Foto de Ensaio
Companhia de Teatro de almada
co-produção Teatro Nacional D. Maria II
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Sobre a corrupção do dinheiro
Com um elenco em que se destacam
nomes como Luís Vicente (no papel
de Timão), Paulo Matos, Ivo Alexandre ou Marques D’Arede, entre outros, «Timão de Atenas» centra-se
na metáfora do ouro enquanto matéria sem qualquer valor em si mesma,
para representar a alienação e a falsa
bajulação no seio de uma sociedade
subjugada à usura e ao materialismo.
Servindo-se de fontes da Antiguidade Clássica, como Plutarco, Shakespeare projectou em personagens
históricas, como Timão, Alcibíades
ou Apemanto, alguns comportamen-
Paulo Matos
tos que tinham directamente que ver
com o seu tempo — e com o nosso.
Timão, um nobre ateniense, leva
uma vida de esbanjamento e altruísmo, malgrado os avisos do seu fiel
criado Flávio para que não seja tão
despesista, e as invectivas do cínico filósofo Apemanto, que denuncia
a falsidade dos nobres bajuladores
que o rodeiam. Enquanto dura a sua
fúria gastadora, não falta quem venha visitá-lo, adulá-lo, e elogiar-lhe
o comportamento magnânimo. No
entanto, uma vez caído em desgraça, vendo a sua fortuna delapidada,
rapidamente aqueles que o incensavam se revelam indisponíveis para
vir em seu socorro: Timão decide
então fugir de Atenas e refugiar-se
na floresta, onde já só espera morrer
“onde as ondas do mar venham para
sempre visitá-lo”.
Ironicamente, no seu exílio Timão
acaba por encontrar uma mina de
ouro, o que só servirá para que re-
Ivo Alexandre
flicta sobre os males que a riqueza e
o poder trazem à sociedade, e para
que aumente a sua misantropia. A
todos os que o vêm visitar — uns
porque gostam dele (como o seu
criado Flávio, e o seu antigo companheiro de armas Alcibíades), outros
porque ouviram dizer que estava
de novo rico — Timão dá ouro, recomendando-lhes que o usem para
benefício da humanidade, isto é, que
a destruam sem misericórdia. Só assim se poderá construir um mundo
novo – um mundo que Timão já não
conhecerá, porque decide aniquilar-se logo em seguida. Um mundo que,
de certa forma, o capitão Alcibíades
anuncia na cena final da peça, quando entra em Atenas para conquistar
a cidade, acabar com a corrupção, e
anunciar um “tempo novo”, no qual
“os criminosos, cheios de medo, serão julgados nas mesmas cadeiras
do poder, e a sua enorme insolência
esfumar-se-á no pavor de uma fuga
horrorosa”.
Alberto Quaresma
Marques D’Arede e Luís Vicente
Fotos de Ensaios
A
pós o sucesso de «O mercador de Veneza», o Teatro
Municipal de Almada volta
a apresentar um clássico
de Shakespeare, desta vez
em estreia absoluta no nosso País:
«Timão de Atenas», com encenação
de Joaquim Benite, que constitui o
regresso do director do TMA à encenação.
Uma alegoria para os tempos modernos
Q
ue interesse, e principalmente que actualidade, conserva
ainda hoje esta peça, para
que seja levada ao palco?
É precisamente por ter um enredo
pouco desenvolvido – ou, dizendo
melhor, tão centrado e concentrado
– e carácteres tão primários em torno da grande figura de Timão que o
seu interesse se mantém, chamando
a atenção para a realidade crua do
servilismo sabujo e hipócrita, da ambição desmedida, da vaidade cega,
e por fim, como corolário de todos
os defeitos de carácter e de comportamento, da enorme ingratidão humana. Aqui está o Homem, o de ontem como o de hoje, posto a nu com
uma crueza impiedosa. É o espelho
em que Shakespeare nos mostra a
nós mesmos, através da vida de Timão, no auge da sua glória, na hora
da sua queda.
A lição moral está lá, a condição humana exposta na vileza mais baixa, e
hoje como outrora poderemos descobrir carrascos ou vítimas de grande semelhança. Podemos encontrar
semelhanças de situação e de engano de alma em Timão como em
Lear, ambos sofrendo da ansiedade
doentia de querer ser amado e admirado acima de tudo o mais, ambos
deixando-se infantilmente enganar, e
sendo conduzidos a um fim trágico
e cruel. Mas podemos dizer que merecido, num destino que não foi obra
dos deuses mas provocado pelas
suas próprias limitações. Aqui, em
Shakespeare, é sempre o homem o
centro, a causa e o efeito do drama
que se desenrola. São já patentes,
nestas como noutras peças em que
se toca no trágico destino humano,
as marcas de uma modernidade, a
do Humanismo e do Renascimento…
Timão, nesta verdadeira alegoria da
condição humana degradada, é um
homem só, não o vemos no seio de
uma família possível, de laços naturais: o que reforça a esterilidade dos
valores (ou a ausência deles) que se
apontam.
Reforçado o contraste ente a cidade (Atenas) – espaço de corrupção
– e a floresta livre, onde o homem
pode regressar aos seus melhores
instintos (alegoria óbvia da cidade e
do campo, ou da civilização e da natureza pura), Shakespeare conduznos a uma situação que nos deixa,
enquanto público, pairar numa ambiguidade de que só Timão é responsável. É certo que se transforma
em figura trágica – mais patética até
do que trágica – como convém a um
exemplo que se pretende dar. Nisso
reside a lição moral da peça: não se
enganem com os louros fictícios do
poder e do dinheiro. Perdidos esses
louros, tudo à roda se perde, e entretanto foram-se os grandes valores
da vida, do Bem, do Belo, da Verdadeira relação com a sociedade e o
mundo.
Para Timão, no seu declínio tudo
se transformou em roubo: roubo do
seu prestígio, que lhe advinha de
um ouro afinal também ele roubado
(pilhagens aos inimigos vencidos), e
a partir daí, sem que tenha aprendido a lição, tudo à sua volta é visto
como roubo. Num monólogo magistral, Shakespeare, pela boca do seu
herói, transforma em paradigma do
humano, do social e do universal,
abarcando o próprio universo esta
ideia do Roubo: em tudo e todos se
detecta qualquer elemento roubado, e assim se constrói uma “cadeia
do ser”, invertida na sua primitiva e
ideal essência (como Shakespeare a
conhecia de Platão):
Que dizer mais? Passou-se de um
extremo a outro, nesta narrativa dramática de ascensão e queda de um
herói que cai vítima de si mesmo, e
cujo exemplo se deixa para outros.
A actualidade da obra mantém-se, a
meu ver, intacta.
Yvette K. Centeno
Ficha Artística
texto William SHAKESPEARE Encenação Joaquim BENITE com Rodrigo Francisco intérpretes Luís VICENTE, Alberto QUARESMA,
Ana CRIS, André GOMES, Celestino SILVA, Ivo ALEXANDRE, Marques D’AREDE, Jeff de OLIVEIRA, Joana FRANCAMPOS, João FARRAIA,
Manuel MENDONÇA, Miguel MARTINS, Paulo MATOS, Pedro WALTER Versão dramatúrgica, segundo tradução DE Yvette K.
CENTENO Cenário Jean-Guy LECAT Figurinos Sónia BENITE Desenho de Luz José Carlos NASCIMENTO Voz e elocução Luís
MADUREIRA Movimento Jean-Paul BUCCHIERI Consultoria musical Fernando FONTES Caracterização Sano de PERPESSAC
6€
20, 21 e 22 de DEZembro | 9 de JANeiro a 3 de FEVereiro
Qua a Sáb às 21h30, Dom às 16h00
SALA PRINCIPAL
M/12
O TMA organiza transportes colectivos para grupos de mais de 20 pessoas.
Informações e Reservas: João Farraia: 92 671 20 34 | Miguel Martins: 96 496 00 05 | Pedro Walter: 96 354 95 75
Preço especial
para grupos
12€
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