Claudionor Rosa: um Guardião da Memória Resendense Enio Sebastião Cardoso de Oliveira Entrevista Claudionor Rosa: um Guardião da Memória Resendense Enio Sebastião Cardoso de Oliveira Mestrando, [email protected] Hoje quando se fala em história cultura e a memória da cidade de Resende, qualquer morador da cidade lembra logo de Claudionor Rosa. Esse paulista de nascimento que ele afirma ter sido por acaso, mas resendense de coração, chegando aqui na década de 60, em seus quase 70 anos de idade, com mais de quarenta dedicados à pesquisa e à memória oral de Resende, revela em entrevista os seus planos, projetos, um pouco da memória oral da cidade e a sua grande paixão pela história de Resende. Diretor do Arquivo Municipal de Resende, onde também é curador de um inestimável acervo, onde pesquisadores de todos os Estados, e até de outros países, vêm conhecer um pouco da história desse pedaço da região no Vale do Paraíba. Com uma memória invejável e afiada nas argumentações, conhece como poucos vários pontos e curiosidades de uma história oral, a qual não se perdeu por iniciativa de alguns amantes como ele da cultura e da história da Região, e por isso continua viva na memória de muitos resendenses. Claudionor Rosa trabalha no arquivo mas, mesmo entre o silêncio dos pesquisadores que utilizam o acervo, não dispensa um dedo prosa, e esta pode ser uma das fontes mais ricas na manutenção e no aprofundamento da memória e da história oral de Resende. Sr. Claudionor Rosa Caminhos da História, Vassouras, v. 6, n. 2, p. 143-150, jul./dez., 2010 143 Claudionor Rosa: um Guardião da Memória Resendense Enio Sebastião Cardoso de Oliveira Entrevista Revista Discente - Qual foi seu interesse pela História e pela memória de Resende? Claudionor Rosa - Isso é uma coisa de pele pois eu mesmo não sei dizer o porquê traduzir o motivo. O que talvez pode ser o motivo era porque eu era muito interessado nas coisas da minha região em que cresci, em Minas Gerais, que era extremamente pobre, mas muito rica de folclore, por exemplo, em suas manifestações culturais etc, etc.. De repente eu vim para cá, uma cidade que era muito conservadora, racista, elitizada, onde haviam pessoas com dinheiro, com informação, com parentes, então tudo o que tinha lá eu não tinha aqui, não tinha família, não tinha nada para se divertir. Assim eu comecei a me interessar a conhecer essa história para com pensar um pouco, e acabei conhecendo pessoas que eram consideradas rabugentas, mas que se interessaram e me ajudaram muito a conhecer um pouco dessa história, que é complicada porque se trata de uma história que era quase toda oral. Talvez por insistência e boa vontade dessas pessoas eu passei por um processo que dificilmente as pessoas daqui passariam, pois que chega de tudo e passa a ser cenário para uma pessoa que chega de fora. E uma coisa que me encantou muito nessa cidade, e lógico que não vim por causa dele, mas o que me encantou muito foi o rio, porque lá em Minas eu morava em uma cidade, que não tinha absolutamente rio nenhum, mas era vizinho de Pirapora que tem o rio São Francisco, então era um complexo de inferioridade, pois algumas horas tava no rio que em Pirapora era majestosa. Cheguei aqui em Resende vi o rio Paraíba, onde as pessoas pescavam, e por acaso fui morar em um bairro chamado Lava-pés, bem próximo ao rio Paraíba. Depois eu fui estudar, pois não tinha completado nem o primário ainda, aí enfim acabei ficando. Claro que nesse meio tempo, tive outras atividades, trabalhei fora, trabalhei em Angra dos Reis, mas sempre ligado às questões culturais e históricas da cidade. Voltei a trabalhar de novo em Resende e fiquei mais próximo das pessoas, ficando meio voluntário, meio rato dessas pessoas idosas que possuíam essa história oral e documentos, enfim, que me despertava grande interesse. E de lá para cá fui trabalhar no arquivo e passei a trabalhar de forma mais direta com a história de Resende. RD - O senhor é considerado uma grande personalidade, no que diz respeito a história oral de Resende, é aquela pessoa que quando pensamos em história oral da região lembramos logo: “Claudionor Rosa” - o que o Senhor pensa em relação a esse reconhecimento? Claudionor Rosa - Isso me alegra, mas por outro me incomoda. Primeiro porque eu sinto falta de ter com quem dialogar, o que se torna complicado, pois corremos o risco de se estar passando informações trucadas, deturpadas ou a falta dessa interlocução, por isso estou sempre procurando estar junto com pessoal que pesquisa, com aluno e professor, mantendo uma linha de comunicação desse diálogo, para ver se a gente coloca essas idéias para fora para que sejam questionadas. Isso se deve porque existem dois estilos básicos de pessoas que podem servir como fonte oral, não querendo generalizar mas assim se colocam: um é aquele que sabe mas não fala e outro é aquele que vai apenas para criticar e encontrar erro e não dá soluções, o que torna o trabalho complicado. E normalmente o que sabe não vai para o Jornal para dizer o que sabe, mas aquele que descobre alguma coisa que você errou ou está mal interpretado, esse faz questão de ir a um Jornal ou a imprensa e gasta três páginas, é uma coisa que chega a ser mesquinha e não se cresce muito com isso. Mas qual é a minha compensação? É ter uma visão bem dentro do possível, apesar de sermos humanos, não querer ser mais importante que a história, é a história que é importante, eu sou apenas um veículo, como outros tantos foram. Outra coisa também é procurar insistentemente, estar colocando para fora a história de vida Caminhos da História, Vassouras, v. 6, n. 2, p. 143-150, jul./dez., 2010 144 Claudionor Rosa: um Guardião da Memória Resendense Enio Sebastião Cardoso de Oliveira Entrevista dessas pessoas vencedoras ou não. Com estabelecimento de um diálogo, outras pessoas se juntam, outras pessoas acrescentam, outras diminuem, criando o que seria ideal se existisse naturalmente, uma interlocução de várias vozes, mas como não tem, por uma série de fatores, através de nossa ação insistente, num estilo “forçando a barra” mesmo, acaba aparecendo. Um exemplo é o nosso Arquivo, ele é muito mais procurado pelas pessoas de fora do que das pessoas da cidade. Então estamos sempre encontrando com pessoas, passando informações, recebendo outras que vêm acrescentar à nossa história, numa troca de informações, do tipo achei, não achei, o que é muito legal, muito interessante, inclusive por pessoas de outros países. Isso significa que o nosso Arquivo e nossa história tem um peso, está sempre aberto e que não estamos trabalhando no resgate de nossa história, inclusive a oral, de forma solitária. Em relação aointeresse local, esperamos mudar esse quadro onde a população da região, pesquisadores, professores, alunos e o povo em um todo, passem a ver agora mais do que nunca, pois Resende está em um impasse muito interessante, já que as novas indústrias que se instalaram na região, trouxeram para cidade muitas possibilidades para todos, porém enquanto as pessoas daqui não sacarem essas novas mudanças, as pessoas ficarão batendo palma paras as pessoas de fora, que chegam de forma mais preparada, ocupam os postos mais importantes dessas empresas e com muito mais interesse de conhecer a cultura e a história da região. Um exemplo foi o último concurso público da Prefeitura em 2010, pessoas com curso superior, tropicou na hora de saber quem nasce na cidade de Resende é Resendense, bastou colocar uma pegadinha, ou que os Índios Puris, chamavam essa região de “Timburibá”, devido à um tipo de palmeira típica da Região da Antiga Campo Alegre. E eu pergunto, será que essas pessoas que mesmo tendo conhecimento técnico estão em condições para encarar essas concorrências “brabas” que existem por ai hoje? Eram questões simples, mas por desconhecerem a nossa história... Então nosso trabalho é mais uma ferramenta, e estamos aqui aberto para elas. RD - O Senhor acha que as novas gerações têm cuidado da preservação da memória da nossa Cidade? Claudionor Rosa - Não porque a Nova Geração depende da Velha Geração, e a Velha geração que é a Minha Geração, talvez seja a Geração mais curiosa que já vi, pois apesar de ter sido uma geração que assistia novela, reclamava do salário e de doenças, mesmo essas sendo infundadas, muitos tinham tempo para se dedicar e conhecer a história da Região, além disso, muitos foram professores que passavam alguma coisa para os alunos. No meu tempo, o professor da minha geração se dedicava apenas a passar o B, A, BA, passar informações, a questão da educação se trazia de casa. Hoje o professor tem muito mais atribuições, o que cria uma geração de mestre que fica preso a outras questões, hoje é um misto de tudo. Mas em relação à juventude, existem coisas que acho muito gratificante, que é quando nós temos oportunidades de chegar até eles ou eles chegarem até a gente, o retorno é fantástico! No caso da história quando conseguirmos chegar às novas gerações, independente de onde se mora e da classe social, isso é realmente inenarrável. Teve um dia, que fomos visitados por alunos de uma escola classe média, o que me chamou atenção era que, todos tinham celular, filmavam, fotografavam, enfim. Três ou quatro dias chegaram alunos de uma escola bem afastada, nenhum deles tinham celular ou máquina fotográfica, mas três ou quatro só tinham a capa do celular, pendurado na cintura deles, eles eram muito mais interessados, mais instigados que os alunos dessa escola classe média da cidade. Vimos que muitas crianças independentes de classe social, e das adversidades, podem ser interessar por nossa história, só espero que esses jovens tenham outros canais de oportunidade e um maior apoio do poder público para prosseguirem em sua formação intelectual, e que sejam as novas gerações da memória histórica de nossa Caminhos da História, Vassouras, v. 6, n. 2, p. 143-150, jul./dez., 2010 145 Claudionor Rosa: um Guardião da Memória Resendense Enio Sebastião Cardoso de Oliveira Entrevista cidade. Mas as pessoas que chegam aqui geralmente demonstram algum interesse, mesmo os desinteressados acabam acompanhando o grupo que na sua maioria possui interesse, por inclusive ser uma atividade pedagógica diferente. A outra esperança que tenho é a propagação de cursos locais. Antigamente para se formar em História, ou outro curso qualquer, tinha que ir para o Rio de Janeiro/ São Paulo, hoje a nossa cidade oferece vários cursos em diversos campos de conhecimento. E os próprios cursos passaram a adotar como pauta de pesquisa os temas relacionados a nossa Região, onde aparecem vários pesquisadores, alunos de graduação e pós-graduação, querendo subsídios para a elaboração de suas pesquisas, suas monografias, não só de Resende, mas de Barra Mansa, Quatis, Cruzeiro (MG), pois é uma região que está com certo “IBOPE” no meio acadêmico, isso é muito interessante e acredito que em um curto espaço de tempo vamos começar a reverter esse quadro, não só pela formação do curso de história, mas de alguma maneira também de geografia, turismo e outros, que passam inclusive a ser uma questão de sobrevivência profissional. RD - Na História de Resende, qual seria, na sua opinião, o fato mais marcante para nossa cidade, um verdadeiro divisor de águas? Claudionor Rosa - Nossa, são tantos né, porque temos fatos Sociais, Políticos, Culturais, militares e até religiosos, que confesso a você que é difícil de destacar. Os fatos históricos principalmente aqueles retirados de uma história oral tem a sua importância que variam de geração a geração. Inclusive a geração atual e até mesmo a anterior curtia menos as coisas de Resende do que a geração anterior a minha. Um fato histórico importante que podemos destacar é a transformação de Campo Alegre à condição de Vila em 29 de setembro de 1801, esse fato colocou Resende definitivamente no mapa político do Brasil, mas isso rompe com a questão da oralidade e de uma simples memória popular para figurar como fato histórico estabelecido no calendário cívico do município de Resende. Muito embora como já disse, o importante são as novas gerações curtirem a nossa cidade, a nossa história, que ela não fique apenas esquecidas nas caixas do arquivo público ou na memória dos velhos. Por exemplo, meu filho foi fazer um trabalho fora do Brasil, e ficou abismado com um roteiro que foi dado a ele em São Francisco (Califórnia), que o primeiro dia do roteiro era conhecer a cidade, onde era matéria obrigatória do curso. Os dirigentes do trabalho que ele participou em palestra, dizia que não adiantava ir numa cidade fazer um trabalho sem conhecer absolutamente nada sobre ela, a não ser só de postal, a filosofia era levar o conhecimento da cidade para pessoas que vem de fora que poderiam até ajudar a solucionar os problemas da cidade, por isso ele visitou asilos, hospitais com pessoas com Parkinson, etc. e isso é muito interessante. RD - Então levar o conhecimento da história e da memória de nossa cidade aos jovens seria hoje um dos maiores desafios para o Senhor? Claudionor Rosa - Acredito que sim. Aqui, quando fazemos atividades com jovens nas chamadas aulas passeio, onde levamos os alunos das Escolas a vários pontos históricos da cidade, em que fazemos um trabalho cultural auxiliando as escolas, é para mim um grande desafio, pois a rede escolar conta sei lá com quase 30 mil alunos, e nos só temos dois funcionários no Arquivo isso já é um desafio, e essas escolas sempre nos procuram. Caminhos da História, Vassouras, v. 6, n. 2, p. 143-150, jul./dez., 2010 146 Claudionor Rosa: um Guardião da Memória Resendense Enio Sebastião Cardoso de Oliveira Entrevista Nessas atividades culturais procuramos colocar escolas com realidades diferentes, uma particular outra não, uma municipal outra estadual de situações bem diferentes, onde aprendemos como falar se portar e estarmos sempre se sentindo desafiado na transmissão da história, da cultura e conhecimento, como por exemplo temos a questão dos portadores de deficiência física. Na semana passada estive aqui um grupo de crianças Francesas e veio um intérprete, enfim estamos sempre sendo desafiados. Outra coisa que nos instiga aqui é a linguagem, da forma que chega um aluno adolescente, chega criança de educação infantil, que temos que utilizar figuras no datashow porque o aluno não sabe nem ler ainda. Claro que o ideal era que nós tivéssemos mais gente, pessoas treinadas, o que faz lembrar o que Darci Ribeiro dizia, em termo de cultura se você for esperar condições ideais no Brasil você não faz nada não. RD - Entre a formação do Povo Resendense nós temos a presença do negro e do índio, o que o Senhor pode falar sobre a importância desses grupos para a região? Claudionor Rosa - Do índio se sabe muito pouco, é ainda um objeto a ser estudado,sabemos é que não foi muito diferente do restante do Brasil, os índios Puris que habitaram essa região nos chamados tempos ainda imemoriais, foram massacrados, e existe pouco registro sobre o assunto tanto é existe muita gente interessada nesse tema, então começa a ocorrer um interesse acadêmico, e o tema estava até então relegado a memória dos seus antepassados, ou pessoas que afirmam serem descendentes dos Puris. Já a questão do negro já é diferente, já ocupa outro espaço, mas também carente de se ter trabalhos acadêmicos regionais, mais aprofundado. Há pouco tempo uns alunos de Turismo, me pediram ajuda para escrever um breve verbete para colocar nas placas das ruas próximas aos monumentos como Santa Casa, Igreja “A” ou “B” todas elas estavam um caos, que foram obras construídas pelos negros. Por exemplo, a Santa Casa foi construída e administrada por um Padre Negro, foram buscar lá em Areias e sem motivo, não foi ele, devia ter alguma qualidade, e curiosamente era negro, mas com uma capacidade de administrar muito grande, onde conseguiu apaziguar aquela relação que não era muito legal, fez de forma admirável a construção da Santa Casa em tempo recorde. Em relação às bandas musicais de escravos que tinham várias na região, como Barão do Bananal, a Maria Benedita que era a Rainha do café, mas a mais famosa era da Maria Benedita, mas porque a dela era a mais famosa? Por que enquanto os outros buscavam professores europeus ou de formação européia, ela buscou um negro, e lógico que a ligação dele com os parceiros, apesar dos outros negros serem escravos e ele não, muito mais íntima que com o europeu. Porém o que temos alguma dificuldade aqui em Resende, que não é diferente do restante do Brasil, é que perdemos muito tempo nessas discussões inócuas, por exemplo, essa raiva que as pessoas tem da princesa Isabel sem conhecer, ela é uma figura histórica muito injustiçada, porque primeiro atribui a ela o fracasso da lei áurea, ela apenas rabiscou alguns parágrafos lá e promulgou a lei. Outro é questão do preconceito, a memória do negro ou do índio ainda é muito maltratado em nossa cidade. Metade do século XIX, a mão-de-obra ativa era do escravo, no entanto você não vê a referência desse povo no Hino, na Bandeira, nas Ruas, nem nas Praças, a não ser nos registros em que um escravo matou um fazendeiro, um fazendeiro mata um escravo esse registro não se vê. Enquanto isso, existiram pessoas negras que foram importantes para Caminhos da História, Vassouras, v. 6, n. 2, p. 143-150, jul./dez., 2010 147 Claudionor Rosa: um Guardião da Memória Resendense Enio Sebastião Cardoso de Oliveira Entrevista nossa cidade, estão esquecidas. Estou me preparando, mês que vem, uma apresentação na Câmara de Resende, um trabalho sobre a vida e a obra de uma pessoa fantástica, que qualquer pessoa que ler a obra desse homem, independente de ser negro ou não vai se apaixonar. Um homem que, de certa forma é desconhecido que é o Luis Gama, um homem considerado o advogado dos escravos. Uma história muito interessante é que o pai dele perdeu sua herança no jogo, foi vendido com dez anos como escravo, como era baiano, chegou em São Paulo, os fazendeiros não queriam saber de escravo baiano, por que escravo baiano aprontava, ele veio parar em uma fazenda no município de Lorena/SP, onde aprendeu a ler e escrever e se transformou em advogado que defendeu muitos escravos, uma história muito interessante. Você não vê muita preocupação, mesmo das pessoas ligadas ao movimento negro em resgatar essas personalidades, o que vemos são palavras de ordem que passam pelos partidos e que não atingem a população. E quando vamos discutir isso, levantamos aquela questão que o problema do Brasil não é racial, é também, mas a gente sabe que não é bem assim, e mesmo que não fosse perdemos a oportunidade de discutir, e vemos grande parte das pessoas negras serem engolidas pelo “branqueamento” cultural. Note bem, grande parte dos estudos sobre negros no século XIX, são feitos por essoas brancas, até por que não tinha negros se formando na Europa nesse século, então se perdeu muito tempo para incorporar uma história fantástica não só do negro mas dos índios também. Eu fico pensando, hoje em dia existe um verdadeiro choque de ordem entre pai e filho na maioria dos casos, será que não seria o momento de repensar a relação que os índios tinha no caso de nossa região com os seus filhos. Pelo menos a titulo de curiosidade seria, portanto os dos grupos raciais são importantes para a nossa região. RD - Voltando a questão da memória local, percebemos sobre o índio Puri, uma memória local muito forte em relação ao nome, o que o senhor tem a dizer sobre isso, apesar ter se perdido essa história, mesmo com a tentativa atual desse resgate? Claudionor Rosa - Na verdade o que a gente entende é que é uma coisa muito forte, senão tinha se perdido totalmente, hoje por exemplo existe uma rua chamada de “Timburibá”, que era como os Índios Puris chamavam essa região. Mas há uma rejeição, para você ter uma idéia, Resende não tem uma rua com o nome dos Puris. Certa vez, pedi a um vereador a procurar uma rua e colocar-lhe o nome de Puri, ele então escolheu o Bairro do Monet, os moradores não aceitaram, foi a primeira vez que eu vi moradores ir para a Câmara dos Vereadores, rejeitar o nome de uma rua, “Puri lá não!”, segundo os moradores, um preconceito “brabo”. Acho uma tremenda burrice, pois se deve conciliar, o crescimento de Resende, tanto industrial e intelectual com a forma de ser do índio e do negro, afinal de contas é a nossa história que devemos pelo menos, ter o direito de conhecer, aceitar ou não e outra coisa, mas é nossa história e a nossa memória, se não surgir nenhuma fonte e documentos que a mude, é a nossa herança. Isso faz parte do preconceito, onde o negro mata fazendeiro e o índio é preguiçoso, isso fez com que durante muito tempo ninguém se interessasse por esse tema. Isso me faz lembrar de um artigo que escrevi para uma matéria em um jornal local, em que brinquei com o seguinte: houve uma época em que os negros se reuniam na igreja do Rosário e o fazendeiro dava um dia ou dois de alforria para ele, onde faziam a festa deles, uma festa de arromba, e que grande parte eram liberados, na qual parte dos mais velhos, não sabiam falar português eles falavam orumbá, onde se tinha parte falando português e parte orumbá, que eu Caminhos da História, Vassouras, v. 6, n. 2, p. 143-150, jul./dez., 2010 148 Claudionor Rosa: um Guardião da Memória Resendense Enio Sebastião Cardoso de Oliveira Entrevista achava legal a gente conhecer, assim escrevi “já pensou a cidade ter um curso de orumbá”, nossa senhora, a cidade quase veio abaixo, “onde já se viu em plena época da tecnologia uma pessoa estar sugerindo a se aprender orumbá, foi um Deus nos acuda, um língua que ia aprender quem quisesse, e a gente só ganharia com isso. RD - O Senhor é um historiador autodidata, você já sofreu preconceito por isso? Claudionor Rosa - Não tenho formação nessa área, é o que lamento, mas o que procuro é utilizar a ciência, a memória oral para desenvolver a nossa história de Resende. Mas eu lamento é o preconceito que existe com que não é e que tem a formação, quem não é acha que dispensa e quem tem a formação acha que só ele que sabe, na verdade todo mundo sabe alguma coisa e todo mundo quer aprender alguma coisa. E o grande barato é a junção dessas duas coisas, nós vemos pessoas sem nenhuma formação acadêmica cheia de cultura e outra com formação sem cultura nenhuma, o encontro dessas duas coisas sem ranço é o ue importa. RD - É o que o senhor espera do futuro dessa história de Resende? Claudionor Rosa - Uma história tão bonita, tão legal deveria ser mais contada, ser incorporada a uma história que não está nos livros, não está na rua, não esta na praça, devem haver coisas perdidas por ai, além do patrimônio que está se perdendo pela falta de conservação, e tem mais o patrimônio imaterial, ligado a história oral, que a cada dia que morre um, parte desse patrimônio se perde, existe a falta de uma política pública para ajudar a gente a reunir essas pessoas. Há também a questão das famílias interessadas que não ajudam no resgate dessa história e das pessoas que convidamos para dar um depoimento, contar uma história para deixar um registro em nosso arquivo, e que se negam, a uma entrevista, elas dizem “Deus me livre não estou na hora de morrer não”, e claro que a família não ajuda neste sentido. Mas o que sobra, é que além de positivo é agradável esse trabalho, pois a gente está sempre pesquisando, aprendendo e preservando a nossa história para as gerações futuras. 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