MINISTÉRIO DA SAÚDE FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ INSTITUTO OSWALDO CRUZ Mestrado em Ensino de Biociências e Saúde FÍSICA EM QUADRINHOS: UMA ABORDAGEM DE ENSINO EDUARDO OLIVEIRA RIBEIRO DE SOUZA Rio de Janeiro Fevereiro de 2014 INSTITUTO OSWALDO CRUZ Programa de Pós-Graduação em Ensino em Biociências e Saúde Eduardo Oliveira Ribeiro de Souza Física em Quadrinhos: Uma abordagem de ensino Dissertação apresentada ao Instituto Oswaldo Cruz como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ensino em Biociências e Saúde Orientadora: Profa. Dra. Deise Miranda Vianna RIO DE JANEIRO Fevereiro de 2014 ii iii INSTITUTO OSWALDO CRUZ Programa de Pós-Graduação em Ensino em Biociências e Saúde AUTOR: EDUARDO OLIVEIRA RIBEIRO DE SOUZA FÍSICA EM QUADRINHOS: UMA ABORDAGEM DE ENSINO ORIENTADORA: Profa. Dra. Deise Miranda Vianna Aprovada em: _____/_____/_____ EXAMINADORES: Prof. Dr. Francisco Romão Ferreira - Presidente Profa. Dra. Maria da Conceição Barbosa Lima Prof. Dr. Ildeu Castro Moreira Profa. Dra. Lucia Rodriguez de La Rocque Profa. Dra. Guaracira Gouvêa de Sousa (UERJ e IOC/RJ) (UERJ) (UFRJ) (IOC/RJ) (UNIRIO) Rio de Janeiro, 24 de fevereiro de 2014 iv v AGRADECIMENTOS Estou finalizando mais um nível do jogo da minha vida. E por isso, tenho que agradecer primeiramente ao grande articulador desse jogo: Deus, a origem de todas minhas ideias e meu dom, a causa primária de todas as coisas. Agradeço à minha família por entender minhas ausências em festas e comemorações familiares para me dedicar aos estudos. Aos meus pais Edson José Ribeiro de Souza e Hosana José Oliveira Ribeiro de Souza, e aos meus irmãos Igor, Fernanda e Geysa, muito obrigado pelo apoio, carinho, os momentos de diversão e a paciência. Os conflitos nos fazem crescer e refletir, e a reflexão nos faz entender uns aos outros. À minha madrinha Lucinda pela revisão do texto e o apoio ontem, agora e sempre. À minha orientadora Profa. Dra. Deise Miranda Vianna, por confiar neste trabalho, pelos puxões de orelha, os conselhos e críticas que nortearam minha pesquisa. Obrigado pela oportunidade de receber um pouco da sua vasta experiência, pelas instruções e pela colaboração deste e de muitos outros trabalhos que estão por vir. Você é mais que uma orientadora, é um modelo de professor, que desejo ser. Além disso, gostaria de agradecer ao grupo PROENFIS pelo apoio e ajuda. Ao Colégio Pedro II por autorizar a realização do meu trabalho e ao professor Carlos Frederico Rodrigues por disponibilizar suas turmas para a realização do meu trabalho. Aos alunos que foram participantes da pesquisa. Novamente, tenho que agradecer de forma especial, aos meus melhores amigos por estarem comigo, por estarem sempre ao meu lado e terem contribuído direta e indiretamente nesta conquista. Seja jogando RPG e/ou vídeo game para tirar o estressar ou simplesmente por me tirar de casa para conversar na porta, ir ao cinema ou andar sem destino. Em especial (e em ordem alfabética): Daniel Maia, Daniel de Sant’anna, David Marques, Rafael Ramires e Raphael Veríssimo. Ao programa de Pós-graduação em Ensino em Biociências e Saúde, aos membros da Comissão de Pós, docentes e funcionários. Como representantes dos discentes, aprendi sobre liderança, empatia e renuncia. Espero usar o que aprendi na minha vida. A todos os discentes da EBS, nós somos como uma família, em especial a turma de 2012, vocês moram no meu coração. Ao IOC/FIOCRUZ pelo apoio financeiro desta pesquisa, e à FAPERJ pelo financiamento do livro “Temas para o ensino de Física com abordagem CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade)” (Vianna e Bernardo, 2012). vi “Os quadrinhos são algo que tenho lido desde que me lembro ser capaz de ler.” Alan Moore “Por que persistes, incessante espelho? Por que repetes, misterioso irmão, O menor movimento de minha mão? Por que na sombra o súbito reflexo? És o outro eu sobre o qual fala o grego E desde sempre espreitas. Na brunidura Da água incerta ou do cristal que dura Me buscas e é inútil estar cego. O fato de não te ver e saber-te Te agrega horror, coisa de magia que ousas Multiplicar a cifra dessas coisas Que somos e que abarcam nossa sorte. Quando eu estiver morto, copiarás outro E depois outro, e outro, e outro, e outro...” Jorge Luis Borges – Ao espelho vii INSTITUTO OSWALDO CRUZ FÍSICA EM QUADRINHOS: UMA ABORDAGEM DE ENSINO RESUMO DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM ENSINO EM BIOCIÊNCIAS E SAÚDE Eduardo Oliveira Ribeiro de Souza Física em Quadrinhos é um projeto que visa promover discussões sobre temas da Física entre alunos e o professor através da utilização de histórias em quadrinhos ou tirinhas. Sabendo que elas já tiveram como objetivo instruir a sociedade, queremos usá-las no ensino de Física de forma reflexiva valorizando as competências ligadas ao raciocínio e à leitura. Dentre as características dos quadrinhos ou tirinhas podese afirmar que apresentam alto nível de informação e podem ser exploradas pelo professor e discutidas com os alunos e que demonstram estimular e desenvolver o hábito da leitura, enriquecendo o vocabulário do aluno. Seguindo referenciais teóricos tais como: Quadrinhos como recurso didático, Enfoque em CTS, Ensino por investigação, Argumentação na sala de aula e interação em múltiplas linguagens, este trabalho se desenvolveu da necessidade de avaliar as atividades com quadrinhos produzidos por Souza (2012) no seu trabalho de conclusão de curso de Licenciatura em Física da UFRJ. Acredita-se que essas tirinhas e quadrinhos e as atividades propostas em sala de aula ajudam a trabalhar a capacidade crítica dos alunos. Os diálogos, registrados em áudio e vídeo em sala de aula, foram transcritos e analisados. Além disso, os alunos responderam em forma de escrita suas respostas às perguntas levantadas pelas tirinhas. Esses dados foram analisados segundo Toulmin (2007), que desenvolveu um padrão de argumento usado para analisar a força e a qualidade das discussões e também acordo com Márquez, et al (2003), que apresentam a relação entre os diferentes tipos de linguagem (gestual, verbal, escrita, visual etc) entre outros autores. A análise dos dados mostra que as tirinhas aplicadas, em uma escola pública de rede federal de ensino, podem ser agente fomentador de discussão, facilitando a argumentação na sala de aula e a aprendizagem de Ciências. Além disso, este trabalho nos permite verificar que as perguntas somadas às tirinhas se revelaram importantes elementos no processo de construção de significado e conhecimento científico. viii INSTITUTO OSWALDO CRUZ PHYSICS IN COMICS: AN APPROACH TO EDUCATION ABSTRACT MASTER DISSERTATION IN ENSINO EM BIOCIÊNCIAS E SAUDE Eduardo Oliveira Ribeiro de Souza Physics in Comics is a project that aims to promote discussion on topics of Physics among students and teachers through the use of comic books or comic strips. Knowing that they have already had the objective of educating society, in this work we intended to use them by teaching Physics reflexively, enhancing skills related to reasoning and reading. Among the characteristics of comic strips we can state that they present high-level information and that they can be exploited by the teacher and discussed among students, furthermore, they show they stimulate and develop the habit of reading, thereby enriching the vocabulary of the student. Following theoretical frameworks such as: Comics as a teaching resource, Focus on CTS, Education through research, Argumentation in classroom interaction and in multiple languages, this work is a project that evolved from the need to evaluate the activities with comics produced by Souza (2012) in his work on completion of the Bachelor's Degree in Physics from UFRJ. It is believed that these comic strips and the proposed activities helped to work the critical skills of students through dialogues. To prove so, audios and videos, that took place in the classrooms where they were proposed, were recorded. These audios were transcripted and analyzed. In addition, students responded to questions raised by the strips in the form of writing. These data were analyzed according to Toulmin (2007), who developed a standard argument used to analyze the strength and quality of the discussions and also according to Márquez, et al (2003), which show the relationship between different types of language (gestural, verbal, written, visual, etc.) among other authors. Data analysis shows that the comics strips applied in a public federal school were able to raise discussion and prepare students for them, facilitating argumentation in the classroom and in the learning of Sciences. Furthermore, this work allows us to verify that the questions added to the strips proved themselves as important elements in the meaning-making process and scientific knowledge. ix ÍNDICE RESUMO VIII ABSTRACT IX APRESENTAÇÃO XVII INTRODUÇÃO XXIII Justificativa .................................................................................................. xxiv 1 DELINEAMENTOS DA PESQUISA 1 1.1 Perguntas .................................................................................................. 1 1.2 Pressuposto .............................................................................................. 1 1.3 Objetivos ................................................................................................... 1 2 1.3.1 Objetivos Gerais ............................................................................ 1 1.3.2 Objetivos específicos ..................................................................... 1 REFERENCIAIS TEÓRICOS 2 2.1 Quadrinhos no ensino ............................................................................. 2 2.1.1 As histórias em quadrinhos como recurso didático ........................ 5 2.1.2 O uso das histórias em quadrinhos no ensino de ciências ............ 9 2.1.3 Concept cartoons......................................................................... 11 2.2 Ciência, Tecnologia e Sociedade .......................................................... 14 2.2.1 Alfabetização Científica e a formação crítica dos alunos ............. 14 2.2.2 Interação CTS.............................................................................. 17 2.2.3 Física em Quadrinhos e CTS....................................................... 20 2.3 Ensino por investigação ........................................................................ 20 2.3.1 Mudança de atitude dos alunos e do professor ........................... 23 2.3.2 Problematização no ensino de ciências ....................................... 25 2.3.3 Valorização do erro ...................................................................... 27 2.4 Argumentação na sala de aula .............................................................. 27 2.4.1 A prática social e a importância de aprender a argumentar......... 29 2.4.2 Padrão do Argumento de Toulmin ............................................... 32 2.4.3 Indicadores de alfabetização científica de Sasseron ................... 34 2.5 As múltiplas linguagens no ensino de Ciências.................................. 36 x 2.5.1 A palavra, o desenho e o gesto na construção de conhecimento .............................................................................. 39 3 2.5.2 O enredo da história e a construção da problematização ............ 40 2.5.3 Linguagem dos quadrinhos.......................................................... 41 CONHECIMENTO DO CONTEÚDO 50 3.1 Leis de reflexão nos espelhos planos .................................................. 50 3.1.1 O princípio de Fermat .................................................................. 51 3.1.2 Modelo teórico da reflexão........................................................... 52 3.2 Espelhos planos ..................................................................................... 53 3.3 Concepções prévias sobre a reflexão e os espelhos planos ............. 56 3.3.1 A reflexão da luz ocorre somente na forma especular................. 56 3.3.2 Raios visuais ................................................................................ 56 3.3.3 A imagem está na superfície do espelho ..................................... 57 3.3.4 O tamanho da imagem depende da distância do objeto ao espelho ........................................................................................ 58 4 3.3.5 A posição da imagem depende do observador............................ 59 3.3.6 Espelhos só podem ser feitos de metal ou vidro ......................... 59 3.3.7 Espelhos como refletores perfeitos.............................................. 59 MATERIAL E MÉTODO 60 4.1 Física em Quadrinhos: O Material......................................................... 60 4.1.1 Física em Quadrinhos como atividades investigativas ................ 63 4.1.2 Física em Quadrinhos como ambiente de discussão .................. 64 4.1.3 Física em quadrinhos e seu diferencial........................................ 64 4.2 Metodologia da pesquisa ....................................................................... 65 4.2.1 Amostra da pesquisa ................................................................... 67 4.3 Coleta de dados ...................................................................................... 69 5 ANÁLISE E RESULTADOS 71 5.1 Posição da Imagem I .............................................................................. 73 5.2 Posição da Imagem II ............................................................................. 76 5.3 Posição da Imagem III ............................................................................ 88 5.4 Campo Visual I ........................................................................................ 99 5.5 Campo Visual IV ................................................................................... 106 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 121 xi 7 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS 125 ANEXO A – PARECER DO COMITÉ DE ÉTICA / FIOCRUZ 132 ANEXO B – PARECER DO COLÉGIO PEDRO II 135 ANEXO C – TCLE 136 ANEXO D – MATERIAL DE APLICAÇÃO 138 ANEXO E – NORMAS DE TRANSCRIÇÃO 142 xii ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 – Tirinha Posição da Imagem II .............................................................. xxi Figura 2 – Cena do jogo Prince of Persia que inspirou a tirinha Posição da Imagem II ................................................................................................................ xxii Figura 3 – M. Vieux-Bois, história ilustrada de Rudolph Töpffer .......................... 3 Figura 4 – Juca e Chico, personagens criados por Wilhelm Busch ..................... 3 Figura 5 – As cobranças, uma das primeiras histórias ilustradas de Ângelo Agostini antes das aventuras de Nhô Quim ........................................................... 4 Figura 6 – Concept Cartoons versão pôster do metrô ......................................... 12 Figura 7 – Padrão de argumento de Toulmin........................................................ 33 Figura 8 – Imagem icônica versus realista............................................................ 44 Figura 9 – Demonstração da interação entre as expressões faciais e o vocabulário .............................................................................................................. 45 Figura 10 – Exemplo de HQ sem palavras ............................................................ 45 Figura 11 – O letramento está apoiado no clima do quadrinho, descrevendo os sentimentos e o cenário ......................................................................................... 47 Figura 12 – Demonstração de timing nos quadrinhos ......................................... 48 Figura 13 – Medida do tempo ................................................................................. 49 Figura 14 – Demonstração do Princípio de Fermat .............................................. 51 Figura 15 – Esquema que representa a reflexão de um raio de luz .................... 53 Figura 16 – Exemplo de reversão da imagem em quadrinhos ............................ 54 Figura 17 – Representação da imagem ................................................................. 54 Figura 18 – Campo visual no espelho plano em duas situações ........................ 55 Figura 19 – Demonstração da translação de espelhos planos ........................... 55 Figura 20 – Lanterna iluminando uma parede de uma sala fechada .................. 56 Figura 21 – Visualização de um objeto utilizando os raios visuais (a); conceito científico (b) ............................................................................................................. 57 Figura 22 – Imagem está na superfície do espelho .............................................. 58 Figura 23 – Redução da imagem com o aumento da distância........................... 58 Figura 24 – Posição da Imagem I ........................................................................... 60 Figura 25 – Campo Visual I ..................................................................................... 61 Figura 26 – Marca das tirinhas ............................................................................... 61 Figura 27 – Desenho correspondente ao turno 1_134 ......................................... 76 xiii Figura 28 – Padrão de Argumento de Toulmin referente à primeira pergunta da tirinha Posição da Imagem II .................................................................................. 79 Figura 29 – Desenho correspondente ao turno 2_119 ......................................... 86 Figura 30 – Conceito científico sobre a formação da imagem em espelhos planos inclinados .................................................................................................... 87 Figura 31 – Posição da Imagem III ......................................................................... 88 Figura 32 – Padrão de Argumento de Toulmin referente à primeira pergunta da tirinha Posição da Imagem III ................................................................................. 98 Figura 33 - Representação gráfica do reflexo no quadro "Um bar no FoliesBergère" com uma visão superior (a) reflexo no quadro e (b) reflexo segundo conhecimento científico ......................................................................................... 99 Figura 34 – Padrão de Argumento de Toulmin referente à segunda questão da tirinha Campo Visual I ........................................................................................... 104 Figura 35 – Um desenho de um dos alunos do grupo HU1236 sobre a concepção alternativa da seção 3.3.4 ................................................................. 105 Figura 36 – Campo Visual IV ................................................................................ 107 Figura 37 – Esquema referente à segunda questão da tirinha Campo Visual IV ................................................................................................................................ 119 Figura 38 – Esquema referente à terceira questão da tirinha Campo Visual IV ................................................................................................................................ 119 Figura 39 - Representação do campo visual de três observadores ................. 120 xiv LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Aspectos CTS ........................................................................................ 18 Tabela 2 – Categorias do conteúdo CTS ............................................................... 18 Tabela 3 – Elementos básicos da narrativa .......................................................... 42 Tabela 4 – Relação das tirinhas por temas da Óptica .......................................... 63 Tabela 5 – Trecho referente à primeira questão da tirinha Posição da Imagem I do grupo HU3233..................................................................................................... 73 Tabela 6 – Trecho referente à segunda questão da tirinha Posição da Imagem I do HU3233 ................................................................................................................ 74 Tabela 7 – Trecho referente à primeira questão da tirinha Posição da Imagem II do grupo HU3233..................................................................................................... 77 Tabela 8 – Trecho referente à segunda questão da tirinha Posição da Imagem II do grupo HU3233 - Parte 1...................................................................................... 80 Tabela 9 – Trecho referente à segunda questão da tirinha Posição da Imagem II do grupo HU3233 - Parte 2...................................................................................... 82 Tabela 10 – Trecho referente à única questão da tirinha Posição da Imagem III do grupo HU3422 – Parte 1 ..................................................................................... 88 Tabela 11 – Trecho referente à única questão da tirinha Posição da Imagem III do grupo HU3422 – Parte 2 ..................................................................................... 91 Tabela 12 – Trecho referente à única questão da tirinha Posição da Imagem III do grupo HU3422 – Parte 3 ..................................................................................... 93 Tabela 13 – Trecho referente à primeira e segunda questão da tirinha Campo Visual I do grupo HU3422 ..................................................................................... 100 Tabela 14 – Trecho referente à segunda e terceira questão da tirinha Campo Visual I do grupo HU3422 ..................................................................................... 101 Tabela 15 – Trecho referente ao entendimento da tirinha Campo Visual IV e de sua primeira questão do grupo HU1236 .............................................................. 107 Tabela 16 – Trecho referente à segunda questão da tirinha Campo Visual IV do grupo HU1236 - Parte 1 ......................................................................................... 113 Tabela 17 – Trecho referente à segunda e terceira questão da tirinha Campo Visual IV do grupo HU1236 - Parte 2 .................................................................... 114 xv LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ALERJ Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro CTS Ciências, Tecnologia e Sociedade CPII Colégio Pedro II FAPERJ Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz FQ Física em Quadrinhos HQ História em quadrinhos IBEP Instituto Brasileiro de Edições Pedagógicas IOC Instituto Oswaldo Cruz LDB Lei das Diretrizes Básicas PCN Parâmetros Curriculares Nacionais PIBID Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência PROENFIS Grupo de Pesquisa de Ensino de Física RPG Role-playing Game (Jogo de interpretação de personagens) UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro UnB Universidade de Brasília UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura TCC Trabalho de Conclusão de Curso xvi APRESENTAÇÃO As Histórias em Quadrinhos (HQs) há muito tempo são utilizadas para instruir e como forma de comunicação. Elas estão presentes na minha gênese desde muito tempo. Quando penso na influência delas na minha formação, lembro-me, por exemplo de um vizinho que me dava os gibis que ganhava no trabalho, já que seu filho não gostava; da assinatura da turma da Mônica que meu pai fez para mim e meus irmãos, sendo eu o mais velho dos quatro, e de quando, ainda no ensino fundamental, criei uma estória sobre um mundo de fantasia, com heróis, poderes mágicos e deuses. Não sei precisar se isso aconteceu na sétima ou na oitava série, ou ainda se aquela foi a primeira história em quadrinhos que pensei, tracei e produzi, mas ela ficou marcada em minha memória afetiva. Tratava-se de uma estória sobre arqueólogos que tinham encontrado algumas pedras que forneciam superpoderes a eles. Naquela época, eu certamente não conhecia a existência do sistema de vestibular e não sabia o que queria ser, profissionalmente falando, mas acho que aquele foi o primeiro movimento significante em relação à produção de quadrinhos, embora sequer conhecesse sua estrutura. Sou cuidadoso com minhas criações e essa estória existe até hoje. Familiarizado que estava com os quadrinhos nos livros didáticos de Língua Portuguesa e de Geografia, deparei pela primeira vez com eles na prova de Física e nos exames de vestibular. Eram duas tirinhas sobre a lei da inércia. Em uma o menino permanecia em repouso enquanto os cães e o trenó arrancavam perseguindo um coelho; e, na outra tirinha, outro menino permanecia em movimento após o skate bater numa pedra e parar. Em seguida, apresentava-se a pergunta fechada e de múltipla escolha sobre que lei aquelas tirinhas representava. Achei muito interessante que as tirinhas estivessem sendo usadas para ilustrar a pergunta, porém, embora estivesse prestando vestibular para a carreira de Física, até então, ainda não tinha passado pela minha cabeça a possibilidade de trabalhar com quadrinhos e ensino. O interesse por essa combinação entre quadrinhos e ciências nasceu durante o II Simpósio sobre Ciência, Arte e Cidadania da FIOCRUZ em 2004. Naquele simpósio houve várias oficinas e duas delas eram sobre construção de quadrinhos: uma delas com o tema Introdução aos Quadrinhos, ministrada pelo Prof. Dr. xvii Diucênio Rangel e outra sobre Ciência em Quadrinhos, ministrada pelo Prof. Dr. Francisco Caruso. Não me recordo bem por qual motivo, mas, não fiz a oficina do Caruso, não sei se foi cancelada ou se o número de vagas tinha acabado, porém da palestra do Dr. Diucênio eu participei. Fiquei fascinado com aquilo, e na época, me senti motivado a voltar a desenhar aquela história que mencionei ter iniciado no ensino fundamental. A oficina introduzia alguns conceitos sobre tirinhas e ao final da atividade fiz uma tirinha sobre o Fantasma do Vestibular, que retratava uma situação sobre a dedicação aos estudos e exclusão social durante a época do vestibular. No dia seguinte, assisti à conferência de palestras: Quadrinhos, Ciências e Arte com a participação de ninguém menos que Maurício de Sousa com a “Arte e ciência na Turma da Mônica” e Francisco Caruso “Tirinhas da ciência”. Essas palestras aconteceram na ALERJ e nelas as tiras dos mais famosos personagens da Turma da Mônica foram utilizadas para discutir questões de mecânica, Óptica e termodinâmica. Enquanto Maurício de Sousa apresentava algumas páginas de suas HQs, o físico Francisco Caruso explicava os fenômenos apresentados nas histórias e durante a conferência, Maurício de Souza afirmou que as situações abordadas pelas histórias em quadrinhos retratam situações do cotidiano das crianças; e que as histórias da Turma da Mônica fazem parte da formação das últimas quatro gerações, por isso a importância de sempre apresentar questões instrutivas, e não apenas divertidas. Eu nem tinha passado no vestibular, mas gostei da ideia desta combinação de áreas e acho que mantive isso armazenado para utilização posterior. Fato é que, durante a graduação, lembrei-me daquele simpósio e decidi trabalhar com quadrinhos no TCC. Sempre que tocava no assunto com alguém costumava ouvir que era fácil trabalhar com isso, que era só pegar quadrinhos da Mônica ou da Mafalda com uma situação, e contextualiza-los com uma questão da Física. No entanto, não era isso que eu queria: eu queria produzir minhas próprias historietas com o objetivo de ensinar Física e incentivar os alunos ao estudo dessa disciplina tão complexa. Surgiu, então, a ideia de unir uma suposta habilidade de desenhar surgida em tenra idade deste autor, já durante o ensino infantil - com o ensino de Física. Sou pretensioso e achava que não poderiam ser apenas para ilustrar ou introduzir um fenômeno físico e/ou um problema e nem como motivação para o ensino de Física apenas. Elas tinham que ter algo a mais, ou seja, motivar e ilustrar não deveriam ser seus principais objetivos. Entretanto, naquele momento, eu não tinha a menor ideia de qual deveria ser o principal objetivo delas. xviii Procurei o professor Francisco Caruso para ser meu co-orientador naquele trabalho. Ao mesmo tempo, eu estava envolvido com o PIBID, programa através do qual comecei a prática docente e no qual vim a perceber, entender e conhecer mais de perto as abordagens de ensino. Foi então que defini o principal objetivo das tirinhas: As histórias em quadrinhos tinham que promover a formação cidadã responsável dos alunos e a reflexão dos alunos sobre o conhecimento científico e tecnológico. Não poderiam ser aulas tradicionais disfarçadas de tirinhas. Foi quando compartilhei minhas ideias com a profa. Dra. Deise Miranda Vianna, e chegamos à proposta de produzir historietas com ênfase em CTS que promovessem a argumentação na sala de aula para que, assim, os objetivos principais das tirinhas pudessem ser alcançados. As tirinhas deveriam fazer uma pergunta na sua narrativa ou aguçar a curiosidade do aluno (leitor); e deveria ter outras perguntas fora da tirinha, porém, essas não deveriam ser perguntas ou questões fechadas, elas deveriam ser mais amplas para que com elas fossem geradas novas questões e discussões sobre o assunto dentro da proposta de ensino por investigação e argumentação da sala de aula. Além disso, os quadrinhos deveriam abordar a ciência presente no cotidiano e possivelmente sua relação com a sociedade em que vivemos. Ou seja, as tirinhas estariam sob a ênfase de CTS. Demorou um pouco e foi preciso muito estudo das teorias dos quadrinhos e do conhecimento físico para eu entender essas propostas e conseguir casá-las com os quadrinhos. Como era de se esperar, no início, foi difícil produzir e pensar em situações e perguntas abertas para as tirinhas que englobassem todos esses aspectos. Mas, o grupo PROENFIS estava estudando o livro 10 Ideas Claves: Competencias en argumentación y uso de pruebas (JIMENEZ-ALEIXANDRE, 2010), e através dele fiquei conhecendo o trabalho de Brenda Keogh, intitulado “Concept Cartoons”, que apresenta desenhos em forma de pôster colocados nos espaços de propaganda do metrô de Londres, com algumas situações do dia a dia com a pergunta “What do you think?”. O intuito desse trabalho é promover o entendimento e o interesse do público nas ciências (KEOGH ET AL, 1998). O trabalho de Brenda era muito parecido com o que eu desejava fazer. No nosso trabalho também deveriam ser apresentadas situações do cotidiano, e, como nos desenhos do metrô de Londres, eles deveriam apresentar outras questões, que estão relacionadas com situações ou com fenômenos do cotidiano. Assim, nasceu o projeto FQ. E começou assim, a produção xix das tirinhas intituladas Física em Quadrinhos (SOUZA, 2012a) e deu-se, desta forma, a minha entrada nesses dois campos de conhecimentos: Ensino de Física e Quadrinhos. Durante o andamento do projeto era necessário escolher um tema das áreas da Física, pois o tempo para produzir e escrever a monografia era muito curto, além disso, era importante seguir uma sequência didática para que, no futuro, fosse mais fácil avaliá-las. A escolha da Óptica deu-se através de uma pesquisa rápida nos trabalhos envolvendo física e ensino com quadrinhos. Essa pesquisa me levou a concluir que existiam poucos quadrinhos usados sobre este tema. O tema de preferência da maioria era mecânica e eletricidade. Como, por exemplo, Guia Mangá, em que nenhum dos quatro livros com os temas da Física, é de Óptica (Física Geral, Eletricidade, Relatividade e Universo). Ou ainda, a Introdução Ilustrada à Física de Larry Gonick e Art Huffman que trata da Mecânica, Eletricidade e Magnetismo. Então, por esse motivo, escolhi lidar com o tema a Óptica. Porém, a Óptica é um tema muito extenso e era necessário filtrar ainda um pouco mais. Os espelhos planos, o mundo mágico e de ilusões que eles produzem sempre me fascinaram. Essas características feéricas dos espelhos inspiraram muitos escritores. O mais conhecido deles, Lewis Caroll, tratou disso no livro “Alice através dos espelhos” (CAROLL, 2009). Esse livro me influenciou muito, assim como, me influenciou um jogo de computador e vídeo game chamado Prince of Persia. A situação exagerada do quadrinho na Figura 1, por exemplo, na qual o menino atravessa o espelho e cumprimenta seu reflexo foi inspirado num evento acontecido no jogo Prince of Persia, como podemos ver a seguir. xx Figura 1 – Tirinha Posição da Imagem II No percurso da aventura, o caminho do príncipe é bloqueado por um espelho (Figura 2). Na época, eu não fazia a menor ideia de como quebrar ou tirar aquele espelho do caminho. Já entediado pelo interrompimento repetitivo naquele ponto do jogo, resolvi fazer o jogador pular através do espelho. Foi então que o príncipe da Pérsia atravessou, e seu reflexo apareceu do outro lado do espelho. Lembro-me que aquele foi o primeiro momento em que as estórias de ficção com os espelhos e sua magia começaram a me intrigar. Surge, assim, meu interesse por histórias com espelhos. Por isso, mais tarde, fui levado a conhecer os livros de Lewis Caroll. xxi Figura 2 – Cena do jogo Prince of Persia que inspirou a tirinha Posição da Imagem II Durante as pesquisas sobre qual tema da Óptica escolher e abordar no TCC, lembrei-me desse livro e do jogo, e decidi pelo espelho plano, porque, além disso, era um dos assuntos iniciais e seria mais interessante aplicar e avaliar as historietas no início do curso de Óptica do que no final do curso. A título de ilustrar que a pesquisa não acaba nunca, cito que recentemente, conheci a revista “Mandrake, o mágico: o mundo dos espelhos e outras histórias de Lee Falk e Phil Davis” (FALK e DAVIS, 2013), cuja principal história é sobre uma lenda que fala sobre a existência de dois reinos em guerra, e nos quais os perdedores são obrigados a viver dentro do espelho imitando os vencedores. Esta é uma revista muito interessante, que conheci mais tardiamente, mas que teria me influenciado muito positivamente se a tivesse conhecido à época da construção dos quadrinhos. Esses foram os motivos para a escolha do conteúdo que seria abordado nas tirinhas. Mas, é importante salientar que dentro desta proposta de utilização de quadrinhos podem ser produzidas tirinhas sobre todos os assuntos da Física, e de qualquer outro assunto, basta pesquisar o tema e as situações que envolvem tema, e entender a estrutura dessa forma de arte, para dar a ela finalidades didáticas. xxii INTRODUÇÃO Para Eisner (1999) e outros teóricos das artes sequenciais, as primeiras artes sequenciais (histórias em quadrinhos ou narrativas gráficas) vêm dos homens da caverna, que usavam imagens primitivas como forma de linguagem. Os contadores de história das tribos de civilizações antigas eram professores, que preservando o conhecimento passavam-na de geração para geração. Nos Estados Unidos, elas tinham uma fácil linguagem e de fácil entendimento da língua inglesa para a maioria de sua população migrante, trabalhadora, semi-analfabeta que precisava aprender o idioma do Novo Mundo (ARAGÃO, 2002). Como a mídia usava os personagens das HQs se comunicando num inglês mais coloquial e de fácil compreensão, isso alavancou significativamente a venda de jornais no final do século de XIX. Assim é muito fácil entender porque é uma ferramenta de comunicação em massa tão importante e popular. Os quadrinhos têm temáticas diversas, desde ficção cientifica e fantástica até as que ilustram fatos do cotidiano (ARAGÃO, 2002). Sabendo disso, esse projeto buscou utilizar os quadrinhos produzidos por Souza (2012a) no seu trabalho de conclusão de curso de Licenciatura em Física da UFRJ. Física em Quadrinhos é um projeto que visa promover uma discussão sobre temas da Física, entre os alunos e entre os alunos e o professor. As tirinhas foram criadas com intuito de levantar questões sobre fenômenos físicos. Baseamo-nos no trabalho de Brenda Keogh, intitulado Concept Cartoons, que apresenta desenhos em forma de pôster colocados nos espaços de propaganda do metrô em Londres, com algumas situações do dia a dia em conjunto com a pergunta “What do you think?”, e com o intuito de promover o entendimento e o interesse público na ciência (Keogh et al, 1998). Assim como “Concept Cartoons”, o projeto “Física em Quadrinhos” apresenta situações do cotidiano. Além disso, como nos desenhos do metrô de Londres, são apresentadas outras questões, que estão relacionadas com a situação ou com o fenômeno. A forma de abordagem desenvolvida no presente projeto visa a formação cidadã dos alunos e que pode ser desenvolvida em qualquer disciplina, e em todos os níveis acadêmicos. Podendo seguir as diversas propostas apresentadas em Vergueiro e Rama (2004) para o ensino de Língua Portuguesa, História, Geografia, História e Artes. Ou ainda, como exemplo, os outros títulos da Série Guia Mangá: Bancos de Dados, Estatística, Cálculo, Bioquímica, Biologia Molecular e Álgebra xxiii Linear. O projeto foi desenvolvido a partir da pesquisa sobre os pressupostos do enfoque CTS, explicitando-os através dos resultados das pesquisas com atividades investigativas. Hoje observamos que os quadrinhos estão na moda com o surgimento de diversos geradores de tirinhas disponíveis na internet que retratam situações cômicas do nosso cotidiano, porém ainda sem cunho cientifico ou pedagógico. A Física em Quadrinhos é uma construção que visa atender aos pressupostos acima, proporcionando um ensino de Física mais contextualizado, porque não dizer, mais divertido. Essa nova forma de utilização dos quadrinhos como recurso didático precisa ser avaliada, assim como muitas outras atividades com quadrinhos. Pois, muitas vezes a avaliação dos HQs é só feita pelas suas características atrativas e motivacionais. Acreditamos que os quadrinhos podem ser avaliados pelo potencial pedagógico e pelo fato de favorecer a construção de conhecimento pelos alunos através da interação social e da argumentação na sala de aula. Por isso, algumas tirinhas foram avaliadas e os resultados serão apresentados nesta dissertação. Neste trabalho no capítulo 2 serão apresentados os delineamentos da pesquisa como as perguntas, o pressuposto e os objetivos; os referenciais teóricos que serviram de suporte para abordagem do material quando foi desenvolvido e agora que foi avaliado (capítulo 3). No capítulo 4 será exposto o conteúdo da Física escolhido como tema para as tirinhas. Além disso, são exibidas as concepções alternativas relacionadas ao tema. No capítulo 5 o material e o método de aplicação e as expectativas da pesquisa são apresentados. Na metodologia da pesquisa são justificadas algumas das escolhas tomadas, além de serem discutidos quais são e como serão trabalhados dos dados coletados. No sexto capítulo as análises segundo os objetivos de cada um dos quadrinhos são expostas. A última parte deste trabalho corresponde às considerações finais. Justificativa O uso das histórias em quadrinhos no ensino já é reconhecido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) (BRASIL, 1996) e pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) (BRASIL, 2002). Vergueiro e Rama (2004) referem que: "existem vários motivos que levam as histórias em quadrinhos a terem um bom desempenho nas escolas, possibilitando resultados muito melhores do que aqueles que se obteria sem elas”. Os alunos gostam dos quadrinhos, pois é uma forma de xxiv texto que já está inserida no cotidiano deles. Nesse sentido, os professores não teriam dificuldade alguma em utilizá-los na sala de aula. Eles apresentam alto nível de informação e podem ser explorados pelo professor e discutidos entre os alunos, podendo ser veículo e fonte de informação para ser trabalhada em sala de aula. Além disso, estimulam e desenvolvem o hábito da leitura, enriquecendo também o vocabulário do aluno (VERGUEIRO E RAMA, 2004). É possível brincar com as histórias que já existem e reestruturá-las de forma lúdica para que alcancem o objetivo específico do professor. Tendo uma linguagem própria, é muito importante conhecer o conjunto de signos que envolvem essa forma de texto. Vergueiro e Rama (2004) sugerem uma "alfabetização" da linguagem dos quadrinhos, para que o professor e os alunos possam aproveitar da melhor forma os recursos das tirinhas. Para Eisner (1999), os quadrinhos usam uma linguagem que demanda a experiência visual comum entre o leitor e o criador, mas que seja de compreensão fácil e que a leitura tenha uma ampla aplicação. É interessante descrever algumas das características e recursos dos quadrinhos, a fim de produzir tirinhas que estejam de acordo com o objetivo do professor. Essa linguagem estimula a imaginação e a construção de significados. E por isso, os professores e os alunos devem explorar essas características a fim de potencializar os recursos didáticos das HQs e o nível de comunicabilidade entre eles. Ainda outro motivo relevante sobre a linguagem quadrinhística é que, ao promover o pensamento e a imaginação do aluno, essa linguagem favorece a discussão e a argumentação em sala de aula. Essa é uma das metas das tirinhas do projeto FQ. As tirinhas do projeto FQ retiram de situações do cotidiano a oportunidade para levantar uma questão sobre determinado fenômeno físico. Ou seja, formam um conjunto com outras questões que são relacionadas com uma situação ou fenômeno para tentar entendê-lo e/ou resolvê-lo. Isso reforça a ideia de Keogh et al (1998) que sugere que os personagens das tirinhas apresentem pontos de vista alternativos sobre a ciência envolvida na situação, e que convidem os alunos a se juntar ao debate com eles. Nas tirinhas desse projeto, são valorizadas e exploradas as competências ligadas à habilidade de leitura e à capacidade de avaliar o conhecimento e a argumentação. Segundo Jiménez-Aleixandre (2010), argumentar é: "a capacidade de avaliar o conhecimento e o desenvolvimento do pensamento critico, são partes das contribuições da argumentação a competência básica e o objetivo da educação". Acreditamos na argumentação na sala de aula, pois, estes xxv estudos dizem que o discurso ajuda a desenvolver a prática social. Capecchi e Carvalho (2000) esclarecem que dentro desse processo de construção do conhecimento científico, os alunos entram em contato com o reconhecimento entre afirmações contraditórias, identificação de evidências e confronto de evidências com teorias. Para que isso aconteça, as tirinhas devem estar de acordo com as proposta de ensino por investigação. Com as atividades investigativas, os alunos podem agir discutir, refletir e relatar, e não simplesmente se resumir à manipulação ou observação do fato. Para Borges (2002), "A ideia central é: qualquer que seja o método de ensino-aprendizagem escolhido, deve mobilizar a atividade do aprendiz, em lugar de sua passividade". Essa forma de trabalhar com as histórias em quadrinhos visa quebrar essa passividade e construir uma postura reflexiva nos alunos. As tirinhas reflexivas são aquelas que não apenas ilustram ou introduzem um conteúdo escolar, elas buscam a reflexão e o pensamento crítico sobre um fenômeno físico para que, no futuro, o aluno possa entender os benefícios da tecnologia gerada por esse conhecimento científico. Ele poderá inclusive se posicionar sobre a necessidade ou não dessa ou daquela tecnologia. Quando um trabalho com quadrinhos no ensino apresenta como avaliação apenas que ‘os alunos gostaram da atividade’ ou que ‘as tirinhas são divertidas’, esse tipo de referência avalia apenas o caráter ilustrativo e motivacional das histórias em quadrinhos. Porém, o uso dos quadrinhos não está restrito a isso. Como já referimos, elas possuem características reflexivas que devem ser avaliadas. No entanto, faltam trabalhos que qualifiquem a reflexão que as tirinhas podem propor. Mas, podemos citar Cabelo et al (2010) que utiliza uma história em quadrinhos para informar e conscientizar os leitores sobre a hanseníase. Esse trabalho foi avaliado através de entrevista pré e pós-aplicação da HQ. Este trabalho se justifica à medida que visa avaliar de forma mais aprofundada as historietas do projeto FQ, as quais foram pensadas para ter uma característica reflexiva. As análises apresentadas neste trabalho têm o objetivo de verificar se elas cumprem esse papel. A reflexão crítica, social e a formação cidadã já foram objetivo das artes sequenciais em sua origem, quando os quadrinhos surgiram nos jornais americanos, os desenhos nas tapeçarias europeias entre outros, isso será explicado nos referenciais teóricos. A FQ é o resgate desse objetivo de forma que se possa construir o conhecimento científico e discutir a importância desse conhecimento na formação de um aluno cidadão. xxvi O modelo de Toulmin (2006) é uma excelente ferramenta de compreensão da estrutura e da função da argumentação na construção do conhecimento científico. Essa ferramenta será usada para avaliar as discussões dos alunos e com isso o potencial da FQ para promover a interação e o pensamento crítico, ou seja, para verificar se as tirinhas são um ambiente que propicia a ação e a reflexão do aluno ao invés de sua passividade. xxvii 1 1 DELINEAMENTOS DA PESQUISA 1.1 Perguntas Sabendo que as histórias em quadrinhos já tiveram como objetivo instruir a sociedade, como (podemos) usá-las no ensino de Física? Como (podemos) avaliar o seu emprego nas salas de aula para que contribuam melhor na aprendizagem em Física? 1.2 Pressuposto As tirinhas e as histórias em quadrinhos são uma forma de comunicação e de transferir uma informação, por isso elas podem ser usadas para construir um conhecimento de Física. 1.3 Objetivos 1.3.1 Objetivos Gerais Utilizar as tirinhas (ou quadrinhos), produzidas por SOUZA (2012a), sobre Leis da Reflexão, em situações do dia a dia, a fim de verificar a aprendizagem dos alunos na disciplina de Física. 1.3.2 Objetivos específicos • Analisar a percepção e a discussão dos alunos sobre as tirinhas e suas atividades para verificação da aprendizagem e sua eficácia; • Reformular e reorganizar as atividades e as tirinhas de acordo com os resultados; 2 2 REFERENCIAIS TEÓRICOS 2.1 Quadrinhos no ensino Os quadrinhos, histórias em quadrinhos, tirinhas e as historietas são algumas das formas das artes sequenciais 1, que têm seu sentido na sequência de imagens e da relação entre essas imagens e determinado texto ou narrativa. Sua origem é ainda muito controversa. Para Eisner (2008), as primeiras artes sequenciais vêm dos homens da caverna, que usavam imagens primitivas como forma de linguagem. Os contadores de história das tribos eram os professores, que preservavam o conhecimento passando-o, oralmente, de geração para geração. Scott McCloud (2005) completa dizendo que as histórias eram contadas através da sequência de imagens como em tapeçarias europeias, em manuscritos de parede dos maias e egípcios, e vitrais de igrejas. Os precursores dos quadrinhos modernos foram o professor suíço Rudolph Töpffer, Ângelo Agostini, desenhista italiano naturalizado brasileiro, e o poeta alemão Wilhelm Busch. Töpffer produziu as primeiras literaturas em estampas em 1846. Eram histórias feitas de uma série de desenhos, e cada desenho era acompanhado por uma ou duas linhas de texto. Esse autor afirmava que os desenhos sem os textos teriam um significado obscuro, e que sozinho o texto nada significaria (Figura 3). Wilhelm Busch criou os meninos travessos: Juca e Chico (no original, Max und Moritz). Eles eram travessos e arranjadores de encrenca, por esse motivo eles foram criticados pelos pedagogos, assim como todas as produções posteriores dos quadrinhos que apresentavam crianças levadas (Figura 4). No Brasil, as histórias deles foram traduzidas por Olavo Bilac. 1 Arte sequencial é um termo criado por Will Eisner para designar toda e qualquer arte que utiliza conjunto de imagens ou fotos para narrar uma história. As histórias em quadrinhos são um tipo de arte sequencial assim como os vitrais das igrejas, as fotonovelas, os hieróglifos egípcios, as tapeçarias de Bayeux e as pinturas em sequencia de Monet. Para McCloud (2005), artes sequenciais são: “imagens pictóricas e outras justapostas em sequencia deliberada destinadas a transmitir informações e/ou produzir uma resposta no espectador”. 3 Figura 3 – M. Vieux-Bois, história ilustrada de Rudolph Töpffer Fonte: MOYA, 1986, p. 11 Figura 4 – Juca e Chico, personagens criados por Wilhelm Busch Fonte: MOYA, 1986, p. 15 No Brasil, as primeiras HQs foram “As aventuras de Nhô Quim, Ou Impressões de Uma Viagem à Corte”, publicadas pelo italiano naturalizado brasileiro Ângelo Agostini em 1864. Com um personagem fixo que dava nome à publicação (Figura 5). 4 De acordo com Aragão (2002), “nada havia de parecido no Brasil até então: uma história única, em capítulos semanais voltados sempre para o mesmo protagonista, onde um segmento estava diretamente ligado ao anterior” (p.122). Essas estórias tinham um caráter de ironizar a sociedade da época e suas tendências de copiar os costumes europeus. Elas serviam para conscientizar a sociedade. Aragão (2002) complementa dizendo que: “trata-se de um convite à reflexão e à análise de uma nacionalidade ainda em construção, de uma cidade que se desejava metrópole e flertava com a revolução industrial, mas que tinha um pé bem fincado no roçado, nas plantações, e que dali retirava seu sustento” (p. 123). Figura 5 – As cobranças, uma das primeiras histórias ilustradas de Ângelo Agostini antes das aventuras de Nhô Quim Fonte: MOYA, 1986, p. 19 As HQs eram historicamente utilizadas para passar informação e também como meio de comunicação antes mesmo do crescimento da imprensa americana, quando surgiram os suplementos dominicais Yellow Kid (O Menino Amarelo) de Richard Fenton Outcault em 1896. Outcalt se apropriou das ideias preexistentes sobre o assunto e incorporou o balão como local no qual ficavam as falas dos 5 personagens, com exceção das falas do próprio menino amarelo, que eram exibidas em um camisão. Segundo Moya (1972), os editores perceberam uma preferência, por parte do público, pelos textos com imagens. Moya (1972) comenta que: Nesse momento histórico, nasciam duas coisas importantes: os comics como os concebemos hoje, com personagens periódicos e seriados; e o termo “jornalismo amarelo” para designar a imprensa sensacionalista, em busca do sucesso fácil com o grande público. Na verdade, tratava-se, nada mais nada menos, do que uma reação de conservadores que temiam a divulgação dos fatos de maneira massiva, através de uma imprensa cada vez mais popular, cada vez mais ao alcance de todos. (p. 36) A mídia usava os personagens das HQs comunicando- se em um inglês mais coloquial e de mais fácil compreensão, o que para a maioria da população migrante, trabalhadora, semi-analfabeta facilitava no processo de aprendizagem do idioma do Novo Mundo (ARAGÃO, 2002). Esse fato alavancou significativamente a venda de jornais no final do século de XIX. Assim, é muito fácil entender porque a HQ é uma ferramenta de comunicação de massa tão importante e popular, podendo, por essa razão, ser usada para instruir e transferir uma informação. 2.1.1 As histórias em quadrinhos como recurso didático O interesse das universidades sobre as vantagens das historietas na educação começou na década de 60 com os europeus. Segundo Moya (1986): A relação dos quadrinhos com as crianças e adultos foi amplamente estudada. E os primeiros trabalhos sectários sobre o tema se tornaram estudos científicos, feitos para a UNESCO, tentando utilizar a linguagem dos comics para fins educacionais. Os cientistas chegaram a medir a retina das crianças diante dos efeitos da onomatopeia para determinar quais quadros provocavam maior reação e poderiam ser utilizados em livros didáticos. (p. 7) Vergueiro (2005), entretanto, refere que o Brasil foi o pioneiro no estudo das histórias em quadrinhos na universidade. Exemplifica sua afirmação com o evento da organização da I Exposição Internacional de História em Quadrinhos em 1951; a criação da primeira disciplina sobre histórias em quadrinhos na UnB (Vergueiro, 6 2005) e os primeiros livros paradidáticos e didáticos que haviam fragmentos ou páginas inteiras de HQs publicados pelo Instituto Brasileiro de Edições Pedagógicas (IBEP) na década de 60 (CALAZANS, 2004). Durante esse início de processo, o emprego das tirinhas e das HQs no ensino sofreu muito preconceito por parte dos pais, dos educadores e de muitos acadêmicos, que achavam que as HQs deixavam as crianças desleixadas e por as acharem levianas. Vergueiro (2005) disserta que a “acusação de leviandade, de peculiaridade e de extravagância podiam correr em função de qualquer pretensão mais séria ao estudar as histórias em quadrinhos” (Vergueiro, 2005, p. 15). De acordo com Cirne (2000) apud Caruso e Silveira (2009), esse preconceito continua: Apesar disso, no início do século XXI o vemos afirmar que o preconceito artístico e cultural contra as HQ ainda é inegável. No fundo, trata-se de um preconceito mesquinho, para dizer o mínimo, a partir, na maioria das vezes, da mais simples e elementar desinformação (CIRNE, 2000, p.17 apud CARUSO E SILVEIRA, op. cit., p. 218) Abrahão (1972), no entanto, refere que: “qualquer gênero de obras, seja no romance ou no teatro, no cinema ou na poesia, apresenta produções das mais diversas qualidades: ao lado de inúmeras obras de pouco valor literário ou moral, frequentemente nocivas, existe sempre boa parcela que se salva” (p.139). Com os quadrinhos isso não é diferente. Existem diversos quadrinhos e formas de utilizá-los na sala de aula. Felizmente, esse preconceito tem diminuído, já que existe um crescente número de educadores que enxergam nelas a capacidade de atrair os jovens. O código de ética dos quadrinhos também ajudou nisso, onde podemos destacar alguns itens como motivadores do uso das HQs na educação: (i) as histórias em quadrinhos devem ser um instrumento de educação, formação moral, propaganda dos bons sentimentos e exaltação das virtudes sociais e individuais; (ii) não devendo sobrecarregar a mente das crianças como se fosse um prolongamento do currículo escolar, elas 7 devem, ao contrário, contribuir para a higiene mental e o divertimento dos leitores juvenis e infantis; (iii) é necessário o maior cuidado para evitar que as histórias em quadrinhos, descumprindo sua missão, influenciem perniciosamente a juventude ou deem motivo a exageros da imaginação da infância e da juventude; e (iv) as histórias em quadrinhos devem exaltar sempre que possível, o papel dos pais e dos professores, jamais permitindo qualquer apresentação ridícula ou desprimorosa de uns ou de outros. (SILVA, 1976 apud VERGUEIRO E RAMA, op. cit., p. 14). Hoje, o uso das historietas (ou tirinhas) no ensino é reconhecido pela LDB e pelos PCNs. Vergueiro e Rama (2004) descrevem que: “existem vários motivos que levam as HQs a terem um bom desempenho nas escolas, possibilitando resultados muitos melhores do que aqueles que se obteria sem elas.” Vejamos, resumidamente, alguns deles: (i) Os estudantes querem ler os quadrinhos – estes já estão inseridos no cotidiano do aluno, ou seja, os professores não teriam dificuldade nenhuma em utilizá-los na sala de aula; (ii) Palavras e imagens, juntos, ensinam de forma mais eficiente – a interligação amplia a compreensão de conceitos de uma forma de comunicação que qualquer outra teria dificuldades para se atingir; (iii) Existe um alto nível de informação nos quadrinhos – eles debruçam sobre os mais diversos temas, sendo facilmente aplicáveis em qualquer área. As HQs oferecem um leque de informações passíveis a serem discutidas em sala de aula, desde os temas de ficção científica até os documentários ou estórias reais; (iv) As possibilidades de comunicação são enriquecidas pela familiaridade com as histórias em quadrinhos; (v) Os quadrinhos auxiliam no desenvolvimento do hábito de leitura – eles estimulam e desenvolvem o hábito da leitura, e hoje se sabe que os leitores de quadrinhos também leem outros tipos de revistas, de jornais e de livros. Amplia assim, a familiaridade com a leitura e se concentrando melhor na leitura; (vi) Os quadrinhos enriquecem o vocabulário dos estudantes – as HQs são criadas numa linguagem de fácil entendimento, com muitas expressões 8 que estão presentes no cotidiano dos leitores; ao mesmo tempo são introduzidas novas palavras para descrever novos assuntos, ou seja, os quadrinhos enriquecem o vocabulário do aluno; (vii) O caráter elíptico 2 da linguagem quadrinhística obriga o leitor a pensar e imaginar – talvez esse seja o motivo favorável para o emprego das HQs no ensino. Esse motivo está em harmonia com os objetivos do enfoque em CTS e a proposta de atividades investigativas; (viii) Os quadrinhos têm um caráter globalizador – por estar veiculado no mundo inteiro, os quadrinhos trazem temáticas que têm condições de ser compreendidas por qualquer aluno, sem a necessidade de um conhecimento anterior específico; (ix) Os quadrinhos podem ser utilizados em qualquer nível escolar e com qualquer tema – não existem limites para o aproveitamento das HQs desde os anos iniciais até os anos mais avançados de ensino. São essas as vantagens de se trabalhar com tirinhas. Segundo Vergueiro e Rama (2004): “Outros poderiam ser acrescentados, é claro. Porém, mais do que listar vantagens, talvez seja interessante fechar essa discussão lembrando duas características bastante pragmáticas do aproveitamento dos quadrinhos em ambiente escolar: acessibilidade e baixo custo” (p. 25). Calazans (2004) apresenta alguns exemplos de quadrinhos usados como material didático, que englobam publicações de utilidade pública, educacional, institucional ou de disseminação de ideias em geral. Alguns dos exemplos são guias, manuais comunicando desde os direitos trabalhistas até sobre como evitar a proliferação de mosquitos; e suplementos que contam a vida de personagens da história brasileira. Porém, em sua maioria, esses exemplos de historietas apresentadas por Calazans (2004) são descritas por ele como: monótonas, cansativas e pouco envolventes. 2 Na construção de uma narrativa gráfica são necessárias algumas escolhas de momentos importantes na narrativa, deixando assim, alguns elementos a cargo da imaginação do leitor. O caráter elíptico que se referem os autores se trata da omissão de uma ou mais elementos, facilmente subentendíveis na narrativa. 9 Os quadrinhos são muito comuns na internet, e retratam os mais diferentes tipos de situações cômicas do nosso cotidiano, porém ainda fazem isso sem nenhum cunho cientifico ou pedagógico. Além disso, também por causa da internet, tornou-se muito mais acessível conseguir tirinhas e HQs escaneadas para utilização em sala de aula. Para Aragão (2002), o advento da internet e dos softwares gráficos ajudam ainda mais na produção e na utilização das tirinhas (ou quadrinhos) na educação tornando a questão da acessibilidade ainda maior. 2.1.2 O uso das histórias em quadrinhos no ensino de ciências Muitos pesquisadores e estudiosos de histórias em quadrinhos consideram Buck Rogers como um dos primeiros heróis de ficção científica retratado em HQs. O herói criado por Philip Francis Nowlan teria direcionado os olhares dos investidores para as tiras com temáticas científicas. Segundo Gresh e Weinberg (2005) muitos aparatos tecnológicos foram idealizados primeiro nos quadrinhos, e depois foram produzidos por cientistas. Esses temas da Ciência podem ser explorados pelo professor e discutidos com os alunos. Para a utilização dos quadrinhos em sala de aula não existem regras. E se houvesse, as únicas seriam: a criatividade do professor e seu bom senso em utilizálos para alcançar seus objetivos de ensino. Normalmente, é observado que as historietas são utilizadas para introduzir um assunto ou conteúdo que depois será desenvolvido em uma aula tradicional ou por outro meio. Essa utilização será classificada como introdutória. Podem também ser utilizadas para aprofundar um conceito já apresentado (as conteudistas), para promover discussões sobre um assunto (as reflexivas), para exemplificar uma ideia (as ilustrativas) e como forma de tratamento lúdicas (as motivacionais). Vergueiro e Rama (2004) assinalam que: “Em cada um desses casos, caberá ao professor, quando do planejamento e desenvolvimento de atividades na escola, em qualquer disciplina, estabelecer a estratégia mais adequada às suas 10 necessidades e às características de faixa etária, nível de conhecimento e capacidade de compreensão de seus alunos” (p. 26). No ensino de Ciência, em especial de Física, temos diversos exemplos de tirinhas ou HQs como material didático. Os mais comuns são as atividades que utilizam quadrinhos consagrados como os da Turma da Mônica, Garfield, Mafalda, Peanuts, entre outros; e acrescentam perguntas e questões abertas ou fechadas sobre o conteúdo ilustrado na tirinha. Essas atividades com os quadrinhos são, muitas vezes, introdutórias e motivacionais, e não exploram o verdadeiro potencial dessa arte. Pode ser observado esse tipo de uso em livros didáticos e em exames de vestibular. Outra forma de utilização das historietas são livros ou revistas feitas propriamente para introduzir os conteúdos. Esses livros ilustrados têm como proposta fugir dos livros tradicionais; no entanto, estranhamente, eles tratam os conteúdos de forma semelhante aos livros didáticos tradicionais. Trata-se, muitas vezes, de livros didáticos bem ilustrados, empolgantes, altamente educacionais e com toque de humor, mas continuam apresentando basicamente fórmulas e exercícios. Exemplos desse tipo de uso é a Introdução Ilustrada à Física e The Cartoon History of the Universe de Larry Gonick; e a série Guia Mangá, escrito por cientistas ou matemáticos japoneses com amplo conhecimento na área com ilustração feita por profissionais de mangás. Existem, talvez em menor número, os quadrinhos que são produzidos pelos professores ou pelos alunos. Esses divergem na forma de uso e na abordagem, porém, em sua maioria, são conteudistas, ilustrativas e/ou motivacionais. São motivacionais, porque motivam os alunos e o professor a buscar formas de abordar o assunto na tirinha e para isso é necessário pesquisar e estudar o tema. Ilustrativas porque geralmente são utilizadas para ilustrar uma ideia sobre o conceito, porém, se bem exploradas pelo professor poderiam ser usadas para avaliar alguns conceitos errôneos ou dúvidas do aluno. Finalmente, conteudistas porque, tanto o aluno 11 quanto o professor, estão presos a um conteúdo ou uma abordagem tradicional, o que pode dificultar a incorporação do tema científico fora desse conteúdo fechado. Qualquer um dos “métodos” de uso dos quadrinhos pode ser desenvolvido e abordado através da reflexão sobre o assunto e a promoção do diálogo entre os alunos e o professor. Os quadrinhos reflexivos são amplamente difundidos no mundo inteiro. 2.1.3 Concept cartoons Os Concept Cartoons (desenhos conceituais) são desenhos de quadrinho únicos que mostram situações cotidianas, nele os personagens apresentam pontos de vista distintos e alternativos sobre a ciência numa dada situação. Essa abordagem de utilização dos quadrinhos inspirou na concepção das tirinhas do projeto Física em Quadrinhos. Os desenhos de Concept Cartoons têm o objetivo de convidar os alunos a participar do debate com os personagens, escolhendo seu ponto de vista, e assim, provocar investigações que ajudem a decidir qual, dos pontos de vista apresentados, é mais aceitável (KEOGH et al, 1998 e KEOGH e NAYLOR, 1999a;b). Desenhos conceituais foram colocados nos metrôs de Londres, e vêm acompanhado da questão What do you think? (O que você acha?). A autora acredita que os desenhos infantis e a fascinante questão ajudam a mostrar a importância da Física em nossas vidas e seu poder de explicar porque as coisas acontecem dessa ou daquela maneira. A Figura 6 é um exemplo de desenhos conceituais. 12 Figura 6 – Concept Cartoons versão pôster do metrô Fonte: Keogh e Naylor, 1998, p. 6. 3 No primeiro balão, o menino adverte que se colocar o casaco no boneco de neve, ele vai derreter. Ele representa a concepção alternativa de que o casaco esquenta. A menina, segundo balão, fala que colocar o casaco não vai fazer menor diferença em relação ao derretimento do boneco. No último balão, o menino que segura o casaco fala que na opinião dele, o casaco manterá o boneco frio, e por isso, vai parar o derretimento. O último menino representa o conhecimento científico, pois, o casaco não “esquenta”, ele só impede a troca de calor da nossa pele com o ambiente. No caso do boneco, o agasalho vai manter a temperatura da neve impedindo a troca de calor com o ambiente. Porém, temos que ter em mente que esse isolamento térmico não é perfeito, por isso, o pensamento do menino de que ele para de derreter está errado, ele vai derreter mais lentamente. Os desenhos conceituais não empregam humor e sátira, como normalmente é visto nas charges ou nas tirinhas de humor. Eles têm a característica de usar o mínimo de texto para tornarem-se mais acessíveis aos alunos com competência limitada de leitura. Como apresentam muitos pontos de vista sobre uma situação do cotidiano, o ponto de vista cientificamente correto é incluído entre as alternativas. Além disso, 3 Diálogos dos balões: - Não coloque o casaco no homem neve, isso o derreterá. - Eu não acho que isso fará alguma diferença. - Eu acho que isso o manterá frio e interromperá seu derretimento. 13 eles são apresentados de forma imparcial para que os alunos não possam adivinhar a alternativa correta. Por exemplo, todas as opiniões são apresentadas por crianças, pois, se um adulto ou professor aparece falando umas das alternativas, os alunos ou o leitor poderiam suspeitar que fosse a alternativa correta. Os Concept Cartoons seguem a forma de questões de múltiplas escolhas, mas diferente do habitual, os desenhos integram texto escrito em forma de diálogo com um estímulo visual. Por isso, é possível perceber que esse material pode vir a ter características da abordagem reflexiva dos quadrinhos, se for bem utilizado pelo professor. Caso contrário, será semelhante uma questão de múltipla escolha vazia e sem discussão. Além de Brenda Keogh e Stuart Naylor existem muitos outros pesquisadores em diferentes países que desenvolvem trabalhos com Concept Cartoons. Ekici et al (2007) usaram os desenhos para diagnosticar as concepções alternativas dos alunos sobre fotossíntese. Com os desenhos de Keogh e Naylor, esses pesquisadores turcos fizeram os alunos identificar o erro e discutir sobre ele. Estas discussões mostraram que os desenhos de Concept Cartoons podem ser ferramentas eficientes não só para identificar equívocos do estudante como também superá-los. Foi proposto para os alunos construírem seus desenhos conceituais durante a atividade. Chin e Teou (2009) avaliaram o uso dos Concept Cartoons para estimular as conversas e a argumentação entre os alunos em pequenos grupos e para fornecer um diagnóstico sobre os seus conceitos alternativos, de forma muito semelhante a esta pesquisa. Os diálogos entre os alunos foram gravados em áudio e eles poderiam expor suas ideias através de desenhos. Os resultados mostram que as afirmações e as perguntas tinham potencial formativo, pois incentivaram o discurso reflexivo dos alunos. Além disso, esse estudo fala que para otimizar o uso de Concept Cartoons no ensino e na aprendizagem de Ciências, os professores precisam projetar atividades que levem ao pensamento crítico. Existem ainda outros trabalhos que usam os Concept Cartoons, por isso, os usamos com base para a criação de Física em Quadrinhos. 14 2.2 Ciência, Tecnologia e Sociedade De acordo com a LDB (BRASIL, 1996): “A educação escolar deverá vincular- se ao mundo do trabalho e à prática social”. Neste trecho, a LDB indica que a educação básica deve preparar o aluno para enfrentar o mundo em que vive, tornando-o um cidadão consciente e atuante. O enfoque em CTS está nos currículos de ensino de ciências desde os anos sessenta, e tem como conceitos principais: “mostrar a ciência como uma atividade da humanidade, formar um aluno capaz de tomar decisões inteligentes e conscientes” (SANTOS e MORTIMER, 2002). O aluno contemporâneo está imerso em um mundo dominado pelas ciências e a tecnologia, por isso, é justo que ele entenda as modificações causadas a partir delas na sociedade em que vive. É importante advertir que esse objetivo só será alcançado com atividades que promovam a prática e a participação do aluno ao invés da sua passividade e aceitação cega ao conteúdo. Para Aikenhead (1994), o ensino de Ciências é para fazer sentido na vida hoje e para o futuro. Além disso, esse autor acredita que essa abordagem aumenta o interesse geral e público em relação às Ciências; preenchendo lacunas do currículo tradicional e fazendo surgir a responsabilidade social na tomada de decisão coletiva para uma cidadania atenta e informada. Neste aspecto, essa ideia está em ressonância com a corrente da “alfabetização científica”, também comprometida com a formação de um cidadão crítico e reflexivo que sofre interferências, mas que também interfere no processo de aprendizado a ele proposto. 2.2.1 Alfabetização Científica e a formação crítica dos alunos Promover e favorecer uma cultura científica e tecnológica tem sido uma das tendências do ensino de Ciências. Com a alfabetização científica pretende-se desenvolver a racionalidade, a capacidade de observação, preparar e analisar informações. Sasseron e Carvalho (2011) concluem que um cidadão alfabetizado cientificamente é: (...) uma pessoa ser considerada alfabetizada cientificamente deve ter conhecimento das relações entre Ciência e Sociedade; saber sobre a ética 15 que monitora o cientista; conhecer a natureza da ciência; diferenciar Ciência de Tecnologia; possuir conhecimento sobre conceitos básicos das ciências; e, por fim, perceber e entender as relações entre as ciências e as humanidades. (SASSERON e CARVALHO, op. cit., p. 62) A ciência deixa de ser ensinada pura e simplesmente para informar sua existência, e passa a ser uma ferramenta que o aluno poderá usar para compreender o mundo, e modificá-lo. O foco do “ensino da Física” passa a ser centrado em “para que ensinar Física”, deixando de ter, como referencia principal, “o quê ensinar” de Física. Observemos o que nos é apresentado no trecho abaixo, extraído do PCN+ (BRASIL, 2002): (...) Quando “o quê ensinar” é definido pela lógica da Física, corre-se o risco de apresentar algo abstrato e distante da realidade, quase sempre supondo implicitamente que se esteja preparando o jovem para uma etapa posterior: assim, a cinemática, por exemplo, é indispensável para a compreensão da dinâmica, da mesma forma que a eletrostática o é para o eletromagnetismo. Ao contrário, quando se toma como referência o “para que” ensinar Física, supõe-se que se esteja preparando o jovem para ser capaz de lidar com situações reais, crises de energia, problemas ambientais, manuais de aparelhos, concepções de universo, exames médicos, notícias de jornal, e assim por diante (BRASIL, op. cit., p. 61). Sasseron e Carvalho (2011) discursam que a alfabetização científica é o conhecimento de que precisamos nos apropriar para compreender os resultados apresentados pela ciência. Em conjunto com esse pensamento, PCN+ (BRASIL, 2002) sugere que: (...) A Física deve apresentar-se, portanto, como um conjunto de competências específicas que permitam perceber e lidar com os fenômenos naturais e tecnológicos, presentes tanto no cotidiano mais imediato quanto na compreensão do universo distante, a partir de princípios, leis e modelos por ela construídos. Isso implica, também, na introdução à linguagem própria da Física, que faz uso de conceitos e terminologia bem definidos, além de suas formas de expressão, que envolvem, muitas vezes, tabelas, gráficos ou relações matemáticas. Ao mesmo tempo, a Física deve vir a ser reconhecida como um processo cuja construção ocorreu ao longo da história da humanidade, impregnado de contribuições culturais, econômicas e sociais, que vem resultando no desenvolvimento de diferentes tecnologias e, por sua vez, por elas impulsionado (BRASIL, op. cit., p. 59). O objetivo da abordagem de alfabetização científica e ensino de Ciências com enfoque na CTS é formar um aluno cidadão crítico e algumas das competências de um aluno cidadão crítico são: (i) utilizar os conceitos científicos e com isso ser capaz de integrar valores para tomada de decisões responsáveis sobre os impactos da tecnologia na sociedade; (ii) compreender que a sociedade exerce controle sobre as 16 ciências e as tecnologias, bem como que as ciências e as tecnologias refletem a sociedade, e que por meio do viés das subvenções que a elas concede; (iii) reconhecer também os limites da utilização das ciências e das tecnologias para o progresso do bem-estar humano; (iv) conhecer os principais conceitos, hipóteses e teorias cientificas e ser capaz de aplicá-los e (v) compreender as aplicações das tecnologias e as decisões implicadas nestas utilizações. É claro que essas competências são muito difíceis de serem alcançadas conjuntamente, mas a formação de cidadãos críticos deve tê-las como guias que norteiam essa abordagem e objetivo. Cappechi (2004) chama a atenção para o fato de que aprender Ciências envolve aprender também a expressar-se em uma nova linguagem social. O ambiente de aprendizado das Ciências é um importante espaço para discussão entre os alunos e entre o professor e o aluno na sala de aula. Nesse espaço de aprendizagem, deve ser desenvolvido o importante papel de proporcionar a identificação das ideias dos alunos a respeito dos fenômenos a serem estudados, enquanto oportunidade para que estes ensaiem o emprego da linguagem científica escolar tão necessária para que o aluno desenvolva conhecimentos e habilidades para que sua intervenção na sociedade seja positiva, tornando-o um cidadão alfabetizado científica e tecnologicamente. Chassot (2000) chama a atenção em relação à alfabetização científica que, quando é usado o termo analfabeto, estamos nos reportando, quase exclusivamente, àquele que não sabe ler e nem escrever na sua língua. Por isso, retomando a ideia de aprender Ciências, podemos afirmar que o ensino de ciências exige aprender uma nova forma de expressão, ou linguagem, ou seja, os alunos devem ser alfabetizados nesta nova linguagem que é também uma nova linguagem social com a qual ele não está acostumado. Reforçando isso, Chassot (2000) refere que: (...) considero a Ciência como uma linguagem para facilitar nossa leitura do mundo (CHASSOT, 1993a, p. 37 apud CHASSOT, 2000, p. 33). (...) seria desejável que os alfabetizados cientificamente não apenas tivessem facilitada a leitura do mundo em que vivem, mas entendessem as necessidades de transformá-lo, e transformá-lo para melhor (CHASSOT, 2000, p. 34). 17 A ideia de ensino com enfoque em CTS permite extrair suas aplicações da Ciência dentro da sociedade. E o domínio dessas duas áreas, resulta na melhora de nossas vidas. Para tomar decisões, o cidadão precisa ter informações e a capacidade crítica de analisá-las para buscar alternativas, avaliando os custos e benefícios de sua decisão. A resolução de um problema que se insere na vida do cidadão é diferente das soluções dos problemas acadêmicos, geralmente, colocados na escola. Para a solução de um problema escolar, tem-se uma definição completa do problema, cujo resultado já é esperado e cuja solução é tomada sob o foco disciplinar, usando-se muitas vezes algoritmos, e uma consequente avaliação como certo ou errado. Já a tomada de decisão de problemas concretos do cidadão é feita a partir de uma questão não exatamente definida, cujo resultado é previsto com alternativas múltiplas e cuja solução é tomada sob o foco multidisciplinar, por meio de discussões, sendo avaliada pela análise de custos/benefícios. Ou seja, enquanto o problema escolar tem caráter bastante objetivo, a tomada de decisão tem caráter muito subjetivo (SANTOS & SCHNETZLER, 1998, p. 263 apud CHASSOT, 2000, p. 45). 2.2.2 Interação CTS Sabe-se que os alunos são mais afetados pelo mundo tecnológico do que pelo mundo científico, e que para entender a questão social ou problema, existe geralmente alguma tecnologia para explorar, mesmo que em níveis superficiais (AIKENHEAD, 1994). Santos e Mortimer (2002) concluem dizendo que: “questões dessa natureza propiciarão ao aluno uma compreensão melhor dos mecanismos de poder dentro das diversas instâncias sociais”. O conteúdo das CTS tem uma faceta multidisciplinar, pois os conceitos são sempre comentados em uma perspectiva relacional, de modo a evidenciar as diversas dimensões do conhecimento estudado (SANTOS e MORTIMER, 2002). As múltiplas formas de abordar Ciência e sua relação com a Sociedade e a Tecnologia são representadas na Tabela 1. 18 Tabela 1 – Aspectos CTS Aspectos de CTS Esclarecimentos 1. Efeito da Ciência sobre a A produção de novos conhecimentos tem estimulado mudanças Tecnologia tecnológicas. 2. Efeito da Tecnologia A tecnologia disponível a um grupo humano influencia sobre a Sociedade sobremaneira o estilo de vida desse grupo. 3. Efeito da Sociedade sobre Por meio de investimentos e outras pressões, a sociedade a Ciência influencia a direção da pesquisa científica. 4. Efeito da Ciência sobre a O desenvolvimento de teorias científicas pode influenciar a Sociedade maneira como as pessoas pensam sobre si próprias e sobre problemas e soluções. 5. Efeito da Sociedade sobre Pressões públicas e privadas podem influenciar a direção em a Tecnologia que os problemas são resolvidos e, em consequência, promover mudanças tecnológicas. 6. Efeito da Tecnologia A disponibilidade dos recursos tecnológicos limitará ou ampliará sobre a Ciência os progressos científicos. Fonte: McKAVANAGH e MAHER, 1982. p.72. apud SANTOS e MORTIMER, 2002, p. 12. Os conteúdos em CTS são integrados nos conteúdos tradicionais de ciências. Para ilustrar isso, Aikenhead (1994) definiu oito categorias para os diferentes currículos de CTS, comparou essas categorias com os currículos tradicionais e apresentou exemplos de material em cada categoria (Tabela 2). Tabela 2 – Categorias do conteúdo CTS Categoria Descrição 1. Conteúdo de CTS como Ensino tradicional de ciências acrescido da menção ao elemento de motivação. conteúdo de CTS com a função de tornar as aulas mais interessantes. 2. Incorporação eventual do Estudo tradicional de ciências acrescido de pequenos estudos conteúdo de CTS ao conteúdo de conteúdo CTS incorporados como apêndices aos tópicos programático. de ciências O conteúdo de CTS não é resultado do uso de temas unificadores. 19 3. Incorporação sistemática do Ensino tradicional de ciências acrescido de uma série de conteúdo CTS ao conteúdo pequenos estudos de conteúdo de CTS integrados aos programático. tópicos de ciências, com a função de explorar sistematicamente o conteúdo de CTS. Esses conteúdos formam temas unificadores. 4. Disciplina Científica Os temas CTS são organizados para organizar os conteúdos (Química, Física e Biologia) de ciências e sua sequência, mas a seleção do conteúdo por meio de conteúdo de CTS. científico ainda é feita a partir de uma disciplina. As listas dos tópicos científicos puros é muito semelhante àquela da categoria 3, embora a sequência possa ser bem diferente. 5. Ciências por meio do CTS organiza o conteúdo e sua sequência. O conteúdo de conteúdo de CTS. ciências é multidisciplinar, sendo ditado pelo conteúdo de CTS. A lista de tópicos científicos puros assemelha-se à listagem de tópicos importantes a partir de uma variedade de cursos de ensino. O conteúdo relevante de ciências enriquece a aprendizagem. 6. Ciências com conteúdo de O conteúdo CTS é o foco do ensino. O conteúdo relevante de CTS. ciências enriquece a aprendizagem. 7. Incorporação das O conteúdo CTS é o foco do currículo. O conteúdo relevante ciências ao conteúdo de CTS. de ciências é mencionado, mas não é ensinado sistematicamente. Pode ser dada ênfase aos princípios gerais da ciência. 8. Conteúdo de CTS. Estudo de uma questão tecnológica ou social importante. O conteúdo de ciências é mencionado somente para indicar uma vinculação com as ciências. Fonte: AIKENHEAD, 1994, p. 8-11 Aikenhead (1994) argumenta que, embora nenhuma categoria particular possa ser usada para representar a verdadeira instrução das CTS, as categorias 3 a 6 representam visões mais citadas pelos estudiosos de CTS. Enquanto que a categoria 1 nem poderia ser considerada como CTS, pelo baixo conteúdo abordado nela. A oitava categoria representa um curso mais radical no enfoque em CTS, por que os assuntos de Ciências propriamente ditos praticamente não seriam abordados nela. Além disso, ele mostra que, na quarta categoria, a ênfase no ensino conceitual de Ciências seria maior e na categoria 5, a ênfase se transforma em uma compreensão das inter-relações de CTS. 20 Esse autor indica, para finalizar, que os currículos nas categorias 6 e 7 seriam propostos dentro da atual reforma do ensino médio, no que diz respeito à busca da interdisciplinaridade nas muitas áreas das Ciências da natureza e suas tecnologias. Tais proposições demandariam projetos audaciosos a serem desenvolvidos com a participação de professores, o que não poderia ser feito de maneira aleatória. É importante lembrar que o ensino de Ciências através de CTS pode ser organizado de acordo com o plano de estudo de Ciências (como nas categorias de 1 a 3 na Tabela 1) ou de acordo com uma sequência natural sugerida pelo conteúdo CTS em si (as categorias de 4 a 8 na Tabela 2) (AIKENHEAD, 1994). 2.2.3 Física em Quadrinhos e CTS As tirinhas de Física em Quadrinhos podem ser combinadas com diversos tipos de atividades e questões. Elas foram concebidas para promover a formação cidadã dos alunos segundo os pressupostos do enfoque em CTS. Segundo HOFSTEIN, AIKENHEAD e RIQUARTS (1988: 358), CTS pode ser caracterizado como o ensino do conteúdo de ciências no contexto autêntico do seu meio tecnológico e social, no qual os estudantes integram o conhecimento científico com a tecnologia e o mundo social de suas experiências do dia-a-dia. (SANTOS E MORTIMER, 2002, p.4) Portanto, não se trata de um ensino do cotidiano vazio e apenas informativo, mas sim de uma série de atividades reflexivas, que relacionam os assuntos do dia a dia com atividades que promovem a alfabetização científica. Os problemas sociais reais, além das questões abertas e reflexivas sobre o cotidiano, podem ser visto em Vianna e Bernardo (2012), que possuem como proposta atividades sobre problemas reais da vida para fomentar a discussão e a tomada de decisões. 2.3 Ensino por investigação Os recursos do ensino de Física e de Ciências em geral têm características semelhantes às desenvolvidas pela comunidade científica. Sasseron (2013) lista três características de comportamento da comunidade científica a que devemos dar 21 atenção na sala de aula para que o aluno se envolva: a investigação, as interações discursivas e a divulgação das ideias. Na investigação, o mais importante não é seu fim, mas o caminho trilhado (SASSERON, 2013). As investigações científicas surgem da busca de respostas para um problema usando e trabalhando dados coletados, informações e conhecimentos já estabelecidos. Na sala de aula, o professor pode conseguir isso com qualquer tipo de atividade, seja ela experimental ou não. “O essencial é que haja um problema a ser resolvido; e as condições para resolvê-lo são muito importantes, havendo necessidade de se atentar para que se façam presentes” (SASSERON, 2013, p.43). A leitura de um texto ou uma história em quadrinhos pode ser uma atividade investigativa tanto quanto um experimento de laboratório. O ensino por investigação impulsiona a participação dos alunos através de atividades planejadas pelo professor, que promovem a liberdade de pensar, discutir e construir seus conhecimentos, de forma que o aprender ciência faça sentido. (Sanmartí e Bargalló, 2012) A construção do conhecimento e sua organização ocorrem por meio de debates, e são chamados por Sasseron (2013) de interações discursivas que “devem ser promovidas pelo professor e cuidados precisam ser tomados para que o debate não se transforme em uma conversa banal” (p. 43). A interação discursiva está relacionada com a linguagem, já que os alunos podem usar diversas formas de linguagem para ser fazer entender. Essa discussão será apresentada de maneira mais aprofundada na próxima seção. A divulgação de ideias acontece nas interações verbais entre dois ou mais pesquisadores ou cientistas. Tem sua importância dentro da própria existência da Ciência, já que ela precisa da aprovação dos pares para que ser validada. As ciências partem da premissa de que o conhecimento não é estático e novas interpretações podem ser dadas a uma proposta anterior, tornando-a mais completa. Portanto, apresentar ideias aos pares faz parte do trabalho de aprimorar ou refutar conhecimentos que estão em discussão. (SASSERON, 2013, p. 44). 22 Gil e Castro (1996) apud Azevedo (2004) descrevem alguns aspectos da atividade científica que podem ser explorados numa atividade investigativa. Dentre eles, são apresentados resumidamente: 1. Apresentar situações problemáticas abertas; 2. Favorecer a reflexão dos estudantes sobre a relevância e o possível interesse das situações propostas; 3. Potencializar análises qualitativas significativas, que ajudem a compreender e acatar as situações planejadas e a formular perguntas operativas sobre o que se busca; 4. Considerar a elaboração de hipóteses como atividade central da investigação científica, sendo esse processo capaz de orientar o tratamento das situações e de fazer explicitas as preconcepções dos estudantes; 5. Considerar as análises, com atenção nos resultados (sua interpretação física, confiabilidade etc.), de acordo com os conhecimentos disponíveis, das hipóteses manejadas e dos resultados das demais equipes de estudantes; 6. Conceder uma importância especial às memórias científicas que reflitam o trabalho realizado e possam ressaltar o papel da comunicação e do debate na atividade científica; 7. Ressaltar a dimensão coletiva do trabalho científico, por meio de grupos de trabalho, que interajam entre si. Segundo as formas que são utilizadas, as atividades investigativas podem ser classificadas como: (i) Demonstração investigativa: atividades feitas, geralmente, com o objetivo de demonstrar e comprovar uma teoria já estudada. "Chamamos de demonstrações experimentais investigativas as demonstrações que partem da apresentação de um problema ou de um fenômeno a ser estudado e levam à investigação a respeito desse fenômeno" (AZEVEDO, 2004, p. 26); (ii) Laboratório aberto: as atividades que buscam a solução de um problema utilizando uma experiência. A busca da solução do problema 23 pode ser separada em seis momentos: proposta do problema, levantamento de hipóteses, elaboração do plano de trabalho, montagem do arranjo experimental e coleta de dados, análise dos dados e conclusão; (iii) Questões abertas são “aquelas em que procuramos propor para os alunos fatos relacionados ao seu dia a dia, e cuja explicação estivesse ligada ao conceito discutido e construído nas aulas anteriores” (AZEVEDO, 2004, p. 29); (iv) Problemas abertos são situações gerais (e reais) levadas aos grupos ou à classe, onde se discute desde as condições de contorno até as possíveis soluções para a situação apresentada. “De forma diferente das questões abertas, que abrangem apenas os conceitos, o problema aberto deve levar á matematização dos resultados” (AZEVEDO, 2004, p. 30). Como se pode verificar, para que as atividades investigativas aconteçam, é preciso uma mudança no comportamento do professor e dos alunos. 2.3.1 Mudança de atitude dos alunos e do professor Um aspecto que fica evidente na promoção de discussão na sala de aula e na proposta de ensino por investigação é a mudança de atitude que essas práticas devem proporcionar ao aluno e à ação do professor. Conforme Moreira (1983) apud Azevedo (2004), a resolução de problemas que leva a uma investigação deve estar fundamentada na ação do aluno. Os alunos devem ter oportunidade de agir, e o ensino deve ser acompanhado de ações e demonstrações que o levem a um trabalho prático. Para que aconteça uma atividade investigativa, o aluno deve estar agindo, discutindo, refletindo e relatando, e não se resumir à manipulação ou observação do fato. Conforme Borges (2002), “a ideia central é: qualquer que seja o método de ensino-aprendizagem escolhido, deve mobilizar a atividade do aprendiz, em lugar de sua passividade.” (p. 294) 24 Para isso, o professor deve sair da posição de transmissão do conhecimento para uma postura de mediador e guia, e as questões passam a ser os pontos de partida para construção do conhecimento científico. É importante para o processo de aprendizagem, que o aluno deixe o papel de observador das aulas, e atue nesse processo, que ele pense, aja, interfira, questione e faça parte desse movimento; “(...) ficando o professor com a função de acompanhar as discussões, provocar, propondo novas questões e ajudar os alunos a manterem a coerência de suas ideias” (DUSCHL, 1998 apud AZEVEDO, 2004, p. 25). Numa metodologia de ensino por investigação que promove as discussões e o uso da argumentação, os alunos devem ter autonomia. Não no sentido de poder fazer o que quiserem, mas de pensarem sozinhos e tomar suas próprias decisões. Carvalho et al. (1998) complementa dizendo que: Os alunos devem obediência ao professor, mas essa obediência deve ser conduzida de tal forma que reflita uma disposição de cooperar, que traduza uma solicitação considerada razoável e coerente pelo aluno. (p. 29) Isso significa que a autoridade do professor deve ser construída a partir de regras claras e precisas com os alunos, não sendo impostas, mas explicadas e dialogadas com a classe. Carvalho et al. (1998) explica que “se cada regra tiver uma razão lógica para existir, os alunos irão entendê-la e ajudar a respeitá-la” (p. 29).Carvalho et al. (1998) reforça essa ideia afirmando: A construção da autonomia moral, das regras de convivência em sala de aula, é necessária para o aluno alcançar a autonomia intelectual, pois uma não existe sem a outra. Se o aluno tiver de seguir regras preestabelecidas sem liberdade de dialogar com seu professor, ele também aceitará, sem discutir e sem questionar, dar a resposta que o professor quer, ainda que pense de outra maneira. A liberdade de perguntar “Por quê?” e de pensar de modo diferente deve ser vista pelo aluno e pelo professor como uma atitude natural e desejável na classe. É necessário dar espaço para que surjam “ideias maravilhosas”, isto é, ideias que levem os alunos a superar obstáculos conceituais. (p. 30) Para que isso aconteça, é necessário dar condições de liberdade para que o aluno se sinta a vontade de falar e discutir. Além disso, as discussões na sala de aula entre o aluno e o professor, e entre os alunos devem ser debates entre pares, ou seja, essa interação deve ser entre iguais. Como acontece, por exemplo, em eventos científicos, nos quais o conhecimento científico é discutido entre pares e 25 tem aprovação entre os mesmos, respeitando-se a troca de ideias e a existência de divergências. Além disso, cabe ao professor gerenciar essas discussões, pois, os alunos podem tomar um rumo não esperado ou desejável pelo professor durante essas interações. Nas comunidades de aprendizagem o professor ou professora é responsável de dirigir as indagações, de orientar a atividade em direção aos objetivos de aprendizagem. Detendo a autoridade intelectual, que não pode ser confundido com autoritarismo. Considerar a aprendizagem como um processo social implica que o professor necessariamente agiu como um modelo para as habilidades que o aprendizado irá desenvolver. (JIMENEZALEIXANDRE, 2010, p.165, tradução do autor) Agir como modelo, para Jimenez-Aleixandre (2010), é o docente que “investiga, pergunta, usa provas, debate, fala e escreve ciências, conduzindo (modelando) as atividades que desejamos que os alunos realizem” (p. 165, tradução minha). Sasseron (2013) adverte que: Fazer perguntas e não estar atento ao que o aluno diz é similar a um discurso monológico: a participação dos alunos resulta em responder sem que o que foi por eles expresso seja aproveitado de algum modo e, no final, o que terá importância será apenas aquilo que foi dito pelo professor. (p. 44) Para Azevedo (2004), o professor deve conhecer bem o assunto que será discutido na sala de aula para propor questões que façam o educando pensar e agir no problema. É necessário que esses aspectos sejam bem trabalhados pelo professor para que os objetivos sejam alcançados. Uma recomendação muito importante dada pelos pesquisadores que defendem o ensino por investigação é que a resolução dos problemas seja feita em grupos pequenos. “Os alunos com desenvolvimentos intelectuais semelhantes têm mais facilidade de comunicação. Além disso, também há a parte afetiva: é muito mais fácil propor suas ideias a um colega que ao professor” (CARVALHO, 2013, p. 12). 2.3.2 Problematização no ensino de ciências Como já foi mencionado, “o progresso da ciência está fortemente relacionado com a formulação de novas perguntas e com sua potencialidade de gerar novas explicações” (SANMARTÍ e BARGALLÓ, 2012, p. 28, tradução do autor). Para uma 26 aula com essa proposta, é necessário fornecer ao estudante uma nova visão de mundo. Segundo Azevedo (2004), em um curso de Física, torna-se de fundamental importância apresentar aos alunos problemas para serem resolvidos, pois essa é a realidade dos trabalhos científicos em todo o mundo. A problematização no ensino de Ciências procura construir um ambiente que favoreça essas situações que simulam o trabalho científico. Delizoicov (2001 apud CAPECCHI, 2013) adverte que: “problematizar é formular problemas diferentes daqueles que os alunos estão acostumados a elaborar, de forma a proporcionar oportunidades para que novos conhecimentos sejam construídos” (p. 25). Para reforçar isso, cite-se Carvalho et al. (1995 apud AZEVEDO, 2004): É preciso que sejam realizadas diferentes atividades, que devem estar acompanhadas de situações problematizadoras, questionadoras de diálogo, envolvendo a resolução de problemas e levando à introdução de conceitos para que os alunos possam construir seu conhecimento. (CARVALHO ET AL., 1995 apud AZEVEDO, 2004, p. 20). Através das perguntas, o professor pretende motivar a participação do aluno, criando condições para que o cotidiano seja problematizado em sala de aula, novas questões surjam e instrumentos sejam apresentados e experimentados. Esse processo objetiva e levará os envolvidos a responder a todas as perguntas surgidas (CARVALHO, 2013). Além disso: Formular uma pergunta de investigação requer a aplicação do conhecimento sobre como se gera ciência e, mais especificamente, o que é uma variável e a distinção entre o que varia e o que são controlados em um experimento, e como projetar os processos de coleta de dados (SANMARTÍ e BARGALLÓ, 2012, p. 29, tradução do autor). O importante na proposta de ensino por investigação não é o conceito que se pretende ensinar, mas quais ações e escolhas que levaram os alunos a fazer novas perguntas, levantar hipóteses, testá-las, errar e acertar. Essas ações e essas escolhas que dão a oportunidade de construir o conhecimento (CARVALHO, 2013). Capecchi (2013) adverte também que, depois da resolução do problema através da investigação deve-se realizar uma discussão com todos os alunos, e que sejam solicitados a eles seus caminhos para chegar à solução. Nesse momento, os 27 estudantes “têm a oportunidade de tomar consciência de suas ações, refletindo a respeito, até elaborar, em alguns casos, explicações causais para o fenômeno estudado” (CAPECCHI, 2013, p. 26). 2.3.3 Valorização do erro No ensino por investigação, o mais importante não é o conceito que se quer ensinar, e sim o caminho que o aluno leva para chegar nesse conceito. È fundamental que o professor valorize o erro dos seus alunos. O erro é um elemento muito importante na comunidade científica, pois ele move a construção do conhecimento, desde o teste de hipóteses até os testes de tentativa e erro. Mas os professores não aproveitam os erros e nem estimulam o erro, muito pelo contrário. Contrariamente a essa postura comum entre os professores tradicionais, Capecchi (2013) defende que: Para que estudantes possam conhecer novas questões e formas de pensar, ensaiando o uso de novas ferramentas de pensamento, é preciso que tenham oportunidades de errar, não atendo-se apenas a tentativas desprovidas de reflexão, mas, avaliando suas ações e formas de interpretação que levam a erros e acertos. (CAPECCHI, op. cit., p. 25) O erro dá oportunidade ao diálogo entre os pares e por isso deve ser valorizado pelo professor também. Ele é importante para separar variáveis que podem ou não interferir no resultado. “O erro ensina... e muito” (CARVALHO, 2013, p. 12). 2.4 Argumentação na sala de aula O objetivo do material desenvolvido e aplicado neste trabalho (as tirinhas e suas questões) é formar alunos capazes de interagir de forma positiva no mundo em que vivem, discutindo e refletindo sobre os problemas da sociedade, da ciência e da tecnologia; e ver surgir suas possíveis soluções. No processo de argumentação poderemos perceber como duas correntes de pensamento tentam convencer uma outra sobre suas ideias, usando a lógica e a razão. Além disso, argumentação é o que move o discurso escolar e os diálogos entre os alunos e entre os alunos e o 28 professor. Para Jiménez Aleixandre e Díaz de Bustamante (2003) argumentação é a “(...) capacidade de relacionar dados e conclusões, de avaliar enunciados teóricos à luz dos dados empíricos ou procedentes de outras fontes” (p. 361). Já Sasseron e Carvalho (2011) indicam que argumentação é: (...) todo e qualquer discurso em que aluno e professor apresentam suas opiniões em aula, descrevendo ideias, apresentando hipóteses e evidências, justificando ações ou conclusões a que tenham chegado, explicando resultados alcançados (SASSERON e CARVALHO, op. cit., p. 100). No desenvolvimento deste material, como metodologia, apresentamos as tirinhas agregadas a questões e/ou atividades investigativas para promover discussões entre os alunos e o professor. Existem diversas pesquisas sobre a discussão na sala de aula para a promoção da construção do conhecimento entre os alunos (CAPECCHI e CARVALHO, 2000; JIMÉNEZ-ALEIXANDRE, 2010; SASSERON e CARVALHO, 2011; CARMO e CARVALHO, 2012). Esses estudos estão interessados em observar as afirmações elaboradas pelos alunos no diálogo visando a construção de explicações coletivas sobre um fenômeno (CAPECCHI e CARVALHO, 2000, p.1). Apresentam a argumentação como contribuinte das competências básicas e dos objetivos gerais da educação, como por exemplo, aprender a aprender e o desenvolvimento do pensamento crítico e da cultura científica (JIMÉNEZ-ALEIXANDRE, 2010). Para justificar isso, Cappechi e Carvalho (2000) referem que: Através da argumentação, os estudantes entram em contato com algumas habilidades importantes dentro do processo de construção do conhecimento científico, tais como, reconhecimento entre afirmações contraditórias, identificação de evidências e confronto de evidências com teorias. (CAPPECHI e CARVALHO, op. cit., p. 172). Por esses motivos, esta pesquisa também defende o uso dessa abordagem de ensino para avaliar os alunos. Assim como foi usada no seu desenvolvimento, é através da discussão que é possível traçar expectativas de como transferir e adaptar as histórias em quadrinhos desse projeto para que elas cumpram seu papel em 29 diferentes turmas, e que, permitam os estudantes consigam se apropriar da informação apresentada pelas tirinhas e que transformem-na em conhecimento. Como já mencionado anteriormente, os estudos sobre argumentação na sala de aula se interessam em observar as explicações e os diálogos desenvolvidos pelo educando em sua tentativa de construir conclusões ou defender ideias sobre um determinado fenômeno ou evento científico. Ademais, buscam estudar a estrutura e os processos do argumento utilizados pelos alunos nessa construção de conhecimento, ao confrontar com os demais alunos. Essa segunda vertente dos estudos da argumentação na sala de aula será explorada para avaliar a eficiência das tirinhas quanto ao seu objetivo, porém é necessário entender melhor o processo da discussão entre os alunos antes de analisá-lo. 2.4.1 A prática social e a importância de aprender a argumentar O processo de construção da ciência está altamente relacionado com a formulação de perguntas e a tentativa de criar explicações ou respostas para elas (SANMARTÍ e BARGALLÓ, 2012). Cria-se, assim, um ciclo onde as novas explicações geram novas questões que motivam a busca de novas respostas. As perguntas são a força motriz da qual se gera um conhecimento científico. É assim que acontece na ciência, e pode também acontecer na escola. Porém é muito difícil encontrar professores dispostos a trabalhar com a discussão entre os alunos sobre um determinado assunto. Os motivos podem ser o desconhecimento do potencial da argumentação, ou por puro comodismo. Segundo Hodson: Os trabalhos de pesquisa em ensino mostram que os estudantes aprendem mais sobre ciência e desenvolvem melhor seus conhecimentos conceituais quando participam de investigações científicas, semelhantes às feitas nos laboratórios de pesquisa. (1992 apud AZEVEDO, 2004, p. 19) Esse processo de construção de conhecimento científico escolar procura, também, estimular que os alunos façam perguntas e desenvolvam a habilidade de discutir e provocar outros questionamentos. Além disso, outro objetivo do uso da argumentação na sala de aula mencionado por Jimenez-Aleixandre (2010) é: 30 (...) o desenvolvimento de competências relacionadas com as formas de trabalhos da comunidade científica, com o desenvolvimento de ideias sobre a natureza da ciência que fazem justiça à sua complexidade, o que, às vezes, é chamado de cultura científica. (JIMENEZ-ALEIXANDRE, op. cit., p.32, tradução minha) Podemos encontrar nos PCNs (BRASIL, 2002) como competência da Física, a capacidade de lidar com as situações já vivenciadas ou que ainda serão vivenciadas dentro da sociedade. Para Kuhn (1993 apud CAPECCHI e CARVALHO, 2000) a argumentação é uma forma de aproximar o pensamento crítico do pensamento cotidiano. Para reforçar essa ideia, o PCN (BRASIL, 2002) exemplifica algumas competências da Física como: Compreender e emitir juízos próprios sobre notícias com temas relativos à ciência e tecnologia, veiculadas pelas diferentes mídias, de forma analítica e crítica, posicionando-se com argumentação clara. Por exemplo, enviar um e-mail contra-argumentando uma notícia sobre as vantagens da expansão da geração termoelétrica brasileira. Argumentar claramente sobre seus pontos de vista, apresentando razões e justificativas claras e consistentes, como, por exemplo, ao escrever uma carta solicitando ressarcimento dos gastos efetuados nos consertos de eletrodomésticos que se danificaram em consequência da interrupção do fornecimento de energia elétrica, apresentando justificativas consistentes. (BRASIL, op. cit, p.64) Constata-se que essas competências sugeridas pelo PCN estão relacionadas com a argumentação. É importante lembrar que o professor deve conduzir a discussão em sala de aula de modo que os diálogos não tomem outro patamar desnecessário e sem importância. Capecchi e Carvalho (2000) reafirmam essa preocupação afirmando que “é necessário que as discussões sejam conduzidas sem a perda do rumo estabelecido, não basta deixar que os alunos falassem livremente, é preciso encontrar um equilíbrio entre a livre apresentação de ideias e a atenção às questões já discutidas” (p. 3). Essas discussões devem promover a construção de conhecimento escolar do mesmo modo como acontece na comunidade científica, ambiente em que os conhecimentos da ciência e da tecnologia são, em muitos casos, gerados a partir de discussões entre pares. Capecchi e Carvalho (2000) referem que: No contexto de ensino de Ciências, esta troca de ideias entre os alunos e a elaboração de explicações coletivas possibilitam o contato com um aspecto importante para a formação de uma visão da Ciência como uma construção 31 de uma comunidade, cujas teorias estão em constante processo de avaliação. (CAPECCHI e CARVALHO, op. cit, p.1) Isso significa apresentar uma ciência inacabada, questionável e em processo de mudança. A aprendizagem é uma construção coletiva dos alunos entre si e com o professor. Capecchi e Carvalho (2000) apresentam, também, como benefícios da argumentação, além da construção coletiva do conhecimento “... o respeito às diferentes formas de pensar, o cuidado na avaliação de uma afirmação e a autoconfiança para a defesa de pontos de vista” (p.1). É importante lembrar que segundo Duarte (2006), Vigotski defendia que as funções superiores mentais do indivíduo (nesse caso o aluno) afloram com os processos sociais. A aprendizagem é uma construção coletiva dos alunos entre si e com o professor, que é favorável que os alunos passem pela mesma experiência, e desenvolvam seu conhecimento na troca entre seus pares (os outros alunos e seu professor). Pensar criticamente é uma faculdade que se desenvolve com a prática e constância. Jiménez-Aleixandre (2010) nos lembra que pensamento crítico é a capacidade de desenvolver uma opinião independente, de adquirir a faculdade de refletir sobre a realidade, participando dela. Ou seja, o indivíduo com essa capacidade não se deixa levar pela influência da mídia e pensa no melhor para ele e para a sociedade em que vive. O aluno pode fazer uma escolha mais consciente e responsável quando usa e desenvolve o pensamento crítico, e consequentemente, a desejada cidadania responsável. Para isso, o estudante deve aprender também a fazer perguntas e construir essa prática junto com o professor. Como já foi mencionado, a construção do conhecimento é um processo social, logo o aluno é parte integrante desse processo. Segundo Sanmartí e Bargalló (2012): Formular uma pergunta investigativa requer aplicar conhecimento sobre como se gera a ciência e, em específico, sobre o que é uma variável e as distinções entre as que variam e as que se pode controla em um experimento, e sobre como projetar processos para coletar dados (SANMARTÍ e BARGALLÓ, 2012, p.29, tradução minha). 32 Deve-se ter em mente que é necessário criar um ambiente na aula onde os alunos se sintam livres, intelectualmente falando, para resolver o problema com suas próprias ações e recursos, como sugerem Sanmartí e Bargalló, (2012) e Capecchi e Carvalho (2000). Os autores, citados ao longo desta seção, que estudam e defendem o uso da argumentação na sala de aula sugerem o padrão de argumento de Toulmin (2006) como instrumento de avaliação da qualidade do uso do argumento em sala de aula. Esses autores, indicam que usa-se esse padrão para avaliar o discurso científico escolar, já que ele propicia uma delimitação de elementos maior do que o silogismo (premissa maior, premissa menor e conclusão). 2.4.2 Padrão do Argumento de Toulmin Nesse sentido, com o objetivo de avaliar o discurso dos alunos promovido pelas tirinhas escolheu-se utilizar como ferramenta o Padrão de Argumento de Toulmin (2006). Assim, poder-se-á avaliar se os quadrinhos cumprem seu papel. Toulmin (2006) parte do conceito de que uma afirmação é feita para defender uma alegação, apoiada em dados (D), que são os firmamentos para a construção da estrutura da conclusão (C). Esse autor chama a atenção para o fato de que a conclusão é o que finda o argumento. Os outros elementos da argumentação têm o papel de relacionar os dados e as conclusões. Esses outros elementos são as garantias ou justificativas (W) que demonstram os processos que levaram os dados até determinada conclusão. De acordo com o autor, as garantias podem se apresentar como regras ou princípios. Não devem ser informações novas, ou seja, as garantias são bases teóricas que nos permitem chegar dos dados às conclusões. Igualmente, os dados devem ser estabelecidos de modo explícito e as garantias, quase sempre, serão estabelecidas de modo implícito. Assim, os dados não devem deixar dúvidas enquanto que as garantias podem ser subentendidas. 33 Figura 7 – Padrão de argumento de Toulmin Fonte: Toulmin, 2006, p. 150. Essa ferramenta (Figura 7) será muito importante para a compreensão da argumentação dos alunos e como eles construíram seu conhecimento. Com ela podemos analisar a qualidade das discussões que as tirinhas puderam promover. Existem, entretanto, situações onde os dados, as garantias e as conclusões não são suficientes para aceitação do argumento. Por isso, para esses casos, são adicionados os qualificadores modais (Q), que é a força que a garantia fornece às conclusões. As refutações (R) tiram a força da garantia e contradizem as hipóteses criadas por ela. Por último, o autor, apresenta os apoios (B), que são os elementos que dão a autoridade que sustenta as garantias. Os apoios servem como suporte à própria garantia, e serão necessários para a construção de argumentos adicionais. Embora os firmamentos básicos dos argumentos sejam campo-invariáveis, é importante que as bases que apoiam as garantias sejam fortemente campodependentes. Para um bom argumento, é necessário apresentar dados de qualquer tipo. Uma conclusão pura, sem dados, não configura um argumento. Além disso, a garantia e o apoio podem, e devem, ser deixados subentendidos, a menos que seja desafiador para o indivíduo apresentá-los. A Figura 7 apresenta a estrutura (ou layout) proposta por Toulmin (2006) como organismo do argumento. Durante a análise dos dados serão apresentados argumentos dos alunos dentro desse padrão de argumento. 34 2.4.3 Indicadores de alfabetização científica de Sasseron Apesar do padrão de argumento de Toulmin ser uma ferramenta ótima para o entendimento da argumentação na construção do conhecimento científico, é, muitas vezes, difícil identificar na fala do aluno os elementos propostos pelo autor. Por esse motivo, serão usados os indicadores de alfabetização científica propostos por Sasseron e Carvalho (2008, 2010 e 2011) para auxiliar na identificação dos elementos do argumento presentes no padrão de Toulmin. Segundo essas autoras: Estes indicadores são algumas competências próprias das ciências e do fazer científico: competências comuns desenvolvidas e utilizadas para a resolução, discussão e divulgação de problemas em quaisquer das Ciências quando se dá a busca por relações entre o que se vê do problema investigado e as construções mentais que levem ao entendimento dele (SASSERON e CARVALHO, op. cit., p.338). Como mostra essa citação, os indicadores têm uma função semelhante aos elementos do Padrão de Toulmin. Além disso, a busca em resolver problemas e explicar aos demais colegas pode ser entendida e visualizada com os indicadores. O uso de diferentes tipos de indicadores forma uma estrutura para a discussão e construção mental do aluno. As autoras dividiram os indicadores em três grupos; (i) um relacionado ao trabalho com os dados; (ii) o outro relacionado com a estruturação do pensamento; (iii) e o último relacionado com a procura do entendimento da situação analisada. O grupo dos indicadores relacionados ao trabalho com os dados está associado a ações feitas nas tarefas de organizá-los, classificá-los e seriá-los. São elas: • Seriação de informação não seria ordenação dos dados, mas listar os dados que serão trabalhos. “Deve surgir quando se almeja o estabelecimento de bases para a ação” (SASSERON e CARVALHO, op. cit., p.338); 35 • Organização de informação aparece no momento em que se discute o modo como os dados serão trabalhados. “Este indicador pode ser vislumbrado quando se busca mostrar um arranjo para informações novas ou já elencadas anteriormente” (SASSERON e CARVALHO, op. cit., p.338); • Classificação de informação está na comparação da hierarquia das informações (dados) obtidas. “Constitui-se em um momento de ordenação dos elementos com os quais se está trabalhando, procurando uma relação entre eles” (SASSERON e CARVALHO, op. cit., p.338). Estes três indicadores são os responsáveis pela identificação das variáveis envolvidas no fenômeno. O grupo de indicadores relacionado com a estruturação do pensamento que cria as afirmações, enunciações e os diálogos feitos durante as aulas “demonstram ainda formas de organizar o pensamento indispensável quando se tem por premissa a construção de uma ideia lógica e objetiva para as relações que regulam o comportamento dos fenômenos naturais” (SASSERON e CARVALHO, 2008, p. 338). As autoras apresentam como apenas dois os indicadores neste grupo: O raciocínio lógico compreende o modo como as ideias são desenvolvidas e apresentadas e está diretamente relacionada à forma como o pensamento é exposto; e o raciocínio proporcional que, como o raciocínio lógico, dá conta de mostrar como se estrutura o pensamento, e refere-se também à maneira como variáveis têm relações entre si, ilustrando a interdependência que pode existir entre elas (SASSERON e CARVALHO, op. cit., 2008, p. 338). Por último, o grupo dos indicadores relacionados com a procura do entendimento da situação analisada, que: Devem surgir em etapas finais das discussões, pois caracterizam-se por serem o trabalho com as variáveis envolvidas no fenômeno e a busca por relações capazes de descreverem as situações para aquele contexto e outros semelhantes. Fazem parte deste grupo os seguintes indicadores da AC: levantamento de hipótese, teste de hipótese, justificativa, previsão, explicação (SASSERON e CARVALHO, op. cit. p. 339). 36 O levantamento de hipóteses são suposições acerca de um determinado tema, podem aparecer tanto com afirmações quanto com as perguntas. O teste de hipóteses é a etapa que tem como meta provar as suposições anteriormente levantadas. Esses testes podem ser realizados na manipulação do objeto ou simplesmente no campo das ideias (atividades mentais). A justificativa é o que faz a afirmação ganhar aval, tornando-a mais segura. A previsão é o que sucede a explicação, associando-se a certos acontecimentos. A explicação aparece quando se procura relacionar as informações com as hipóteses levantadas. “Normalmente a explicação sucede uma justificativa para o problema, mas é possível encontrar explicações que não recebem estas garantias” (SASSERON e CARVALHO, 2008). Em muitos casos, as explicações estão inacabadas e vão ganhando corpo e individualidade ao longo da discussão. Na argumentação, a linguagem tem um papel importante tanto na forma como o argumento é construído, quanto na qualidade desse argumento. 2.5 As múltiplas linguagens no ensino de Ciências Linguagem é qualquer sistema de meio de comunicação para transmitir ideias ou sentimentos através de símbolos convencionados. Além de possibilitar uma transmissão de informações de um emissor a um receptor, a linguagem é vista como um lugar de interação humana. A linguagem é a peça fundamental para o desenvolvimento científico na aula de Ciências. Por esse motivo, é de grande interesse para que se possam compreender as diversas variáveis que auxiliam na comunicação na sala de aula. Na relação escolar, tanto o professor quanto o aluno tentam se entender. Existem diversos tipos de linguagens para representar conceitos, ideias, significados e pensamentos. São necessários, geralmente, uma combinação ou relação dos tipos de linguagem na comunicação para que um conceito ganhe significado inteligível. A escolha da função da linguagem mais adequada aumenta a chance de êxito no processo de comunicação, ou seja, a reação desejada no receptor. Ela não funciona como uma via de mão única entre docente/transmissor e aluno/receptor. Essas posições são mutáveis constantemente. Porém, os 37 professores acabam não conseguindo se fazer entender, pois não buscam entender ou ouvir seus alunos, e conhecer suas necessidades. Piccinini e Martins (2004) afirma que: Não nos comunicamos exclusivamente por meio da fala, mas sim pela sua articulação com imagens, gestos corporais, expressões faciais, movimentos de aproximação e de afastamento, os tons de voz, nosso jeito de vestir e de andar, entre tantos outros. (op. cit., p. 2) Em concordância com isso, a ciência também não é feita apenas da linguagem verbal e escrita, sua construção dispõe de outras formas de linguagem, tais como gráficos, equações, tabelas, etc (LEMKE, 1998). Quando os cientistas pensam, falam, trabalham e ensinam, não usam apenas palavras; eles gesticulam e movem-se em espaços visuais imaginários definidos pelas representações gráficas e simulações, que por sua vez têm expressões matemáticas que também podem ser integrados em discurso. (LEMKE, op. cit, p.3) Lemke afirma isso para mostrar a importância de diversas formas de linguagem e seus papéis no processo de construção do conhecimento científico. “Os conceitos da ciência não são conceitos verbais, embora tenham componentes verbais. Eles são híbridos semióticos, simultaneamente e essencialmente verbaltipológico e matemático-gráfico-operacional-topológico.” (LEMKE, op. cit, p. 3). Lemke acredita que cada modo é um canal de comunicação que promove a socialização do conhecimento. Muitos pesquisadores têm estudado a relação entre os diferentes modos semióticos (ou linguagens) para dar sentido a um argumento e questionam a linguagem como única possibilidade na comunicação e na construção do conhecimento (LEMKE, 1998; BARBOSA-LIMA e CARVALHO, 2002 e 2003; MÀRQUES et al., 2003; PICCININI e MARTINS, 2004; SASSERON e CARVALHO, 2010; CARMO e CARVALHO, 2012). Verifica-se, portanto, que a comunicação tem mais recursos do que apenas a linguagem oral ou escrita. Márquez et al (2003) referem que na construção de conhecimento as interações multimodais contribuem para a análise do discurso em dois aspectos: identificando as funções comunicativas dos distintos modos semióticos (signos) na construção de significado (especificação); e mostrando a relação entre elas ao longo da atividade analisada 38 (cooperação). Além disso, as autoras lembram que a comunicação é parte essencial das atividades que são desenvolvidas na aula de ciências, e que a escrita ou fala, muitas vezes, não oferecem segurança para refletir o pensamento desejado. Sasseron e Carvalho (2010) explicam que: Relações entre as noções explicitadas por meio de uma ou de outra forma de comunicação podem auxiliar na construção de ideias mais coesas e coerentes. Dadas estas considerações, a multimodalidade de discurso e de comunicação oferece oportunidades para que uma mesma informação seja analisada à luz de diferentes situações, cada qual acrescentando detalhes que enriquecerão a percepção que se tem sobre tal assunto, permitindo, portanto, que se construa uma ideia mais bem sistematizada daquilo que se discute. (p. 7) Márques et al (2003) afirmam que “a construção de significado na aula se produz através das palavras faladas, dos diagramas desenhados, das fórmulas escritas e dos experimentos realizados” (p. 372), com ações compartilhadas e construídas em conjunto entre os alunos e o professor, Lemke (1998) chama isso de semiótica social. Para ele, a semiótica social procura explicar como fazemos com todos os recursos à nossa disposição: linguística, pictórica, gestual, musical, coreográfica e, mais geralmente acional. E como as pessoas elaboram e utilizam os signos para construir uma comunicação concreta. Para a FQ esta visão é crucial na avaliação das suas tirinhas, por três motivos: (i) A comunicação na sala de aula, também, se utiliza de múltiplas linguagens: escrita, oral, visual e matemática; (ii) As artes sequenciais em geral são desenvolvidas segundo essa mesma relação entre linguagens na construção de significado; (iii) E o último, como já havia sido apontado, a ciência se desenvolve dentro dessa relação de diversas formas de linguagem. No planejamento das sequências investigativas e tirinhas reflexivas foram pensadas atividades que fomentem uma interação entre as diferentes linguagens de modo que o aluno tenha mais recursos para a construção do conhecimento. 39 2.5.1 A palavra, o desenho e o gesto na construção de conhecimento A relação entre os diferentes tipos de linguagens favorecem o diálogo entre os alunos. Isso pode auxiliar na compreensão de alguns elementos presentes na construção de conhecimento científico. Segundo Piccinini e Martins (2004) a linguagem gestual, por exemplo, é essencial para que a aluno, carente de vocabulário para consolidar a explicação, possa significar e explicar os conceitos envolvidos na resposta à pergunta do professor. Com a falta de vocabulário para construir seu significado ou resposta, o aluno pode se utilizar dos gestos e/ou dos desenhos. Para Vigotski (1994), “o gesto é a escrita no ar, e os signos escritos são, frequentemente, simples gestos que foram fixados” (p. 142). Mais adiante, esse autor acrescenta que “(...) o desenho é uma linguagem gráfica que surge tendo por base a linguagem verbal” (op. cit., p. 149). Barbosa-Lima e Carvalho (2003) completam afirmando: Se ampliarmos a esfera de ação de nossos alunos, através de atividades de ensino, ao mesmo tempo em que os estimulamos a falar e/ou escrever sobre as mesmas, mais eles se desenvolverão, com possibilidades de incluir novas palavras em seu vocabulário mesmo que sem o significado estrito utilizado na Física e de compreender novos conceitos. (op. cit., p. 88) Pode-se concluir com isso, que as múltiplas linguagens propiciam as funções argumentativas e retóricas do aluno. Por essa razão, utilizaremos, no material da FQ, esse tipo de viés que permite avaliar, dando a possibilidade de os alunos responderem às questões apresentadas nas tirinhas através de diversas formas de linguagem. Afinal, uma palavra mal utilizada pode ser mais bem entendida com gestos ou desenhos, especificando seu sentido assim como nos lembra Màrques et al. (2003). No processo de ensino-aprendizagem é elementar considerar o uso de diversas linguagens para a construção dos conhecimentos científicos, já que apenas a linguagem oral não é suficiente para a representação necessária do entendimento dos fenômenos físicos (CARMO e CARVALHO, 2012) A história em quadrinhos se comunica com o leitor através do argumento dos quadrinhos, por isso o enredo da história e o tema devem auxiliar nessa construção 40 do discurso escolar. Para isso, devem-se conhecer as bases do argumento e do enredo das histórias em quadrinhos. 2.5.2 O enredo da história e a construção da problematização No caso dos quadrinhos reflexivos, acreditamos que, para uma sequência didática, a problematização deve ser apresentada através do enredo da história. É necessário, além disso, que exista uma conversa com os leitores, através de perguntas e questões abertas. Segundo Lipszyk (1972) um argumento de história em quadrinhos deve conter pelo menos um problema para ser resolvido, algum obstáculo à solução do problema, uma crise na tensão dramática e um apogeu, ou ainda um desenlace ou explicação. O problema a que ele se refere, é o elemento que dá interesse ao leitor, e o atrai dramaticamente à história. Nos quadrinhos com atividades reflexivas, o problema no enredo da história é o fenômeno dentro da situação retratada nos quadrinhos, e também o elemento que estabelece a comunicação do aluno com a tirinha. O obstáculo é a discussão e o desenvolvimento da argumentação entre os alunos para chegar ao apogeu, que é a conclusão dos alunos sobre o fenômeno apresentado. Essas são algumas das bases do argumento dos quadrinhos, e é como a historieta se comunica com o leitor. A problematização no enredo é a essência do argumento e a linguagem que orquestra esta comunicação que está altamente relacionada com a interação entre a imagem e o texto. A discussão sobre perguntas e situações apresentadas nos quadrinhos são os motivos da HQ, e é mais um canal dentro da comunicação e da linguagem dos quadrinhos. Lipszyk (1972) argumenta que um enredo sem motivo não possui profundidade, e muitas vezes não tem lógica. Para uma linguagem eficaz, na FQ é necessário que na estrutura das histórias em quadrinhos, haja a problematização no enredo se comunicando com as questões. Para manter o leitor lendo e interagindo com as tirinhas, a historieta deve ser proporcional a uma reação emocional, esse sentimento deve estar no enredo da história para que os alunos possam discutir e desenvolver seu conhecimento sobre o fenômeno. 41 As histórias em quadrinhos são uma linguagem de comunicação de massa, que na sala de aula, vão proporcionar o diálogo com os alunos e o professor. Logo, elas também devem estabelecer essa autonomia libertadora para os alunos e o professor; conservando elas mesmas sua autonomia própria. 2.5.3 Linguagem dos quadrinhos Os conjuntos de sinais empregados nas histórias em quadrinhos são: os signos escritos que representam, dentro da estória, a fala ou o pensamento do personagem, e os signos gráficos que podem expressar o sentimento e a personalidade do personagem. Tendo uma linguagem própria, é muito importante conhecer esse conjunto de signos. Como sugere Vergueiro e Rama (2004), uma “alfabetização” da linguagem dos quadrinhos se faz necessária, para que se possa aproveitar da melhor forma os recursos das tirinhas. Esse conjunto de signos que compõem as HQs aguçam a imaginação e a capacidade de pensar do aluno. Em todos os lugares que nos encontramos na sociedade em que vivemos, estamos rodeados por informações em forma de imagens. Caruso e Silveira (2009) reforçam essa ideia: Em uma sociedade eminentemente visual, com o predomínio da televisão como mídia de massa, os quadrinhos não devem ser desprezados como uma mídia em favor da educação. Além de a linguagem das HQs ser de fácil compreensão, se comparada à dos livros, seu apelo visual é grande, e o seu timing (principalmente o das tiras), compatível com o timing da visão fragmentada dos videoclips, com os quais os jovens estão habituados. Ou seja, as HQs e, em particular, as tirinhas permitem uma leitura muito rápida e dinâmica da mensagem que se pretende transmitir; portanto, são estimulantes, num certo sentido. (CARUSO e SILVEIRA, 2009, p. 219) Para Eisner (1999), os quadrinhos usam uma “linguagem” que precisa da experiência visual comum entre o leitor e o criador, mas de compreensão fácil e cuja “leitura” tenha uma ampla aplicação. É interessante descrever algumas das características e recursos dos quadrinhos, e das artes sequenciais, a fim de analisar melhor o emprego dessa abordagem de ensino. Seguindo as definições dos autores: Eisner (1999, 2008), Vergueiro e Rama (2004) e McCloud (2005, 2008), pode-se 42 separar a estrutura dos quadrinhos em: (i) a organização e função dos quadros para a narrativa; (ii) a relação entre a imagem e o texto; e (iii) o tempo e o espaço na estória. 2.5.3.1 A narrativa A narrativa é o argumento dos quadrinhos e, como mencionado anteriormente, é onde deve estar a problematização e o gatilho da discussão do fenômeno científico. Porém, é necessário lembrar que McCloud (2008) aponta que as pessoas buscam duas coisas quando querem contar uma história: que o leitor entenda o que se tem que contar, e que ele se importe o bastante para continuar ouvindo até que se acabe. Para que isso aconteça, a clareza nos quadrinhos deve ter um fluxo de escolhas em relação a imagens, ritmo, diálogo, composição e gesticulação. Ou seja, uma interação clara entre diferentes tipos de linguagem. Com isso, é necessário conhecer os princípios que permitem se comunicar com clareza, e também aprender a persuadir seu público a continuar com você. McCloud (2008) divide as escolhas do contador de história em cincos tipos básico (Tabela 3): Tabela 3 – Elementos básicos da narrativa Escolha do momento: decidir quais momentos incluir em uma tirinha e o que deixar de fora; Escolha do enquadramento: escolher a distância e o ângulo corretos para ver esses momentos; Escolha das imagens: representar os personagens, objetos e ambientes com clareza nesses enquadramentos; Escolha das palavras: escolher palavras que acrescentem informações valiosas e se casem bem com as imagens que as rodeiam; 43 Escolha do fluxo: guiar os leitores através e entre os quadrinhos em uma página ou tela. Fonte: MCCLOUD (2008), p.15 Jiménez-Aleixandre (2010) refere que aprender a argumentar implica comunicar, persuadir um público. Em cima dessa afirmação, pode-se relacionar a argumentação proposta para a sala de aula, com a narrativa em FQ. As tirinhas são um novo ambiente que pretende estimular o desenvolvimento da argumentação do aluno através das atividades envolvidas, e o estudo das interações professor-alunos. Uma boa narrativa e um argumento são encontrados quando o escritor lança seu olhar aos problemas humanos (LIPSZYK, 1972, p. 245), e, consequentemente, para a sociedade. Além disso, o autor explica que o método problemático (a problematização proposta pelo FQ na narrativa da história) “estimula a imaginação e é um dos exercícios mais práticos para realizar bons argumentos” (p. 249). 2.5.3.2 A imagem Para Eisner (1999), o entendimento de uma imagem necessita de um senso comum de vida entre o artista sequencial e o leitor; ou que o artista compreenda a vida do leitor. Esse entendimento está na relação da linguagem dos quadrinhos e a construção de significado. As historietas devem propiciar que o leitor desenvolva esse processo de estruturação do significado. Vergueiro e Rama (2004) reiteram dizendo que na grande maioria das vezes, esse entendimento é alcançado pelo leitor pela interação entre os códigos dos quadrinhos: texto e imagem. Esse tipo de interação é um confronto entre o que nos é apresentado e o que pensamos sobre o assunto. Nesse método de comunicação, o facilitador desse entendimento é o cotidiano. Em muitos casos, o cotidiano do aluno é o mesmo do professor, que é o mesmo da escola. Reforçando isso Eisner (1999) lembra que: O sucesso ou fracasso desse método de comunicação depende da facilidade com que o leitor reconhece o significado e o impacto emocional da imagem. Portanto, a competência da representação e a universalidade 44 da forma escolhida são cruciais. O estilo e a adequação da técnica são acessórios da imagem e do que ela está tentando dizer. (EISNER, 1999b, p.14) Esse é o lado da linguagem das HQs que apresenta, de forma mais nítida, o potencial expressivo do artista de quadrinhos. A imagem dentro do quadro é como uma palavra. Sozinha ela tem um significado, mas em uma sequência de quadros, ela pode complementar a informação que se quer passar ou até significar outra coisa completamente diferente do que se entendeu no início. A imagem, como se pode verificar, guia o leitor dentro da narrativa. Muitas vezes, é possível passar uma informação ou contar uma estória com imagens apenas. Nesse sentido, mais uma vez, requer-se do artista uma experiência comum com o leitor/aluno. McCloud (2005) sugere imagens icônicas quando a mensagem é importante. Desenhos muito realistas tendem, segundo ele, a prender o leitor na admiração da imagem dos personagens e do cenário (Figura 8). Por esse motivo, ele acha que essa é a explicação do nosso fascínio por desenhos animados, já que a simplicidade dos desenhos deixa a identidade e a consciência mais atrativa ao leitor. Em relação às imagens nas tirinhas de FQ, buscou-se adotar personagens icônicos para que o aluno possa se identificar com o personagem e a situação nelas retratadas. Figura 8 – Imagem icônica versus realista Fonte: Mc Cloud, 2005, p. 36 Além disso, através das expressões faciais ou corporais, os artistas podem passar uma ideia ou uma informação. Eisner (1999) aponta que, “decididamente, a 45 imagem mais universal com que o artista sequencial tem de lidar é a forma humana. De todo o inumerável inventário de imagens que constituem a experiência dos homens, a forma humana é a mais assiduamente estudada, e, portanto, a mais familiar”. A Figura 9 mostra um exemplo de como a expressão facial em conjunto com as palavras pode ter inúmeras interpretações, e um vocabulário de expressões. Figura 9 – Demonstração da interação entre as expressões faciais e o vocabulário Fonte: EISNER, 1999, p. 110 Podem ser encontradas, também, histórias sem palavras. Para isso, a imagem deve ser explorada de forma ainda mais expressiva. A ausência de texto ou falas pede a utilização de imagens de senso comum e de gestos e expressões exageradas (Figura 10). Figura 10 – Exemplo de HQ sem palavras Fonte: McCloud, 2008, p. 12 46 2.5.3.3 O texto A fala e o pensamento dos personagens, a voz do narrador e os sons envolvidos nas narrativas são o elemento textual da linguagem dos quadrinhos. Dentro dos quadrinhos, as linguagens textuais e as verbais, geralmente, são a mesma coisa, e os seus empregos dentro das HQs são mais complexos do que podemos imaginar. Vejamos o que nos apresenta Vergueiro e Rama (2004) em relação a esse tema: (...) os textos verbais que representam formas de comunicação dos personagens, internas ou externas, aparecem nos quadrinhos envoltos por uma linha circular, próxima à cabeça do(s) que as expressam. Da mesma forma, os textos que contém a expressão do narrador vêm acondicionados em um retângulo colocado no canto superior esquerdo do quadrinho. A representação verbal de sons é feita nos quadrinhos por meio das onomatopeias, normalmente em caracteres grandes e dispostas na vinheta de maneira a valorizá-la graficamente. (VERGUEIRO E RAMA, 2004, p.55 e 56) A forma mais comum de apresentar o texto dentro dos quadrinhos é pelo balão. Os balões de fala formam um complexo código dentro da linguagem verbal. Eles são a interseção entre a linguagem verbal e a linguagem visual. Com certa frequência, os balões diferenciam os personagens. Por exemplo, quando existe uma adaptação de uma HQ para o cinema, alguns fãs reclamam que aquela voz não é a do personagem. Como pode ser isso? Já que os personagens nos quadrinhos não falam. Vergueiro e Rama (2004) explicam que, os leitores têm a impressão de ouvir as vozes na sua mente, quando leem as palavras dentro dos quadrinhos. Isso reforça o que já foi falado sobre o exercício dos quadrinhos estimularem a imaginação do leitor, e, no caso deste projeto, do aluno. Um ponto também interessante na questão dos balões e seus textos é quando apresenta tipografia diferente da normal. Isso representa um personagem falando em outro idioma, ou outro sotaque, ou ainda quando ele fala de forma diferente. Dentro da linguística dos quadrinhos, algumas vezes o texto é tratado graficamente para reforçar uma ideia, um fato ou um sentimento que quer ser narrado. Para Eisner (2008), “O letramento, tratado “graficamente” e a serviço da 47 história, funciona como uma extensão da imagem.” Esse tipo de recurso é utilizado para direcionar a proposta de ensinar Física dentro das tirinhas, pois é mais um elemento atrativo para a leitura dos quadrinhos e sua interação com os alunos. Figura 11 – O letramento está apoiado no clima do quadrinho, descrevendo os sentimentos e o cenário Fonte: EISNER, 1999, p. 11 A Figura 11 exemplifica uma utilização do letramento para dar um clima chuvoso à narrativa. A utilização da tipografia (letramento) pode ser usada nas tirinhas para enfatizar uma situação ou os fenômenos físicos. Esse é um caso particular do uso do texto nas tirinhas, assim como as onomatopeias, uma vez que os textos por si só não são arte sequencial, elas devem estar em conjunto com as imagens. 48 2.5.3.4 Timing Muitas vezes, os elementos dos quadrinhos devem ser combinados com o tempo, por isso, é necessária uma representação do tempo para situar o leitor no espaço-tempo. Entre um quadrinho e outro, podem passar séculos ou segundos, mas apesar do tempo ser ilusório, ele é essencial na estrutura da linguagem dos quadrinhos. O tempo é percebido através de elementos gráficos da narrativa. O Timing é o uso dos elementos do tempo para a obtenção de uma mensagem dramática, como por exemplo, simular a câmera lenta durante a morte de um personagem (Figura 12). Figura 12 – Demonstração de timing nos quadrinhos Fonte: Eisner, 1999, p. 25 Para Eisner (1999) uma história em quadrinhos torna-se "real" quando o tempo e o timing tornam-se componentes ativos da criação. Os balões, os quadrinhos e as sarjetas (espaços entre os quadrinhos) são muito úteis no delineamento do tempo (Figura 13). “O código Morse ou uma passagem musical podem ser comparados a uma tira de quadrinhos, já que incluem o uso do tempo na sua expressão” (EISNER, 1999, p. 27). Existem outros signos que podem representar o tempo como, por exemplo, um relógio na parede do cenário, ou até a queda sequenciada de um objeto. 49 Figura 13 – Medida do tempo Fonte: Eisner, 1999, p. 27 Todos esses elementos são ingredientes indispensáveis para estruturação dos quadrinhos. Porém, durante a criação das histórias em quadrinhos, o desenhista tem liberdade para brincar e subverter essa estrutura. No entanto, antes de brincar e subverter estruturas, o desenhista precisa conhecê-las e ter domínio de suas utilizações. 50 3 CONHECIMENTO DO CONTEÚDO 3.1 Leis de reflexão nos espelhos planos O fenômeno da reflexão e a presença dos espelhos planos são observados em vários momentos de nosso dia a dia, e muitas vezes não percebemos. Espelhos são superfícies lisas e polidas que permitem a reflexão de grande parte da luz que incide sobre elas. Materiais de aço inox, uma pintura bem polida de um automóvel e até um lago são exemplos dessas superfícies através das quais é possível ver nossa imagem. Eles são usados, principalmente, para observação de ângulos diferentes. Ao pegar um elevador, notamos a existência de espelhos planos na lateral ou no fundo do elevador. Nesse caso, eles são usados para que o ascensorista, estando dentro do local, possa enxergar possíveis usuários dirigindo-se para o elevador. São utilizados também nos retrovisores de carros para que seja possível ver os veículos que estão atrás, garantindo ao motorista segurança na hora da ultrapassagem ou ao estacionar. Muitos instrumentos ópticos utilizam espelhos planos em seu funcionamento. Alguns telescópios, por exemplo, possuem espelhos em sua composição. Introduzidos por Issac Newton, eles são chamados de telescópicos refletores, e funcionam com a combinação de espelhos esféricos e espelhos planos. Além disso, existem os periscópios que são instrumentos usados na guerra para observar os inimigos de dentro de uma trincheira ou de um submarino. A bola de espelhos e os caleidoscópios, criados por David Brewster, são utilizados como entretenimento, e refletem luzes e brilhos fascinantes. A utilização mais comum do fenômeno da reflexão é quando nos olhamos no espelho. E a mais antiga registrada é a lenda de Narciso quando olhava seu reflexo no lago e admirava sua beleza. 51 3.1.1 O princípio de Fermat O matemático francês Pierre de Fermat, por volta de 1650, baseado na sua hipótese de que “a Natureza sempre atua pelo caminho mais curto”, formulou o principio de Fermat ou do mínimo tempo: “de todos os caminhos possíveis para ir de um ponto a outro, a luz segue aquele que é percorrido no tempo mais curto” (FEYNMAN, 2008, p.26-3). Com a ideia de Fermat em mente, podemos compreender a reflexão. Para demonstrar esse princípio em espelho plano, na Figura 14a são demonstrados dois pontos A e B, e um espelho E. A partir disso, a seguinte questão é levantada, qual é o caminho para ir de A até B no menor tempo para um raio de luz? A resposta para isso é muito simples: um raio de luz refletido em A, direto para B. Poderíamos supor que A é um objeto e B um observador. Além disso, devemos considerar uma condição para essa questão: o raio de luz tem que “bater” no espelho E, e retornar no menor tempo. No entanto, a resposta não é tão simples assim. Figura 14 – Demonstração do Princípio de Fermat O raio de luz teria que ir tão rápido quanto possível de A até o espelho E, e do espelho ir para B, como demonstra a Figura 14b. O caminho de A até o espelho E é o mais curto, porém o caminho de B até o espelho E é o mais comprido. Deslocando o ponto que a reta toca no espelho, um pouco mais para a direita, aumenta-se ligeiramente o raio de A até o espelho E, mas diminui-se consideravelmente o raio 52 do espelho E até o ponto B, diminuindo, desse modo, o caminho total de A até B, quando o raio de luz ricocheteia no espelho E. No entanto, deve-se perguntar como podemos encontrar o ponto exato de incidência sobre o espelho para o qual o tempo total é o mais curto possível. Podemos encontrar a resposta para isso utilizando um truque geométrico: marcando um ponto artificial B’ no outro lado do espelho, a uma distância abaixo do mesmo igual à distância do ponto B até o espelho E, como ilustra a Figura 14c, a distância mais curta entre A e este ponto artificial B é determinado traçando-se uma linha reta entre os dois pontos. Essa reta intercepta o espelho num ponto C, que é o ponto exato onde se dá a reflexão no mínimo caminho e que é o menor percurso de propagação da luz entre A e B. Analisando cuidadosamente isso, verifica-se que a distância entre C e B é igual à distância entre C e B’. E que o caminho de A até B’, passando por C, é igual ao comprimento do caminho que vai de A até B também passando pelo ponto C. 3.1.2 Modelo teórico da reflexão A reflexão é o fenômeno no qual a luz volta a se propagar no meio de origem, após incidir numa superfície que separa dois meios. Considere a reflexão de um raio de luz na superfície E (Figura 15), sendo AC o raio de incidência no ponto C da superfície E, o qual forma, em conjunto com a reta normal N em relação à superfície E, um ângulo incidente i. O raio refletido CB, por sua vez, forma com a reta normal N um ângulo de reflexão r. Mediante isso, podemos enunciar as duas leis da reflexão: • Primeira lei: o raio refletido, o raio incidente e a reta normal são coplanares, ou seja, eles pertencem ao mesmo plano; • Segunda lei: o ângulo de reflexão é igual ao ângulo de incidência. 53 Figura 15 – Esquema que representa a reflexão de um raio de luz Estas duas leis provêm da observação do truque geométrico apresentado na Figura 14c. 3.2 Espelhos planos Quando os raios de luz sofrem reflexão regular num espelho plano e atingem nossos olhos, não percebemos que esses raios foram refletidos na superfície. A impressão que se tem é que os raios vieram do espelho, exatamente da posição em que se vê a imagem. A imagem é vista em um espelho, porque os raios de luz que são refletidos pelo corpo chegam até a sua superfície, sofrem reflexão regular e esses raios são captados pelos olhos formando a imagem. Os espelhos têm umas particularidades interessantes. Uma delas é a reversão da imagem, que em linguagem cientifica quer dizer que ele “troca” a direita e a esquerda de lugar. É possível observar esse fenômeno na palavra “casa” escrita pela menina na tirinha abaixo (Figura 16). 54 Figura 16 – Exemplo de reversão da imagem em quadrinhos Apesar da reversão, a imagem no espelho plano é simétrica ao objeto, tanto em tamanho quanto em distância. Considere sempre como referencial a posição do espelho, pois ao observador (objeto) é possível mudar de posição. Na Figura 14c o tamanho do ponto B é desprezível para comparar com o ponto B’, porém a distância entre o espelho e os pontos B e B’ são iguais, como já discutindo anteriormente. A Figura 17 representa a formação da imagem no espelho plano, que tem o mesmo tamanho e é virtual. O conceito científico define imagem virtual como sendo a imagem formada pelos prolongamentos dos raios refletidos. Figura 17 – Representação da imagem Outra particularidade é o estudo sobre o campo visual, que é a região do espaço que pode ser contemplada pelo espelho através da reflexão. Esse campo visual é determinado pela posição do observador em relação ao espelho. Situação muito observada, por exemplo, quando o espelho é usado para ampliar sua visão, o que ocorre em locais como supermercados, elevadores e automóveis. Na Figura 18 temos um observador O em duas posições distintas, e seu campo visual nas duas 55 situações. As áreas entre as linhas tracejadas representam o campo visual em ambas as situações. Importante lembrar a relação das distâncias entre ponto O e O’, e o espelho, demonstrada na Figura 14c. Figura 18 – Campo visual no espelho plano em duas situações Numa situação em que o espelho é transladado paralelamente a si mesmo, a imagem de um objeto fixo sofre translação no mesmo sentido em relação ao espelho com o dobro da distância da translação do espelho, como podemos observar na Figura 19. Figura 19 – Demonstração da translação de espelhos planos Além disso, observa-se a associação do espelho plano. imagens é fornecido pela fórmula: onde, N é o número de imagens α é o ângulo diedro entre os dois espelhos O número de 56 3.3 Concepções prévias sobre a reflexão e os espelhos planos Algumas tiras têm a finalidade de discutir concepções prévias, propondo questões que levam os estudantes a confrontar essas concepções de forma que eles sejam capazes de construir as concepções corretas. Segundo Almeida et al. (2007), as principais concepções prévias detectadas referentes à reflexão e sobre os espelhos planos são: 3.3.1 A reflexão da luz ocorre somente na forma especular Quando a palavra reflexão não aparece explicitamente, os alunos não costumam considerar o processo de interação entre a luz e os objetos. Isso ocorre porque eles não entendem que a luz é refletida em uma parede assim como em outros objetos opacos. Figura 20 – Lanterna iluminando uma parede de uma sala fechada (figura adaptada da apresentada em Almeida, 2007) A Figura 20 faz a demonstração de uma lanterna ligada e apontada para uma parede. Nessa situação, existe a possibilidade de haver luz na região I. Por isso, os alunos acreditam que seja uma “violação da propagação retilínea da luz”, pois a luz não pode dobrar-se para iluminá-la. Em outras palavras, por esse pensamento, não parece ser considerada a reflexão da luz na parede da sala, que faz com que parte da luz emitida pela lanterna também se propague na região I. 3.3.2 Raios visuais A concepção dos Raios Visuais está relacionada com a anterior, na qual os estudantes não consideram que a luz é refletida pela parede e por outros objetos 57 opacos. É comum o estudante considerar que não é necessário luz para que se veja um objeto. Alguns desses estudantes apresentam o modelo dos “raios visuais”, proposto por Aristóteles, para explicar o processo da visão, conforme Figura 21a. No entanto, na Figura 21b pode-se ver representada a visualização de um objeto considerando a concepção científica. Diversos raios são refletidos pela superfície do objeto, alguns desses raios chegam ao olho do observador, permitindo-lhe sua visualização. Figura 21 – Visualização de um objeto utilizando os raios visuais (a); conceito científico (b) (figura adaptada da apresentada em Almeida, 2007) 3.3.3 A imagem está na superfície do espelho Provavelmente essa concepção existe porque há a dificuldade de os alunos conceberem as características das imagens virtuais, que são formadas pelos prolongamentos dos raios refletidos na superfície do espelho, o que já sugere que a imagem não pode estar em sua superfície (Figura 22), mas atrás dele. A imagem formada por um espelho plano não é somente do objeto em questão, mas de parte do ambiente que cerca esse objeto, ou seja, reproduz, também, a distância em que o objeto se encontra do espelho, por exemplo. 58 Figura 22 – Imagem está na superfície do espelho (figura adaptada da apresentada em Almeida, 2007) 3.3.4 O tamanho da imagem depende da distância do objeto ao espelho Ao afastar um objeto de um espelho plano, o aluno acredita que a imagem do objeto diminui (Figura 23). Figura 23 – Redução da imagem com o aumento da distância (figura adaptada da apresentada em Almeida, 2007) O autor refere que tal concepção, possivelmente, também esteja relacionada à dificuldade de traçar os raios principais para determinação de imagens em espelhos planos. 59 3.3.5 A posição da imagem depende do observador A posição da imagem depende somente da posição relativa do objeto ao espelho. A visualização dessa imagem é que depende da posição na qual o observador está, ou seja, depende do local onde os raios refletidos no espelho, provenientes do objeto, possam chegar aos olhos do observador. A concepção correta pode ser entendida observando a Figura 18. 3.3.6 Espelhos só podem ser feitos de metal ou vidro Almeida (2007) afirma que os estudantes investigados não consideram os espelhos planos simplesmente como qualquer superfície polida que reflete regularmente a luz, devendo ser, somente, de metal ou vidro. Os alunos esquecem que a água ou qualquer outro material polido também refletem luz e formam imagens. 3.3.7 Espelhos como refletores perfeitos Alguns estudantes acreditam que toda luz que incide num espelho é refletida. Eles esquecem, ou pelo menos deixam de observar, que um espelho fica quente quando exposto ao Sol. Os alunos não consideram que parte da luz é refletida e outra parte é absorvida fazendo com que ele fique quente. 60 4 MATERIAL E MÉTODO 4.1 Física em Quadrinhos: O Material Física em Quadrinhos (FQ) consiste em tirinhas reflexivas que apresentam situações do cotidiano. As historietas têm como objetivo promover a discussão entre os alunos sobre fenômenos físicos, sendo utilizadas, além disso, nas aulas para motivar e/ou introduzir outras perguntas e informações. No desenvolvimento das tirinhas, foram incorporadas questões abertas ou atividades que provocassem a curiosidade dos alunos. Além das situações do dia a dia, as tirinhas apresentam pontos de vistas alternativos sobre o fato nelas apresentado, como em Concept Cartoons (KEOGH ET AL., 1998). Isso é feito, com o objetivo de convidar os alunos a envolverem-se no debate junto aos personagens e à situação retratada. A investigação e a discussão sobre os pontos de vista e o fenômeno seguem, propositalmente, as propostas de ensino por investigação e promoção de argumentação na sala de aula. As figuras 24 e 25 são exemplos das tirinhas de FQ. Figura 24 – Posição da Imagem I 61 Figura 25 – Campo Visual I A FQ apresenta as situações de forma bem humorada, pois acreditamos que as histórias em quadrinhos não podem perder sua característica lúdica quando aplicada na escola. Porém não é um humor exagerado e que tire o foco do fenômeno tratado. Assim como as Concept Cartoons, os quadrinhos têm um uso de texto pequeno para tornar mais acessíveis aos alunos com a competência da leitura limitada. As artes sequenciais, em geral, têm uma identidade própria, que é a marca da série de quadrinhos. A marca da FQ é uma brincadeira com a palavra História que foi substituída pela palavra Física, já que os quadrinhos “contam” Física ao invés de Histórias. Por isso a série leva o nome de Física em quadrinhos. Figura 26 – Marca das tirinhas 62 A letra ‘O’ estilizada representa a órbita da Terra em torno do Sol ou também um átomo de hidrogênio, uma vez que cerca de 70% da matéria que constitui nossa estrela é o hidrogênio. Essa marca pode ser interpretada por esse duplo significado. Constata-se, assim, que a marca da FQ (Figura 26) tem seu significado, baseado em princípios e que ela não foi escolhida de forma aleatória. Em FQ, o protagonista das histórias é o fenômeno físico. Para Vergueiro e Rama (2004), os personagens secundários concorrem para destacar a atuação do protagonista, ou seja, os personagens secundários estão vivenciando esse fenômeno, para destacá-lo fisicamente falando. Por enquanto, as tirinhas produzidas estão relacionadas com a lei de reflexão em espelhos planos, presentes em vários momentos de nosso dia a dia, e que, muitas vezes, não percebemos. Todas as atividades do projeto aqui apresentadas estão dentro da subárea da Óptica. O tema “espelhos planos” foi divido em cinco tópicos, e cada um desses tópicos tem um grupo de tirinhas e suas respectivas questões. Essa divisão busca uma sequência didática que está habitualmente presente em muitos livros didáticos. Os tópicos são: (i) “inversão” da imagem; (ii) posição da imagem; (iii) campo visual; (iv) associação de espelhos e (v) curiosidade com espelhos e/ou reflexão. Apresentamos na tabela abaixo, o número de tirinhas criadas por tema. 63 Tabela 4 – Relação das tirinhas por temas da Óptica Temas da Reflexão Número de tirinhas “Inversão” da Imagem 5 Posição da Imagem 5 Campo Visual 4 Associação de Espelhos 2 Curiosidades sobre espelhos 4 As tirinhas fazem parte do conjunto de materiais do grupo PROENFIS 4, que já desenvolveu, aplicou e avaliou diversos materiais para o ensino de Física. Outros exemplos podem ser vistos em Souza (2012a; b). 4.1.1 Física em Quadrinhos como atividades investigativas Os quadrinhos de FQ foram planejados sob a proposta de ensino por investigação. O próprio argumento das tirinhas deveria ser uma questão, ou seja, a leitura das histórias gerariam um desconforto e um questionamento no aluno. Porém, para que essas discussões fossem mais dinâmicas e houvesse uma sistematização, as tirinhas foram somadas com outras questões, problemas e/ou atividades. A combinação tirinhas-questões busca valorizar a participação dos alunos e, para isso, ela promove atividades e discussões que os tirem da postura passiva de mero receptor de conhecimento. Como referido anteriormente, qualquer atividade ou material pode ter caráter investigativo, contanto que ele esteja ancorado em perguntas, questões e/ou situações-problemas que despertem o interesse dos estudantes em investigar. Essas situações-problema devem se mostrar interessantes para o estudante, e, de preferência, devem envolver um enfoque CTS. Observadas essas características, os 4 Grupo que tem produzido e avaliado materiais para ensino de Física, e que publicou um livro Temas para o ensino de Física com abordagem CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade) [Vianna e Bernardo (2012)] apoio FAPERJ. As tirinhas fazem parte do capítulo 9 desse livro que se encontra online: www.proenfis.org.br no site do grupo PROENFIS. 64 quadrinhos e suas atividades terão caráter investigativo e reflexivo, uma vez que promovem a discussão e a reflexão sobre o fenômeno científico apresentado. 4.1.2 Física em Quadrinhos como ambiente de discussão Para que estes quadrinhos cumpram seu papel na construção de conhecimento científico, é necessário que elas promovam um ambiente onde o estudante pode se sentir livre para expor suas ideias, e possa discutir de igual para igual com os outros alunos e com o professor. Segundo Capecchi e Carvalho (2000): “(...) vários aspectos têm sido considerados, entre eles, as condições favoráveis à criação de um ambiente estimulante ao desenvolvimento da argumentação, através da identificação de características das atividades de ensino envolvidas, e o estudos das interações professor-aluno” (CAPECCHI e CARVALHO, 2000, p. 173). As tirinhas do projeto FQ pretendem ser um material que faz o aluno argumentar e discutir sobre ciência. Logo, propõe um material que promova a capacidade de desenvolver e justificar enunciados e ações com o objetivo de compreender a natureza (CARMO E CARVALHO, 2012), tendo também como referência a afirmativa de Jiménez-Aleixandre et al.(1998 apud CAPECCHI e CARVALHO, 2000) que “apontam o papel que atividades planejadas, envolvendo a elaboração de hipóteses, representam na criação de um ambiente estimulante ao desenvolvimento da argumentação” (p. 3). 4.1.3 Física em quadrinhos e seu diferencial A forma de abordagem desenvolvida em Souza (2012a) visa à formação cidadã dos alunos e pode ser desenvolvida em qualquer disciplina, e em todos os níveis acadêmicos. Além disso, uma pesquisa foi feita para que as estruturas dos quadrinhos conversassem com os demais referenciais. Esse material apresenta tirinhas e questões capazes de despertar a curiosidade do aluno, e que permitem uma reflexão e o aprendizado do conceito abordado, através de suas próprias conclusões e da discussão entre os alunos e entre o professor e o aluno. 65 Como nas tirinhas do metrô de Londres, as tirinhas deste projeto estão em conjunto com outras questões, que estão relacionadas com a situação ou o fenômeno. Isso reforça a ideia de Keogh et al (1998) que sugere que os personagens das tirinhas apresentem pontos de vistas alternativos sobre a ciência envolvida na situação, e convidem o aluno a se juntar ao debate com eles. As histórias em quadrinhos nos mostram a possibilidade de trabalharmos com elas de maneira mais interativa e lúdica, proporcionando a apropriação do conhecimento físico e resgatando assim, o seu objetivo de informar um saber para a população. Como uma das características mais importantes das tirinhas é o humor, algumas situações foram “exageradas” com certa licença poética. Entretanto, o humor e a licença poética devem ser trabalhados para que elas não alimentem conhecimentos alternativos errôneos ou equivocados. As historietas de FQ apresentam uma nova forma de trabalhar com histórias em quadrinhos, que não é, de maneira alguma, a mais fácil, porém é a forma que acreditamos ter melhor resultado, pois é sempre bom lembrar que a participação do aluno tem grande importância na construção do conhecimento científico escolar. Dentro da proposta dos quadrinhos do projeto, ao professor é dada a liberdade de trabalhar com ou sem as perguntas e/ou incorporar perguntas diferentes das perguntas originais. 4.2 Metodologia da pesquisa Na presente pesquisa de natureza qualitativa, procuramos inquirir sobre as discussões geradas nas tentativas de resolver os problemas propostos pelas tirinhas combinadas com atividades, questões e problemas investigativos. Igualmente, essa pesquisa está buscando encontrar no discurso dos alunos indicadores de construção de conhecimento que surgem na busca de responder um problema. Para classificar esses indicadores (ou elementos) de construção de conhecimento utilizaremos os padrões de argumento de Toulmin (Toulmin, 2006) e os indicadores de alfabetização científica sugeridos por (Sasseron e Carvalho 2008; 2010; 2011). De acordo com 66 Lüdke e André (2013), essa pesquisa pode ser classificada pelo conjunto de hipóteses como: A hipótese qualitativo-fenomenológica, que determina ser quase impossível entender o comportamento humano sem tentar entender o quadro referencial dentro do qual os indivíduos interpretam seus pensamentos, sentimentos e ações. De acordo com essa perspectiva, o pesquisador deve tentar encontrar meios para compreender o significado manifesto e latente dos comportamentos dos indivíduos, ao mesmo tempo que procura manter sua visão objetiva do fenômeno. O pesquisador deve exercer o papel subjetivo de participante e papel objetivo de observador, colocando-se numa posição ímpar para compreender e explicar o comportamento humano. (Op. cit., p. 17) Quanto aos meios de compreender o significado manifesto e latente dos comportamentos dos alunos, escolhemos coletar diferentes tipos de dados, numa perspectiva de múltiplas linguísticas. Acreditamos que, as tirinhas são mais bem aproveitadas quando utilizadas para gerar discussões entre os alunos e entre alunos e professor, ou seja, historietas reflexivas. Diferente das demais formas de utilizações de quadrinhos no ensino que costuma empregar a elas um papel apenas introdutório ou motivacional. Uma pesquisa, a comunicação e a cultura científica não se desenvolvem através da linguagem oral e escrita apenas, e sim da combinação de múltiplos sistemas semióticos como: pictural, gestual entre outros (Lemke, 1998). Para a construção de conhecimento científico são necessárias diferentes formas de comunicação, além da escrita e da oral, tal como: gráficos, equações, tabelas etc. Em incontáveis textos e atos de construção de significado, os membros de uma comunidade usam simultaneamente a linguagem e sistemas semióticos de representação e gráficos, movimento e gestual, música, moda, comida e todos os outros modos de ação social significativa em sua cultura (LEMKE, 1998, p.1). Com isso em mente, esta pesquisa analisa a construção de conhecimento promovida pela discussão sobre os temas abordados no material Física em Quadrinhos gravada em forma de áudio e vídeo; em diferentes sistemas semióticos que constituem a comunicação social e científica. Wilson (1977) apud Lüdke e André (2013) afirma que: 67 A investigação etnográfica procura descobrir as estruturas de significado dos participantes nas diversas formas em que são expressas, os tipos de dados relevantes são: forma e conteúdo de interação verbal dos participantes; formas e conteúdos da interação verbal do pesquisador; comportamentos não-verbais; padrões de ação e não ação; traços, registros de arquivos e documentos. (op. cit., p. 18) Essas combinações de sistemas semióticos foram estudadas por Lemke (op. cit.); Marquéz et al. (2003). Para Lüdke e André (2013), o professor tem uma tarefa que exige todo um arcabouço teórico para ser capaz de reduzir o fenômeno em seus aspectos mais relevantes para que também tenha conhecimento das diversas alternativas metodológicas para abordar a realidade a fim de compreende-la e interpretá-la melhor. Nesta seção apresentamos todas as escolhas metodológicas realizadas no percurso do nosso trabalho, descrevendo a pesquisa sobre a natureza educacional das histórias em quadrinhos (artes sequenciais), sua aplicação e avaliação no ensino de Física. 4.2.1 Amostra da pesquisa O projeto da pesquisa - CAAE 02852512.0.0000.5248 - foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da FIOCRUZ em 15 de setembro de 2012 (ANEXO A). Este projeto foi submetido também à Comissão de Ética do CP II com a aprovação pela Pró-Reitora de Pesquisa e Pós-Graduação para que essa pesquisa se realizasse naquele colégio (ANEXO B). Da mesma forma, antes da aplicação do material, os alunos, sujeitos da pesquisa, assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido autorizando a utilização dos dados da coleta. Para os estudantes com menos de 18 anos, os responsáveis também deveriam assinar o tal termo. Esse termo autoriza a gravação em áudio e vídeo preservando a identidade dos participantes na redação de seu trabalho e em materiais futuros que virão a ser publicados e/ou apresentados, seguindo os princípios éticos de pesquisa (ANEXO C). Para desenvolver a investigação, foi necessária a autorização de um professor permitindo trabalhar com suas turmas. O grupo PROENFIS conta com diversos professores de Física da rede estadual, federal e privada. Foi feito contato com alguns deles a fim de que permitissem a aplicação das tirinhas em suas turmas. 68 Três deles, professores do CPII, autorizaram a investigação e o trabalho em suas salas. Depois disso, fez-se contato com a direção do CPII solicitando a autorização para desenvolvimento da pesquisa e, como mencionado, houve aprovação daquela instituição. Todos os três professores que se voluntariaram a disponibilizar suas turmas para a pesquisa, são professores que já desenvolveram pesquisas e práticas semelhantes em anos anteriores. Por isso, contou-se com a experiência deles na aplicação das tirinhas. Dois professores eram do campus São Cristóvão e um do campus Humaitá. Os dois professores de São Cristóvão tinham apenas uma turma de Óptica cada. O do Humaitá tinha seis turmas. Em virtude do cronograma e do deslocamento entre os campi, só foi possível aplicar o material nas turmas de um desses professores (o que tinha mais turmas de Óptica), pois as turmas dos professores de São Cristóvão eram no mesmo horário entre si, e também no mesmo horário de uma turma no Humaitá. Além disso, a maioria das aulas de Óptica de dois tempos é aos sábados de quinze em quinze dias. As tirinhas podem ser usadas antes, durante ou depois da apresentação da teoria, porém, seria mais interessante para um melhor aproveitamento delas fossem aplicadas antes da teoria, por isso a espera para a aplicação poderia atrasar as turmas de São Cristóvão. Os quadrinhos foram aplicados no CPII que tem um programa diferente do implementado nas instituições estaduais de ensino. Nessa instituição de ensino, a Óptica pertence ao conteúdo da primeira série do ensino médio desde 2012. No entanto, houve aplicação das histórias em quadrinhos em turmas de primeira e terceira série do ensino médio pois, como a mudança se deu em 2012, ainda há turmas de terceira série no conteúdo programático antigo. A pesquisa foi realizada, como mencionado, no Campus Humaitá II do CPII, um dos campi dessa escola da rede federal no Estado do Rio de Janeiro. Esse colégio funciona nos três turnos escolares. Porém, o material só foi aplicado em turmas dos turnos vespertino e noturno, nos horários do professor voluntário atua. No turno da tarde há quatro turmas por série. Com alunos oriundos do processo de seleção à 1ª série do ensino médio regular e alunos vindos direto do ensino 69 fundamental feito na mesma Instituição. A noite há duas turmas por série, formadas por alunos que vieram somente do processo seletivo. 4.3 Coleta de dados As cinco tirinhas selecionadas são: Posição da Imagem I (Figura 24), Posição da imagem II (Figura 1), Posição da imagem III (Figura 31), Campo Visual I (Figura 25) e Campo Visual IV (Figura 36). Essa seleção se deu através da observação do pré-teste, onde tinham sido escolhidas uma tirinha de cada tema, e as discussões pareciam fracionadas, ou seja, quando os alunos discutiam, eles não associavam os assuntos de uma tirinha com os das outras. Na busca de evitar a discussão fracionada e com isso que os alunos conseguissem associar as tirinhas entre si, foram escolhidas tirinhas para seguir uma sequencia didática. Além disso, com essa escolha buscamos verificar a qualidade do argumento dos alunos ao discutir sobre cada tirinha, e também os indicadores de alfabetização cientifica de Sasseron (2011) e os elementos do Padrão de Argumento de Toulmin (2006). O material (ANEXO D) foi aplicado em duas turmas de primeira série do ensino médio e quatro de terceira série; sendo duas de terceira série do turno da tarde e as outras quatro do turno noturno. Cada turma tinha aproximadamente trinta alunos, que foram divididos em grupos de três a seis componentes. O que proporcionou trinta e três grupos de discussão para serem analisados. Os alunos dessas turmas não estavam habituados a esse tipo de prática na sala de aula. Mas, não foi observado nenhum problema significativo de disciplina, todos mostraram interesse e entusiasmo com a pesquisa. Prova disso foi a participação e o envolvimento dos mesmos com a prática. Para cada grupo foi apresentado o material, e à luz desse material, os alunos dialogaram sobre os fenômenos e as situações mostradas nas historietas. Esses diálogos foram gravados para que fossem avaliados. A discussão, voltamos a lembrar, faz parte do processo de ensino-aprendizagem. Cada grupo de discussões gerou um arquivo de áudio e alguns arquivos de vídeo (nem todos os grupos foram filmados). Desses diálogos, foram selecionadas situações-momentos em que os 70 alunos aparecem respondendo uma questão e levantando hipóteses. Procurou-se identificar quais os componentes do padrão de argumento e os indicadores de alfabetização científica se apresentam em suas falas. Esses momentos foram separados e transcritos se tornando dados empíricos para análise. A aplicação em todas as turmas proporcionou um conjunto de 33 arquivos em áudio para transcrição. Essas gravações em áudio e vídeo se complementam numa combinação de signos e linguagens dentro da sala de aula para compreender, de forma mais precisa, o que o estudante quis dizer e/ou expressar. Através deles podemos ver representadas gesticulações ou diferenças na entonação que ajudam na análise da pesquisa e que, se utilizando apenas os áudios, deixam de ser detectadas. Afinal, assim, como nas tirinhas em que gestos e palavras carregam significados, não se poderia deixar de recorrer aos vídeos para dar mais sentido às reações dos alunos. Reforçando essa ideia temos que: (...) as diferentes linguagens ocorrem simultaneamente, cada qual construindo um tipo de significado, e a combinação destes permite o desenvolvimento de novos significados que não seriam possíveis com apenas uma delas (LEMKE, 1998 apud CARMO e CARVALHO, 2012). Além disso, foi pedido para que os alunos respondessem às questões por escrito. Esse recurso é utilizado para dar um objetivo para as discussões, e também como forma de dado para ser analisado. Essas respostas escritas estão em forma de texto e/ou desenhos que podem auxiliar os alunos na construção do seu argumento e retórica. 71 5 ANÁLISE E RESULTADOS Transcrever os dados já é uma espécie de análise preliminar (LEMKE, 1997). Pois, na transcrição, estamos sempre tendo que tomar decisões e selecionando o que é importante ou não nos diálogos. O cerne da pesquisa foi a análise de discurso. Os métodos do estudo foram combinados com o conceito de múltiplas linguagens para identificação dos significados das palavras ou expressões naquele diálogo, e de como esses diferentes tipos de signos se comunicam entre si na construção de significado. O que pretendemos é compreender e descrever a função do discurso numa determinada situação de interesse. Em relação à combinação de dados semióticos, estamos analisando o componente emotivo dentro do argumento. Para definir novos conceitos e para que os alunos tenham mais segurança na construção de significado e conhecimento, os desenhos são fundamentais. Liakopoulos (2011) afirma que: “uma combinação útil entre semiótica e análise da argumentação poderia fornecer uma compreensão mais profunda da dinâmica que afeta o desenvolvimento do discurso público” (p. 241). Um desenho pode ser uma garantia ou uma justificativa dentro do argumento e consequentemente no Padrão de Argumento de Toulmin (TOULMIN, 2006), ou ainda um argumento completo. Para encontrar os elementos deste padrão utilizaremos os indicadores de alfabetização científica de Sasseron e Carvalho (2008; 2010). Os dados foram trabalhados seguindo os seguintes passos: (a) A seleção inicial aconteceu com a observação dos desenhos das respostas de cada grupo e cada turma. Os desenhos mais curiosos foram separados; (b) Em seguida, foram ouvidos os diálogos dos grupos cujo desenho foi separado; e selecionados os episódios e situações de interesse. Se os grupos tinha vídeo ele também era separado; 72 (c) As situações de interesse foram transcritas e comparadas com as respostas escritas e os desenhos. Quando o grupo tinha vídeo era feito um mapa de gestos para identificar o sentido oportunamente; (d) Esses dados foram somados e analisados para construir uma interpretação num contexto geral. Após os dados serem trabalhos, a análise foi feita através de comentários e interpretações desses dados para cada tirinha individualmente, esses podem ser observados a seguir. Três grupos foram escolhidos pelos desenhos produzidos para responder e pela profundidade das discussões. Para manter a confidencialidade dos participantes da pesquisa, os nomes dos alunos, os números das turmas e dos grupos foram alterados. E identificá-los-emos com as duas primeiras letras dos nomes próprios, JO que significa que o José Carlos está falando. Os grupos foram caracterizados e identificados da seguinte forma: (i) HU3233 – Uma turma de terceiro ano do ensino médio noturna. Um grupo considerado grande com cinco alunos, e cujas vozes no início foram difíceis de identificar, por alguns terem o timbre da voz muito parecido e serem todos meninos. Os participantes desse grupo são: JO = José Carlos, ZE = Zéfiro, RO = Ronaldo, RA = Ramon e NA = André; (ii) HU3422 – Uma turma de terceiro ano do ensino médio do turno vespertino. Com três meninas e um menino, as vozes eram fáceis de identificar, pois as meninas do grupo tinham timbres de voz bem característicos e de fácil identificação. Os membros desse grupo são: AC = Ana Carolina, JU = Julieta, AR = Arlindo e HE = Heloísa; (iii) HU1236 – Turma de primeiro ano do ensino médio do turno noturno. Com dois meninos e duas meninas. As vozes dos membros desse grupo também eram fáceis de identificar, ou seja, a voz de um menino era diferente do outro e a voz de uma menina era completamente diferente da outra. MA = Mauro, DA = Danubia, CA = Carina e BR = Brian. 73 Dentro de algumas tabelas existem sentenças que foram destacadas em itálico, negrito ou sublinhadas para destacar a combinação de linguagem. Itálico para quando eles escrevem. Negrito para desenhos e sublinhado quando a palavra significa algum gesto. Além disso, existem também, algumas partes nos trechos em que a tabela tem fundo cinza, isso significa que essa parte foi gravada em vídeo também, e com ela podemos analisar os gestos e a forma como os alunos falam. Para facilitar o entendimento da dinâmica dos diálogos foram adotadas as normas de transcrição apresentadas no ANEXO E. É importante informar também que durante a aplicação das tirinhas foram fornecidos aos alunos espelhos planos para que eles pudessem fazer testes e experiências. Nas gravações em áudio apareceram vários momentos onde se percebia a utilização desses espelhos. 5.1 Posição da Imagem I Essa tirinha (Figura 24) foi desenvolvida para ser introdutória à discussão sobre a posição da imagem. A pergunta “por que ele está olhando atrás do espelho?” foi colocada para ser uma base de discussão sobre onde se encontra a imagem (seção 3.3.3). A situação retratada nestes quadrinhos é comum para crianças até certa idade e alguns animais, como gatos e cachorros. Quando uma criança se depara com um espelho pela primeira vez, ela tem a curiosidade de procurar quem está atrás do espelho. A Tabela 5 abaixo, apresenta um trecho dos diálogos dos alunos do grupo HU3233, onde é discutida a primeira pergunta: Tabela 5 – Trecho referente à primeira questão da tirinha Posição da Imagem I do grupo HU3233 T Linguagem Oral 1_10 JO: Por que no último quadrinho o menino está Indicadores e Comentários Levantamento de hipótese; olhando atrás do espelho? Porque ele Justificativa achou que tinha outro igual ele atrás do ((“Como se fosse tipo um vidro” é a espelho, né? Como se fosse tipo um vidro justificativa para o menino estar olhando atrás do espelho que por sua vez é a hipótese inicial)) 1_11 ZE: É porque ele achou que tivesse um garoto/= ((ZE começa a explicar a hipótese 74 inicialmente de JO para os outros, e assim, responder a primeira pergunta)) 1_12 RA: que fosse um vidro ((RA repete a justificativa de JO)) 1_13 RO: É...É 1_14 AN: É, eu pensei nisso também 1_15 ZE: = [Porque o espelho refletiu a imagem dele, e o garoto muito ignorante/= ((Continua a explicação iniciada no turno 1_11)) 1_16 RA: [muito ingênuo 1_17 ZE: =achou que tivesse outra pessoa atrás/= 1_18 RO: 1_19 ZE: = é, atrás do vidro. Explicação [do vidro ((Termina a explicação sobre a primeira questão)) 1_20 RO: do espelho 1_21 ZE: Então, como a gente vai responder? 1_22 RA: Porque o garoto achou que tinha alguém Explicação atrás do espelho Neste trecho, observamos três indicadores: levantamento de hipótese, justificativa e explicação. A hipótese levantada é que o menino foi olhar quem estava atrás do suposto vidro (turno 1_10). Ao falar sobre o reflexo do espelho, o aluno está começando a explicar a situação (turno 1_22). Porém, neste trecho ainda não é apresentado uma discussão com um bom argumento, já que não é possível perceber os elementos do padrão de argumento de Toulmin com muita clareza. Os alunos ficam mais preocupados em escrever a resposta escrita. Vejamos o segundo trecho (Tabela 6), onde os alunos discutiram sobre a segunda questão da mesma tirinha. Tabela 6 – Trecho referente à segunda questão da tirinha Posição da Imagem I do HU3233 T Linguagem Oral 1_126 RO: dois... O menino está olhando para um Indicadores e Comentários espelho plano/ 1_127 AN: A dois não faz sentido ((Os alunos começam discutindo sobre o sentido da questão)) 1_131 RA: Isso aí é tipo uma régua Levantamento de hipótese 1_132 ZE: É tipo assim, tá aqui o menino... espelho Seriação de informação 75 ((O aluno está listando os elementos da imagem)) 1_133 AN: Cara, você tem que desenhar aqui, tá? 1_134 ZE: Calma, isso é só um exemplo. Depois eu Organização da informação; faço aí. Essa distancia d, você tem que Levantamento de hipótese desenhar uma outra ((distância)) igual, ó. desenho é a hipótese)); ((o Explicação 1_135 RO: AH TÁ ((O aluno aumenta a entonação da voz mostrando que entendeu a explicação do colega)) 1_136 ZE: E aí vai ter o reflexo aqui. Sacou? Explicação ((ZE continua a explicação do turno 11_134)) 1_137 AN: É isso aí 1_138 RO: E isso? 1_139 ZE: Eu acho que é. 1_140 AN: Po, Eu vou ter que desenha? Eu vou puxar ((O aluno confirma o entendimento)) uma setinha d e d e desenha uma bolinha 1_141 ZE: Sim 1_142 JO: Você tem que desenha ele do outro lado, é? ((JO questiona para ver se realmente entendeu)) 1_143 ZE: Acho que é... Professor, rapidinho... É tipo, Organização de informação pode marcar essa distância como d e outra ((Para definir e organizar a estrutura distância d aqui e fazer uma bolinha ao do desenho que neste caso é a invés do menino? informação, o aluno pergunta ao professor se ele pode simplificar o desenho)) ((Eles ficam discutindo como fazer o desenho)) Neste trecho da gravação, podemos observar que a princípio alguns alunos não entenderam muito bem a pergunta, mas ela foi logo esclarecida por outro aluno. Ainda não temos uma discussão propriamente dita, pois apenas um aluno levantou hipótese e explicou o fenômeno, não havendo assim outros elementos para montar o padrão de argumento de Toulmin. A partir destes dois trechos, percebemos que este grupo de alunos já consegue estabelecer que a imagem é formada atrás do espelho e que ela dista do espelho a mesma distância que o objeto está do espelho (Figura 27). 76 Figura 27 – Desenho correspondente ao turno 1_134 Quando o aluno está organizando sua informação no desenho (turno 1_134), ele está levantando sua hipótese e explicando. Porém, ainda não podemos saber se eles têm esse conhecimento e podem raciocinar sobre ele ou se estão apenas repetindo essa informação. É importante mencionar que, a imagem formada por um espelho plano não é somente do objeto em questão, mas de parte do ambiente que cerca esse objeto, por isso, a distância que o objeto está do espelho também é reproduzida (ver seção 3.3.3). 5.2 Posição da Imagem II Essa tirinha (Figura 1) foi inspirada no clima mágico e místico que os espelhos proporcionam como já foi mencionado anteriormente. Ela apresenta uma situação exagerada do menino atravessando o espelho e cumprimentando seu reflexo. Essa situação foi criada para conceituar imagem virtual e associá-la com a Figura 27, ou seja, que a imagem virtual é aquela que se encontra atrás do espelho. Além disso, a tirinha apresenta uma questão muito interessante sobre a posição da imagem quando o espelho está inclinado. Na seleção do material, ela foi colocada para ver se a informação sobre a posição da imagem num espelho plano é um conhecimento adquirido pelo aluno, ou se é apenas uma reprodução do que o professor diz. No seguinte trecho, temos o início da discussão sobre essa tirinha. 77 Tabela 7 – Trecho referente à primeira questão da tirinha Posição da Imagem II do grupo HU3233 T Linguagem Oral 2_01 JO: O que significa dizer que a imagem no espelho Indicadores e Comentários ((Lendo a questão)) plano é virtual? 2_02 ZE: Aí, aí, olha a pergunta três ((Chamando a atenção para questão)) 2_03 RO: Vamos interpretar primeiro. 2_04 ZE: O que significa dizer que imagem do espelho ((O aluno lê novamente a questão)) plano é virtual? 2_05 AN: Acho que é porque, tipo, a imagem do Levantamento de hipótese; espelho. O seu direito é o esquerdo do ((A hipótese do aluno é baseada na espelho... É cara, porque aqui ó reversão da imagem no espelho plano)) Justificativa ((Ele justifica mostrando alguma coisa, mas não podemos analisar o que por falta de imagem, o ato de mostrar)) 2_06 RO: Não, não, não usa esse tipo de expressão, cara, é sério, pô papo dez. 2_07 RA: É tipo, Harry Potter Levantamento de hipótese; ((Ele provavelmente está falando do Espelho de Ojesed – Mirror of Erised, no original)) 2_08 JO: É todo invertido 2_09 RA: Você entendeu né? 2_10 JO: É como se ele tivesse entrando no espelho 2_11 ZE: É? 2_12 JO: É, cara... Sério, ó. Se você vê na imagem, olha Levantamento de hipótese Levantamento de hipótese Explicação isso daqui 2_13 RA: É o que eu to falando 2_14 JO: Aí ele entrou aqui, já tá dentro 2_15 ZE: O espelho parece inverso, se você estiver com Explicação o alargador do lado esquerdo, se você olha no ((ZE está explicando a hipótese espelho o alargador no espelho vai se no lado levantada por AN no turno 2_05)) direito. 2_16 RO: Tá, o que isso tem a ver com virtual? ((Nesse momento, os alunos 78 2_17 ZE: Você sabe o que é virtual? começam 2_18 RO: Ahm? entendimento 2_19 ZE: Você sabe? Você interpretou a pergunta? palavra “virtual”)) 2_20 RO: Virtual é o que não é real Levantamento de hipótese 2_21 RA: Tá mais para isso, tá mais para isso 2_22 JO: Vamos ler o texto daqui ((Os estudantes haviam ignorado o 2_23 ZE: Vamos desde o início ver se tem alguma dica texto lá. a inicial discutir do do sobre significado material, o da neste instante eles resolvem retornar ao texto com o objetivo de encontrar uma dica)) 2_28 AN: A medida que eu vou fazendo assim o que acontece/ ((AN está demonstrando alguma coisa, provavelmente com o espelho, porém não é possível saber o que)) 2_29 ZE: Virtual é que... 2_30 JO: Não é real Levantamento de hipótese 2_31 ZE: Isso. Virtual não é real, porque é uma Levantamento de hipótese; projeção. É uma projeção, você não pode Explicação; avançar na imagem, por isso que tá errado Justificativa; essa parada, porque essa imagem é virtual. Raciocínio proporcional; Ela só existe no espelho. Ela só existe no espelho, você não pode fazer igual ele fez dá a volta e avançou. 2_32 RA: Então, vou colocar, porque a imagem é Levantamento de hipótese produzida pelo espelho. 2_33 ZE: Isso, a imagem só existe no espelho. Ela é uma projeção da realidade e não é algo Levantamento de hipótese; Explicação tridimensional. 2_34 RO: É uma projeção da realidade. 2_35 ZE: Não é algo tridimensional. 2_36 RA: Porque é uma projeção da realidade. Levantamento de hipótese 2_37 JO: Porque é uma projeção da realidade? ((O aluno apresenta dúvida)) ((Nesse momento, os alunos estão organização como vão responder na folha de atividade na forma escrita)) 2_42 RA: Que é uma projeção... 2_43 ZE: Vamos botar assim, significa dizer que a imagem é uma projeção. Explicação 79 2_44 AN: Essa é qual? A três? 2_45 ZE: Essa é a três. Significa dizer que a imagem é uma... É uma projeção do mundo real. 2_46 RA: Essa imagem é uma projeção do mundo real. 2_47 ZE: E não existe tridimensionalmente. 2_48 RO: Significa dizer que a imagem é uma projeção Explicação; Justificativa do mundo real, é não? 2_49 ZE: E não existe tridimensionalmente. No início do trecho, verificamos que alguns alunos não entendem muito bem a pergunta, e fazem até analogia com o espelho mágico do universo Harry Potter (Espelho de Ojesed). Porém, a discussão iniciada no turno 2_15 dá um novo rumo para as discussões e o entendimento do que é perguntado. Os alunos RO e ZE desenvolvem, em conjunto, um bom argumento para responder a primeira questão dessa tirinha. Neste trecho podemos perceber alguns dos elementos do padrão de argumento de Toulmin (Figura 28). Figura 28 – Padrão de Argumento de Toulmin referente à primeira pergunta da tirinha Posição da Imagem II Ainda não vemos o apoio (B) ou a refutação (R), mas eles não foram necessários nesse contexto, e ainda sim percebemos o qualificador modal “não” na conclusão. Esse argumento não exige uma complexidade na sua estrutura. Com apenas a justificativa podemos chegar à conclusão. Em outro contexto, virtual pode 80 estar associado ao mundo da internet e dos computadores, porém num entendimento geral a palavra virtual significa ser algo que não existe na realidade, mas como potencial e faculdade. Ou seja, no caso dos espelhos, virtual é a imagem quando se forma atrás do espelho, no plano do espelho. Existem espelhos em que a formação da imagem se dá no plano real, ou seja, no plano do objeto, que se encontra em frente ao espelho. Outra coisa importante de se comentar é a questão da tridimensionalidade da imagem, observando e analisando o trecho percebemos que os alunos ainda não associam a imagem no espelho com uma reprodução do ambiente, que respeita todas as dimensões do espaço e dos objetos. No próximo trecho, observaremos o início da discussão sobre a formação da imagem em espelhos planos inclinados. Tabela 8 – Trecho referente à segunda questão da tirinha Posição da Imagem II do grupo HU3233 - Parte 1 T Linguagem Oral Indicadores e Comentários 2_51 AN: Oh, o meu 4 ficou assim Levantamento de hipótese; ((Está no seu desenho, pois aparece que ele mostra sua folha de resposta para os outros alunos. Mas, esse desenho não estava na folha de atividade, provavelmente ele apagou para colocar o desenho “certo”)) 2_52 ZE: Deixa eu ver rapidinho... Deixa eu ver o 4 aqui como é que é. A imagem... 2_53 RO: Tem que fazer aqui 2_54 JO: Ela só vai refleti a parte uma parte da cabeça Levantamento de hipótese dele 2_55 ZE: Não, não vai ser assim quer vê Levantamento de hipótese 2_56 JO: Como se ele refleti só uma parte da cabeça Levantamento de hipótese dele 2_57 RO: É 2_58 RA: É assim, aqui está a cabeça dele 2_59 AN: Não gente, vocês tão fazendo errado, tem que Levantamento de hipótese ser assim 2_60 ((Discussão inapropriada)) ((Neste momento, eles dispersam na discussão para um ficar zoando o 81 outro, mas eles retornam a discussão em seguida)) 2_61 RA: Por que ele ficou assim? 2_62 AN: Porque assim, cadê o espelho? Me dá o Justificativa; espelho. Viu? Ele está aqui paralelo essa Teste de hipótese; assim/ ao espelho assim ((Nesse caso, a justificativa e o teste são a demonstração que o aluno faz com o espelho, porém sem o vídeo não podemos concluir ou analisar esse momento)) 2_63 RA: Ele tá aqui em pé, e vai vê só a cabecinha Levantamento de hipótese; Previsão 2_64 AN: Não cara, mas tá paralela, a imagem ((ao espelho)) Levantamento de hipótese ((O aluno levanta a hipótese de que a imagem está paralela ao espelho)) 2_65 RA: Ah tá, tá, tá 2_66 AN: A mesma distância/ que tá na mesma distância, só não ficou paralelo ao espelho Levantamento de hipótese; Previsão ((O aluno associa a questão da distância ao levantar a sua hipótese)) 2_67 ZE: A minha ficou, é que tá mal desenhado... Mas, a ideia é que/ Classificação de informação ((O aluno ZE revela que seu desenho ficou paralelo ao espelho, porém ele classifica que isso ocorreu porque o desenho está mal feito, pois ele não deveria ser paralelo ao espelho)) 2_68 AN: Vai ter a mesma distância d e d, só que a imagem vai ficar paralela ao espelho Organização de informação ((Aqui é possível perceber uma relação entre a primeira tirinha e essa, é com isso podemos ter uma ideia de que ele está raciocinando sobre a informação anterior)) 2_69 ZE: Vai não ((Ele está falando sobre a imagem ser paralela ao espelho)) 2_70 AN: Vai sim, a gente fez a experiência aqui e ficou 2_71 ZE: Não vai não. 2_72 RA: Não, ZE. Não é assim não, cara. 2_73 ZE: Claro que não, vai quer?... É assim, quer vê? Classificação de informação Teste de hipótese 82 Escolhe uma angulação qualquer e bota o ((Pedindo para escolher a angulação, garoto aqui os alunos estão começando a testar a hipótese)) 2_74 AN: Não, bota ele reto e depois vai caindo ((O teste continua)) 2_75 ZE: Não, não, tem que deixar ele assim. Tão vendo Classificação de informação qui/ 2_76 RA: Não vai sai/ 2_77 AN: O lápis dentro do espelho está paralelo ao ((Definindo a posição do objeto)) Teste de hipótese espelho No trecho acima, observamos os alunos levantando algumas hipóteses e no turno 2_62, o aluno AN faz um teste de sua hipótese apresentada no turno 2_51(o suposto desenho dele). Porém, com a ausência do vídeo nesse momento, não podemos analisar a forma que ele apresenta sua hipótese, mas sim o fato dele ter feito isso. No decorrer da discussão, os alunos levantam várias hipóteses, e começam a apresentar dados e fazer previsões sobre o comportamento da imagem num espelho inclinado. Nos turnos 2_66 e 2_68, AN lembra a questão da distância, porém ele acredita que a imagem ficará paralela à superfície do espelho. Nos turnos seguintes, os alunos tentam convencer ZE de que a hipótese de AN está certa, até que ele faz um desafio que inicia no turno 2_73 e continua no próximo trecho (Tabela 9). Tabela 9 – Trecho referente à segunda questão da tirinha Posição da Imagem II do grupo HU3233 - Parte 2 T Linguagem Oral Indicadores e Comentários 2_79 ZE: Não segura aqui rapidinho. O que vai Explicação; acontecer? Vai bater aqui. Só que/ Essa é a Justificativa; dúvida, porque não sei como a imagem ia Previsão parar aqui. AH por que ele está considerando ((O o plano. Aí vai bater aqui e vai vir assim para explicação para os colegas, ele está, cá. É aquela parada como se descesse. É provavelmente, usando o espelho para aquela parada no shopping que tem um essa espelho grandão no teto, já viram? Que/ alicerçando sua explicação com a quando tem espelho no teto, e aí você olha e questão do plano do espelho, e depois consegue ver o que tá atrás de você. É o faz previsões quando fala sobre o mesmo principio. Você olha, bate assim e ângulo e com o exemplo do espelho volta no mesmo ângulo. Então você não vê do teto nos shoppings. Porém, ele aluno começa explicação. dando Ele uma justifica 83 você, você vê o está atrás de você acredita que não é possível se vê no espelhos)) 2_80 RA: A gente não se vê a gente não? ((O aluno RA questiona o fato do 2_81 ZE: Ahm? exemplo de ZE, ele falar que não nos 2_82 RA: A gente não se vê não? vemos no espelho só o que está 2_83 AN: ( ) na nuca atrás)) 2_84 ZE: Tipo deixa eu pensa aqui/ O retrovisor, Explicação retrovisor é esse principio tem o motorista aqui ((O aluno faz analogias e associações olhando, tem o retrovisor aqui para ver o que para explicação sua hipótese)) está pra lá. Ele não vai se vê o motorista não vai se vê 2_85 RA: É claro, o espelho está apontando para cá ((Através da experimentação com o 2_86 AN: Ah entendi espelho, 2_87 ZE: Sacou? Eu acho que é o mesmo principio hipótese com o exemplo dado por ZE daqui 2_88 JO: AH ME LIGUEI me liguei me liguei. Esse aqui vai ter mais sentido pra mim. os alunos entendem a do retrovisor. Porém, tanto o exemplo do retrovisor quanto o exemplo do espelho do shopping não podem ser 2_89 AN: Professor, professor, por favor? bem 2_90 RO: Por gentileza imagens ou vídeos do momento. Mas, 2_91 RA: Eu acho que ele vai poder se vê, só que não a dúvida se a imagem está paralela ao tipo só um pouco interpretados espelho ou não, por não haver ainda não foi solucionada)) 2_92 AN: Só uma interpretação aqui do desenho, a ((Ele, então, interrogam o professor imagem que ele teria é a mesma ((distância)) (PR) a fim de ver quem está certo, ele que tá aqui, só que estaria paralela ao ou ZE. O PR questiona os alunos com espelho. Estaria paralela ao espelho. o objetivo de eles defenderem suas 2_93 ZE: Não estaria paralela ao espelho ideias. 2_94 PR: Não sei, por que você acha isso? justificativa o teste que ele fez no turno 2_95 AN: É porque eu fiz aqui com o lápis 2_62)) 2_96 ZE: Não 2_97 AN: Eu botei a lapiseira assim ficou aparecendo ( ) 2_98 ZE: Que loucura, cara 2_99 AN: e a imagem ficou assim 2_100 ZE: É não, é tipo um retrovisor, né, professor? Vai ((Já ZE usa como justificativa a ter um ângulo aqui, vai ter um ângulo alfa aqui igualdade dos ângulos nos dois lados que bate aqui, aí vai ter outro ângulo saindo do espelho.)) assim que vai ser alfa também. 2_101 PR: Será que vocês não estão dizendo a mesma AN usa como apoio e 84 coisa, não? 2_102 ZE: Ahm? 2_103 JO: Também acho ((Após o questionamento anterior do 2_104 PR: Não sei, pensa aí PR, alguns alunos acham que eles 2_105 ZE: Tá fazendo o quê? estão falando a mesma coisa, só que 2_106 RO: Vocês estão falando a mesma coisa de forma diferente. Porém, ZE lembra 2_107 ZE: Não, cara porque ele falando que vai se/ que a discussão está no fato de um 2_108 AN: Vai refletir aqui e vai descer ((a imagem)) dizer que a imagem está paralela ao 2_109 ZE: Mas não vai ficar paralelo. espelho, e o outro falar que devesse 2_110 RA: Não é questão de ficar paralelo respeitar a angulação que o espelho 2_111 JO: Que paralelo o quê faz com o objeto, e por isso não pode 2_112 RO: Não era isso que ele estava falando não ser paralela)) 2_113 ZE: Mas ele tá falando que é paralelo. Não paralelo, a imagem não é paralela. 2_114 RA: Cara vai defasar óbvio 2_115 ZE: Vai ser o mesmo ângulo aqui ((O desenho do turno 2_119 se desenvolve, pois ele começa a explicar usando o seu desenho)) 2_116 AN: Se inclina pra trás 2_117 ZE: Vai ser esse mesmo ângulo beta, vai ter um ((ZE reforça a ideia da angulação)) outro garoto. 2_118 AN: Exatamente, assim eu estava fazendo agora 2_119 ZE: Aqui ó. Um ângulo beta também, o garoto vai estar por aqui Explicação; ((Aqui ele apresenta o desenho completo e começa a explica-lo)) ((Os alunos ainda discutem mais sobre a imagem ser paralela ao espelho ou não, e a qualidade do desenho, mas nada muito diferente do que já foi apresentado)) 2_126 ZE: É assim que vai olhar. Tem o espelho aqui, vai vir o ângulo beta com o garoto e vai te outra ângulo beta assim com o garoto 2_127 AN: Mas será que tá certo? 2_128 ZE: Ahm? Pela lógica, é assim 2_129 AN: Cadê minha lapiseira? 2_130 ZE: Tá ali não é? Como você é burro, AN 2_131 RA: Esse ângulo alfa aqui vai ser esse mesmo Explicação; ((Ele continua explicando o desenho)) 85 ângulo alfa aqui? 2_132 ZE: Eu acho que vai cara... Por exemplo, quando Justificativa; você fez o espelho reto/ o espelho plano, tinha Explicação aqui ó, um ângulo de noventa graus e você ((A repetiu noventa graus... Tá entendendo? desenho da Tabela 6, ou seja, Figura justificativa está baseada no 27 passa a ser o apoio para a construção da Figura 29)) 2_133 JO: Aí, ele vai dá uma inclinada, né? 2_134 ZE: Então você inclina, justamente, se você inclina ((Aqui ele faz uma analogia com o o maluco aqui vai fazer isso. É como se você comportamento da curva numa função fizesse o modulo de uma função, você pega e modular, que é considerada uma bota reta. Você vai fazer o modulo, vai tirar a função espelhada)) parte negativa e vai ficar só isso aqui. É tipo essa parada. 2_135 AN: Modulo da função. Então é isso. 2_136 RA: Ele vai ficar tipo, aqui é a cabeça dele. 2_137 ZE: É deve ser, acho que é 2_138 RA: Eu puxei um raio daqui 2_139 ZE: Tá pode ser. Mas aí você tem que botar que é a mesma distância, né? Bota d e d também. ((Nesse ponto da discussão, você percebe que ele está associando mais uma vez com a Figura 27 e que a informação sobre a reprodução do ambiente e não só do objeto)) 2_140 RA: Muito bem 2_141 ZE: Espera aí, não terminei não. Alfa. Na verdade, na verdade mesmo a imagem ia ser pra cima, Levantamento de hipótese; Explicação né? Só que ele tá considerando como que tridimensional, né? O espelho é tipo uma outra realidade, né? 2_142 AN: Ia ser pra cima o moleque? 2_143 ZE: Ia tá por aqui 2_144 NA: Ah tá, ia bater e ia voltar né? Assim 2_145 ZE: Isso, mas aqui tem as letrinhas e tal, mas ele Explicação; tá considerando o espelho tipo uma outra ((Neste turno, o aluno associa a realidade. Então, essa imagem vai estar na informação da primeira questão dessa mesma posição, só que aqui. Sacou? Alfa tirinha com a segunda questão)) 2_146 RA: Assim? 2_147 ZE: Eu acho que é 86 No trecho acima acontece um embate entre duas ideias. Um aluno (AN) acredita que a imagem se forma a mesma distância do espelho, mas como o espelho está inclinado, a imagem ficará paralela à superfície do espelho (turno 2_92). O outro aluno (ZE) também acredita que a imagem está à mesma distância que o objeto do espelho, porém ele acredita que se deve respeitar a angulatura do espelho em relação ao solo, esse ângulo deve ser repetido do outro lado do espelho com a imagem, por isso a imagem não está paralela ao espelho. Durante a discussão, eles chamam o professor (PR) para mediar a discussão e nesse momento o professor acredita que os dois alunos estão falando a mesma coisa, porém existe uma diferença na hipótese de cada um e que ZE não deixa passar. Ele usa um desenho para demonstrar e justificar sua ideia (Figura 29). Figura 29 – Desenho correspondente ao turno 2_119 A Figura 29 é o argumento completo dele, e fica impossível encontrar a partir deste desenho os elementos do padrão de Toulmin. Mas, no turno 2_132, ele usa a Figura 27 como apoio para esse desenho (argumento), quando fala que nele existe um ângulo de noventa graus e que foi repetido do plano do espelho, e por isso, o ângulo que o espelho faz com o chão deve se repetido no plano do espelho (turno 2_134). Além disso, ele faz uma analogia interessante com o comportamento da curva numa função modular, onde o eixo x é como um espelho que reflete os valores negativos. 87 É importante ressaltar que o aluno não tinha régua ou transferidor, mas nem por isso, a ideia não deixa de estar correta. Apesar dele (ZE) lembrar na questão da distância e da angulação, as distâncias são todas iguais como é apresentado no seu desenho (Figura 29), além de confundir um pouco o fato de ele chamar as distâncias de alfa e os ângulos também. Na Figura 30 temos o conceito científico da questão: Figura 30 – Conceito científico sobre a formação da imagem em espelhos planos inclinados O ângulo de inclinação do espelho é igual a “a”, e temos uma diferenciação entre as distâncias representadas d1 e d2. Normalmente, os alunos representam somente pensando nas distâncias iguais. Nestes casos, os alunos desenham a imagem inclinada e paralela ao espelho. Porém, pelo princípio de Fermat e as leis de reflexão a questão da angulação é fundamental para a representação correta. Como foi lembrado e defendido pelo aluno ZE no turno 2_132 e com o uso da Figura 27 como apoio para esse desenho. Isso mostra que ele raciocinou sobre a informação e não reproduziu simplesmente. Após a apresentação do desenho e das justificativas, os outros alunos aceitam e concordam com ZE, reproduzem o mesmo desenho e partem para a próxima tirinha. 88 5.3 Posição da Imagem III A Figura 31 apresenta a tirinha que tem o famoso quadro chamado “Um Bar no Folies-Bergère”. Ele foi pintado por Edouard Manet, em 1882, e um dos motivos do seu sucesso é a sutil distorção no reflexo do espelho que faz a cena parecer estranha. Walker (2008) explica essa distorção dizendo que ao olhar para o quadro pela primeira vez já percebemos que existe algum erro. A ideia da questão apresentada em conjunto com a tirinha é levar à discussão e à descoberta dos erros. Figura 31 – Posição da Imagem III O erro do quadro está na posição da imagem do espelho atrás da garçonete. O reflexo da garçonete está na posição errada, que deveria estar atrás dela, e não à direita. Para estar daquela forma, o espelho teria que estar inclinado. Porém, estando o espelho inclinado, a garçonete teria que estar bloqueando a visão do reflexo das garrafas à esquerda dela. Por ultimo, o reflexo do homem, que alguns acreditam que seja o observador, está muito próximo e deveria bloquear a visão da garçonete. Observe as discussões dos grupos sobre a tirinha e o quadro que ela contém. Tabela 10 – Trecho referente à única questão da tirinha Posição da Imagem III do grupo HU3422 – Parte 1 T 3_22 Linguagem Oral AC: realmente não sei qual é da ((questão)) cinco Indicadores e Comentários ((Questão referente à tirinha Posição da Imagem III)) 89 3_23 JU: to pintando 3_24 AR: vocês fizeram a dois? ((Questão referente à tirinha Posição da Imagem I)) 3_25 AC: ah impossível fazer a dois 3_26 JU: não, na dois a imagem tá aparecendo aqui ((JU apresenta um desenho da questão referente à tirinha Posição da Imagem I)) 3_27 AC: e se não aparecer? Levantamento de hipótese 3_28 JU: se ele está se vendo no espelho, ele ((o reflexo Levantamento de hipótese; dele)) tem que tá no espelho 3_29 AC: não tem que não oh... olha para o teto pelo Previsão Teste de hipótese; espelho, você está olhando para o espelho e Levantamento de hipótese; não tá/ se vendo... coloco meu dedo assim, Previsão; não sei se você vai conseguir vê, supondo que Explicação meu dedo é ela ((garçonete))... eu consigo ver ((A explicação está na demonstração, a parte de trás do dedo apareceu... você que os alunos estão fazendo neste consegui vê a parte de trás, você consegui vê turno)) a lateral dele, mas não precisa se vê 3_30 JU: mas, eu to vendo ela,] = 3_31 AC: 3_32 JU: = eu tenho que vê ela, e a imagem dela no [pensa em toda ela Levantamento de hipótese espelho 3_33 AC: mas, eu consigo vê, porque eu tenho meu dedo de frente para ela e meu dedo de costa Justificativa; Explicação para o espelho e não me vê... e não me vejo... essa parte toda ( ) menino... eu acho que/ 3_34 JU: você tinha que tá se vendo no fundo do Justificativa espelho do quadro 3_35 AC: não... acho que não precisa disso, por exemplo eu estou vendo a sala só... não to vendo nada... coloca assim e inclina assim, você tá vendo que nem tá aparecendo, pode segura eu não consigo = 3_36 JU: [tem que segura assim 3_37 AC: = mas, não precisa se vê] ((HE e AR ficam conferindo as questões anteriores, enquanto JU e AC discutem a questão da tirinha Posição da Imagem III)) Justificativa; Explicação 90 3_41 AC: se chega mais pra cá ou se inclina mais pra cá, Explicação você vai está vendo as duas linhas 3_42 HE: tá faltando/ ( ) ((respondendo o AR)) 3_43 JU: vê aqui Justificativa 3_44 AC: você vai tá vendo quase o mesmo ângulo que Explicação; é inclinado 3_45 Justificativa HE: se ele tivesse reto aí sim estaria errado, porque ele estaria se vendo 3_46 AC: mas, tá inclinado Explicação; Justificativa; Previsão 3_47 HE: se espelho tivesse reto, não ia vê o reflexo dela, porque ela ia tá na frente de você Levantamento de hipótese; Explicação ((Os alunos lançam hipótese e usam algumas justificativas para alicerçar suas hipóteses, mas ainda não chegaram a um consenso sobre o erro)) As discussões do grupo HU3422 não seguem a ordem do material. Por isso, dentro da discussão de uma questão pode surgir ou serem retomada discussões sobre outra tirinha. Este trecho (Tabela 10) começa com a retomada da segunda questão referente à tirinha Posição da Imagem III (Figura 31), porém, JU sinaliza apresentar seu desenho referente à resposta no turno 3_26. O desenho é semelhante ao apresentado pelo grupo HU3233 (Figura 27). No turno 3_28, a aluna JU retoma a discussão da tirinha Posição da Imagem III, que continua fracionada ao longo da gravação. A hipótese inicial é que o espelho está inclinado, e que se estivesse reto, o pintor estaria bloqueando a visão da garçonete. Para eles, o observador e o homem que aparece no canto direito do quadro são o pintor. No turno 3_34, a hipótese é relembrada quando a JU fala que no espelho do quadro, você (o observador) tinha que estar se vendo. Essa ideia é reafirmada por HE nos turnos 3_45 e 3_47. Após este trecho, o grupo volta a discutir a questão da independência do tamanho da imagem e a distância do objeto em relação ao espelho. Em seguida, a discussão sobre o quadro de Manet continua na Tabela 11. 91 Tabela 11 – Trecho referente à única questão da tirinha Posição da Imagem III do grupo HU3422 – Parte 2 T Linguagem Oral Indicadores e Comentários 3_63 HE: cara olha JU, JU é esse daqui 3_64 JU: ahm 3_65 HE:o espelho atrás dela vai tá assim para ela tá aparecendo assim, ela tem que está Justificativa; Explicação inclinada... porque ela não tá tipo exatamente de frente 3_66 AC: senão não daria para ver o reflexo dele Justificativa; Classificação de informação 3_67 HE: pois é, ele tem que tá inclinado... mas, o Levantamento de hipótese; reflexo dele ia ter que aparece digamos/ ele tá Seriação de informação; bem de frente... a não ser que ele ((esteja)) Explicação; exatamente aqui Previsão; Justificativa 3_68 AC: não dá para você ver oh ah/ o negócio, o Levantamento de hipótese reflexo do negócio não se ver 3_69 JU: mas, olha só a gente tá falando] de uma Justificativa borracha na mesa = 3_70 AC: [mas, olha o Classificação de informação ângulo que ele tá vendo 3_71 JU: = e de um pessoa do Justificativa; tamanho dele... se o negócio ((espelho)) tá Explicação; assim e vai ficar assim, na altura do negócio Classificação de informação ((espelho))... a gente estava olhando de cima 3_72 HE: mas... ou 3_73 JU: aí meu Deus 3_74 AC: teve essa aqui que tá aqui... aqui em embaixo, mas não tem como senão ele não ia ver o Justificativa; Classificação de informação reflexo dela 3_75 HE: se ele tivesse tipo aqui abaixado sabe que ele tá vendo aqui assim, mas não tem como Justificativa; Explicação; Classificação de informação 3_76 JU: oh: tinha que ser daqui Levantamento de hipótese 3_77 HE: melhor daqui... deixa eu ver aqui... é só Levantamento de hipótese; espelho que está inclinado e não ele? ele tá Explicação; bem de frente para ela, se ela aparece ele vai Justificativa; 92 aparece a não ser que ele esteja escondido Organização de informação pela imagem dela 3_78 AC: mas, ele está reto né, não tá inclinado também se ele tivesse abaixado 3_79 JU: a não ser que o espelho esteja reto, e ele Levantamento de hipótese; Explicação Levantamento de hipótese; esteja inclinado... daí ele ia aparecer no Justificativa; espelho Previsão; 3_80 AC: pois é 3_81 JU: não ia? 3_82 AC: não, porque ele aparece no espelho... porque a pintura é a visão dele, se ele aparece no Levantamento de hipótese; Previsão espelho/ ele consegui fica:/ perpendicular 3_83 HE: mas, é aquela coisa se ele que tá no espelho/ 3_84 AC: o que tá no espelho vê ele, mas ele não Levantamento de hipótese; precisa aparece no espelho... senão toda vez Justificativa; que você olha no espelho você tem que tá nele Explicação; e não é assim que funciona Classificação de informação 3_85 JU: eh ela tá vendo ele/ ele tá vendo o espelho né? 3_86 AC: teoricamente as costas dela tão vendo ele 3_87 HE: certo 3_88 AC: só até o olho dele ver ( ) 3_89 HE: é que parece que/ 3_90 AC: mas, oh se ele tá aqui ( ) aqui tá ela e o reflexo Explicação Levantamento de hipótese; dela de costas... ele não precisa aparece ele Previsão apareceria aqui/ apareceria aqui na/ ((AC está ((Nesse momento, AC está apontando mostra alguma coisa na folha da atividade)) e desenhando alguma coisa na folha de atividades, porém não é possível identificar o que é, e o desenho foi apagado.)) A aluna HE deve ter feito algum gesto ou sinalizado de alguma forma a posição do espelho no quadro. Porém, essa parte não foi filmada, a seção do turno 3_65 mostra que provavelmente o gesto ou a sinalização era para mostrar a inclinação do espelho. Ela defende a hipótese de que o espelho do bar está inclinado, como é visto no turno 3_67. A justificativa dela mencionada no trecho anterior, é de que com o espelho reto não seria possível ver o observador (turno 3_47). Já no final do trecho vemos JU levantando uma nova hipótese, que o espelho 93 está reto, e quem está inclinado é o homem da direita. Como refutação, AC fala que a pintura é a visão do homem (observador), por isso, não pode ser o homem que está inclinado. No próximo trecho, continua a discussão entre as duas ideias. JU acredita que o homem está inclinado, tendo como justificativa a mesa que está reta. Já AC acredita que a imagem está inclinada, já que o quadro é a visão do homem e o reflexo da garçonete está completamente errado (turno 3_110). Existem momentos onde os alunos apontam a posição dos elementos da pintura, mas não é possível identificar, pois essa indicação é na folha de atividade ou na folha de exercício de Desenho Geométrico e não é possível saber o que é exatamente. Tabela 12 – Trecho referente à única questão da tirinha Posição da Imagem III do grupo HU3422 – Parte 3 T Linguagem Oral Indicadores e Comentários 3_93 JU: só se for a imagem dela ((o erro do quadro)) 3_94 HE: eh 3_95 JU: porque olha só Levantamento de hipótese ((A aluna está apontando para a folha, mas não dá para saber o que ela está mostrando na folha de atividades)) 3_96 HE: mas, aí ele ia ter que tá tipo pra cá/ Previsão ((A aluna está apontando para a tirinha, não é possível identificar o quê)) 3_97 JU: esse aqui tá certinho aqui, o espelho... ( ) quem Levantamento de hipótese tá inclinado aqui é ele, ele que tá ele tinha que ((JU faz com o corpo como o homem tá aparecendo aqui oh estaria inclinado, ela joga o corpo para o lado)) 3_98 AC: hum::: ele vai ter que oh/ está do lado de cá Levantamento de hipótese; ((Não é possível identificar o significa o “oh” e o do “lado de cá”)) 3_99 JU: o espelho não está inclinado, se o espelho Levantamento de hipótese; tivesse inclinado, a mesa/ a mesa ia fazer Justificativa assim na imagem ((JU faz um gesto para mostrar a posição da imagem, ela junta os pulsos com as mãos, formando uma espécie de quina perpendicular)) 3_100 AC: ele vai ter que está do lado de cá oh... ele tá vendo o reflexo dela] Levantamento de hipótese; Justificativa 94 3_101 JU: [ele tá vendo o reflexo dela 3_102 AC: aí ele ia ter que aparecer aqui oh 3_103 JU: eh 3_104 AC: ele ia ter que aparece aqui... por aqui Previsão 3_105 JU: não, ele ia aparece por aqui Previsão 3_106 AC: ah então o espelho tá paralelo e ele ((homem)) Levantamento de hipótese ((Parece teria que aparece ponto Previsão Previsão que AC está querendo finalizar a resposta escrita quando fala o “ponto”)) 3_107 HE: o que? 3_108 AC: o espelho está paralelo e ele teria que aparece ponto ((Novamente, parece que AC está tentando finalizar a resposta escrita quando fala o “ponto”)) 3_109 JU: como se o negócio ((espelho)) tivesse assim oh Teste de hipótese ((JU coloca a folha de atividades reta de lado ao espelho inclinado)) 3_110 AC: mas, o reflexo dela está completamente errado Justificativa 3_111 JU: não, ele que tá assim ((JU joga o corpo novamente como faz no turno 3_97, só que agora ele coloca o espelho na frente)) 3_112 HE: mas, aí não faz sentido porque isso aqui é todo Justificativa reto, só o reflexo que tá ((inclinado)) 3_113 JU: tá assim... as garrafas tão todas tortas Justificativa 3_114 HE: mas, JU a mesa está toda reta, ela Justificativa ((garçonete)) tá reta, ele ((homem)) tá vendo o reflexo dela ((garçonete))] 3_115 JU: [ele ((reflexo do homem)) tá assim, ele ((reflexo do homem)) tá Classificação de informação ((JU joga o corpo novamente)) assim 3_116 HE: se ele tivesse assim ele ia tá vendo isso aqui Previsão inclinado junto com a imagem do espelho, já ((HE faz um gesto colocando as mãos que o espelho estaria paralelo à mesa... tipo... em frente ao corpo, uma em cima da o espelho outra, sinalizando que o espelho está reto)) 3_117 JU: a gente tem que fazer uma experiência Seriação de informação 3_118 HE: olha... o espelho... a mesa... se ele está vendo Explicação; a mulher inclinada/ 3_119 JU: [não, ele tem que tá aqui Justificativa Previsão 95 3_120 HE: se ele tá vendo a mulher que tá aqui/ Previsão 3_121 JU: [ele ((homem)) tem que tá aqui aí ele Previsão ((homem)) ia se ver aqui oh 3_122 HE: sim, mas aí ele ia ver a mesa inclinada Justificativa; também já que ele está vendo as costas da Explicação; mulher inclinada... olha se imagina aqui na Previsão frente se olhando, você ia ver/ a mesa assim oh... 3_123 JU: não 3_124 HE: porque ele tá retratando a mesa retinha... significa que a mesa está assim para ele 3_125 AC: eh/ eh olha só/ 3_126 JU: o problema] 3_127 AC: [o reflexo dela tá errado com Justificativa; Explicação Levantamento de hipótese certeza/ 3_128 HE: 3_129 AC: tenta coloca isso de frente para vocês e tenta 3_130 [é o reflexo dela, ele tá vendo/ Teste de hipótese colocar seu dedo e ver o reflexo dela, o seu ((AC propõe uma experiência para os dedo vai te que tá tipo pra cá outros colegas)) JU: o problema é o ângulo então, ele não vê as costas dela Levantamento de hipótese; Justificativa 3_131 AC: eh 3_132 JU: porque esse negocio ((espelho)) tá reto e ela 3_133 Levantamento de hipótese Justificativa; ((garçonete)) tá tapando o reflexo das costas... Explicação; e ele ((homem)) teria que aparecer no espelho Previsão AC: eu ainda acho que ele não teria que aparecer Levantamento de hipótese no espelho 3_134 HE: pra cá/ 3_135 JU: [ou se ele tá assim tinha que tá tudo inclinado no reflexo 3_136 AC: tá tudo inclinado... porque/ o único jeito assim/ é assim...eu não me vejo assim 3_137 HE: então tipo o melhor é dizer que o reflexo não Levantamento de hipótese ((O mesmo movimento do turno 3_97)) Levantamento de hipótese; Justificativa Levantamento de hipótese condiz] com a... posição/ da mulher e do da mesa 3_138 AC: [mas, tipo tá muito longe 3_139 AR: oh minha borracha tá aqui 3_140 JU: se ele tá vendo tudo reto também ele pode não Levantamento de hipótese; 96 tá aparecendo porque/ a imagem dela pode tá Justificativa; bem na frente do reflexo né?/ não... o reflexo Explicação; dele ((o homem)) não chega no espelho ela tá Previsão na frente 3_141 HE: mas aí ela ia ter que tá exatamente na frente, porque ele não pode nem tá aqui embaixo, se Levantamento de hipótese; Justificativa não ele ia ver ele e não ia ver as coisas retinhas ele tem que tá de perto 3_142 JU: não não o problema não é o reflexo não aparece 3_143 HE: sim, tem que ser um ou outro... ou ele taria Levantamento de hipótese; muito por lado ou se ele tivesse na posição do Justificativa; quadro ((ruído)) do jeito que a gente acha que Explicação; ele tá aparecendo e o reflexo dela taria muito Previsão atrás dela quase que ( ) atrás dela 3_144 JU: não gente se se tivesse retinho ele pode não aparece só ((a mulher)) tá na frente dele 3_145 AC: eh... ele pode aparece/ 3_146 AR: eu acho que pra mim é o reflexo dela 3_147 HE: nem a tela dele? = 3_148 AC: 3_149 HE: = nem a tela dele, porque ele tá pintando Levantamento de hipótese; Explicação Levantamento de hipótese [ele num/ ( ) Levantamento de hipótese; Justificativa 3_150 AC: não tem várias formas que ele pode fazer para não aparece mas, o reflexo tá errado 3_151 Levantamento de hipótese; Justificativa JU: ele pode não se pinta... mas mesmo assim o reflexo dela está errado 3_152 AR: o reflexo está no lugar errado o que... 3_153 JU: o reflexo tinha que tá noventa] graus assim Classificação de informação 3_154 AR: Classificação de informação [tinha que tá... num lugar central 3_155 JU: ou tudo inclinado Classificação de informação 3_156 AC: não ou mais um pouquinho por lado... não tá Justificativa; pro lado... mas, poderia tá mas não tanto] 3_157 AR: Previsão [não ela podia/ não ela podia 3_158 JU: [olha só a mesa tá reta e o reflexo inclinado Justificativa 97 3_159 AC: eu sei e ela tá pro lado] 3_160 AR: 3_161 AC: entendeu? então o reflexo dela deveria está [mas, ela tá pro lado Levantamento de hipótese aqui mas, não aqui 3_162 AR: eu to achando que ela tá muito inclinada, ela Levantamento de hipótese não tá no lugar certo 3_163 JU: então a posição do reflexo não condiz? 3_164 AR: reflexo dela 3_165 HE: eh eu coloquei eh... não condiz com a posição Levantamento de hipótese Levantamento de hipótese dela e da mulher 3_166 AC: tá 3_167 HE: que coisa 3_168 AR: que polêmica heim 3_169 HE: ((risos)) 3_170 AR: o que você escreve? 3_171 AC: o reflexo não condiz com a posição dele ((o ((Sinal toca terminando a aula)) homem/pintor)) e da mulher... já acabou a aula Neste trecho, observamos claramente que há uma discussão para descobrir uma solução para o erro. Não é o erro que está sendo discutido, mas sim, as possibilidades do reflexo estar certo. As duas correntes, o espelho está inclinado ou o homem está inclinado, são desenvolvidas pelas alunas que tentam defender suas hipóteses. Observe a Figura 32, que apresenta o Padrão de Argumento de Toulmin construído a partir das duas ideias. 98 Figura 32 – Padrão de Argumento de Toulmin referente à primeira pergunta da tirinha Posição da Imagem III A partir da defesa das duas ideias, o erro volta à pauta de discussão. Os alunos têm como dado o fato de o espelho não estar inclinado, já que a mesa está reta e o reflexo inclinado. Isso por conta do reflexo dela estar completamente errado. Assim, eles concluem que o reflexo não condiz com a posição dele (homem/pintor) e da mulher. A menos que ele esteja inclinado. Esta conclusão é vazia, porém a discussão é muito interessante e profunda. Muitos aspectos foram levados em consideração, como por exemplo, o fato de a garçonete tapar seu reflexo (turno 3_132), e do homem (3_140) ou ainda o fato de ele não querer se pintar (3_150). Este grupo talvez tenha se focado mais em dar uma explicação do que encontrar o erro simplesmente. Esse fato foi muito interessante e agregou bastante no desenvolver de cada ideia, nenhum das duas hipóteses foi fechada ou dada como certa. Porém, o aluno AR puxa os outros alunos de volta para o objetivo da tirinha que era encontrar o erro. Com isso, eles determinam um denominador comum entre eles: que o erro está no reflexo, pois é ele que não condiz com a posição do homem e da mulher. O que é uma resposta genérica em cima das duas ideias: homem está inclinado ou o espelho que está inclinado. Novamente, “não” é o qualificador modal. 99 Segundo Walker (2008) o erro pode ser observado nas garrafas do lado espelho da pintura que estão na parte de trás do balcão, porém na imagem refletida estão na parte da frente. Além disso, como já indicado, a imagem da mulher deveria estar atrás dela, e não à direita. E por último, o reflexo do homem (o observador) deveria ser bloqueado pelo corpo da garçonete. Na Figura 33 representamos de uma visão superior do reflexo na pintura (Figura 33a) e como deveria ser o reflexo segundo as leis da reflexão (Figura 33b). Figura 33 - Representação gráfica do reflexo no quadro "Um bar no Folies-Bergère" com uma visão superior (a) reflexo no quadro e (b) reflexo segundo conhecimento científico Nesta figura retratamos, para facilitar, apenas a posição de quatro elementos da pintura: a mulher, o homem, o balcão e as garrafas do lado esquerdo do balcão. A bola (M) representa a posição da mulher e a (H) a posição do homem. A linha tracejada é a posição do espelho. O retângulo arredondado figura a posição das garrafas do lado esquerdo. O balcão é a linha dupla entre as bolas (H) e (M). 5.4 Campo Visual I A tirinha intitulada “Campo Visual I” (Figura 25) apresenta uma situação onde se pretende discutir as concepções alternativas das seções 3.3.4 e 3.3.5. A menina expõe uma solução para enxergar os tênis que não é comum aos alunos nessa situação. Ela sugere que a outra menina se aproxime do espelho, enquanto normalmente os alunos acreditam que se deve afastar do espelho. Para que haja 100 discussão não seria muito proveitoso colocar a concepção comum dos alunos, pois eles simplesmente concordariam com a opinião da menina, e precisariam de outros meios para chegar à conclusão que esta concepção está errada. Com isso em mente, na elaboração desta tirinha foram misturadas as duas concepções alternativas. Como já foi falado, os alunos acreditam que ao se aproximar do espelho sua imagem aumenta e ao se afastar sua imagem diminui, porém alguns também acreditam que ao nos aproximarmos do espelho é possível ver nossos pés, como se chegando mais perto do espelho fosse possível enxergar “dentro” do espelho, sem levar em consideração o limite do campo visual. Estas duas concepções estão relacionadas entre si, pois ao aproximar do espelho o campo visual se alarga ligeiramente e vice versa. Na Tabela 13 é apresentado o inicio da discussão sobre a tirinha Campo Visual I. De inicio eles estão tentando entender a situação, observe: Tabela 13 – Trecho referente à primeira e segunda questão da tirinha Campo Visual I do grupo HU3422 T Linguagem Oral 4_7 JU: eu não entendi também, ela tem que chegar Indicadores e Comentários Levantamento de hipótese; mais perto do espelho? tem que chegar pra Raciocínio proporcional trás ((A aluna indica uma relação entre as variáveis, distância do espelho e tamanho do objeto, diferente da apresentada na tirinha)) 4_8 AC: eh, a lógica da menina é tipo assim, ela Levantamento de hipótese percebeu o que está dentro do espelho, o espelho é tipo outra realidade 4_9 JU: ah:::: tá 4_10 AC: mas, não é assim, tem que chegar pra trás e abaixar ((o espelho)) primeiro 4_11 AR: ahm? 4_12 AC: é que se você só chegar pra trás não Levantamento de hipótese; Justificativa Levantamento de hipótese; adianta, você vai continuar vendo só seu Explicação; rosto Justificativa 4_13 JU: só se você for muito pra trás... Levantamento de hipótese; 4_14 AC: mas, assim você tem que inclinar o espelho Raciocínio lógico; 101 pra você conseguir ver embaixo Justificativa; Explicação 4_15 JU: por que esse é pequeno? Levantamento de hipótese; 4_16 AC: porque o espelho do corredor, eu fico muito Justificativa; longe eu só vejo o meu rosto Explicação ((A aluna apresenta um exemplo do cotidiano dela e dos outros alunos)) 4_17 AR: como você respondeu ah::/] ((Neste momento, parece que os alunos resgatam esse exemplo, pois parece que eles aceitam a hipótese)) 4_18 AC: [você tem que abaixar ((o espelho))... eu Levantamento de hipótese; acho/] No trecho anterior, a aluna AC levanta duas possíveis soluções para enxergar o tênis: inclinando o espelho e afastando e/ou abaixando o espelho e afastando. Ela até exemplifica e justifica quando comenta do espelho no corredor das salas de aula. Porém, não há muitos questionamentos, pois parece que ao invocar o exemplo do espelho do corredor, ela está ativando a memória dos outros alunos. No próximo trecho, os alunos continuam discutindo sobre a segunda questão enquanto discutem sobre a terceira questão. No início do trecho, os alunos apresentam uma das concepções alternativas mencionadas anteriormente (seção 3.3.4), porém vemos a aluna AC defendendo que se afastar não influencia em nada no tamanho da imagem. Ela usa alguns termos errados como “peso” no turno 4_37, que na verdade, provavelmente, ela estava querendo dizer tamanho. Tabela 14 – Trecho referente à segunda e terceira questão da tirinha Campo Visual I do grupo HU3422 T 4_27 Linguagem Oral AC: como assim ((imagem)) Indicadores e Comentários ampliada ou reduzida? 4_28 JU: oi? 4_29 AC: como assim ampliada ou reduzida? Classificação da informação; 4_30 AR: maior... você se vê a imagem maior de si Organização de informação; mesmo, só que de uma parte do corpo Levantamento de hipótese; Justificativa 102 4_31 JU: dependendo do/] 4_32 AR: [dependendo da sua distância com relação ao espelho 4_33 JU: é menor, dependendo do tipo de espelho... NÉ? Levantamento de hipótese; Explicação; Seriação de informação; Levantamento de hipótese 4_34 AR: também, também 4_35 AC: não, mas,/] 4_36 JU: 4_37 AC: [se um espelho for reto/] [num espelho plano você não Levantamento de hipótese Explicação; consegui de ver maior, vai ver com o mesmo ((Uso inadequado da palavra “peso” peso, o que você vai ver é à distância... a na expressão. É provável que, ela distância é::: maior ou menor esteja se referindo ao tamanho do objeto)) 4_38 JU: e se tiver um espelho aqui assim? assim? Levantamento de hipótese; você vai ver aqui 4_39 HE: eh 4_40 JU: se fizer assim você vai ver? 4_41 AC: um pouquinho mais... 4_42 JU: se você estiver muito longe dele você vai ser Levantamento de hipótese vê tipo/] 4_43 AC: [se o espelho estiver Explicação; na altura do rosto, você vai continuar vendo Justificativa; só seu rosto... se tiver um pouquinho Previsão inclinado aí você vê... se ele tiver mais baixo, e não tiver na altura do olho 4_44 JU: porque tá errada, né? 4_45 AC: porque não é assim que funciona 4_46 JU: inclinar o espelho 4_47 AR: mas, se afastar também não ajuda não? Levantamento de hipótese 4_48 HE: o ideal pra mim seria afastar e inclinar, se só Levantamento de hipótese afastar ] não vai afetar em nada = 4_49 AR: [eh pra mim é afastar e Levantamento de hipótese inclinar 4_50 HE: = porque ela está muito perto 4_51 AC: não, afastar nem é necessário se você só Justificativa inclinar você consegui 4_52 JU: faz assim oh, você vai ver ((No “faz assim oh”, a aluna faz um gesto com as mãos para mostrar a 103 posição do espelho e a inclinação)) 4_53 AC: o que eu acho que como vê em desenho ((a Levantamento de hipótese; disciplina)) o espelho funciona com ângulo... Explicação; então assim, se ele si vê aqui... ele si vê Justificativa; aqui...volta não... é o ângulo zero...é isso Raciocínio lógico mesmo, se ele olha pra cá o ângulo se ((fazendo o desenho na folha)) repete...meio que se repete... isso a gente vê em desenho ((a disciplina))... 4_54 4_55 JU: aí... é tipo um eixo de simetria... né? se você Raciocínio proporcional; vê daqui você vai ver a mesma distância do Explicação; outro lado... Previsão AC: me dá seu caderno de desenho aí?... mas, que nem essa parte aqui oh!.. que tem esse] ((Em “essa parte aqui oh!” AC está mostrando as folhas de Desenho Geométrico)) 4_56 JU: [a imagem desse se forma desse lado, e ele se vê? Levantamento de hipótese; Explicação 4_57 AC: é tipo, por exemplo... desse lado... Levantamento de hipótese 4_58 HE: isso aqui é... ele vai ver tipo o pé... se ele por Levantamento de hipótese; o pé 4_59 Explicação JU: ah:: é como se esse aqui já estivesse aqui] assim oh = Levantamento de hipótese; Explicação; Organização de informação ((No “assim oh” ela está apontando para o caderno de Desenho Geométrico)) 4_60 AC: [eh 4_61 AR: [eh 4_62 JU: = o raio incidente for... noventa, aí o refletido vai ser, noventa mesmo... né? Teste de hipótese; Raciocínio proporcional; Seriação de informação; Previsão 4_63 AC: eh 4_64 JU: ah:::: A discussão da terceira questão da Figura 25 é baseada ainda nas ideias e hipóteses da solução da segunda pergunta. AC usa diversos recursos para explicar e defender sua ideia, como por exemplo, a questão do ângulo e da repetição. O 104 apoio dela é o material de Desenho Geométrico, que provavelmente fala sobre simetria. No momento passado no trecho acima, podemos ver uma clara construção de conhecimento e um bom argumento construído pela AC e algumas vezes complementado pela aluna JU. Observe a Figura 34, a estrutura do argumento de AC. Figura 34 – Padrão de Argumento de Toulmin referente à segunda questão da tirinha Campo Visual I 105 AC tem como dado, o fato de ela se olhar no espelho do corredor de longe e continuar só vendo seu rosto, esse dado é apresentado ainda na Tabela 14. Por isso, sua conclusão para a segunda pergunta é que se deve inclinar para ver o tênis com aquele espelho. A justificativa para isso é que num espelho plano você não consegue se ver maior ou menor, você se vê do mesmo tamanho, a distância é que aumenta ou diminui com o aumentar ou diminuir da distância do objeto em relação ao espelho (turno 4_37). Como base para essa justificativa, ela se ancora ao material de Desenho que provavelmente é sobre simetria, e a propriedade do espelho plano onde a imagem tem o mesmo tamanho do objeto e se encontra à mesma distância do espelho que o objeto, só que do lado oposto, no plano do espelho. Ela ainda coloca uma condição que se o espelho não estiver na altura dos olhos e se tivesse mais a baixo, a menina poderia ver seu calçado. Um dos desenhos mais curiosos encontrados entre os materiais escritos foi a Figura 35, que apresenta uma representação da concepção alternativa da qual a tirinha “Campo Visual I” foi baseada. Figura 35 – Um desenho de um dos alunos do grupo HU1236 sobre a concepção alternativa da seção 3.3.4 Na maioria das vezes, essa concepção é expressa na forma oral ou escrita. Os diálogos do grupo HU1236 sobre essa tirinha, não tem uma profundidade, pois todos os alunos acreditam na mesma ideia, e por isso, não houve uma discussão ou defesa de ideia. A Figura 35 foi destacada e está sendo mostrado aqui somente pela 106 peculiaridade do desenho e que reforça a representação da concepção espontânea que diz que O tamanho da imagem depende da distância do objeto ao espelho. Como definido pela aluna AC num espelho plano, a distância do objeto em relação ao espelho não interfere no tamanho do objeto, isso só acontece nos espelhos esféricos. 5.5 Campo Visual IV A tirinha “Campo Visual IV” (Figura 36) mostra uma das lendas mais conhecidas sobre reflexão e espelho. Nesse caso, um escudo polido: o confronto entre a górgona conhecida como Medusa e o valente guerreiro Perseu representado num jogo de interpretação de personagens (RPG). Um garoto utiliza o conhecimento da lenda e o outro garoto (o narrador do jogo) contrargumenta com o conhecimento científico, já que os raios ópticos da górgona podem ser refletidos pelo escudo (uma superfície polida). Com essa tirinha, pretendemos discutir como os objetos são enxergados e o que é necessário para que isso aconteça, confrontando a concepção alternativa sobre os raios ópticos (seção 3.3.2). Além disso, foi colocada uma questão encontrada em Hewitt (2006) sobre as placas de alguns caminhões que dizem: “Se você não pode ver meu espelho, eu não posso te ver”. Essa placa é muito pertinente para a situação da tirinha, se o guerreiro pode ver a imagem da Medusa refletida no escudo polido, ela também pode ver o guerreiro pelo escudo, o que levaria a ser petrificado. Outra questão que pode ser discutida com os alunos é o fato de como uma superfície de reflexão (por exemplo, espelho) ser qualquer superfície polida. 107 Figura 36 – Campo Visual IV O grupo HU1236 começa discutindo o entendimento da tirinha, depois disso, eles começam a tentar responder a primeira questão. Além disso, durante a discussão, eles fazem associações com o filme Percy Jackson, que tem uma versão moderna do filme, onde Percy Jackson usa a superfície metálica do Ipod, da mesma maneira que Perseu usou o escudo, para enxergar a górgona. Tabela 15 – Trecho referente ao entendimento da tirinha Campo Visual IV e de sua primeira questão do grupo HU1236 T Linguagem Oral Indicadores e Comentários 5_18 ((MA começa a ler a tirinha Campo Visual IV)) 5_19 ((DA continua lendo)) 5_20 CA: Porque tipo quando a medusa olha pra você Classificação de informação 108 e você olha pra ela, você vira pedra... na ((A aluna relaciona os mitologia. acontecimentos da tirinhas com a mitologia)) 5_21 DA: sim 5_22 CA: Se botar um espelho e ela olha pra si mesma, ela não vira pedra Levantamento de hipótese; Classificação de informação ((Está classificando definindo a imunidade da Medusa aos próprios efeitos)) 5_23 BR: é 5_24 CA: Porque ela vai tá olhando/ 5_25 BR: [porque ela vai tá olhando para o espelho 5_26 CA: ela vai olhar e o espelho vai refletir a imagem Explicação dela 5_27 () 5_28 BR: não cara, se ela 5_29 CA: EM TESE ((CA aumenta a atonação da voz)) 5_30 DA: já viu Percy Jackson ele coloca um espelho Explicação para não vê ela/ 5_31 CA: [EM TESE 5_32 MA: DA, olha só... peraí rapidinho, me empresta ((CA aumenta a atonação da voz)) aqui ((o espelho)) 5_33 BR: Eu to olhando, eu to jogando os raios... os ((BR está observando o espelho)) raios... aí tá bateu aqui 5_34 DA: Ele não tá se olhando, ele tá olhando a medusa é tipo ( ) Levantamento de hipótese; Teste de hipótese ((DA está tentando ver BR com o espelho, estando ela de costas para ele)) 5_35 CA: sim, você tá me vendo, mas isso não significa que se você coloca...uh::: espelho não vá Levantamento de hipótese; Justificativa refletir 5_36 MA: o raio de visão/= 5_37 DA: [Eu vou vendo você, mas também vai me vê/ Teste de hipótese ((Com o espelho, a aluna observa o colega)) 5_38 MA: = [então é isso, olha só... eu to ti vendo, tá Levantamento de hipótese; 109 me vendo? ((perguntando para BR))... o meu Teste de hipótese; raio de visão tá refletindo em você, e o seu Justificativa; raio de visão tá refletindo em mim... é isso Explicação ((Em seguida, ele continua lendo a primeira ((MA questão da tirinha)) semelhante à feita pela DA, só que faz uma experimentação ele afasta mais o espelho para ver o BR)) 5_39 DA: o espelho reflete o campo de visão dela ((a Explicação; medusa))... Como vai refletir o seu ((do Justificativa menino)) campo de visão 5_40 CA: PR ((chamando o professor)) ((Neste momento, os alunos conversam sobre a hora da saída, e chamam atenção para terminar logo e ir embora)) 5_47 CA: oh BR 5_48 MA: borá só terminar isso ((reler a primeira questão da tirinha campo visual IV de novo)) 5_49 CA: porque ele vai ver a si mesma... e quando ele Levantamento de hipótese emitir/ 5_50 MA: não, pois... pois o campo de visão que você Levantamento de hipótese; tá vendo ela ((a Medusa) vai tá vendo você. Explicação Se você consegue ver ela ((a Medusa)), ela ((MA começa a relacionar a história ((a Medusa)) conseguir te vê com as perguntas que estão em conjunto com as tirinhas)) 5_51 DA: mas, porque isso? 5_52 BR: não, porque tipo assim, aqui... Tá me vendo CA? 5_53 MA: você apontou ((o espelho)) para a CA? 5_54 BR: o raio... Os raios estão batendo no espelho e Levantamento de hipótese; estão/ e está sendo refletindo certo? só que Explicação; meu campo de visão não tá encontrando o Justificativa espelho/ não ele tá encontrando o espelho, ((BR aponta para o espelho quando mas o espelho não encontra meu campo de ele fala que o raio está batendo no visão espelho. Quando ele fala que seu campo de visão não encontra o espelho, ele não está olhando o espelho que está apontado para ele)) 5_55 DA: encontra o da CA Teste de hipótese 110 ((Pedindo para MA encontrar o MA encontrar o reflexo da CA)) 5_56 BR: encontra o da CA/ Teste de hipótese ((Pedindo para reflexo da CA)) 5_57 MA: o espelho/ então a resposta é essa, o espelho/ 5_58 BR: então eu posso vê a CA 5_59 DA: dependendo da angulação o espelho... Levantamento de hipótese; Dependendo da localização que você está do Explicação; espelho, você vai ter vários campo de visão Justificativa; diferentes... tipo, se eu to com espelho aqui, Previsão aqui eu vejo uma coisa, aqui eu vejo outra, ((Durante o discurso, DA muda a aqui eu vejo outra, entendeu? Dependendo posição do seu rosto várias vezes de onde estou do espelho, de qual angulação mantendo o espelho na mesma eu to eu vou ter um campo de visão posição)) diferente... se eu boto o espelho numa angulação que eu consiga ver a Medusa, eh::: a angulação que a Medusa vê o espelho vai ser a mesma/ vai ser uma angulação que ela vai me ver 5_60 MA: cara, você/ você não consegui vê o seu/ 5_61 DA: [olha Levantamento de hipótese; só... desculpe, eu acho que é isso o espelho Explicação está a trinta graus, certo? ((DA começa desenhar na folha de atividades de BR. Provavelmente, ela está desenhando os ângulos)) 5_62 CA: eu ainda acho que é porque o espelho/ 5_63 DA: Se eu to vendo o espelho ah::: sessenta, ela 5_64 Explicação; vai vê a centro e vinte, certo? você vai se vê Justificativa; no espelho quando você tiver a noventa Classificação de informação graus do espelho... aí você vai se vê, tem ((A aluna elege alguns ângulos para que tá perpendicular ou mais ou menos exemplificar perpendicular explicação)) BR: mas, aqui não está perpendicular, aqui é uma e Classificação de informação reta 5_65 DA: tá, mas se você deixar assim, você não se vê..? ((perguntando para BR)) eu não to classificar Teste de hipótese; Explicação a 111 5_66 perpendicular ao espelho? assim eu to ((DA posiciona o espelho de frente perpendicular ao espelho... ou mais ou para ela com o braço estendido, e menos perpendicular faz a demonstração para BR)) BR: mas, eu não/ cadê o ângulo de noventa graus? ((Ele pega o espelho da mão de DA, e coloca o espelho na frente como DA fez no turno anterior)) 5_67 DA: daqui pra cá... imagine que isso seja um Explicação; plano assim... você está mais ou menos a Previsão; noventa graus, quando você está assim... Classificação de informação; não vou tá noventa graus, eu vou tá vamos Raciocínio proporcional supor a sessenta... se eu vou tá a sessenta a ((“daqui pra cá” a aluna faz um Medusa olhando daqui, vai tá cento e vinte ângulo de noventa espelho usando deixando ela graus uma com caneta perpendicular ao espelho. Medusa olhando daqui, ela joga o corpo para o lado com se estivesse se escondendo espelho)) 5_68 BR: ela ((a Medusa)) completa? 5_69 DA: sim, então você vê ela e ela te vê 5_70 BR: então, peraí/ o espelho ((BR relê a primeira questão da tirinha)) 5_71 DA: o espelho vai refleti o campo de visão dela... Explicação assim como/ vai refleti/ em você... como para ele o espelho vai refleti o seu campo de visão 5_72 BR: o espelho 5_73 MA: o espelho vai refleti o campo de visão dela, Explicação; assim como o seu campo de visão será Justificativa refletido para ela... é isso? 5_74 CA: é... ( ) campo de visão, porque campo de visão é o que você vê, só que ela não se vê 5_75 BR: é 5_76 DA: é a imagem 5_77 MA: o espelho... vai refleti a imagem dela e você Explicação vai vê a imagem que é refletida dela... e ela vai vê a imagem refleti de você 5_78 DA: ué? Para refleti a imagem da Medusa é precisa de certa angulação, e a gente sabe Classificação de informação; Explicação; do 112 5_79 tipo.. provou o MA que a gente não pode Jsutificativa bota o espelho aqui, a gente tem que colocar ((Ela se refere aos turnos de 5_51 ao no ângulo certo... peraí ((Ela relê o que ela 5_56, quando o MA testa com o escreveu)) espelho)) BR: o espelho? ((Nesse momento, eles começam a conversar sobre outra coisa, enquanto eles esperam a DA escrever a resposta)) 5_85 DA: olha só, “para o personagem virgula o reflexão da Medusa/ 5_86 MA: BR BR tá fazendo errado tá ((BR está adiantando a última 5_87 BR: que? questão, mas MA o adverte que o 5_88 MA: ele tá olhando para o espelho desenha está errado)) 5_89 BR: ah esse aqui é o espelho? 5_90 MA: é... esse aqui embaixo é o espelho 5_91 BR: ahm 5_92 DA: peraí, olha só: “para o personagem ver o ((A conclusão construída por todos)) reflexão da Medusa é necessário uma angulação precisa que também possibilita que a Medusa o veja” 5_93 () ((DA repete a resposta para os colegas)) A função do espelho (ou escudo) é lembrada pela aluna DA. O espelho serve para ver a Medusa sem precisar encará-la de frente (5_34). Neste mesmo momento, ela faz o teste utilizando o espelho com o outro colega. Podemos perceber as primeiras hipóteses sobre o campo visual e a necessidade de estar dentro dele para ser visto pelo espelho. A hipótese levantada é que se você me vê pelo espelho, eu também posso te ver. Porém, os alunos usam o termo raio de visão ao invés dos raios ópticos (5_38). Muitos alunos ainda têm o entendimento semelhante ao apresentado na seção 3.3.2. Em seguida, a aluna DA usa o termo campo de visão, e também fala sobre os diferentes tipos de campo visual dependendo da angulação do espelho (5_59). A discussão continua até que eles chegam na resposta escrita comum ao grupo 113 (5_92). Para entender melhor a utilização de termos como campo de visão ou raio de visão, observemos o próximo trecho (Tabela 16). Tabela 16 – Trecho referente à segunda questão da tirinha Campo Visual IV do grupo HU1236 Parte 1 T Linguagem Oral Indicadores e Comentários 5_96 MA: tá agora a dez 5_97 ((DA começa a ler a segunda questão da tirinha Campo Visual IV)) 5_98 MA: que o carro está fora do campo de visão do Levantamento de hipótese espelho do:: ((caminhão)) 5_99 DA: campo de visão não, campo de projeção 5_100 MA: campo de projeção do espelho Levantamento de hipótese do:: ((caminhão)) 5_101 DA: é... que o carro está fora do campo de Explicação projeção do espelho, logo/ é::: 5_102 MA: sua imagem não será refletida 5_103 DA: não... pelo carro não poder vê o espelho/ 5_104 BR: [calma cara tem duas perguntas 5_105 DA: ( ) porque tipo se você não pode vê o espelho Levantamento de hipótese; do carro o cara do caminhão vai poder vê Explicação; seu carro, então a gente pode bota é:: Pelo Justificativa fato de não poder/ pelo fato do espelho não ((Ela define campo de visão como o está no campo de visão do motorista... o campo visual do olho e campo de motorista também não está no campo de projeção sendo o campo visual do projeção do espelho, tipo você tem um espelho)) espelho... aqui que você não consegui o espelho é claro que você não consigo te vê 5_106 BR: tá 5_107 DA: você consegue ver o espelho Teste de hipótese ((DA tenta observar o BR pelo espelho estando ela de costas para ele)) 5_108 BR: consigo 5_109 DA: tá então não consigo explicar ((risos)) 5_110 MA: Não cara você tá fora do campo de projeção do espelho só isso Teste de hipótese 114 5_111 DA: só que ele tá falando do cara não conseguir vê o espelho ((Ela lê a pergunta novamente)) 5_112 CA: pelo que entendi/ 5_113 MA: [pra você tá no campo de Levantamento de hipótese; visão do espelho você precisa tá vendo o Explicação; espelho... o que isso quer dizer? Que o carro Justificativa está fora do campo de visão/ ((Agora MA usa o termo campo de visão para designar o campo visual do espelho)) 5_114 DA: o carro está fora do campo de visão do Justificativa espelho e o espelho precisa ( ) 5_115 MA: Para que... 5_116 DA: não precisa bota ( ) para que/ não porque Explicação para você está no campo de projeção do ((Os alunos constroem uma resposta espelho, ele precisa está no seu campo de escrita comum, a partir do que foi visão discutido entre eles)) 5_117 MA: Para que você possa está no campo de vis/ 5_118 DA: Para que você possa está no campo de projeção do espelho, ele precisa está no campo de visão MA usa de forma correta o termo campo de visão neste trecho (Tabela 16), porém DA o corrige usando o termo errado (campo de projeção). Ela explica, segunda questão da tirinha Campo IV, que se você vê espelho do caminhão, o motorista do caminhão pode ver você pelo mesmo espelho (5_105). Apesar dela falar de uma forma pouco clara, MA sintetiza e explica de forma um pouco mais clara para os demais colegas (5_113). Ele fala que para você estar no campo de visão do espelho você precisa estar vendo o espelho, o que significa que o carro está fora do campo de visão do espelho do caminhão. Tabela 17 – Trecho referente à segunda e terceira questão da tirinha Campo Visual IV do grupo HU1236 - Parte 2 T Linguagem Oral 5_143 ((DA termina de ler a segunda parte da pergunta)) DA: É porque os dois... falam sobre/ 5_144 MA: dois tratam sobre/ 5_145 DA: [falam sobre refletir Indicadores e Comentários 115 5_146 MA: sobre o campo de visão do espelho Levantamento de hipótese 5_147 DA: em diferentes angulações ( ) Levantamento de hipótese 5_148 BR: os dois tratam? 5_149 DA: tratam do campo visual do espelho em diferentes angulações ((Os alunos escrevem na folha de atividades, o que DA está narrando)) 5_155 ((BR começa a ler a ultima questão)) 5_156 MA: cara, eu fiz assim olha... eu fiz assim ((Aqui MA apresenta para os colegas o seu desenho referencia a terceira questão da tirinha [Figura 38])) 5_157 DA: faça um desenho para esquematizar o que ocorre com o fenômeno físico envolvido 5_158 BR: Não é... tipo assim, se ele olha aqui 5_159 DA: gente ainda tem que desenho o negocio da dez 5_160 MA: é... mas desenho é tipo... faz um caminhão Seriação de informação ((MA começa a fazer o desenho da Figura 37)) 5_161 DA: eu só vou fazer o espelho 5_162 BR: olhe aqui e olhe aqui... no espelho, eu vou ((BR começa a discutir a última conseguir ver isso... vou consegui vê a bola... questão enquanto os outros ainda a bola tá no campo de visão discutem sobre o desenho)) 5_163 CA: as duas bolas e a jarra 5_164 BR: as duas bolas e a jarra não... as duas bolas e metade da jarra... hum não, eu consigo ver a jarra toda 5_165 DA: aí a nossa visão não é perpendicular é de Seriação de informação cento e oitenta graus, né? 5_166 MA: é 5_167 BR: eu consigo ver a jarra toda e metade da Levantamento de hipótese estrela 5_168 MA: é assim oh 5_169 DA: é ela ( ) 5_170 MA: o que tava aqui 5_171 BR: eu acho que só dá para vê metade da estrela Levantamento de hipótese 5_172 DA: é a gente vê pra cima também ((“Pra cima” quer dizer que dá para 116 ver a outra metade da estrela ao contrário do que BR diz)) 5_173 MA: é tipo tá num ângulo de cento e oitenta 5_174 MA: DA, o que ocorre é isso aqui oh... o espelho, ((Neste momento, MA explica seu DA... o espelho, ela tá refletindo isso daqui desenho para DA. O “isso daqui oh... a imagem daqui o espelho refleti, se oh” se refere ao campo visual do você tá, por exemplo, por aqui... se o carro tá espelho do caminhão apresenta no aqui, por exemplo... desenho)) 5_175 DA: eu não sei desenha, então só vou desenha o espelho 5_176 MA: se o carro tá aqui, o que ele tá vendo? ele tá ((MA volta para a questão anterior vendo isso daqui oh... mas, uh:: o caminhão, e explica seu desenho [Figura 37])) não tá vendo o carro 5_177 BR: cara, aqui eu acho que:: ele vê só parte da estrela que esse ângulo é congruente a esse ((BR puxa novamente o grupo para a discussão da última questão)) ângulo 5_178 MA: é... ele vê/ ele vê tipo/ ele deixa de vê a Levantamento de hipótese pontinha da estrela 5_179 BR: ele vê parte da estrela... se ele não vê toda, Levantamento de hipótese; vê parte... entendeu? mas, tem que mostra Justificativa; que esse ângulo aqui... é congruente a esse, Classificação de informação então se bota aqui lambda... ((BR classifica como importante os ângulos terem a mesma medida [congruência])) 5_180 MA: cara só ((MA lê novamente a pergunta)) É só para falar 5_181 CA: MA, faz o desenho pra mim, eu não tem a menor habilidade pra desenhar 5_182 MA: em qual nesse daqui? 5_183 DA: olha só gente... essa bolinha vai tapar parte ((CA está se referindo ao desenho da Figura 37)) Seriação de informação do espelho, porque olha.. o:: olho tá/ é essa ((A aluna está identificando os bolinha certo? então essa bolinha ((a bola de elementos da imagem. Só não é basquete)) vai tapar a parte do reflexo possível identificar de que bola ela está falando da de bilhar ou de basquete)) 5_184 BR: cara, mas a íris/ a íris não, a parte/ como é o nome da parte dessa bolinha ((pupila)) aqui? 5_185 DA: pupila 117 5_186 BR: a pupila... ela tá pegando aqui em linha reta... não é para pegar aqui 5_187 DA: aí, você tá, olha só/ 5_188 BR: eu fiz uma curva eu sei ((Na folha de atividades do BR, ele não desenhou as linhas exatamente retas, talvez por não ter régua ou por falta de capricho)) 5_189 DA: faz assim oh 5_190 BR: aqui, não pega aqui? 5_191 DA: verdade 5_192 BR: tá vendo, pega a bola... e aqui ele vai refletir Teste de hipótese tudo, então ela vai vê assim, certo?... certo? ((Provavelmente, BR está fazendo que ele tá olhando reto... então ele vai refleti o teste com o espelho)) tudo 5_193 DA: não ele não vai pega isso daqui não, ele vai pega só isso daqui oh 5_194 BR: não meu amor, sabe porque? Se eu to vendo Levantamento de hipótese isso daqui, a angulação vai se a mesma que essa daqui 5_195 DA: ah verdade verdade... tem razão 5_196 MA: então ele vai vê a jarra e a estrela Levantamento de hipótese 5_197 BR: ele vai/ parte da estrela ((Neste momento, os alunos estão 5_198 DA: ele não vai ver a estrela toda tentando chegar num consenso 5_199 BR: ele não vai ver a estrela toda sobre quais os objetos visualizados 5_200 MA: a jarra e parte da estrela no 5_201 DA: como a gente identifica quais os objetos? começam a identificar cada um dos 5_202 BR: aqui seria congruente itens)) 5_203 DA: aí tem que identifica... isso aqui é o que uma Seriação de informação bola de basquete? espelho. Além disso, eles ((Eles listam os objetos presentes 5_204 BR: basquete, bola sete de::= na imagem. Depois disso, eles 5_205 DA: respondem quais são vistos pelo 5_206 BR: [sinuca = sinuca, uma jarra e espelho)) parte da estrela 5_208 MA: cara, ele não vai vê a bola de basquete 5_209 DA: vai sim 5_210 MA: não vai não DA... olha isso, cara olha isso, presta atenção... eu to olhando pra cá... tem Levantamento de hipótese Teste de hipótese 118 uma borracha aqui... a bola tá aqui 5_211 DA: a bola tá aqui 5_212 MA: a bola tá aqui, mas eu não to vendo a bola... 5_213 Levantamento de hipótese; não, ele não tá assim ele tá deitado... prest/ Teste de hipótese você tá olhando assim,o seu campo de visão ((O vai se aqui... vai bate aqui e daqui pra cá... situação é a construção da Figura vai fazer isso... você não vai vê a bola 38)) BR: é, tá aqui... oh... tá aqui... você tá vendo aqui... você tá vendo aqui 5_214 MA: a bola tá aqui, você não tá vendo a bola, BR 5_215 BR: a bola estando aqui, eu vou ver ela 5_216 MA: agora a bola estando aqui você não vai vê 5_217 DA: é 5_218 BR: é 5_219 MA: é o que tá acontecendo aqui... a bola tá aqui teste de hipótese nesta ((BR parece está apontando para o desenho da Figura 38)) Levantamento de hipótese , a bola não tá aqui 5_220 DA: ih por que esse ângulo? ((O ângulo que ela se refere é o ângulo alfa que aparece no desenho da Figura 38)) 5_221 MA: porque ele tá batendo o olho no espelho 5_222 DA: ah, paralelo ao alvo 5_223 BR: então, ele não vê nem bola de basquete e Levantamento de hipótese nem a bola de:: 5_224 MA: ele não vai vê nem a bola de basquete/ tipo, ((MA reafirma que é as bolas são ele vai vê as duas, mas olhando assim, agora vistas, mas pelo espelho elas não da visão do espelho, ele não vai vê... e não serão vistas)) vai vê a lâmpada, ele só vai vê a jarra e a estrela/ e parte da estrela No turno 5_156, vemos MA apresentar o desenho (Figura 37) referente à segunda questão da tirinha Campo Visual IV. Com o auxílio do desenho, ele explica para os outros colegas, além disso, ele organiza e lista as informações que devem constar no desenho (turno 5_160). No desenho vemos a posição do carro e do caminhão, a parte hachurada representa o campo visual do espelho do caminhão, e determina o que o motorista do caminhão vê atrás dele (turnos 5_174 e 5_176). 119 Figura 37 – Esquema referente à segunda questão da tirinha Campo Visual IV No turno 5_179, BR está classificando a informação quando fala que os ângulos são congruentes, ou seja, de mesma medida. Esta informação parece sem sentido neste turno, porém, quando eles constroem a Figura 38, a questão do ângulo faz mais sentido, porém não está correto. Pela falta de vídeo nesse momento não podemos precisar muito algumas falas, mas podemos perceber uma discussão interessante sobre os objetos vistos pelo espelho. Figura 38 – Esquema referente à terceira questão da tirinha Campo Visual IV Durante a discussão, os alunos fazem testes para concluir se a frase dos caminhões é válida. Para entender essas experimentações dos alunos podemos observar a Figura 39. Ela mostra três observadores P, Q e R: 120 Figura 39 - Representação do campo visual de três observadores A Figura 39a mostra o campo visual correspondente ao observador P. Nele P observa somente o observador Q, que está dentro do campo visual dele, e também só enxerga o observador P por estar também dentro do campo visual de Q (Figura 39). Já o observador R não está presente no campo visual de P e nem de Q, que por sua vez não tem nenhum dos dois observadores no seu campo visual (Figura 39c). As figuras 37 e 38 mostram um entendimento claro do conceito físico. Porém, quando analisamos os diálogos vemos que esse entendimento não esteve sempre presente com os todos os alunos. Esses conceitos sobre campo visual foram construídos e desenvolvidos entre os alunos. Apesar de pouco preciso, os desenhos estão representando o conceito científico, exceto pelo fato dos ângulos da Figura 38, pois estes ângulos nem sempre são congruentes. Este trabalho serve como forma de avaliação das tirinhas produzidas por Souza (2012a). Não foi possível, como já mencionado anteriormente, aplicação de todas as vinte tirinhas produzidas, mas a partir dessa avaliação podemos prever que as outras também podem atingir seus objetivos. Para isso, basta lembrar dos referenciais teóricos e de como eles se articulam. As perguntas foram fundamentais para a dinâmica, pois em vários momentos percebemos que se elas não existissem as discussões seriam menos profundas e menos diretas. Tal observação nos revela que a interação social e a não passividade dos alunos são importantes para o processo de construção de conhecimento. 121 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho é mais um passo para o progresso do projeto Física em Quadrinhos, que pretende contribuir na visão dos quadrinhos no ensino de Ciências, principalmente de Física. Acreditamos que as histórias em quadrinhos ou as tirinhas podem ser usadas de forma reflexiva, ou seja, como atividades que desenvolvem a capacidade de pensar e analisar os fatos. Por isso, algumas considerações importantes devem ser apontadas na conclusão desta dissertação. Os referenciais teóricos abordados durante o curso desta dissertação rementem à importância de formar alunos capazes de tomar decisões racionais e que possam beneficiar a sociedade. A ênfase em CTS faz a discussão sobre os avanços tecnológicos ficarem mais comuns e próximos do aluno, de sua família e meio social, além de apresentar uma ciência mais próxima do seu cotidiano. As atividades investigativas e a argumentação na sala de aula ajudam no desenvolvimento do pensamento crítico do aluno e na busca de soluções para resolver problemas do dia a dia. Acreditamos que qualquer atividade possa ser abordada e pensada para atingir o objetivo de formar um aluno-cidadão, desde que siga os referenciais de ensino por investigação com ênfase em CTS e argumentação na sala de aula. Os quadrinhos foram uma escolha pessoal, que acabou tomando maiores proporções às minhas expectativas. As tirinhas proporcionaram discussões mais profundas do que podia supor ou imaginar, por exemplo, não imaginava que a Figura 35 apareceria entre os dados desta pesquisa. Esse fato motivou ainda mais esta busca. É importante lembrar, que as tirinhas podem ser usadas antes, durante ou depois da apresentação da teoria, porém, achamos mais interessante para um melhor aproveitamento delas, que sejam aplicadas antes da teoria. Avaliamos as tirinhas do projeto Física em Quadrinhos através da percepção das discussões dos alunos sobre as tirinhas e suas atividades, e verificamos a construção do conhecimento e se elas atingem os objetivos para o qual elas foram criadas de acordo com os princípios e os procedimentos da análise de discurso 122 seguindo a estrutura do padrão de argumento de Toulmin (2006) para qualificar os argumentos dos estudantes. Durante as análises percebemos vários momentos de levantamento e desenvolvimento de hipóteses, e alguns exemplos de processo de construção do conhecimento. Isto mostra que as tirinhas em conjunto com as questões são mais que ilustrativas e introdutórias, elas podem proporcionar discussões, que tem como premissa os alunos poderem aprender e ensinar num processo de interação social e discussão com seus pares. Além disso, um material que valoriza o aluno faz com que ele se interesse mais em participar das atividades, pois faz com que ele se sinta parte do grupo, o que em escala maior, pode resultar em maior comprometimento com a sociedade em que vive. Por isso, é muito importante que esse tipo de atividade seja trabalhado mais vezes. As gravações em áudio e vídeo durante a aplicação das tirinhas nos permitiram conferir, com certa clareza, as discussões e os argumentos dos alunos em prática. Porém, teria sido mais proveitoso se todos os grupos fossem gravados em vídeo também, pois alguns momentos não puderam ser analisados de forma mais clara, por faltar a visão dos gestos relacionados a um termo ou palavra. Além disso, seria interessante fornecer aos alunos folhas de rascunhos, já que muitos desenhos foram apagados durante o desenvolvimento da resposta ou do próprio desenho. Outra consideração importante sobre as gravações é que apesar de os alunos brincarem e falarem coisas irrelevantes, é possível retirar diálogos ricos, que nos mostram os estudantes levantando e testando ideias, tirando conclusões e enfrentando desafios. Percebemos, também, a participação de todos os alunos dos grupos com o objetivo de resolver as questões propostas e interpretar as situações retratadas nos quadrinhos. Os estudantes ficaram à vontade para interpretar, discutir, resolver e concluir. Sobre o conteúdo da discussão e dos conhecimentos físicos, percebemos os conhecimentos prévios nas afirmações, nas refutações ou até mesmo na correção de um aluno em relação a afirmação de outro aluno. Os desenhos foram fundamentais para a análise do argumento, pois eles são, geralmente, argumentos 123 inteiros. Ademais, um conteúdo inicial como espelhos planos facilitou as discussões, pois são necessários menos informações sobre o fenômeno. Por isso, foi muito relevante a escolha do conteúdo na confecção das tirinhas (SOUZA, 2012a). Uma das dificuldades acerca da avaliação do material foi que demanda muito trabalho e tempo para ser realizada. As escolas têm uma quantidade grande de alunos por turma, exigindo uma quantidade muito grande de grupos, o que faz as gravações ficarem mais difíceis de entender em virtude dos ruídos. Ou ainda, grupos muito grandes, o que pode tornar difícil a identificação dos alunos e pode dispersar com mais facilidade os alunos. É importante salientar também que os quadrinhos já tiveram o objetivo de instruir a sociedade, e por isso, é muito relevante a busca da retomada desse objetivo. Para isso, é muito importante avaliarmos os quadrinhos como recursos didáticos; e essa avaliação deve ser feita a partir do objetivo que pretendemos para essa forma de arte. Hoje é muito fácil produzir quadrinhos. Existem muitos programas e aplicativos que são disponibilizados gratuitamente na internet. O próximo passo para a continuação desse trabalho é produzir novas tirinhas que abordarão outras áreas da Física. E divulgar, esse material para uso dos outros professores. De mais a mais, incentivar os professores a trabalhar e produzir suas próprias tirinhas ou histórias em quadrinhos. Além disso, as artes sequenciais possuem um alto nível de informação. Elas oferecem um leque de informações passíveis a serem discutidas em sala de aula. Favorecendo uma argumentação na sala de aula, por isso, elas podem ser usadas para promover uma construção de conhecimento baseada nas discussões de temas de qualquer ciência. Esse motivo está em harmonia com os objetivos do enfoque em CTS e a proposta de atividades investigativas. Os quadrinhos, também, auxiliam no hábito de leitura e na concentração na leitura. Enriquecendo o vocabulário do aluno, e fazendo buscar outros tipos de mídias – revistas, jornais e livros. O projeto vem sendo apresentado em congressos e eventos científicos com o objetivo de divulgar, receber sugestões e críticas de outros pesquisadores e professores. Futuramente, forneceremos oficinas de produção de tirinhas para 124 avaliar o método de produção delas. E depois, buscaremos responder novas questões que foram despertadas durante a elaboração desta pesquisa. Como isso, podemos supor que quanto mais perguntas ou questões mais rica e profunda é a discussão entre os alunos sobre os fenômenos científicos. Por isso, defendemos a utilização dos quadrinhos de maneira mais reflexiva. 125 7 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRAHÃO, A. Pedagogia e quadrinhos. In: Álvaro de Moya. (Org.). Shazam!. São Paulo: Perspectiva, 1972, p. 137-170. AIKENHEAD, G. S. What is STS science teaching? In: SOLOMON, J., AIKENHEAD, G. STS education: international perspectives on reform. New York: Teachers College Press, 1994, p.47-59. ALMEIDA, V. O.; CRUZ, C. A.; SOAVE, P. A. Concepções alternativas em Óptica. 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Com a coleta dos dados, as tirinhas serão avaliadas e reformuladas de acordo com as necessidades do projeto. Além disso, serão produzidas novas que abordarão outras áreas da Física. Após isso, esse material será publicado e disponibilizado para uso dos outros professores, pela internet. Hipótese: Sabendo que as histórias em quadrinhos já tiveram como objetivo instruir a sociedade, como podemos usá-las no ensino de Física? Pode-se avaliar o seu emprego nas salas de aula, para melhorar a aprendizagem em Física? As etapas do projeto são: Etapa 1: Revisar a bibliografia e as metodologias de ensino: Nessa etapa serão redefinidas e ajustadas as estratégias de abordagem em conjunto com a orientadora. Nesse mesmo momento, começará a comunicação com o professor da instituição(CPII/UESCIII) onde serão aplicadas as tirinhas e suas atividades. Etapa 2: Aplicar as tirinhas e suas atividades na escola: As tirinhas produzidas têm como meta levantar questões do cotidiano relacionando a Física. Além disso, elas estão combinadas com outras questões que estão relacionadas à própria situação dentro dos quadrinhos. Etapa 3: Coletar os dados para verificação da aprendizagem: Durante a etapa 2 serão coletados os dados da aplicação das tirinhas. As discussões dos alunos serão gravadas para que os diálogos sejam avaliados, durante a utilização das tirinhas. Etapa 4: Propor a elaboração de tirinhas pelos alunos sobre os assuntos abordados, e produção de outras tirinhas sobre os outros tópicos da física: Outra forma de avaliar o aprendizado do aluno é propor que ele produza suas próprias tirinhas, e analisar o que ele quer dizer com ela. Etapa 5: Avaliação dos resultados parciais e finais: Nessa fase serão analisados os resultados parciais, e com eles serão reformulados e reorganizados os materiais já produzidos para que sejam aplicados Endereço: Av. Brasil 4036 Sala 705 Bairro: Manguinhos CEP: 21.040-360 UF: RJ Município: RIO DE JANEIRO Telefone: (21)3882-9011 Fax: (21)2561-4815 E-mail: [email protected] 133 FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ FIOCRUZ/IOC novamente no próximo ano. Além disso, será organizado o novo material para que sejam desenvolvidos novamente as etapas 2 e 3. Serão pesquisados 120 alunos. Objetivo da Pesquisa: O objetivo geral deste trabalho é utilizar a tirinhas (ou quadrinhos) sobre Leis da Reflexão, em situações do diadia, produzida por Souza (2011)para verificar a aprendizagem dos alunos. Com elas abordar a ciência e sua relação com a sociedade e a tecnologia, nos tópicos de Física abordado. Avaliação dos Riscos e Benefícios: Com a criação de novas tirinhas e atividades relacionadas a elas, para ampliamos ainda mais a qualidade e quantidade de recursos para despertar o espírito crítico do discente, como também explorar a diversidade das subáreas da Física. Outro ponto de suma relevância nesse estudo é saber se os alunos realmente construirão seu conhecimento e o emprego de uma vida cidadã e crítica. Por isso, também, é papel do professor mediar o debate entre os alunos. Se provada a eficácia do material, será criada uma biblioteca de tirinhas para que elas sejam usadas em outras instituições. Oferecendo assim, mais um recurso para os professores de Física. Riscos: Todo o material produzido não causará dano aos alunos. Cuidados serão tomados para que nenhum tipo de descriminação apareça. Comentários e Considerações sobre a Pesquisa: A pesquisa é relevante, onde os objetivos foram definidos e possui uma metodologia adequada para o estudo. Nessa última versão do projeto, o pesquisador responsável incluiu os documentos solicitados no primeiro parecer. Considerações sobre os Termos de apresentação obrigatória: Todos os documentos e termos de apresentação obrigatório foram apresentados. Recomendações: Diante do exposto, o Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto Oswaldo Cruz (CEP FIOCRUZ/IOC), de acordo com as atribuições definidas na Resolução CNS 196/96, manifesta-se pela aprovação do projeto de pesquisa proposto. Conclusões ou Pendências e Lista de Inadequações: As seguintes pendências listadas no parecer consubstanciado datado de 30/07/2012 foram atendidas : 1- Os critérios de inclusão e exclusão dos sujeitos da pesquisa foram incluídos. 2- O endereço do CEP foi acrecentado ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. 3- Foram apresentados os termos de autorização das instituições envolvidas na pesquisa. Situação do Parecer: Aprovado Necessita Apreciação da CONEP: Não Endereço: Av. Brasil 4036 Sala 705 Bairro: Manguinhos CEP: 21.040-360 UF: RJ Município: RIO DE JANEIRO Telefone: (21)3882-9011 Fax: (21)2561-4815 E-mail: [email protected] 134 FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ FIOCRUZ/IOC Considerações Finais a critério do CEP: É responsabilidade indelegável do Pesquisador Principal: Apresentar relatórios parciais e anuais, e relatório final do projeto de pesquisa. Qualquer modificação ou emenda ao projeto de pesquisa em pauta deve ser submetida à apreciação do CEP FIOCRUZ-IOC. O sujeito de pesquisa ou seu representante, quando for o caso, deverá rubricar todas as folhas do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido-TCLE apondo sua assinatura na ultima pagina do referido Termo. O pesquisador responsável deverá da mesma forma, rubricar todas as folhas do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido- TCLE apondo sua assinatura na ultima pagina do referido Termo. RIO DE JANEIRO, 24 de Setembro de 2012 Assinado por: José Henrique da Silva Pilotto Endereço: Av. Brasil 4036 Sala 705 Bairro: Manguinhos CEP: 21.040-360 UF: RJ Município: RIO DE JANEIRO Telefone: (21)3882-9011 Fax: (21)2561-4815 E-mail: [email protected] 135 ANEXO B FIOCRUZ – PARECER DO COLÉGIO PEDRO II 136 ANEXO C FIOCRUZ – TCLE TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE) Você está sendo convidado(a) a participar, como voluntário, da pesquisa “Física em Quadrinhos: Uma Abordagem de Ensino”, do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Biociência e Saúde. Como foi falado, sua participação não é obrigatória, mas sim voluntária. A qualquer momento você pode desistir de participar e retirar seu consentimento. Você tem plena autonomia para decidir se quer ou não participar, bem como retirar sua participação a qualquer momento. Você não será penalizado de nenhuma maneira caso decida não consentir sua participação, ou desistir da mesma. Contudo, ela é muito importante para a execução da pesquisa. Além disso, serão garantidas a confidencialidade e a privacidade das informações por você prestadas. Objetivo do estudo: Neste estudo pretendo avaliar o poder pedagógico das histórias em quadrinhos. Sabendo que as histórias em quadrinhos já tiveram como objetivo instruir a sociedade, será que podemos usá-las no ensino de Física e de outras ciências? Procedimento: As histórias em quadrinhos serão aplicadas em conjunto com questões e/ou atividades onde os alunos estarão discutindo suas respostas com outros alunos. Os alunos devem ter oportunidade de agir e o ensino deve ser acompanhado de ações e demonstrações que o levem a um trabalho prático. Os diálogos dos estudantes serão gravados em forma de áudio e de vídeo, que por sua vez serão analisados pelo pesquisador responsável pelo estudo. Além disso, as respostas escritas e desenhos dos participantes serão também analisados. Para isso é necessário firmar este termo de consentimento, a fim de autorizar o uso de voz, imagem e os demais recursos escritos e gráficos produzidos pelos participantes durante o estudo. Risco: Todo o material produzido não causará dano aos alunos. Cuidados serão tomados para que nenhum tipo de discriminação apareça. Benefícios: Os benefícios gerados com a sua participação estão relacionados às possíveis contribuições ao processo ensino-aprendizagem da Física, a ciência do qual os alunos têm tanta dificuldade, tornando-a mais interessante e cativante. Confidencialidade: Os resultados da pesquisa estarão à sua disposição quando finalizada. Seu nome ou o material que indique sua participação não será liberado sem a sua permissão, e o material será armazenado em local seguro. A qualquer momento, durante a pesquisa, ou posteriormente, você poderá solicitar do pesquisador informações sobre sua participação e/ou sobre a pesquisa, o que poderá ser feito através dos meios de contato explicitados neste termo. Somente os resultados da pesquisa serão divulgados em apresentações, relatórios individuais, artigos científicos e na dissertação com fins científicos ou educacionais. Custo: Sua participação não implica em nenhum custo para você, e, como voluntário, você também não receberá qualquer valor em dinheiro como compensação pela participação. Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e endereço do pesquisador responsável, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer momento. 1 137 Ministério da Saúde Ministér FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz Instituto Oswaldo Cruz Comitê de Ética em Pesquisa Pesquisador Responsável: Eduardo Oliveira Ribeiro de Souza Telefone de contato: (21) 8258-2868 Email: [email protected] Pesquisa apoiada pelo IOC/FIOCRUZ Comitê de Ética em Pesquisa – IOC/FIOCRUZ Endereço: Av. Brasil, 4365 - Manguinhos, Rio de Janeiro - CEP: 21040-360 Telefone: (21) 3882-9000 (Ramal 9011) ou pelo fax (21) 2561-4815 Email: [email protected] Declaro que entendi os objetivos e condições de minha participação na pesquisa e concordo em participar. Recebi uma cópia deste termo de consentimento livre e esclarecido e me foi dada à oportunidade de ler e esclarecer as minhas dúvidas. Local e Data: _______________________________________________________________ Nome do Participante: ________________________________________________________ Assinatura: _____________________________________ Caso o participante seja menor de 18 anos, o termo de consentimento deverá ser assinado também pelo responsável legal. Nome do Responsável Legal: __________________________________________________ Assinatura: ____________________________________ Nome do Pesquisador Responsável: _____________________________________________ Assinatura: ____________________________________ 2 138 COLÉGIO PEDRO II UNIDADE ESCOLAR PROVA DE FÍSICA FIOCRUZ – TURMA: ANEXO DSÉRIE: – MATERIAL DE APLICAÇÃO COORDENADOR: PROFESSOR(A): N0: ALUNO(A): TRABALHO DE FÍSICA II POSIÇÃO DA IMAGEM E CAMPO VISUAL EM ESPELHOS PLANOS Os espelhos são usados, principalmente, para observar coisas em ângulos diferentes. Ao pegar um elevador, notamos a existência de espelhos planos na lateral ou no fundo do elevador. Nesse caso, eles são usados para que o ascensorista possa enxergar possíveis usuários estando dentro do local. Ou então, em retrovisor de carros para que seja possível ver os carros que estão atrás do carro. A mais comum utilização do fenômeno da reflexão é quando nos olhamos no espelho. E a mais antiga registrada é a lenda de Narciso quando olhava seu reflexo no lago e admirava sua beleza. Abaixo são apresentadas cinco tirinhas, e em cada uma delas você juntamente com seu grupo, deverá responder as perguntas procurando justificar de forma clara a sua resposta. Se achar necessário, faça desenhos para ajudar na justificativa. 1) Responda por que, no último quadrinho, o menino está olhando atrás do espelho? 2) O menino está olhando para um espelho plano. Sabendo disso, desenhe na figura a seguir, onde se encontra a imagem do menino? 139 3) O que significa dizer que a imagem no espelho plano é virtual? 4) A imagem abaixo mostra o mesmo menino de frente para um espelho. Se esse espelho estiver inclinado, em relação ao chão, onde se encontra sua imagem? Mostre na figura. 140 5) Você é capaz de encontrar o erro, comentado pela menina, nesse quadro? 6) Por que as meninas riem da afirmação da outra menina? 7) O que seria possível fazer para que ela conseguisse ver seus tênis? 8) É possível formar uma imagem ampliada ou reduzida utilizando o mesmo espelho? Justifique. 141 9) O que o narrador do jogo quis dizer: "o espelho reflete os raios ópticos dela"? Faça um esquema, se preciso. 10) Alguns caminhões possuem uma placa na traseira dizendo: "Se você não pode ver meu espelho, eu não posso te ver". O que isso quer dizer? Como podemos relacionar isso com essa tirinha? Faça um desenho para esquematizar o que ocorre com o fenômeno físico envolvido. 11) Qual das imagens dos objetos, o olho, localizado no ponto P, pode ver refletida no espelho? 142 ANEXO E – NORMAS DE TRANSCRIÇÃO Normas de transcrição usadas nas transcrições dos diálogos entre os alunos, sujeitos participantes desta pesquisa. Essas normas foram tiradas de VIERA (2013). Situação Qualquer pausa Hipótese do que se ouviu Incompreensão de palavras ou segmentos Comentários do transcritor Truncamento, interrupção discursiva Alongamento de vogal e consoante (como r, s) Interrogação Entonação enfática Silabação Aspas Superposição, simultaneidade de vozes Convenção ... (hipótese) () ((ruído)) / (ex.: a meni/ a menina vai fazer...; o menino/ a menina vai fazer... : ou :: (se for muito longo) ? Maiúsculas (Ex.: ela quer UMA solução, não qualquer solução) - - (Ex.: Eu estou pro-fun-da-men-te chateada) Discurso direto [ [ (ligando as linhas) Obs.: Se o primeiro locutor continuar falando sem parar, apesar da superposição de vozes, colocar um sinal de = ao fim da linha e recomeçar, após a fala superposta, com um sinal de =, para indicar a continuação. Exemplo: L: eu gosto muito de histórias infantis... [sempre que eu = D: [sei L: = posso leio pros meus netos