Foto de Ensaio Companhia de Teatro de almada co-produção Teatro Nacional D. Maria II Av. Prof. Egas Moniz - Almada | Telf.: 21 273 93 60 | www.ctalmada.pt | [email protected] Sobre a corrupção do dinheiro Com um elenco em que se destacam nomes como Luís Vicente (no papel de Timão), Paulo Matos, Ivo Alexandre ou Marques D’Arede, entre outros, «Timão de Atenas» centra-se na metáfora do ouro enquanto matéria sem qualquer valor em si mesma, para representar a alienação e a falsa bajulação no seio de uma sociedade subjugada à usura e ao materialismo. Servindo-se de fontes da Antiguidade Clássica, como Plutarco, Shakespeare projectou em personagens históricas, como Timão, Alcibíades ou Apemanto, alguns comportamen- Paulo Matos tos que tinham directamente que ver com o seu tempo — e com o nosso. Timão, um nobre ateniense, leva uma vida de esbanjamento e altruísmo, malgrado os avisos do seu fiel criado Flávio para que não seja tão despesista, e as invectivas do cínico filósofo Apemanto, que denuncia a falsidade dos nobres bajuladores que o rodeiam. Enquanto dura a sua fúria gastadora, não falta quem venha visitá-lo, adulá-lo, e elogiar-lhe o comportamento magnânimo. No entanto, uma vez caído em desgraça, vendo a sua fortuna delapidada, rapidamente aqueles que o incensavam se revelam indisponíveis para vir em seu socorro: Timão decide então fugir de Atenas e refugiar-se na floresta, onde já só espera morrer “onde as ondas do mar venham para sempre visitá-lo”. Ironicamente, no seu exílio Timão acaba por encontrar uma mina de ouro, o que só servirá para que re- Ivo Alexandre flicta sobre os males que a riqueza e o poder trazem à sociedade, e para que aumente a sua misantropia. A todos os que o vêm visitar — uns porque gostam dele (como o seu criado Flávio, e o seu antigo companheiro de armas Alcibíades), outros porque ouviram dizer que estava de novo rico — Timão dá ouro, recomendando-lhes que o usem para benefício da humanidade, isto é, que a destruam sem misericórdia. Só assim se poderá construir um mundo novo – um mundo que Timão já não conhecerá, porque decide aniquilar-se logo em seguida. Um mundo que, de certa forma, o capitão Alcibíades anuncia na cena final da peça, quando entra em Atenas para conquistar a cidade, acabar com a corrupção, e anunciar um “tempo novo”, no qual “os criminosos, cheios de medo, serão julgados nas mesmas cadeiras do poder, e a sua enorme insolência esfumar-se-á no pavor de uma fuga horrorosa”. Alberto Quaresma Marques D’Arede e Luís Vicente Fotos de Ensaios A pós o sucesso de «O mercador de Veneza», o Teatro Municipal de Almada volta a apresentar um clássico de Shakespeare, desta vez em estreia absoluta no nosso País: «Timão de Atenas», com encenação de Joaquim Benite, que constitui o regresso do director do TMA à encenação. Uma alegoria para os tempos modernos Q ue interesse, e principalmente que actualidade, conserva ainda hoje esta peça, para que seja levada ao palco? É precisamente por ter um enredo pouco desenvolvido – ou, dizendo melhor, tão centrado e concentrado – e carácteres tão primários em torno da grande figura de Timão que o seu interesse se mantém, chamando a atenção para a realidade crua do servilismo sabujo e hipócrita, da ambição desmedida, da vaidade cega, e por fim, como corolário de todos os defeitos de carácter e de comportamento, da enorme ingratidão humana. Aqui está o Homem, o de ontem como o de hoje, posto a nu com uma crueza impiedosa. É o espelho em que Shakespeare nos mostra a nós mesmos, através da vida de Timão, no auge da sua glória, na hora da sua queda. A lição moral está lá, a condição humana exposta na vileza mais baixa, e hoje como outrora poderemos descobrir carrascos ou vítimas de grande semelhança. Podemos encontrar semelhanças de situação e de engano de alma em Timão como em Lear, ambos sofrendo da ansiedade doentia de querer ser amado e admirado acima de tudo o mais, ambos deixando-se infantilmente enganar, e sendo conduzidos a um fim trágico e cruel. Mas podemos dizer que merecido, num destino que não foi obra dos deuses mas provocado pelas suas próprias limitações. Aqui, em Shakespeare, é sempre o homem o centro, a causa e o efeito do drama que se desenrola. São já patentes, nestas como noutras peças em que se toca no trágico destino humano, as marcas de uma modernidade, a do Humanismo e do Renascimento… Timão, nesta verdadeira alegoria da condição humana degradada, é um homem só, não o vemos no seio de uma família possível, de laços naturais: o que reforça a esterilidade dos valores (ou a ausência deles) que se apontam. Reforçado o contraste ente a cidade (Atenas) – espaço de corrupção – e a floresta livre, onde o homem pode regressar aos seus melhores instintos (alegoria óbvia da cidade e do campo, ou da civilização e da natureza pura), Shakespeare conduznos a uma situação que nos deixa, enquanto público, pairar numa ambiguidade de que só Timão é responsável. É certo que se transforma em figura trágica – mais patética até do que trágica – como convém a um exemplo que se pretende dar. Nisso reside a lição moral da peça: não se enganem com os louros fictícios do poder e do dinheiro. Perdidos esses louros, tudo à roda se perde, e entretanto foram-se os grandes valores da vida, do Bem, do Belo, da Verdadeira relação com a sociedade e o mundo. Para Timão, no seu declínio tudo se transformou em roubo: roubo do seu prestígio, que lhe advinha de um ouro afinal também ele roubado (pilhagens aos inimigos vencidos), e a partir daí, sem que tenha aprendido a lição, tudo à sua volta é visto como roubo. Num monólogo magistral, Shakespeare, pela boca do seu herói, transforma em paradigma do humano, do social e do universal, abarcando o próprio universo esta ideia do Roubo: em tudo e todos se detecta qualquer elemento roubado, e assim se constrói uma “cadeia do ser”, invertida na sua primitiva e ideal essência (como Shakespeare a conhecia de Platão): Que dizer mais? Passou-se de um extremo a outro, nesta narrativa dramática de ascensão e queda de um herói que cai vítima de si mesmo, e cujo exemplo se deixa para outros. A actualidade da obra mantém-se, a meu ver, intacta. Yvette K. Centeno Ficha Artística texto William SHAKESPEARE Encenação Joaquim BENITE com Rodrigo Francisco intérpretes Luís VICENTE, Alberto QUARESMA, Ana CRIS, André GOMES, Celestino SILVA, Ivo ALEXANDRE, Marques D’AREDE, Jeff de OLIVEIRA, Joana FRANCAMPOS, João FARRAIA, Manuel MENDONÇA, Miguel MARTINS, Paulo MATOS, Pedro WALTER Versão dramatúrgica, segundo tradução DE Yvette K. CENTENO Cenário Jean-Guy LECAT Figurinos Sónia BENITE Desenho de Luz José Carlos NASCIMENTO Voz e elocução Luís MADUREIRA Movimento Jean-Paul BUCCHIERI Consultoria musical Fernando FONTES Caracterização Sano de PERPESSAC 6€ 20, 21 e 22 de DEZembro | 9 de JANeiro a 3 de FEVereiro Qua a Sáb às 21h30, Dom às 16h00 SALA PRINCIPAL M/12 O TMA organiza transportes colectivos para grupos de mais de 20 pessoas. Informações e Reservas: João Farraia: 92 671 20 34 | Miguel Martins: 96 496 00 05 | Pedro Walter: 96 354 95 75 Preço especial para grupos 12€ Jantar + Espectáculo