemos encontrar também internamente, na
própria forma de organizar o LD, por meio de uma estrutura cristalizada, que busca
formar mentalidades, sem despertar o espírito crítico dos alunos. Assim como
constatou Grigoletto (1999), ao analisar a estrutura das seções de leitura dos LD de
Língua Portuguesa dos cursos fundamental e médio:
A economia do livro didático como um dos discursos de verdade se dá na
operação com construções fixas. A repetição de uma mesma estrutura a
cada unidade e a atribuição de uma determinada ordem e sequência ao ato
de leitura são apresentadas como naturais, e, na maior parte dos casos,
interpelam o aluno em sujeito que deve ser guiado, a cada passo, por um
único caminho (p. 75).
E é por meio dessa estrutura cristalizada, por meio do saber, poder, dever
dizer, que a ideologia faz sentido, que os próprios fatos reclamam sentido, como diz
Orlandi (2007). E é dessa forma que o LD se postula, produzindo um efeito de
completude, de conter todo o necessário para o aluno dominar, controlar a
linguagem, a língua. Assim como afirma Grigoletto(1999), trabalhando com a noção
de verdade de Foucault:
Certamente, uma das formas de disseminação do poder decorrente da
produção, circulação e funcionamento dos discursos na esfera escolar está
no LD que funciona como um dos discursos de verdade. Um discurso de
verdade é aquele que ilusoriamente se estabelece como um lugar de
completude dos sentidos. A análise de Discurso (ao menos a linha
denominada Escola francesa, cf. Pêcheux, 1975, por exemplo) postula que
a incompletude é constitutiva da linguagem (p.67 – grifo nosso).
Ainda nesse sentido, trazemos as palavras de Orlandi(2007):
A condição da linguagem é a incompletude. Nem sujeitos nem sentidos
estão completos, já feitos, constituídos definitivamente. Constituem-se e
funcionam sob o modo do entremeio, da relação, da falta, do movimento.
21
Essa incompletude atesta a abertura do simbólico, pois a falta é também o
lugar do possível(p.52).
Os interlocutores também são parte das condições de produção de um
discurso e precisam ser explicitados, analisados. O autor do LD, como parte desse
processo de didatização dos conhecimentos linguísticos não é transparente, de
acordo com a perspectiva discursiva, um indivíduo empírico, mas uma posição de
fala, um sujeito afetado pela língua, história e ideologia e que sofre determinações
conforme o lugar que ocupa. Nesse sentido, mais uma vez, Choppin (2004) nos traz
elementos para a reflexão.
Conclui-se que a imagem da sociedade apresentada pelos livros didáticos
corresponde a uma reconstrução que obedece a motivações diversas,
segundo época e local, e possui como característica comum apresentar a
sociedade mais do modo como aqueles que, em seu sentido amplo,
conceberam o livro didático gostariam de que ela fosse, do que ela
realmente é. Os autores de livros didáticos não são simples espectadores
de seu tempo: eles reivindicam um outro status, o de agente. O livro didático
não é um simples espelho: ele modifica a realidade para educar as novas
gerações, fornecendo uma imagem deformada, esquematizada, modelada
(p. 557).
Em se tratando do Brasil, não poderíamos deixar de tratar das condições de
produção desse instrumento em termos econômicos e sociais, que tem um peso
muito importante pelo volume de recursos públicos que mobiliza. Soares (1996)
afirma que, a partir dos anos 60, o setor de edições didáticas veio crescendo,
chegando nos anos 80 a ocupar o principal segmento do mercado editorial, dividido
em média entre 5 editoras;
crescimento que
deve ser explicado devido à
implantação da política de financiamento de livro didático.
Uma pesquisa feita por Ricardo Pereira Soares, técnico do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, em seu texto para discussão denominado
“Compras governamentais para o programa nacional do livro didático: uma
discussão sobre a eficiência do governo” (2007), analisa o comportamento do
governo nesse processo, por ocupar a posição de maior comprador de livros
didáticos do país, como podemos observar:
Com relação ao setor editorial brasileiro, constatou-se que o total de livros
didáticos (ensino fundamental e ensino médio) correspondeu a 58% dos
livros produzidos em 2004(CBL/SNEL, 2005, p. 7 e 9). Deste total, 64%
foram comprados pelo governo federal, principalmente por meio do PNLD
(EARP, 2005, p. 107). Isto significa que o governo comprou cerca de 36%
de toda a produção editorial brasileira(p.12).
22
No Brasil, o Programa iniciou-se em 1929 e foi sofrendo modificações no
decorrer do tempo, atingindo até 2004 o Ensino Fundamental, quando surge o
Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio - PNLEM, programa
responsável pela distribuição de LD para as escolas do Ensino Médio do país –
interesse deste TCC -, aumentando esse poder de compra do governo.
Analisando dados disponibilizados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento
da Educação – FNDE, constatamos que no ano de 2010, somente o PNLEM,
movimentou R$117.306.315,14, distribuídos entre 12 editoras. Porém, observando
de forma mais detalhada esses dados, pode-se ver, como dito por Soares (1996) em
relação a somente 5 editoras dominarem o mercado nos anos 80, que atualmente
essa realidade não está diferente, pois o peso maior está dividido entre uma minoria:
Moderna, FTD, Ática, Saraiva e Scipione.
Soares (2007), outrossim, explica que essa concentração entre poucas
editoras se dá devido ao grande investimento em divulgação, no qual as que
possuem maior poder aquisitivo investem pesado nos divulgadores responsáveis por
distribuir gratuitamente os livros para os professores (que serão responsáveis pela
escolha), dentre outras estratégias, o que se torna inviável para as pequenas
empresas, devido à falta de recursos. Vejamos dados apresentados:
Esse esforço de divulgação parece bem-sucedido. Tanto o é que figura
inexpressiva a venda de editoras menores que, apesar de participarem do
PNLD, não contam com a equipe de divulgadores nos moldes das grandes
editoras, assim como, muito provavelmente, tampouco contam com
recursos para divulgarem gratuitamente seus livros para um número
elevado de escolas. De fato, Cassiano (2005) constatou que, em 2002, para
a cidade de São Paulo, as editoras com práticas de divulgação bastante
incisivas, com prioridade à doação de livros às escolas, como as editoras
Saraiva/Atual, FTD, Ática/Scipione, IBEP/Nacional, Moderna e Brasil,
venderam 96,7% dos livros didáticos. Enquanto isso, as editoras com
práticas menos agressivas de divulgação, como Nova Geração, Módulo,
UFG, Dimensão e Lê, mesmo com os seus livros referenciados no Guia do
Livro Didático e alguns bem avaliados, obtiveram juntas apenas 3,3% do
total das vendas (CASSIANO, 2005, p. 307 apud SOARES, 2007, p.30).
Soares explica que essa prática de visitar escolas e fazer divulgações, de
certa forma “fazer a cabeça do professor”, foi proibida, o que “indicou que, para
2006, aumentaram as vendas de livros das editoras pequenas, como a Sarandi, e
diminuíram as das grandes, como Ática e Scipione” (VALOR ECONÔMICO, 2006
apud Soares, 2007,p.30). Porém, constatamos que essa prática de enviar os livros
gratuitamente para os professores, de uma forma ou de outra, ainda continua, pois
23
um dos exemplares do livro que vamos analisar possui um selo no qual diz que ele é
um livro destinado à análise do professor.
Enfim, devido ao grande número de exemplares vendidos e do peso
econômico, é óbvio constatar que é interesse dos autores e editores que o seu livro
seja escolhido. Então, temos fortemente a intervenção do Estado articulado à
Ciência, uma vez que todo o processo de orientações e diretrizes do PNLEM, bem
como de avaliação, é feito por professores e pesquisadores da comunidade
acadêmica.
O processo inicia-se a partir da publicação do edital, do qual constam os
parâmetros propostos por especialistas. Depois, é feito uma triagem pelo Instituto de
Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), que envia os escolhidos
para a Secretaria de Educação Básica (SEB/MEC), onde especialistas analisam
mais uma vez as obras e escrevem resenhas, que compõem os Guias que são
disponibilizados nas escolas para a escolha do livro que mais se ajuste ao seu
projeto político pedagógico.
É notório o jogo de interesses envolvidos nas condições de produção desse
instrumento até que ele chegue à sala de aula. Os sentidos que aí irão se produzir
trazem as marcas das relações de poder presentes em todo o processo discursivo,
desfazendo aquela concepção de instrumento neutro, transparente, cujo objetivo é
simplesmente carregar a função de transmitir os conteúdos julgados indispensáveis.
24
CAPÍTULO 2
CONSTRUINDO UM DISPOSITIVO ANALÍTICO
A Análise de Discurso (AD) é uma teoria e uma metodologia de leitura e de
interpretação de textos, de arquivos, que procura compreender como um objeto
simbólico, um objeto significante produz sentidos: no nosso caso, o livro didático de
língua portuguesa de Ensino Médio. Não procuramos o sentido verdadeiro, correto,
adequado, mas em saber como, por meio da materialidade da língua, chegamos aos
processos discursivos, aos efeitos de sentidos entre os interlocutores. Queremos
saber como se estabelecem relações entre a língua, o sujeito e a história. Para
entender essas relações, temos uma teoria com seu objeto e conceitos, e para se
chegar à materialidade desse objeto, precisamos construir um dispositivo de análise.
Embora o dispositivo teórico encampe o dispositivo analítico, o inclua,
quando nos referimos ao dispositivo analítico, estamos pensando no
dispositivo teórico “individualizado” pelo analista em uma análise específica.
Daí dizermos que o dispositivo teórico é o mesmo, mas os dispositivos
analíticos, não. O que define a forma do dispositivo analítico é a questão
posta pelo analista, a natureza do material que analisa e a finalidade da
análise (ORLANDI, 2007, p. 27).
Nesse processo de construção de nosso dispositivo, gostaríamos de retomar
algumas questões do dispositivo teórico que nos deram sustentação para as
definições necessárias.
A AD foi fundada em 1960, na França. As suas filiações teóricas são a
Linguística, o Materialisno Histórico e a Psicanálise, que ela une sem se deixar
absorver por elas. Assim o foco está na língua em seu funcionamento, em sua
materialidade, da qual faz parte um sujeito interpelado pela história.
Assim, para a Análise de Discurso:
a.
A língua tem sua ordem própria, mas só é relativamente autônoma
(distinguindo-se da Lingüística, ela reintroduz a noção de sujeito e de
situação na análise da linguagem);
b.
A história tem seu real afetado pelo simbólico (os fatos reclamam
sentidos);
c.
O sujeito de linguagem é descentrado, pois é afetado pelo real da
língua e também pelo real da história, não tendo o controle sobre o modo
como elas o afetam. Isso redunda em dizer que o sujeito discursivo funciona
pelo inconsciente e para ideologia (ORLANDI, 2007, p. 19-20).
A partir dessas afirmações, desfaz-se a noção de linguagem, sentido e sujeito
transparentes, pois a ideologia, a história e a língua produzem efeitos de sentidos, e
25
isto é o discurso: “[...] uma palavra em movimento, prática de linguagem: com o
estudo discurso observa-se o homem falando (ORLANDI, 2007, p.15). Temos, pois,
de atravessar a opacidade da linguagem, do sentido, do sujeito, sabendo que “[...] os
sentidos não estão só nas palavras, nos textos, mas na relação com a exterioridade,
nas condições em que eles são produzidos e que não dependem só das intenções
dos sujeitos” (ORLANDI, 2007, p.30).
Assim, para a compreensão do nosso objeto de estudo, será preciso levar em
consideração as suas condições de produção, isto é, os sujeitos, a situação e a
memória, a sua relação com a exterioridade, com o dito e o não dito. E para tanto,
tomamos a língua, em sua estrutura e funcionamento como ponto de partida para a
descrição e a análise, e o texto como unidade de análise.
Os textos, para nós, não são documentos que ilustram idéias préconcebidas, mas monumentos nos quais se inscrevem as múltiplas
possibilidades de leituras. Nem tampouco nos atemos aos seus aspectos
formais cuja repetição é garantida pelas regras da língua – pois nos
interessa sua materialidade, que é linguístico-histórica, logo não remete a
regras, mas as suas condições de produção em relação à sua memória,
onde intervém a ideologia, o inconsciente, o esquecimento, a falha, o
equívoco. O que nos interessa não são as marcas em si, mas o seu
funcionamento no discurso. É este funcionamento que procuramos
descrever e compreender (ORLANDI, 2007, p. 64-65).
O sujeito, segundo Pêcheux (1990, p.82), “[...] designa algo diferente da
presença física de organismos humanos individuais”, mas um lugar determinado na
estrutura de uma formação social e esse lugar está representado e transformado
nos processos discursivos: “[...] em outros termos, o que funciona nos processos
discursivos é uma série de formações imaginárias que designam o lugar que A e B
se atribuem cada um a si e ao outro, a imagem que eles fazem de seu próprio lugar
e do lugar do outro” (p. 82). Nesse processo, ele é afetado pela língua e história e
não tem total controle sobre como elas o afetam. Significa dizer que o sujeito sofre
determinações da língua, da história, logo da ideologia.
Apresentamos, a seguir, o quadro produzido por Pêcheux (1990) que explicita
o funcionamento dessas formações imaginárias.
26
Expressão que designa as
formações imaginárias
I A (A)
A
{
Imagem do lugar de A para o
sujeito colocado em A
Imagem do lugar de B para o
sujeito colocado em A
I B (B)
B
Significação da expressão
{
Questão
implícita
cuja
“resposta” subentende a
formação
imaginária
correspondente
“Quem sou eu para lhe falar
assim?”
“Quem é ele para que eu lhe
fale assim?”
Imagem do lugar de B para o
sujeito colocado em B
“Quem sou eu para que ele
me fale assim?”
Imagem do lugar de A para o
sujeito colocado em B
“ Quem é ele para que me
fale assim?”
I B A)
Fonte:Pêcheux, 1990.
Pensando ainda nas condições de produção do discurso, temos a situação,
ou seja, o aqui e o agora, que determina o que pode e dever ser dito em
determinada conjuntura. Outras noções são propostas por Pêcheux (1990) para
compreender o processo discursivo, a saber: I) as relações de força existentes entre
os sujeitos, entre os lugares de onde falam (o de professor, o de aluno, o de autor do
livro didático, o do editor, o do MEC etc); II) a relação de sentidos que evidenciam
que um discurso sempre remete a outro discurso, ou seja, a existência de uma
intertextualidade e interdiscursividade (o discurso da ciência, o discurso do Estado, o
discurso jurídico, o discurso pedagógico); e III) a antecipação, que é a possibilidade
de o sujeito se colocar de uma certa maneira no lugar do ouvinte, e antecipar-se em
relação ao sentido de suas palavras.
Esses funcionamentos, que determinam o que é dito dão contornos próprios
à situação imaginária; logo o que produz sentido são as imagens que resultam de
projeções. E “[...] são essas projeções que permitem passar das situações empíricas
– os lugares dos sujeitos – para as posições dos sujeitos no discurso. Esta é a
distinção entre lugar e posição” (ORLANDI, 2007, p.40).
O contexto histórico mais amplo deve ser considerado também como parte
das condições de produção. Assim, o LD selecionado para análise neste TCC faz
parte de um contexto que não se restringe ao momento de sua elaboração, de sua
distribuição, de sua utilização em sala, mas faz parte de programa de governos, de
27
uma política de educação, de um processo histórico de escolarização da sociedade
brasileira, da história da relação do professor e do aluno com o conhecimento
gramatical etc. Há uma memória do dizer presente naquilo que dizemos hoje. A
memória discursivamente constitui o que chamamos interdiscurso; o já dito faz com
que o que está sendo dito tenha sentido, sem que os sujeitos tenham controle.
Assim, como explica Orlandi(2007):
Como dissemos, o interdiscurso – a memória discursiva- sustenta o dizer
em uma estratificação de formulações já feitas, mas esquecidas e que vão
construindo uma história de sentidos. É sobre essa memória, de que não
detemos o controle, que nossos sentidos e constroem, dando-nos a
impressão de sabermos do que estamos falando. Como sabemos, aí se
forma a ilusão de que somos a origem do que dizemos. Resta acentuar o
fato de que esse apagamento é necessário para que o sujeito se estabeleça
um lugar possível no movimento da identidade e dos sentidos: eles não
retornam apenas, eles se projetam em outros sentidos, constituindo outras
possibilidades dos sujeitos se subjetivarem(ORLANDI, 2007,p.54).
O esquecimento é dividido, segundo ainda Pêcheux (1988) em: esquecimento
número 2: de acharmos que o que estamos dizendo só pode ser dito dessa forma; e
esquecimento número 1: de acharmos que somos a origem do que dizemos. Não
temos controle desse esquecimento, porém é por meio dele que são constituídos os
sentidos e somos constituídos sujeitos.
O dito significa, portanto, em relação ao já dito (histórico que está nessa
memória do dizer), mas também em relação ao não dito.
[...] a proposta é a da construção de um dispositivo de interpretação. Esse
dispositivo tem como característica colocar o dito em relação ao não dito, o
que o sujeito diz em um lugar com o que é dito em outro lugar, o que é dito
de um modo com o que é dito de outro, procurando ouvir, naquilo que o
sujeito diz, aquilo que ele não diz, mas que constitui igualmente os sentidos
de suas palavras (ORLANDI,2007, p.59).
A partir destes (e de outros) conceitos disponibilizados pelo dispositivo teórico
é tarefa de cada analista construir o seu dispositivo analítico, a partir de uma
pergunta que desencadeia a análise - Como o saber gramatical é didatizado pelo
Livro Didático? - e da escolha e delimitação do corpus:
Tendo isso em conta, ele constrói finalmente seu dispositivo analítico, que
particulariza, a partir da questão que ele coloca face aos materiais de
análise que constituem seu corpus e que ele visa compreender, em função
do domínio científico a que ele vincula seu trabalho. Com esse dispositivo,
ele está medida de praticar sua análise, e é a partir desse dispositivo que
ele interpretará os resultados a que ele chegar pela análise do discurso que
ele empreendeu (ORLANDI, 2007, p.62).
28
Em relação à delimitação do nosso corpus, inicialmente buscamos os Guias
de Livros Didáticos de 2012 e encontramos dois que nos seriam úteis: a
apresentação, que deixa claro o que se deve esperar dos livros didáticos de Ensino
Médio e explica como acontece processo de escolha e aquisição pelas escolas, e o
de Língua Portuguesa, que traz a resenha e a avaliação das 12 obras de Português
destinadas ao Ensino Médio aprovadas pelo MEC.
Nos Guias, obtivemos informações gerais sobre o que é prescrito para essas
obras, antes mesmo de serem elaboradas, visões específicas de como se faz a
análise, a avaliação, do modo como é tratado o Ensino de Português nessas
coleções aprovadas: seus pontos forte e fracos vistos de uma perspectiva geral e
específica. Os Guias constituem, pois, parte de nosso corpus e foram objeto de
análise, trazendo elementos para análise do LD propriamente, fazendo parte das
condições de sua produção.
Em seguida, no trabalho com a constituição do corpus, fomos em busca de
LD de Português de Ensino Médio para ser nosso material de descrição e análise.
Para isso, fizemos um levantamento dentre as obras distribuídas pelo Estado, a fim
de descobrir qual era a mais utilizada. Tomando como base o conhecimento
adquirido em relação à política do livro didático no Brasil (ver Capítulo anterior),
analisamos os valores negociados por cada título em um âmbito nacional, por meio
de um documento 2011 disponibilizado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação1, responsável pelo Programa Nacional do Livro Didático.
No documento, constam 250 obras das disciplinas distribuídas em geral. A
partir dos dados obtidos, fizemos um recorte de todas as obras destinadas à Língua
Portuguesa (totalizando 11) e elaboramos o seguinte quadro, a fim de visualizar qual
teria fornecido mais exemplares, logo, o mais utilizado.
1
Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/index.php/pnld-dados-estatisticos>.
29
EDITORA
LIVRO
BASE EDITORIAL
LTDA
Português: Língua e
Cultura
EDITORA ÁTICA
Português - ProjetosVolume Único
40.223
EDITORA ÁTICA
Português- Volume
Único
134.812
EDITORA DO BRASIL
LÍNGUA
PORTUGUESA –
Projeto Escola e
Cidadania para Todos
Novas Palavras
6.214
Português- Língua,
Literatura, Produção de
texto
Português- De Olho no
Mundo do TrabalhoVolume Único
Textos: Leituras e
Escritas – Volume
Único
172.932
EDITORA SCIPIONE
Português
428.341
IBEP INSTITUTO
BRASILEIRO DE
EDIÇÕES
PEDAGÓGICAS LTDA
SARAIVA SA
LIVREIROS
EDITORES
Língua Portuguesa –
Coleção Vitória-RégiaVolume Único
34.781
Português Linguagens
1.084.429
EDITORA FTD
EDITORA MODERNA
EDITORA SCIPIONE
EDITORA SCIPIONE
NÚMERO DE
EXEMPLARES
16.779
424.686
56.981
32.314
Como se pode observar, o livro “Português Linguagens”, assustadoramente é
o mais utilizado em âmbito nacional, pois nenhum outro exemplar conseguiu vender
nem a metade do número que ele distribuiu.
Após essa informação, decidimos por um novo recorte: analisar a nossa
cidade, Brasília, saber qual era o LD mais adotado. Fizemos um levantamento das
77 escolas de Ensino Médio atendidas pelo PNLEM no DF. Devido ao tempo
disponível para elaboração deste TCC, centramos nosso trabalho na Cidade Satélite
30
mais importante do DF, para verificar qual o livro estava mais presente na sala de
aula. A cidade foi Taguatinga e o livro “Português Linguagens” foi novamente
destaque, estando presente em 90% das escolas.
Vale ressaltar que o livro escolhido faz parte de uma coleção que abrange
todo ciclo escolar, desde a primeira série do Ensino Fundamental até o terceiro ano
do Ensino Médio e, segundo o site da Editora Saraíva, seus autores - William
Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães - são os autores mais adotados do
país.
Devido à grande difusão do livro “Português linguagens”, resolvemos analisálo e optamos pelo livro do segundo ano do Ensino Médio: ano em que o aluno já se
desvinculou do Ensino Fundamental e ainda não está tão comprometido com o
vestibular. Depois de uma visada geral no livro e de uma observação assistemática
em todas as suas unidades no que se refere explicitamente – ou não – à parte
gramatical, decidimos nos deter na primeira Unidade, que trata da classe de
palavras, fazendo, então, um paralelo com o modo com a “Moderna Gramática
Portuguesa” de Evanildo Bechara (2009) trata tal assunto.
31
CAPÍTULO 3
O LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA NO ENSINO MÉDIO
A análise dos Guias de Livros Didáticos e do LD selecionado será feita com
base nos conceitos do dispositivo teórico aqui discutidos, e no trabalho bibliográfico
feito no Capítulo anterior. Assim, buscaremos compreender como são produzidos os
sentidos no nosso corpus, por meio dos vestígios deixados na materialidade da
língua, tomado como um sistema com autonomia relativa porque afetado pela
história.
O nosso principal material de descrição e análise “Português Linguagens 2”
de Cereja e Magalhães (2010) encontra-se inserido em um contexto especifico que é
necessário levarmos em consideração, o da etapa escolar e a disciplina a qual ele é
destinado. Gostaríamos, pois, de refletir um pouco sobre as condições de produção
nesse contexto mais estrito.
O LD em análise participa do Programa Nacional do Ensino Médio, que, como
dito anteriormente, é responsável por financiar livros didáticos para escolas de
Ensino Médio da rede pública. A parte da triagem e observação é feita pelo Instituto
de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo, que escolhe especialistas
responsáveis para analisarem as obras, conforme requisitos apresentados no edital
e elaborarem o Guia de Livros Didáticos de cada área com resenhas das obras
aprovadas.
Como, explicado anteriormente, as escolas públicas de Ensino Médio, além
de receberem os guias específicos de cada área, recebem um guia intitulado como
“Apresentação” que é comum para todas as disciplinas, e que esclarece o que deve
se esperar de um livro destinado a esta etapa escolar, explica a importância de o
professor refletir antes da escolha, e todas as etapas do processo de adesão. A fim
de compreender as condições de produção que envolvem esse processo, tomamos
para descrição e análise esses guias.
No Guia de Língua Portuguesa, inicialmente são apresentados patamares de
qualidade e organização de todas as coleções em geral. Posteriormente, cada obra
é resenhada uniformemente, apresentando uma visão geral, descrição e análise de
leitura, literatura, produção de textos escritos, oralidade e conhecimentos
linguísticos. Ainda, é apresentado um quadro esquemático com os pontos fortes,
fracos, destaque, programação do ensino e manual do professor.
32
Os Livros Didáticos de Ensino Médio devem seguir as normas oficiais que
regulamentam o Ensino Médio, requisito imprescindível para as obras de todas as
áreas que devem ser adotadas pelas Unidades da Federação. Desse modo,
segundo o Guia 2012, as obras devem levar em consideração a Constituíção da
República Federativa do Brasil, Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Estatuto da
Criança e do Adolescente, Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio e
Resoluções e Pareceres do Conselho Nacional de Educação. Observamos, pois, a
presença de diferentes discursividades sustentando a produção de determinado LD,
estabelecendo alianças ou não entre elas.
Dentre todos esses documentos, ressaltamos a Lei de Diretrizes e Bases –
LDB, que determina os objetivos dessa etapa escolar na formação de caráter geral
do aluno cidadão:
I.
II.
III.
IV.
Art. 35. O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração
mínima de três anos, terá como finalidades:
a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino
fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;
a preocupação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para
continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade
a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores;
o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação
ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico;
a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos
produtivos, relacionando a teoria com a prática, de cada disciplina(GUIA DE
LIVROS DIDÁTICOS 2012, p.7).
Nesse ponto, observa-se a articulação entre o discurso do Estado com o do
Direito, em que se mostra a preocupação não apenas em transmitir o conhecimento,
mas também o de formação pessoal, ética, intelectual e crítica, levando em
consideração a etapa da vida do aluno, transição entre o mercado de trabalho e/ou o
estudo universitário. Como pensar o conhecimento linguístico-gramatical nesse
processo de formação do cidadão, do trabalhador brasileiro?
O Guia 2012 aponta respostas para essa questão, alertando sobre o dever de
levar em consideração a condição juvenil dos alunos para formar cidadãos.
Podemos dizer, então, discursivamente, que o que está em questão é o sujeito e
seus processos de individualização, a sua adequação a uma forma de sociedade:
“estratégias eticamente legitimadas e socialmente bem sucedidas”.
Considerando-se esses traços do perfil do aluno, são desafios básicos da
escola de EM:
33


acolher o jovem em sua condição específica, colaborando para o processo
de construção de sua plena cidadania e, portanto, para sua inserção social
e cultural;
reconhecer os limites e possibilidades do sujeito adolescente, propiciandolhe o suporte necessário para o desenvolvimento de estratégias
eticamente legítimas e socialmente bem sucedidas de subjetivação (GUIA
DE LIVROS DIDÁTICOS 2012- Língua Portuguesa, p.10, grifo nosso).
Nota-se a interferência na formação do pensamento ético, momento em que o
tanto o LD como a Gramática tem, como vimos, o objetivo de educar para um
pensamento hegemônico. Como dito anteriormente, seguindo o pensamento de
Choppin (2004), são instrumentos unificadores, pois, devido à sua grande difusão no
território e seu público ainda maleável, são submetidos a essa regulamentação do
Estado com o apoio do Direito e da Ciência.
Por meio do ensino de uma disciplina específica, todos os LD de Ensino
Médio seguem essa regulamentação. O MEC desenvolve também critérios para
avaliar especificamente cada disciplina. Vamos lançar um olhar sobre como deve ser
o ensino de língua portuguesa na visão do Estado.
Segundo o Guia 2012, o Livro Didático de Língua Portuguesa do Ensino
Médio (doravante LDPM) deve seguir os eixos de ensino estabelecidos pelos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que são: leitura, produção de textos
escritos, oralidade e conhecimentos linguísticos. Estendendo três objetivos do
Ensino fundamental, relacionados à aprimoração da linguagem escrita e oral,
proficiência na norma-padrão e prática de análise e reflexão sobre a língua,
trataremos, especificamente da parte relativa aos conhecimentos linguísticos.
O Guia 2012 prescreve como devem ser desenvolvidos esses conhecimentos
linguísticos, dividindo-os entre norma e reflexão sobre a língua. Vejamos como isso
se dá. Inicialmente, trata-se da norma padrão.
No ensino da norma-padrão, por outro lado, torna-se necessário:
 abordar os fatores socioculturais e políticos que entram em jogo no
estabelecimento e difusão de ideais e padrões lingüísticos;
 considerar a língua padrão no contexto da variação lingüística, sem
estigmatizar as demais variedades(GUIA DO LIVRO DIDÁTICO- Língua
Portuguesa, p.11).
E em seguida, sobre a reflexão sobre a língua:
No que diz respeito à reflexão sobre a língua e a linguagem, espera-se que
o ensino de língua portuguesa, nesse nível, seja capaz de:

considerar as relações que se estabelecem entre a linguagem verbal e
outras linguagens, no processo de construção dos sentidos de um
texto;

sistematizar, com base na observação do uso e com o objetivo de
subsidiar conceitualmente o desenvolvimento da proficiência oral e
34

escrita, um corpo básico de conhecimentos relativos à língua e à
linguagem;
privilegiar, em função de tomar o uso como objeto de reflexão,
abordagens discursivo-enunciativas da língua, não se atendo, portanto
ao nível da frase.
O Guia pauta-se em teorias da Linguística chamada Moderna, aquelas que
têm como referência a variação, o uso da língua, as linguagens não verbais. Esse é
o dito. E o não dito? A tradição do nosso processo de escolarização que privilegia a
Gramática Tradicional como base para o trabalho pedagógico, como irá revelar
contraditoriamente o subtítulo do LD de Cereja e Magalhães: “Literatura – Produção
de textos – Gramática”. O pragmatismo e sociologismo aí presentes em termos de
língua é que deverão substituir a gramática e levar o aluno a refletir sobre a língua.
Nota-se, ainda, que é proposto um ensino que separa a norma-padrão da
reflexão sobre a língua, referendando a fragmentação sempre presente na escola, e
trazendo uma imagem de língua como algo estanque, linear. Na análise feita pelo
Guia 2012, dos patamares gerais de qualidade e organização das obras
“escolhidas”, afirma-se que alguns livros ainda tratam da gramática de forma isolada,
enquanto outros tratam a língua e a literatura a partir de reflexão e análise, como se
as próprias diretrizes não continuassem a dividir, a separar língua e sujeito.
Nota-se, ainda, segundo a avaliação do Guia 2012, que as duas abordagens,
tradicional e inovadora,possuem pontos fracos. Os que têm como foco a gramática,
apesar de reflexões sobre a linguagem se fazerem presentes, não perdem o foco do
ensino sistematizado dessa variante da língua.
Mesmo nas coleções que mantêm uma abordagem dos conhecimentos
lingüísticos predominantemente identificada com a gramática tradicional, as
lingüísticas do uso e do texto se fazem presentes principalmente na forma
de reflexões sobre a variação lingüística, os gêneros do discurso e os
mecanismos e recursos que dão a um texto coerência e coesão. Mas a
gramática, quase sempre nos níveis da morfologia, da morfossintaxe e da
sintaxe é o centro das atenções. Em geral, os tópicos escolhidos são
abordados a partir de textos de diversos gêneros, mas o foco do interesse
está na palavra ou na frase isolada, e não no papel dos fatos gramaticais
para a construção do texto ou para a eficácia do discurso. A abordagem é
metalingüística, e a exposição da matéria segue a lógica consagrada pela
tradição da área, indo da formação da palavra a sua inserção em orações e
períodos, passando antes por sua classificação morfossintática (GUIA DE
LIVROS DIDÁTICOS- Língua Portuguesa, p. 22).
Quanto ao conteúdo, temos indicio que os livros seguem a mesma estrutura
da Gramática Tradicional. Segundo Dias (2001), essa ordem específica de
35
apresentar as classes ignora a identidade de cada classe tornando-as apenas um
elemento de uma lista fácil de decorar.
Os livros que seguem a linha considerada inovadora têm o foco no uso da
língua, para que o aluno entenda a gramática a partir de como a língua se realiza. O
guia, porém, aponta o risco de ser negligenciada a sistematização dos
conhecimentos.
Nessa opção, a formação do aluno como usuário proficiente da língua está
à frente da aquisição de conhecimentos teóricos. Assim, o risco que se
corre é o de negligenciar a sistematização dos conhecimentos lingüísticos, o
que parte dessas coleções procura exorcizar reservando momentos
específicos para esse trabalho (GUIA DE LIVROS DIDÁTICOS- Língua
Portuguesa, p.22).
Alguns LDPM optam pelas duas formas. Porém, a partir dessas e de outras
questões – como ensinar a língua como um todo ou somente a gramática apontadas pelo Guia 2012, fica claro que o Ensino dos conhecimentos linguísticos
no Ensino Médio ainda é polêmico, frágil, questionável, inconsistente, necessitando
de estudos mais amplos e que pensem em trabalhar a unidade e a diversidade não
apenas como oposições. É todo um processo de gramatização, de constituição e de
acesso a uma língua gramatizada, relacionado a uma escolarização precária do
brasileiro que está em questão.
Vários estudos se posicionam acerca dessas polêmicas questões. A teoria
adotada neste TCC é a discursiva, no qual o foco do ensino não é excluir a
gramática tradicional, mas sim ir além das categorias formais da língua, levando em
consideração o conhecimento sobre o que é língua gramatizada e o seu
funcionamento em relação com a história e o sujeito. A partir da visão discursiva,
podemos pensar, por exemplo, na relação entre a configuração enunciativa e o lugar
da memória. Assim, o ensino da língua não ficaria restrito a uma repetição empírica,
formal de conceitos e regras, imaginariamente constantes – como fato gramatical –
e, sim, trabalhado de forma que os enunciados, os textos fossem analisados,
levando em conta as suas condições de produção – como fato discursivo. Como diz
Orlandi (1996):
Trabalhar com o conceito de fato discursivo implica em resgatar a dimensão
enunciativa da frase; isto é, em considerá-la ao mesmo tempo como produto
e processo. A forma lingüística não pode ser abstraída da
vivência/experiência, ou da história do sujeito falante. Analisar uma questão
lingüística como fato discursivo implica analisar não apenas o modo como
36
ele se dá no nível das relações estritamente lingüísticas, manifestadas pelo
conteúdo da frase, mas no discurso que dá sentido ao seu aparecimento
enquanto fato significativo para a análise (apud DIAS 2001, p.76).
Enfim, a partir de uma abordagem discursiva, o ensino da língua portuguesa dos fatos gramaticais -, seria tomado em seu funcionamento entre a unidade e a
diversidade, estimulando a capacidade de reflexão do aluno, atribuindo sentidos
diferentes aos locutores envolvidos. Dias (1998) reflete sobre a tarefa do gramático,
e por extensão, da gramática, do professor, do LD e dos alunos.
Cabe ao gramático levar o aluno a uma reflexão sobre a ocorrência dos
fatos linguísticos em discursos que dão sentido a realidades variadas. E a
tarefa dos alunos? Pensar a língua no funcionamento dos enunciados a
partir da sua própria realidade. Isto é, estudar a ocorrência dos fatos
lingüísticos a partir de uma observação dos discursos do seu próprio dia-adia (1998, p.119).
Tendo feito essa análise de documentos que estabelecem diretrizes e
validam, legitimam determinados livros por meio de sua aprovação, agora, vamos à
descrição e à análise do livro de Cereja e Magalhães, para observar um pouco do
processo de didatização do conhecimento gramatical, levando em consideração as
condições de produção, efeitos de sentidos que estão sendo ali produzidos,
buscando compreender que imagem de língua, de conhecimento linguístico e de
leitor estão se fazendo presentes.
37
CAPÍTULO 4
DESCRIÇÃO E ANÁLISE: LINGUAGENS E LÍNGUA
Iniciamos este Capítulo, retomando as palavras de Orlandi (2007): “Os
sentidos não estão só nas palavras, nos textos, mas na relação com a exterioridade,
nas condições em que eles são produzidos e que não dependem só das intenções
dos sujeitos” (p. 31).
E como isso já pode ser observado desde a capa do livro de Cereja e
Magalhães? Comecemos pelo título e subtítulo:
Português
Linguagens 2
Literatura - Produção de Texto – Gramática
Nota-se que, apesar de o ensino de Português não ser mais estruturado
dessa forma pelos PCN e pelo PNLD, como vimos anteriormente, e sim como
“Leitura, produção de textos escritos, oralidade e conhecimentos linguísticos”, o LD
em estudo não segue esse estruturação, mas sim um modelo antigo. Percebemos
pela presença da palavra “GRAMÁTICA” (dito) em destaque, e a ausência do termo
“CONHECIMENTOS LINGUÍSTICOS” (não dito), em um o jogo do dito e do não dito,
que o livro prestigia o ensino de gramática, tornado-a mais importante que o
conhecimento da língua, trazendo-nos a confirmação da posição de poder que ainda
é atribuída à Gramática Tradicional no Ensino de Língua Portuguesa.
Observamos, ainda, outro apagamento: o de Língua como área de
conhecimento. Aliás, temos uma assimetria nesse subtítulo, pois Literatura é uma
área do conhecimento, Produção de Textos, uma atividade e Gramática, um
instrumento, uma tecnologia linguística. O que significaria esse apagamento?
Ainda na capa, o nome do livro “Português Linguagens” em relação com as
imagens apresentadas - um senhor (Drummond) com um livro e uma pena, sentado
em um banco, uma menina, matando um inseto que aparece ao lado da sandália
usada para matá-lo, um rolo de fita de cinema e um poste de iluminação antigo aponta para o fato de que o livro aborda diversos tipos de linguagens, adequando-
38
se, pois, ao que propõe o PNLD, como um dos critérios básicos para a elaboração
dos livros didáticos.
1. Apresenta uma coletânea de textos, de diversos tipos e gêneros, que
revelem funções e registros de linguagem diversificados e que sejam
representativos da cultura escrita destinada a adolescente do ensino
médio (GUIA DE LIVROS DIDÁTICOS- Língua Portuguesa, p.90).
Assim temos o critério do PNLD se materializando no livro, fazendo-nos
pensar naquele funcionamento discursivo, o da antecipação, para produzir esse
efeito de adequação, de legitimidade, sentidos necessários a sua aprovação. Assim,
alguém que pegue o livro já é induzido a essa representação do que seja ensinar
Português: um efeito leitor, que coloca o leitor em determinado posição, em
determinado lugar de produção de sentidos.
Curiosamente, isso nos faz refletir sobre a seguinte questão: de que adianta o
livro se propor a oferecer diferentes linguagens se ali, no espaço enunciativo da
capa, ele privilegia somente uma tecnologia da língua, a “gramática”? Sem
conhecimentos linguísticos mais amplos e renovados para que seja analisada a
língua em funcionamento, de que adianta o livro abordar as diferentes linguagens?
Ainda na capa, temos um selo que indica que o livro é para a análise do
professor e que a venda é proibida. Constatamos, então, que, apesar da prática de
distribuir gratuitamente os LD para professores ser proibida, como vimos no Capítulo
anterior, no trabalho do pesquisador do IPEA, por induzir de certa forma a escolha
dos professores, ela continua sendo feita. Isso traz ainda a questão de se trazer a
resposta já pronta para o professor, diminuindo cada vez mais as possibilidades de
uma prática pedagógica autônoma e criativa.
Na capa, também temos a informação que o livro segue a nova ortografia, o
que produz um efeito de atualidade, projetando uma imagem de que o livro está por
dentro do que está acontecendo.
Temos também uma Apresentação dos autores, dirigida aos estudantes, em
que o termo “língua” também é bem dizer apagado no dito, sendo amplamente
superado em termos de ocorrência pelos termos “linguagem/linguagens”. Na
verdade, língua aparece só duas vezes: como produto cultural e para dela se fazer o
“melhor uso possível”. E o impossível? Nada aparece da imagem de língua como
algo a conhecer, a desvendar o mundo.
39
Esta obra pretende ajudá-lo na desafiante tarefa de resgatar a cultura em
língua portuguesa, nos seus aspectos artísticos, históricos e sociais, e, ao
mesmo tempo, cruzá-la com outras culturas e artes. [...]
Além disso, tem em vista ajudá-lo a compreender o funcionamento e a fazer
o melhor uso possível da língua portuguesa, em suas múltiplas variedades,
regionais e sociais, e nas diferentes situações sociais de interação verbal.
Observando em seguida o Sumário, o livro organiza-se em torno de quatro
Unidades,
que
indicam
uma
forma
tradicional
de
conceber
a
literatura:
diacronicamente, pelas chamadas escolas.
1.
HISTÓRIA SOCIAL DO ROMANTISMO. A POESIA
2.
O ROMANTISMO. A PROSA
3.
HISTÓRIA SOCIAL DO REALISMO, DO NATURALISMO E DO
PARNASIANISMO
4.
HISTÓRIA SOCIAL DO SIMBOLISMO
Cada uma dessas Unidades distribui-se em Capítulos. Na primeira Unidade,
temos 14 Capítulos; na segunda, 13; na terceira, 12 e na quarta, 12. Esses
Capítulos se subdividem em Literatura, Produção de texto, Língua, uso e reflexão,
Interpretação de textos, e, como uma espécie de “bônus”, temos uma parte
denominada Intervalo. Como pode se observar só pelos títulos, a fragmentação, a
ambiguidade, os apagamentos continuam, mantendo essa imagem de língua como
uma colcha de retalhos ou ainda como algo que se pode recortar e se ter pleno
controle de cada parte.
Ressaltamos que, além das unidades do livro serem organizadas, tendo como
ponto de partida a Literatura, essa área do conhecimento também ocupa maior parte
dos Capítulos da mesma Unidade.
Chamamos ainda a atenção para a palavra “gramática” utilizada na capa, e
que desaparece na organização dos Capítulos do livro, sendo substituída por
Língua: uso e reflexão. Essa substituição foi feita, parece, a fim de produzir uma
projeção imaginária de que o livro trabalha os conhecimentos linguísticos como
proposto pelos PCN e pelo PNLD, que adotam tal nomenclatura. O livro vai-se
adequando, pois, as diferentes diretrizes governamentais, independentemente de
sua coerência ou consistência, ao mesmo tempo, continuam a trabalhar os sentidos
já estabilizados historicamente sobre o que seja ensinar Português, sobre o que seja
língua. Parece que aí se dá um conflito, confronto entre o que é atual, o que é
determinado por um poder maior e uma memória que não se desloca. Como se
40
materializam esses Capítulos nomeados como Língua: uso e reflexão, da Unidade
em análise?
Como já dissemos, fizemos um recorte da Unidade 1 para descrição e análise
neste TCC. Apresentamos, a seguir, um quadro com os conteúdos trabalhados nos
Capítulos desta Unidade. É importante observar que estamos trabalhando apenas
com as partes em que a gramática aparece explicitamente, pois ela também aparece
em outras partes como na Produção de textos em que trata do discurso direto e do
discurso indireto, colocando em questão entre o que faz ou não parte da gramática.
E o texto de outras linguagens também serve de pretexto para questões gramaticais
como as da página 55, o que coloca em questão também a forma de explorar essas
outras linguagens.
Capítulo 3
O Substantivo 28
Flexão do substantivo 32
O substantivo na construção do texto 35
Semântica e discurso 36
Capítulo 5
O adjetivo 50
Flexão de adjetivo 52
O adjetivo na construção do texto 56
Semântica e discurso 57
Capítulo 8
O artigo e o numeral 69
O artigo e o numeral na construção do texto
73
Semântica e discurso 74
Capítulo 11
O pronome 97
Pronomes pessoais 98
Pronomes de tratamento 101
Pronomes possessivos 103
Pronomes demonstrativos 104
Pronomes indefinidos 106
Pronomes interrogativos 107
Pronomes relativos 108
O pronome na construção do texto 110
Semântica e discurso 111
Chamamos a atenção ainda para o título da parte denominada Intervalo e
suas subdivisões, que nos pareceu um “bônus” oferecido aos alunos.
41
EM DIA COM O ENEM E COM O VESTIBULAR 131
A gramática nos vestibulares de hoje 131
Questões do Enem e do vestibular 133
Nota-se que, apesar da troca dos nomes de Gramática (capa) para Língua:
uso e reflexão (no interior do livro), temos aí presente uma memória que sustenta
essa estruturação do LD funcionando: a de uma ordem cristalizada em que se
estudam as classes, como dito por Dias (1998) “uma lista para ser decorada”. Ordem
essa que se encontra nas gramáticas. Observando o Sumário da “Moderna
Gramática Portuguesa” de Bechara (2009), na parte que trabalha com as classes de
palavras, intitulada como Unidades do Enunciado, encontramos os quatro primeiros
capítulos na seguinte ordem:
1 Substantivo.
2 Adjetivo.
3 Artigo.
4 Pronome.
Passemos, agora, a outra etapa da descrição-análise da Unidade 1,
observando como o saber gramatical é didatizado, em que momentos ele está
presente tanto explícita como implicitamente nos capítulos de Língua: uso e reflexão,
que estão assim divididos:
 Construindo um conceito: textos de diferentes linguagens, seguido de
exercícios;
 Conceituando: o conceito e explicações
 Exercícios a partir de textos de diferentes linguagens
 O (substantivo, adjetivo, pronome e etc) na construção do texto: um texto
seguido de exercícios.
 Semântica e discurso: texto seguido de exercicíos.
Como se pode observar, há partes explicitamente nomeadas como Exercícios,
embora apareçam questões em outras seções. Vejamos como ocorre esse
processo, tomando como referência o Capítulo 11, destinado ao estudo dos
pronomes (p. 91).
42
CONSTRUINDO UM CONCEITO - Inicialmente temos uma tira de Fernando
Gonsales (2005), seguida de cinco (5) questões de exercícios, sendo que quatro
delas consistem em identificar na tira os pronomes na mais antiga forma de se
trabalhar com a gramática. Deixamos em vermelhos as respostas, tal como vêm no
exemplar do Professor.
1. Há na tira algumas palavras que indicam as pessoas que participam da ação discursiva,
substituindo-as.
a)
a) No 1° quadrinho, que palavra substitui a palavra Níquel? você
b)
b) No 2° e no 3°quadrinho, que palavra substitui a palavra você? a palavra lo.
2.
2. No 2° quadrinho, na fala de Walt, que palavra indica a 1° pessoa do discurso, ou seja, a
pessoa que fala? me
3.
3. Em três situações, as personagens empregam a palavra meu (s). O que essa palavra indica:
imprecisão, posse ou localização? posse (p. 91)
Nota-se aqui a forma como o livro se postula como discurso de verdade
(GRIGOLETTO, 1999), pois ele leva o aluno a pensar por um único caminho,
admitindo uma única resposta “correta”.
CONCEITUANDO – Parte da teoria dos atos de fala (Linguística) para apresentar a
relação do pronome com o sujeito, mas de modo categórico, sem nuances, tomando
a tira anterior como comprovação, para chegar ao conceito de pronomes em geral,
sem indicação de qual gramática foi retirado: “Pronomes são palavras que
substituem ou acompanham outras palavras, principalmente os substantivos” (p. 92).
Bechara (2009) irá definir Pronome de forma bem mais complexa.
[...] classe de palavras categoremáticas que reúne unidades em número
limitado e que se refere a um significado léxico pela situação ou por outras
palavras do contexto.
De modo geral, esta referência é feita a um objeto substantivo
considerando-o apenas como pessoa localizada do discurso (p.162).
Em seguida ao conceito de pronome, o livro didático em análise, classifica-os
em pronomes substantivo e pronome adjetivo, e, mais uma vez, usa uma frase da
tirinha inicial para exemplificar.
Depois dessa subdivisão, o livro apresenta o seguinte subtítulo: “Pronomes
pessoais” (p. 92) e explica que os pronomes se referem às pessoas do discurso:
43
Os pronomes pessoais designam diretamente uma pessoa do discurso:
 O locutor (quem fala): 1ª pessoa: eu (singular) ou nós (plural);
 O locutário (com quem se fala): 2ª pessoa: tu (singular) ou vós (plural);
 O assunto ou referente (do que o de quem se fala): 3ª pessoa: ele/ela
(singular) ou eles/elas (plural) (p.92).
Logo, conceitua: “Pronomes pessoais são aqueles que indicam as três pessoas
do discurso” (p. 93).
Paremos um instante para uma ida à gramática de Bechara (2009) para ver
como ele nos ajuda a desconstruir esse conceito.
Os pronomes pessoais designam as duas pessoas do discurso e não a
pessoa (não eu, não tu), considerada, pela tradição, a 3.ª pessoa:
1.ª pessoa: eu (singular), nós (plural),
2ª pessoa: tu (singular), vós (plural) e
3ª pessoa: ele, ela (singular), eles, elas (plural) (p. 164).
Essa parte traz, ainda, as classificações dos pronomes em retos e oblíquos,
seguidos de um quadro-resumo, colorido, do que havia se tratado até então. Apesar
de, antes de apresentar o quadro, o LD trazer uma breve explicação, utilizando os
exemplos da tirinha de Gonsalez, notamos os efeitos de sentido produzidos por esse
quadro: a língua é apresentada é “enquadrada” como algo estático para ser
reconhecido e decorado, como explica Dias (1998).
Depois desse quadro, temos uma explicação sobre pronome reflexivo com
exemplos criados pelo autor para comprovação do conceito, da regra.
Feri-me com a tesoura.
Pron. reflexivo
(a mim mesmo)
Nesse ponto, há uma deslizamento de sentido, no qual todo o discurso
didático de gramática contextualizada é substituído pelo discurso da gramática
tradicional que apresenta exemplos de forma isolada. Confirmamos com os
exemplos oferecidos por Bechara (2009) referentes ao pronome oblíquo reflexivo
(p.165):
Eu me vesti rapidamente.
Nós nos vestimos.
Eles se vestiram.
Também, nessa mesma seção, o livro traz o subtítulo “Contraponto”, em que
informa o aluno sobre as formas você(s) (substituindo o pronome tu e vós) e a gente
(substituindo nós), dizendo que especialistas reivindicam a entrada desses
44
pronomes de tratamento na lista dos pronomes pessoais, e então questiona o aluno:
“Qual a sua posição sobre o assunto: essas palavras deveriam ser reconhecidas
como pronomes pessoais? Por quê? Que ganhos isso poderia trazer para o uso ou
estudo da língua?” (p. 93) E nós nos perguntamos: O que foi apresentado e o modo
como foi permitem que o aluno tenha uma posição sobre o assunto?
A seção seguinte trata dos Pronomes de Tratamento. Inicialmente, traz um
cartum de Santiago (Tinta fresca. Porto Alegre: L&PM, 2004. p.86), em que um
político se dirige ao seu público por meio das palavras “Senhoras e senhores”. Em
seguida, o LD explica que as expressões utilizadas para o personagem dirigir-se ao
público são pronomes de tratamento e conceitua: “Pronomes de tratamento são
palavras e expressões empregadas para tratar familiar ou cerimoniosamente o
interlocutor(p.95).”
Nota-se o quanto este conceito é vago, pois e se for um amigo? Imagine
quantas questões devem passar pela cabeça do aluno. Bechara (2009) traz uma
definição mais abrangente: “A estes pronomes de tratamento pertencem as formas
de reverência que consistem em nos dirigirmos às pessoas pelos seus atributos ou
qualidades que ocupam (p. 165)”.
Conceito que apesar de mais abrangente ainda não é totalmente convincente,
pois o que diríamos em relação ao pronome “você” em paralelo com essa definição?
Podemos constatar que a pessoa a qual nos dirigimos dessa forma não possui
nenhum atributo ou não ocupa nenhuma qualidade? Porém, em suas observações,
o gramático explica que “você”, usado familiarmente, vem de “Vossa Mercê” e
substitui o pronome vós que caiu em desuso.
Logo, no LD temos mais uma vez um quadro-resumo, com as formas de
tratamento, a abreviatura e a explicação de como são usadas, produzindo um efeito
“para decorar” e não aprender a língua em seu funcionamento.
Enfim, temos uma lista de exercícios, composta por 7 questões em que o foco
é treinar. Vejamos alguns exemplos, extraído da página 96:
45
1. Identifique as frases em que o pronome está empregado em desacordo com a variedade
padrão da língua. Em seguida re-escreva-as, adequando-a a essa variedade.
a) Fiquei tão brava que mandei ele sair da sala imediatamente... o mandei.
b) Quando saíres, avisa-nos que iremos com você. .... comigo
c) Preciso encontrar-me com você ainda hoje.
d) Não vá, por favor, preciso falar com o senhor.
e) Se você sair, leve com você o cachorro. ... consigo
5. Re-escreva as frases, completando-as com um pronome pessoal da 1ª pessoa do
singular:
a) Sem ___ ler a procuração, eu não assino. (eu)
b) Isso é para ___! ? Obrigada! (mim)
Conclui-se que, apesar dos Capítulos iniciarem com um texto no qual o aluno
deveria ser levado a pensar a língua em seu funcionamento; posteriormente, ele é
levado a aprender os conceitos e regras gramaticais e aplicá-los de forma
descontextualizada.
Após os exercícios, o LD continua a classificar os pronomes. Temos, então, uma
seção denominada “Pronomes Possessivos”, que inicia com uma canção de Lenine
(“Meu amanhã”. HTTP://letras.terra.com.br/lenine/83606/.) Aí, o LD ressalta o
sentido produzido pela palavra “minha” usada pelo eu lírico e, em seguida, explica
que essa palavra “minha” tal como “meu” indicam posse e são pronomes
possessivos, oferecendo a seguinte definição: “Pronomes possessivos são aqueles
que indicam posse em relação às três pessoas do discurso(p.98)”.
Após a definição dos pronomes possessivos, o LD traz a definição de
pronomes possessivos adjetivos e pronomes possessivos substantivos, a partir de
exemplos extraídos do texto:
Nas expressões “minha festa”, meu requinte”, “minha sina”, “meu cinema”, etc.
da canção, minha e meu acompanham substantivos e, por isso, são pronomes
possessivos adjetivos. Quando ao pronome possessivo substitui um substantivo, ele
é um pronome possessivo substantivo. Veja:
Meu carro está sem estepe.
Pron. poss. Adj.
O seu tem estepe
Pron. poss.subst.
Como podemos ver, os textos de variados gêneros são utilizados para que
sejam retirados “fatos gramaticais”, e não para que o aluno perceba o funcionamento
do pronome. É priorizada sempre a definição, o conceito: é porque é, a marca de um
discurso autoritário. Os exemplos retirados dos textos produzem um efeito de que
estão ali somente para produzir um sentido, nos quais o autor pensou
46
antecipadamente, o de contextualizar a gramática. Por outro lado, vemos que há
sempre a necessidade de trazer outros exemplos para comprovar o que o LD diz,
exemplos fora do texto que está sendo trabalhado, fora da literatura, meros
exemplos pra comprovar o que é dito.
Após esses conceitos, temos mais uma vez um quadro-resumo com todos os
pronomes possessivos; mais uma vez é usado esse recurso de enquadrar a língua
didaticamente para ser decorada.
Na sequência, temos a seção “Pronomes Demonstrativos”, que é iniciada a partir
da leitura da tira de Adão Iturrusgarai (Folha de S. Paulo, 7/5/2002), da qual é
extraído o pronome “isto” e definido como pronome demonstrativo, seguido de seu
conceito: “Pronomes demonstrativos são aqueles que situam pessoas ou coisas em
relação às três pessoas do discurso. Essa localização pode se dar no tempo, no
espaço ou no próprio texto (p.99)”.
Em seguida, mais uma vez, são retirados exemplos do texto para subdividir
esse conceito, no caso, em pronomes demonstrativos substantivos e pronomes
demonstrativos adjetivos, e reafirmado com um exemplo sem relação com o texto,
nem com a literatura. Como ocorreu nas outras seções, essa também traz um
quadro-resumo com os pronomes demonstrativos. Efeito de mesmice, de monotonia.
Por fim, trata do emprego dos pronomes demonstrativos, afirmando ser preciso
levar em consideração as pessoas do discurso e aquilo que se fala e se escreve. E
traz exemplos descontextualizados de cada um deles. A título de exemplificação,
temos:
Em relação ao espaço

Este(s), esta(s) e isto indicam o que está perto da pessoa que fala:
Este relógio de bolso que eu estou usando pertenceu a meu avô.

Esse(S), essa(s), e isso indicam o que está perto da pessoa com
quem se fala:
Mamãe, passe-me, por favor, essa revista que está perto de você.

Aquele(s), aquela(s) e aquilo indicam o que está distante tanto da
pessoa que fala como da pessoa com quem se fala:
Olhem aquela casa. É um exemplo de arquitetura colonial brasileira.
A gramática de Bechara (2009) traz basicamente o mesmo conceito, porém
deixa claro que: “Nem sempre se usam com este rigor gramatical os pronomes
demonstrativos; muitas vezes interferem situações especiais que escapam à
disciplina da gramática”(p. 167). O apagamento dessa informação que daria
flexibilidade ao conceito, à língua, produz um sentido de algo estanque, de algo
47
evidente e, em relação ao aluno de que realmente ele não sabe língua. E mais uma
vez eu faço a pergunta: De que adianta afirmar que vai trabalhar as “linguagens” e
“variedades”, se a gramática, que está no lugar da língua, é tratada em um sentido
“tradicionalíssimo”, como verdade absoluta e completa?
Após os pronomes demonstrativos temos um pequeno exercício que segue a
mesma estrutura dos anteriores. Destaco a questão de número 3, porque ela deixa
clara a posição de privilegio atribuída a uma norma padrão estanque. Chamo a
atenção, especialmente, para a resposta dada no exemplar do professor.
3. Leia a tira ao lado, de Caco Galhardo, e observe o emprego do pronome demonstrativo.
Tanto na fala de Gina quanto na fala de Júlio, o emprego do pronome demonstrativo está de acordo
com a variedade padrão da língua? Justifique sua resposta.
Na fala de Gina, não, pois como o controle remoto está na mão dela, próximo, portanto da pessoa
que fala, ela deveria ter empregado este; já na fala de Júlio, sim, pois ele se refere ao controle que
está próximo da pessoa com quem ele fala. (p.101)
Na
sequência,
temos
as
seções
“Pronomes
indefinidos”,
“Pronomes
interrogativos” e “Pronomes relativos” que seguem a mesma estrutura das demais:
um texto referente a algum gênero, o conceito e o quadro-resumo. Após as três
seções, novamente um exercício focalizado em treinar o aluno em relação ao que foi
apresentado.
Na seção O Pronome na Construção do Texto, o aluno tem um texto inicial, no
caso, o poema de Sílvio Bedani, seguido de questões (exercícios) no qual ele é
novamente levado a reconhecer os fatos gramaticais. Como exemplo, citamos as
duas primeiras questões da p. 106.
1.
O poema é essencialmente lírico. Como é comum nesse gênero literário, há inúmeras
marcas da 1ª pessoa, que evidenciam a presença e a voz do locutor (o eu lírico), como se nota nos
verbos e pronomes. Identifique os pronomes que dizem respeito ao eu lírico. Classifique-os. Meu
(duas vezes): pronome possessivo; eu: pronome pessoal do caso reto; mim, me: pronomes
pessoais do caso oblíquo.
2.
Dirigindo-se a um interlocutor, o eu lírico extravasa seu mundo interior.
a)
Que palavras do poema dizem respeito ao interlocutor? Teu, teu, teu, te, te, tua, te, ti.
b)
De que fala o eu-lírico? Dos seus sentimentos pelo interlocutor ou de seu envolvimento
emocional.
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Ao lado desse exercício, temos um quadrado que tem como título “Para que
servem os pronomes” e uma pequena explicação sobre qual o seu papel no texto e
sua função de garantir a clareza, a coerência e a coesão do texto. Constata-se que,
ao invés de o aluno ser levado a perceber isso na língua em funcionamento, o texto
serviu apenas para que fossem identificados fatos gramaticais. E o que realmente
deveria ser importante, que é o uso dos pronomes para coesão e coerência de um
texto, é apresentado em um pequeno quadro, sem nenhuma reflexão critica do
aluno, nem percepção de sua relação com a prática.
Por fim, a seção “Semântica e discurso”, apesar de trazer um novo nome, trata
basicamente das mesmas coisas. A novidade fica por conta de uma abordagem da
variação. A estrutura é a mesma de todas as seções, pequenos textos ou tirinhas,
seguidos de exercícios. Vejamos, por exemplo, mais dois exercícios, das páginas
107-108.
1.
Na fala de Calvin no 1º quadrinho e na fala do tigre no último quadrinho, é empregada
uma expressão no lugar de pronome pessoal.
a)Que expressão é essa? A gente
b) No último quadrinho, que pronome pessoal poderia substituir, a variedade padrão formal, essa
expressão? O pronome pessoal nós.
c) Re-escreva falas de ambas as personagens nesses quadrinhos, substitundo a expressão pelo
pronome pessoal adequado, de acordo com a variedade padrão. Quando somos crianças não
temos muita.../ ...se víssemos alguém normal...
(...)
4. No 1º quadrinho, os rapazes chamam alguém cerimoniosamente.
a)Como se classificam as palavras contidas nos balões? Pronomes de tratamento
b)Três das quatro palavras podem vir acompanhadas de Sua ou Vossa. Se os rapazes optassem
por dizê-las em sua forma completa, como ficariam? Vossa Excelência, Vossa Majestade, Vossa
Alteza.
c) A quem provalvelmente eles tratam assim? Justifique sua resposta. A um provável patrão ou
chefe, como comprova a fala de Fagundes no 3º quadrinho.
O bônus “Em dia de Enem e vestibular”, inicialmente, traz uma explicação de
como está sendo tratada a gramática no vestibular hoje, que, segundo o LD em
análise, estaria abordando aspectos linguísticos dos textos que também servem ao
estudo de literatura e à interpretação de textos. Logo em seguida, mostra exemplos
de como isso pode acontecer, sendo comum três tipos de abordagens: semântica,
reescrita e coesão textual. Logo depois,traz quatro páginas de exercícios retirados
desses exames para que os alunos resolvam.
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Não podemos dizer que nossa análise seja conclusiva e possa ser
generalizada para todos os livros didáticos ou mesmo para o de Cereja e
Magalhães, mas criou condições para uma investigação mais aprofundada e
detalhada em determinadas direções. Mas, considerando a descrição e análise
feitas, chegamos a algumas conclusões. A gramática é realmente o centro do ensino
de português e produz a imagem de uma língua fechada em si mesma,
independentemente do fragmento de língua que se use para trabalhá-la. A presença
de diferentes linguagens produz antes e, sobretudo, o efeito de modernidade, de
novidade, de movimento em meio à monotonia do tratamento que se dá à língua, O
aluno é frequentemente levado a trabalhar com a gramática, colocada no lugar da
língua, para extrair do texto, também tornado fechado, fatos gramaticais a serem
estudados isoladamente. Poderíamos, então, ainda nos perguntarmos. De que está
se falando quando se fala em ensinar ou não gramática na escola?
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A proposta inicial de analisar como o saber gramatical é didatizado nos livros
didáticos tomou uma dimensão muito maior a partir do momento em que foram
definidas as teorias - História das Ideias Linguísticas e Análise de Discurso - que
com seu suporte acabou com nossa relação até então ingênua com o objeto,
fazendo-nos compreender que não se tratava apenas de transposição de
conhecimentos.
A gramática foi tomada como instrumento linguístico e como tecnologia
(AUROUX, 1992) e estendemos esses conceitos para o livro didático por ser
também um saber produzido pelo homem, responsável por descrever e instrumentar
a língua por meio de sua sistematização (seleção, segmentação, organização),
aumentando a competência falante. Logo, a gramática, nesta concepção, como uma
ciência sistematizada, desfaz a impressão de estudo ineficaz, inferior a linguística.
Assim, a partir da compreensão da história e da teoria de interpretação de
texto – Análise de Discurso-, investigamos como são produzidos os sentidos do
nosso objeto de estudo - a gramática no livro didático-, levando em consideração as
suas condições de produção.
O olhar mais próximo das condições de produção desfez toda a noção de
discurso transparente que tínhamos desses objetos, pois descobrimos como o
contexto sócio-histórico determinava o sentido do que estava sendo produzido, em
um jogo em que a política, a memória, as posições imaginárias se fazem presentes.
Pensar nas condições do processo de gramatização no Brasil nos fez
compreender que não se tratava apenas da construção de instrumentos e, sim, da
construção da nossa identidade brasileira. Acompanhando a produção do nosso
saber gramatical, pudemos compreender como a história e o político se materializam
em um âmbito geral, pois seguimos ainda a tradição greco-latina e, internamente, a
NGB, que uniformiza e administra a produção da gramática brasileira.
Em se tratando de livros didáticos, constatamos que eles também seguem
padrões e exigências estabelecidos pelo Estado em uma relação com a Ciência,
uma vez que o político – a divisão e sua administração - se faz presente, por meio
de sua estruturação, visando o controle ideológico escolar, buscando atingir uma
homogeneização.
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Ainda pensando nos livros didáticos, buscamos compreender como o poder
político ganha espaço e descobrimos que é por meio da economia, pois o Estado
ocupa o lugar de maior comprador de livros didáticos no nosso país. O programa
responsável que rege essa relação é o PLND, e no caso do nosso corpus, é o
PNLEM, que movimenta milhões, capazes de instigar as editoras e autores à
produção de algo em determinadas direções de sentido, desencadeando todo um
processo.
Então, buscamos compreender como ocorre esse processo e quem participa
desse jogo de sentidos.
E então, chegamos aos Guias do Livro Didático –
responsáveis por apresentar diretrizes, descrever e analisar as obras aprovadas
pelo MEC -, e buscamos compreender o que o Governo espera dessas obras em
geral, e em um sentido mais estrito em relação à etapa escolar de nosso interesse: o
português no Ensino Médio.
Para compreender como tudo isso funcionava, buscamos Pêcheux (1990) e
Orlandi (2007) e, por meio do entendimento do dispositivo de interpretação, ficou
claro que não existe discurso transparente e, sim, afetado pela língua, história e
ideologia.
A partir desse conhecimento, construímos o nosso dispositivo analítico
definindo o nosso corpus “ Português Linguagens”, livro que atualmente é o mais
usado em âmbito nacional e em nossa cidade.
Nossa descrição e análise levaram em consideração o modo de construção, a
estruturação, o modo de circulação e responderam as questões que foram
colocadas inicialmente: Como o saber da gramática é didatizado? Qual é a imagem
de língua, de conhecimento linguístico e de leitor que são formadas?
Constamos que, apesar do PCN e do PNLD apontarem para um estudo dos
conhecimentos linguísticos, em que o aluno deveria trabalhar com fatos discursivos
e não fatos linguísticos (Dias, 1998 ), uma tradição gramatical já superada por
alguns gramáticos como Bechara (2009), ainda “domina” o ensino de língua
portuguesa em sua forma primordial, que é a de ser estudada em formato de quadro
e de exercícios que transformam a língua em algo fixo, estanque e não em seu
funcionamento,
e que constituem um sujeito leitor que precisa ler apenas para
responder alguma coisa, nunca ler para ler, conhecer a língua para saber as
possibilidades que ela traz de conhecer e desvendar o mundo.
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Elaborar esse Trabalho de Conclusão de Curso não foi uma tarefa fácil,
porém, abriu espaço para uma imensidão de novas descobertas, mudou inclusive a
nossa forma de ver as coisas, que até então seguia um pensamento hegemônico,
resultado de uma educação a que fomos/somos submetidos. Logo, a partir desse
estudo consegui deslocar meu pensamento e ver além das evidências, conseguindo
perceber que não existe discurso transparente, e que um mesmo discurso abre
espaço para inesgotáveis interpretações. Enfim, ampliamos nossa visão acerca de
vários aspectos e percebemos que ainda há muito a ser descoberto, deixando,
portanto, o espaço aberto para futuro trabalhos.
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55
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Camila Oliveira Ribeiro - Universidade Católica de Brasília