PARECER Nº 2371/2012 CRM-PR PROCESSO CONSULTA N.º 002/2012 – PROTOCOLO N. º 1296/2012 ASSUNTO: UTI MÓVEL - VAGA HOSPITALAR - TRANSFERÊNCIA DE PACIENTE RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL PARECERISTA: CONS. ROMEU BERTOL EMENTA: UTI móvel - Vaga hospitalar - Transferência de paciente - Responsabilidade profissional CONSULTA Em e-mail encaminhado a este Conselho Regional de Medicina, o Dr. XX, faz consulta com o seguinte teor: “Solicitação: Solicito parecer sobre dilema ético na dificuldade para encaminhamento de pacientes atendidos por ambulâncias. Trabalho numa empresa de UTI móvel e necessito de orientações sobre quais são as condutas éticas nas seguintes situações diárias: 1-É ético levar o paciente para unidade hospitalar sem um contato telefônico prévio? 2No caso de ser feito o contato telefônico e seja alegado falta de vaga para não aceitar receber o paciente. Há infração ética em levar o paciente para uma unidade hospitalar que negou recebê-lo no contato telefônico? 3- Devo aguardar no local do atendimento pré-hospitalar até que consiga a vaga num hospital ou devo levar o paciente imediatamente para o hospital mais próximo? 4- É ético prescrever tratamento de casos agudos ou todos os pacientes deveriam ser removidos para tratamento em unidades fixas (PS, PA, ambulatórios)? Justificativa: 1- Em alguns casos de pacientes graves é perder um tempo precioso ficar aguardando contato telefônico. Um exemplo é o paciente vítima de amputação traumática de membro que necessita intervenção cirúrgica imediata. Alguns hospitais exigem que o médico assistente faça a passagem do contato por telefone antes de aceitar receber. Nisto perdemos tempo de fazer um deslocamento rápido colocando em risco a vida do paciente. 2- Temos repetidos problemas com pacientes SUS e de convênios com pequena rede hospitalar. Para pacientes SUS é quase impossível conseguir uma vaga que não seja na base do "jeitinho" (conhecer alguém). Já cheguei a ficar mais de quatro horas tentando contato para um paciente com suspeita de IAM. Noutra situação, nenhum hospital do convênio do paciente queria aceitar, sendo que um colega do PA chegou a sugerir que eu deveria tentar uma vaga no SUS para o paciente. 3- Após o atendimento inicial e estabilização do paciente fica a dúvida de que se devo esperar até que surja uma vaga ou já iniciar o deslocamento para a unidade hospitalar mais próxima. 4- Alguma vezes somos chamados para atender quadros infecciosos agudos. Por exemplo, posso prescrever antibiótico para tratamentos de faringites ou cistites, ou mesmo tendo feito o diagnóstico tenho que levar para uma unidade hospitalar para que lá seja realizado a prescrição do tratamento?” FUNDAMENTAÇÃO E PARECER A razão desta consulta ao CRM é a dificuldade na relação entre médicos que atuam na assistência pré-hospitalar e médicos da rede hospitalar particularmente dos serviços de urgência/emergência. Este tema é motivo de frequentes pedidos de parecer a este conselho, pois a situação dos serviços de emergência/urgência embora extremamente grave tem mudado muito pouco nos últimos anos, pelo contrário, tem piorado. Basta que se assista aos noticiários da mídia que diariamente mostram imagens de pacientes em condições desumanas em corredores de hospitais, UPAS e unidades de saúde. As entidades médicas tem denunciado esta situação, reivindicado mais verbas para a saúde e a implementação de políticas mais efetivas para o setor sem serem ouvidas no entanto. Somos a sexta economia do planeta terra, somos o décimo segundo país concentração de renda e temos um vergonhoso e humilhante IDH de 84. Recentemente fomos surpreendidos por corte de recursos para o setor saúde. O que já estava ruim poderá ficar pior. Por outro lado a constituição garante aos cidadãos brasileiro acesso universal e igualitário aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência. “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas (...) Artigo 196 da constituição de 1988. Feitas estas considerações preliminares a seguir se verá o que diz a legislação par o setor. No texto da Portaria n.º 2048/02 do MS podemos ler que cabe ao médico regulador: (...) tomar a decisão gestora sobre os meios disponíveis devendo possuir delegação direta dos gestores municipais e estaduais para acionar tais meios, de acordo com seu julgamento. Bem como: (...) decidir os destinos hospitalares não aceitando a inexistência de leitos vagos como argumento para não direcionar os pacientes para a melhor hierarquia disponível em termos de serviços de atenção de urgências, ou seja, garantir o atendimento nas urgências, mesmo nas situações em que inexistam leitos vagos para a internação de pacientes (a chamada vaga zero para internação). Deverá decidir o destino do paciente baseado na planilha de hierarquias pactuada e disponível para a região e nas informações periodicamente atualizadas sobre as condições de atendimento nos serviços de urgência, exercendo prerrogativas de sua autoridade para alocar os pacientes dentro do sistema regional, comunicando sua decisão aos médicos assistentes das portas de urgência. Em suma, o regulador deve responder como autoridade sanitária e lançar mão dos meios necessários para garantir o adequado atendimento do paciente, após devidamente autorizado pelo gestor local a assim agir. Em virtude do aumento da violência e da privatização das estradas, surgiram no País inúmeros serviços privados de atendimento pré-hospitalar. Sobre estes legisla também a portaria 2048/2002 ao afirmar que as empresa privada de atendimento pré-hospitalar: (...) (...) deve contar, obrigatoriamente, com centrais de regulação médica, médicos reguladores e de intervenção, estas centrais privadas devem ser submetidas à regulação pública, sempre que suas ações ultrapassem os limites estritos das instituições particulares não conveniadas ao SUS, inclusive nos casos de medicalização de assistência domiciliar não urgente. A Portaria GM/MS nº 2.657 de 16 de dezembro de 2004 que estabelece as atribuições das centrais de regulação médica de urgências define ainda: Atribuições gerais: I – ser instância operacional onde se processa a função reguladora, em casos de urgências clínicas, pediátricas, cirúrgicas, traumáticas, obstétricas e psiquiátricas; (...) III – ser capaz de refletir a relação entre oferta disponível e as necessidades demandadas; (...) Atribuições específicas: IV - discernir sobre a urgência, a gravidade e o risco de todas as solicitações; (...) VI - decidir sobre a resposta mais adequada para cada demanda; (...) XI - permear o ato médico de regular por um conceito ampliado de urgência, acolhendo a necessidade expressa por cada cidadão, definindo para cada um a melhor resposta, não se limitando apenas a conceitos médicos pré-estabelecidos ou protocolos disponíveis; (...) Palavras do gestor. É quem tem, a atribuição legal de normalizar as atividades na área da saúde. Na sua fala não deixa vácuo de poder. Estabelece com clareza funções, obrigações e atribuições dos serviços e profissionais que trabalham com urgência/emergência. Assim não cabe ao médico intervencionista invadir área de atuação privativa do médico regulador ou querer substituí-lo assumindo suas funções. Não está preparado para isso nem dispõe de delegação de poder do gestor para acionar recursos de urgência ou emergência. O legislador é claro quando afirma que o regulador médico tem a delegação da autoridade sanitária local para alocar o paciente em serviço adequado a sua necessidade naquele momento. Poderá até utilizar o recurso extremo da VAGA ZERO, quando vagas não existirem. Por fim o médico ao completar sua graduação está habilitado ao exercício pleno da medicina. Este é o entendimento dos conselhos. Assim não ofenderá a ética profissional se prescrever tratamento em casos agudos que venha a atender quando chamado e em serviço em uma unidade de atendimento móvel de urgência. É o parecer, s. m. j. Curitiba, 24 de março de 2012. Cons. ROMEU BERTOL Parecerista Aprovado em Sessão Plenária n.º 2938.ª de 27/03/2012- CAM I.