INTERCOMPARAÇÃO DE MÉTODOS PARA DETERMINAÇÃO DA CONCENTRAÇÃO MÁSSICA DE PARTÍCULAS NA ATMOSFERA A. CARVALHO1, J. MORAIS2, C. PIO1 E L. SALGUEIRO1 1 Universidade de Aveiro – Dep. de Ambiente e Ordenamento – 3810-193 Aveiro 2 Vórtice – Rua de Xabregas, 20 – Piso 2, Esc. 2.04 – 1900-440 Lisboa RESUMO Os amostradores de elevado caudal – hi-vol - com cabeça de pré-separação são o método de referência para a determinação das partículas com diâmetro inferior a 10 µm (PM10). O analisador de microbalança de elemento cónico oscilante – TEOM – efectua medições em contínuo e é um método equivalente para determinação das PM10. Realizaram-se amostragens simultâneas junto à estação meteorológica da Universidade de Aveiro com um hi-vol e um TEOM para comparação de resultados. As concentrações registadas por ambos os métodos variam de modo semelhante e apresentam correlação entre si. As concentrações de PM10 medidas pelo hi-vol são superiores às obtidas pelo TEOM, devido sobretudo a diferentes retenções de compostos semi-voláteis e água. Este efeito não inviabiliza a existência de correlação, e a utilização alternativa dos dois equipamentos é possível. PALAVRAS CHAVE: Partículas, Concentração mássica, Monitorização, Amostradores, TEOM 1 INTRODUÇÃO Os amostradores de elevado caudal – high-vol - com cabeça de pré-separação são o método de referência da Agencia de Protecção Ambiental dos Estados Unidos, e o mais largamente utilizado para determinação das partículas com diâmetro aerodinâmico equivalente inferior a 10 µm- PM10. Este método requer tempos de amostragem mínimos de várias horas, e por isso é utilizado para determinar a concentração média de 24 horas. Antes e após amostragem é necessário proceder à pesagem do filtro em condições controladas de humidade e temperatura. A necessidade de monitorizar a concentração de partículas em tempo real para prevenir a ocorrência de episódios de poluição com graves consequências na saúde levou a que se tenham criado instrumentos de medição contínua como o analisador de microbalança de elemento cónico oscilante – TEOM. Desde o início dos anos 90 que este analisador é um método equivalente para a determinação de partículas menores que 10 µm (PM10) aprovado nos EUA e das partículas totais na RFA (Rupprecht & Patashnick Co., Ink., 1992). Mais recentemente foi testado novamente na RFA tendo satisfeito os critérios da 1 Norma Europeia prEN 12341 e sido aprovado como método equivalente para PM10 (Mückler, 1999). No Reino Unido o TEOM é utilizado nas Redes Automáticas Urbanas como método de referência para medições de curto termo de PM10 (Patashnick, 1998; Harrison et al, 1997). O TEOM é um sistema de medição directa da massa inercial. O ar é aspirado através de um filtro ligado a um tubo cónico (balança de inércia), e o fluxo de ar que atravessa o tubo é mantido a volume constante por um controlador de caudal mássico. Um sistema de controlo electrónico mantém o tubo cónico em oscilação e mede continuamente a sua frequência. À medida que as partículas se vão depositando no filtro, a massa do oscilador modifica-se e como resultado a frequência de oscilação altera-se (Rupprecht & Patashnick Co., Ink. 1992). O conjunto do filtro e tubo cónico funcionam como um oscilador harmónico simples de acordo com a expressão: ω== 2πF = (K/M)0,5 (Eq. 1) onde ω e F são as frequência angular e linear do movimento, K a constante do oscilador, e M a massa do oscilador. Se resolvermos a equação 1 em ordem a M, a massa amostrada entre um instante i e um instante i+1 (∆M) obtém-se calculando a diferença de massa entre os dois instantes: ∆M = KO (1/Fi+1 - 1/Fi) (Eq. 2) com KO = K/2π. A determinação da constante KO é realizada em fábrica durante um processo de calibração. O seu valor pode ser verificado através da introdução de massas pré-determinadas gravimetricamente e medindo as alterações resultantes na frequência de oscilação. Como o elemento oscilante é construído em material não fatigante não se esperam variações significativas na calibração. O limite de detecção deste sistema é de aproximadamente 0,01 µg ou seja cerca de 100 vezes mais baixo que uma microbalança operada em condições de temperatura e humidade controlada. Para médias de 30 minutos consegue-se obter um desvio padrão de 1 µg m-3 na escala de 0 a 50 µg m-3. As partículas atmosféricas contém por um lado uma larga fracção compostos não voláteis, e por outro compostos semi-voláteis com pontos de ebulição próximos da temperatura ambiente, os quais podem existir simultaneamente na fase particulada e na fase gasosa. Na generalidade dos processo de colheita, estes compostos depositam-se ou libertam-se do filtro dependendo das condições ambientais e de amostragem causando variações na massa depositada. Tsai e Perng (1998) estudaram as perdas e ganhos durante a amostragem com amostradores de baixo e elevado caudal. Nas amostragens realizadas com hi-vol ocorreu um acréscimo de 11 % no sulfato e um decréscimo de 16, 24 e 17 % em nitrato, cloreto e amónio respectivamente. Os amostradores de baixo caudal apresentaram mais 5 % de perdas que o hi-vol devido á utilização de filtros de teflon em vez de filtros de fibra de quartzo. O ganho em sulfato resulta da reacção do SO2 com o filtro, enquanto as perdas dos outros iões resultam da variação da perda de 2 carga no filtro, da reacção com compostos acídicos existentes na fase gasosa e de modificações na temperatura durante a amostragem e condicionamento do filtro. A água também é um dos componentes das partículas cuja abundância depende muito das condições ambientais. Por isso procura-se remover a água dos filtros antes das pesagens, no entanto, mesmo condicionando os filtros a temperatura e humidade controlada a remoção nem sempre é total. Se a humidade relativa for aumentada até ao ponto de deliquescência de uma partícula, ocorre um aumento de massa e de volume por incorporação de água. Posteriormente a libertação total desta água apenas ocorre se a húmidade for reduzida para valores muito mais baixos (Patashnick, 1998; Hansson, 1998). Para eliminar as variações de massa resultantes das permutas de água entre a fase particulada e a fase gasosa e assegurar medições coerentes em períodos inferiores a uma hora, o TEOM é mantido a temperatura e caudal de amostragem constantes, normalmente 50 ºC e 3 dm3min-1. Por consequência, nestas condições o TEOM amostra menos compostos semi-voláteis e água que os métodos operados à temperatura ambiente. No entanto a situação poderá ser invertida se modificarmos as condições de amostragem. Numa experiência realizada nos EUA com um hi-vol, um TEOM operado a 50ºC e 3 dm3min-1 e um TEOM operado a 30ºC e 1 dm3min-1, obtiveram-se resultados distintos com os três aparelhos (Rupprecht e Meyer, 1998). O TEOM operado a temperatura mais baixa apresentou os resultados mais elevados (TEOM 30ºC / hi-vol = 1,66), enquanto o outro TEOM produziu os resultados mais baixos (TEOM 50ºC / hivol = 0,74). O hi-vol apresentou resultados delimitados por ambos os TEOMs. A velocidade de filtração verificada no TEOM operado a 50ºC é semelhante há do hi-vol e 3 vezes a ocorrida no TEOM operado a 30ºC. Logo o filtro deste TEOM encontra-se menos ventilado e a uma temperatura próxima da ambiente, resultando numa menor libertação de água e semi-voláteis. As diferenças ocorridas na massa efectivamente depositada sugerem que a retenção de compostos semi-voláteis e água depende significativamente das condições termodinâmicas registadas durante a amostragem e medição. 2 PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL Entre 21 de Setembro e 11 de Outubro de 1997 realizaram-se amostragens simultâneas junto à estação meteorológica da Universidade de Aveiro com o high-vol e com um TEOM® série 1400. Paralelamente monitorizou-se a concentração de carbono negro com um aethalometer. O high-vol com cabeça de pré-separação PM10 foi operado durante períodos de 12 horas a 1,13 m3min-1, e as partículas foram colhidas em filtros de fibra de vidro Whatman EPM 2000. Antes e após a amostragem, os filtros foram equilibrados numa atmosfera a 50% de humidade relativa durante períodos nunca inferiores a 30 minutos e posteriormente foi determinada a sua massa nas mesmas condições. O TEOM foi operado a 50 ºC e a um caudal de 16.7 dm3min-1 para manter o diâmetro de corte da cabeça de pré-separação, separando-se isocineticamente apenas 3 dm3min-1 para serem amostrados no filtro. O aethalometer mede a concentração de 3 carbono negro com base na sua absorção de radiação no infravermelho. O TEOM e o aethalometer efectuaram medições espaçadas 10 e 5 minutos respectivamente. 3 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A figura 1 relaciona as concentrações de partículas obtidas por ambos os métodos. Os pontos representados (n = 21) aproximam-se de uma recta que passa pela origem. Apesar da correlação existente (R2 = 0,88), o declive obtido não é unitário: [PM10]TEOM = 0,58 × [PM10]high-vol + 0,97 (Eq. 3) Maas (1992) comparou os resultados do TEOM e os obtidos manualmente com um hivol em Montana (EUA) e não registou diferenças apreciáveis. Allen et al (1997) apresentaram resultados de comparação entre o TEOM e métodos de amostragem manual, obtidos em vários locais dos EUA e México, tendo os declives das aproximações dos mínimos quadrados variado entre 0,62 e 1,03 no Verão na gama 0,51 a 0,74 no Inverno. Analogamente na zona urbana de Essen (RFA) obtiveram-se declives de aproximadamente 0,70 (Mückler, 1999). Em qualquer das situações a ordenada na origem apresentou valores baixos. -3 Concentração de Partículas - TEOM (µg m ) 80 70 60 50 40 30 20 10 0 0 20 40 60 80 100 120 -3 Concentração de Partículas - Hi-vol (µg m ) Figura 1 – Relação entre as concentrações de PM10 obtidas pelo TEOM e pelo hi-vol. 4 120 70 100 60 50 80 40 60 30 40 20 Hi-Vol TEOM 20 10 80 0 TEOM/hi-vol Precipitação Temperatura 60 0,9 40 0,6 0,3 22/9 Precipitação (mm) Razão TEOM/hi-vol 1,2 30 25 20 20 24/9 26/9 28/9 30/9 8/10 10/10 0 12/10 Temperatura Máxima Diária (ºC) 80 -3 Concentração de partículas medida com hi-vol (µg m ) 140 Concentração de partículas medida com TEOM (µg m-3) Allen et al (1997) atribuem a diferença à presença de compostos semi-voláteis no aerossol, como o nitrato de amónio e alguns compostos orgânicos, e a alguma água retida higroscopicamente pelas partículas mesmo após o condicionamento. Os declives das aproximações dos mínimos quadrados tendem a ser mais elevados durante os períodos quentes de Verão, porque o aerossol está mais seco e os compostos semivoláteis são mais facilmente volatilizados do hi-vol. Em locais com influência marinha, como o da presente experiência, o aerossol é húmido e a concentração de sal marinho é elevada, logo o efeito da higroscopicidade das partículas é mais significativo. 15 Data Figura 2 – Evolução das concentrações de partículas medidas pelo TEOM e pelo hi-vol, e da temperatura máxima diária e precipitação durante o período de colheitas. 5 Analisando a variação da temperatura máxima diária durante o período de colheitas, observa-se que houve uma tendência para as subidas de temperatura serem acompanhadas por um aumento da razão entre as concentrações obtidas pelo TEOM e pelo hi-vol (Figura 2). Este facto sugere que os resultados de ambos os métodos serão mais próximos em períodos de temperatura elevada. A ocorrência de pluviosidade nos períodos de temperatura mais elevada contribuiu para remover partículas da atmosfera, mas parece não ter contribuído para baixar a razão. Também se verifica que a variação relativa das concentrações registadas por ambos os métodos é semelhante. 70 7000 60 6000 Partículas Carbono Negro 50 5000 40 4000 30 3000 20 2000 10 1000 0 Concentração de Carbono Negro (ng m-3) Concentração de Partículas (µg m-3) Na Figura 3 apresenta-se a variação média diária dos níveis de partículas e de carbono negro no período de 19 a 26/9/97. Em meios urbanos os transportes são uma fonte importante de partículas de carbono negro e orgânico, e por consequência os perfis médios diários de concentração de partículas e de concentração de carbono negro foram semelhantes As concentrações foram elevadas durante a noite, devido à acumulação de poluentes; aumentando durante a manhã como resultado do aumento das emissões dos transportes; e diminuindo durante a tarde e inicio da noite quando a dispersão é mais eficiente. 0 0 6 12 18 24 Tempo (Horas) Figura 3 – Perfis diários de PM10 e carbono negro entre 19 a 26 de Setembro de 1997. 6 4 CONCLUSÕES A monitorização continua dos poluentes atmosféricos para detecção de episódios de poluição é muito importante em locais densamente povoados ou com intensa actividade industrial. As medições de curto termo realizadas pelo analisador de microbalança de elemento cónico oscilante são uma medida coerente da concentração de partículas e permitem a detecção de picos horários de concentração os quais não são detectados pelos métodos manuais. Em termos relativos, verificou-se que a variação dos níveis medidos pelo TEOM e pelo amostrador de elevado caudal é semelhante, o mesmo acontecendo entre os perfis diários de PM10 medidos com o TEOM e os perfis de concentração de carbono negro medidos pelo Aethalometer. Em termos absolutos as concentrações de PM10 medidas pelo hi-vol foram superiores às obtidas pelo TEOM, tendo-se verificado a existência de correlação entre ambas as medidas. A não coincidência de resultados dever-se-á fundamentalmente a diferentes retenções de água e matéria semi-volátil devido à utilização de temperaturas de amostragem distintas, fixa a 50 ºC no TEOM e variável em função das condições ambientais no hi-vol. Devido à ocorrência de perdas em ambos os métodos, a correcta quantificação dos compostos semi-voláteis existente na fase particulada e na fase gasosa deverá ser feita por métodos específicos. Como o efeito dos compostos semi-voláteis não inviabiliza a existência de correlação, a utilização alternativa dos dois equipamentos para obtenção de médias diárias é possível. 5 AGRADECIMENTOS Os autores agradecem à Fundação para a Ciência e a Tecnologia a bolsa concedida a Abel Carvalho e à Rupprecht & Patashnick Co. a cedência do TEOM® série 1400 utilizado. 7 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALLEN, G., SIOUTAS, C., KOUTRAKIS, P., REISS, R., LURMANN, F. e ROBERTS, P. 1997. Evaluation of the TEOM® method for measurement of ambient particulate mass in urban areas. J. Air & Waste Manage. Assoc. 47, 682 - 689. HANSSON, H., ROOD, M., KOLOUTSOU-VAKAKIS, S., HÄMERI, K., ORSINI, D. e WIEDENSOHLER, A. 1997. NaCl aerosol particle hygroscopicity dependence on mixing with organic compounds. 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